05/10/2021 - 24ª - Comissão de Agricultura e Reforma Agrária, Comissão de Meio Ambiente

Horário

Texto com revisão

R
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO. Fala da Presidência.) - Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos.
Declaro aberta a 15ª Reunião da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária e a 24ª Reunião da Comissão de Meio Ambiente, que ocorrem conjuntamente, da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 56ª Legislatura.
A presente reunião destina-se à realização de audiência pública para debater a regularização fundiária e instruir os seguintes projetos de tramitação conjunta:
- PL 2633/2020, de origem da Câmara dos Deputados, que "altera as Leis nºs 11.952, de 25 de junho de 2009, 14.133, de 1º de abril de 2021 (Lei de Licitações e Contratos Administrativos), e 6.015, de 31 de dezembro de 1973, a fim de ampliar o alcance da regularização fundiária; e dá outras providências"; e
- PL 510/2021, do Senador Irajá, que "altera a Lei nº 11.952, de 25 de junho de 2009, que dispõe sobre a regularização fundiária das ocupações incidentes em terras situadas em áreas da União; a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, que institui normas para licitações e contratos da administração pública; a Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, que dispõe sobre os registros públicos; a Lei nº 13.240, de 30 de dezembro de 2015, que dispõe sobre a administração, a alienação, a transferência de gestão de imóveis da União e seu uso para a constituição de fundos; e a Lei nº 10.304, de 5 de novembro de 2001, que transfere ao domínio dos Estados de Roraima e do Amapá terras pertencentes à União, a fim de ampliar o alcance da regularização fundiária e dar outras providências.
R
Esta audiência pública é interativa, por meio do portal e-Cidadania, no site do Senado, e também pelo telefone 0800-612211.
Os nossos convidados de hoje são Dom José Ionilton Lisboa de Oliveira, Bispo da Prelazia de Itacoatiara, Amazonas, e Presidente da Comissão Pastoral da Terra, organismo da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil; também Dr. José Henrique Bernardes Pereira, da CNA; Dr. Júlio José Araújo Júnior, Procurador da República no Rio de Janeiro e Coordenador do Grupo de Trabalho de Reforma Agrária e Conflitos Fundiários da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, representante de Márcia Brandão Zollinger; e também Dra. Julia Bittencourt Afflalo, Consultora Jurídica da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).
Nós daremos a palavra nesta ordem, depois nós inverteremos: o primeiro será o último e o último será o primeiro. Cada um terá 20 minutos para as suas colocações.
Antes de iniciarmos a nossa audiência pública sobre a regularização fundiária, faço algumas considerações sobre o que é importante para avançarmos com o nosso trabalho e sobre a realidade da regularização fundiária, que é um tema dos mais importantes para a agricultura e também para a economia brasileira.
Em primeiro lugar, partimos do pressuposto de que é necessário atualizar a legislação sobre o tema. Para isso, temos duas propostas em debate, mesmo reconhecendo que é possível avançar com a legislação que já temos. Isso foi dito por vários Senadores e palestrantes que estiveram aqui na primeira audiência pública que realizamos sobre este tema e depois da retomada dos trabalhos da reforma semipresencial do Senado.
O próprio Presidente do Incra, Dr. Geraldo José de Melo, disse que o trabalho está a pleno vapor em todo o País, com muitos servidores municipais sendo capacitados para trabalhar junto com o Incra no programa Titula Brasil. Ele também disse que é possível avançar com a atual legislação e que o alcance do trabalho pode ser maior e melhorar muito com as propostas em tramitação no Congresso.
É por isso que estamos realizando esta audiência pública, de forma conjunta, da Comissão de Agricultura com a Comissão de Meio Ambiente, pois além de ser importante atualizar, melhorar ou modernizar o atual marco legal da regularização fundiária, também é importante que façamos isso o mais rápido possível, justamente para que o efeito dessa melhoria possa ser sentido de imediato na vida das pessoas, dos nossos agricultores e da economia brasileira. Eu considero, inclusive, que a regularização fundiária pode ser a ação desse Governo com muito impacto na economia do País no curto e médio prazo. Ela garante acesso ao crédito, aos programas governamentais e às inovações tecnológicas, para os produtores investirem na ampliação da lavoura, no aumento da produção de alimentos e na geração de emprego e renda. Se queremos realmente diminuir o desmatamento, o caminho é esse. Com isso, temos o aumento da competitividade e da sustentabilidade dos negócios sem deixar de lado a conservação ambiental, ou seja, a regularização fundiária é também um caminho para sairmos mais rápido da crise que atravessamos.
R
O impacto na economia será grande, uma vez que temos em todo o País cerca de mais de 80 milhões de hectares de terras da União sem regularização. Segundo o Incra, temos 1,2 milhão de posses precárias, incluindo cerca de 970 mil famílias assentadas que ainda não obtiveram título de propriedade e outros 300 mil posseiros em áreas federais não destinadas. Além disso, só na Amazônia existem 109 mil imóveis georreferenciados e registrados no sistema do Incra com requerimento de regularização correspondendo a 16 milhões de hectares aptos para a regularização, tudo dentro da legalidade e com procedimentos em estágio avançado. Isso equivale a 40% de toda a área possível de regularização na região pelas atuais normas, ou seja, se avançarmos com a legislação, poderemos regularizar muito mais, pois um cruzamento de informações do IBGE e do CAR (Cadastro Ambiental Rural) identificou quase 60 mil propriedades fora do sistema do Incra, o equivalente a 10 milhões de hectares.
O Estado de Rondônia possui um total de 17 milhões de hectares de terras públicas divididas em 92 e duas glebas. Destes, 10 milhões de hectares são de terras destináveis, ou seja, passíveis de destinação ou regularização, e 7 milhões de hectares são de áreas não destinadas. Em Rondônia, são mais de 120 mil proprietários rurais que já possuem o termo de posse de terras da União, que já solicitaram a regularização e aguardam o tempo da burocracia e dos pareceres técnicos e jurídicos para terem o título definitivo de propriedade do imóvel. Além disso, existem pelo menos outras 300 mil pessoas em assentamentos e acampamentos da reforma agrária, aguardando a posse e o título da terra. E há também pelo menos outras 200 mil pessoas reivindicando a posse da terra que ocupam, mas que também sonham novas possibilidades na regularização fundiária rural. Isso acontece em Rondônia, porque somos um Estado novo, fruto da reforma agrária que, como muita coisa em nosso País, foi feita pela metade.
Sem título da terra, sem o registro do imóvel, os agricultores de Rondônia veem limitações do seu crescimento. Falta segurança jurídica para investir, cidadania, dignidade para essas pessoas que foram ocupar o Estado nas décadas de 60, 70 e 80, atendendo o chamado do Governo Federal. Essa insegurança prejudica esses agricultores, prejudica a nossa economia e tem alimentado muitos conflitos agrários em Rondônia e toda a Amazônia. Mais de 70% dos proprietários de imóveis de Rondônia não possuem o título definitivo dos seus lotes. Segundo dados do relatório de desempenho do Terra Legal, esse programa emitiu, em oito anos, 12 mil títulos rurais em Rondônia. Depois disso, poucos títulos foram emitidos, mesmo tendo sido colocado como meta a emissão de 2 mil títulos até 2018, o que não se confirmou.
R
Pelo Titula Brasil, programa que, em 2020, substituiu o Terra Legal, poucos títulos foram emitidos, mas o fato positivo é que temos a adesão de 70% das prefeituras do Estado de Rondônia a esse programa. Dentre os 52 Municípios de Rondônia, 70% já aderiram ao Titula Brasil; 14 assinaram um acordo de cooperação técnica para iniciar o programa, que esperamos possa conferir mais celeridade e eficiência a processos envolvendo a regularização fundiária em assentamentos da reforma agrária e em terras públicas rurais da União e do Incra.
Estamos otimistas com esse novo trabalho e esperamos que a atualização da legislação possa trazer ainda mais celeridade e efetividade para esse trabalho de regularização fundiária, mas lembrando sempre que todo o trabalho nesse momento, Senador Jaques Wagner, de regularização no Estado já pode ser feito sem a atualização da nossa legislação. É um fato importante, já muito discutido nesta Comissão, principalmente por V. Exa. e outros debatedores e também dito pelo Presidente do Incra. Nós podemos nesse momento fazer a regularização fundiária de muitas áreas, não só do Estado de Rondônia, mas do Brasil inteiro.
Antes de iniciar o debate, pergunto a V. Exa. se gostaria de usar a palavra.
O SR. JAQUES WAGNER (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA. Para discursar.) - Apenas para cumprimentá-lo, estimado Senador Acir Gurgacz, cumprimentar a todos os nossos convidados, que daqui a pouco já começarão a falar, a todos que nos acompanham, e para reafirmar a minha posição original - evidentemente sou um homem de negociação, de busca de entendimento - de que, com a lei que nós temos, se houvesse celeridade - e aqui não estou apontando o dedo, mas estou dizendo que é preciso dar mais musculatura ao Incra, e a tecnologia que eles estão adotando agora seguramente facilitará -, já poderíamos regularizar.
E eu sei, Senador, que o seu sentimento é pelos pequenos, é realmente pelo pessoal que foi levado para Rondônia para fazer exatamente a expansão da nossa fronteira agrícola, então são pessoas de três, de quatro módulos, e é isso que eu acho que é preciso separar, o joio do trigo: quem é de três, de quatro de quem é de quarenta, cinquenta ou cem módulos de terra.
Então, eu concordo, só reafirmo minha posição original, a cautela, mas acho que o Senador Fávaro está tendo essa cautela com o marco temporal, em que ele já se comprometeu a não mexer, no sentido de que a gente atenda... Vamos pela fila, vamos começar dos pequenos, depois a gente chega aos grandes.
Mas era só isso.
Obrigado e boa reunião para nós.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Muito obrigado, Senador Jaques Wagner.
Iniciando, então, cumprimento os nobres convidados e passo a palavra ao D. José Ionilton Lisboa de Oliveira.
V. Sa. tem 20 minutos para fazer as suas colocações. É evidente, se precisar de um tempo a mais, nós estamos aqui à disposição. Muito obrigado mais uma vez pela sua presença conosco.
R
O SR. JOSÉ IONILTON LISBOA DE OLIVEIRA (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia, participantes desta audiência pública. Agradeço a oportunidade, como Igreja católica, como representante aqui de um bispo da Amazônia e também como membro da Comissão Pastoral da Terra, de participar desta audiência.
Gostaria de começar, como eu fiz numa outra audiência lá na Câmara dos Deputados, com a palavra de Deus. A palavra de Deus, no Profeta Amós, diz o seguinte: "Ouvi isto, vós que pisais o indigente, e exterminais os humildes da terra, dizendo: 'Quando passará a lua nova, para vendermos o grão, e o sábado, para abrirmos o trigo, diminuindo o efa aumentando o siclo, e enganando com balanças fraudulentas para comprar com dinheiro o pobre e o humilde por causa de um par de sandálias e para vender o refugo do trigo'. Jura o Senhor pelo orgulho de Jacó: 'Acaso me esquecerei para sempre de todas as suas obras?'". É uma palavra do Profeta Amós que nos impulsiona a estar sempre do lado dos pequenos, dos mais pobres.
Quero me valer aqui de um posicionamento dos bispos da Amazônia Legal. Agora em maio passado, nós fizemos um encontro virtual e elaboramos um documento que foi divulgado também em toda a imprensa. Mas eu quero me valer aqui de um parágrafo desse nosso posicionamento. A gente disse assim:
Percebemos [...] que a crise [...] [ambiental] denunciada em 2019 durante o Sínodo [para a Amazônia], acentuou-se durante a pandemia e revela os limites de um sistema que está sendo rapidamente destruído e que tende a perecer se a crise não for detida. Preocupa-nos a cadeia de iniciativas em vista do desmonte e fragilização da legislação socioambiental e fundiária [Aqui está como PL, acho que algum já foi aprovado na Câmara, mas foi escrito em maio.]: o PL 3729/2004 que desmonta o sistema de licenciamento ambiental; o PL 2633/2020 [que é esse que já se transformou, que está em discussão] e PL 510/2021 [outro que está em discussão também] que abrem as “porteiras” para a grilagem de terras; o PL 191/2020 permitindo a mineração e atividades econômicas em terras indígenas; o PL 6299/2002 que flexibiliza fabricação e uso de agrotóxicos.
Essa é a posição que nós, os Bispos da Amazônia Legal, tomamos, ali em maio, e que depois foi referendada por uma outra manifestação da comissão permanente da CNBB, do Conselho Permanente da CNBB, que pedia ao Presidente do Senado - inclusive, foi uma carta dirigida diretamente ao Presidente do Senado - para que pudesse não avançar com o Projeto 510, de 2021.
R
Nós temos consciência, como Igreja, como a Igreja na Amazônia, como CPT, de que o Projeto de Lei 2.633 não favorece, como disse aí o Senador Jaques Wagner, os pequenos. A nossa preocupação é essa, e nós, os Srs. Senadores e as Sras. Senadoras precisamos estar bastante atentos quanto a isso.
Primeiro, porque a nossa Constituição, quando fala dos Poderes, e aí o Poder Legislativo entra como um deles, diz que todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente. No caso, aqui, por meio dos representantes eleitos: V. Sas. ou V. Exas. - não sei qual o nome correto pelo qual devo chamá-los. Mas é importante que se pense nisso, no que está por trás desses dois projetos de lei que estão em discussão aí no Senado, para ver se beneficiam o povo ou prejudicam o povo. E pensar que a função do eleito, como disse aqui a Constituição, é garantir aquilo que faz bem para o povo brasileiro na sua maioria, os que mais precisam inclusive da proteção da lei.
Se nós vamos novamente à nossa Constituição, lá no capítulo IV dos direitos sociais, vai falar do... No capítulo VI, melhor dizendo, Do Meio Ambiente, aqui está muito claro que o ambiente precisa ser considerado quando se modifica qualquer lei e se faz qualquer lei. Aqui diz, por exemplo, no inciso VII, no §4º:
A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso de recursos naturais.
Então, precisamos ter esse artigo também da nossa Constituição quando se considerar a votação desses projetos.
Vou me valer aqui do Projeto de Lei 2.633, de alguns posicionamentos de setores da nossa sociedade civil, para considerar a nossa posição também como igreja, como CNBB, como bispos da Amazônia Legal, como CPT.
O Greenpeace fez uma manifestação, logo que foi aprovado lá na Câmara dos Deputados, e a nota diz o seguinte:
Foi uma lei aprovada durante a pandemia, diante de um escândalo de corrupção que estava sendo discutido lá na CPI da Covid, com desmatamento e queimadas na Amazônia batendo recordes. E se considera que esta lei, ao invés de prevenir e combater o crime ambiental, vai incentivar. Portanto, legaliza o que é ilegal.
A coordenadora de políticas pública afirma que de alguma forma os Deputados, ao aprovarem essa lei lá e passarem isso para o Senado, passam um recado para nós, para o povo brasileiro, de que vale a pena invadir, desmatar, queimar terra pública, porque depois vem a lei e favorece a regularização daquilo que já foi destruído no nosso meio ambiente.
Portanto, a gente considera que esse projeto de lei, que está também igual ao outro, ao 510, abrirá caminho para a invasão de terras públicas por grileiros e criminosos ambientais e facilitará a legalização de invasões onde há comunidades tradicionais indígenas e quilombolas.
R
Nós que estamos aqui na Amazônia acompanhamos sempre com apreensão o crescimento do desmatamento na Amazônia. Só, por exemplo, nos últimos 11 meses, com dados que eu tenho aqui somente de até junho de 2021, foi 51% a mais de desmatamento na Amazônia nos últimos 11 meses, dados que se encontram na página do Imazon. Foram 8.381 quilômetros quadrados de desmatamento, 51% a mais do que houve de desmatamento já em 2020.
Então, nós acreditamos que esse Projeto de Lei 2.633 - e o outro que está em discussão no Senado, o 510 - não vai, na minha opinião, ajudar a resolver os problemas do campo, os problemas dos pequenos agricultores, dos assentados, dos posseiros; pelo contrário, vai fazer com que haja risco de que um pequeno agricultor, um posseiro, um assentado que está lutando pela terra sofra mais ainda, perdendo espaço para o que disse o Senador Jaques Wagner, para os grandes, para aqueles que querem conquistar um maior pedaço de terra, assim como o projeto de lei que foi agora aprovado na Câmara dos Deputados e que está com os senhores e com as senhoras no Senado.
Inclusive eu vou ler aqui o que está na página da própria Câmara. Está escrito lá na agência Câmara de notícias:
[...] [Essa proposta] aumenta o tamanho de terras da União passíveis de regularização sem vistoria prévia, bastando a análise de documentos e de declaração do ocupante de que segue a legislação ambiental.
Isso, para nós, é muito perigoso, ou seja, basta a pessoa dizer "eu sou o dono desta terra e eu quero regularizar esta terra" e não ter nenhum tipo de acompanhamento nem algo que prove que de fato ele é possuidor daquela terra. A declaração simplesmente de garantir já a regularização vai trazer, com certeza, muitos problemas para os pequenos agricultores, aqueles que estão buscando a terra, lutando pela terra.
Ainda está na agência Câmara de notícias:
A proposta passa de 4 para 6 módulos fiscais o tamanho da propriedade ocupada que poderá ser regularizada com dispensa de vistoria pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
[...] estabelece novas regras para a Lei 11.952 [...] de 2019, que valerão para imóveis da União e do Incra em todo o País em vez de apenas os localizados na Amazônia Legal, como [...] [está até agora].
[...] [Portanto], a regularização de imóveis com base nessa lei poderá beneficiar inclusive posseiros multados por infração ao meio ambiente, se for atendida qualquer uma destas condições [...] [que a própria lei já cita lá para poder fazer a regularização].
Então, quero também aqui dizer que nós concordamos plenamente com o que foi postado pelo Observatório do Clima, de que esta Lei 2.633 é "totalmente desnecessária, uma vez que a legislação atual [a 11.952, de 2009 - eu falei 2019, mas é de 2009] já prevê regras mais flexíveis para ocupações de até quatro módulos", como lembrou o Senador Jaques Wagner. É uma lei que a gente considera ser "irresponsável, que estimulará novas ocupações de áreas públicas e mais desmatamento". Diz aqui o Observatório do Clima, e nós concordamos, que é uma lei criminosa porque é direcionada a respaldar a grilagem de terras.
R
Então, a nossa posição vai também de acordo com o que está na posição do SOS Mata Atlântica, que disse que esse Projeto de Lei 2.633 continua nos mantendo na contramão da história. Nós fomos deslocados da ciência, da participação da sociedade, não houve uma discussão, quer dizer, no projeto de lei, aprovado na Câmara e que está em discussão agora no Senado, está havendo essas audiências públicas com um número limitado de pessoas, mas ele requereria uma discussão mais ampla, mais aberta, com a participação da população e, no tempo da pandemia, isso não era possível. Então, o que foi feito na Câmara, aprovando essa lei, passando para o Senado e, agora, estando com V. Exas., esse projeto de lei deveria ser interrompido, tirado de pauta e ser feita uma ampla discussão no Brasil, ouvindo, inclusive, os que estão buscando a terra, os pequenos agricultores, repito, os posseiros, aqueles que esperam a reforma agrária e não conseguem a posse da terra oficialmente.
Aliás, a reforma agrária está parada já há um bom tempo, assim, em termos de regularização mesmo de terras.
Então, acho que a nossa posição com relação a isso tem sido de que o Senado deve devolver, vamos dizer assim, esse projeto de lei para a Câmara dos Deputados, não deve levar adiante, deve interromper esse processo e deve fazer uma abertura depois maior para uma discussão para que, de fato, os pequenos, como disse também o Senador Jaques Wagner, possam ser os primeiros beneficiados. Como está, a gente avalia que não serão os pequenos os beneficiados, porque se fossem, os pequenos, até quatro módulos, já teria sido feito, pela lei atual que já permite isso. Não é necessário ampliar o tamanho de módulos agora.
Sobre o Projeto de Lei 510, que está também em discussão no Senado, a CNBB fez já uma manifestação, como eu dizia antes, no mês de junho, dirigindo uma carta ao Congresso brasileiro, mediante os grandes retrocessos na pauta agrária e socioambiental.
Aqui nós dizemos que esse Projeto 510 é uma atualização daquela Medida Provisória 910, de 2019, que veio lá do Governo Federal e que foi derrubada, vamos dizer assim, não foi votada, caducou e, de repente, eles pegaram a medida provisória do Governo Federal e transformaram em um projeto de lei na Câmara e no Senado. Portanto, é mais uma resposta para que a medida provisória volte e seja aprovada por outro caminho, então, aqui, na nota da CNBB, nós fazemos uma série de considerações para indicar a nossa posição contrária a esse Projeto de Lei 510 também.
Considerando que o caráter de urgência à tramitação [na época] do PL 2633/2020 e do PL 1720/2021 [que estavam em discussão conjuntamente lá na Câmara] retira a possibilidade de sua necessária ampla discussão com todos os setores da sociedade brasileira;
R
Considerando a necessidade de dar voz aos povos da terra e das florestas, sobretudo aos agricultores familiares e comunidades tradicionais que seriam afetados diretamente com os termos do Projeto de Lei 510/2021, no Senado Federal, e os Projetos de Lei 2633/2020 e 1730/2021, na Câmara dos Deputados, que objetivam instaurar novas regras para processos de regularização fundiária, favorecendo a grilagem de terras no Brasil, como também o Projeto de Lei 490/2007, na Câmara dos Deputados, que visa restringir as demarcações de terras indígenas com base na tese do marco temporal [que está em discussão no Supremo Tribunal Federal];
Considerando que a pandemia prejudica o debate das populações vulneráveis mais afetadas, sujeitos de direitos dos projetos de lei em tramitação;
Considerando que a grilagem de terras públicas é responsável por 1/3 (um terço) do desmatamento no Brasil, além de ser promotora de violência no campo brasileiro;
Considerando que os projetos de lei [em discussão, 2.633 e 510, de 2021] atinentes à regularização fundiária flexibilizam procedimentos para a titulação de terras, por meio da autodeclaração e dispensam a exigência de vistoria para a regularização dessas áreas;
Considerando que o crescimento do desmatamento ilegal na Amazônia precisa ser combatido de forma urgente [...];
Considerando que os projetos de lei em pauta possibilitam a titulação de terras com pendências ambientais e alvo de conflitos fundiários, o que favorece pessoas com maiores recursos financeiros em detrimento [dos mais pobres] dos mais vulneráveis;
Considerando que o Projeto de Lei 510/2021 e o Projeto de Lei 2159/2021, no Senado Federal, e os Projetos de Lei 2633/2020 [que está, agora, em discussão com V. Sas.] [...] tratam de patrimônio público que será entregue à iniciativa privada, com tamanho ataque aos biomas [não só aqui ao bioma Amazônia, mas a todos os biomas do Brasil, já que a lei agora amplia, sai da Amazônia Legal para os outros Estados brasileiros, outras regiões; amplia esse ataque aos biomas] e aos seus repetitivos povos [onde esses biomas estão, que são os] verdadeiros guardiões da natureza, sem audiências públicas;
E aí concluímos a nota da CNBB, de 17 de junho, pedindo aos senhores do Congresso Nacional, Câmara dos Deputados e Senado:
Nós, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, conscientes de nossa missão de pastores comprometidos com a vida de todos os seres da Criação, respeitosamente, reivindicamos encarecidamente que se proceda à retirada [desses projetos de lei que estão no Senado] [...] e se favoreça um debate amplo a respeito da regularização fundiária e do licenciamento ambiental, e da preservação da vida das populações indígenas nos seus territórios [e dos que ficam, também dos posseiros, nas suas pequenas posses], considerando, sobretudo, os pleitos apresentados na Carta dos Bispos da Amazônia [a que eu acabei de me referir, no início da minha fala].
R
Então, quero concluir dizendo que nós, como Igreja Católica, nós CNBB, nós Igreja Católica aqui na Amazônia, os bispos da Igreja Católica aqui na Amazônia, somos contra esses Projetos de Lei 2.633 e 510. E solicitamos que esta Comissão, as duas Comissões que aqui se encontram e os demais Senadores e Senadoras pensem na responsabilidade que têm ao aprovarem isso, essas leis, o mal que isso vai fazer à população brasileira, principalmente para a destruição do meio ambiente, porque, como dissemos aqui, regularizar as terras simplesmente pela apresentação de uma pessoa que diz que é proprietário é incentivar realmente que se desmate, que se queime e depois se regularize, e fica assim do mesmo jeito. E a grande parcela da população que precisa da terra e que quer trabalhar na terra fica descoberta, sem proteção e sem amparo.
E o Papa Francisco, para encerrar aqui esta minha fala que está dentro dos 20 minutos, na querida Amazônia, afirma que todas as operações econômicas que visam à destruição - ele falava aqui do bioma Amazônia -, todas essas operações ele diz: "Só tem um nome que a gente pode chamar: injustiça e crime".
E eu gostaria, então, de dizer que esperamos do Senado que ajude a essa injustiça, a esse crime parar aí e não avançar mais.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Nós é que agradecemos, D. José Ionilton, pelas suas colocações.
E volto a colocar aqui a nossa preocupação, que é exatamente com os pequenos, com a agricultura familiar, com o não desmatamento. Com o marco temporal de 2008, de lá para cá não se pode fazer nenhuma regularização fundiária, ou seja, há uma convergência muito grande do que o senhor comentou, o senhor falou, com aquilo que nós esperamos desse relatório. E eu tenho certeza de que o Relator, que está assistindo junto conosco, está muito atento a essas preocupações que V. Sa. muito bem colocou nesta manhã.
Muito obrigado pela sua presença. Depois nós voltaremos para mais uma rodada de conversações.
Passo a palavra agora ao Dr. José Henrique Bernardes Pereira, Assessor Técnico da Comissão Nacional de Assuntos Fundiários da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil.
V. Sa. tem 20 minutos para fazer as suas colocações, mais uma vez agradecendo a sua presença junto conosco nesta manhã de terça-feira.
O SR. JOSÉ HENRIQUE BERNARDES PEREIRA (Para expor. Por videoconferência.) - Bom dia. Bom dia a todos!
Meu nome é José Henrique, sou Assessor Técnico da Comissão de Assuntos Fundiários aqui da CNA. Primeiramente, gostaria de agradecer, em nome da CNA, a entidade máxima representativa dos produtores rurais de todo o Brasil, na pessoa do nosso Presidente, Dr. João Martins. Agradecer ao Senador Acir, ao Senador Jaques Wagner.
Para a gente, da CNA, é muito importante este debate, este tema que é fundamental para os produtores rurais, que precisam dessa regularização. Muitos produtores já estão há mais de 30, 40, 50 anos esperando esse título da terra.
Então, eu preparei uma rápida apresentação aqui, Senador, que vou compartilhar aqui com vocês. Por favor, vocês me falem se estão sendo... se está aparecendo aí. (Pausa.)
Todos estão vendo?
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Já está aparecendo.
O SR. JOSÉ HENRIQUE BERNARDES PEREIRA - Vou colocar só em modo apresentação aqui.
Foi? (Pausa.)
R
Então, o que a gente está discutindo no debate aqui na Comissão de Agricultura e na Comissão do Meio Ambiente do Senado Federal são os projetos de lei de regularização fundiária que tramitam. Eu fiz um quadro comparativo aqui, Senadores, sobre os dois Projetos de Lei: o PL 2.633, do Deputado Zé Silva, que foi aprovado na Câmara em agosto, e o PL 510, de 2021, do Senador Irajá.
A gente entende que o PL 2.633, que foi aprovado na Câmara, passou com alguns pontos positivos, até a CMA propôs emendas a ele. E aqui eu destaquei alguns pontos como: a questão da ampliação da possibilidade de estabelecer contratos e convênios com outras instituições, por exemplo, com as Forças Armadas, com entidades de assistência técnica, no seu art. 32; a criação de um sistema informatizado, com vistas a assegurar transparência e o produtor rural ter acesso a todo o seu processo, isso é de suma importância; a autorização da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) de regularizar imóvel de sua propriedade de até quatro módulos fiscais, e isso dá celeridade à regularização fundiária; a questão também da dispensa de assinatura dos confrontantes, quando tem indicação das coordenadas e vértices, que também dá uma celeridade; e a questão principalmente também muito importante que passou foi a revogação do art. 36, da Lei 11.952, de 2009, do Programa Terra Legal, que falava que tinha que ter Zoneamento Ecológico-Econômico para celebrar contratos com a União e regularizar. Então, a gente sabe que o zoneamento é importante, mas muitos Estados não avançaram, a grande maioria, no zoneamento. Então, você lincar isso à questão da regularização fundiária não seria o ideal. Então, isso também foi revogado no PL que passou agora na Câmara.
A gente também trouxe aqui alguns pontos positivos do PL 510, de 2021, que tramita aí no Senado, do Senador Irajá, principalmente em relação ao inciso XI do seu art. 2º, que define a questão da infração ambiental - que é conduta lesiva ao meio ambiente, depois de esgotadas as vias administrativas; a questão da alteração do marco legal para maio de 2012, e a gente entende que essa alteração é benéfica. Por quê? Porque maio de 2012 foi quando foi editado o novo Código Florestal, que é a nossa principal lei de ordenamento territorial no Brasil aprovada. É a Lei nº 11.951, de 2012. Então, você lincar o marco temporal da lei, que é maio de 2012, à regularização fundiária é de suma importância. Ademais, a gente sabe que, de acordo com o Incra, já existem famílias que entraram após o marco temporal atual, que é julho de 2008. Então, têm aproximadamente 7 mil famílias. Seria um problema social. São famílias que já estão produzindo lá. Então, como a gente faria com essas famílias que entraram um pouco depois do marco temporal? Geraria um grande problema social. Então, a gente, o setor produtivo defende desse marco temporal de maio de 2012, que é a data da edição do Código Florestal.
Outra coisa que é de suma importância para a gente é a ampliação do uso da tecnologia do sensoriamento remoto para imóveis de até 2,5 mil hectares. A gente sabe que a tecnologia veio para ficar. Hoje em dia a gente tem imagem de satélite de alta resolução, que a gente consegue verificar se possui cultura efetiva, se possui ocupante e toda a questão de ocupação anterior ao marco temporal, se já havia. Então, é muito importante a gente poder ter essa tecnologia para regularizar tanto os médios, como os pequenos produtores rurais.
Então, a gente, como CNA, destaca esses dois pontos do 510, de 2021.
R
Aqui, eu preparei também uma tabela para a gente ver, porque muita gente fala que os projetos de lei que estão tramitando aí no Senado vão flexibilizar as salvaguardas ambientais.
Aqui, eu fiz um quadro comparativo, rápido, com a lei atual, que é a 11.952, de 2009, que foi regulamentada pelo Decreto 10.592, de 2020, do final do ano passado. Essa é a legislação atual. Aqui, os PLs 2.633, de 2020, e 510, de 2021.
O que a gente pode notar, Srs. Senadores, é que todos os PLs exigem, continuam mantendo a vistoria presencial nestes casos: área embargada ou com infração ambiental. Todos os projetos de lei mantêm essa vistoria.
Conceitua infração ambiental, apenas o 510 o faz, como a gente tinha falado.
Obrigatoriedade de inscrição no CAR ou adesão aos PRAs, se o produtor tiver algum passivo ambiental, todos os PLs contemplam.
Vistoria presencial em casos de indício de fracionamento fraudulento - é obrigatória a vistoria presencial do técnico do Incra.
Vistoria presencial em caso conflito declarado ou registro na Câmara de Conciliação Agrária. Se houver um conflito lá, deve haver a vistoria.
No caso também de ausência de indícios de exploração anterior ao marco temporal, que atualmente é julho de 2008, também todos têm de ter essa vistoria obrigatória.
Então, o que está mudando nos PLs? É só a possibilidade de sensoriamento remoto. Todos podem utilizar sensoriamento remoto até 2,5 mil hectares, que é o quê? É o limite constitucional para um produtor poder requerer terras da União. Depois, pode, mas deve ter anuência do Congresso Nacional, para áreas maiores que 2,5 mil hectares.
Porém, na legislação atual, acima de quatro módulos fiscais, já deve haver a vistoria.
A gente sabe que a Região Amazônica é uma região enorme, com altas extensões de terra, grandes extensões de terras, e é muito difícil. A gente sabe que o Incra tem uma limitação de pessoal.
Então, o que a gente propõe? O 2.633, de 2020, aumentou um pouco esse limite do uso do sensoriamento remoto para até seis módulos fiscais. Só que a gente considera modesto. A gente acha que pode usar, até 2,5 mil hectares, a tecnologia de sensoriamento remoto. Porém, se houver alguma destas questões - infração ambiental, casos de parcelamento irregular da terra, conflito -, há que se fazer a vistoria presencial. Então, isso não, por nenhum motivo, flexibiliza as salvaguardas ambientais.
Outro ponto muito discutido aqui - a gente usou esta tabela com dados do Incra atualizados - é que a gente pode notar aqui o potencial de regularização na região da Amazônia Legal, que é onde concentra o maior número de terra a ser regularizada. O que a gente pode ver aqui, eu destaquei aqui para vocês: até quatro módulos fiscais representam 88% dos títulos. É uma grande quantidade. Então, a Lei 11.952 conseguiria regularizar. Porém, ela representa, como vocês podem notar, apenas 39% da área, ou seja, ficariam 61% da área sem regularização de forma remota.
Se a gente quer o ordenamento territorial da área, se a gente quer realmente destinar essas glebas públicas para a regularização fundiária, para aquele produtor que produz de forma mansa, pacífica e de boa-fé, a gente deve dar essa celeridade, essa regularização, aumentar esse escopo da governança fundiária, que é regularizar os pequenos e os médios produtores rurais.
Aqui, como a gente pode notar, são aproximadamente 160 mil títulos de propriedades que podem ser dados, fornecidos, em uma área de aproximadamente 26 milhões de hectares - esse número apenas na Amazônia Legal.
E por que são importantes os projetos de lei também? Porque eles ampliam. A Lei 11.952, de 2009, fala da regularização de glebas públicas apenas na Amazônia Legal.
R
Os dois Projetos de Lei, tanto o 2.633 como o 510, ampliam para a posse fora da Amazônia Legal, porque a gente sabe que tem aproximadamente 1 milhão de hectares a serem regularizados na Bahia, no Paraná, em Minas Gerais. Então, é importante também essa ampliação, totalizando quase 1 milhão de hectares para serem regularizadas 185 mil ocupações rurais. Por isso que também é importante essa ampliação do número de hectares a serem regularizados.
Eu trouxe para vocês também... Muita gente fala que a regularização fundiária vai incentivar a grilagem de terra, vai incentivar o parcelamento irregular. A Amazônia, pessoal, a gente sabe que tem 500 milhões de hectares. O que a gente está propondo aqui, de acordo com dados do Incra, é regularizar aproximadamente 5% dessa área, que seria em torno de 26 milhões de hectares. Porém, a gente sabe que, de acordo com o Código Florestal, um imóvel na Amazônia tem que preservar 80% da sua área, ou seja, a área real, que seria regularizada com os projetos de lei, representa 1,2% da área da Amazônia Legal, ou seja, 6 milhões de hectares. Então, o que a gente está falando aqui, pessoal? A gente está falando de regularizar, não é derrubada de floresta, não é legalizar grilagens, e sim áreas já consolidadas, muitas glebas públicas já georreferenciadas pelo Incra, com produtores rurais aguardando o seu título, há, pelo menos, muitas vezes, 30, 40, 50 anos, e que precisam receber esse título.
Então, o que a titulação promove, a entrega desse título? Na verdade, ela promove justamente a preservação ambiental. Você vai identificar aquele ocupante, você vai dar o título para ele, vai dar o título da sua propriedade, e ele vai ser responsabilizado. Então, você vai agregar tanto a regularização fundiária como a própria regularização ambiental. Ele vai poder aderir ao CAR, ele vai poder homologar o seu CAR, ele vai poder entrar nos pagamentos de serviços ambientais, ele vai regularizar a sua propriedade como um todo. Mas, para isso, ele precisa regularizar a questão fundiária.
Aqui a gente pode ver - essa é feita pela nossa querida Embrapa territorial - o uso e a ocupação das terras do Brasil. Esse é um dado atual. A gente pode ver que as áreas destinadas à preservação de vegetação nativa, dentro das propriedades rurais, aumentaram aqui: estão em 26,7%. Antigamente, eram aproximadamente 25%, ou seja, os produtores rurais preservam, dentro da sua área - a gente sabe que, na Amazônia Legal, 80% têm que ser preservada -, 26% da vegetação nativa presente no nosso Brasil. E o Brasil ainda preserva 66% da sua mata nativa. Então, o Brasil é um País que preserva e o produtor precisa desse título para continuar preservando.
Então, do que a gente precisa para dar celeridade? A gente precisa da aprovação de uma lei que dê celeridade à emissão de títulos e verbas públicas. Qual é o objetivo disso? Promover a utilização de tecnologias, principalmente o sensoriamento remoto. O Incra lançou, por meio da sua Portaria 1.423, agora em setembro, a sua Plataforma de Gestão Territorial, que vai agregar todos os seus cadastros dentro dessa plataforma. O produtor vai poder dar entrada ao seu pedido de regularização de forma informatizada, de forma digital. Ele vai poder ver lá quais são os documentos que faltam, se falta o georreferenciamento, se falta o documento do Incra na Receita. Então, é um programa muito bom, vai ser um marco para dar celeridade à regularização e a gente tem que usar essa tecnologia a nosso favor.
A gente já utiliza a tecnologia para a questão de multa, para a questão de supressão de vegetação nativa de forma irregular; e por que não utilizar também para a questão da regularização fundiária?
Ela favorece a aplicação da legislação ambiental aos ocupantes, porque você vai conhecer e você vai responsabilizar esses ocupantes que vão receber o título; mantém essa vistoria presencial, conforme eu falei para vocês, em caso de fracionamento fraudulento, em caso de infração ambiental ou embargo ambiental na área - vai continuar a vistoria presencial do Incra -; proporciona maior segurança jurídica e transparência a todo processo de regularização fundiária - essa transparência continua, porque o produtor vai poder ter acesso ao seu processo, então, de forma digital, e o Incra está digitalizando os processos antigos também do Programa Terra Legal -; e aumenta a governança de terras e o ordenamento territorial. A gente sabe que no Brasil a gente tem aproximadamente 55 milhões de hectares não destinados ou sem posse definida. O que isso significa? Significa que são terras de ninguém. Então, é importante para a governança de terra no País e para o ordenamento territorial a gente emitir títulos para esses produtores que possuem a posse mansa, pacífica, de boa-fé dentro do marco temporal, justamente para dar destinação a essas glebas, porque terra sem lei facilita a invasão de grileiros, de pessoas que querem trabalhar à margem da lei. Então, se a gente destinar essas terras aos produtores rurais, àqueles que trabalham, que mantêm sua terra de forma digna, que querem continuar produzindo, que querem ter acesso ao crédito, a gente precisa fornecer o título a esses produtores rurais.
R
Então, aqui, eu coloquei este eslaide final, Senador Acir, Senador Jaques Wagner: prioridades do agro brasileiro. Por que eu coloquei a regularização fundiária em cima? Porque a regularização fundiária, como fala o nosso querido Evaristo de Miranda, Chefe da Embrapa Territorial, é a mãe de todas as batalhas. Se a gente não consegue a regularização fundiária, o produtor não consegue o quê? Acesso ao crédito. O produtor não consegue a valorização da sua terra, a diminuição da pobreza. O IDH da Região Amazônica é baixo. Se você pegar o IDH da região rural da Amazônia Legal, é muito baixo, é nível de países da África. Então, o produtor precisa ter essa valorização do seu patrimônio. Com o título da propriedade, ele vai valorizar o seu patrimônio.
Regularização ambiental. O produtor pode realizar o CAR com a posse? Pode, mas, quando ele começar a ter acesso ao pagamento de serviços ambientais, acesso à cota de reserva legal, ele vai precisar, em algum momento, quando for homologar, do seu título de propriedade.
Combate ao desmatamento ilegal. É fundamental ter o título, conhecer aquele ocupante para ver se ele está suprimindo de forma irregular a vegetação nativa. Você vai responsabilizar o produtor rural.
Assistência técnica e gerencial. O produtor rural, muitas vezes, utiliza técnicas rudimentares na Amazônia porque ele não tem assistência técnica. Com o título da propriedade, ele vai ter a sua assistência técnica.
E, principalmente, também a redução da sua insegurança jurídica. Hoje o produtor tem extremamente essa insegurança por quê? Porque ele não possui o título da sua propriedade, porque muitas vezes tem uma posse ou tem um contrato de gaveta, está lá há muitos anos trabalhando, tentando, mas não consegue evoluir por conta... Como eu falei aqui, tudo vai depender da regularização fundiária.
Então, Senadores, a mensagem final que eu passo aqui para vocês é que a gente não pode fazer uma lei pensando em quem trabalha à margem da lei, quem grila terra, quem faz crime, quem invade terra pública. A gente tem que pensar na lei para aquele produtor de boa-fé, que possui a sua posse mansa e pacífica. Então, esse é o recado final aqui da CNA. Coloco-me à disposição dos Senadores para possíveis dúvidas no final.
Muito obrigado, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Nós que lhe agradecemos, José Henrique, pela sua participação.
Passo a palavra agora ao Dr. Júlio José Araújo Júnior, Procurador da República no Rio de Janeiro e Coordenador do Grupo de Trabalho de Reforma Agrária e Conflitos Fundiários da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão.
R
V. Sa. tem 20 minutos para fazer as colocações, mais uma vez, agradecendo a sua presença junto conosco.
O SR. JÚLIO JOSÉ ARAÚJO JÚNIOR (Para expor. Por videoconferência.) - Um bom dia a todos e a todas.
Eu queria, inicialmente, agradecer ao Senador Acir, agradecer ao Senador Jaques Wagner e a todos os Senadores e Senadoras pela oportunidade de debater com os senhores e as senhoras um tema tão importante e tentar dialogar e contribuir para alguns pontos que nós consideramos fundamentais nesta discussão.
Quero saudar aqui os colegas e a colega que debatem comigo, que trazem pontos aqui sobre os PLs, sobre a discussão da regularização fundiária. Eu entendo que é fundamental no debate legislativo que a gente tenha oportunidades como esta e, infelizmente, já faz algum tempo que não temos a condição de dar uma amplitude à participação e ao aprofundamento das discussões, apesar de todos os esforços que vêm sendo feitos em todas as Comissões.
Como foi dito, eu sou Coordenador do Grupo de Trabalho Reforma Agrária e Conflitos Fundiários da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão. Nós temos acompanhado esse debate desde antes, mas, a partir da MP nº 910, com muita atenção. Elaboramos já três notas técnicas sobre o tema, temos organizado discussões sobre isso. E, também, eu sou Diretor da Associação Nacional dos Procuradores da República e nós temos, também, promovido encontros e discussões sobre a questão da grilagem, da regularização num enfoque mais amplo, mas pensando, principalmente, na Região Amazônica. Recentemente, nós fizemos um encontro sobre a proteção socioambiental da Amazônia e o papel do Ministério Público Federal.
Alguns pontos que eu vou trazer aqui acho que são fruto, um pouco, dessa discussão que nós fizemos recentemente com especialistas, com os povos da floresta e refletem um pouco alguns problemas do debate. Às vezes, parece que estamos falando a mesma língua, mas não exatamente estamos. Embora eu respeite muito as finalidades, as percepções de todos e todas aqui, é necessário, no meu entender, e é fundamental dar um passo atrás para que a gente pense essa questão à luz de alguns pontos e, principalmente, à luz das diretrizes constitucionais sobre essa matéria e à luz duma situação fática que é um cenário histórico de omissão dos órgãos e falta de governança e transparência no enfrentamento à grilagem, recolocando e posicionando adequadamente o tema da regularização fundiária à luz de outras políticas públicas constitucionais.
É natural que a gente discuta o amplo papel a ser adotado na efetivação de preceitos constitucionais, e, hoje, aniversário da Constituição, da promulgação da Constituição, 33 anos, eu não posso deixar de colocar o debate nesses termos. E aí, é claro, sem deixar de analisar questões concretas e pontuais que foram mencionadas aqui, como as políticas que já estão em curso, inclusive o próprio Titula Brasil.
Então, eu pensei em organizar e trazer aqui três partes na minha exposição.
R
A primeira ressaltando alguns aspectos da Constituição que nos guiam, que são necessários. A gente não pode abrir mão desse debate para pensar a produção normativa e a produção legislativa. Então, esse é o primeiro ponto.
Na sequência, vou colocar todo esse debate sobre o chamado caos fundiário, como o Professor Jerônimo Treccani ressalta, da Universidade Federal do Pará, e a necessidade de um ordenamento territorial; e problemas clássicos e sérios da fiscalização, esses, sim, um problema central nessa discussão.
E, como terceiro ponto, quero ressaltar, aí sim, a análise concreta de alguns pontos, de algumas propostas, que estão no 2.633 e no 510, e relatar algumas experiências nossas do GT no debate sobre o Titula Brasil, que é um programa cuja execução nos preocupa pela falta de certos parâmetros normativos e reguladores que nós gostaríamos de compartilhar aqui com os senhores. Imagino que a discussão do PL também seja fundamental para isso.
Bom, pensando aqui na Constituição de 88, a nossa jovem aniversariante, como eu disse, é fundamental para a gente pensar a realidade, a destinação das terras públicas e o programa constitucional do ordenamento territorial. Não tem como fugir da orientação constitucional e do princípio republicano que nos orienta, enquanto análise criteriosa, na destinação do patrimônio público.
É fundamental a gente pensar aquilo que nós chamamos de regularização, que é algo importante, principalmente pensando nessa lógica que nós mencionamos aqui dos pequenos, daqueles que produzem, e ninguém é contra esse tipo de perspectiva, mas pensarmos isso como uma lógica restritiva, uma lógica de exceção, no sentido de que existe todo um programa constitucional de ordenamento territorial, de ordenação territorial, e a regularização fundiária deve estar focada no atendimento dessas situações que transbordam nesse cenário, por conta de situações consolidadas ao longo do tempo. E isso é importante para a gente reorientar esse debate e não pensar a questão a partir da regularização fundiária como um programa ou como uma diretriz, e sim como um aspecto complementar nessa discussão em que as políticas públicas e as ordenações territoriais previstas na Constituição, essas sim, devem ser encaradas como prioridade.
E aí é inevitável a gente diferenciar que regularização fundiária, nos termos da 11.952 e dos próprios PLs, não se confunde com assentamento ou com o atendimento dos beneficiários da reforma agrária, por exemplo. E esse programa constitucional de ordenação territorial nos coloca, no campo das terras públicas, no enfrentamento à chamada realidade do estoque de terras. Afinal, qual é o estoque de terras públicas que nós temos para destinação e atendimento dos programas constitucionais?
E nisso é fundamental a gente pensar numa ideia, num conceito jurídico, que é o dever de proteção suficiente aos bens jurídicos fundamentais que a Constituição enuncia e, principalmente, na questão da função social da propriedade privada ou pública, para que a gente pense as políticas de reforma agrária, a demarcação dos territórios, populações tradicionais, a proteção ambiental dos espaços diferenciados... Tudo isso é fundamental para a gente olhar e pensar como o fato de que as áreas não destinadas são justamente os espaços onde o ataque e as violações ambientais têm ocorrido mais. A não destinação de áreas, nos termos da ordenação territorial prevista na Constituição, tem relação intrínseca com os desmatamentos e com as violações ambientais, conforme mostram os estudos do Imazon.
R
Então, mais do que estimular a regularização fundiária, que é a chancela de processos de invasão e ocupação ilegais de terras públicas, é necessário que a gente prestigie e garanta a ordenação territorial. Mas, para isso, é necessário que a gente identifique o quantitativo de terras incorporadas ao patrimônio público, que a gente identifique a destinação constitucional, a quem foram destinadas e qual o tamanho.
E, aí, a gente entra num problema crucial, que acho que o PL não resolve, que deveria ser a prioridade, que é justamente a questão da governança e da organização dos dados, a transparência nas informações e a participação e o controle social. Eu vejo que, quando a gente deixa de pensar a questão à luz da Constituição e à luz das indicações da Constituição, a gente acaba focando e invertendo a lógica para pensar na legitimação de cenários que, muitas vezes, não mereceriam esse tipo de chancela, principalmente pelo fato de gerarem tanto vulnerabilidade ao patrimônio público como ao meio ambiente.
Isso nos leva ao segundo ponto, esse ponto do chamado caos fundiário do ordenamento territorial. A grilagem de terras, como a gente conhece, é um problema conhecido e que até indica possibilidades de enfrentamento pela própria legislação. A gente pode citar, inclusive, a Lei nº 10.267. Mas o fato é que, apesar da existência da legislação, hoje a gente tem um problema na fiscalização, que é ineficaz, e na organização da governança e do enfrentamento desse cenário, tanto na identificação de terras como na adoção de medidas para a destinação dos territórios.
E, na Amazônia, como eu disse, nas palavras do Professor Jerônimo Treccani, reina o caos fundiário, em que boa parte desses territórios não está georreferenciada, cerca de 50%, e que há mais papel do que terra em muitas regiões. E isso são levantamentos de Corregedorias de Tribunais de Justiça que indicam que há sobreposições, que há indicações de cenários em que todo esse caos acaba favorecendo uma situação em que nós não sabemos, afinal, de quem são e a quem se destinam esses territórios, isso associado a um cenário de omissão na concretização de políticas extremamente relevantes.
Com a governança fraca, como eu disse, que é muito mencionada, por exemplo, pelo Instituto Imazon, a gente acaba ficando num cenário de fragilidade nesses pontos, o que nos impõe justamente ter esse ponto como prioridade. Nosso principal desafio, nós entendemos, está em trabalhar a governança, em trabalhar a fiscalização para garantir efetivamente a destinação das áreas, efetivamente um mapa concreto e adequado sobre o tema. Isso sob pena de, ao ficarmos trabalhando numa lógica de chancela de situações irregulares, a gente acabar estimulando, cada vez mais, a invasão de terras públicas e a violação de questões ambientais.
E, aí, não tem como não discutir, não debater as conclusões que o Tribunal de Contas da União já teve sobre o Programa Terra Legal, ao analisar a questão da Amazônia Legal, e rebater uma ideia de que o projeto, de certa forma, seria uma forma de atender as recomendações do TCU.
R
O TCU falou justamente da falta de providências para a recuperação de recursos em áreas irregularmente ocupadas, destacou a falta de providências para a retomada e destinação de terras em imóveis rurais do Programa Terra Legal, a falta de fiscalização das cláusulas resolutivas e o desmatamento como um problema extremamente atrelado a esse fenômeno.
Então, não dá para a gente pensar como solução para um problema já constatado e já consolidado a gente empurrar a marcha para criar novas leis que facilitem ainda mais a regularização. Eu não consigo imaginar como uma lógica de desregulamentação pode ser eficaz no fortalecimento da fiscalização e da garantia da integridade dessas terras públicas. Entendo, sim, a necessidade de debatermos e discutirmos e concretizarmos os processos de regularização fundiária pendentes em discussões sobre as áreas com até quatro módulos fiscais, mas não consigo imaginar como a manutenção desse ciclo em que se ocupa, se invade uma terra pública, há o desmatamento para sinalizar essa ocupação, na sequência, os pedidos de titulação e, depois, a tendência de mudar a lei para chancelar esses processos, não entendo como isso, como a manutenção desse ciclo pode nos ajudar a enfrentar esse problema. E essa frente é a que está presente na Medida Provisória 910 e nesses projetos de lei.
A outra frente que eu considero também complicada diz respeito ao Programa Titula Brasil e a medidas que vêm sendo adotadas pelo Incra no âmbito da regularização, da certificação de regularidades em ocupações. À margem do processo legislativo se tenta intensificar e acelerar e estimular esses processos, e eu acho que, como a gente vai ver na sequência, o fato de não termos uma engrenagem, uma regulação muito clara sobre tudo isso, na verdade, não atinge esse objetivo de garantir a regularização fundiária dos pequenos como enfrentamento do cenário de grilagem.
É por isso que eu digo que nós não estamos falando, infelizmente, as mesmas coisas. Entendo todas as preocupações com os pequenos, e elas são fundadas e relevantes, e acho que ninguém é contra isso, mas acho que temos que olhar para a destinação constitucional como uma prioridade, a partir dali, identificar os problemas históricos que estão documentos e são apresentados por órgãos oficiais, para, na sequência, aí, sim, discutirmos as propostas, discutirmos os efeitos que os projetos de lei têm nessas realidades.
E tanto no projeto de lei como no próprio Titula Brasil, como a gente vai discutir, eu posso adiantar aspectos extremamente complicados que a gente precisa estudar: a capacidade institucional dos Municípios para conduzir esse tipo de trabalho, o que não se resolve pela capacitação, dada a expertise e a necessidade do acompanhamento de órgãos federais; a necessidade de impessoalidade na condução desses programas; e a observância de critérios socioambientais claros, além da observação e respeito aos territórios de povos e comunidades tradicionais.
Tudo isso me parece extremamente relevante para discutir desde já, porque são temas que estão regulados de forma infralegal e, de certa forma, acabam por fragilizar todo esse regime a que a gente está assistindo e fragiliza o próprio debate da legislação que está sendo discutida aqui, no Senado.
R
Eu passo, então, para a última parte da minha exposição para analisar alguns pontos dos Projetos, o 2.633, aprovado na Câmara, e o 510, de certa forma levantando alguns pontos e tentando dialogar com os senhores e com as senhoras.
Como eu disse, essa lógica da substituição de normas, que é um tema que a gente já vem abordando em outras reuniões e audiências, não traz segurança jurídica nem constitui uma medida de justiça de transição, tendo em vista que o incentivo do passado do Estado brasileiro é a ocupação, o que não significa que as normas de regularização fundiária já existentes não devam ser aplicadas. Acho que uma coisa é essa lógica de sucessão de normas, outra coisa é a gente pensar a adequação do atendimento dessas finalidades juntamente com a ordenação territorial.
Nesse ponto, aí a gente entra em alguns aspectos que são sempre muito debatidos nos projetos de lei e que eu considero aqui relevantes. Um deles é a chamada dispensa de vistoria que aparece e é estímulo ao sensoriamento remoto e a dificuldade que nós temos aqui de colocar esse debate nesse momento, ainda mais num contexto, infelizmente, em que os conflitos possessórios, os conflitos que estão colocados muitas vezes como um critério para a vistoria não vêm sendo tratados dessa forma e de forma adequada pelo Poder Executivo.
É importante a gente levar em consideração que hoje muitas vezes o Poder Executivo Federal não desenvolve interlocução com diversos grupos que estão atingidos pelos conflitos possessórios, o que torna, o que transforma esses chamados conflitos possessórios em não conflitos. Então, nós temos uma massa e um mapa de casos de território que, se a gente subordinar as câmaras de conciliação agrária e a Câmara de Conciliação Agrária do Incra, simplesmente vai estar invisível.
Então, eu penso que, em relação a essa lógica da dispensa de vistoria para além do que a gente já debateu sobre o sensoriamento remoto e as dificuldades que se colocam, nós temos que olhar com muita serenidade esse debate sobre a dispensa de vistoria e sobre o impacto que isso gera em relação a esse processo simplificado, ainda mais pensando nessa lógica até seis módulos fiscais, o que claramente, no nosso entender, é um excesso.
Em relação ao marco temporal, a Câmara avançou em relação ao reconhecimento até 2008, porém é necessário também destacar o art. 38 e a possibilidade de alienação de terras públicas, sem considerar esse marco temporal que para nós pode configurar uma anistia por tempo indeterminado. E esse tema que está presente no art. 38, inciso I, §1º, eu acho que é um tema extremamente importante.
Outro tema que nos preocupa, e também à luz da diretriz constitucional que eu mencionei, é a realidade dos direitos territoriais dos povos e comunidades tradicionais, porque nós vivemos hoje um cenário em que se tenta restringir o conceito dos territórios, de terras indígenas, por exemplo, como se o reconhecimento desse direito só ocorresse ao final de processos administrativos de titulação, de demarcação, o que contraria a jurisprudência, a Constituição, claro, nossa aniversariante, mas também a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal nessa matéria, já que há um direito originário, há o reconhecimento de situações que limitam e que de certa forma têm preponderância sobre a propriedade privada, de modo que toda a regulação que foi pensada para o PL em relação aos direitos territoriais, em que há uma afetação dos direitos dos povos de comunidades tradicionais, gera um risco.
R
Por que gera um risco? Se você não tem esses territórios formalmente titulados ou demarcados - isso já vem acontecendo no Titula Brasil e é uma preocupação da gente -, se você não tem isso formalmente demarcado ou reconhecido ou até tratado sob uma lógica, como a Funai apresenta na Instrução Normativa nº 9, que restringe o conceito desses territórios, há grande chance de eles ficarem num limbo e não serem considerados na hora em que houver a titulação e a destinação de glebas.
Com isso, nós vamos reproduzir um processo histórico em que se avança sobre esses territórios, e, lá na frente, quando se buscar a titulação, o registro - e esperamos que as políticas voltem a caminhar neste campo -, que isso seja tratado como fato consumado, porque a presença de pessoas muitas vezes de boa-fé, legitimada pelo Estado, vai impedir a demarcação desses territórios.
Esse é um ponto importante para o que eu acho que não podemos deixar de olhar.
Outro ponto diz respeito à consulta aos órgãos no âmbito das câmaras de destinação e regularização fundiária. O prazo fatal é em relação à presunção de oposição contra regularização. Nesse contexto, para nós, é muito cruel, é muito duro dada uma situação em que esses órgãos adotam e vêm adotando conceitos restritivos e inconstitucionais em relação a esses territórios.
Mas ainda que não houvesse concretamente esse tipo de postura, é temerário você subordinar o reconhecimento desses territórios e dessas áreas a manifestações da burocracia, como se a mera omissão da burocracia pudesse implicar a negação desses direitos.
Além disso, a previsão de um prazo para a conclusão em relação à questão, no caso, um prazo de 180 dias, para que se resolva a questão do território, da mesma forma não atende a esse cenário, já que são direitos que independem dessa constituição, desse caráter constitutivo.
Então, reconheço alguma preocupação em resolver esses problemas, mas é necessário ter como premissa um reconhecimento prévio no campo dos direitos territoriais e não só nos direitos territoriais, mas também no âmbito dos projetos de assentamento, da implementação da reforma agrária, dada a proteção da confiança legítima que envolve o sistema.
Por fim, encaminhando para o final, quero falar um pouco de Titula Brasil. O PL indica uma transferência a um regulamento para lidar com esta questão. O problema é que o nosso regulamento, que existe hoje, é um regulamento extremamente vago, a partir da portaria que instituiu o Titula Brasil, além da Instrução Normativa 105, do Incra, em que há pontos muito complicados para os quais a lei pode muito bem apontar diretrizes claras para evitar furos e problemas, que nós já constatamos.
Várias recomendações do Ministério Público Federal, no Brasil inteiro, já têm apresentado aos Municípios a necessidade de observar critérios, direitos e deveres extremamente relevantes. Primeiro, a publicidade na condução do programa, que é precária; segundo, na questão da necessidade de manifestação expressa dos órgãos antes da destinação das glebas; há a necessidade de atuação por agentes públicos efetivos do quadro, para evitar a contaminação desses processos por interesses locais ou a tentativa de tratar a questão da destinação do patrimônio público de forma não republicana; a aplicação de regras de suspeição e impedimento dos agentes; e a participação social no controle dessas atividades.
R
O Titula Brasil, do jeito que está hoje, associado a esse projeto de lei, representaria uma clara fragilização nesse controle em relação à grilagem e à destinação das terras públicas no ordenamento territorial.
Só para fechar, com o perdão mais uma vez, em relação ao PL 510, nós não concordamos com a discussão sobre alteração de marco temporal e sobre a flexibilização de requisitos para a regularização. Entendemos que o conceito de infração ambiental tenta inovar num tema que já tem uma consolidação de conceituação, além disso, a necessidade do esgotamento de vias administrativas no campo ambiental também representaria uma clara fragilização.
O Brasil precisa reforçar o seu compromisso com a proteção ambiental e a proteção da Amazônia, e vejo que a questão do procedimento simplificado, para imóveis até 2,5 mil hectares, certamente vai enfraquecer essas salvaguardas ambientais.
Meu tempo esgotou.
Eu agradeço muito esta oportunidade. Estamos à disposição para esse debate. Entendemos os diversos pontos que estão aqui, mas peço aos Senadores e às Senadoras que, de fato, considerem diversos pontos que são trazidos aqui para que realmente o projeto de lei, um projeto de lei sobre esse tema, de fato, beneficie os pequenos e atenda as diretrizes da nossa Constituição de 88.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Nós é que agradecemos a sua presença, Dr. Júlio.
Passo a palavra agora à Dra. Júlia Bittencourt Afflalo para fazer as suas colocações, Consultora Jurídica da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).
V. Sa. tem 20 minutos para fazer as suas colocações, mais uma vez agradecendo a sua presença junto conosco.
A SRA. JULIA BITTENCOURT AFFLALO (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigada, Sr. Presidente.
Bom dia ao senhor! Bom dia ao Senador Jaques Wagner, também Presidente de uma das Comissões aqui em que estamos debatendo.
Inclusive quero ressaltar o amplo debate que a Casa está permitindo, discordando um pouco do que foi trazido, já nesta reunião, a respeito desse debate. O debate tem sido amplo e tem se dado inclusive desde a edição da MP 910, não apenas pelos Parlamentares, mas também por entidades da sociedade civil, tanto nesta Casa, como na Câmara dos Deputados também.
O próprio Senador Acir mencionou dados que o Presidente do Incra trouxe, inclusive em uma das audiências públicas realizadas sobre o tema. Então, não há uma carência de debate, a meu ver, ao menos.
Bom, eu vou, a fim de começar aqui a minha fala, pegar um gancho do que foi dito a respeito da necessidade de se analisar o tema sob a perspectiva de diretrizes e preceitos constitucionais a respeito dessa distribuição territorial, por assim dizer.
Eu acho que é importante esse aspecto, mas a gente tem que analisar também por que o tema é tão importante para o País. Por que que hoje temos o citado caos fundiário? Por que que o tema de regularização fundiária é até hoje tão debatido? E isso não pode ser feito a partir de uma análise simplesmente do Direito e da Constituição, o que, obviamente, é bastante importante, mas a gente tem que analisar uma situação fática, que vem, desde os primórdios, realmente, desde a colonização do País.
As nossas terras, como todos devem imaginar, ou quem tem familiaridade com o assunto, eram todas concentradas na Coroa; posteriormente, todas concentradas no Império. Então, sempre houve, pela própria história, pelo próprio histórico de colonização do País, uma concentração de terras no poder público. E essa concentração de terras evidentemente traz impactos e consequências até hoje, isso porque essa concentração de terras na União, dado o tamanho continental realmente do País, causou não apenas uma distribuição deficitária da terra, mas uma incapacidade natural e fática do poder público de organizar, de gerir, de explorar e efetivamente fiscalizar esse tanto de terra que ele próprio concentrava.
R
Então, realmente, eu acho muito importante a gente analisar esse ponto, até para fazer um paralelo e rechaçar, no caso, o que vem sendo muito dito a respeito de grilagem de terra e de ações criminosas nesse ponto. Essa incapacidade da União de gerir todas as suas terras, de estar presente em todas as suas terras e de explorar tais terras causou, nos próprios entes da Federação, uma atuação no sentido de incentivar o particular a explorar, o que já foi dito - inclusive, acho que foi o Senador Acir que trouxe isso, pela fala do Presidente Geraldo, do Presidente do Incra. Sempre houve de parte do poder público esse incentivo de exploração e de ocupação do particular nessas terras da União, justamente pela ausência de destinação adequada que a União efetivamente enfrenta nas suas terras. Esse ponto, inclusive, é bem evidenciado e exemplificado no que diz respeito aos títulos que os próprios Estados davam ao particular em terras da União. Isso é, inclusive, um problema grave em alguns Estados. E um dos projetos, o PL 510, vem tentar resolver esse problema. Então, o particular adquiria do próprio ente público, mas, no caso, do Estado, um título que lhe conferia um aparente direito de estar nas terras da União. Então, isso demonstra efetivamente que sempre houve esse aparente respaldo do poder público para essa ocupação do particular em suas terras.
Isso tudo gerou, e é importante que se diga isso a respeito dessa questão novamente de grilagem... Tem que haver uma diferenciação do ocupante para o grileiro. O ocupante tem que atender a diversos requisitos da lei. Inclusive, os projetos trazem uma descrição maior desses requisitos, dessas exigências. Não há, a meu ver, uma desregulamentação, como foi dito aqui. Há, na verdade, uma maior especificação de exigências e de requisitos que o particular deve atender. Mas, de toda forma, esse ocupante, que não se confunde com o grileiro novamente e que muitas vezes vem parar na terra da União por incentivo do poder público, se vê sem título, se vê ocupando a terra de forma adequada, se vê respeitando a legislação, se vê explorando de forma direta e se vê sem título. E como foi dito, inclusive pelo representante da CNA, sem título, há uma grande dificuldade, senão impossibilidade, de acesso ao crédito. Quem tem familiaridade, novamente, nesse assunto sabe que, sem acesso ao crédito, o produtor não financia a sua produção e, sem financiar a sua produção, a atividade econômica efetiva de exploração da terra fica completamente prejudicada, isso sem contar as dificuldades de acesso lá, como, por exemplo, quando é exigido um licenciamento ambiental. E são esses os problemas que os projetos, efetivamente, tentam consertar. Inclusive, acho importante trazer nesse ponto o que o próprio Senador Acir trouxe, da fala novamente do Presidente do Incra: que hoje já seria possível essa regularização a partir da legislação que já está em vigência.
R
Mas aí a gente tem que refletir o seguinte: se isso já é possível, por que existem tantos gargalos, tantos problemas, tantas terras - foi dito que há milhões de hectares - ainda sem titulação e sem regularização? Há algum problema nesse processo. A meu ver, o que caberia realmente ao Congresso Nacional é tentar dar facilitação, celeridade, maior simplificação do processo para que o Poder Executivo, efetivamente, consiga dar vazão a essa demanda, que é imensa e que, às vezes, demora anos, décadas para ser atendida.
Bom, a respeito dos projetos em si, eu acho que é importante a gente pensar, inicialmente, na atualização do texto para que a lei se torne efetivamente uma lei de regularização das terras da União, e não apenas de terras da Amazônia Legal. Foi dito realmente do caos que é vivido de forma mais intensa na Amazônia Legal, mas esse problema da regularização fundiária é um problema nacional. E isso deve ser tratado dessa forma. E os projetos trazem justamente uma atualização da redação nesse sentido, no sentido de unificação.
Bom, a respeito de alguns pontos importantes do mérito, principalmente na questão ambiental, eu acho importante que a gente tenha em mente que é impossível que se relacionem esses projetos a algum retrocesso ambiental, isso por várias razões.
Inicialmente, os projetos de lei trazem de forma, como eu já disse, mais específica os requisitos ambientais que o ocupante deve atender para ter direito a essa regularização fundiária. Então, traz a exigência de inscrição no CAR, traz a exigência de que não tenha infração ambiental ou embargo ambiental. E muito foi dito de estimular o desmatamento. Veja, em uma terra sem título, você não tem o responsável por aquela terra. Não havendo um responsável pela terra, aquele desmatamento não é imputável a ninguém. Eu não vejo como que não titular uma terra ajuda no combate ao desmatamento. Realmente, para mim, é um pouco incongruente.
De toda forma, nesse sentido inclusive, eu acho que é importante a gente ter em mente - com o perdão da palavra - que grileiro é criminoso. O criminoso não quer se responsabilizar por uma terra. O criminoso não quer ter que fazer licenciamento ambiental, não quer ter que fazer inscrição no CAR, não quer ter que fazer plano de manejo ou reflorestamento da vegetação nativa. Nada disso é pauta de criminosos ou grileiros, como é bem trazido aqui.
R
Essa questão ambiental é muito importante para que a gente tenha uma visão mais clara, no meu ponto de vista, sobre o projeto, que não vem sendo discutido de uma forma muito adequada, a meu ver.
Outro ponto também muito trazido que é muito debatido e que, inclusive, contribui para o argumento de grilagem é a respeito da extensão dos imóveis a serem regularizados. Acho que é muito importante que a gente deixe bem claro que, atualmente, pelas disposições constitucionais e pela Lei 11.952, o poder público, no caso, o Incra, tem o poder, por meio do processo de regularização administrativa, de regularizar terras com até 2,5 mil hectares, e isso não é, de forma alguma, discutido ou ampliado ou inovado por nenhum dos projetos. Esse poder já existe, inclusive em razão de disposição constitucional que concede a este Congresso Nacional a competência efetiva para conceder regularização fundiária em terras superiores a 2,5 mil hectares, e isso não é alterado por nenhum dos projetos. O que se discute efetivamente - e é muito importante que isto fique claro - é a forma como é feita a vistoria das áreas. E eu vou aqui ser bem clara: não existe dispensa de vistoria. O que existe é uma diferenciação entre vistoria presencial e vistoria por sensoriamento remoto.
Foi trazida aqui a necessidade de atualização e modernização da lei justamente para andar junto com a modernização do próprio Incra, que hoje conta com instrumentos e medidas muito mais modernos e que tendem a acelerar o processo de regularização. Há, efetivamente, apenas esta diferenciação: vistoria presencial e vistoria por sensoriamento remoto. Não há uma automática regularização apenas por declaração do ocupante. Esse ocupante declara e junta documentos. O próprio Incra pode instruir o processo com documentos. O Presidente do Incra já trouxe aqui a integração entre os sistemas, que tem sido cada vez mais forte, entre os sistemas de órgãos ambientais com o próprio sistema do Incra.
Então, a eventual inadequação de documentos ou insuficiência de documentos pode ser sanada pelo Incra, mas, novamente, nessas hipóteses de inadequação de documentos ou de aparente irregularidade, aparente não atendimento dos requisitos, é nessas hipóteses que, efetivamente, seria necessária uma vistoria presencial, porque, se o ocupante, desde o começo, tem capacidade de demonstrar, por meio de documentos que a lei exige, por meio do sensoriamento remoto, se ele consegue comprovar desde o começo sua exploração efetiva da terra, sua ocupação mansa e pacífica - que, inclusive, é o ponto auge da discussão -, se ele consegue demonstrar tudo isso sem que um servidor do Incra tenha que se deslocar pessoalmente à sua terra ou que isso seja feito via convênio com algum órgão estadual, não me parece... E talvez o próprio princípio da eficiência, que deveria reger a administração pública, desaconselharia essa exigência de vistoria presencial.
R
A exigência de vistoria presencial não me parece que deva ser vinculada ao tamanho da área ou algo nesse sentido, e, sim, a uma incapacidade ou insuficiência de indícios ou de provas que demonstrem o atendimento efetivo dos requisitos legais.
Foi mencionada a grande demanda que o Incra acumula de processos que tramitam durante anos. Então, na minha percepção, se há algo que o Congresso Nacional pode fazer para dar celeridade a esse tipo de processo - isso sem considerar as deficiências do Poder Executivo, que realmente são grandes, são muitas, mas que infelizmente não cabe ao Poder Legislativo resolver -, o que o Poder Legislativo pode fazer efetivamente é conferir maior celeridade a esse processo. E é, a meu ver, o que tem sido feito.
Só para finalizar, eu anotei alguns pontos que os debatedores trouxeram.
A respeito, primeiro, de terras indígenas, esse efetivamente não é um ponto central na discussão. O projeto de regularização fundiária não permite qualquer regularização de particular em terras indígenas, a legislação a respeito disso permanece inalterada e salvaguardada. Realmente, o que tem que ser tido como foco é a celeridade, a simplificação e a modernização da legislação, a fim de que esse problema que já se arrasta por anos e que vem sendo amplamente debatido nesta Casa seja efetivamente resolvido.
Eram esses os meus apontamentos, ressaltando novamente a importância dessa questão da regularização fundiária do setor.
Agradeço novamente o tempo e a disposição que este Congresso Nacional tem dispendido a esse tema.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Nós é que agradecemos, Dra. Julia, pela sua presença e pela sua fala muito oportuna, como as dos demais também.
Pede a palavra o nosso Líder Mecias de Jesus, Senador pelo Republicanos.
Se V. Exa. estiver logado tem a palavra. (Pausa.)
Enquanto isso, eu passo às colocações dos nossos internautas.
O Dr. Angelo Maniero, de São Paulo, pergunta o seguinte: "Por que não colocar novo marco regulatório para REURB para DEZ/2020? Abrangeria mais pessoas, especialmente de baixa renda!"
Deixo para os nossos debatedores responderem.
E os comentários. Ruan Pinheiro, do Rio de Janeiro, diz o seguinte: "A regularização deve ser feita, contudo sem privilégios!"
Angelo Maniero, de São Paulo: "Quando da edição da Lei 13.465/2017 (Lei da REURB) a população não foi devidamente esclarecida sobre o marco regulatório. Necessita revisão!" Bruno Pires, de São Paulo: "Espero que a regularização possa ser feita da forma mais justa e benéfica, para todos os envolvidos, possível."
R
E o Joel de Oliveira, do Rio de Janeiro, diz o seguinte: "Que seja benéfica aos grandes e pequenos 'proprietários'."
São alguns dos comentários que nós recebemos dos nossos internautas, agradecendo a todos pelas suas menções, pelas suas colocações junto a nós.
Muito bem, eu volto agora, numa última rodada, invertendo as falas. Falará primeiro a Dra. Julia, depois o Dr. Júlio, na sequência, o Dr. José e finalizando com D. José Ionilton.
Eu faço uma pequena colocação aqui para os nossos debatedores: se nós criarmos um cronograma de regularização fundiária, começando com os menores, chegando a quatro módulos, depois que terminarmos a regularização de todos aqueles que estão até quatro módulos, nós começarmos a trabalhar com aqueles que ultrapassam os quatro módulos.
Porque a nossa grande preocupação, e eu falei aqui no começo sobre o nosso Estado de Rondônia, é com relação à agricultura familiar. Aqueles agricultores, os pequenos principalmente, de até quatro módulos, que estão assentados há mais de 20, 30, até 40 anos, que não têm ainda a regularização da sua área. Essa é a grande preocupação que todos nós temos.
E é claro que temos um marco regulatório que tem que se manter, 2008. Eu entendo que isso é importante para que a gente possa avançar. E a regularização vai nos dar uma tranquilidade com relação ao meio ambiente também. Quando nós colocamos o CPF de uma pessoa naquela terra, é evidente que o cuidado com relação ao meio ambiente será muito maior. Por isso a importância da regularização fundiária também para a preservação do meio ambiente, para o não desmatamento ilegal.
Isso tudo é muito importante, além de trazer cidadania à nossa população que está nas suas áreas já há muito tempo e precisa dessa regularização. Não é só uma questão de economia, mas é uma questão de reconhecimento do trabalho, é uma questão de cidadania a essas famílias que, no nosso caso de Rondônia, vieram de vários outros Estados e foram atender um chamado do Governo Federal para ocupar e fazer a transformação nas áreas, nesse caso, no Estado de Rondônia. Acontece que foi uma grande reforma agrária na época, só que não houve a última etapa, que é exatamente dar o título ou fazer a regularização fundiária para essas famílias. Essa é a nossa grande preocupação.
Então, se nós pudermos colocar, nesse relatório, e aí, é claro, o Relator, que é o Senador Fávaro, que está nos ouvindo neste momento, se nós fizermos um cronograma, começando dos menores aos maiores, primeiro até os quatro módulos fiscais, e a partir daí, avançar nas demais áreas, que são também importantes para a regularização fundiária.
Bom, volto, então, para fazer as suas colocações finais, e se também tiver, Dra. Julia, alguma pergunta entre os senhores e senhoras debatedores, que possam fazê-lo, sem nenhum problema.
R
Passo a palavra à Dra. Julia Bittencourt Afflalo, para as suas colocações.
Agora, com cinco minutos, doutora.
A SRA. JULIA BITTENCOURT AFFLALO (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigada, Senador.
Bom, eu queria só pontuar a respeito dessa questão dos módulos.
Eu acho importante a gente pautar esse dito cronograma. Realmente, nas informações que o Incra já trouxe em reuniões passadas, que a CNA destacou, novamente, aqui nesta sessão, a respeito efetivamente da demanda relacionada a cada faixa, digamos assim, de áreas que estão aguardando por regularização, considerando também que o módulo fiscal varia no País, assim, de 5 a 110 hectares, se eu não me engano.
Então, esses pontos têm que ser efetivamente levados em conta, considerando também que o projeto traz um procedimento simplificado para regularizações de até um módulo, o que, realmente, nesse sentido, tem sido trazido pela Comissão e pelo Senador, de priorizar aqueles menores e, depois, assim ir seguindo. Mas os dados do Incra, efetivamente, são muito importantes nesse sentido, para que esse trabalho seja feito de forma a atender de forma efetiva àqueles que aguardam há muitos anos na fila aí do processo de regularização fundiária.
Foi feita uma pergunta, não sei se alguém responderá, a respeito da questão da Reurb. Eu só queria destacar que o foco desses projetos que tramitam no Senado é, efetivamente, a regularização de áreas rurais. Então, a Reurb é instrumento diverso, que trata, efetivamente, da regularização urbana, que não é menos importante, de fato, mas que foge um pouco do escopo dessa discussão, hoje, da regularização fundiária em áreas da União.
Bom, são esses os pontos que eu queria trazer, destacando, novamente, a importância de se atender a esses critérios técnicos do Incra a respeito da priorização aí proposta sobre esses processos que aguardam nessa fila.
Muito obrigada, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Muito obrigado, Dra. Julia.
De fato, o debate aqui é mais abrangente com relação à regularização fundiária das áreas rurais. A urbana também é muito importante, precisa acontecer, mas o debate aqui, principalmente, é das terras rurais.
Eu passo a palavra agora ao Senador Fávaro, que é o Relator desta matéria, que pede a palavra para fazer as suas colocações.
Mais uma vez, agradecendo, também, Senador Fávaro. A sua presença é muito importante neste debate para que a gente possa avançar nesse relatório, sendo que esta, na nossa conta, é a última audiência pública e, a partir deste momento, o relatório vai para V. Exa. para fazer o relatório. Depois, nós vamos debater o relatório, com toda paciência e calma.
É importante que todos os Senadores possam ter acesso ao relatório antes do próprio debate, para que a gente possa mostrar toda a transparência com relação a este tema, que é muito importante para todos nós.
Com a palavra o Senador Fávaro.
O SR. CARLOS FÁVARO (PSD - MT. Como Relator. Por videoconferência.) - Sem sombra de dúvida.
Bom dia, Sr. Presidente.
Muito obrigado pela oportunidade.
Desde já, reitero que faço aqui das suas palavras as minhas considerações. Muito provavelmente serei redundante nos meus posicionamentos, com todas as cautelas que o senhor teve com relação ao assunto.
R
Quero agradecer a todos os debatedores, que trouxeram as suas opiniões e os seus entendimentos para que nós possamos aprimorar o nosso parecer, o nosso relatório.
Antes de mais nada, Sr. Presidente, eu gostaria de dizer que, se a legislação atual já fosse suficiente, nós não teríamos centenas de milhares de famílias à espera do título da sua propriedade para poder tocar a sua vida com dignidade, fazer um custeio, um financiamento e avançar. Portanto, é papel do Plenário do Senado Federal, do Congresso Nacional, da Câmara e do Senado debater os temas para que a sociedade tenha a evolução nos problemas relevantes para a sociedade e eles sejam, de fato, solucionados.
Segundo, quero dizer que eu tenho pleno conhecimento do assunto, primeiro, porque sou um agricultor, cheguei a Mato Grosso há 35 anos em um assentamento de reforma agrária, vivi na pele a ausência do poder público e os efeitos que causa a falta do título da terra numa pequena propriedade. Portanto, eu sou conhecedor, na minha história, na minha vida, do que significa a falta do título de propriedade.
Também quero ressaltar, Sr. Presidente, que, em hipótese alguma, no nosso relatório, nós vamos, primeiro, favorecer grileiros, favorecer latifundiários; nós vamos fazer um relatório para ressalvar os direitos de pequenos e médios produtores à regularização fundiária. Até porque a Constituição Federal, como já foi dito aqui no debate, tem o regramento próprio para aqueles que podem, acima de pequenos e médios, adquirir terras públicas, tem um regramento próprio até 2,5 mil hectares.
Segundo, quero deixar também muito claro que não vamos, em hipótese alguma, em hipótese alguma, precarizar o meio ambiente. O mundo todo exige do Brasil e de todos os produtores mundiais responsabilidade ambiental, produzir com sustentabilidade. Portanto, em hipótese alguma, nós vamos, no nosso relatório, empregar qualquer assunto que venha a precarizar o meio ambiente. E isso não é nenhum incômodo, até porque nós devemos, é possível produzir com sustentabilidade. Não há divergência nisso. É mais que isso; é uma obrigação fazê-lo dessa forma.
E, terceiro, nós não pretendemos, no nosso relatório, alterar a linha de corte, o marco temporal. Por mais que eu tenha entendido o grande trabalho feito pelo autor do nosso projeto, o Senador Irajá, fui a fundo estudar esse assunto. Inclusive, tive a oportunidade, conversando com a Bancada do Partido dos Trabalhadores, grandes amigos que tenho, de mostrar ao Senador Paulo Rocha uma preocupação. Eu verifiquei no Pará, por estudos que foram apresentados com imagens de satélite do ano de 2009, por exemplo, do ano de 2010, pequenas propriedades com roçados de um, de um e meio hectare, só que depois do marco temporal de 2008.
Portanto, eles... "Não, porque eu vou manter o marco temporal de 2008". Já estou aqui adiantando uma parte do meu relatório. Só que para onde vão essas pessoas? Não vai ser possível regularizá-los. E para onde eles vão? Para a periferia de Belém? Para a periferia de Santarém?
R
Mas eu entendo que, se nós mudarmos o marco temporal, nós vamos dar um sinal ao mercado: "Continuem invadindo terras públicas que, logo adiante, o Congresso Nacional muda a data de novo, e nós vamos poder fazer nova regularização". Por isso, eu pretendo manter em 2008. Mas nós temos que ter a consciência de que isso pode prejudicar microprodutores, pequenos produtores.
Por último, quero ressaltar que fiquei muito feliz com todas as considerações, me engrandeceu muito ainda mais - já tinha ouvido vários desses debatedores em outra oportunidade - e tenho certeza de que, ao final desta reunião da Comissão de Agricultura e de Meio Ambiente, nós vamos estar mais tranquilos a apresentar um relatório aos nossos pares Senadores para que nós possamos fazer justiça com a regularização fundiária neste País.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Muito obrigado, Senador Carlos Fávaro. Importantes as suas colocações. Tenho certeza de que o seu relatório será bastante equilibrado, como é da sua natureza. E, como conhecedor desta matéria, eu tenho certeza de que nós teremos um relatório que, realmente, vai atender a todos, a toda a população brasileira.
O Dr. Júlio José Araújo Júnior pede desculpas, mas teve que se ausentar. Portanto, passo a palavra, agora, ao Dr. José Henrique Bernardes Pereira, da CNA, por cinco minutos.
O SR. JOSÉ HENRIQUE BERNARDES PEREIRA (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado, Senador Acir; obrigado, Senador Carlos Fávaro, Relator do projeto de lei.
É importante essa questão que o Senador falou do marco temporal. A gente, em nenhum momento, quer incentivar as pessoas a invadirem terra pela mudança do marco temporal, de julho de 2008 para maio de 2002, mas é justamente por conta dessas famílias que o Senador falou aí, que são pequenos e médios produtores, pequenos produtores, na verdade - de acordo com dados do Incra, são aproximadamente 7 mil famílias -, que estão fora do marco temporal. Então, realmente, vai gerar um problema social essa questão do marco temporal. Então, a gente tem que ficar atento a isso, e era justamente para a gente atrelar a questão ambiental à questão fundiária, porque essa data é a data de edição do Código Florestal.
Mas entendo também a preocupação do Senador Carlos Fávaro em manter também o marco temporal de julho de 2008. É importante também passar essa mensagem.
Em relação também à questão que o Senador Acir falou do cronograma, eu entendo igualmente. Conforme a Dra. Júlia falou, as micropropriedades de até um módulo fiscal já vão ter preferência na tramitação e na regularização. Porém, se a gente for fazer um cronograma e falar: "Ah, primeiramente, vai ser até quatro, até seis, até oito", o grande problema é que a gente sabe que existem áreas que têm conflitos, de quatro módulos fiscais, e, muitas vezes, um vizinho dele que tem seis, sete, oito módulos fiscais e não vai ser regularizado. Então, vai ficar... Ou, então, você vai ver seu vizinho, que tem quatro módulos fiscais, ser regularizado, e você, que é vizinho e tem seis, não vai ser.
Então, eu não sei se seria interessante fazer esse cronograma. Eu acho que a gente pode focar os aspectos técnicos, ou seja, há a questão do embargo, na forma da lei; a questão de fracionamento irregular; a questão de a gente ver se há indícios de se há mesmo ocupação anterior ao marco. Então, em tudo isso já há esse corte.
Ademais, nessa nova plataforma do Incra, o Incra vai poder fazer também esses cruzamentos. Se a pessoa estiver dentro de unidade de conservação; se estiver dentro de terra indígena; se tiver no CPF alguma questão de problema com a questão de trabalho de escravo, ele não vai poder regularizar, ele já vai ser cortado ali na parte que é a parte digital da análise. Então, nem vai prosseguir seu processo e isso já faz um corte.
R
Eu creio que a gente pode manter essa questão da possibilidade do sensoriamento remoto até os imóveis de 2,5 mil hectares. A gente sabe que varia o módulo fiscal da Amazônia, de 40 hectares a 110 hectares, com a média de 70 hectares na região. Então, o imóvel de 2,5 mil hectares da Amazônia não tem a mesma dimensão de um imóvel de 2,5 mil na Região Sudeste, por exemplo.
Seriam essas as minhas considerações.
A gente só quer deixar claro, a CNA, que a regularização fundiária é muito importante para os produtores rurais. É uma demanda que já vem de anos. A gente sabe que houve a Lei 11.952, de 2009, mas ela não conseguiu emitir uma gama grande de número de títulos. A gente sabe que ficaram aproximadamente 27 mil títulos a serem emitidos.
Então, é preciso dar celeridade nas emissões. O Governo Federal está fazendo isso. Já há projeto de emitir, até o final de 2022, 300 mil documentos titulatórios, que seriam títulos de domínio e títulos provisórios, que seriam a CRO e o CCU, que podem vir a ser títulos de domínio.
Então, a gente tem que dar essa oportunidade ao produtor que tem a posse mansa, pacífica e de boa-fé de ter esse documento, que é tão importante. Ele é o documento base para ele ter acesso, conforme a gente falou aqui, ao crédito, à assistência, à valoração do seu patrimônio e da sua terra. Isso vai beneficiar a todos, o Estado, o Governo Federal e o Brasil como um todo, e dar destinação também a essas áreas.
Obrigado, Senador.
O SR. JAQUES WAGNER (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA. Pela ordem.) - Senador Acir, só para fazer um comentário sobre a fala do representante da CNA.
Em primeiro lugar, eu acho que ninguém daqui seria leviano de dizer que a CNA, que é uma entidade nacional, de tradição, estaria estimulando qualquer tipo de invasão.
Mas eu gosto sempre de dizer que, às vezes, o ótimo é inimigo do bom e amigo do péssimo. Nós já temos uma lei com 12 anos de existência, que, pelo consultei aqui, é de 2009. Então, são 12 anos de existência. E ainda temos, como foi a sua própria explanação, 88% de títulos demandados com até quatro módulos rurais.
Então, nós estamos falando de uma amplíssima maioria. Eu não estou dizendo que, amanhã ou depois, depois que estiverem regularizados os 88% - eu sei que não são 88% das terras, mas 88% das pessoas -, nós poderemos discutir.
Se a intenção da CNA, na sua exposição - eu não estou contra ela, a princípio, é preciso aprofundar -, é de estender um pouco, esses que estão demandando estão há 30 anos na terra, como acontece em Rondônia, como o Senador Acir falou. Então, até por uma questão de justiça, vamos começar pelos que estão lá já aguardando esse título há tanto tempo e estão no módulo, vamos dizer, previsto, no módulo menor, e, depois, nós podemos fazer.
Eu não estou querendo contestar, nem utilizar do privilégio de estar aqui na mesa, mas só fazer a ponderação, porque me chama a atenção que 21% terras estão em 3% ou 4% dos que pedem título de terra.
Então, era só para esclarecer, porque a gente tem que buscar um processo de conciliação aqui e eu acho que a gente tem a virtude de ter um Relator que é uma pessoa que conhece a área e é extremamente ponderada e equilibrada.
R
Então, só estou querendo esclarecer, não vamos começar a estabelecer antagonismos, vamos tentar ver o que andará mais rápido, porque o que falta é o Incra, e eu não o estou culpando, ter mais gente e ter mais tecnologia, para acelerar esses 88% de títulos que são ainda demandados.
Obrigado, Senador Acir.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Muito obrigado, Senador Jaques Wagner. De fato, é importante a gente dar preferência àquelas pessoas, como eu disse há pouco, que já estão nas suas áreas há muito tempo e que são, na maioria absoluta, falando do Estado de Rondônia, Senador Jaques Wagner, 99% até quatro módulos fiscais; 99% daqueles que precisam do título, que precisam da regularização fundiária, no Estado de Rondônia, 99% são agricultura familiar até quatro módulos - da agricultura familiar, do pequeno, até quatro módulos fiscais.
Então, é importante dar essa preferência, porque são essas pessoas que estão precisando de cidadania, não é só a questão de economia. É claro que, através do título, ele vai ter condições de investir mais na sua área, de recuperar as áreas degradadas, de combater o desmatamento ilegal que, para nós, é prioridade. Aquilo que a gente sempre tem colocado, Senador Jaques Wagner, Senador Carlos Fávaro e os nossos convidados: grilagem é crime. Quando se tem grilagem, desmatamento ilegal, invasão de terras da União, tudo isso é crime, e tem que ser combatido, independentemente de qualquer debate que nós estamos fazendo aqui. Então, é importante todos esses esclarecimentos e também promovermos esse debate nessa linha.
Agradecendo mais uma vez a presença, passo a palavra a D. José Ionilton Lisboa de Oliveira, Bispo da Prelazia de Itacoatiara e Presidente da Comissão Pastoral da Terra, organismo da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Mais uma vez agradecendo a sua presença, passo a palavra para V. Exa.
O SR. JOSÉ IONILTON LISBOA DE OLIVEIRA (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigado, Senador Presidente da Mesa e demais participantes. Uma saudação ao Senador Jaques Wagner. Eu sou baiano e estivemos juntos em algumas atividades lá no interior da Bahia, em Araci.
Quero dizer... Peço aos demais Senadores e Senadoras que também vejam a nota técnica do Núcleo de Avaliação de Políticas Climáticas da PUC-Rio, se é que os senhores e as senhoras não tiveram acesso, eles fazem uma análise muito boa. Esse comparativo que o representante da CNA apresentou aqui também traz um comparativo justamente classificando entre o que é mais retrocesso e menos retrocesso.
Depois a pergunta que a gente pode fazer é quem está por trás desses dois projetos de lei? Quem é que está querendo que isso aconteça de qualquer jeito? Seriam os pequenos agricultores, esses que foram ditos agora, que vão até os quatro módulos, que já está previsto na lei? E aí eu me somo mais uma vez a isso. Eu acho que não precisa de uma nova lei. Vamos aplicar a lei que já existe, já alcança esse número de 88% das terras que estão esperando regularização.
E aproveitando os dados da CNA, 88% corresponde a 39%, ele mesmo apresentou isso, de pequenos agricultores. E os 12% restante vão para 61%, quer dizer, só aí já dá para perceber o grande perigo que existe.
R
E a preocupação nossa vai continuar sendo exatamente esta: não seria esse projeto de lei resposta ao que o então Ministro do Meio Ambiente disse lá na reunião ministerial, que se deveria aproveitar a pandemia para passar a boiada e modificar a legislação para facilitar o avanço para as terras, especialmente aqui na Amazônia? Eu acho que cabe a nós essa reflexão, aos Srs. Senadores e Senadoras. Preocupa-nos a questão do Matopiba, aquela situação de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. A Igreja sempre tem se posicionado contra o avanço nessas terras desses quatro Estados. E solicito que o Senado, a Câmara dos Deputados - o Congresso -possam, aí sim, arquivar esses dois projetos de lei e fazer com que o outro, o 11.952, de 2009, seja então cumprido e alcance o que está previsto ali para depois se discutir o restante.
E concluo dizendo assim: não é hora também de o Congresso - Câmara Federal e o Senado - buscar meios para agilizar então o processo de reforma agrária, fazendo com que as terras cheguem às mãos realmente de quem nelas já está ou quem quer trabalhar na terra, e não favorecer as empresas agrárias, mas favorecer os trabalhadores realmente, os pequenos trabalhadores?
Então, cabe ao Congresso, ao Senado essa importante responsabilidade. Até na fala do Sr. Presidente desta Mesa, agora, neste momento, foi no sentido de que há assentados em Rondônia, salvo engano, esperando há 20, 30, 40 anos, mas a lei já está possibilitando realizar a legalização. Por que não fez? Está na hora de a gente dizer um basta a essas leis que são para a passar a boiada, vamos dizer assim, manter a lei que ainda tem validade e tem mecanismos de apoio na regularização fundiária para os pequenos agricultores e evitar que a gente, aprovando essa lei, abra mecanismos que venham ainda mais facilitar de fato a devastação dos biomas, a invasão das terras dos pequenos agricultores que correm o risco muitas veze de serem expulsos, porque aparece alguém dizendo que é proprietário. Aí vêm as decisões judiciais que fazem com que as pessoas saiam das suas terras.
Eu acho que o Congresso, Senado nesse momento tem uma grande responsabilidade de começar pelos pequenos. Foi dito isso aqui diversas vezes por V. Exas.
Eu quero terminar dizendo: pensem nas pessoas que estão na terra e que têm um pequeno pedaço de terra, que vivem ali, que trabalham ali e que preservam o meio ambiente.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Muito obrigado, D. José Ionilton.
Nós já fizemos a última rodada, mas o Dr. José Henrique Bernardes Pereira pede a palavra e, a bem do debate, eu concedo e, se algum outro debatedor quiser usar da palavra, até para contradizer o que o José Henrique vai falar, nós estaremos à disposição aqui. É só pedir a palavra.
Com a palavra José Henrique Bernardes Pereira.
R
O SR. JOSÉ HENRIQUE BERNARDES PEREIRA (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado, Senador Acir.
Só para fazer uma rápida colocação na fala do D. José - obrigado pela fala, D. José; é muito importante o debate aqui, eu creio que isso é a democracia. Aquela tabela que eu apresentei em relação aos 88% é que 88% das ocupações têm até quatro módulos fiscais, mas os 39% são em relação ao tamanho da área. Ou seja, 88% representam 39% da área, ainda faltarão regularizar 61% do quantitativo da área em relação aos 26 milhões de hectares plausíveis de regularização. Então, aqueles 39% são só em relação à área que representa os 88% de ocupações. Seria só esse comparativo. Ainda faltariam para o ordenamento territorial 61% da área a ser regularizada.
Somente essa colocação, Senador Acir.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - E esses 61% seriam até 2,5 mil hectares? Seria isso, Dr. José Henrique?
O SR. JOSÉ HENRIQUE BERNARDES PEREIRA - Exatamente, exatamente, na verdade seriam até 15 módulos fiscais. Até 2,5 mil hectares, exatamente.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Porque é até onde chega a autorização da Constituição, até 2,5 mil hectares. Só para deixar claro, é isso mesmo?
O SR. JOSÉ HENRIQUE BERNARDES PEREIRA - Isso, exatamente.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Muito bem.
Passo a palavra a D. José Ionilton, que pede para fazer o contraponto.
Muito obrigado.
O SR. JOSÉ IONILTON LISBOA DE OLIVEIRA (Para expor. Por videoconferência.) - É só para dizer que está entendido isso mesmo, apenas eu quis mostrar que 88% estão com os pequenos agricultores, pelos próprios dados apresentados aqui, o restante ficaria para as médias e grandes propriedades.
E eu acho que nós da Igreja, nós da CPT, nós que trabalhamos junto aos pequenos agricultores queremos que a lei não seja agora alterada e que permaneça com condições de fazer a regularização fundiária sem precisar alterar essas outras coisas que nós consideramos realmente, neste momento, bastante perniciosas para a nossa população, o nosso povo, e para a preservação do meio ambiente, pelo que nós temos tanto que fazer para melhorar a nossa imagem fora do Brasil, que, no momento, está muito desgastada.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Muito obrigado, D. José.
Passo a palavra, também a pedido, para a Dra. Julia Bittencourt.
A SRA. JULIA BITTENCOURT AFFLALO (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigada, Senador.
Eu só queria novamente deixar bem esclarecido este ponto: tanto o PL 2.633 quanto o 510 - no caso, o 2.633 até seis módulos e o 510 até 2,5 mil hectares -, não há qualquer expansão ou ampliação da área a ser regularizada. Acho importante que a gente entenda isso. O que vai ser alterado diz respeito aos procedimentos internos do Incra, procedimentos de vistoria, procedimentos nesse sentido. Então, tem que haver este esclarecimento, este entendimento por parte de todo mundo que está debatendo esse assunto: nenhum dos projetos amplia, aumenta ou tem a intenção de privilegiar os grandes lotes fundiários ou algo nesse sentido. Inclusive essa priorização de terras a serem regularizadas pode ser debatida num regulamento do próprio Incra, mas para deixar esclarecido que não há por parte de nenhum dos projetos essa pretensão de aumento ou de favorecimento dos maiores.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - RO) - Muito obrigado, Dra. Julia.
Mais uma vez agradeço as presenças e as falas de D. José Ionilton Lisboa de Oliveira, Dr. José Henrique Bernardes Pereira, Dr. Júlio José Araújo Júnior e da Dra. Julia Bittencourt Afflalo. E também agradeço a presença dos Senadores: Senadora Rose de Freitas, Senador Esperidião Amin, Senador Carlos Fávaro, Senador Izalci Lucas, Senador Plínio Valério, Senador Angelo Coronel, Senador Luiz do Carmo, Senador Mecias de Jesus, Senador Wellington Fagundes, Senador Vanderlan Cardoso, Senador Nelsinho Trad e Senador Marcelo Castro.
R
E também, claro, dividindo esta Mesa, o Presidente da CMA, Senador Jaques Wagner, ao qual eu pergunto se tem alguma colocação. (Pausa.)
Não.
Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada esta reunião.
(Iniciada às 8 horas e 04 minutos, a reunião é encerrada às 10 horas e 13 minutos.)