16/09/2021 - 20ª - Comissão de Agricultura e Reforma Agrária, Comissão de Meio Ambiente

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Havendo número regimental, declaro abertas a 20ª Reunião da Comissão de Meio Ambiente e a 12ª Reunião da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária, que ocorrem conjuntamente.
O objetivo da presente reunião destina-se à realização de audiência pública, em atenção aos Requerimentos nºs 6, de 2021, da CRA, e 46, de 2021, da CMA, de autorias dos Senadores Acir Gurgacz, que se encontra aqui ao meu lado, Presidente da CRA, e Jaques Wagner, respectivamente, com o objetivo de instruir o PL 2.159, de 2021, de origem da Câmara dos Deputados, que dispõe sobre o licenciamento ambiental; regulamenta o inciso IV do §1º do art. 225 da Constituição Federal; altera as Leis nºs 9.605, de 1998, e 9.985, de 2000; e revoga dispositivo da Lei 7.661, de 1988.
Esta é a segunda de uma série de audiências que faremos conjuntamente, de modo a instruir essa matéria a partir de diversos pontos de vista.
Estarão conosco, no dia de hoje, de modo remoto, em ordem alfabética: o Sr. José Carlos Carvalho, ex-Ministro do Meio Ambiente; o Sr. Davi Bomtempo, Gerente Executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Confederação Nacional da Indústria (CNI); a Sra. Andréa Zhouri, pesquisadora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e representante da Associação Brasileira de Antropologia (ABA); e o Sr. Marcos Saes, Consultor Jurídico da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic).
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Na exposição inicial, cada orador usará da palavra por até 20 minutos. Caso os participantes optem por usar material de apoio, será autorizado o compartilhamento da tela ao longo da exposição.
Após as exposições iniciais, será dada a palavra, caso queira, à Relatora da matéria, Senadora Kátia Abreu e, em seguida, aos Senadores inscritos para a sua interpelação em cinco minutos.
As inscrições podem ser solicitadas por meio do recurso "levantar a mão" ou no chat da ferramenta para os Senadores que se encontram remotamente.
Informo que, nos termos da Instrução Normativa nº 9, de 2017, da Secretaria-Geral da Mesa, a Secretaria solicitará a degravação da presente reunião para que as notas taquigráficas sejam anexadas à respectiva ata, de modo a facilitar a análise da matéria em questão.
A reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados por meio do Portal e-Cidadania na internet, em senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone 0800-0612211.
O relatório completo, com todas as manifestações, estará disponível no portal, assim como as apresentações que forem utilizadas pelos expositores.
Solicito à Secretaria que, neste momento, abaixe as mãos de quem se encontra remotamente, silencie os microfones e monitore as inscrições.
Consulto o Senador Acir Gurgacz, Presidente da Comissão de Reforma Agrária e Agricultura, se gostaria de fazer uso da palavra.
O SR. ACIR GURGACZ (PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO. Fora do microfone.) - Obrigado, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Então, agora passaremos às exposições.
Eu lembro que estas sessões são sempre dirigidas alternativamente por mim ou pelo Presidente Acir Gurgacz, da Comissão de Reforma Agrária e Agricultura.
Convido, para fazer uso da palavra, o Sr. José Carlos Carvalho, que terá até 20 minutos para a sua exposição. V. Sa. está com a palavra, Sr. José Carlos Carvalho.
O SR. JOSÉ CARLOS CARVALHO (Para expor.) - Bom dia a todos e a todas, Exmo. Senador Jaques Wagner, Exmo. Senador Acir Gurgacz. Cumprimento também aqueles que estão nos ouvindo em outros canais e, desde logo, agradeço a oportunidade de estar aqui participando desse debate sobre um projeto de lei de fundamental importância para o País. Quero, desde logo, parabenizar o Senado da República pela iniciativa de abrir essa série de audiências públicas de debate com a sociedade brasileira, corrigindo uma das falhas que tivemos na tramitação da Câmara, quando o último relatório infelizmente não foi colocado em discussão com o mesmo empenho e a mesma visão política estratégica que as Comissões de Meio Ambiente e de Agricultura e Reforma Agrária demonstram neste momento.
Também fico muito feliz de estar iniciando uma reunião com o Senado da República às 8 horas da manhã. Nós sabemos que o dia em Brasília começa às 10 horas.
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Então, é mais uma razão que demonstra o empenho das duas Comissões, nos seus dois Presidentes presentes, em realizar os necessários debates para a discussão desse tema.
Eu tenho tido oportunidade de me manifestar sobre o Projeto de Lei 2.159, que é o número que ele recebeu no Senado. E vou, dentro desses 20 minutos, me concentrar naqueles pontos que considero mais relevantes para estimular o debate, que é fundamental para dar aos Srs. Senadores e às Sras. Senadoras os subsídios necessários para que possam fazer a melhor interpretação da realidade ambiental brasileira e dar ao País um projeto de lei de licenciamento, uma lei de licenciamento ambiental que corresponda realmente às nossas necessidades.
Nunca é demais dizer que, quando nós estamos tratando de direitos de última geração, como são os direitos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, quando nós estamos tratando dos direitos difusos que interessam coletivamente à sociedade brasileira, nós estamos tratando de normas intergeracionais. Não é uma norma para resolver um problema de hoje; é uma norma que necessariamente tem reflexos para esta e as futuras gerações. Acho que é com esse princípio, com essa visão que certamente o Senado da República estará se debruçando para a análise desse tema, uma relatoria da Senadora Kátia Abreu, a quem também quero parabenizar pela abertura que tem dado na discussão do tema no Senado, diferentemente do que havia ocorrido na Câmara Federal.
Primeiro, eu gostaria de mencionar em relação ao PL aquilo que ele devia ter e não tem. É o meu primeiro ponto, considerando, inclusive, as mudanças havidas no último relatório da Câmara, que acabou sendo aprovado, que tirou questões que me parecem fundamentais, que chegaram a ser colocadas em relatórios anteriores e que não estão presentes no PL remetido pela Câmara ao Senado da República.
Primeiro, desejo falar da importância da avaliação ambiental estratégica, da necessidade de o País tratar o licenciamento como uma questão estratégica do desenvolvimento sustentável. Nós não podemos continuar tratando o licenciamento ambiental no Brasil como um cartório onde as pessoas vão buscar licenças, com todas as precariedades que nós sabemos existirem no Sistema Nacional do Meio Ambiente no Brasil.
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Então, esse é um ponto. É preciso trabalhar com Avaliação Ambiental Estratégica para que o licenciamento possa ser, de fato, um instrumento de promoção do desenvolvimento sustentável do País, que ele possa ser, de fato, um instrumento que ponha a sustentabilidade no patamar que ela merece para a concepção, a formulação e a implementação das nossas políticas de desenvolvimento. Esse é um ponto que eu queria mencionar.
Também desejo mencionar outro ponto importante que foi retirado no último PL da Câmara, que foi o Zoneamento Ecológico-Econômico. Aliás, isso não se aplica exclusivamente à política de meio ambiente, mas, lamentavelmente, tem sido historicamente uma grande lacuna do processo de desenvolvimento no Brasil, que é a completa ausência da dimensão territorial na formulação das nossas políticas públicas. E, quando se trata de meio ambiente...
Eu gostaria de pedir que a Mesa desligasse o microfone dos dois Presidentes.
Prosseguindo.
Eu espero que essa questão da dimensão territorial que menciono possa ser levada em consideração, porque, em se tratando de meio ambiente principalmente, não é adequada a formulação de uma política pública que ignore a dimensão territorial, porque é no território que os impactos ambientais ocorrem, é no território que a comunidade impactada sofre diretamente os impactos negativos, sobretudo dos grandes empreendimentos. Então, essa é a primeira questão.
Volto também a um tema que já tive oportunidade de debater com a Senadora Kátia Abreu, quando mencionei a importância do licenciamento ambiental de um formato de Avaliação Ambiental Estratégica, porque, no modelo atual, que acabou sendo revisado na Câmara, na verdade, com o argumento de aperfeiçoar o licenciamento ambiental brasileiro, a Câmara, na verdade, tratou de fazer remendos numa regra que já existe, perdendo, com isso, a oportunidade de que fazer realmente o necessário aperfeiçoamento.
E eu, quando falo aperfeiçoamento, quero deixar claro que não defendo os status quo; estou entre aqueles que reconhecem que há espaço necessário para fazer um grande aperfeiçoamento no licenciamento ambiental do Brasil, na nossa legislação de licenciamento, mas um aperfeiçoamento que realmente possa aprimorar a norma e não apenas fazer remendos para buscar resolver problemas deste ou daquele setor que alega ter dificuldade com o licenciamento ambiental no Brasil.
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É uma pobreza, permitam-me os senhores, ir ao Congresso Nacional brasileiro, com a oportunidade de fazer uma lei ambiental para o futuro - porque toda lei ambiental tem que ser feita para o futuro -, e aceitar simplesmente fazer remendos para atender determinados setores que se consideram prejudicados com o licenciamento ambiental no Brasil.
E nesse particular eu retorno à avaliação ambiental estratégica para mencionar um ponto que certamente espero possa ser examinado no Senado, que é o da avaliação de impacto ambiental ex ante ao licenciamento.
O licenciamento ambiental hoje é o licenciamento ex post, realizado depois que todas as decisões de fazer o empreendimento já foram tomadas. Vamos pegar um exemplo das grandes obras de infraestrutura na área energética, na área viária, em outras grandes áreas onde os empreendimentos são de significativo impacto: é feita avaliação de viabilidade econômica, avaliação de viabilidade financeira, avaliação de viabilidade técnica e, nesse momento, o fundamental tema da questão ambiental acaba ficando esquecido, é o grande ausente no momento em que se define a decisão de fazer.
Vamos pegar um exemplo: Belo Monte, pela quantidade de impacto ambiental que tem. Em que momento a questão ambiental de um empreendimento daquela magnitude aparece no processo, aparece no balcão do licenciamento - e isso acontece com todos os grandes empreendimentos ambientais no Brasil? É no balcão do licenciamento que os grandes temas ambientais vão surgir por conta da necessidade de realizar o EIA/Rima e obter a licença.
Ora, nesse momento, a decisão de fazer já foi tomada, os empréstimos já foram negociados e fica uma expectativa 100% frustrada de achar que, no momento do licenciamento, aquela obra que poderia ser ambientalmente inviável possa ser declarada inviável no licenciamento ambiental. Ora, é ingênuo imaginar que algum técnico do licenciamento ambiental vai dar um parecer contrário ao final a uma obra de grande porte que já foi aprovada ou pelo Presidente da República ou pelo Governador do Estado.
Essas são questões que nós temos que tratar.
Então, é fundamental, no meu entendimento, que tenhamos uma avaliação de impacto ambiental ex ante, inclusive para o empreendedor conhecer o custo ambiental do seu empreendimento, para decidir se ele realmente é viável, porque vamos convir que não é razoável esperar que um empreendimento, seja de que natureza for, possa ser declarado viável, externalizando os custos de meio ambiente, externalizando os custos socioambientais do empreendimento.
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Então, é esse o ponto. Se um empreendimento, logo na fase de concepção, incluir avaliação de viabilidade socioambiental e se esse ponto implica que o empreendimento poderá ser inviável do ponto de vista econômico, ele tem que ser declarado inviável. Nós não podemos admitir que a viabilidade venha pela degradação do meio ambiente, pela destruição da biodiversidade. São questões, no meu entendimento, que parecem elementares, mas que estão longe de serem percebidas e que, até agora, não foram percebidas no PL da Câmara. No entanto, nós esperamos que possam ser examinadas no PL do Senado.
Como não temos essa questão e eu estou procurando fazer uma abordagem mais estratégica, porque tenho certeza de que os que virão depois, especialmente a Andréa, que terá a oportunidade de esmiuçar mais os detalhes e as fragilidades do licenciamento ambiental no Brasil, eu menciono que, com base nessa distorção que eu estou citando, há um divórcio completo entre o projeto executivo do empreendimento e o EIA/Rima, que é feito para obter o licenciamento ambiental no órgão licenciador. Aí já começa uma deformação. Ora, se o projeto executivo não contempla as medidas mais importantes de natureza ambiental para implementação de um determinado empreendimento - e isso vai aparecer desconectadamente no EIA/Rima, no licenciamento ambiental -, nós já temos uma porta de entrada de crise. Por quê? O EIA/Rima vai incluir uma série de considerações relacionadas ao projeto executivo - vejam bem, quando é com base no projeto executivo. Quero ressaltar aqui que a maioria dos EIA/RIMAs são realizados com base no projeto básico, quando não no projeto conceitual, quando, na verdade, essa questão teria que estar esmiuçada no projeto executivo, depois de ter passado pelo crivo de uma avaliação de viabilidade ambiental.
Aí vamos ao balcão do licenciamento. Eu já tive oportunidade, como profissional da área, de fazer uma sobreposição de um EIA/Rima sobre um projeto executivo de um empreendimento. Quando a gente faz a sobreposição, o que aparece é um queijo suíço cheio de buracos. E aí o que acontece, na prática, na legislação que vigora hoje? Para cada buraco, uma condicionante. Não é por acaso que os empreendimentos obtêm licenças ambientais com quase um jornal de condicionante para ser cumprido, porque, para cada buraquinho que existe na sobreposição do EIA/Rima num projeto executivo, tem que se pedir uma condicionante.
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E aí entramos numa outra questão, que certamente deverá ser examinada pelo Senado, que é a negociação das condicionantes. Por conta de fragilidades existentes, as condicionantes no Brasil viraram um balcão de negócios, com cada qual querendo incluir uma determinada condicionante no empreendimento, muita das vezes sem nexo causal, sem nenhum nexo causal, para fazer determinadas obras que não guardam nenhum nexo de causalidade com o empreendimento que está sendo feito, e menos ainda com a comunidade afetada. Nós temos exemplos recentes agora que estão sendo adotados no Brasil de empreendimentos que estão realizando obras de interesse social, que são fundamentais - não estou aqui questionando esse ponto -, mas que não estão atendendo diretamente a comunidade atingida.
Então, são temas dessa natureza que eu entendo que nós precisamos de considerar, no ponto de vista estratégico, para termos, de fato, um projeto de licenciamento que atenda os interesses do País, que possam ser um instrumento para estimular o nosso desenvolvimento sustentável. Para isso, é nesse contexto que eu acho que temos que analisar a política ambiental brasileira. Precisamos de sair de um cartório, de um licenciamento que é exercido de maneira frágil, porque também precisamos de considerar aqui um ponto que eu gostaria de finalizar com ele: é fundamental considerar que há justificadas críticas em relação ao atraso do licenciamento ambiental em muitos casos, mas esse atraso não está relacionado exclusivamente aos aspectos legais e normativos; eles estão relacionados às questões institucionais em relação ao desmantelamento do Sistema Nacional do Meio Ambiente.
Muito obrigado. Fico à disposição para os debates.
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Muito obrigado pela sua contribuição bastante densa, Sr. José Carlos Carvalho. E eu lhe informo que, ao final, depois das primeiras quatro apresentações e dos questionamentos dos Srs. Senadores e das Sras. Senadoras, nós voltaremos a vocês como palestrantes na ordem invertida; ou seja, a pessoa que for a última, no caso o Marcos, será o primeiro no retorno para os comentários finais e eventuais respostas.
Eu convido agora o Sr. Davi Bomtempo para fazer uso da palavra.
V. Exa. tem 20 minutos.
O SR. DAVI BOMTEMPO - Bom dia a todos. Estão me ouvindo?
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Estamos ouvindo.
O SR. DAVI BOMTEMPO (Para expor.) - O.k. Muito obrigado.
Bom dia, Sras. e Srs. Senadores. É sempre um prazer estar aqui.
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Aproveito para cumprimentar também a nossa Mesa de palestrantes, a partir do José Carlos, da Andréa e também do Marcos Saes. É sempre um prazer estar aqui compondo esse momento de discussão de um tema tão importante para o Brasil, um tema tão importante para a indústria nacional.
Eu vou iniciar aqui o compartilhamento de uma apresentação, só um momentinho. (Pausa.)
Aqui a ideia é a gente passar uma ideia geral do que é o licenciamento ambiental para a gente começar a elaborar um racional durante a nossa apresentação. E, logo na sequência, a gente faz a referência internacional, um trabalho que a CNI executou em termos de comparativo com os países do G7 para saber como esses países têm tratado a questão do licenciamento ambiental, quais seriam as boas práticas, enfim, fazer um comparativo para entender como esse licenciamento ocorre nesses países mais desenvolvidos, o que a indústria defende e, por fim, a gente passaria por um apanhado geral sobre o Projeto de Lei 2.159, o antigo 3.729, já na Câmara dos Deputados.
Aqui a ideia é pegar também um gancho da fala do José Carlos. A partir do momento em que a gente entende que o licenciamento ambiental é um dos instrumentos de gestão, então, assim como a gente precisa compor e entender também que existem outros, como, por exemplo, os instrumentos de planejamento, muito direcionados ao zoneamento ecológico e econômico, não só um lado da moeda quando a gente fala de controle e comando, mas, também, da questão dos instrumentos econômicos, enfim, o cadastro técnico federal, ou seja, tratar a política nacional do meio ambiente de uma forma muito mais ampla, não só apenas com o foco no licenciamento ambiental, mas, para que a gente tenha todo esse cuidado, a gente precisa também considerar todos os instrumentos no conjunto.
O que é o licenciamento ambiental de uma forma bem resumida, de uma forma bem simplificada? É um procedimento administrativo por meio do qual o órgão ambiental competente autoriza a localização, instalação, ampliação e operação de empreendimentos e atividades. Então, aqui é muito importante também deixar claro quem precisa fazer: são as atividades que utilizam recursos ambientais e podem ser consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras; além disso, as atividades que podem causar a degradação ambiental. Então, é muito importante a gente entender e ter clareza desse contexto de quem está sujeito ao licenciamento ambiental.
Aqui é apenas para ressaltar a importância de uma pesquisa que a CNI realizou recentemente, direcionando o licenciamento ambiental principalmente nos órgãos estaduais e municipais, quase 90%. Então, hoje, o licenciamento ambiental está muito mais presente tanto no Estado quanto no Município, apenas uma pequena parte, as grandes obras, no âmbito federal.
Aqui, como é feito? Basicamente o licenciamento ambiental no Brasil, o chamado licenciamento trifásico, inicia-se com a licença prévia, em que se aprova a localização, concepção da atividade, empreendimentos, atestando também a viabilidade ambiental; seguindo com a licença de instalação, na qual é autorizada a instalação da atividade ou do empreendimento; e a licença de operação, em que começa a funcionar.
Aqui alguns gargalos que já foram citados na fala anterior, mas eu gostaria aqui de ressaltar também por que, hoje, o licenciamento ambiental é tão importante para a segurança jurídica, é importante para a atração de investimentos, é importante, também, para um melhor ambiente de negócios.
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Então, de certa forma, o que identificamos aqui é o excesso de procedimentos burocráticos e superposição de competências, uma complexidade regulatória, ou seja, um conjunto enorme, um arcabouço enorme de atos normativos e insegurança jurídica, mesmo após a licença ambiental, falta de clareza de procedimentos e atuação discricionária e condicionantes fora do escopo não relacionadas ao projeto, não relacionadas aos estudos de impacto ambiental, o que a gente vai poder explorar um pouquinho mais à frente.
Aqui a gente já inicia na referência internacional com alguns comparativos, principalmente um dos pontos-chave, um dos pontos mais importantes desse comparativo, que é o licenciamento simplificado. Isso é praxe, isso acontece em todos esses países. A ideia aqui é que você gaste a energia, gaste os recursos e também o recurso de pessoal para aqueles empreendimentos muito mais complexos. A mesma licença é usada desde a concepção até a operação do empreendimento. E aqui, no Brasil, a gente trabalha com as três licenças, como a gente viu ali anteriormente. A validade da licença e a renovação, no caso da validade, é indeterminada. E aqui, no Brasil, ela tem prazo de validade e deve ser renovada. No caso da renovação da licença, a renovação é necessária somente se você alterar alguma questão relativa ao empreendimento, ao projeto. E aqui, no Brasil, você tem ali uma necessária após o vencimento ou para alteração de processos, ampliação, entre outros.
Aqui uma das partes mais importantes na minha percepção também, são os bancos de dados. Há um investimento muito grande nessa parte de banco de dados, principalmente para compartilhar, ou seja, se você já tem estudos de uma área, de uma localização e chega um novo empreendimento solicitando licenciamento ambiental, você economiza essa etapa, ou seja, você economiza recurso, você economiza tempo, você economiza tempo também do servidor público. E aqui, no Brasil, a gente ainda está caminhando, acho que há um grande espaço ainda para a gente ocupar, o que a gente identificou é uma falta de base de dados que facilite o aproveitamento das informações já produzidas.
Aqui é a questão da descentralização, cada vez mais Estados e Municípios licenciando. E aqui, no Brasil, a partir da LC 140, a gente já começa a ter essas definições dando mais segurança jurídica também a partir da competência dos Estados e Municípios.
Aqui é só a percepção, porque o licenciamento ambiental é muito importante para o empresário brasileiro, o licenciamento ambiental precisa cumprir o seu processo de uma forma mais eficiente. E 95,4% consideram o licenciamento ambiental importante para a conservação do meio ambiente - essa foi uma pesquisa feita com os industriais. No entanto, 84% também entendem que o licenciamento ambiental ajuda na melhoria da qualidade da gestão ambiental do seu empreendimento, 65% consideram que o licenciamento ambiental não é apenas mais uma forma de arrecadação de tributos do Estado, ou seja, todos consideram a importância do licenciamento ambiental, mas ele não está rodando da maneira que deveria, incorrendo em insegurança jurídica, em questões burocráticas, numa dificuldade também relacionada a custos.
O que a indústria defende? Num primeiro ponto, é desburocratizar o licenciamento de empreendimentos e as dificuldades consideradas de baixo impacto ambiental, ou seja, trazer a questão do licenciamento simplificado e gastar realmente energia naqueles licenciamentos mais complexos; definir modalidades diferenciadas de licenciamento que sejam aplicadas às diversas classificações do empreendimento e das atividades, ou seja, o aperfeiçoamento também dos processos; padronizar e estabelecer critérios de qualidade para termos de referência -aqui é uma questão bastante importante, a padronização desses TRs -; garantir a autonomia do órgão licenciador como condutor do processo de legislação do licenciamento, ou seja, estabelecer aqui a governança, estabelecer também a liderança do processo; que as condicionantes guardem relação com os projetos e também com os estudos; disciplinar a atuação dos intervenientes, Funai, Iphan, Fundação Palmares e ICMBio, com competências claras, definindo limites, prerrogativas, as manifestações e também os prazos; melhorar a estrutura dos órgãos ambientais e intervenientes, também trazendo a fala do José Carlos, da importância de se fortalecer institucionalmente esses órgãos.
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Aqui a gente já entra no PL. A grande questão é que hoje não temos uma lei geral, acho que esse é o principal ganho quando a gente fala da aprovação de um projeto de lei sobre licenciamento ambiental e, também, não é interessante que a gente exclua qualquer tipo de atividade, até porque é uma lei geral e, dessa forma, a gente estaria incorrendo e ferindo princípios como isonomia, razoabilidade e proporcionalidade, que existem para qualquer restrição ao direito fundamental e de livre iniciativa a ser válida.
Estou falando aqui da exclusão do setor de mineração. A gente entende que a lei vale para todos, uma lei geral, então, não faz nenhum sentido que a gente tenha qualquer tipo de exclusão, até porque nisso ocorreria insegurança jurídica, mas o PL também estabelece diretrizes para o licenciamento ambiental, vinculando ao objetivo da conservação e, também, para as atuais e futuras gerações. Além disso, atualiza e introduz novos conceitos como tipologia, natureza, porte, potencial poluidor.
A participação pública, a gente amplia também a participação pública criando três novas modalidades - consulta pública, reunião participativa e tomada de subsídios técnicos -, traz também a referência aos bancos de dados, tornando obrigatória a inclusão dos conteúdos, dos estudos de impacto e dos demais estudos e informações no sistema nacional, isso vai proporcionar também mais agilidade, compartilhamento de dados, redução de custos, redução de tempo, redução também do tempo do próprio servidor público, a partir do momento que você começa a compartilhar todo tipo de informação.
Aqui a figura do licenciamento simplificado, incorpora novas modalidades, a bifásica, a fase única por adesão e compromisso e operação corretiva.
A validade das licenças, que são criadas para 10 anos e, aqui, uma referência, o licenciamento por adesão e compromisso, que está condicionado ao atendimento de três exigências cumulativas, não é um licenciamento como muitos falam, em termos de ser autodeclaratório, ele tem que cumprir algumas etapas, alguns critérios, ou seja, atividades e empreendimentos que não sejam potencialmente causadores de significativa degradação do meio ambiente, sejam conhecidas as características das reuniões, as condições de instalação e operação, impactos ambientais e medidas de controle ambiental, não ocorra a supressão de vegetação nativa, ou seja, não é simplesmente um licenciamento autodeclaratório, ele precisa cumprir as etapas, ele precisa cumprir condicionantes e, além disso, também, ele está sujeito à fiscalização.
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Aqui a dispensa de licenciamento. Ele aumenta e define melhor as hipóteses de dispensa de licenciamento ambiental, especialmente aquelas de interesse público com obras de intervenção emergenciais, de respostas a colapsos de obras de infraestrutura, acidentes, desastres ou para prevenir tais eventos e o PL também apenas cria a possibilidade de dispensa. O ponto central desse texto é que o órgão licenciador segue sendo o responsável por definir quem pode ser dispersado, é a autonomia do órgão licenciador.
As condicionantes também, aquelas estabelecidas em virtude de não possibilidade de prevenir, minimizar e compensar os impactos ambientais negativos, que não poderão obrigar o empreendedor a manter ou operar serviço de responsabilidade do poder público, ou seja, isso é responsabilidade do próprio Estado e não do empreendedor.
O poder decisório, trazendo aqui os elementos da LC 140. Então, compete aos órgãos licenciadores o poder decisório sobre o licenciamento ambiental, uma vez que possuem o corpo técnico adequado para mensurar as características do empreendimento, os seus impactos e, portanto, capacidade também para decidir sobre a sua viabilidade ambiental.
Manifestação das autoridades envolvidas, aperfeiçoa também a tramitação perante as autoridades envolvidas. Essa participação passa a ser não vinculante e, com isso, ele passa a não travar também o andamento do processo, mas sempre levando em consideração, havendo essa manifestação, numa fase em que estiver o processo no momento posterior.
Aqui algumas boas práticas. Você contemplar aqueles empreendedores que estão fazendo mais do que a lei determina, então, você precisa criar também esse estímulo e também os prazos de análise, definindo novos prazos para emissão das licenças.
Então, eu fico por aqui. Agradeço muito a oportunidade de estar podendo dar publicidade ao que a indústria entende, ao trabalho que a indústria vem fazendo em termos de identificar quais são os gargalos do licenciamento ambiental. Precisamos urgentemente resolver essa questão para que a gente possa atrair mais investimentos, para que a gente possa dar mais segurança jurídica, para que a gente possa proporcionar um melhor ambiente de negócios, gerando renda, gerando receita, gerando emprego e fazendo também o Brasil crescer.
Agradeço mais uma vez a oportunidade e fico à disposição.
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Obrigado, Sr. Davi Bomtempo, pela sua exposição.
Eu convido, agora, a Sra. Andréa Zhouri.
V. Sa. tem 20 minutos para sua exposição, com a palavra.
Muito obrigado.
A SRA. ANDRÉA LUISA ZHOURI LASCHEFSKI (Para expor.) - Bom dia, bom dia a todas e todos. Meu nome é Andréa Zhouri, eu sou professora titular da Universidade Federal de Minas Gerais e estou representando, nesta audiência, a Associação Brasileira de Antropologia.
Agradeço a oportunidade, em nome da associação, e tenho, então, essa honrosa tarefa, muito difícil inclusive, de apresentar uma perspectiva do acúmulo de trabalhos e pesquisas realizados por antropólogos e antropólogas ao longo de várias décadas, em várias gerações, que têm trabalhado, pesquisado e produzido conhecimento sobre o processo de licenciamento de grandes obras, sobretudo seus efeitos, suas consequências nos territórios, como disse o ex-Ministro José Carlos Carvalho.
Então, eu vou esmiuçar um pouco alguns problemas que nós temos enfrentado. E vemos, com bastante preocupação, o novo PL como possibilidade de agravamento dessas situações.
Eu tenho aqui uma apresentação de PowerPoint, e eu vou pedir licença para compartilhar a tela.
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Vocês estão me vendo? Vendo a tela? (Pausa.)
Alô! A tela está sendo vista?
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Está o.k.
A SRA. ANDRÉA LUISA ZHOURI LASCHEFSKI - O.k.
Nós elaboramos este PowerPoint, que, na verdade, sintetiza...
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Sra. Andrea, só um minutinho. (Pausa.)
Parece que a senhora não deu entrada na exposição ou, pelo menos, não está registrada a entrada na sua tela.
A SRA. ANDRÉA LUISA ZHOURI LASCHEFSKI - Eu estou compartilhando a minha tela.
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Porque aqui está tudo branco. Eu não sei se falta algum toque de disparo...
A SRA. ANDRÉA LUISA ZHOURI LASCHEFSKI - A gente fez o teste anteriormente. Vocês estão vendo alguma foto, alguma coisa?
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Nada, nada.
A SRA. ANDRÉA LUISA ZHOURI LASCHEFSKI - Nada?
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - O que está aparecendo aqui...
A SRA. ANDRÉA LUISA ZHOURI LASCHEFSKI - "Você está compartilhando a tela"... Então houve alguma incompatibilidade? (Pausa.)
Um momento.
E neste momento estão vendo?
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Ainda não. A orientação que eu estou recebendo aqui é que a senhora precisa fechar todas as janelas do seu computador e só deixar aberta a janela que a senhora deseja compartilhar.
A SRA. ANDRÉA LUISA ZHOURI LASCHEFSKI - Certo. Estou fazendo, então, o compartilhamento de tela... O compartilhamento de tela... Está agora?
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Olha, aqui não está entrando, então nós vamos fazer a seguinte opção: como nós temos a sua apresentação aqui conosco...
A SRA. ANDRÉA LUISA ZHOURI LASCHEFSKI - Mas eu preciso da dinâmica da apresentação. Só um minuto, por gentileza. Eu não estou entendendo, porque fizemos o teste anteriormente e ele... Eu vou só sair do compartilhamento.
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Pois não!
A SRA. ANDRÉA LUISA ZHOURI LASCHEFSKI - Um momentinho. Há um quadro branco aqui que realmente não havia anteriormente. Eu quero compartilhar...
Agora funcionou? (Pausa.)
Eu não sei por que... Compartilhamento...
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - A senhora acha muito ruim... Repare, é óbvio que nós podemos esperar. A outra alternativa seria... (Pausa.)
Olhe, eu queria ponderar o seguinte: para facilitar, nós colocaríamos na tela, e evidentemente que a senhora, a cada momento, teria que dizer "próximo" para que pudéssemos sequenciar.
A SRA. ANDRÉA LUISA ZHOURI LASCHEFSKI - Sim.
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Como, em geral, a gente faz quando está alguém a distância controlando. A menos que a senhora... O pessoal acha que a senhora pode estar tentando compartilhar numa janela errada. Eu não sei se é isso.
A SRA. ANDRÉA LUISA ZHOURI LASCHEFSKI - Eu desliguei todas as janelas, eu apaguei todas as janelas... Só mais uma última...
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Tentativa.
A SRA. ANDRÉA LUISA ZHOURI LASCHEFSKI - Ele está vindo com uma proposta... Por favor, você pode me ajudar? Há um box, Google - não é nada disso -, um básico... Mas não é esse quadro branco, eu não sei por quê! Compartilhar... Eu não sei por que está aparecendo esse quadro branco.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. ANDRÉA LUISA ZHOURI LASCHEFSKI - A apresentação está... Um momentinho, por gentileza. Agora ela está aqui.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. ANDRÉA LUISA ZHOURI LASCHEFSKI - Sim, está aberta. E agora eu posso minimizar.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. ANDRÉA LUISA ZHOURI LASCHEFSKI - Deixo aberta. Eu vou aqui e faço o compartilhamento...
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Olhe, está aqui. Agora ela apareceu. Desculpe, Senadoras e Senadores. Agora está...
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Está o.k. Agora a senhora pode sequenciar. Eu zerei esse tempo que nós perdemos com essa dificuldade tecnológica. Pode ficar tranquila, a senhora terá o tempo normal dos 20 minutos.
Pronto. Agora a senhora já está.
A SRA. ANDRÉA LUISA ZHOURI LASCHEFSKI - Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - De nada.
A SRA. ANDRÉA LUISA ZHOURI LASCHEFSKI (Para expor.) - Nós examinamos a nova proposta de Lei Geral do Licenciamento Ambiental e elaboramos uma nota técnica, que foi encaminhada tanto ao Congresso - a versão anterior - quanto, agora, ao Senado, material esse que eu espero que vocês possam avaliar.
O que eu faria aqui é uma síntese, em poucos minutos, nestes 20 minutos, dessa análise criteriosa que nós fizemos, abordando apenas alguns aspectos críticos para o debate, para essa discussão.
De antemão, eu devo dizer que nós avaliamos com muita preocupação esse PL, porque consideramos que ele, de fato, representa não um aprimoramento do licenciamento, como deveria, mas um retrocesso na política ambiental brasileira.
Eu vou tentar ser objetiva e direta, porque a situação é grave e exige, dessa forma, que não haja maiores rodeios.
Nós compreendemos, de fato, Senadores e Senadoras, que esse projeto de lei normatiza determinados procedimentos que consideramos falhos no atual processo de licenciamento ambiental e que nós avaliamos que serão convertidos, na verdade, essas exceções, em norma por meio desse novo projeto de lei.
Esses cinco pontos críticos que a gente traz aqui eu vou tentar mostrar, a partir das experiências empíricas e vivências nos territórios, da realidade vivida no Brasil. Não dá para a gente comparar com o G7, com países do Norte, nós temos uma outra realidade aqui. O que nós temos são casos em que a inobservância das regras do licenciamento, como existe hoje, gerou de fato efeitos indesejáveis e, muitas vezes, desastrosos para o meio ambiente e para as parcelas significativas da população brasileira.
Estes são os cinco eixos que eu gostaria de destacar.
O primeiro deles é o comprometimento das análises técnicas e da participação da sociedade. A análise técnica e a participação estão comprometidas, por exemplo, pela criação de novas modalidades de licenças, como o autolicenciamento, o Licenciamento por Adesão e Compromisso, e as licenças simplificadas e concomitantes. Além disso, o PL flexibiliza a exigência ou extingue a necessidade de estudos ambientais para uma gama de empreendimentos que são, de fato, potencialmente muito danosos ao meio ambiente e à sociedade. Ele não prevê audiências públicas, em muitos casos, e cria uma modalidade de audiência remota, o que, no contexto brasileiro, de fato, acaba por excluir grande parte da população sobretudo atingida pelas obras, além de não possibilitar o controle social efetivo, que é aquele controle que vai além da participação protocolar, que é o controle capaz de trazer, realmente, inputs e contribuições para avaliação dos impactos socioambientais dos empreendimentos.
Ainda nesse eixo um, o PL apresenta ritos processuais indefinidos, jogando para Municípios e Estados, por exemplo, a prerrogativa de construir classificações de risco dos empreendimentos variadas, algo que, com certeza, pode gerar conflitos entre os entes federativos, criando ambiente de incerteza jurídica, que não é boa para os negócios nem para a economia do País. Portanto, a gente considera, popularmente falando, se me permite, um tiro no pé.
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Eu trago, a seguir, alguns exemplos da realidade.
Começo por questionar a ideia da adesão e compromisso das empresas, o autolicenciamento.
O Licenciamento por Adesão e Compromisso revela um excesso de confiança nos dados apresentados pelas empresas, e essa confiança vai na contramão de muitos dos casos com os quais nós temos lidado, na realidade, como os recorrentes desastres da mineração, em Minas Gerais e também no Pará.
Mais do que confiança exagerada nas empresas, vemos o Estado renunciando ao seu papel de regulação, pois o autolicenciamento expressa uma transferência do dever constitucional do Estado para as empresas privadas.
Caras Senadoras e Senadores, a realidade de Mariana e Brumadinho, de onde eu falo, pedem justamente o contrário: mostram a necessidade de o Estado agir pela precaução e pelo controle ambiental.
A própria CPI de Brumadinho e outras Barragens concluiu que houve interferências indevidas na formulação de laudos técnicos por parte da mineradora. Esses desastres crimes não podem ser ignorados; devem nos servir ao menos de lição. Vidas foram ceifadas e continuam sendo ceifadas.
Eu trago esse exemplo, não é porque as mineradoras fazem o autolicenciamento, mas pelo excesso de confiança, na verdade, pelo automonitoramento, pelos laudos de autofiscalização que são apresentados pelas próprias empresas.
Outro exemplo significativo das mudanças são as licenças simplificadas para empreendimentos erroneamente considerados menos complexos, como é o caso das rodovias, das linhas de transmissão, os empreendimentos considerados lineares. Vejam, esses empreendimentos são altamente impactantes e produtores de efeitos diversos. Eles atravessam comunidades tradicionais, comunidades rurais, comunidades indígenas; promovem todo tipo de afetação, como é o caso, por exemplo, dos minerodutos. Nós temos aqui o Minas-Rio, que é um projeto que atravessa 32 Municípios e centenas de comunidades. As comunidades ali vivem uma situação de privação de água, privação hídrica e vários problemas pela instalação desses empreendimentos. Há também um caso paradigmático que a gente traz aqui, o da BR-163, sobretudo no trecho Cuiabá-Santarém, que atravessa terras indígenas, unidades de conservação; apresenta focos de pressão de madeireiros, garimpeiros. Então, notamos o acirramento de conflitos por conta da apropriação ilegal de terras, oscilação do desmatamento, aumento de risco de incêndios florestais, aumento de processos de grilagem e especulação imobiliária.
Esta imagem de satélite que estou mostrando já é bastante conhecida e revela o desmatamento conhecido como "espinha de peixe", que ocorre perpendicularmente no traçado das rodovias.
A população tende a se fixar às margens dos eixos rodoviários, avançando gradualmente em direção à floresta, atravessando terras indígenas e fomentando conflitos socioambientais de alta complexidade.
Portanto, são empreendimentos de alta complexidade, como estou dizendo, que não podem ser licenciados de maneira simplificada, sem estudos de impacto ambiental que levem em consideração toda essa dinâmica que o empreendimento acaba produzindo.
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O segundo eixo crítico refere-se à exclusão de empreendimentos degradadores da lista obrigatória do licenciamento ambiental. A lista contempla mais de uma dezena de empreendimentos, mas vou citar apenas três exemplos aqui, que são os cultivos agrícolas, os empreendimentos de caráter militar e as obras emergenciais.
Em relação aos cultivos agrícolas, há, inclusive, uma imprecisão no PL. Não se sabe se serão todos os empreendimentos agrícolas ou apenas os agroindustriais e quais agroindustriais. Enfim, não há uma especificação.
Neste caso, eu trouxe o exemplo de uma comunidade quilombola que, além de encurralada por uma monocultura de cana de açúcar, vem sendo exposta à contaminação pela aplicação de defensivos agrícolas por parte da empresa. Esse caso nos ajuda a ponderar, a questionar a impropriedade do argumento, que já foi dito aqui na primeira audiência, de que, uma vez registrado o defensivo agrícola na Anvisa, não haveria necessidade de licenciamento ambiental. Vejam, uma coisa é o registro do agrotóxico, do produto na Anvisa; outra coisa é a forma como esse produto é aplicado, onde é aplicado, de que forma é aplicado. Isso exige acompanhamento, avaliação e controle ambientais.
No caso da isenção para atividades militares, eu gostaria de lembrar aqui que a base da Aeronáutica fica em Alcântara, no Maranhão, um projeto que foi instalado, em 1983, sem licenciamento ambiental, e que desalojou mais de 300 famílias, as quais não foram indenizadas até a presente data, mais de 40 anos depois. Há vários problemas relacionados às comunidades quilombolas dali que foram e são privadas de seus recursos naturais, como os recursos pesqueiros, e também da realização de seus rituais religiosos.
Sobre as obras emergenciais, aqui em Minas Gerais, também, nós temos vários exemplos, estamos aqui sendo ameaçados por várias rupturas de barragem. Há uma movimentação muito grande em torno da Região Metropolitana de Belo Horizonte, com obras de contenção, populações sendo desalojadas - não se sabe ao certo -, obras incidindo sobre recarga hídrica, sobre áreas de preservação permanente. Então, há de haver um regulamento para isso, não se pode simplesmente abrir mão do licenciamento e da análise técnica sobre essas intervenções.
O terceiro ponto é o subdimensionamento dos impactos.
Eu vou avançando, então, aqui na apresentação.
Esse subdimensionamento é um dos principais problemas do licenciamento ambiental hoje. E a nova lei, no nosso entendimento, vai acirrar, na verdade, esse problema, pelo menos em três dimensões: primeira dimensão, a nova lei apresenta uma definição restritiva da área de influência direta do empreendimento, uma definição construída a partir da necessidade das obras, dos empreendedores, e não a partir daquilo que realmente já existe nos lugares, nos territórios, na realidade ambiental e social dessas localidades; segunda dimensão, a nova lei também apresenta uma definição de impacto bastante reduzida da que existe hoje, excluindo, por exemplo, os efeitos sobre a saúde, o bem estar, as condições estéticas, sanitárias, a cultura e o modo de vida da população; e, por último, terceira dimensão, ela submete a elaboração de condicionantes à comprovação do nexo causal, uma lógica que inverte e subverte completamente o princípio da precaução, colocando o ônus da prova, inclusive, nas vítimas.
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Essa discussão sobre subdimensionamento das obras é bastante técnica e complexa. Eu infelizmente não terei tempo para desenvolvê-la a contento - e me permito modestamente sugerir de novo a leitura da nossa nota técnica, que é bastante minuciosa em relação a esse aspecto -, mas eu vou mencionar apenas dois exemplos aqui, tomando o caso das hidrelétricas, das consequências que o subdimensionamento dos impactos causa na realidade das pessoas.
O primeiro exemplo de hidrelétrica aqui em Minas Gerais é o caso da Hidrelétrica de Irapé, no Vale do Jequitinhonha. Ela foi inaugurada em 2005, afetou sete Municípios, desalojou 1.124 famílias, que são aquelas famílias que estavam na área do alagamento, do reservatório, mas todas as famílias, as comunidades a jusante da barragem não foram reconhecidas como atingidas, no entanto elas foram submetidas a um deslocamento forçado, que a literatura antropológica internacional chama de deslocamento in situ, porque permaneceram ali naquele lugar, mas o lugar está completamente modificado, foi drasticamente alterado, comprometendo sua reprodução social e suas estratégias de vida. De fato, essa população vive um contexto de insegurança administrada pela barragem que controla a vazão do rio, perdeu a agricultura da vazante, por exemplo, e está submetida a uma insegurança alimentar, provocada pela construção da barragem.
Da mesma forma, o outro exemplo é da Amazônia, já dito aqui, o de Belo Monte. A população que vive na Volta Grande do Xingu, uma área que sofreu uma redução drástica da vazão do rio, são dezenas de grupos de pescadores, de comunidades tradicionais e indígenas que vivem esse deslocamento in situ, com a perda da soberania alimentar, do modo de vida, uma população colocada em processo de vulnerabilidade pela construção da barragem, pelo funcionamento da barragem, porque até mesmo encontramos hoje, há registros de casos de espécies de peixes que estão com má-formação. Um verdadeiro histórico, então, esse caso de Belo Monte, de violação do direito humano à moradia, do direito humano à alimentação.
Eu entro, então, falando em direitos humanos e na violação de direitos no quarto item, que é a ameaça aos direitos de povos indígenas e comunidades tradicionais.
Nesse eixo, então, ao analisarmos o PL, nós verificamos que a previsão de licenciamento ambiental ocorre apenas nos casos em que o empreendimento envolver terras tituladas e demarcadas, no caso de populações indígenas e comunidades quilombolas. Essa proposta compromete ao menos 40% da existência dos povos indígenas do Brasil e, no caso os quilombolas, ainda pior, mais de 90%, porque, das duas mil e oitocentas e poucas comunidades quilombolas estimadas no Brasil, somente 154 tiveram suas terras tituladas. Então, é uma ameaça essa definição e, além de tudo, o PL não prevê a consulta livre, prévia e informada, conforme determina a Convenção 69, da OIT, da qual o Brasil é signatário, uma consulta nos termos das próprias comunidades.
Então, o comprometimento aos direitos da população brasileira é mais geral no PL, mas ele é especificamente preocupante no caso desses grupos, que já são bastante vulnerabilizados em sua cidadania, embora formalmente eles estejam submetidos a um regime especial de direitos, conforme listados aqui nesse eslaide, nesse conjunto de leis, assim também como existem os tratados internacionais assinados pelo Brasil, como esses listados aqui.
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Esse último eixo, o eixo cinco, são tratados mais abrangentes, reconhecido pela comunidade internacional, tal como a Convenção Americana sobre Direitos Humanos de 1969, o Marco de Sendai para Redução do Risco de Desastres 2015-2030, para ficar só nesses dois exemplos.
Então, gostaria de lembrar ainda que o Brasil é signatário de acordos internacionais que asseguram padrões de boas práticas para os setores financeiros e empresariais, e essa nova lei do licenciamento ambiental também compromete esses acordos internacionais, como já temos presenciado, em termos de pressões internacionais, sobre a falta de uma política ambiental mais incisiva do Brasil nos últimos tempos.
Por fim, avançando, então, aqui, nessa análise, eu gostaria de ressaltar que, em vários aspectos, o PL configura, no nosso entendimento, violação aos direitos constitucionais do País, sobretudo no que se refere aos arts. 231, 232, 216, 225, 6º. É importante a gente lembrar que esse projeto de mudança do licenciamento acompanha outras propostas atualmente de mudança na regulação ambiental brasileira - ele não está isolado -, e isso constitui um processo efetivamente de desmanche e desregulação ambiental que temos visto sendo analisados por vários de nós, vários pesquisadores.
Os setores da economia que defendem a nova lei do licenciamento ambiental com o propósito de conferir maior celeridade e desburocratização do rito licenciador, como já foi dito aqui, alegam a dimensão do tempo excessivo e dos altos custos do licenciamento ambiental. Contudo, nossas pesquisas empíricas, pesquisas nos territórios em diferentes Estados do Brasil, permitem avaliar que a morosidade, quando ela existe, não ocorre tanto em função da arquitetura do atual licenciamento - obviamente pode ser melhorado, tendo em vista o objetivo realmente de preservação ambiental e cuidado com a população -, mas a morosidade ocorre em função de dois fatores interligados.
De um lado, os ritos não são integralmente cumpridos de forma adequada por setores interessados no licenciamento ambiental, que enxergam o licenciamento ambiental, como já foi dito aqui pelo José Carlos Carvalho, como um balcão de retirada de licença, o empecilho que tem que ser vencido no caminho. Não raro, então, dentro dessa concepção, os estudos de impacto ambiental não apresentam a qualidade necessária, o que exige dos órgãos ambientais análises reiteradas e solicitações de complementação de estudos, processo - esse, sim - que acaba delongando o licenciamento ambiental, considerado, então, como eu disse, uma mera formalidade por essa cultura empresarial brasileira, lamentavelmente.
De outro lado - o aspecto complementar a esse -, é que os órgãos ambientais foram sucateados ao longo dos anos, o corpo técnico é diminuto, os salários são defasados, há a falta de equipamentos apropriados para execução da política ambiental, como, por exemplo, as vistorias in loco, mas o novo projeto de lei não vai alterar substantivamente essa situação.
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Isto que a gente avalia, concluindo aqui: não vai alterar essa situação, mas ele pode acirrar os conflitos, provocar uma judicialização e abalar de fato a confiabilidade internacional do País para os investimentos, sobretudo internacionais. Não é bom para o meio ambiente, para a população e para a economia. Lamentavelmente eu tenho dito isto bastante claramente, é meu dever de ofício, é meu dever moral, é meu dever profissional dizer isto: ele não é bom nem para o meio ambiente nem para a população, não é bom para a economia do País.
Temos consciência de que existem interesses divergentes que produzem tensões no campo ambiental, mas nós entendemos também que há uma cultura de negociação de interesses que prevalece nesta nossa sociedade de mercado. Contudo, devemos igualmente reconhecer que, antes dos interesses setoriais, existem direitos, e direitos que vão além dos direitos civis: direitos que envolvem os direitos humanos, coletivos, os direitos diferenciados de cidadania, muitos dos quais não são negociáveis. A gente espera que o Senado avalie com muita atenção essa lei e que ela não seja aprovada da forma como está sendo proposta.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Obrigado, Sra. Andréa Zhouri.
Eu agradeço a sua exposição e passo a palavra agora ao Sr. Marcos Saes, para a sua fala. V. Sa. tem vinte minutos para exposição.
Muito obrigado.
O SR. MARCOS SAES (Para expor.) - Muito obrigado, Senador Jaques Wagner, que está cumprindo brilhantemente os trabalhos também na Comissão. Como já dito pelos que me antecederam, é um prazer muito grande para nós que militamos com a questão de licenciamento verbal no nosso dia a dia poder participar deste momento tão importante, que é a discussão e o debate da lei geral do licenciamento ambiental, já ocorrida, à saciedade, na Câmara dos Deputados, e que agora vem ocorrendo aqui no nosso Senado Federal, o que demonstra a importância e a relevância do assunto. Então, parabenizo o nosso Senado por estar dando tanta importância a esse tema, que efetivamente é de extrema importância.
Gostaria de dizer também que estou aqui representando a Câmara Brasileira da Indústria da Construção. A Cbic teve um papel também muito atuante na Câmara dos Deputados durante os debates dessa questão, participamos das audiências públicas na Câmara, participamos no dia em que o Plenário da Câmara virou Comissão geral.
Esta é uma questão importante, Sr. Presidente, que este processo está, sim, tendo uma participação popular muito efetiva. O que nós temos que diferenciar é que muitas vezes os que discordam do texto que acaba sendo aprovado alegam que não há participação popular, que o texto é novo, que o texto é desconhecido - a própria realização dessas audiências demonstra muito isso.
A Cbic tem se feito muito presente. Nós temos feito eventos regionais, já fizemos, enquanto o projeto tramitava na Câmara dos Deputados, convidando uma série de Parlamentares. Faremos novamente eventos em todas as regiões do nosso País, convidando os ilustres Senadores, para que aprofundem o seu conhecimento nessa questão. Estamos nos colocando à disposição também com o apoio técnico para a Senadora Kátia Abreu, que é a Relatora do presente projeto.
Acho que é uma coisa muito importante, e me parece que é o pensamento de todos aqui: a vinda da lei geral do licenciamento público por si só não vai resolver todos os problemas do licenciamento ambiental.
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Pensar que a simples vinda de uma lei resolve tudo é quase uma ingenuidade, e acho que ninguém, em sã consciência ou que conhece a realidade, faça a defesa. Agora, a vinda de uma lei geral do licenciamento ambiental é, sim, um belo começo. Nós temos, no âmbito federal e estadual, mais de 50 mil normas tratando de questões ambientais. É um desafio hercúleo para quem lida com as questões ambientais - e aqui estou falando para os empreendedores, para quem faz estudo técnico e ambiental, os consultores, para os servidores dos órgãos ambientais e para o próprio Ministério Público, que é fiscal da lei - entender esse emaranhado de nós. Por isso que a vinda - e aqui não é mais uma norma - de uma lei geral que visa a uniformizar o tratamento dessa questão de norte a sul, de leste e oeste do nosso País é extremamente importante, até porque, me valendo especialmente da fala anterior da Professora Andréa, todos os exemplos citados de que o licenciamento ambiental brasileiro não anda num bom caminho são da legislação atual, agora.
Então, me parece no mínimo um antagonismo você, por exemplo, citar Brumadinho e Mariana, que não são muito certos com a legislação atual, nesse emaranhado de 50 mil normas, e, agora, quando há a possibilidade de uniformizar tudo isso, de modernizar tudo isso, virem críticas citando o atual momento, quer dizer, com o devido respeito - e isto é democracia, poder concordar e discordar -, o sistema atual não é bom, por isso precisamos avançar. Essa é uma questão extremamente importante.
Uma outra questão. Fala-se de sustentabilidade, sustentabilidade, hoje se fala muito em ESG: sustentabilidade é dar o mesmo peso à questão ambiental, social e econômica. Pobreza não traz meio ambiente ecologicamente equilibrado. Isso é um fato, é só ir nas grandes cidades e entender as invasões. A gente fala muito aqui - e a Cbic representa as Ademis nos rincões do Brasil -, essas entidades fazem o desenvolvimento sustentável no nosso País ao licenciar loteamentos, ao fazer as incorporações, ao fazer as obras licenciadas. Invasões e depois ter que sair fazendo Reurb por aí para regularizar, isso não traz meio ambiente ecologicamente equilibrado, isso não traz renda, isso não traz sustentabilidade. Então, é importante a gente deixar claro, estamos falando aqui do mercado formal. Então, até por honestidade intelectual, é bom a gente deixar isto bastante claro: se a situação atual não é boa, que a gente avance. Acho que essa é a grande questão e por isso parabenizo as nossas Casas Legislativas, o nosso Parlamento por estar debatendo essa ideia.
Três pontos, Presidente, Presidentes de ambas as Comissões, aqui são muito importantes nesta hora.
O primeiro, como eu já disse: a gente tem um sistema hoje de licenciamento insano; são exigências, e exigências, e exigências. Esse sistema é engraçado; é um sistema cartorário, sim; eu tenho que ir ao órgão ambiental público e entrar numa fila de órgãos ambientais, sim - e concordo plenamente que hoje não têm a estrutura necessária. Os nossos governantes vão demonstrar efetiva preocupação com as questões ambientais, como aparelhar melhor os órgãos ambientais brasileiros. Acho que essa é uma luta muito grande da AMA, da Adema, do nosso próprio Ibama - e parabenizo já este momento, em que foi divulgado que vai haver a realização finalmente de concurso para o Ibama; isso é o Executivo demonstrar efetiva preocupação com as questões ambientais.
Pois bem, mas nós temos que evoluir também na sistemática, e esta lei - e aqui é outra coisa muito importante de ser dita -, a lei geral do licenciamento ambiental é uma lei procedimental, ela não altera o direito material ambiental.
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Então, quando falam: "Ah, vai ter mais supressão", não! É a regra do jogo de como fazer avaliação de impacto ambiental e de como se terem as licenças com as condicionantes necessárias.
O primeiro ponto importante que a lei vem trazer: ela traz uma simplificação. Quando se fala que se quer simplificar, que se quer desburocratizar, não se quer perder eficiência e eficácia dessa norma, quer, sim, ter uma simplificação. Isso ela faz. Ela faz porque, na verdade, Sr. Presidente, a lei compila as boas práticas que ocorrem nos órgãos ambientais mais avançados do nosso País. De fato, neste ponto, eu concordo: a lei inova muito pouco. Ela inova pouco, porque ela traz boas práticas. Então, o primeiro ponto muito importante que a lei geral do licenciamento ambiental vai fazer é uma simplificação. Isso é positivo.
Segundo ponto. Em âmbito federal, nós temos duas normas que tratam de licenciamento ambiental: a Resolução Conama 01/86 e a Resolução Conama 237/97. Já é um problema: as resoluções Conama fazendo vezes de lei geral. Aí começam aquelas falácias de que resoluções Conama têm força de lei, coisa que quem estuda Direito Ambiental sabe efetivamente que não o são.
Aqui, Sr. Presidente, outra questão importante: o Direito Ambiental - escrevi isto recentemente num artigo - é apaixonante, as discussões ambientais são apaixonantes, mas é dever de quem lida tecnicamente com a questão ambiental não lidar com paixões. O Direito Ambiental é uma ciência, avaliação de impactos ambientais é uma ciência, e nós devemos avaliar essas questões como ciência que o são, ou seja, eu tenho que simplificar, eu tenho que modernizar. A Resolução 01/86 tem 35 anos, a Resolução 237/97 tem 24 anos. É momento, ou melhor, já passou o momento! Quem olha a exposição de motivos do PL 3.729, da Câmara, de 2004, Sr. Presidente, já se dizia a necessidade de uma lei que viesse trazer modernização e trazer... Eu acho interessante as críticas às audiências públicas virtuais: nós estamos numa audiência pública virtual funcionando muito adequadamente. Se é caso, como disse a Professora Andrea, com muita propriedade, de participação de populações tradicionais...
E a OIT 169 só fala desse tipo de população. Está cheio de população tradicional hoje aqui do lado de grandes cidades. A gente conversa... Eu fiz uma audiência na Justiça Federal do Mato Grosso em que os índios participaram com o seu iPhone, participaram remotamente da audiência, e funcionou muito bem. Então, é somente realmente para aquelas populações que não têm possibilidade, quando, então, você faz também presencialmente ou híbrida, como é o caso da nossa audiência hoje aqui, nas duas Comissões.
Além de simplificar e modernizar, um ponto extremamente relevante, que já fere de morte uma das críticas que é feita ali... Eu ouço dizer: "Ah, essa lei vai causar uma guerra entre os Estados!". Isso é falácia! Essa guerra existe hoje, quando nós temos inúmeras - inúmeras - sistemáticas de licenciamento ambiental. Uma lei geral vai uniformizar no País todo as regras básicas e gerais do licenciamento ambiental.
Esses três pontos, Sr. Presidente, fatalmente, trazem uma segurança jurídica muito maior para todos os envolvidos no licenciamento ambiental e para se garantir todas as questões, inclusive, constitucionalmente trazidas para as questões ambientais.
Quero aproveitar a fala introdutória também para desmistificar algumas das críticas que, como disse, se forem críticas apaixonadas, ficam no campo da paixão. Quero tecnicamente desmistificar essas críticas. Primeiro, já disse, tem havido, sim, uma ampla participação popular no debate do projeto de lei tanto na Câmara e agora no Senado.
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Eu repito: discordar do texto aprovado é criticar a democracia, porque está tendo participação popular e está tendo a possibilidade... Na Câmara dos Deputados, foram cinco versões, nada menos que cinco versões, nove audiências públicas e a Comissão Geral.
Segundo ponto. A retirada... E aqui peço vênia ao ex-Ministro José Carlos para discordar. Eu vi com muito acerto, da quarta versão para a quinta versão, que foi aprovada, a retirada da avaliação ambiental estratégica. A avaliação ambiental estratégica não é licenciamento ambiental. É quase confundir institutos absolutamente diversos. Avaliação ambiental estratégica é instrumento de planejamento, que deve ser feito pelo Estado. Exigir isso dos empreendedores é subverter a lógica. O assunto da avaliação ambiental estratégica é tão importante que merece uma legislação própria e não ser confundido com o licenciamento ambiental. Portanto, ao contrário de quem critica, nós particularmente vemos com muito acerto tratar a lei geral de licenciamento ambiental de licenciamento ambiental e não da avaliação ambiental estratégica.
Segundo ponto. Com todo o respeito, e aqui me parece uma desinformação absoluta de quem chama LAC (licença por adesão e compromisso) de autolicenciamento. Eu espero que seja um desconhecimento, se não, é desonestidade. Licenciamento por adesão e compromisso não é autolicenciamento. E quem conhece a sistemática sabe disso. É matéria, inclusive, questionada no Supremo Tribunal Federal e em outras cortes de Justiça e mantida. A questão da LAC... Na Câmara dos Deputados, no dia do debate, Sr. Presidente, disseram que era uma inovação. Outra falácia! Dez Estados da Federação já praticam a LAC. Vou dar o que é, para mim, o melhor exemplo: o Estado de Santa Catarina instituiu a licença por adesão e compromisso para atividade de avicultura. Santa Catarina é o maior - vejo aqui o ilustre Senador Esperidião Amin, que é do Estado de Santa Catarina - exportador de aves do País. É uma atividade que o IMA, antiga Fatma, que é o órgão ambiental catarinense, licencia há 40 anos, conhece de trás para frente e de frente para trás. E passava por esse sistema cartorário...
O que é a LAC? É uma atividade de extremo conhecimento do órgão ambiental, que, ao saber dessa sistemática, de antemão, fixa as condicionantes ambientais. Um empreendedor passa a ter, sim, um maior protagonismo, mas ele não vem sozinho, ele vem acompanhado de alguém com formação técnica, que assina uma IRT, se adere a essa sistemática, se firma um termo de compromisso e se compromete a seguir as condicionantes ambientais que serão fiscalizadas pelo órgão ambiental, ou seja, é, sim, uma simplificação e uma modernização sem perder qualidade técnica no licenciamento ambiental. Um, LAC não é novidade; dois, a LAC, em Santa Catarina, somente para a questão da avicultura - e o órgão ambiental catarinense publicou isto -, reduziu em 20% o trabalho da diretoria de licenciamento ambiental.
Sr. Presidente, se os órgãos estão defasados e, sem diminuir a qualidade do licenciamento ambiental, se consegue liberar 20% do tempo do trabalho dos servidores da diretoria do licenciamento ambiental, isso é eficiência administrativa, princípio do Direito Administrativo, para que os servidores possam, sim, acompanhar, como bem trazido pela Professora Andrea, as obras de grande impacto ambiental, aquelas de que também o Davi, que me antecedeu, muito bem falou.
Segunda questão. Licença corretiva é algo que já acontece na maioria dos Estados. E que bom que está sendo regulamentada! Não querer que tenha licença corretiva é fechar os olhos para coisas que aconteceram no passado. E, se há a possibilidade de corrigir, que se corrija.
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O último ponto, esse talvez, sim, um pouco mais polêmico. Nós, como Cbic, nunca defendemos essas isenções de licenciamento ambiental, mas conseguimos entender a lógica. E quero deixar claro aqui: as isenções feitas por Estados, notadamente para atividades do agro, foram declaradas inconstitucionais pelo Supremo, isso é verdade, em mais de uma oportunidade. No primeiro - inclusive, um caso famoso no Tocantins -, à unanimidade, o Supremo disse que um Estado dispensar era inconstitucional. Qual é a diferença para cá? Duas diferenças básicas. O primeiro é que é a primeira vez que uma lei geral... E aqui estou na Casa Legislativa, V. Exas., uns especialistas, sabem muito bem a competência legislativa do art. 24 da Constituição: compete à União editar normas gerais, que é o que se está fazendo agora; aos Estados, é competência supletiva. Estado não pode usar isenção do licenciamento ambiental; a União, eu não sei, nunca houve uma decisão do Supremo nesse sentido. E, para deixar muito claro... E aqui eu não estou defendendo o artigo das isenções, estou apenas trazendo verdades sobre o que diz a norma. Ela determina que, inclusive, para as atividades... Não foi citado anteriormente, mas quero dizer aqui: talvez o que cause mais debate sejam as atividades de saneamento. E o entendimento do legislador da Câmara dos Deputados foi o seguinte: "Olhem, de fato, o licenciamento ambiental ainda não acontece na velocidade necessária, e você ter obras de saneamento travadas no licenciamento ambiental causa mais dano ambiental que você dispensar do licenciamento, mas obrigar [isto está dito na lei: obrigar] a cumprir integralmente todas as normas que se aplicam ao setor". E essas obras vão ser fiscalizadas. Você apenas permite que elas não passem pelo rito. Então, nessa questão, é muito importante deixar isso claro.
Sr. Presidente, eu fiz uso de uma frase do conhecidíssimo Winston Churchill quando finalizei minha fala na Comissão Geral na Câmara dos Deputados e queria fazê-lo novamente. A frase que o Churchill disse, quando acabou a Segunda Guerra, acho que se aplica integralmente às discussões da lei geral de licenciamento. Disse o então Primeiro-Ministro inglês, após o final da Segunda Guerra: "Agora, isso não é o fim, nem sequer é o começo do fim, mas é talvez o fim do começo". A vinda da lei geral do licenciamento ambiental não resolverá o problema do licenciamento ambiental brasileiro num passe de mágica. Certamente - e nunca ouvi alguém defender isto -, não é o fim em si mesmo, mas todos aqueles que militam nessa área concordam que a sistemática atual não vem funcionando adequadamente.
Os anos de demora para se expedir uma licença ambiental não têm se traduzido em bons licenciamentos. Os acidentes aqui citados têm demonstrado que a fiscalização não tem ocorrido de forma adequada. Portanto, é chegada a hora de, com muita seriedade, o nosso Parlamento realmente se ater sobre este assunto e aprovar uma norma que traga simplificação, modernização, uniformização, eficiência e, acima de tudo, que traga qualidade ao licenciamento ambiental brasileiro.
Ao longo dos últimos cinco anos, tenho, em sala de aula e em palestras e aqui nas Casas Legislativas, tratado sobre este projeto de lei. Todos aqueles que atuam e aqui falam - empreendedores, consultores, servidores de órgãos ambientais, Ministério Público na função de fiscal da lei e o próprio Judiciário, quando chamado a se manifestar sobre questões ambientais - necessitam ter uma bússola, uma lei geral. Que a gente possa, a partir do ano que vem, não mais debater o projeto de lei da lei geral de licenciamento ambiental, mas, sim, os efeitos da entrada em vigor dessa lei geral de licenciamento ambiental.
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Este Senado, mais uma vez, está deparado com uma questão de altíssima relevância para as presentes e futuras gerações. Que tenha a capacidade de dialogar sobre este assunto e possa conseguir ser a Casa das convergências em tudo que for possível. E grande parte do projeto de lei - isto eu posso testemunhar pelos debates na Câmara - são convergências; e as divergências, como a democracia que vivemos, que possam, então, ser votadas, para que a gente possa ter a lei geral do licenciamento ambiental.
Sr. Presidente, agradeço imensamente o convite e a palavra.
Fico à disposição aqui para a gente continuar neste tão profícuo e relevante debate.
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Obrigado, Sr. Marcos Saes, pela sua exposição. Eu agradeço a sua contribuição.
Eu agora vou passar para a fase da interpelação das Sras. e Srs. Senadores.
A Senadora Kátia Abreu, Relatora da matéria, está lincada e deseja fazer uso da palavra? (Pausa.)
Ela não está lincada, até porque ela tem outra reunião na Comissão de Relações Exteriores.
Eu pergunto se há algum Senador inscrito. (Pausa.)
Eu pergunto, mais uma vez, se algum Senador deseja fazer uso da palavra.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Eu passo a palavra, então, ao prezado Senador Acir Gurgacz, Presidente da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária.
O SR. ACIR GURGACZ (PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO. Para interpelar.) - Minha saudação, Sr. Presidente Jaques Wagner, que conduz esta reunião. Minha saudação a todos os palestrantes que estão contribuindo, e muito, para que a gente possa ajudar neste tema que eu considero da maior importância para o nosso País.
Eu tenho convicção, tenho total certeza de que é preciso ter uma atenção e um cuidado especial com o meio ambiente e os impactos ambientais das obras que são necessárias para o nosso País. Só que algumas não têm como serem transferidas de local. Aí é preciso fazer um estudo de compensação ambiental e um estudo de um impacto menor dessas obras que são de importância nacional. Por exemplo, imaginemos nós se nós não tivéssemos hoje em funcionamento Jirau e Santo Antônio gerando energia lá no Estado de Rondônia, assim como Belo Monte no Pará. Nós já estamos com problema de energia elétrica. Se nós não tivéssemos essas três obras em funcionamento, a situação brasileira estaria muito pior. Por isso, é importante a gente colocar nesta nova lei, neste novo momento do licenciamento ambiental que as obras de interesse nacional têm que ter uma atenção diferenciada, têm que ter um estudo diferenciado.
Temos um grande exemplo que é a BR-319. A pré-avaliação ambiental não pode ser eterna. Já se vão 17 anos, Senador Jaques Wagner, de tentativa de licenciamento ambiental para o reasfaltamento da BR-319! O impacto ambiental aconteceu nos anos de 1967, quando começou a obra, a 1970, quando foi inaugurada a obra. Em três anos, fizeram essa obra. Ela foi totalmente asfaltada. O asfalto se destruiu, e não se consegue fazer o reasfaltamento. Já foram gastos mais de R$110 milhões em estudos para o licenciamento desta obra de reasfaltamento da BR-319. É uma obra de interesse nacional. Nós temos que ver os impactos ambientais, que nesse caso não há, mas se houver, fazer as compensações, mas não deixar de fazer uma obra tão importante como essa.
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Aliás, existem alguns segmentos do Governo que se utilizam das questões ambientais para não executar as obras. Agora me parece, Senador Jaques Wagner, que paralisou novamente a manutenção da BR-319, que foi iniciada em 2015 e paralisou agora por um documento novo que o Ministério da Infraestrutura colocou no processo, e aí paralisaram a obra novamente. Dá a impressão que faltou dinheiro pra executar a obra, então, vamos colocar um documento aqui para que o Ministério Público questione, paralise a obra e aí o ministério vai dizer: "não, a culpa não é minha; a culpa é do meio ambiente". Então, nós temos que deixar claras essas situações todas para que não haja essas manobras, primeiro pra não dar licenciamento ambiental, depois pra paralisar uma obra que está em andamento. São manobras que o próprio Executivo pode fazer em algum momento. Não estou dizendo que isso esteja acontecendo, mas é preciso deixar claro para que isso não venha a acontecer.
É por isso que eu sugiro e peço pra que a nossa Relatora, Senadora Kátia Abreu, coloque no seu relatório instrumentos que permitam celeridade do processo, talvez com prazos para que possam ser cedidos ou cancelados, ou não concedidos os licenciamentos ambientais.
Eu quero fazer só uma colocação aqui, com relação ao que a Sra. Andréa falou com relação ao PL da grilagem. Nós não estamos falando em grilagem, nós estamos falando em regularização fundiária. Regularização fundiária é dar documento para aquelas famílias que entraram nas suas áreas nos anos 70, 80, 90, e há um marco, um marco legal de 2008, ou seja, não se dará - e a intenção não é dar - documento para futuras ocupações, ou ocupações depois de 2008, ou ultrapassar o que diz a Constituição, até 2.500 hectares. Nós queremos dar legalidade, levar legalidade ao campo, legalidade àquelas pessoas que estão ali trabalhando há muitos anos, há muitas décadas, principalmente para quem tem terras em até quatro módulos fiscais.
No Brasil, nós ouvimos no último debate que isso corresponde a 88% das terras que precisam ser legalizadas. No nosso Estado de Rondônia, Senador Jaques Wagner, isso corresponde a 97% das áreas que precisam ser regulamentadas, legalizadas, e estão dentro dos quatro módulos fiscais. Portanto, é uma questão de civilidade para essas pessoas.
Então, não tenho nenhuma pergunta a fazer, apenas fazer essas colocações que eu entendo que são pertinentes.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
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O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Obrigado, Senador Acir.
Antes de fazer a minha própria intervenção, eu quero ler alguma das perguntas e comentários que chegaram daqueles que nos acompanham pelo e-Cidadania. Eu falo aqui de perguntas...
Elinadja Targino, de Alagoas: "Qual a pretensão para..."
Eu peço que os nossos expositores atentem para as perguntas dos nossos internautas para que, eventualmente, na sua fase final de comentários, possam contribuir e eventualmente responder.
A pergunta de Elinadja Targino, de Alagoas: "Qual a pretensão para que o licenciamento ambiental consolide equilíbrio entre União, Estados e Municípios?"
Carlos Iuri, do Rio de Janeiro: "Há pessoal suficiente para manter a fiscalização assídua sobre o objeto do PL nº 2.159, de 2021?" Eu me associo a essa pergunta, particularmente ao nosso ex-Ministro José Carlos Carvalho, sobre a estrutura dos órgãos de licenciamento, porque pra mim esse é um problema crucial que acaba impactando negativamente sobre a própria qualidade da lei.
Francisco Raposo, de São Paulo: "Será que os grandes produtores não entendem que eles serão os mais prejudicados com as barreiras nas exportações, e na alteração do clima?"
Otacílio Duarte, de Goiás: "Nós já temos o maior rebanho bovino do mundo, exportamos alimentos para 190 países. Pra que agredir mais o meio ambiente?"
E aqui alguns comentários.
Paulo Turazzi, do Rio de Janeiro: "Ainda que tardiamente, o Brasil precisa compreender que a agricultura e a agropecuária dependem da preservação da natureza para se sustentar."
Barítono Games, de Minas Gerais: é preciso que medidas compensatórias sejam obrigatórias para todo tipo de atividade que gere impacto ambiental, além de serem fiscalizadas."
Elaine Braga, de São Paulo: "Se não protegermos o meio ambiente, não teremos os animais polinizadores e dispersores das sementes, visto que são essenciais para as flores."
Davi Oliveira, de Minas Gerais: "Não precisamos desmatar para aumentar a produção agrícola. Devemos recuperar áreas degradadas improdutivas e restaurar ecossistemas nativos."
Eu queria também, antes de devolver a palavra para comentários finais, até pra estimular o debate entre vocês, porque ao fim e ao cabo, eu comentava com o Senador Acir que não se trata aqui, na medida em que V. Sas. são especialistas, de nós debatermos. Na verdade, a ideia é que haja esse debate no contraditório de ideias. É essa a alma da democracia, o esgrimar argumentos pra que a gente chegue a um ponto de equilíbrio. Eu pessoalmente venho insistindo, desde que assumi a Comissão de Meio Ambiente, que não há dicotomia entre produzir, desenvolver, gerar emprego e preservar. O mundo inteiro faz isso, o mundo inteiro olha para isso e olha para isso ou por consciência ou pela emergência a que nós chegamos. Eu ontem estava na sessão normal da CMA, Senador Acir, e o Senador Wellington Fagundes, mais uma vez, trouxe o drama do Pantanal. Segundo ele - ele leu aqui uma entrevista que saiu em algum jornal nosso ou em algum órgão de televisão -, naqueles últimos incêndios do Pantanal, 17 milhões - números que ele trouxe - de animais foram perdidos, segundo estudos feitos por 30 cientistas que devem ter algum critério de cálculo, de quanto por hectare que você tinha. Dezessete milhões!
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E dizia o Senador Wellington Fagundes ontem, quando eu até antecipei que quarta-feira que vem nós instalaremos - eu não estarei, mas já preparei para que seja instalada - a Subcomissão do Pantanal, proposta do Senador Wellington: "para minha tristeza, as condições que nós estamos vendo neste momento de estiagem apontam pra novos incêndios este ano de novo."
Então, eu digo assim: ou por questões de consciência ou de emergência, a verdade é que o mundo inteiro vem para isso. É óbvio, concordando com algum dos palestrantes, que toda a norma, para poder ser cumprida e para poder contribuir nesse sentido que eu falo, tem que ser clara e tem que ser fruto desse debate, porque senão a gente fica enredado em décadas de debates dentro do Poder Judiciário, que também fará a sua interpretação, e quanto mais a norma for complicada, sinuosa, mais nós vamos ter esse problema se repetindo.
Então, é necessário que a gente faça isso que nós estamos fazendo aqui, essas audiências públicas, pra que a norma possa ser clarificadora, esclarecedora. É óbvio que tudo tem que ser atualizado. Há 30 anos, nós não tínhamos a tecnologia que nós temos hoje, por exemplo, pra fazer verificação de incêndios, etc. Então, é claro que essas coisas têm que mudar.
Como V. Exa. mesmo colocou, por exemplo, a norma atual da lei de regularização fundiária já permite ou permitiria a regularização de 88% dos que demandam seu título. Eu disse também na reunião da CMA que de 2007, quando eu assumi o Governo, até 2020, já no Governo do atual Governador da Bahia, nós regularizamos 1 milhão de hectares na Bahia, 1 milhão de hectares, com 60 mil novos títulos, dentro daquela norma: comecei fazendo dos pequenos, até chegar aos maiores. Então, eu insisto: por exemplo, com a norma atual dá para regularizar, como V. Exa. disse, 88%. Por que não regularizar esses 88%? Qual é a burocracia, já que até quatro módulos você tem um formato mais simplificado?
É por isso que eu me somei à pergunta de um dos internautas e a deixo não só para o José Carlos de Carvalho, mas para todos que quiserem comentar: o quanto pesa a desestruturação dos órgãos - ou do Incra, que nós tivemos nessa audiência também uma exposição do Presidente do Incra, ou do próprio Ibama? Porque, Senador Acir, para quem não gosta da norma, é fácil não fazê-la funcionar, os que têm o poder no Governo Federal, para depois dizer que ela está obsoleta. Então, quanto é que de peso cabe de falta de atualização da norma ou falta de pessoal nos órgãos? E eu digo como é contraditório: quando houve a expansão da energia eólica na Bahia e efetivamente eu não tinha pessoal no meu órgão ambiental para agilizar com a velocidade que queria, eu fiz convênio com a Federação das Indústrias do Estado da Bahia. Através desse convênio, eles bancavam a contratação de auxiliares por órgão ambiental, só que escolhidos pelo meu órgão ambiental. Eles não licenciavam, eles preparavam o processo. Isso beneficiava o Estado, beneficiava os investidores e a geração de emprego. Pois bem, depois eu fui questionado pelo Ministério Público, que dizia: "não, para ser licenciador tem que ser do órgão". Eu digo: "não, mas sou eu que estou indicando, é apenas um convênio para que eles possam pagar, até porque o empresário tem interesse nessa agilidade". Pois bem, tive que suspender o convênio e voltar à eventual morosidade, porque não tínhamos estrutura pra contratar mais. Então, muitas vezes falta posologia, ponto de equilíbrio, bom senso para que realmente a gente consiga fazer. Eu vou insistir: os que falam pela dicotomia entre produzir e preservar são os que ou não querem produzir ou não querem preservar, porque na verdade, é o que eu digo: há diabos em todos os cantos, até dentro de nós, nós temos santos e diabos até dentro de nós. E a luta para prosperar o melhor é essa luta cotidiana.
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Então, eu queria fazer essa intervenção. Antes de devolver, eu vejo a nossa queridíssima Senadora Zenaide Maia, sempre atenta a tudo que se passa nesta Comissão, e eu passo a palavra a V. Exa. para o seu questionamento. Senadora Zenaide Maia, com a palavra.
A SRA. ZENAIDE MAIA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PROS - RN. Para interpelar.) - Sr. Presidente, Senador Jaques Wagner, nosso colega representante da Comissão de Agricultura, quero dizer o seguinte: este debate é de uma importância fundamental. Não tenha dúvida de que, por essa quantidade de pessoas que estão entrando neste momento em que a gente está dando visibilidade, a importância de se preservar o meio ambiente está já na população. O povo está aí perguntando, Jaques Wagner.
O que eu queria mostrar aqui é o seguinte: nós estamos, aqui nesta Comissão, empoderando a população brasileira para entender a importância de não degradar o meio ambiente. Eu sou aqui do Alto Sertão do Rio Grande do Norte, eu vivi a seca, mas eu vim descobrir depois o porquê, o que era a seca, como se poderia conviver e administrar isso sem deixar as pessoas e os animais morrerem de sede.
Uma coisa é certa, gente, há algo aqui no Brasil com que eu acho que todos têm que concordar: nós temos que ter um olhar diferenciado para o extrativismo do Brasil, seja ele mineral, seja ele animal, seja ele vegetal, termos uma política de taxa zero para esse povo. No Brasil, para quem produz e exporta, os impostos são liberados. Então, o que acontece? Usam o patrimônio natural da população, água, os minerais da terra, usam tudo - e normalmente é uma família que faz isso -, mandam os recursos para o exterior e não pagam os impostos corretamente. Eu queria levantar aqui o seguinte: isso estimula, muitas vezes, a ganância, porque eu acredito que o Brasil não precisa e nem pode mais desmatar para aumentar a produção agrícola. Aí o que acontece? Daqueles recursos de impostos que viriam para a educação, para a saúde do povo, não fica nada. Esse pessoal vai para fora...
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Outra coisa: as máquinas, o nosso parque tecnológico já não faz. Então, essas máquinas também são introduzidas no País sem se pagar imposto.
Então, o que eu queria mostrar é que esse cuidado... O mundo todo não pode estar errado. Todo o mundo hoje se preocupa com a preservação da natureza. A gente está vendo aí o que está acontecendo com o mundo de enchentes, tsunâmis... Tudo isso tem a ver com o meio ambiente, com o clima.
E digo mais: a gente não pode estar usando aqui o argumento de que Alemanha, Estados Unidos já dizimaram os índios, já desmataram. Quando eles desmataram, não tiveram o privilégio que a gente tem, porque levou alguns anos para a ciência mostrar que a degradação do meio ambiente não era boa para ninguém.
Eu concordo com Jaques Wagner no sentido de que aqui a gente não vai polemizar: produzir, obrigatoriamente, e não preservar seria uma condição incompatível - se você produzir, você não tem como preservar o meio ambiente. Tem sim! E a gente pode até importar quem já está fazendo isso. Agora, vamos ter um olhar diferenciado. Não pode tirar os produtos, o extrativismo tirar os produtos da nossa natureza, do nosso povo, e esse povo não ficar com nada, porque, já que há esse benefício de não se pagar imposto, o povo não fica com nada, porque esses impostos seriam para a educação, para a saúde e para a própria preservação do meio ambiente.
Como foi falado aqui, essa desestruturação, esse desmonte dos órgãos que cuidavam da preservação da natureza não é bom para ninguém. Como o Wellington Fagundes falou, nós tínhamos - que eu acho que já não é mais - a maior planície alagada do mundo, que é o Pantanal, e vemos que dizimaram, só nos últimos anos, 17 mil espécies animais, que desapareceram. Com certeza, gente, isso fazia parte da cadeia. Quando tira um, aparecem os outros.
E algo que eu tenho que chamar atenção aqui para a população brasileira, para quem está nos assistindo: outra coisa que degrada o meio ambiente é cortar aquelas árvores de 200, 300 anos, mas uma coisa me chama atenção: aquelas árvores, a gente vê o fogo dizimar; agora, a produção, dificilmente, porque quem produz deve ter uma segurança maior para não queimar a sua produção, como o milho, a soja, etc. Mas quero dizer o seguinte: a quantidade de agrotóxicos que estão jogando na natureza para a produção do setor agrícola... Só em dois anos e oito meses foram 1.144 novos agrotóxicos. O serviço de oncologia do Brasil mostra, e eu queria dizer algo aqui: hoje o câncer de intestino mata mais mulheres do que o câncer de mama. Não é possível! De repente, estudos mostram que os agrotóxicos estão diretamente envolvidos com isso também, mostrando que todos são comprometidos por esse agrotóxico, porque eles são jogados na natureza, vão para os rios, os peixes os ingerem, e todos são prejudicados com isso. Então, quero dizer o seguinte: pode-se, sim, produzir, respeitando...
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O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Senadora...
A SRA. ZENAIDE MAIA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PROS - RN) - ... o meio ambiente; pode-se, sim, fazer um extrativismo, mas dividir o que foi tirado da natureza com a população brasileira, revertendo em educação, em saúde e preservando o próprio meio ambiente.
Obrigada, amigos. Desculpem se...
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Não, eu só queria informar a V. Exa., porque sei da sua preocupação constante como médica, como brasileira e Senadora representante do povo do Rio Grande do Norte, que, encerrada esta reunião, nós teremos outra audiência pública exatamente sobre agrotóxicos especificamente, uma audiência que foi proposta e que deveria ser na semana, se não me engano, do 7 de setembro, mas, como foram suspensos os trabalhos, nós acabamos adiando. Então, encerrada esta, às 10h30 nós começaremos uma audiência, que eu vou abrir e provavelmente quem continuará na sequência será o Senador Fabiano Contarato, autor do requerimento. É só para lhe informar porque eu sei do seu interesse como médica por esse tema. E agradeço a sua enriquecedora intervenção nesta audiência.
Eu agora vou retornar a palavra por cinco minutos para cada um dos palestrantes para eventuais respostas e/ou comentários finais e, como eu havia colocado, vou inverter a ordem, porque sempre, Sr. Marcos, é um privilégio falar por último ou aqui ou na tribuna do Judiciário. É sempre o último argumento que vale mais. Então, por uma questão de equilíbrio, combinação minha com o Senador Acir, a gente, ao final, inverte o procedimento. Assim, V. Sa. é o primeiro a ter a palavra, se quiser responder algum dos questionamentos ou fazer os seus comentários.
Muito obrigado! Com a palavra V. Sa.
O SR. MARCOS SAES (Para expor.) - Sr. Presidente, eu concordo com o fato de que o último argumento sempre tem muito peso, mas, melhor do que o último argumento, é o bom ato. Então, independentemente da ordem em que ele é falado, eu fico com os bons argumentos que todos aqui podemos falar e ouvir, e, por isso, muito rapidamente...
Primeiro, eu gostaria que o Senador Acir Gurgacz... A fala sobre o PL da - entre aspas - "grilagem" demonstra muito bem, Senador, o que acontece hoje nas questões ambientais e no País como um todo: é uma guerra de narrativas. Quem é contra transforma o PL da regularização fundiária em PL da "grilagem"; quem é contra uma atualização, uma simplificação, uma modernização do licenciamento ambiental transforma o PL da lei geral do licenciamento ambiental numa catástrofe anunciada, sem bons argumentos, Sr. Presidente. Então, essa é uma questão... Gostei muito da sua fala e da do Senador Acir porque deixa isto muito claro: conhecimento é importante para tudo e que bom que a gente pode ter aqui um debate qualificado.
Sr. Presidente, muito rapidamente, sobre as perguntas.
A pergunta da Elinadja sobre essa cooperação entre União, Estados e Municípios: a lei geral do licenciamento ambiental não vem fazer isso, porque isso é regulamentado na Lei Complementar 140, que regulamentou o parágrafo único do art.23 da Constituição. Então, a lei geral do licenciamento ambiental traz um procedimento do licenciamento e não cria novas divisões entre União, Estados e Municípios.
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A pergunta sobre fiscalização ambiental - o Senador Jaques Wagner também falou disso - é muito relevante, e é o que eu disse: a lei geral não vai resolver a falta de estrutura dos órgãos do Sistema Nacional do Meio Ambiente, mas ela pelo menos simplifica um entendimento no licenciamento ambiental. Então, foi por isso que eu elogiei, por exemplo, o concurso público que foi aberto no Ibama. E a gente precisa disso nos Estados, sob pena... E aí eu pego também o exemplo de que o Senador Jacques Wagner falou, da bela iniciativa - eu conheço - que foi feita na Bahia para que houvesse a contratação prevista na Resolução 237 do Conama, Senador, mas isso não é uma lei. Então, se... E fica aqui uma sugestão: que possa vir para a lei geral do licenciamento ambiental a possibilidade de contratação de técnicos, de especialistas para fortalecer também a estrutura dos órgãos ambientais, ainda que seja em casos excepcionais.
Quando eu falava do licenciamento ambiental, do desmatamento no Brasil, eu só queria deixar claro para quem talvez não tenha tanta vivência que o licenciamento ambiental é justamente o instrumento para você compatibilizar desenvolvimento com respeito ao meio ambiente.
Eu participei de um exemplo, e gosto sempre de contá-lo: a gente fez o licenciamento ambiental de um porto, Sr. Presidente, que era numa área prioritária para desova de tartarugas marinhas. E o órgão competente para isso, Instituto Tamar, foi contrário à implantação do porto, porque ali era uma área de desova de tartaruga marinha ameaçada de extinção. Se não se tivesse feito nada e se o porto não tivesse sido implantado, essa tartaruga, essa espécie continuaria ameaçada de extinção. Com a implantação do porto, houve a sextuplicação do número de desovas. Por quê? Porque licenciamento ambiental não é impedir que se implante um porto numa praia; é, sim, impor medidas que melhorem a vizinhança às áreas contíguas ao porto. E, se ainda que, efetivamente na área de implantação do porto, eu tenha prejudicado a desova da tartaruga marinha, ao ter o que se chama em programas ambientais de medidas compensatórias, eu aumentei nas laterais, essa tartaruga marinha, em breve, vai sair da lista de animais ameaçados de extinção. Isso é licenciamento ambiental no nosso País.
Concordo, Senador, que não há dicotomia. A nossa legislação, na questão do desenvolvimento sustentável, ainda é da década de 70, e, neste ano, nós estamos comemorando 40 anos da lei que criou a Política Nacional do Meio Ambiente no nosso País, uma lei até hoje moderna e que vai ser claramente complementada pela lei geral do licenciamento ambiental.
Uma última questão, da Senadora Zenaide, que eu acho que respondo também pelo que foi falado com o exemplo que eu dei das tartarugas. De fato, eu só queria deixar isto claro para todos: o licenciamento ambiental é a forma de se utilizarem corretamente os recursos naturais.
Eu sonho, Presidentes das nossas duas Comissões, com o momento em que o mercado vai se autorregular. As grandes obras de infraestrutura já citadas aqui que prescindem de financiamento... Quem participa efetivamente do licenciamento ambiental sabe que a due diligence feita pelo órgão financiador é, muitas vezes, inclusive, mais aprofundada que o próprio licenciamento ambiental.
Nós ainda vamos chegar a este momento, Senadores, em que a consciência ambiental será tamanha que talvez nem se vá mais precisar da lei ambiental, porque as boas práticas efetivamente serão aplicadas. Enquanto isso não acontece, que a gente possa ter a lei geral de licenciamento ambiental para ajudar nessa consciência ambiental das presentes e futuras gerações.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Obrigado, Marcos, pela sua contribuição.
E agora eu passo a palavra à Sra. Andréa Zhouri, para suas considerações finais, em até cinco minutos.
A SRA. ANDRÉA LUISA ZHOURI LASCHEFSKI (Para expor.) - Pois não.
Primeiramente, eu gostaria de agradecer pela oportunidade de ter trazido aqui para o debate a posição da Associação Brasileira de Antropologia.
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Gostaria de convidá-los novamente para a leitura da nossa nota técnica, com certeza muito mais concisa do que eu pude apresentar nesses breves 20 minutos, em que tentei ser bastante didática também, trazendo fotos, fatos da nossa experiência de pesquisa ao longo de vários anos - não só minha, mas de vários colegas meus, inclusive daqueles que já não estão entre nós, porque as gerações passadas nos ensinaram a trilhar esse caminho da pesquisa séria e comprometida com o bem-estar da população brasileira e do meio ambiente. A nota técnica já está disponibilizada aí para os senhores, e eu espero que ela possa contribuir para o debate.
Eu gostaria de trazer aqui uma pequena história que aconteceu comigo quando eu ainda estava fazendo o meu doutorado na Inglaterra nos anos 90. Ali estava em discussão a criação de um selo ambiental, um certificado florestal que era o FSC (Forest Stewardship Council), o Conselho de Manejo Florestal. Eu pude etnografar, pesquisar o processo de criação desse selo entre as ONGs europeias e o empenho delas em fazê-lo de forma consensuada com o setor madeireiro na Inglaterra na época. Mas a federação das importadoras de madeira do Reino Unido não aderiu a esse selo. E eu tive oportunidade, lá na Inglaterra, de entrevistar o presidente da federação, da Timber Trade Federation. Não me esqueço de uma pergunta que fiz a ele, e ele foi muito claro e objetivo, como são os ingleses, na sua resposta. Eu perguntei a ele por que ele não aderia ao selo do FSC, como federação? Algumas empresas aderiram individualmente, mas não a federação. Ele me disse, de forma bem simplória e direta, bem inglesa, o seguinte, Senadores e Senadora, ele falou assim: "O nosso negócio é comprar e vender madeira. Os direitos dos povos indígenas, das comunidades, os direitos humanos são problemas do seu Governo - são problemas do seu Governo. O meu negócio é comprar e vender madeira".
Por que eu estou trazendo esse episódio que me marcou tanto aqui? Porque se falou muito aqui da autorregulação, a autorregulação pelo mercado, a autorregulação das empresas, e eu percebo uma fé, como eu disse, exacerbada nessa autorregulação. Existe um mercado que se regula. É uma outra lógica. A regulação, o princípio da precaução ambiental, da saúde, da integridade da população, do bem-estar da população é dever do Estado - é dever do Estado -, como bem disse o representante da Federação da Indústria de Madeira da Inglaterra: é dever do nosso Estado. E o Estado brasileiro não pode se submeter a mudanças sem o rigor técnico, sem o conhecimento científico acumulado em décadas nessa área ambiental, internacionalmente inclusive, não pode se submeter a normas que são exigências de determinados setores pontuais da nossa economia. O Estado não pode ser refém e não pode transferir para as empresas a sua obrigação de fazer a regulação ambiental e de zelar pelos direitos humanos, os direitos da sua população.
Não há antagonismo entre meio ambiente e desenvolvimento. Isso é uma discussão - me perdoem - de 40 a 50 anos. Eu tenho 60 anos e eu tinha 20 anos quando comecei a entender essa discussão! Há 40 anos eu escuto esse debate que já supunha avançado em torno da sustentabilidade, do desenvolvimento sustentável. Voltamos agora no País a uma discussão já ultrapassada internacionalmente, a uma negação da ciência, a uma desqualificação do discurso crítico, como foi feito aqui por um dos expositores, que não trouxe uma exposição substantiva, mas tão somente usou de uma retórica eloquente para desqualificar o conhecimento científico, chamando de desonesto, de desinformado, inclusive de passional. Como mulher, infelizmente, na arena pública, estamos acostumadas a ouvir esse tipo de desqualificação, que não contribui em nada para o avanço do debate.
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Eu estou falando de uma forma eloquente aqui, porque a situação é grave, senhoras e senhores, é gravíssima. O que está se propondo aqui na Mesa é o retrocesso. E nós analisamos tecnicamente esse PL, trouxemos a nossa experiência de décadas observando in loco a realidade, para que vocês pudessem então entender a complexidade e os efeitos perversos de situações que podem ocorrer, podem ser acirradas caso esse PL seja aprovado sem as reformulações que já foram colocadas aqui, que são necessárias.
O meu tempo já está esgotado, eu só agradeço novamente a oportunidade.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Obrigado, Sra. Andréa, pela sua participação nesses comentários finais.
Eu passo a palavra agora ao Sr. Davi Bomtempo, por até cinco minutos, para seus comentários finais.
Com a palavra V. Sa.
O SR. DAVI BOMTEMPO (Para expor.) - Muito obrigado, Senador Jaques Wagner e Senador Acir, pela oportunidade.
Muito importante a intervenção e a fala dos senhores e eu vou aproveitar até para pegar um gancho também, em termos de contexto internacional, e passar aqui três pontos por que eu acho importante o Brasil estar se qualificando cada vez mais, em termos de desenvolvimento sustentável, e trazendo licenciamento ambiental como uma das ferramentas para que a gente possa ter esse tipo de desenvolvimento.
Queria trazer aqui a importância da própria OCDE. Dentro da OCDE, a gente sabe que 40% dos instrumentos econômicos dizem respeito ao meio ambiente e sustentabilidade. E, quando você faz uma relação com política pública ambiental aqui no Brasil você vê que já cobre grande parte desses instrumentos.
Há a questão também do Acordo Mercosul-União Europeia, em que a gente tem um capítulo inteiro de desenvolvimento sustentável, e o pilar central é o Acordo de Paris, é a questão climática.
E o terceiro ponto que eu queria aqui enaltecer é a questão da recuperação pós-covid. Então, você vê todo o mundo direcionando os seus investimentos para questões que vão tratar da redução da perda de biodiversidade e também das questões climáticas, todas conectadas aí com os objetivos de desenvolvimento sustentável e também, de uma forma mais horizontal, da economia circular.
Então, hoje não dá mais para você produzir sem ter esse cuidado com o meio ambiente, sem ter responsabilidade social. E eu acho que é isto que o licenciamento ambiental também procura trazer: muito mais eficiência e muito mais cuidado com o meio ambiente.
O texto foi amplamente discutido, como o Marcos colocou. Foram quase dez, nove audiências públicas na Câmara, infinitas reuniões com vários setores, com os Parlamentares, com os ambientalistas, com o setor produtivo, com a academia, enfim, foi um texto que já roda dentro desta Casa, dentro do Congresso desde 2004, então acho que chegou a hora de a gente começar a entender qual seria um texto mais equilibrado, que pudesse dar mais simplicidade, trazer modernização e, mais do que tudo, trazer também a questão de um licenciamento cada vez mais inteligente e aproveitando o que seria uma das formas de você lidar também, a partir da tecnologia, a partir da inovação, com essas questões relacionadas à falta de pessoal, que foi citada aí nos comentários e também nas perguntas.
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Mas esse texto vai trazer também a figura das condicionantes, trazendo essa relação com o nexo causal, trazendo essa relação com o que está sendo definido dentro dos estudos, dentro também desses outros procedimentos. A questão dos intervenientes também, estabelecendo prazos para respostas, sendo não vinculantes e, principalmente, fortalecendo o que já há dentro da LC 140, que estabelece a competência dos entes federativos. Então, nesse contexto, eu acho que é um texto bastante equilibrado, é um texto que merece uma discussão mais aprofundada aqui dentro do Senado Federal, mas que a gente caminhe para o entendimento, de forma a finalizar esse processo para dar mais segurança jurídica, para trazer regras claras, trazer também investimento e também a geração de renda, de empregos, de arrecadação e, principalmente, de desenvolvimento sustentável.
Então, eu fico por aqui na minha mensagem, trazendo também esse ponto de vista em relação aos investimentos inovadores. O Senador citou a questão da eólica. Hoje estamos discutindo a questão relacionada à eólica offshore, principalmente ali no Nordeste. Com certeza a questão do licenciamento ambiental vai precisar também ser endereçada, vai precisar ser discutida, para que a gente também não atrase esse investimento e também não atrase o desenvolvimento dessa Região do Brasil.
Então, eu fico por aqui. Agradeço mais uma vez a oportunidade e me coloco à disposição.
Todo o material que a CNI tem a respeito do licenciamento ambiental, tais como as pesquisas, as consultas, todo o material que foi produzido em relação a esse assunto está disponível no nosso canal Indústria Sustentável. É só colocar no Google que ele já aparece como top 1.
Então, fico aqui à disposição. Mais uma vez, muito obrigado, Senador, e lhe devolvo a palavra.
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Obrigado, Sr. Davi Bomtempo, pela sua participação.
Eu passo, nessa segunda fase, a palavra ao nosso ex-Ministro José Carlos Carvalho como último orador desse bloco.
Com a palavra V. Sa.
O SR. JOSÉ CARLOS CARVALHO (Para expor.) - ... Wagner, ao Presidente Acir Gurgacz.
E, como o tempo não é suficiente para repassar todas as perguntas, eu gostaria de entrar direto na questão muito oportuna, muito pertinente levantada pelo Senador Jaques Wagner, relativamente à governança ambiental do Estado nacional brasileiro.
Como nós sabemos, desde a Lei 6.938, de 1981, foi criado o Sistema Nacional do Meio Ambiente, um sistema integrado, já concebido com base na estrutura federativa, mesmo antes da Constituição de 1988. Então, do ponto de vista da concepção, é um modelo integrado, sistêmico, mas que não tem a musculatura necessária para desempenhar a sua finalidade.
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E as boas políticas públicas dependem de leis claras, objetivas, como se espera que possa ocorrer em relação ao licenciamento ambiental, mas elas também dependem de instituições qualificadas para executá-las. Uma lei... E é muito comum isto no processo legislativo brasileiro: criar leis que terminam nos seus enunciados, leis que se encerram nos seus enunciados. Por quê? Porque elas próprias não criam os meios da sua implementação. E uma das questões fundamentais das dificuldades que nós temos no Brasil com licenciamento ambiental é a fragilidade institucional do Sistema Nacional do Meio Ambiente, com estruturas precárias, recursos humanos em quantidade e qualidade insuficiente, falta de meios, falta de equipamento, orçamentos irrisórios. Então, ainda que o Congresso venha - e eu espero que o Senado possa fazê-lo - a melhorar a lei da Câmara e fazer uma lei que atenda aos interesses nacionais com vistas à sustentabilidade, mantida a atual estrutura do Sistema Nacional do Meio Ambiente, nós vamos continuar patinando, porque os órgãos não têm capacidade de resposta. Eu estou falando de capacidade material, humana. Não têm. É preciso que isso fique claro de uma vez por todas, alinhado com a posição do Senador Jaques Wagner.
Nós vamos ter uma lei excepcional... E outra coisa que é fundamental quando se fala da...
(Interrupção do som.)
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - José Carlos, sua voz foi interrompida. Não sei se houve problema com a sua internet. Eu lhe sugeriria, eventualmente...
O SR. JOSÉ CARLOS CARVALHO - ... assimétrica. Nós não podemos pensar numa lei geral como se Acre fosse igual a São Paulo; como se Alagoas fosse igual ao Rio de Janeiro; como se Rio Grande do Norte fosse igual a Minas Gerais. É disso que também precisamos de tratar.
Então, essa é uma questão central. Se nós não criarmos meios de fortalecimento do Sistema Nacional do Meio Ambiente, poderemos obter uma lei razoável - e eu espero que a gente possa considerá-la ao final razoável ou boa - e, ainda assim, o setor produtivo vai continuar amargando dificuldades por falta de capacidade operacional, por falta de capacidade de resposta dos órgãos licenciadores, principalmente levando em conta que mais de 80% do licenciamento ambiental é feito pelos Estados. E todos estão cientes da crise fiscal que assola os Estados brasileiros, o que também é um dificultador a mais para o encaminhamento da solução desse problema.
Quero terminar, rapidamente, com relação ao licenciamento do saneamento, dizendo que quem defende que não haja licenciamento para o saneamento básico no Brasil nunca foi vizinho de uma estação de tratamento de esgoto.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Jaques Wagner. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Obrigado pela sua contribuição nessa fase final, nosso ex-Ministro José Carlos Carvalho.
Eu quero, na verdade, agradecer a todos os quatro palestrantes, representando cada um as suas entidades.
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E sempre estamos fazendo questão de colocar, vamos dizer, dois que têm uma visão e outros dois que têm outra visão, não necessariamente contraditórias, mas com enfoques diferenciados, exatamente para suscitar o esclarecimento das Senadoras e Senadores, porque é esse debate que vai construir a posologia necessária para a gente ter uma lei, como se diz, moderna, equilibrada e protetora daquilo que a Sra. Andréa colocou - que eu também acho que já está ultrapassado, mas é sempre bom rememorar - da sustentabilidade tripartite ambiental, social e econômica, porque, se esse tripé não estiver equilibrado, nós não temos uma boa lei, pelo menos na minha opinião.
Eu quero, portanto, agradecer a todos, me despedindo aqui do Senador Acir Gurgacz, Presidente da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária, com quem estamos compartilhando essas reuniões conjuntas; a todos que nos acompanharam, particularmente aos três palestrantes e à senhora palestrante; e a todos aqueles que nos acompanharam pela TV Senado até 10h ou pela via da internet.
Então, agradeço a presença de todos.
Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada esta reunião.
Muito obrigado.
(Iniciada às 8 horas e 02 minutos, a reunião é encerrada às 10 horas e 17 minutos.)