14/03/2024 - 2ª - Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL. Fala da Presidência.) - Havendo número regimental, declaro aberta a 2ª Reunião da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura.
Conforme pauta publicada, a reunião será dedicada a audiência pública, em atendimento ao disposto no §2º do Regimento Interno do Senado Federal, com a finalidade de receber como convidado o Exmo. Sr. Ministro das Relações Exteriores, Mauro Luiz Vieira. A reunião será, como todos sabem, interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados por meio do Portal e-Cidadania, na internet, em senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone da Ouvidoria, 0800 0612211.
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Nós temos a honra de cumprimentar - e já contamos aqui com a sua presença na mesa dos nossos trabalhos - o Chanceler Mauro Vieira.
Eu aproveito para esclarecer todas as diretrizes que seguiremos. Inicialmente, será dada a palavra ao Exmo. Sr. Ministro pelo tempo de até 30 minutos para sua exposição inicial. Em seguida, abriremos a fase de interpelações pelas Sras. e Srs. Senadores pelo prazo de até cinco minutos, em blocos de três interpelantes. Na sequência, o Exmo. Sr. Ministro terá o prazo de cinco minutos para resposta. Por fim, poderá ser concedida réplica e tréplica, com limites de três minutos para ambas.
Srs. Senadores, Sras. Senadoras, Sr. Ministro Mauro Vieira, na condição de Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, em primeiro lugar agradeço a participação de V. Exa. nesta audiência pública interativa, nos termos previstos no §2º do art. 103 do Regimento Interno, para prestar informações no âmbito de suas competências.
A política externa que vem sendo executada pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por meio de uma intensa agenda de encontros bilaterais e multilaterais, tanto no Brasil quanto no exterior, trouxe o nosso país de volta para a mesa dos grandes debates mundiais e vem reafirmando a posição histórica do Brasil como exemplo de mutualidade e de soberania. Consequentemente, a política externa brasileira voltou a ser mais proeminente e influente, reassumindo uma magnitude que nos obriga a redobrar a cautela diplomática e a promover uma avaliação ainda mais ponderada dos riscos e oportunidades.
Nesse contexto, faço aqui um reconhecimento público do papel que V. Exa. tem exercido à frente do Ministério das Relações Exteriores, nosso muito caro Itamaraty, no esforço de recondução do Brasil à posição de ator relevante na geopolítica mundial. Sua presença hoje aqui, Sr. Ministro e caro amigo, enriquece mais uma vez os trabalhos desta Comissão.
Isso posto, o revigorado empenho de nossa política externa vem também acompanhado de muita visibilidade e de novas responsabilidades, em um mundo que se vê hoje marcado por embates econômicos, conflitos territoriais, guerras cibernéticas, disputa por hegemonia, dentre tantas outras circunstâncias desafiadoras. Nesse sentido, a participação de V. Exa. nesta audiência pública lhe oferece a oportunidade de nos apresentar, a esta Comissão e à sociedade brasileira, uma prestação de contas das atividades, em matéria de política externa, empreendidas pelo Itamaraty em 2023 e daquelas planejadas para 2024.
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Sendo assim, Sr. Ministro, além dos temas que julgar pertinente, nós gostaríamos de pedir para V. Exa. trazer ao conhecimento e ao debate desta Comissão, permita-me identificar, três pontos, três questões que, estou convencido, são hoje incontornáveis do ponto de vista da diplomacia brasileira.
Pediria que, durante a sua fala ou, evidentemente, na fase de interpelações, V. Exa. pudesse trazer informações sobre os seguintes questionamentos: primeiro, pela urgência e pela gravidade, sobre o conflito entre Israel e o grupo Hamas e a decorrente crise humanitária na Faixa de Gaza. A guerra acaba de completar cinco meses, e a solução parece ainda muito distante.
Precisamos entender, Sr. Embaixador, o que realmente está ocorrendo em Gaza. Não é preciso repetir que, em toda guerra, a primeira vítima é sempre a verdade.
A juízo de V. Exa., de que maneira as atrocidades cometidas pelo Hamas e a brutal resposta israelense poderão transformar nossas relações bilaterais com Israel e com Palestina?
Ademais, há alguma esperança para desfecho positivo no atual conflito, com a efetiva implementação da chamada solução de dois Estados, malgrado a terrível dor experimentada pelas vítimas israelenses e os familiares, bem como a grave crise humanitária vivenciada pelos palestinos na Faixa de Gaza?
Em 26 de janeiro de 2024, a Corte Internacional de Justiça, ao apreciar o pedido de medida cautelar, no caso, a aplicação da Convenção para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio, África do Sul versus Israel, determinou, por 16 votos a 1, que Israel, aspas, "tomará medidas imediatas e eficazes para permitir a prestação de serviços básicos e assistência humanitária urgentemente necessários para fazer face às condições de vida adversas enfrentadas pelos palestinos na Faixa de Gaza".
Nesse contexto, eu perguntaria a V. Exa., desde já: em que medida, no sentido de V. Exa., o recente bloqueio por Israel de parte da ajuda humanitária enviada pelo Brasil afronta a citada decisão do principal órgão judiciário da Organização das Nações Unidas?
Quais medidas o Brasil pode adotar, visando garantir o desbloqueio da ajuda humanitária bem como evitar futuros impedimentos?
Por fim, pediria que V. Exa. abordasse - isto foi tema de alguns requerimentos - as declarações recentes do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre a guerra.
O segundo questionamento, inevitável, diz respeito à guerra da Ucrânia, que acaba de completar três anos e que também vive, hoje, um impasse. Especialistas temem uma nova escalada do conflito. O orçamento de defesa da Rússia triplicou, desde 2021, e deve consumir 30% dos gastos do Governo russo em 2024.
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Por outro lado, a Otan anunciou, recentemente, a realização do maior exercício militar, desde o fim da Guerra Fria, com quase 100 mil soldados.
Que avaliação V. Exa. faz das consequências dessa guerra até aqui, tanto para o contexto europeu quanto para as relações internacionais de maneira mais ampla, e, sobretudo, da consequência para o Brasil, em caso de prolongamento do conflito?
Como terceiro e último ponto, agora de natureza bilateral, nós pediríamos que V. Exa. esclarecesse a posição do Brasil e o andamento das negociações relativas ao Anexo C do Tratado de Itaipu, que dispõe sobre as bases financeiras do acordo, cuja validade expirou em abril do ano passado.
Como todos sabem, o Tratado de Itaipu, celebrado entre Brasil e Paraguai em 26 de abril de 1973, permitiu o aproveitamento hidroelétrico de trecho do Rio Paraná. Referido ato internacional é composto por 25 artigos e 3 anexos: Anexo A, Estatuto da Itaipu; B, Descrição Geral das Instalações Destinadas à Produção de Energia Elétrica e das Obras Auxiliares; e C, Bases Financeiras e de Prestação dos Serviços de Eletricidade da Itaipu.
A revisão referida não contempla o Tratado de Itaipu, tampouco os Anexos A e B. E mais, ela não significa, de modo necessário, que o Anexo C necessita ser alterado.
Esse contexto deve ser recordado na medida em que, conforme disposto no art. 13 do Tratado de Itaipu, apenas Brasil e Paraguai poderão adquirir eventual excedente de energia da outra parte, vedada a possibilidade de comercialização.
Dito isso, eu queria perguntar, Sr. Ministro, para que V. Ex. respondesse, inclusive na fase de interpelações: existem negociações em curso no sentido de rever o Anexo C? Em caso afirmativo, como ela se encontra e quais os órgãos brasileiros envolvidos nas tratativas?
Lembrando, desde já, a nossa evidente limitação de tempo, creio que esses três pontos sintetizam algumas das preocupações mais urgentes desta Comissão e, evidentemente, que não poderiam ser colocadas de lado.
Eu concedo a palavra a V. Exa., para uma intervenção inicial, por até 30 minutos.
O SR. MAURO VIEIRA (Para expor.) - Exmo. Sr. Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado, Senador Renan Calheiros; Exmo. Sr. Líder do Governo no Senado Federal, Senador Jaques Wagner; Srs. Senadores; senhoras, senhores; colegas do Ministério das Relações Exteriores, é uma grande satisfação e honra, hoje, estar aqui, a convite de V. Exa., para esta reunião, que é a abertura do ano legislativo da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado.
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Quero registrar, uma vez mais, a importância e o apreço que o Itamaraty confere aos trabalhos desta Comissão, por meio da qual tem sido fortalecido o diálogo e a cooperação com o Senado em todos os temas afetos à política externa definida pelo Presidente Lula.
Sr. Senador, muito obrigado pelo tempo que me concede. Tentarei me referir a todos os temas que havia preparado para a minha apresentação e também aos temas levantados por V. Exa. e gostaria de dizer que farei primeiro uma apresentação, como se fosse um relatório, sobre o ano de 2023, e a projeção para 2024. Na segunda parte, então, eu abordaria a questão do conflito entre Israel e Gaza, as questões que V. Exa. levantou com relação à guerra entre Rússia e Ucrânia e a questão de Itaipu. E obviamente estarei sempre à disposição para responder a todas as perguntas.
Para começar, eu diria que concluímos com êxito o primeiro ano da política externa determinada pelo Presidente Lula, com o objetivo de reposicionar o Brasil no mundo a partir de 1º de janeiro do ano passado.
Foram mais de 200 interações mantidas pelo Senhor Presidente da República e por mim mesmo na forma de participação em cúpulas, reuniões bilaterais, visitas realizadas, telefonemas e videoconferências.
Dedicamos especial atenção ao relançamento dos contatos com nossos principais parceiros. O ponto de partida foi, como não poderia deixar de ser, a nossa própria região, em linha com o mandamento constitucional de integração latino-americana.
O Brasil revitalizou a parceria com nossos sócios estratégicos do Mercosul, regressou à Comunidade dos Estados Latino-Americanos e do Caribe (Celac), lançou nova agenda de cooperação e integração na América do Sul, com o consenso de Brasília adotado na reunião de Presidentes dos países da América do Sul realizada aqui em Brasília, no dia 30 de maio.
Em agosto fizemos a Cúpula da Amazônia em Belém, com os Chefes de Estado dos países-membros do Tratado de Cooperação Amazônica.
Resgatamos relações com parceiros tradicionais, como os Estados Unidos, com quem celebramos 200 anos de relações diplomáticas neste ano de 2024, e com países europeus.
O Presidente Lula foi convidado para grandes eventos internacionais, entre os quais a reunião do G7, em Hiroshima, grupo de países composto pelos Estados Unidos, Reino Unido, França, Alemanha, Itália, Japão e Canadá, e com o qual mantemos um intercâmbio político importante e um intercâmbio comercial de cerca de U$140 bilhões.
Aliás, vale a pena registrar que o Presidente Lula foi o único Chefe de Estado brasileiro convidado a participar de todas as reuniões do G7 durante os seus dois primeiros mandatos, portanto em oito realizações da cúpula do G7, e foi convidado no ano passado, no primeiro ano do seu terceiro mandato, e já foi convidado este ano. No ano passado se realizou no Japão, em Hiroshima, e este ano será na Itália - isso cabe a países que tenham a Presidência do G7 -, que fará a cúpula na região de Puglia, de 15 a 17 de julho, já tendo convidado o Presidente Lula.
Além disso, demos novo impulso aos laços com países em desenvolvimento, como a China, a Índia, a África do Sul e demais nações da África e da Ásia, inclusive com a Asean (Associação de Nações do Sudeste Asiático).
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Queria destacar, Sr. Presidente, que recebi em Brasília, em janeiro deste ano, a visita do Ministro de Negócios Estrangeiros da China, com quem copresidi a IV Reunião do Diálogo Estratégico Global Brasil-China. O encontro foi muito produtivo e importante, resultou na assinatura do acordo sobre vistos em passaportes comuns, que dobrará para dez anos a validade recíproca dos vistos concedidos; e isso terá um efeito positivo na comunidade de negócios de ambos os países. A reunião permitiu ainda que se discutissem os preparativos para a VII Sessão Plenária da Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação (Cosban), mecanismo que comemora, este ano, 20 anos e que reunirá em junho na China - é presidida pelos respectivos Vice-Presidentes - o Vice-Presidente Geraldo Alckmin e o Vice-Presidente da China, Han Zheng.
Aguardamos também a visita de Estado do Presidente Xi Jinping ao Brasil, prevista para novembro deste ano, quando celebraremos os 50 anos de relações bilaterais.
Como todos sabem, a China é o maior parceiro comercial do Brasil desde 2009. Em 2023, a corrente de comércio registrou um recorde de praticamente US$158 bilhões. O superávit comercial para o Brasil atingiu um recorde de US$51 bilhões, ou seja, metade do superávit comercial total do Brasil no ano passado.
Criamos, ainda, a posição de Delegado Permanente do Brasil junto à Asean (Associação de Nações do Sudeste Asiático), bloco de dez países representativos de uma das regiões mais dinâmicas do mundo, composto por Tailândia, Malásia, Singapura, Filipinas, Indonésia, Vietnã, Camboja, Brunei, Myanmar e Laos. Trata-se de bloco que tem se consolidado como parceiro-chave para a economia brasileira. Nosso fluxo de comércio tem aumentado consistentemente e alcançou a cifra de US$37 bilhões no ano passado.
Ainda na diplomacia comercial, é digna de nota a conclusão do Acordo de Livre Comércio entre Mercosul e Singapura, o primeiro dessa natureza que o bloco assina desde 2011.
O comércio do Brasil com a União Europeia tem se mantido em patamar elevado, acima de US$91 bilhões. Podemos dizer que fizemos importantes avanços na negociação do acordo de associação entre o Mercosul e a União Europeia durante a Presidência Pro Tempore do Brasil no Mercosul no ano passado, que demonstra o engajamento do Brasil e dos sócios do Mercosul nas relações com a União Europeia. E seguimos comprometidos com a conclusão desse importante acordo, que deverá - esperamos - ocorrer ainda este ano, no segundo semestre.
Graças ao trabalho intenso do Ministério das Relações Exteriores em conjunto com o ministério e com o próprio Ministro da Agricultura e Pecuária, foram abertos, no ano passado, 78 novos mercados para produtos agropecuários em 39 países, distribuídos por cinco continentes.
Já nesses primeiros dois meses do ano, conseguimos abrir mais 18 mercados em 13 países. Isso tem sido fundamental para a geração de renda e emprego no Brasil, instrução e preocupação constante do Presidente Lula, além de ser importante elemento para o agronegócio brasileiro.
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No plano multilateral, participei, na semana retrasada, da 13ª Conferência Ministerial da Organização Mundial do Comércio, em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes. Nossa atuação teve como parâmetro geral a defesa da OMC e do sistema multilateral de comércio, em linha com a atuação histórica do Brasil, com a prioridade atribuída pela Presidência brasileira do G20 ao fortalecimento da governança global. Lamentamos, por outro lado, a falta de resultados ambiciosos da conferência, em especial a ausência de avanços concretos em agricultura, apesar dos esforços empreendidos. De todo modo, continuaremos engajados nas negociações, com vistas a restabelecer a operacionalidade do sistema de solução de controvérsias da OMC - que é um tema central para a política brasileira -, pilar fundamental do sistema multilateral de comércio e que está paralisado desde 2017 e totalmente bloqueado a partir de 2019.
Se, no ano de 2023, o Brasil voltou ao mundo, neste ano é o mundo que virá ao Brasil. O principal exemplo disso é a Presidência brasileira do G20, nossa prioridade maior de política externa em 2024. Quero agradecer o apoio do Congresso Nacional, especialmente desta Casa, na viabilização dos meios materiais para entregarmos com êxito esse compromisso que assumimos perante a comunidade internacional. Serão mais de 200 reuniões ao longo de todo o ano em diversas capitais do Brasil, nas quais serão discutidos temas fundamentais para o futuro do mundo e do Brasil.
O Governo brasileiro definiu as seguintes prioridades para a nossa Presidência do G20: Inclusão social e combate à fome e à pobreza; transição energética e a promoção do desenvolvimento sustentável; e a reforma das instituições de governança global. Lançamos também três iniciativas prioritárias: aliança global contra a fome e a pobreza, que contará tanto com países desenvolvidos quanto em desenvolvimento; também uma força-tarefa para a mobilização global contra as mudanças climáticas; e também faremos uma reunião inédita, que será a segunda ao longo do ano, de chanceleres do G20, que ocorrerá em Nova York logo após a abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas, aproveitando a presença de praticamente todos os ministros de Estado, muitos dos ministros de relações exteriores e muitos dos chefes de Estado. Essa reunião será aberta à participação de todos os países membros da ONU, num esforço de inclusividade, e terá por objetivo promover os debates sobre a reforma da governança global.
Nos dias 21 e 22 de fevereiro passados, durante a primeira reunião de chanceleres do G20 no Rio de Janeiro, tivemos a oportunidade de discutir com profundidade este último tópico. Colocamos à mesa os membros do G20 - 19 países mais a União Europeia e a União Africana -, além de alguns países convidados e organismos internacionais, em um diálogo franco, importante e necessário para discutir a conjuntura internacional e para discutir caminhos para a reforma da governança global. Em um cenário de extrema polarização internacional, o fato de que todos estiveram na mesma sala e dialogaram já merece ser celebrado.
Posteriormente, no dia 26 de fevereiro, em São Paulo, os ministros de finanças do G20 se reuniram para discutir a arquitetura financeira internacional, inclusive temas como evasão fiscal, taxação internacional, finanças sustentáveis, entre outros, sob a liderança do Ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
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A agenda seguirá intensa até a Cúpula de Líderes e Chefes de Estado do G20, que acontecerá no Rio de Janeiro, em novembro deste ano.
Outra prioridade para este ano, conforme orientações recebidas do Presidente Lula, são as relações com a América Latina, o Caribe e o continente africano. O Presidente Lula realizou visita ao Egito, que foi particularmente significativa, pois celebramos, neste ano, cem anos de relações diplomáticas com o Egito. Mantemos um importante fluxo comercial, da ordem de quase US$3 bilhões, com o Egito. Durante a visita, iniciamos discussões para elevar as relações entre o Brasil e o Egito ao nível de parceria global.
O Presidente regressou à sede da Liga dos Estados Árabes, 20 anos após o seu primeiro discurso naquele foro, o primeiro e único até então realizado por um Chefe de Estado brasileiro. A Liga Árabe congrega 22 países membros e, no ano passado, representou também, em bloco, importante intercâmbio comercial com o Brasil, da ordem de US$30 bilhões.
Em seguida, o Presidente esteve em Adis Abeba, na Etiópia, para uma visita de Estado importante e para participar, como convidado especial, da Cúpula da União Africana. Foi o único Chefe de Estado de fora da região a ter sido convidado para tomar a palavra, além do Primeiro-Ministro da Palestina. O Presidente também manteve uma série de reuniões bilaterais com os países da região.
O nosso comércio bilateral com a África já ultrapassa US$20 bilhões. A minha avaliação é de que esse périplo do Presidente abriu novas oportunidades de aprofundamento em nossas relações na seara política e, especialmente, em termos de comércio e investimento.
Ao mesmo tempo, seguimos conferindo especial ênfase à cooperação e à integração da América do Sul. Isso ficou muito evidente no importante esforço diplomático de desarme de tensões entre a Guiana e a Venezuela, sobre a disputa da região do Essequibo. Isso se deveu muito à iniciativa do Presidente Lula durante a Cúpula do Mercosul, realizada em dezembro passado, no Rio de Janeiro, quando o Presidente propôs ao Presidente da Celac, o Primeiro-Ministro de São Vicente e Granadinas, Ralph Gonçalves, que abordasse a questão com ambas as partes, que fizesse uma intermediação entre Venezuela e Guiana.
Atendendo a esse chamado para criar um espaço de entendimento, foi realizado, no dia 14 de dezembro, em São Vicente e Granadinas, a reunião entre o Presidente Nicolás Maduro e Irfaan Ali, da Guiana. Os Presidentes de ambos os países concordaram em não recorrer à força para resolver o contencioso bilateral e comprometeram-se a manter negociações com vistas a encontrar solução diplomática permanente.
Em janeiro último, como consequência desse encontro empresarial de São Vicente e Granadinas em dezembro, recebemos, no Brasil, a primeira reunião da Comissão Conjunta de Chanceleres e Técnicos da Guiana e Venezuela, criada pelas partes para seguir o diálogo. O Governo brasileiro também está firmemente empenhado no acompanhamento da situação na Venezuela. Em nossos contatos com o Governo venezuelano, temos enfatizado a importância de preservar o espírito dos Acordos de Barbados para o encaminhamento da situação política no país. O Presidente Lula manteve reunião com o Presidente da Venezuela, à margem da Cúpula da Celac, e, posteriormente, três dias depois, o Governo venezuelano anunciou a convocação das eleições presidenciais para o dia 28 de julho próximo, o que será um passo fundamental para o encaminhamento do processo político no país vizinho.
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Representei o Governo brasileiro na cerimônia de posse do Presidente da Argentina, Javier Milei. Antes da posse, recebi a visita da então Chanceler designada da Argentina Diana Mondino, com quem venho mantendo contatos frequentes e produtivos.
No final de fevereiro último, o Presidente Lula visitou a Guiana para participar da 46ª Cúpula da Comunidade do Caribe (Caricom), em Georgetown, e eu acompanhei também a 8ª Cúpula da Celac, em Kingstown, São Vicente e Granadinas.
Cabe ressaltar que o comércio do Brasil com a Celac foi da ordem de US$83 bilhões no ano passado e com a Caricom, de US$2,6 bilhões.
Acompanhamos com preocupação a situação em curso no Haiti. Estamos empenhando esforços para que a comunidade internacional apoie a Missão Multinacional de Apoio à Segurança, mandatada em outubro passado, durante a presidência brasileira no Conselho de Segurança da ONU. Essa missão, que deverá ser integrada por contingentes de policiais do Quênia e do Benin e de países da Caricom, será fundamental para apoiar os esforços da Polícia Nacional do Haiti na estabilização do país.
Como as senhoras e os senhores podem ver, a agenda política externa para 2024 exigirá bastante do Itamaraty e dos demais ministérios da Esplanada. Além da execução das prioridades de 2024, também já estão em andamento preparativos para os grandes eventos que sediaremos em 2025, com destaque para a COP 30, do clima, e a cúpula dos Brics, além da cúpula também, nessa ocasião, do Mercosul. Portanto, o apoio constante do Senado e desta Comissão será fundamental para continuarmos realizando as sabatinas, a aprovação de atos internacionais e o diálogo institucional e as relações interparlamentares.
Neste segundo Governo do Presidente Lula, o Itamaraty seguirá dedicando esforços para a consolidação de iniciativas de política externa lançadas no ano passado, cujos resultados já se fazem sentir, permitindo que em 2024 e nos próximos anos o mundo venha ao Brasil abrindo novas possibilidades de parcerias políticas e econômicas em prol do desenvolvimento sustentável do Brasil em suas três dimensões: econômica, social e ambiental.
Sr. Presidente Renan Calheiros, passo, então, agora, à segunda parte desta apresentação. Procurarei aproveitar a oportunidade para responder os pontos que V. Exª. levantou na sua alocução inicial, e começaria pela questão do conflito israelo-palestino, que continua sendo da mais alta importância e relevância para a política externa brasileira e para o conjunto da comunidade internacional.
Passados cinco meses desde os brutais ataques terroristas realizados pelo Hamas contra a população civil em Israel, a violência, a destruição e a morte continuam a imperar entre Israel e Palestina, colocando em risco a estabilidade regional.
Já na primeira hora, o Governo brasileiro, a começar pelo Presidente da República, manifestou repúdio e a condenação aos ataques terroristas de 7 de outubro. Transmitimos oficialmente, por nota do Itamaraty, por meio de telefonema do Presidente Lula ao Presidente de Israel e em telefonema meu ao Chanceler de Israel, então, nossas mais sentidas condolências aos familiares das vítimas e nossa solidariedade ao povo daquele país. Manifestamos também nossas mais profundas condolências e solidariedade aos familiares de nacionais brasileiros e de filhos de brasileiros que perderam a vida naquele dia fatídico.
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Solicitamos e continuamos empenhados na pronta libertação dos reféns, inclusive do cidadão brasileiro-israelense Michel Nisenbaum, cuja família foi recebida pelo Presidente Lula, aqui em Brasília, no dia 11 de dezembro passado. Eu mesmo recebi os familiares do Sr. Nisenbaum em Buenos Aires, no dia 9 de dezembro, à margem da cerimônia de posse do Presidente Milei, a pedido do então Ministro das Relações Exteriores de Israel, Eli Cohen, que os acompanhou durante essa entrevista e nessa reunião.
Prestamos também a nossa sincera e profunda solidariedade ao povo palestino, particularmente àqueles que ainda se encontram em Gaza, àqueles que foram forçados a se deslocar e àqueles muitos que perderam seus entes queridos.
Ressaltei aqui nesta Comissão, em outubro passado, que nada, absolutamente nada, justifica o recurso à violência, sobretudo contra civis. Isso permanece válido e ganhou ainda mais urgência e relevância. E foi justamente por isso que incentivamos, desde o início, todas as partes a exercerem a máxima contenção a fim de evitar uma escalada da situação.
Nos primeiros meses, nossa atenção estava voltada a atender aos cidadãos brasileiros em necessidade de assistência dos dois lados do conflito. Eram cerca de 14 mil brasileiros residentes em Israel e cerca de 6 mil na Palestina. A grande maioria na Cisjordânia, mas alguns, acima de uma centena, na Faixa de Gaza.
A determinação do Presidente Lula, desde o início, foi a de não deixar nenhum brasileiro ou brasileira para trás. Criamos um gabinete de crise no Itamaraty, de natureza interministerial, com a participação do Ministério da Defesa e da Força Aérea Brasileira, além de outros Ministérios, como o Ministério da Justiça e a pasta do Desenvolvimento e Assistência Social, com o objetivo de acompanhar, em tempo real, o desdobramento do conflito. Servidores do Itamaraty trabalharam, em sistema de plantão de 24 horas, 7 dias por semana, atendendo a brasileiros e familiares e coordenando o processo de repatriação. Nossa rede de postos no exterior e os funcionários em Brasília monitoraram constantemente a situação no terreno e as negociações em foros internacionais.
Faço um especial agradecimento aos funcionários do Itamaraty, nas embaixadas em Tel Aviv, Ramala, Cairo, Amã e Beirute, além de todos os funcionários envolvidos, da área consular e das demais áreas, nesse esforço e na implementação dessa operação em Brasília. Graças a essa atuação determinada, o Brasil foi o primeiro país a iniciar a operação de repatriação de nacionais e de maneira totalmente gratuita. Isso não teria sido possível sem o apoio do Ministério da Defesa e o profissionalismo da Força Aérea, que atenderam imediatamente ao chamado do Presidente Lula.
A retirada dos brasileiros de Gaza, em particular, foi fruto de intensa articulação diplomática e presidencial em contatos com o Governo de Israel, com a Autoridade Palestina, com o Egito, a Turquia, o Catar, a Jordânia, os Emirados Árabes, o Irã, a Rússia, a França e a Arábia Saudita, todos atores importantíssimos nesse conflito na região, no Oriente Médio, entre outros atores.
Em todos esses contatos, nossa mensagem foi sempre uníssona: apoio à operação de retirada dos brasileiros que desejavam retornar ao nosso país; apoio a todas as iniciativas possíveis para que não faltassem água, luz e remédios em hospitais em Gaza; apelo por corredor humanitário, pelo cessar-fogo, pela retomada das negociações e pela liberação dos reféns.
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Após meses de espera e de intenso trabalho diplomático, logramos retirar nossos nacionais de Gaza, inclusive um bebê brasileiro nascido nos primeiros momentos do conflito. No total, a operação Voltando em Paz repatriou 1.560 cidadãos em 12 voos da FAB e um voo comercial, incluindo quatro grupos de brasileiros que estavam em Gaza.
Quero agradecer, mais uma vez, o apoio dos inúmeros Parlamentares que entraram em contato conosco e nos ajudaram a identificar pessoas que precisavam de ajuda tanto em Israel quanto na Palestina.
Srs. Senadores, Sr. Presidente, o conflito entre Israel e Palestina não é algo novo. Ele pode ser considerado o último grande conflito colonial não resolvido após quase 70 anos de discussões, guerras, acordos negociados, muitos dos quais jamais implementados. A violência na Faixa de Gaza já havia eclodido em 2007, ano do início do bloqueio israelense, que agravou a situação humanitária naquele território. Outros episódios sangrentos se seguiram em 2009, 2011, 2014 e 2018. Como se vê, a dinâmica entre Israel e Palestina já estava se mostrando cada vez mais insustentável, sem avanços concretos.
Nos anos recentes, organismos internacionais, ONGs e Governos vêm alertando para o crescimento sistemático dos assentamentos ilegais israelenses na Cisjordânia. Também houve forte aumento de atos de violência dos colonos israelenses contra palestinos residentes nos territórios ocupados. Observou-se uma crescente segregação no que tange ao acesso de serviços básicos. Além disso, houve numerosas violações israelenses ao status quo dos sítios sagrados em Jerusalém, com destaque à Esplanada das Mesquitas, também conhecida como Monte do Templo.
Historicamente, como um país amigo do Estado de Israel e do Estado da Palestina e como um país que abriga de forma harmônica comunidades de origem árabe e judaica, a posição do Brasil tem sido e continuará a ser em favor do diálogo e de negociações que conduzam à solução de dois Estados, com a Palestina e Israel convivendo em paz e segurança dentro das fronteiras mutuamente acordadas e internacionalmente reconhecidas.
Temos um compromisso histórico com o Estado de Israel e temos também um compromisso histórico com o Estado da Palestina, reconhecido por 139 países na data de hoje; e temos um compromisso com sua aspiração legítima de tornar-se membro pleno da Organização das Nações Unidas. O Brasil esteve presente no processo que levaria à criação do Estado de Israel quando, no dia 29 de novembro de 1947, a Assembleia Geral das Nações Unidas, sob a Presidência do brasileiro Oswaldo Aranha, aprovou o plano para a divisão da Palestina, plano este que previu a criação de um Estado judeu, mas também de um Estado palestino, além de um Estado especial para a cidade de Jerusalém.
O Brasil se orgulha de sua posição histórica sobre o conflito israelo-palestino, que respeita o direito internacional, as resoluções do Conselho de Segurança e da Assembleia Geral das Nações Unidas. Também valorizamos nossa disposição para apoiar e tentar encontrar um caminho de paz naquela região que é tão importante e relevante para os brasileiros. O Brasil se orgulha, igualmente, de sua atuação internacional constante e firme no combate a todas as formas de discriminação, xenofobia e antissemitismo.
Sr. Presidente, a atual escalada de violência põe em evidência a urgência de se buscar solução justa, política e duradoura para o conflito. O Brasil tem trabalhado no máximo de suas capacidades diplomáticas nesse sentido.
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Temos sistematicamente condenado a expansão dos assentamentos israelenses nos territórios ocupados. O Brasil reconhece a Palestina como um Estado desde 2010, e continuamos a nos empenhar para que ela se torne membro pleno das Nações Unidas. E, como disse, 139 países dos 193 membros das Nações Unidas já reconhecem o Estado palestino como um Estado. Esses esforços se prestam a ajudar e a criar condições para a retomada do processo de paz, levando a uma solução dos dois Estados, com a Palestina e Israel vivendo lado a lado, dentro de fronteiras seguras e internacionalmente reconhecidas.
Propostas que envolvam o deslocamento de palestinos para fora da Faixa de Gaza e o restabelecimento de assentamentos israelenses naquele território são absolutamente inaceitáveis e apenas aprofundarão a tragédia em curso. O Brasil tem feito tudo ao seu alcance para colaborar para uma solução dessa catástrofe humanitária. Defendemos a urgência de um cessar-fogo e insistimos para que as partes respeitem o direito humanitário internacional.
À frente do Conselho de Segurança das Nações Unidas em outubro passado, eu próprio presidi e facilitei esforços para aprovar um projeto de resolução que determinasse a cessação do fogo e recolocasse as partes em discussão, com vistas à implementação da solução de dois Estados. Sempre com esse intuito de facilitação de consenso, fui a Nova York quatro vezes em outubro, quando presidi sete sessões do Conselho de Segurança, além de participar de outro debate do Conselho de Segurança sobre o Oriente Médio, já no mês de novembro, fora da Presidência brasileira, na Presidência chinesa rotativa do Conselho.
Chegamos muito perto. O projeto facilitado pelo Brasil recebeu dois votos favoráveis e duas abstenções, mas foi vetado por um dos membros permanentes do Conselho. Outros três projetos, instando um cessar-fogo imediato, foram igualmente vetados por diferentes lados. Essa paralisação decisória não é isenta de custos. Recordo que, no dia da votação do referido projeto brasileiro, em 18 de outubro de 2023, registravam-se 3,4 mil palestinos mortos e 12 mil feridos. Hoje, já são 32 mil mortos e 73 mil feridos em Gaza, 70% dos quais são mulheres e crianças, e um número elevado de mais de 7 mil desaparecidos. Do lado israelense, além dos 1.112 mortos no ataque terrorista do Hamas em 7 de outubro, já morreram 251 soldados desde a invasão de Gaza pelo exército de Israel.
A questão que se impõe é: quantas vidas mais serão perdidas até que todos atuem para impedir o morticínio em curso?
Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, é nesse contexto de profunda indignação que se inserem declarações do Presidente Lula. São palavras que expressam a sinceridade de quem busca preservar e valorizar o valor supremo que é a vida humana. O próprio... E aqui me valho de exemplos de declarações de importantes personalidades políticas do mundo, como o próprio Secretário de Estado norte-americano, que, quando perguntado sobre as declarações do Presidente, afirmou compreender que foram motivadas pelo desejo de ver acabar o sofrimento das pessoas, com o que ele concordou.
Foi também por esse motivo que apoiamos o processo iniciado pela África do Sul perante a Corte Internacional de Justiça, que busca avaliar se o Governo de Israel estaria violando a Convenção para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio, como mencionado por V. Exa.
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Os juízes acolheram a demanda e reconheceram a plausibilidade de que um genocídio estaria em curso. Por esse motivo, a Corte da Haia emitiu, no dia 26 de janeiro, medidas cautelares que demandam que Israel tome todas as medidas ao seu alcance para impedir a prática de todos os atos considerados como genocídio, para evitar danos irreparáveis. Quero ressaltar que essas medidas cautelares são de implementação imediata e obrigatória, porém, até o momento, não há registro de alterações da condução das operações militares levadas a cabo na Faixa de Gaza. Pelo contrário, temos ouvido declarações, cada vez mais recorrentes, de altas autoridades do atual Governo de Israel que passaram a falar abertamente de ocupação de Gaza, de deslocamento forçado de sua população e que jamais aceitarão a constituição de um Estado palestino.
Sr. Presidente, o senhor perguntou sobre o bloqueio da ajuda humanitária e se ele afronta a decisão da CJI.
Desde o início do conflito, a comunidade internacional vem manifestando preocupação com o volume de assistência humanitária insuficiente que chega a Gaza em razão das restrições impostas ao acesso à Faixa de Gaza por Israel. A estimativa é de que mais de 15 mil toneladas de suprimentos de ajuda humanitária internacional ainda aguardariam aprovação israelense para entrar em Gaza, e mais da metade da carga consistiria em alimentos. Sem sombra de dúvidas, o bloqueio à ajuda humanitária, no contexto atual de fome e falta de insumos médicos em Gaza, consiste em uma violação do direito internacional.
No tocante especificamente às doações brasileiras, a maior parte delas, enviadas diretamente pelo Brasil, foi devidamente entregue em Gaza, segundo a organização Crescente Vermelho Egípcio. Trinta dos 190 purificadores de água que enviamos, contudo, tiveram sua entrada impedida em Israel na passagem de Nitzana, onde ocorre a inspeção antes de serem enviados para a passagem de Rafah. Até o momento não temos confirmação sobre os motivos alegados para a rejeição desses 30 últimos purificadores de água, mas há indicações informais de que decorreria do fato de os purificadores de água serem movidos a energia solar e contarem com kit voltaico.
O que podemos fazer, e continuaremos a fazer na nossa linha atual, é denunciar a decisão unilateral israelense de bloquear recorrentemente a entrada de ajuda humanitária e seguir trabalhando com os países vizinhos e os organismos internacionais em favor da abertura de corredores humanitários.
Anúncios oficiais também dão conta de estar sendo preparada uma operação militar terrestre israelense na região de Rafah, para onde foram forçosamente deslocados grande parte dos habitantes do norte de Gaza, que agora não têm para onde fugir. É justamente isso que nos causa espanto e consternação, assim como à grande maioria da comunidade internacional - trata-se de avaliação compartilhada por diversos veículos de imprensa internacional, pelo Secretário-Geral da ONU, António Guterres, por diversos Chefes de Estado, além de declaração recente do próprio Papa Francisco.
Lamento que a chancelaria de Israel tenha se dirigido de forma desrespeitosa a um Chefe de Estado de um país amigo, o Presidente Lula. Por sinal, foi o primeiro Chefe de Estado do Brasil a visitar Israel, em março de 2010, em visita oficial.
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Reputo igualmente lamentável o tratamento indecoroso e descabido dado ao Embaixador do Brasil em Israel, Frederico Meyer, que atendeu de boa-fé a uma convocação da chancelaria israelense. São páginas que desabonam a prática diplomática internacional. Determinei o pronto retorno do Embaixador do Brasil em Tel Aviv para consultas em Brasília. O Embaixador de Israel em Brasília e o Governo do Primeiro-Ministro Netanyahu foram informados de que o Brasil reagirá com diplomacia, sempre, mas com toda firmeza a qualquer ataque que receber, agora e sempre.
Estou seguro de que as relações do Brasil com Israel e nossa amizade com o povo israelense sobreviverão ao comportamento do atual Governo de Israel.
Sras. e Srs. Senadores, jamais poderíamos antecipar que a situação chegaria ao estágio atual com mais de 31 mil mortos, dos quais 25 mil mulheres e crianças. Números esses que foram mencionados pelo próprio Secretário de Defesa dos Estados Unidos, em depoimento no Congresso dos Estados Unidos, no dia 29 de fevereiro deste ano. É um cenário desolador. Em pouco mais de cinco meses, houve mais crianças, jornalistas, pessoal médico, funcionários da ONU mortos do que em qualquer outro lugar do mundo durante um conflito.
Crianças morrem diariamente por desnutrição. Segundo o Fundo da População das Nações Unidas, 5, 5 mil mulheres deverão dar à luz, no atual mês de março, enquanto mais de 155 mil grávidas e lactantes correm risco de desnutrição.
Desde 7 de fevereiro, segundo a Organização Mundial da Saúde, não existe mais hospital totalmente funcional em Gaza. Cirurgias estão sendo realizadas sem anestesia, inclusive em crianças. O Porta-voz do Unicef afirmou, em dezembro passado, que pelo menos mil crianças tiveram uma ou ambas as pernas amputadas, desde 7 de outubro, em virtude de ataques.
Na semana retrasada, assistimos a um massacre de mais de cem palestinos que foram mortos quando esperavam na fila para receber comida enviada por assistência humanitária. E, apesar disso, o Governo do Primeiro-Ministro de Israel continua dificultando sistematicamente a entrada de caminhões com ajuda humanitária nas fronteiras com Gaza.
Recebemos com preocupação a notícia, na última semana, de que o Governo de Israel autorizou a construção de cerca de 3,5 mil novos assentamentos ilegais nos territórios palestinos ocupados, como confirmado por órgão das Nações Unidas, a exemplo do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos e do Escritório da ONU para a coordenação de assuntos humanitários.
Senhoras e senhores, Gaza é um quadrilátero com 41km de comprimento e com largura que varia de 6 a 12km. São 365m². É uma área pouco menor do que o Plano Piloto de Brasília. É como se toda a população de cidades como Belo Horizonte ou Salvador estivesse confinada neste pequeno espaço.
É preciso condenar e repudiar a atrocidade do ataque terrorista sofrido por Israel no dia 7 de outubro. Sim, Israel tem o direito de defender sua população, mas isso tem de ser feito dentro de regras do direito internacional. A cada dia que passa, no entanto, resta claro que a reação de Israel ao ataque sofrido tem sido extremamente desproporcional e não tem como alvo somente aqueles responsáveis pelo ataque, mas todo o povo palestino. Tal como ressaltado pelo Governo brasileiro no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, trata-se de punição coletiva. Essa atitude é absolutamente contrária aos princípios mais básicos do direito internacional humanitário e deve ser igualmente condenada.
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Sr. Presidente Renan Calheiros, não é por acaso que o preâmbulo da Carta das Nações Unidas começa com a seguinte frase: "Nós, os povos das Nações Unidas, resolvidos a preservar as gerações vindouras do flagelo da guerra, que por duas vezes, no espaço de nossa vida, trouxe sofrimentos indizíveis à humanidade [...]". Todo o sistema internacional em vigor, com as Nações Unidas no seu centro, foi erigido sobre os escombros da Segunda Guerra Mundial. O objetivo é evitar que as atrocidades registradas naquele período venham a se repetir.
Como afirmei em maio do ano passado nesta Comissão, o mundo assiste hoje a uma superposição inédita de crises, que tornam a realidade internacional contemporânea ainda mais complexa e dinâmica. Como afirmado pelo Presidente Lula, não é possível que o mundo gaste, por ano, 2,2 trilhões em armas enquanto mais de 700 milhões de pessoas não têm o que comer.
Combates seguem em curso na Ucrânia, a instabilidade se aprofunda no Haiti, as tensões se elevam no Oriente Médio. Mais do que nunca é preciso diálogo, diplomacia e cooperação. Temos buscado manter uma posição equilibrada, mas, sobretudo, construtiva, coerente com a nossa história diplomática e com o respeito ao direito internacional.
O Brasil mantém canais de interlocução abertos com Kiev e com Moscou. O Presidente Lula - isso em resposta a um dos temas que V. Exa. suscitou - manteve encontro com o Presidente Zelensky, à margem da Assembleia Geral da ONU, em setembro do ano passado. O Assessor Especial da Presidência da República, Embaixador Celso Amorim, viajou à Ucrânia, onde foi recebido pelo Presidente Zelensky em maio passado e tem participado de vários esforços de negociação da paz. Eu próprio já conversei várias vezes, por telefone, com o Ministro dos Negócios Estrangeiros da Ucrânia, Dmytro Kuleba, a última vez em 31 de janeiro passado. Estive pessoalmente com ele em Nova York em setembro e também, no mês de fevereiro do ano passado, durante o seminário de segurança de Munique, em que tivemos a ocasião de discutir as nossas posições sobre a questão. Anteriormente, mantivemos encontro justamente na Conferência de Munique, que foi em fevereiro, como eu disse.
Nossa posição é clara: condenamos a violação da integridade territorial ucraniana tanto no Conselho de Segurança como na Assembleia-Geral da ONU. Ao mesmo tempo, nos posicionamos em favor da paz, do diálogo e da diplomacia. Trata-se de criar um espaço para a negociação que leve em conta as legítimas preocupações de segurança de todas as partes. Até o Papa Francisco repetiu também essa observação. Isso decorre não apenas do imperativo de acabar com a tragédia diária que o conflito impõe em termos de perdas de vidas humanas. O fim do conflito se impõe pelo risco, a meu ver, crescente, se considerarmos as declarações recentes de altas lideranças, de uma escalada do conflito, inclusive com possibilidade de uso de armamento nuclear. O prolongamento do conflito afetará todos. O risco geopolítico crescente, agravado pelas sanções econômicas unilaterais ilegais, levou o mundo a uma escalada inflacionária que não se via há décadas, com forte impacto na segurança alimentar e energética.
O Brasil tem credenciais e patrimônio diplomático suficientes para dar uma contribuição aos grandes temas da ordem internacional, sejam eles de paz e segurança, econômicos, financeiros, de combate à fome e à pobreza, à desigualdade e também no conflito entre Israel e Palestina.
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Não estamos sozinhos, muito pelo contrário. É cada vez maior o entendimento internacional de que o que estamos vendo é inadmissível. Para citar outro exemplo, a Vice-Presidente dos Estados Unidos afirmou agora, no dia 4 de março, que muitos inocentes palestinos foram mortos e que a nossa humanidade comum nos compele a agir para levar ajuda humanitária e vital aos inocentes. Defendeu o cessar-fogo imediato de seis semanas, de modo que os reféns possam ser libertados. É a hora de o Conselho de Segurança agir, portanto. O Brasil seguirá firme na defesa da diplomacia e do direito internacional, contribuindo na medida das nossas possibilidades, conforme a orientação do Presidente Lula.
Com relação a Itaipu, eu me permitiria só avançar que, como V. Exa. mencionou, o tratado completou 50 anos no ano passado. Foi terminado o pagamento da dívida contraída para a construção da empresa, e o Brasil e o Paraguai começarão, em breve, a discutir a revisão do Anexo C. Já foi criado, dentro do Governo brasileiro, um comitê para discutir a posição com relação ao Anexo C e a revisão dos seus termos, tendo em vista, sobretudo, o fim, a extinção do pagamento da dívida. Esse comitê inclui funcionários de vários organismos, do Governo, do Ministério de Minas e Energia e de outros setores do Governo.
É preciso só lembrar, do nosso ponto de vista, que um resultado satisfatório precisará assegurar as condições de sustentabilidade da produção de Itaipu com energia barata em benefício dos consumidores dos dois países. Neste momento, nós estamos ainda na discussão prévia que ocorre todos os anos da tarifa aplicada para o pagamento dos serviços de eletricidade.
Mas são essas as observações que eu teria a fazer sobre os aspectos que V. Exa. levantou e sobre o relato que eu tencionava e fiz. E fico, obviamente, à disposição para esclarecer as dúvidas e trocar ideias que as Sras. e os Srs. Senadores tenham sobre esse e qualquer assunto.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Agradeço a intervenção inicial do Ministro Mauro Vieira.
E tenho a satisfação de conceder a palavra ao primeiro Senador inscrito para as suas interpelações.
Com a palavra, o Senador Esperidião Amin.
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (S/Partido - AP) - Presidente, o senhor pode só declinar a lista das inscrições?
O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Aproveitando a oportunidade, estão inscritos o Senador Esperidião Amin, o Senador Sergio Moro, o Senador Nelsinho Trad, a Senadora Tereza Cristina, o Senador Hamilton Mourão, Senador Randolfe Rodrigues.
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) - Eu acho que o Senador Randolfe Rodrigues está se inscrevendo para direito de resposta, Presidente, como é de seu feitio. Ele nem sabe a pergunta, mas já se inscreveu para direito de resposta.
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (S/Partido - AP) - É devido inscrição como último, respeitando os colegas que estão à frente.
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) - Os mais velhos, inclusive. (Risos.)
O SR. JAQUES WAGNER (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Senador Esperidião...
Senador...
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) - As evidências do sênior estão a latere, à sua esquerda, pela cor dos cabelos.
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O SR. JAQUES WAGNER (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Não... Senador, eu não me inscrevi porque eu tenho certeza de que as perguntas estarão todas, como sempre, no padrão do relacionamento normal do Legislativo e que o Ministro Mauro Vieira estará muito à vontade para responder.
Mas, qualquer coisa, do outro lado de Jordão, a gente conversa. (Risos.)
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC. Para interpelar.) - Sempre sob a forma de diálogo, isso que é muito bom.
Eu quero cumprimentar o Presidente Renan Calheiros pelo cumprimento de um dispositivo regimental muito importante numa Comissão que tem relevância óbvia.
Eu vou fazer cinco colocações que o Ministro poderá responder na medida do que desejar.
Primeiro, eu sou lobista das mulheres. O senhor já sabe disso desde o dia 11 de maio do ano passado. Eu sou de um estado privilegiadamente feminino - Catarina de Alexandria, padroeira das bibliotecas, dos desbravadores, dos inovadores - e tenho acompanhado as estatísticas sobre o papel da mulher na diplomacia brasileira. E quero dizer que Santa Catarina está chorosa, porque neste ano e dois meses, a última estatística que eu tenho é a de setembro de 2023, o papel da mulher não acompanhou a média de presença da mulher na carreira de diplomata.
Eu participei aqui, com a sua presença, da sabatina da Embaixadora Viotti, que nos representa, o Brasil, o que no Itamaraty chama de Missão A, missão tipificada, o jargão é de que é uma das mais importantes, evidentemente.
E, em nome da Senadora Tereza Cristina, eu faço aqui um apelo para que o senhor esclareça e nos dê augúrios, ou seja, boas notícias sobre a possibilidade de, se me permite dizer, reverter essa tendência que hoje faz com que haja menos de 23% de participação da mulher, que é a participação objetiva da mulher na diplomacia.
Segundo, eu gostaria de introduzir aqui uma perplexidade com a situação do anúncio da eleição na Venezuela. Eu acho que nós sabemos que o Governo do Brasil e o próprio Presidente Lula têm, digamos, uma certa ascendência sobre o poder decisório da Venezuela, e não me parece que a evolução seja satisfatória, o anúncio sem o esclarecimento da situação da possibilidade de uma disputa verdadeiramente competitiva. Então, é lógico que eu não estou defendendo aqui uma intervenção do Brasil, mas uma persistência na obtenção de um mínimo razoável para os nossos padrões, inclusive para os padrões de juízo do próprio atual Governo brasileiro sobre o que seja uma disputa justa.
Vou deixar a parte da Bolívia... Quero dizer que votei a favor do ingresso da Bolívia com absoluta convicção. Tive a honra de, como Governador, receber o Presidente eleito Hugo Banzer, em Florianópolis, no dia 14 de dezembro de 2000, numa reunião ampliada do Mercosul. Ele foi lá para pedir o ingresso, quer dizer, circunstancialmente na minha cidade, quando eu era Governador. Participei da evolução do Gasbol, que beneficiou o meu Estado também, e tenho o testemunho do Fonplata, que é um banco eminentemente municipalista, a maior parte das operações são realizadas no Brasil. A Presidente do banco, Luciana Botafogo Gonçalves, apesar de ser flamenguista... Tanto o pai quanto ela são flamenguistas, mas têm esse nome, que ontem teve uma vitória altamente controvertida, mas de qualquer maneira faz parte. Então faz parte, portanto, da nossa tradição.
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(Soa a campainha.)
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) - Quero pedir apenas uma atenção especial a esta questão de Gaza e Israel. Tanto Palestina quanto Israel fazem parte da nossa vida e das nossas relações. Eu acho que o seu relato é ponderado e deve ser aperfeiçoado pelas indagações que se sucederão.
Vou pedir que V. Exa., Sr. Ministro, estude com o corpo diplomático o que nós podemos fazer para acompanhar a evolução da legislação sobre inteligência artificial - a União Europeia aprovou anteontem uma lei impondo regras a isso - e também sobre a questão de guerra cibernética. O Brasil criou um comitê, e nós vamos ter que nos equiparar àquilo que o mundo faz sobre esse assunto, assunto que inclusive está afeto duplamente ao Senador Renan Calheiros como Presidente desta Comissão e como Presidente da Comissão Mista de Controle de Atividades de Inteligência do Congresso Nacional desde o dia 1º de agosto.
Finalmente, só quero registrar que fiz uma solicitação ao Embaixador Bruno Bath, e eu sei que vai ajudá-lo o seu chefe de gabinete, o Embaixador Ricardo Monteiro, para que dê uma assistência a um pedido que me foi trazido pessoalmente, e eles o farão hoje à tarde. Já quero agradecer antecipadamente pelo atendimento, sob a forma de marcação de uma audiência, para um grupo de palestinos que já foi atendido, que já agradece, mas faz um complemento de solicitação que ambos tratarão hoje à tarde com o meu agradecimento prévio.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Com a palavra, V.Exa.
O SR. MAURO VIEIRA (Para expor.) - Muito obrigado, Senador Esperidião Amin. Agradeço muito suas perguntas, todas muito interessantes e que me permitem dar alguns esclarecimentos. O papel das...
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) - Eu continuo ouvindo. Muito agradecido.
O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Pode responder, Sr. Ministro.
O SR. MAURO VIEIRA - Vou responder então sobre a questão do papel das mulheres. O papel das mulheres é importante. O Ministério tem um número importante de políticas de valorização da presença da mulher na diplomacia. No nosso número total de diplomatas, que são cerca de 1.500, quase 1.500, 23,3% são de mulheres. Temos uma série de providências e de medidas para estimular o ingresso de mulheres, mais mulheres na carreira.
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Sem um maior ingresso, nós vamos sempre esbarrar em alguns momentos em falta de presença de mulheres em algumas classes. Mas há uma série de ações afirmativas, com políticas de cotas, políticas de bolsas para mulheres, para facilitar e permitir o maior acesso.
Eu quero dizer, Senador, que a participação das mulheres não é inferior ao número de 23%. Nós temos, por exemplo, no Itamaraty, dez secretarias, que é o segundo escalão. Desse segundo escalão, há três mulheres que ocupam funções, quer dizer 30%. Neste momento exato, ainda não está em funções a terceira mulher, a Embaixadora Márcia Loureiro, que se encontra aqui na plateia e que será a Secretária de Assuntos Consulares e Jurídicos do Itamaraty...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. MAURO VIEIRA - Perdão?
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) - Eu me referi à estatística de setembro de 2023, que foi a última publicada.
O SR. MAURO VIEIRA - Bom, eu tenho essa estatística de dez secretários, que fazem parte do segundo escalão do ministério. Estão o Ministro, o Secretário-Geral e os secretários. Aí temos três mulheres em dez cargos, 30%.
Há um esforço muito grande para mantermos, evidentemente, a presença feminina nos demais cargos de chefia, como chefes de departamento, chefes de divisão e assessorias. Há um equilíbrio muito grande...
(Soa a campainha.)
O SR. MAURO VIEIRA - ... nos gabinetes do Ministro das Relações Exteriores e da Secretária-Geral.
Aliás, é a primeira vez, na história de 200 anos do Itamaraty, que nós temos uma mulher no segundo cargo mais alto da chancelaria e o cargo mais alto a que um diplomata de carreira pode aspirar, que é o de Secretário-Geral. O cargo de Ministro é um cargo de escolha política do Presidente da República, e o cargo de Secretário-Geral tem que ser de um ocupante do cargo de ministro de primeira classe.
Depois temos também um grande número de mulheres ocupando funções importantes no exterior, chefias importantes. Nós temos a Embaixadora, como V. Exa. mesmo citou, Maria Luiza Viotti, na Embaixada em Washington, que é uma das mais importantes. Posso dizer isso porque eu mesmo servi como diplomata em Washington e depois fui Embaixador em Washington. Mas também temos em várias outras funções, em vários outros cargos.
Acabamos de mandar uma embaixadora muito competente para a Venezuela, para que possa manter um diálogo e evitar o que aconteceu no passado, quando nós não tínhamos embaixada, não tínhamos consulado...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. MAURO VIEIRA - Na Guiana, também é uma mulher. Também é uma mulher na FAO, o que é muito importante. Na Unesco, também é uma mulher. E temos também uma mulher chefiando a missão, a delegação do Brasil junto à Agência Internacional de Energia Atômica. Temos também uma mulher chefiando a Embaixada do Brasil em Singapura, importantíssima plataforma, grande centro financeiro. E há muitas outras.
Eu não trouxe, não estou preparado, não tenho todos os dados, mas posso lhe mandar, com muito prazer. Posso lhe dizer que há também mulheres chefiando vários consulados importantes e grandes, como, por exemplo, Los Angeles, Houston, Madrid, Toronto e Porto. Há também, encontrei aqui uma referência, mulheres chefiando, na função de embaixadoras, em Berna, em Singapura, como já citei, em Budapeste, em Praga, em Seul e em Estocolmo.
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Estamos, evidentemente, empenhados em manter e aumentar esse percentual de 23%. Nem sempre se pode fazer tudo ao mesmo tempo na diplomacia, porque tudo depende dos tempos diplomáticos. E, para a designação de chefes de missão, nós precisamos ter, primeiro, o agrément pedido e, depois, mandar para o Senado.
Na primeira leva de embaixadores que mandamos para o Senado, no início do ano passado, havia 14 ou 15 nomes e só uma mulher, que foi a Embaixadora Maria Luisa Viotti, porque, para as demais que estavam esperando, não tinha sido concedido, e não se pode divulgar. Isso está na Convenção de Viena sobre relações diplomáticas, é tratado de forma reservada. Então, parecia e quem olhava dizia: 14 a 1. Não era, havia muito mais e, ao longo do tempo, foram se consolidando, como está aqui. Mas esses são os dados que eu queria antecipar.
Eu vou preparar depois um documento e lhe mandar, mas tenha certeza de que estamos muito atentos e estamos fazendo o todo possível para mantermos, como temos agora, uma participação acima do número efetivo dos 23%. Estamos em 30%.
Eleição na Venezuela.
Creio que não podemos fazer outra coisa a não ser o diálogo. Nós temos dialogado intensamente, não é de agora. Eu fui Ministro das Relações Exteriores da Presidente Dilma Rousseff, no momento em que havia um grupo, uma troika, de três países da Unasul que faziam a interlocução com o Governo e com a oposição, a pedido da Venezuela. Nós viajávamos, praticamente, todos os meses, passávamos um dia, dois dias e tínhamos contatos e reuniões com todos os órgãos do Governo, desde a Comissão Eleitoral, ao Supremo Tribunal, ao Legislativo, e depois nos reunimos com a oposição dentro da Nunciatura Apostólica para garantir que haveria imunidade. Esse tipo de reunião e de mecanismo levou o Estado venezuelano a concordar com a realização das eleições, que ocorreram em final de 2016, se não me engano.
Nossa posição atual é esta: continuar conversando, por várias razões. É um país onde vivem 25 mil brasileiros, hoje em dia. Temos uma fronteira de 2,2 mil quilômetros na Amazônia, região de grande fragilidade, atravessando essa fronteira de terras indígenas, inclusive, reservas indígenas; temos um comércio importante; temos um problema de pagamentos ao comércio brasileiro, em virtude de sanções internacionais à Venezuela. Portanto, não podemos deixar de dialogar.
Eu creio que a declaração, o anúncio de que as eleições se realizarão no dia 28 de julho é fundamental e importantíssimo. Isso aconteceu, entre outras coisas, pelos constantes contatos que mantivemos, o Itamaraty e o próprio Presidente da República, com o Governo da Venezuela, chamando a atenção para a necessidade de um processo eleitoral ser mantido.
Nós não podemos interferir internamente na legislação. As datas eleitorais na Venezuela não são fixadas, como no nosso caso, em que está na Constituição. Lá o Executivo anuncia, não sei quantos meses antes, há uma forma de dois ou três meses antes anunciar. Estão todas dentro desse critério. Agora, o que nós queremos e nos preocupa muito é apoiar para que haja a realização de eleições justas, transparentes, abertas, aceitas por todos.
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Também nesse sentido é muito importante levar em conta a intermediação que houve em São Vicente, desculpa, em Barbados, com a participação do Governo brasileiro. O Presidente Lula mandou seu assessor especial, Celso Amorim, para participar da negociação e do acordo que foi feito entre o Governo e a oposição. O Governo e a oposição discutiram durante três dias e fizeram um acordo por escrito. Todos aceitaram os termos, que foram negociados e aceitos por ambos os lados.
Também é importante dizer que, quando eu, em 2015 e 2016, ia todas as vezes à Venezuela, me encontrava com a oposição, e a oposição dialogava e nos transmitia todas as suas preocupações, que eram levadas ao outro lado, ao Governo.
Portanto, o importante é isto: é manter essa interlocução, manter esse diálogo constante para buscar soluções aceitáveis.
Com relação à questão da inteligência artificial e guerra cibernética, sem dúvida nenhuma o senhor tocou num ponto fundamental, e isso é o futuro. Nós temos que ter muita atenção. No Itamaraty há, como em todo Governo há, o grupo de trabalho que está discutindo o tema nos ministérios envolvidos - Ciência, Tecnologia e Inovação, Comunicações, Justiça -, o Itamaraty também participa. O tema é tocado e levantado em vários organismos internacionais, e realmente não podemos deixar de tomar medidas imediatas e rápidas para nos protegermos. É uma preocupação também constante em outros países.
O Primeiro Ministro, Presidente, do Governo espanhol esteve aqui na semana passada, falou neste assunto e propôs uma iniciativa conjunta brasileiro-espanhola, e também nós já conversamos sobre esse mesmo aspecto com o Governo francês.
O senhor sabe que o Presidente Macron virá à América Latina; é a primeira vez em seus sete anos de mandato agora - cinco do primeiro e dois e meio do segundo. É a primeira vez que ele virá à América Latina; está vindo exclusivamente ao Brasil, onde passará três dias. E um dos temas é justamente esse, que é muito importante.
Quanto à questão pessoal que o senhor mencionou do grupo de palestinos, isso já está encaminhado. Fico contente, receberemos o tema e trataremos dele.
O SR. ESPERIDIÃO AMIN (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC. Para interpelar.) - A título de réplica, mas eu só queria ajustar duas questões.
Primeiro, eu me baseio em números distribuídos pelo Itamaraty. Não é com intuito de replicar, mas, já que o senhor vai fazer um estudo mais profundo, hoje a estatística de setembro de 2023 é de que houve 62 nomeações para a chefia de missões no exterior, com 11 mulheres - dados do Itamaraty - e 51 homens.
Então, nas contas tanto de um lado do Rio Jordão quanto do outro, não se chega a 23%.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Eu peço desculpas a todos, porque anunciei, como regra, o grupo de três e acabei equivocadamente dando a palavra ao Chanceler para responder às perguntas do Senador Amin. Eu vou restaurar a regra inicial.
Com a palavra o Senador Sergio Moro.
O SR. SERGIO MORO (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR. Para interpelar.) - Bem, bom dia a todos.
Cumprimento aqui o Presidente da Comissão, Senador Renan Calheiros, por realizar esta importante audiência. Cumprimento também o Ministro Mauro Vieira, pela sua presença aqui para responder aos questionamentos.
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Ministro, há uma percepção crescente, na opinião pública tanto internacional como nacional, de que a diplomacia brasileira, com especial referência à diplomacia do Presidente Lula, tem se afastado das democracias ocidentais e dos valores e princípios defendidos pelas democracias ocidentais.
Esses episódios envolvendo Israel, Hamas, Ucrânia, Rússia e a posição do Brasil aqui em relação à Venezuela têm gerado um desgaste contínuo para a imagem do Brasil perante a comunidade internacional. Quem diz isso não sou eu; eu estou reproduzindo o que nós lemos praticamente diariamente em jornais internacionais e mesmo aqui dentro da imprensa nacional.
Algumas perguntas... O Senador Esperidião Amin centrou ali questões sobre as mulheres. Então, eu vou lhe dizer o nome de uma mulher valente: María Corina Machado. Qual é a posição do Governo brasileiro em relação à candidatura presidencial da María Corina? Ela foi vitoriosa nas primárias da Venezuela; no entanto, se encontra arbitrariamente inabilitada pelo regime da Venezuela. Sim, foram anunciadas eleições, mas com inabilitação dos principais opositores, não só dela, mas também de outros, como o Guaidó, como o Capriles, ali na Venezuela.
É claro que o diálogo é importante, e o Brasil não tem condições de fazer uma interferência completa, uma interferência nos assuntos internos, não com muitas sutilezas de rogar que isso seja alterado. Mas o que nos surpreende é que nós temos visto declarações, inclusive do Presidente Lula, fazendo pouco caso da inabilitação da candidatura presidencial da María Corina Machado. Então, minha indagação é qual a posição do Governo brasileiro em relação à candidatura dela, se o Governo brasileiro concorda com essa inabilitação e, se o Governo brasileiro discorda dessa inabilitação, se ele já transmitiu a sua posição - publicamente não o fez, mas se o fez pelas vias diplomáticas.
Além disso, nós temos visto uma crescente arbitrariedade também daquele regime em relação a direitos humanos. Recentemente, Rocío San Miguel, que era Diretora da ONG Controle Cidadão, foi presa na Venezuela, e nós não ouvimos uma palavra pública do Governo brasileiro em relação a essa prisão. Foram expulsos também funcionários da ONU da área dos direitos humanos.
Até nós entendemos, muitas vezes, que a sutileza diplomática não recomenda algumas manifestações públicas para se tentar fazer um diálogo, mas aí eu pergunto se o Brasil, no diálogo, pelo menos ainda que não público, com a Venezuela, com o Governo venezuelano, protestou contra a prisão de Rocío San Miguel na Venezuela.
Mudando aqui de país, mas também com bastante importância, vou falar de outra mulher valente, que é a Jeanine Áñez, a ex-Presidente da Bolívia, que está presa há três anos naquele país, também uma prisão considerada arbitrária pela comunidade internacional, inclusive com manifestação do Parlamento europeu.
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Nós fizemos aqui... A Comissão de Relações Exteriores aprovou o ingresso da Bolívia no Mercosul. Isso foi um pedido, inclusive, do Itamaraty, do Governo brasileiro. Todos nós fomos aqui sensíveis a esse apelo, mas nós pedimos uma contrapartida de formar uma Comissão aqui no Senado para realizar uma visita à Bolívia para que nós pudéssemos analisar a situação de direitos humanos, inclusive essa prisão que nós reputamos aqui extremamente controvertida, além da própria prisão do ex-Governador Camacho, ali da província de Santa Cruz, da Bolívia.
Gostaria de pedir a V. Exa., aproveitando a sua presença, o apoio do Itamaraty para viabilizar essa visita à Bolívia, já que nós estamos... Ontem mesmo o Senador Rodrigo Pacheco oficiou as Lideranças partidárias solicitando a indicação dos membros da Comissão, e nós gostaríamos de fazer isso. Então, gostaria de pedir a V. Exa., aproveitando a sua presença, o apoio do Itamaraty para que nós pudéssemos realizar essa visita.
(Soa a campainha.)
O SR. SERGIO MORO (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - Gostaria também aqui de perguntar - me encaminho ao final - uma clareza da posição brasileira em relação à guerra na Rússia e na Ucrânia. É claro que nós não devemos entrar em guerras europeias, mas o Brasil tem defendido uma solução pacífica; no entanto, parece que a posição de princípio que temos que defender é a integridade do território ucraniano. O fim da guerra na Ucrânia demanda, na minha opinião, a retirada das tropas russas do território ucraniano. Do contrário, seria simplesmente uma rendição aos desejos imperialistas do atual Presidente russo. Eu gostaria de saber qual é a posição do Governo brasileiro quanto a isso, se tem exatamente também essa clareza.
Quero esclarecer - eu tenho ouvido aqui bastantes reclamações do Embaixador ucraniano...
(Soa a campainha.)
O SR. SERGIO MORO (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) - ... no Brasil, o Andrii Melnyk - se o Embaixador tem sido recebido e ele tem sido atendido pelo Itamaraty, e se há uma viabilidade, assim como o Presidente Lula se manifestou desejoso da vinda do Putin ao Brasil, embora esteja inviabilizado pelo mandado de prisão internacional, se há também um convite ao Presidente da Ucrânia, o Zelensky, para que ele venha ao Brasil.
Para finalizar, uma pergunta um pouco mais regional: V. Exa. falou das negociações do acordo de Itaipu. Eu gostaria de indagar se a posição do Governo brasileiro é na linha de, com o fim desses pagamentos, obter, se possível, junto com o Paraguai, um acordo que leve à diminuição das tarifas de energia elétrica no país.
São essas as indagações, Sr. Presidente.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Agradecendo as interpelações de V. Exa., concedo a palavra ao Senador Hamilton Mourão.
Com a palavra, V. Exa.
O SR. HAMILTON MOURÃO (Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - RS. Para interpelar.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, senhoras e senhores, Sr. Chanceler, vou fazer uma primeira pergunta aqui para o senhor, que é uma pergunta dos meus eleitores: quem assessora o Presidente Lula na questão de política externa em relações internacionais, V. Exa. ou o Embaixador Celso Amorim?
Na minha segunda pergunta, Sr. Embaixador Mauro Vieira, vou fazer uma digressão histórica. Eu sei que o senhor conhece história até mais do que eu, mas eu acho importante para situar aonde eu quero chegar.
Em 1648, ocorre a Paz de Vestfália e nós inauguramos um sistema de relações internacionais baseado no equilíbrio de poder, que dura em torno de 150 anos, até as guerras napoleônicas. Posteriormente, o Congresso de Viena retoma esse processo.
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Nós temos outro período de 100 anos, baseado em uma ordem mundial, digamos assim, que se esfarela com a Primeira Guerra Mundial e, junto com a segunda - que alguns estudiosos hoje já chamam de a Segunda Guerra dos 30 anos da Europa -, desemboca no sistema que nós estamos vivendo ainda, baseado nas Nações Unidas, em todos os mecanismos de direito internacional, em todos os princípios que hoje regem as relações entre países.
No entanto, esse sistema apresenta-se, praticamente, na minha visão, no seu final, está nos seus estertores. Isso foi agravado pela pandemia da covid-19, foi mais agravado ainda por esse conflito entre a Rússia e a Ucrânia e pela própria questão que foi debatida aqui, inicialmente - o senhor estressou bem o assunto -, essa guerra entre Israel e o Hamas, essa guerra eterna, lá no Oriente Médio. Aliás, existe uma frase que diziam que era do Platão, mas, na realidade, dizem que era do General MacArthur: "Apenas os mortos verão o fim da guerra". A guerra não foge da vida da humanidade.
Então, nós temos hoje uma nova ordem mundial se organizando. Surge um grupo, em que está a China, a Rússia e o Irã, que alguns estudiosos chamam de eixo da resistência - eu não gosto muito desse nome -, e outro grupo das democracias ocidentais. A minha pergunta para o senhor, como um estudioso, como assessor de governos é: onde o Brasil vai se situar nessa nova ordem mundial?
Era só isso.
O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Recebo a interpelação do Senador Hamilton Mourão e concedo a palavra ao Senador Randolfe Rodrigues.
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (S/Partido - AP) - Presidente, posso declinar até o próximo bloco?
O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Posso fazer uma permuta com o Senador Astronauta Marcos Pontes.
Com a palavra, V. Exa.
O SR. ASTRONAUTA MARCOS PONTES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - SP. Para interpelar.) - Obrigado, Presidente.
Bom dia a todos. Bom dia, Chanceler. Obrigado por ter vindo aqui conosco.
Tenho duas perguntas simples. Talvez sejam simples para responder, mas - eu acredito - de uma importância grande.
Como o senhor sabe, eu fui Ministro de Ciência, Tecnologia e Inovações, e esse é um setor que tem uma capilaridade internacional muito grande, ou seja, o Brasil participa, em parceria com diversos países, em projetos importantes. Obviamente, o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação tem a responsabilidade tática de colocar esses projetos em andamento, mas o Ministério das Relações Exteriores tem uma participação muito grande para que essas parcerias e projetos aconteçam de forma harmônica e eficiente.
Então, a minha pergunta: gostaria que o senhor fizesse um sumário muito breve - e é bom, porque, provavelmente, as prioridades vão estar na sua cabeça, e essas prioridades são justamente o que eu gostaria de saber - a respeito dos projetos de cooperação internacional no setor de ciência, tecnologia e inovações que o Ministério das Relações Exteriores tem priorizado para este ano e para os próximos anos. Essa é a primeira.
A segunda. Nós vemos uma série de coisas acontecendo no planeta, conflitos, escassez, mudança climática, uma série de situações. Certamente, o Ministério das Relações Exteriores deve ter um setor que trata de uma previsão ou uma preparação de como o país pode ser afetado, positiva ou negativamente, por esses fatores que estão acontecendo no planeta e que devem acontecer dentro dessas previsões.
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Eu gostaria que o senhor também fizesse um tipo de um sumário rápido sobre quais são as maiores preocupações - pensando como se fosse uma análise SWOT aqui, pegando as duas partes externas -; quais são as maiores oportunidades e preocupações que o senhor vê que o Brasil tem não atualmente, mas nos próximos meses, nos próximos anos; e o que nós podemos fazer aqui do ponto de vista de Legislativo ou mesmo no país como um todo para mitigar os riscos ou para aproveitar essas oportunidades.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Concedo a...
O SR. JAQUES WAGNER (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Sr. Presidente...
O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Senador Jaques Wagner.
O SR. JAQUES WAGNER (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA. Pela ordem.) - Se V. Exa. me permite, eu tinha até avisado antes ao Ministro Mauro que eu tenho um compromisso na Assembleia Legislativa da Bahia e, portanto, não posso perder essa oportunidade do voo ao meio-dia e pouquinho, e tenho que sair correndo. Então, não vou fazer nenhuma pergunta, mas apenas queria registrar meus elogios à atuação não só do Ministro - evidentemente, o Ministro é quem capitaneia -, mas de todo o Itamaraty, como sempre muito profissional e muito atento à defesa dos interesses do Brasil, mantendo a política de não interferência nas vidas internas de qualquer país.
Eu creio que essa trajetória de 14 meses, capitaneada, evidentemente, pelo Ministro, mas orientada pelo Presidente da República, deu essas marcas. Voltamos a fazer crescer o relacionamento internacional, voltamos a participar de todas as mesas multilaterais importantes, estamos abrigando aqui, como já foi dito, o G20, o Brics, vamos fazer a COP de 2025.
Então, eu queria parabenizá-lo por essa trajetória e reforçar que comungo totalmente da posição do Presidente Lula - e estou dizendo da posição política, sem me apegar a esse ou àquele detalhe de fala que pode ser tomado como ofensivo. Minha posição já deixei clara no Plenário desta Casa quando daquele episódio.
Só como reflexão, no episódio Rússia-Ucrânia, nós, imediatamente, declaramos a condenação à invasão. Pela condição nossa de busca do equilíbrio da paz, nem sempre isso é compreendido. Aí o Governo brasileiro é acusado de estar do lado dos invasores, em tese, ou de ter simpatia, como se fosse um crivo político-ideológico. Quando, agora, e, de novo, falo muito à vontade por ser judeu e filho de famílias que sofreram na Segunda Guerra, quando, da mesma forma, buscamos a paz e estamos defendendo as questões humanitárias obrigatórias, quando eu digo que uma criança palestina é tão valiosa quanto uma criança israelense ou que o idoso palestino é tão valioso quanto o idoso israelense, aí nós somos taxados de estar a favor dos invadidos.
Então, eu acho que a gente não pode usar do crivo ideológico para ter uma posição. Se a posição é perene, ela é isso, ela é equidistante. Independentemente da natureza de quem invade, nós vamos sempre condenar aqueles que invadem território que já está previamente demarcado por cada país, pela história e pelas Nações Unidas.
Então, eu queria só deixar o registro dos meus parabéns pela tradição do nosso Itamaraty, a tradição de Rio Branco, ter voltado a respirar dentro do Itamaraty.
Muito obrigado.
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O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Concedo a palavra ao Ministro Mauro Vieira para responder às interpelações.
Com a palavra V. Exa.
O SR. MAURO VIEIRA (Para expor.) - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Eu começaria então, rapidamente, respondendo às perguntas do Senador Sergio Moro.
Eu queria dizer que não há um afastamento das democracias ocidentais. O Brasil é um país que tem diálogo com todos os países. Nós temos embaixadas residentes em um grande número de países, temos uma rede enorme. Não é só com os países que pensam ou atuam da mesma forma. Nós somos um país de diálogo que tem preceitos constitucionais que orientam a nossa política externa, um deles é o multilateralismo, a solução pacífica das controvérsias e tantos outros.
Eu não vejo esse afastamento de nenhuma democracia ocidental. O Brasil não poderia deixar de ter contatos com todos os estados que o senhor citou, nesta circunstância, pela importância desses países, pela importância comercial, pela importância de relações científicas, tecnológicas, de relações de comércio exterior. Eu, sinceramente, não acho que haja uma diferença, como o senhor mencionou também - praticamente respondido pelo Senador Jaques Wagner -, com relação à Ucrânia e a Israel.
O Presidente Lula era, talvez... Como foi em 2022, no início de 2022, não sei se já era, oficialmente... Eu estava no exterior e não me lembro se ele já era, oficialmente, em fevereiro de 2022, candidato, falado como candidato sem dúvida. Mas ele criticou muito duramente a invasão da Rússia nesse momento e, desde o primeiro dia do seu Governo, a partir do dia 1º de janeiro, criticou a invasão do território da Ucrânia pela Rússia e defendeu a integridade territorial. Recebeu, aliás, no mesmo dia, uma após a outra, delegações tanto da Rússia quanto da Ucrânia, que vieram em alto nível; e, curiosa ou coincidentemente, eram de mesmo nível hierárquico as duas delegações. Pena que o Senador Esperidião Amin não está, mas queria registrar que ambas eram presididas por mulheres Senadoras dos dois países. Ele ouviu os dois lados, conversou e reafirmou a posição.
Agora, o que ele tem dito, desde esse primeiro momento, é que chega de falar de guerra, que chega de guerra. Ele sempre promoveu e disse que o Brasil estaria pronto a participar de qualquer iniciativa que levasse a um entendimento entre as duas partes e que levasse também a um encontro entre as duas partes. Foram muitas as iniciativas promovidas pela União Europeia de projetos de paz. Houve, se não me engano, na Holanda. Agora, não estou me lembrando bem, mas tenho certeza... Não, foi em Copenhague, houve na Dinamarca uma reunião. Já houve mais de uma reunião para negociar a paz, só que só tinha um lado. Fica difícil, não é um diálogo, é um monólogo. Eu acho que para que haja um entendimento, para que se possa chegar a alguma coisa, é preciso, sempre, estarem os dois lados presentes.
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Eu não posso, de forma alguma, deixar de esclarecer isto: que não há um afastamento, que não há nada de ideológico. Nós nos damos com todos. Nós temos excelentes relações na América do Sul, sempre tivemos, com os governos mais diferentes, desde o Governo do ex-Presidente Chávez, como os Governos da Colômbia, do Presidente Uribe, todos com orientações totalmente diferentes um do outro e nós sempre tivemos excelentes contatos, excelentes relações. E isso diz respeito também a todos os outros países. Isso aconteceu com relação aos Estados Unidos e a todos os demais.
Com relação à questão de Ucrânia e Israel, sobre que o senhor fez uma distinção, dizendo que havia um contraste, não tem também. É a mesma coisa. Da mesma forma que condenamos a invasão da Ucrânia, condenamos os atos terroristas, e o Presidente, o próprio, disse isso. Os atos terroristas que desencadearam esse conflito em Gaza ele condenou e também, imediatamente, pouco tempo depois, passou a condenar o excesso, a reação desproporcional e a crise humanitária sem fim a que nós estamos assistindo. É uma coisa... O senhor deve ter visto também. Constantemente, na imprensa, as notícias, as fotografias são coisas terríveis!
Então, eu acho que a humanidade não permite que se se cale diante disso. Nós temos que pedir a paz e dizer que é chegada a hora. Pessoas representativas na comunidade internacional, como o Papa, que é indiscutível, já pediu também, tanto na questão Israel-Palestina como na questão Rússia-Ucrânia, o fim das hostilidades.
Então, esta é a nossa posição: o Brasil estará sempre pronto a participar de qualquer esforço, de qualquer conferência, de qualquer negociação que estabeleça, que abra um diálogo. Isso é o que está faltando, porque não tem havido um diálogo. Até agora, só há fornecimento de armas e investimentos, como eu mencionei a cifra de US$2,2 trilhões, em armas. Isso aplicado de outra forma teria um efeito muito melhor, muito mais benéfico para a humanidade.
Com relação à inabilitação de pessoas, de candidatas, de uma mulher, a María Corina Machado, e à detenção de Rocío San Miguel, o ministério, nós, o Governo tomou conhecimento, informamos ao Presidente. A questão toda é que nós não podemos e não devemos interferir internamente em nenhum país, como nunca o fizemos. Nós não dizemos, nós não ensinamos a ninguém o que deve fazer. Esperamos que possa haver, sim...
(Soa a campainha.)
O SR. MAURO VIEIRA - ... um entendimento também e para isso participamos intensamente em todas essas iniciativas, como eu mencionei, desde 2015 e 2016, desse diálogo para o entendimento nacional que havia no período da Unasul, com a Venezuela, como também continuamos apoiando o entendimento, a reunião que houve em Barbados entre Governo e Oposição.
É isso que nós podemos fazer para tentar ajudar com o nosso exemplo. Nós sempre solucionamos todas as nossas diferenças internas e externas pela negociação, pela prática democrática, pelo exercício da democracia. Temos que fazer isso. Não creio que se possa fazer nenhum tipo de interferência direta que não seja adequada. Agora, tenha certeza de que nós conversamos e muito - para isso existem as embaixadas, para isso existem os embaixadores -, transmitindo mensagens. Nem sempre isso é público, nem poderia ser porque a diplomacia tem seus tempos e tem suas maneiras, seus modos.
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Os anúncios são feitos quando as negociações levam a bom fim, mas há uma série de iniciativas que tem que, obviamente, enquanto estão em andamento, ser mantida. Mas nós temos, inclusive, manifestado, em organismos multilaterais que tratam de direitos humanos, nossa posição muito claramente no Conselho de Direitos Humanos em Genebra e em outros, com relação a vários países e várias regiões. Portanto, eu queria lhe dizer isso.
Com relação... O senhor mencionou uma Comissão à Bolívia e, evidentemente, o ministério estará sempre pronto para gestionar o que for. Esperemos que seja aceito o desenho dessa missão pelo Governo local, para que se possa fazer essa reunião, esse encontro.
Bom, eu já mencionei, o senhor falou com clareza e me pediu clareza sobre a posição entre Rússia e Ucrânia; creio já ter respondido. Com relação ao convite que o senhor disse ao Presidente da Ucrânia, também visitas presidenciais são negociadas, acertadas. O Presidente se encontrou com ele em Nova York, à margem da ONU; quando foi ao G7, não foi possível encontrar-se porque a agenda do Presidente da Ucrânia estava repleta e ele não teve tempo para esse encontro. Mas eu converso, eu tenho contatos com o Ministro das Relações Exteriores e sempre estamos falando. Negociaremos no momento que for adequado e que seja pedida essa visita. Uma visita de chefe de Estado é negociada, é acertada, será discutida no momento em que chegar a acontecer.
Quanto à tarifa de Itaipu, eu queria dizer que a preocupação é justamente que seja garantido, com a nova tarifa de Itaipu, a que for acordada entre as duas partes, como aconteceu nos últimos 50 anos, o pleno funcionamento e a segurança da empresa, que é um símbolo mundial de integração, também que seja favorável ao consumidor brasileiro e ao paraguaio também e que os benefícios da construção e, sobretudo, do fim da quitação do financiamento possam ser transmitidos aos consumidores brasileiros.
Com relação à pergunta do Senador Hamilton Mourão - agradeço a sua presença, Senador -, eu gostaria de dizer o que já respondi em outras ocasiões: o principal assessor de política externa, é uma questão de legislação, é o Ministro das Relações Exteriores.
Os presidentes brasileiros sempre tiveram, desde os períodos militares, assessores internacionais e, grande parte das vezes, eram diplomatas. Que eu me lembre, não sei se houve no passado algum não diplomata, além do Prof. Marco Aurélio Garcia, que era um homem de grande preparo, grande categoria e de toda a confiança do Presidente Lula, que foi seu assessor internacional nos dois primeiros mandatos do Presidente. Inclusive, pela sua atividade partidária como Diretor de Relações Internacionais, conhecia amplamente o espectro político, sobretudo no continente latino-americano, conhecia como poucas pessoas - me surpreendia o nível de conhecimento e a assessoria que dava. Mas é indispensável o Presidente ter um assessor diplomático, porque há várias coisas para as quais ele precisa mandar uma pessoa que não seja o Ministro do Exterior.
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O Ministro do Exterior, ao ir a determinados encontros, a determinadas situações, está levando uma chancela do Governo, e não é esse o caso, porque às vezes são conversas reservadas, são o tipo de encontros que eu mencionei com relação à Ucrânia, de tentativas de conferências de paz para a Ucrânia, em que não tem um dos lados - o Governo brasileiro não poderia estar presente nisso; um representante pessoal do Presidente da República, sim.
Além do que, é utilíssimo ter uma pessoa com a experiência profissional, com a experiência, como Ministro, do Embaixador Celso Amorim, que está no mesmo andar e próximo do Presidente. Eu falo diariamente com ele, várias vezes, e tem várias vezes que é: "Olha, por favor, leve tal informação, tal papel ao Presidente" - se fosse esperar que eu me deslocasse para ir, o tempo... A exigência hoje em dia do tempo é muito maior, então a celeridade da transmissão de informação é fundamental e é esse o papel dele; além do que, somos amigos há 40 anos, pelo menos, e nos entendemos muito bem e repartimos, com essa visão que eu lhe dei, muito bem as funções que ele exerce e que eu exerço.
Com relação à Nova Ordem Mundial, o Brasil vai se situar onde nós acreditamos que é o nosso papel; quer dizer, no mundo multipolar, nós temos que ter - o que eu já declarei aqui - relações e estar em contato com todos os países, acompanhar todos os movimentos de crescimento mundial. Eu me lembro de que, em 1986, o Brasil fez um importante acordo espacial com a China, o CBers, que está até hoje em vigor, num momento totalmente diferente da situação da China, hoje uma grande potência em várias áreas - sobretudo na área científica e tecnológica -, mas naquele momento estava também começando, desenvolvendo as suas possibilidades, e o Brasil teve muito a aprender - e isso com vários outros países; a mesma coisa na Coreia do Norte, no Governo do Presidente Fernando Henrique, lembro também que foram feitos vários acordos em que o Brasil só teve a ganhar.
O Brasil aproveita todas essas oportunidades de cooperação, de parcerias, e tem feito isso em todos os países. Nós fizemos isso inclusive na nossa região, no Governo do Presidente Sarney e do Presidente Alfonsín, houve um grande avanço na questão de informática entre o Brasil e a Argentina: foi criada uma entidade chamada Ebai (Escola Brasileiro-Argentina de Informática), num momento de grande discussão no Brasil da Lei de Informática, e que levou a importantes avanços para o nosso país.
Então eu acho que é esse o papel que nós temos que ocupar.
Senador Marcos Pontes, creio que um pouco já respondi da questão que o senhor colocou de ciência, tecnologia e inovação. São vários os temas, são enormes; o Ministério das Relações Exteriores, obviamente tem interesse, está presente, sobretudo na interface externa, e trabalhando muito conjuntamente com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.
Ontem tivemos a boa notícia de que a adesão total e completa do Brasil ao Cern, o centro europeu de pesquisa nuclear, foi finalmente encerrada, esse é um passo importantíssimo, fundamental, e também em vários outros... São muitos os instrumentos e muitas as possibilidades que se abrem.
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Nós exploraremos todas, desde pesquisa genética, de pesquisa em inteligência artificial... O importante é que o Brasil esteja presente em todas essas iniciativas e que não perca a oportunidade, que não fique para trás e que depois não fique na mão de um grupo de países ou de uma organização que possa controlar e dificultar o nosso acesso. Então, o interesse nacional é esse.
Queria agradecer ao Senador Jacques Wagner, que não fez nenhuma pergunta, como ele mesmo disse, mas que fez declarações com as quais eu concordo plenamente; e seria até ocioso responder, ou voltar, porque já abordei todas aqui.
Muito obrigado.
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (S/Partido - AP) - Presidente...
O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Senador Randolfe Rodrigues, com a palavra, V. Exa.
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (S/Partido - AP. Pela ordem.) - Presidente, eu queria, somente, cumprimentar o Embaixador Mauro Vieira, que recupera, para a cadeira que ele ocupa, as melhores tradições de nossa diplomacia. As tradições advindas do Barão do Rio Branco; de Manuel de Oliveira Lima; de Oswaldo Aranha, presente na fundação da Assembleia das Nações Unidas e responsável, inclusive, pela criação do Estado de Israel e reconhecido como tal.
Eu queria cumprimentá-lo, e eu queria cumprimentá-lo sobretudo com números, que eu acho que é importante. Eu acho que os números falam por si sobre o papel que o Brasil está cumprindo atualmente.
O atual Presidente da República já teve encontro, em um ano de mandato, Presidente Renan, em um ano de mandato, em dois meses, com 47 chefes de Estado de nações estrangeiras.
O Brasil sediou a reunião dos países do Cone Sul, no ano passado. O Brasil, neste momento, preside o G20. O Brasil presidiu o Mercosul. E o Brasil sediará, no ano que vem, uma conferência do clima. Conferência do clima essa que já era para ter sido sediada por nós, Embaixador Mauro Vieira, em 2019, mas que foi banida de nosso país.
O Brasil e o Embaixador Mauro Vieira reconhecem o sentido do papel que o país ocupa no cenário internacional, pautado por alguns princípios, um deles o multilateralismo. Multilateralismo esse que, vergonhosamente, pelo antecessor do Ministro Mauro Vieira, foi atacado sob a alegação de que não tinha espaço para o Brasil no chamado globalismo.
Aliás, no período anterior, é bom destacar o sentido de isolamento que nós viemos a cumprir na seara internacional.
Eu ouvi dizer: "O Brasil está se afastando das democracias ocidentais?". Bom, vamos perguntar isso ao Presidente Biden, que já encontrou duas vezes com o Presidente Lula e que, reiteradas vezes, pergunta para ele.
Parece-me que os Estados Unidos da América são a principal democracia ocidental. Sobre se afastar das democracias ocidentais, vamos perguntar para o Presidente do Governo da Espanha, Primeiro-Ministro da Espanha, Pedro Sánchez, que esteve lá, que esteve aqui no Brasil - em uma visita que não foi feita por premier espanhol no período passado - durante quase dois dias; e que trouxe também negócios e investimentos espanhóis para o Brasil.
Vamos perguntar isso, quem sabe, para o Presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, que convidou o Presidente Lula para a celebração dos 49 anos da Revolução dos Cravos; e que o convidou, agora, para os 50 anos da Revolução dos Cravos.
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Afastar-se das democracias ocidentais? O Brasil preside o G20, aclamado pelo G20, aclamado pelos demais 19 países. O Brasil foi aclamado para sediar uma conferência do clima, a primeira em toda a história das conferências do clima, que será no coração climático do planeta, na Amazônia.
Então, eu acho que os números revelam algo totalmente distinto. O atual Presidente da República, com o seu Chanceler... repito, 47 chefes de delegações estrangeiras, com seus chefes de Estado; o Governo anterior, em quatro anos, 33. Ou seja, bastou um ano para nós superarmos tudo o que ocorreu no período passado.
O Brasil voltou ao cenário internacional sendo respeitado e tendo um papel de voz ativa na comunidade internacional de nações, tanto é que, ao condenar a guerra, ao condenar os ataques que estão em curso em Gaza, o Presidente da República passou depois a ser reconhecido de todas as formas pela posição que assumiu, denunciando o que nós assistimos hoje, que é uma carnificina. E reitero o que foi dito aqui: o Brasil foi um dos primeiros países a condenar o ataque do Hamas ao povo de Israel...
(Soa a campainha.)
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (S/Partido - AP) - ... e, mais que isso, a denunciar o Hamas como uma organização terrorista. É essa a posição da nossa Chancelaria, é essa a posição do Governo brasileiro, mas, na mesma medida, nenhuma nação, nenhum líder contemporâneo de qualquer nação da humanidade pode aceitar 32 mil mortos, sendo, desses 32 mil, 70% mulheres.
Ministro Mauro Vieira, nós estamos aqui, nós estamos há duas horas, mais ou menos, nesta Comissão de Relações Exteriores. Nessas duas horas, pelo menos, quatro mulheres palestinas foram mortas em Gaza. A cada uma hora, uma mulher palestina é morta em Gaza. Nós temos o maior processo de imigração forçada da história contemporânea. Mais de 2,5 milhões de pessoas foram despejadas de suas casas. Isso é três vezes, é quatro vezes mais do que a população do meu Estado, o Amapá. É como se os 800 mil amapaenses fossem obrigados a sair de suas casas e, em seguida, as suas casas fossem destruídas. Dos 32 mil mortos, 12 mil são crianças.
Condena-se o Hamas com toda a veemência, é uma organização terrorista, mas tem nome o que está acontecendo em Gaza e o nome disso é genocídio, e isso, em nome da humanidade, tem que ser denunciado. E a posição do Brasil em relação a isso é clara.
Em relação à Sra. Jeanine Áñez, é importante dizer como ela ascendeu ao poder na Bolívia. Foi em decorrência de um golpe de Estado. O Presidente da República foi obrigado a renunciar, o Vice-Presidente foi obrigado a renunciar, o Presidente da Câmara boliviana foi obrigado a renunciar e o Presidente do Senado, por intervenção das Forças Armadas. Logo em seguida, um ano depois, restabeleceu-se a normalidade democrática com a eleição de um Presidente da República reconhecido pela comunidade internacional.
Nesse âmbito, ela responde pelo crime de golpe de Estado. E aí eu acho que, seja na Bolívia ou seja no Brasil, quem tenta golpe de Estado tem que ir para a prisão, porque atenta contra a democracia. O princípio de Popper tem que servir para a atualidade. Não se pode traduzir e trazer a intolerância com intolerância, porque reproduz a intolerância. O princípio de Popper deve servir para a atualidade, sobretudo, em todos os cantos em que a democracia está sendo ameaçada, seja na Bolívia, seja no Brasil.
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A posição do Brasil em relação à Venezuela é esta, de desarmar eventual conflito que poderia ter na nossa vizinhança. O Presidente Lula, há duas semanas, não foi em Caracas, ele foi em Georgetown, na República Cooperativista da Guiana, reconhecer e dizer, em alto e bom som: "Não aceito, como líder da região. Não aceito e não aceitaremos um conflito aqui."
Romper relações com vizinhos, como foi feito no passado, contribui para quê? Será que contribuiria para a construção da paz que está sendo construída nesse momento?
Embaixador, eu o cumprimento por fazer parte desta grande obra de resgatar o nosso Brasil ao seu lugar de destaque na diplomacia internacional, na liderança global. Nós temos vocação para isso e eu tenho certeza de que temos um chanceler à altura disso, mas, sobretudo, temos um líder de nosso país que tem o reconhecimento de todos os países do mundo para cumprir essa missão.
O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Agradecemos a V. Exa.
Senador Wellington Fagundes, com a palavra.
O SR. WELLINGTON FAGUNDES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - MT. Para interpelar.) - Sr. Presidente, quero cumprimentá-lo aqui, Senador Renan Calheiros, e também o nosso Embaixador Mauro Vieira por essa excelente presença aqui, em quase mais de duas horas, não é, Senador?
Eu queria também aqui, Ministro, comunicar que, agora pela manhã, nós tivemos aqui a eleição no grupo Brasil-Arábia Saudita, quando tivemos a oportunidade de ser eleito como Presidente deste grupo e ter também como Vice-Presidente o Senador Rogério Carvalho e como Primeiro Secretário ser o Senador Esperidião Amin. É claro que quero já aqui pedir ao Ministro que a gente possa ter essa interação entre o grupo parlamentar. Já tivemos um trabalho com a Embaixada da Arábia Saudita, o Embaixador Faisal, a quem, inclusive, já quero convidar, pois vamos fazer logo agora, após o Ramadã, um evento na Embaixada, e o embaixador já nos convidou, o grupo, para estar lá presente num jantar de entrosamento. E aí já me deu a liberdade de convidá-lo, bem como também ao Presidente da Comissão de Relações Exteriores, o Senador Renan Calheiros. É claro que o nosso objetivo é intensificar as nossas relações, como todos os grupos aqui têm essa função.
Eu tenho aqui quatro perguntas, e vou tentar ser bem rápido, dado o horário já.
Todos nós reconhecemos aqui a importância das embaixadas, principalmente na promoção das relações comerciais. Diante disso, eu quero aqui fazer a pergunta: quais medidas estão sendo adotadas para fortalecer o papel aqui das embaixadas brasileiras na intensificação de oportunidade de comércio, na remoção das barreiras comerciais e na atração de investimentos estrangeiros, que possam impulsionar também o desenvolvimento econômico do Brasil?
Na mesma linha, a gente tem percebido, principalmente ao longo do tempo, que o Itamaraty tem aprimorado sim o enfoque nas questões econômicas e comerciais, em especial no agronegócio, o que para nós do Mato Grosso, do Centro-Oeste brasileiro, é extremamente importante. E aí o senhor poderia explicar como o Ministério se estrutura nessas questões? Como um exportador, interessado em prospectar novos mercados, pode contar com o apoio da rede diplomática? E ainda: o acordo entre o Mercosul e a União Europeia estabelece uma série de medidas para facilitar o comércio entre os dois blocos. Por exemplo, o Imposto de Importação será eliminado para mais de 90% dos bens comercializados entre os países dos dois blocos após um período de transição.
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E eu pergunto: Quais as chances reais do acordo de associação Mercosul-União Europeia avançar?
E, ainda, o terceiro, que é em relação à temperatura do planeta que está cerca de 1,1 grau centígrado a mais do que no final do século.
E aí eu registro, inclusive, Senador Renan, que em meu estado, o Pantanal Mato-Grossense está vivendo a pior seca, vai viver agora, dos últimos 154 anos. As temperaturas do Mato Grosso e do Mato Grosso Sul devem estar agora, nesta semana, a mais de 40 graus.
E a pergunta é: Como o Brasil está se posicionando em relação às mudanças climáticas e quais são as principais iniciativas diplomáticas para promover a cooperação internacional na mitigação e adaptação?
São essas as perguntas.
Parabéns pelo trabalho e espero que a cada dia mais possamos ampliar essa relação, principalmente do Ministério das Relações Exteriores...
(Soa a campainha.)
O SR. WELLINGTON FAGUNDES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - MT) - ... com todos os países.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Concedo a palavra ao Senador Girão.
Apenas uma ponderação, quando acertamos a vinda do Ministro para esta Comissão de Relações Exteriores, nós assumimos um compromisso de liberá-lo antes das 13h para que ele pudesse, evidentemente, ter um outro compromisso.
Portanto, eu faço um gentil apelo a V. Exa. para sintetizar ao máximo a sua pergunta e as suas interpelações.
O SR. EDUARDO GIRÃO (Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE. Para interpelar.) - Com certeza, Sr. Presidente Renan Calheiros.
Já que será às 13h, eu tenho 50 minutos então, é isso? (Risos.)
O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL. Fora do microfone.) - Isso é um perigo.
O SR. EDUARDO GIRÃO (Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Não, eu vou ser bem breve, até porque eu conversei com os colegas agora lá em Plenário, nós estamos tendo Plenário, e peço desculpas por não ter chegado desde o início, estava numa reunião de Líderes, mas alguns colegas já fizeram até algumas perguntas, Embaixador Mauro Vieira.
Ministro, seja muito bem-vindo aqui ao Senado Federal.
O que eu queria era apenas tentar esclarecer pontos que alguns colegas trouxeram, mas não se sentiram, pelo menos na inteireza, contemplados com a resposta.
Com relação... No Brasil, a gente sabe, a gente sabe do histórico do Brasil na diplomacia, um país que sempre foi da cultura da paz, um país que sempre teve uma posição de neutralidade ou de construção da paz. Está aí Oswaldo Aranha, está aí o nosso próprio Ruy Barbosa.
E o que tem me preocupado ultimamente, Ministro, é a questão do flerte que nós estamos vendo do atual Governo Lula com ditadores, que tem um lado muito claro. O Brasil sempre teve uma posição diferente e agora está tendo um lado muito claro, e é uma das falas que o senhor teve que me passaram, sobre a questão do que o senhor falou sobre o caso lá de Israel, do que está acontecendo, que o Governo Lula se manifestou, a violação dos direitos humanos e tal, mas eu não vejo essa manifestação do Presidente Lula, do Governo brasileiro, com relação ao que está acontecendo lá na Venezuela. Nós recebemos aqui, antes da Presidência do Senador Renan Calheiros, ainda no ano passado, foi até uma solicitação do Ministro Moro, e nós ouvimos aqui a Corina Machado, que fez uma participação dentro do Senado Federal aqui virtualmente, porque ela tem essa limitação lá no seu país, agora está enfrentando todo tipo de vilipêndio. Mais uma vez, teremos uma eleição lá altamente questionável. E eu lhe pergunto: por que o Presidente Lula não se manifesta sobre essas violações lá na Venezuela? Muito pelo contrário. O sinal é o contrário. Dá o tapete vermelho quando vem Nicolás Maduro para o Brasil.
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Isso me preocupa muito, o que está acontecendo com cristãos. Não sei se o senhor tem essa informação, mas nós somos uma nação majoritariamente cristã. Nós somos aí perto de 90% dos brasileiros cristãos. E o que está acontecendo lá na Nicarágua com Daniel Ortega, outro que tem relações boas com o Presidente Lula, é algo de estarrecer qualquer cristão. Estão fechando rádios, tendo problemas lá com relação à questão de violação dos direitos humanos.
E para encerrar, Senador Renan Calheiros, ficando aí no meu tempo de mais um minuto. Recentemente, o Embaixador da Ucrânia no Brasil, Andrii Melnyk, afirmou que aguarda há cerca de seis meses - vou repetir, seis meses - que o Governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva cumpra um acordo estabelecido no ano passado e convide o Chanceler ucraniano Kuleba para visitar o Brasil, já tendo feito diversos contatos com o Ministério das Relações Exteriores. Em contrapartida, o Chanceler russo Sergey Lavrov, em menos de um ano, em menos de 12 meses, já foi recebido duas vezes pelo Governo brasileiro. Tal atitude vinda do nosso país, que sempre teve uma relação diplomática de neutralidade, como eu falei aqui, em busca da paz, é muito estranha e me deixa num sentimento de injustiça grande.
(Soa a campainha.)
O SR. EDUARDO GIRÃO (Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Como brasileiro, como cidadão, eu fico num sentimento... Por que esses dois pesos e duas medidas? A gente sabe, mas receba. É aquela velha história que tem: receba. Por que isso, fazer esse tipo de isolamento, de discriminação? Inclusive eu tenho um requerimento aqui na Comissão, esperando uma reunião deliberativa. Entrei só para colocar esse requerimento, Senador Renan Calheiros - espero que a gente possa deixar claro o posicionamento dos colegas -, para receber o Presidente Volodymyr Zelensky, que topa vir aqui ao Senado Federal, já que o Governo brasileiro está ignorando a Ucrânia. O Brasil tem uma colônia, o senhor sabe, no Paraná e em Santa Catarina, grande de descendentes de ucranianos.
(Soa a campainha.)
O SR. EDUARDO GIRÃO (Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) - Se o Governo Lula não receber, o Senado, no espírito de democracia, puder votar isso, nós vamos ter realmente um equilíbrio.
É isso que eu faço o questionamento. Muito obrigado, Senador Renan Calheiros, pela tolerância.
O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Agradecemos. Com a palavra o Chanceler Mauro Vieira.
O SR. MAURO VIEIRA (Para expor.) - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Eu quero responder então ao comentário do Senador Randolfe e aos dois questionamentos.
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Com relação ao Senador Randolfe, ao comentário que fez, só queria concordar plenamente com ele, com o seu argumento de que o Brasil não está, de forma alguma, isolado.
Eu acho que é óbvio, é claro, pelas vezes com que o Presidente, em todas as interações que teve o Presidente, em visitas ao exterior, em visitas que recebeu, e também em reuniões multilaterais, à margem das reuniões, teve uma interação com um número enorme de Chefes de Estado, dos mais importantes.
Nisso também, Senador Girão, posso já começar a responder às suas perguntas.
Por exemplo, na próxima semana, nós teremos aqui o Presidente Macron, da França.
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (S/Partido - AP) - Passará três dias.
O SR. MAURO VIEIRA - Pois é. Três dias. Irá à Amazônia. Estará no Rio de Janeiro, tratando de assuntos da maior importância; e, em São Paulo, num grande encontro empresarial. Depois, em Brasília, para a parte política da sua visita.
Ele virá pela primeira vez, nos seus primeiro e segundo mandatos, e visitará só o Brasil.
Acho que isso é um sinal.
E todos os projetos que serão anunciados mostram que há um grande interesse da França, uma grande aproximação.
A França, sem dúvida nenhuma, um grande ator na democracia mundial. Não há a menor sombra de dúvida.
Também vamos ter em breve, não me lembro direito se em duas ou três semanas, uma visita importantíssima, que não está sequer anunciada, mas que já nos foi pedida e será feita, que é a do Secretário de Estado do Vaticano, que é o número dois. É o Primeiro Ministro do Vaticano, que virá ao Brasil no interesse, justamente, porque é o Chefe de Governo, é quem cuida dos assuntos de Governo, de políticas externas do Governo do Vaticano.
Isso, para não falar de todas as outras questões, de todos os outros encontros.
Eu, de forma alguma, não vejo flerte com ditadores. O próprio Senador Randolfe já abordou essa questão. Não há nada disso.
O que eu tinha dito antes é que o Brasil fala, dialoga e se dá com todos os países e conversa com todos. Recebe, visita e mantém canais de diálogo com todos os países, com todos os Governos, sobretudo, na nossa vizinhança, o que é fundamental para se manter a paz, a segurança, a estabilidade nas nossas fronteiras.
Tem uma interlocução constante com todos os Chefes de Estado, independentemente da orientação política que tiveram no passado. E eram diferentes as orientações políticas nos dois primeiros mandatos do Presidente Lula. E, agora, houve uma mudança de composição.
Eu acho que não há nenhuma questão que impeça esses contatos. Quer dizer, não há nada que seja feito por parte do Governo que prejudique encontros com líderes de um lado ou de outro, muito pelo contrário.
Eu diria também que, com relação à visita do Ministro Kuleba, a que o senhor se referiu, o Presidente recebeu, em Nova York, o Presidente da Ucrânia. Foram duas vezes em que eles estiveram juntos em mesmas reuniões. A primeira vez foi no ano passado ainda, na Cúpula do G-20, no Japão.
Foram acertados, foram oferecidos três momentos diferentes para o Presidente Zelensky estar com o Presidente Lula, e não foi possível. A agenda do Presidente Zelensky não permitiu.
E o Presidente tinha um período reduzido. Ele ficou um dia a mais só no Japão. No total, foi em 1,5 dia a sua participação. Não havia tempo disponível. Não havia compatibilidade de agendas.
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No entanto, eu já me encontrei com o Ministro Kuleba, várias vezes: nessa ocasião no Japão; na Alemanha, à margem da Conferência de Segurança de Munique; em Nova York... E falo constantemente com ele. E eu também já tinha respondido dizendo que os tempos diplomáticos são diferentes. Visitas de Chefes de Estado são feitas e negociadas. Não há nenhum impeditivo, não há nenhuma negativa de receber ou de conversar. Estamos sempre abertos e prontos para conversar com todos os Chefes de Estado.
Queria, ainda, respondendo ao Senador Wellington Fagundes, dizer que o Itamaraty tem todo um setor de promoção comercial, que é muito importante e antigo, vem de muitos anos. Isso data, se não me engano, dos anos 60, e é um instrumento importantíssimo para a inserção internacional do Brasil e o fortalecimento do comércio exterior.
Queria também cumprimentá-lo pela Presidência do Grupo Brasil-Arábia Saudita, que é uma função importantíssima, um país com o qual nós temos uma relação, do ponto de vista comercial, muito importante.
Queria inclusive anunciar ao senhor que eu estou indo, na próxima semana, à região. Eu farei uma visita. Irei à Arábia Saudita, à Jordânia e a Ramala, além de Beirute. Todos esses países com um importante... O Líbano, nem precisa dizer... um grande número de brasileiros vivendo lá, além do grande número de descendentes de libaneses no Brasil.
A Jordânia é um país importante, um grande ator na região, que muito colaborou com o Brasil na manobra de repatriar os brasileiros que estavam - sobretudo os nascidos na Jordânia e na faixa de Gaza... Foi importantíssima. E a relação nossa com a Arábia Saudita...
Então, a partir de domingo, eu farei essa viagem de quatro dias, um dia em cada país. Mas o que eu queria dizer é que o Brasil se coordena através... A plataforma exterior do Brasil é a secretaria que tem, a seu encargo, a promoção comercial, que é o segundo nível hierárquico dentro do Ministério. Foi uma criação do Governo do Presidente Lula, dando esse status para que se possa ter uma melhor interlocução, não só com outros atores importantes, os outros Ministérios, como o Mapa, o MDA e o Mdic, que são importantíssimos, e também usando os instrumentos da ApexBrasil e, sobretudo, a nossa rede de postos no exterior.
O Brasil tem cerca de cem postos no exterior, com setores de promoção comercial, que têm uma atividade muito importante de inteligência comercial, de recolhimento de propostas para o Brasil e de recepção de exportadores brasileiros.
Não é à toa que nós tivemos, no ano passado, um resultado recorde, fantástico, de comércio exterior. Foram 340 bilhões de exportações.
O esforço dos Ministérios, do Governo como um todo e dos postos do Itamaraty no exterior foram fundamentais, como eu disse, na prospecção de oportunidades, no contato entre empresários dos dois lados e na participação de visitas presidenciais, porque as visitas não são só políticas, há um grande componente empresarial, como na visita do Presidente à China, no ano passado, em abril, em que havia uma grande delegação empresarial; a Angola também da mesma forma, o nosso principal parceiro na África, e ao Catar, mais recentemente.
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Nós fizemos uma quantidade enorme de ações e de missões muito setoriais a Bangladesh. É importante dizer - eu tinha mencionado na minha apresentação inicial - a importância dos países da Asean, do sudeste asiático, para o nosso comércio exterior. É um crescimento exponencial, surpreendendo e ultrapassando parceiros tradicionais do Brasil. Isso nos levou também a propor ao Presidente da República criar uma função, um posto de representante especial junto aos países da Asean, cuja sede fica em Jacarta.
Portanto, a questão da promoção comercial o Brasil tradicionalmente vem desempenhando e com muito sucesso, sempre em coordenação com os órgãos internos e com todos os instrumentos, inclusive do setor privado, como Sebrae, Senai, Senac, todos convergindo as sinergias e também as disponibilidades de cada órgão.
Eu também farei uma visita, no mês de abril, à Ásia. Eu vou às Filipinas e vou a Bangladesh, justamente porque nunca houve visita de autoridade brasileira de nível ministerial. E são dois importantíssimos países para o Brasil do ponto de vista de comércio exterior. Então não deixarei de fazer isso também.
E o senhor também me perguntou sobre a questão climática. Eu queria só comentar, como disse também o Senador Randolfe, que o Brasil perdeu a grande oportunidade de ser sede da COP em 2019. Eu pessoalmente atuei - eu era embaixador na ONU - para que o Brasil tivesse aprovada a sua candidatura.
E assim foi feito. A candidatura tem que ser aprovada no grupo regional de cada país. Então no nosso grupo latino-americano foi um exercício diplomático intenso e longo para conseguir o consenso de todos os países para que o Brasil pudesse sediar todos, e finalmente nos apoiaram unanimemente, inclusive a Venezuela e tantos outros. Infelizmente depois desistimos, abrimos mão e deixamos de ter no Brasil a presença de toda a comunidade preocupada com a mudança climática e tomando posições importantes.
Mas creio que nessa ocasião agora, no ano que vem, quando a COP se realizar no Brasil, nós vamos ter ocasião de dar uma grande contribuição para todas as questões de mudança climática e respeito ao Acordo de Paris, à Convenção das Nações Unidas sobre mudança climática e sobretudo também ao princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas, e a participação dos grandes países desenvolvidos, que já poluíram bastante e que precisam agora cumprir com o compromisso desses diplomas internacionais, com a contribuição para o financiamento da mitigação.
Então eram esses os comentários que eu queria fazer e agradeço ao senhor e aos Senadores as perguntas.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Parlamentar Democracia/MDB - AL) - Agradeço-lhe mais uma vez, Embaixador Mauro Vieira, a presença de V. Exa. em nossa audiência pública interativa de hoje. Agradeço também a presença dos Senadores e das Senadoras, membros desta Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional.
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Agradeço especialmente a participação de cidadãos pelo e-Cidadania; do Ademir, do Mato Grosso do Sul; da Sara, de São Paulo; da Cássia, do Piauí; do Marcondes, do Acre; do Vítor, da Bahia; e do Márcio, do Rio de Janeiro, que fizeram perguntas e interpelações que de alguma forma foram respondidas pelo chanceler durante a exposição e até mesmo em resposta às perguntas que foram feitas pelos Senadores.
Muito obrigado a todos.
Muito obrigado, Embaixador, é uma honra muito grande.
(Iniciada às 10 horas e 03 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 29 minutos.)