26/03/2024 - 12ª - Comissão de Educação e Cultura

Horário

Texto com revisão

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A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Fala da Presidência. Por videoconferência.) - Agradeço, inicialmente, a todas e todos a presença.
Esta audiência cumpre uma solicitação da ANPG (Associação Nacional de Pós-Graduandos).
Nós temos disponível o tempo de duas horas, porque, às 16h, nós daremos início ao Plenário deliberativo e não é comum haver reunião de Comissão quando o Plenário se instala. Ele é muito pontual, mas acho que a gente vai poder, sim, vencer todo esse tempo.
A proposta é que nós tenhamos um tempo de dez minutos para a exposição inicial. Depois, a gente vai ler os questionamentos ou as sugestões encaminhadas pelo eCidadania, porque se trata de uma reunião interativa. Ouviremos algum Senador ou Senadora que queira se pronunciar, e, havendo necessidade, faremos a devolutiva para nossos queridos e ilustres convidados.
Combinado, então?
Quem tem premência de horário é Charles.
Nós temos uma mesa já formada. Vou relatar para os nossos internautas terem uma visão geral da mesa.
Temos a presença do Sr. Olival Freire Junior, Presidente Substituto do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); do Sr. Vinicius Soares, Presidente da Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG); da Sra. Denise Pires de Carvalho, Presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes); da Sra. Helena Bonciani Nader, Presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC); do Sr. Charles Morphy D. Santos, Presidente do Fórum de Pró-Reitores de Pesquisa e Pós-Graduação (Foprop); e da Sra. Lucia Carvalho Pinto de Melo, Conselheira da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
Vou passar, de imediato, a palavra ao Prof. Charles, Presidente do Fórum de Pró-Reitores.
Muito bem-vindo e muito obrigada.
O SR. CHARLES MORPHY D. SANTOS (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado, Senadora. É um prazer estar aqui, dividindo a mesa com colegas tão diletos, com quem a gente vem falando já há muito tempo.
Como a senhora colocou, sou o atual Presidente do Fórum Nacional de Pró-Reitores de Pesquisa e Pós-Graduação das Instituições de Ensino Superior. Nós representamos 273 instituições de todos os segmentos, federais, estaduais, particulares e universidades privadas, comunitárias, de todas as regiões do país.
Eu fiz uma apresentação breve que eu acho que vai dialogar bastante, inclusive, com a apresentação da Profa. Denise, Presidente da Capes, porque vou apresentar também algumas informações que vêm diretamente da Capes.
Coloquei a minha tela aqui. Vocês estão vendo? O que nós vamos falar aqui é um pouquinho sobre avanços e desafios da pós-graduação no Brasil. É um tema fundamental e é um tema que é difícil de se discutir, porque ele tem muitas complexidades, muitas frentes. E vamos falar um pouquinho, em especial aqui, em que posição nós estamos na pós-graduação, no que a gente precisa ainda avançar um tanto.
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Esses são dados - e a Profa. Denise, como Presidente da Capes, conhece na ponta da língua - da nossa última avaliação quadrienal dos programas de pós-graduação. Qual é o tamanho da nossa pós-graduação no Brasil hoje? Nós temos quase 5 mil programas. Isso foi a última avaliação, de 2017 até 2020, com 4.512 programas. Outros programas foram aprovados no último ano. Portanto, a gente tem hoje um universo bem grande de programas de pós-graduação. Talvez seja o sistema de pós-graduação mais organizado e mais robusto do mundo. Esse sistema percola todas as regiões do país, com uma certa predominância nas regiões que tiveram a criação de programas de pós-graduação antes, com mais tempo, mais história na pós-graduação - a interiorização da pós-graduação é relativamente recente -, e a gente tem uma distribuição dos programas segundo os conceitos da Capes, que é praticamente uma curva normal, como a gente consegue ver aqui nesse eslaide.
Isso significa que nós temos boa parte dos nossos programas com condições de oferecerem tanto cursos de mestrado quanto doutorado. Aqui nós estamos falando especificamente da pós-graduação stricto sensu e não dos cursos de especialização que são considerados pós-graduação ou lato sensu.
Uma questão fundamental que chacoalhou, de certa maneira, o nosso sistema nacional de pós-graduação de uma forma positiva, foi o investimento adicional que tivemos o ano passado, em 2023, para o reajuste das bolsas de mestrado e doutorado, e também de pós-doutorado. Elas estavam sem alteração nos seus valores desde 2013. Isso significa que hoje nós temos bolsas, que são bolsas para pesquisadores - a gente não deve entender isso como uma bolsa assistencial, mas sim a bolsa para os pesquisadores, que trabalham efetivamente como pesquisadores, os mestrandos e doutorandos -, que é mais atrativa do que nós tínhamos há pouco tempo, no início do ano passado, final de 2022. Hoje nós temos uma bolsa de pesquisa para mestrandos e doutorandos, e também para pós-doutorandos, que é mais atrativa, o que, de certa maneira, também é uma forma de a gente trazer os nossos alunos e alunas da graduação para dentro da pós-graduação.
Ainda assim, nós entendemos que o orçamento para 2024 está abaixo do que seria o adequado. Estou falando isso para a gente ter uma noção de onde estamos na pós-graduação. Isso aqui vem do site da Capes. Aqui nós temos a dotação e a execução de 2023. Se a gente olhar a dotação para 2024, é perceptível aqui que há uma redução do orçamento previsto, o que, de certa maneira, vai impactar algumas ações, tanto da Capes quanto ações ligadas à pós-graduação, de uma forma geral. Esses números são importantes para a gente ter uma dimensão, uma real dimensão do que nós estamos falando, em termos orçamentários, diretamente para a pós-graduação no país, via Capes. Mas é óbvio que o cenário que nós temos hoje é um cenário muito mais interessante do que tínhamos há pouco tempo.
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O que nós temos hoje é um cenário muito mais interessante do que tínhamos há pouco tempo.
Aqui, é a avaliação dos recursos do Ministério da Ciência e Tecnologia. Não são exatamente os recursos da Capes, mas os recursos da Capes também tiveram essa curva descendente, em especial de 2016 para frente, com uma retomada a partir do ano passado, 2023.
Para que a gente tenha uma noção do que nós estamos falando quando falamos da pós-graduação, nós estamos falando de um universo que é maior do que este, pois são dados de 2017. São quase 400 mil estudantes mestrandos e doutorandos que estão concentrados nos programas de pós-graduação em especial das universidades públicas do Brasil, as federais e as universidades estaduais, com um percentual bem menor nas instituições privadas e também nas instituições comunitárias.
Portanto, o que nós estamos falando, quando falamos de pós-graduação strictu sensu, é que mais de 80% dos estudantes e das estudantes estão nas universidades públicas. Nas privadas, há um número bem menor em pós strictu sensu.
Ainda assim, é importante que a gente entenda de que universo de estudantes nós estamos falando. A pós-graduação no Brasil ainda não reflete a estrutura étnico-racial do país. Nós temos uma concentração grande - isto são dados de um trabalho do Prof. Luiz Mello, da Federal de Goiás, mostrando a distribuição por raça ou cor de estudantes de pós-graduação no Brasil -, a gente percebe que há uma predominância dos autodeclarados brancos quando comparados com autodeclarados pretos e pardos. Portanto, a pós-graduação no Brasil ainda não reflete a nossa sociedade. A sociedade fora dos muros das universidades, dos institutos de pesquisa é diferente da sociedade que temos aqui dentro.
Um dado importante também tem a ver com a faixa etária dos pós-graduandos e de quem termina a pós-graduação no Brasil.
Os doutorandos no Brasil, em geral, finalizam seus projetos de doutorado e obtêm o título de doutorado em uma idade um pouco acima do que acontece, por exemplo, nos Estados Unidos e em países da Europa. Vocês estão vendo aqui que cerca de 10% dos títulos de doutor no Brasil são dados para discentes de até 30 anos. Quando a gente sobe um pouquinho a faixa etária, também sobe a formação mais tardia, que é refletida aqui neste gráfico para essa faixa etária, que a gente consegue ver.
O centro, mais de 50% dos nossos doutores são formados entre 30 e 40 anos. Isso é algo que, por exemplo, na minha universidade, a Universidade Federal do ABC, é muito claro. A gente percebe, de maneira muito clara, que os nossos estudantes de pós-graduação são mais velhos no sentido de terem idade um pouco acima da que terminam a graduação.
Uma coisa importante. Quando eu fiz pós-graduação, não faz muito tempo, mas já faz algum tempo, o caminho normal pensado era o caminho da docência. Era o caminho da docência no ensino superior, era entrar em alguma instituição de ensino superior para tentar pesquisar e para ensinar também para graduando e para pós Mas isso eu falo do meu lugar de fala como homem. Quando a gente olha a distribuição de docentes mulheres no Brasil, no ensino superior, de 2010 para 2022 tivemos uma alteração, mas ainda existe uma predominância de homens como docentes no ensino superior. Por que isso é um dado importante? Porque estamos falando de uma sequência de poucas pessoas entrando na pós-graduação, um universo limitado, étnico-racial, entrando na pós-graduação, e, quando a gente passa da pós-graduação para a docência efetiva no ensino superior, a gente tem muito mais homens do que mulheres, ainda que isso esteja mudando. Com o passar do tempo, nos últimos 10, 12 anos, houve uma alteração, mas a predominância ainda é muito clara.
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Finalizando aqui, eu tenho mais 15 segundos, só para a gente ter uma noção do que nós precisamos quando estamos falando do mercado de trabalho.
Isso aqui é um gráfico que aponta que hoje nós temos muito mais alunos da graduação na área de ciência da computação e de tecnologia de informação e comunicação. E o desafio que a inteligência artificial nos coloca é fundamental para a gente pensar em estratégias de absorção de estudantes, de mestres e doutores no ensino superior, e também de absorção fora do ensino superior, fora da academia, para além da academia, participando da confecção de políticas públicas, de eventos de popularização da ciência, trabalhando em empresas, criando startups, sendo empreendedores, indo para o ecossistema de inovação. Tudo isso são desafios que a gente precisa levar em conta quando nós falamos da pós-graduação e do mercado de trabalho no século XXI.
Algumas dessas frentes são muito novas, muito recentes, quando a gente fala, por exemplo, da inteligência artificial, não são tão apocalípticas, pelo menos na minha percepção ou quanto alguns pensam, mas a gente tem que abraçar isso para tentar discutir não só o futuro, mas o presente à luz do que vem na próxima semana, no próximo mês, no próximo ano.
Portanto, para finalizar aqui, eu extrapolei os meus 15 segundos, eu entendo que a pós-graduação precisa descer da torre, ou seja, olhar também para fora dos muros em que o conhecimento é construído no país em nossos cursos de mestrado e cursos de doutorado.
Desculpem-me se extrapolei o tempo, obrigado pela oportunidade, fico à disposição de vocês.
Obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Professor, nós é que agradecemos.
Desculpe-me por essa insistência do tempo tão repentina, mas é automático, não se preocupe também.
O SR. CHARLES MORPHY D. SANTOS (Por videoconferência.) - Mas a gente perde um pouco o rebolado nesses 15 segundos que eles falam.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Vamos ver se a gente coloca só a sinalização.
Sempre a gente se depara com isso nas audiências, mas vamos ver como é que a gente contorna, já pedindo desculpas ao senhor e dizendo que pode ampliar um tiquinho, caso seja necessário.
Quero pedir licença a vocês para dar boas-vindas à Profa. Lucia Melo, minha conterrânea e contemporânea aqui no Conselho Estadual de Educação. Seja bem-vinda, Lucia.
Parabéns pelos dados, professor. Realmente o desafio é grande e os dados são bem ilustradores do tamanho desse desafio.
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Dando continuidade, vou passar a palavra, voltando à ordem, ao Sr. Olival Freire Junior, Presidente Substituto do CNPq, por dez minutos.
Pelo menos vamos baixar o som desse aviso. Veja aí com a técnica se é possível.
O SR. OLIVAL FREIRE JUNIOR (Para expor. Por videoconferência.) - Boa tarde, Senadora. Parabéns pela iniciativa da audiência.
Quero falar do meu contentamento também de estar nesta audiência pública com a presença do Charles, da Helena, da Denise, do Vinicius.
A minha ponderação é uma ponderação menos calcada em números e mais genérica.
Então, a primeira ponderação que eu queria fazer é que, quando a gente fala do estado atual e do futuro da pós-graduação no Brasil e no mundo, do que nós estamos falando? Nós estamos falando do modo de produção da ciência nas sociedades contemporâneas.
A ciência é uma atividade quase tão antiga quanto a história das civilizações, mas a gente pode dizer que a própria palavra cientista é uma palavra criada no século XIX, na Inglaterra, no momento em que a atividade científica se profissionaliza. Em uma fase anterior, havia certamente atividade científica, mas essa atividade científica não era profissionalizada. E, ao longo do século XX, com a onipresença da ciência, tanto no desenvolvimento do bem-estar, no desenvolvimento da saúde quanto na realização das guerras, a ciência adquiriu uma enorme pujança e uma enorme presença em praticamente todas as sociedades.
É nesse contexto que a gente tem que entender a seguinte questão: o que é a pós-graduação para a produção da ciência? E a resposta eu diria que é muito simples. A pós-graduação é a mão de obra da produção da ciência nas sociedades contemporâneas. Se você corta a juventude de se dirigir para realizar a pós-graduação e cursos de pós-doutorado, é algo equivalente a você querer produzir carros tirando os operários, tirando os trabalhadores. Ou seja, sem essa força de trabalho da ciência que é a pós-graduação, nós não temos condição de continuar a produção da ciência.
E no Brasil não é diferente. Por essa razão que o Brasil criou, no final da década de 1960, o Parecer Sucupira. Peço desculpas à Profa. Denise talvez por estar avançando num terreno que ela mesma vai enfatizar. O parecer do Conselheiro Newton Sucupira deu uma institucionalidade à pós-graduação e, em seguida, os financiamentos da ciência e tecnologia, a partir de 1968, 1969 e 1970, principalmente, levaram a que a pós-graduação se expandisse rapidamente no Brasil.
Nós temos também um sistema robusto como política pública no âmbito da pós-graduação, porque é um sistema que permite o financiamento daquilo que é benfeito. Então, a gente avalia e financia. Isso é feito basicamente pela Capes. Em segundo plano, é feito pelo CNPq. O CNPq mais com foco na pesquisa, e a Capes mais com foco na formação dos pós-graduados. Mas é evidente que há uma forte interação entre as duas agências, porque esses pós-graduandos ou pós-graduados vão trabalhar exatamente na produção de conhecimento novo. A boa tese de doutorado é aquela que gera um produto novo, algo que não se sabia ainda.
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Bom, mas, nas últimas décadas, mais do que a tradicional boa política pública de pós-graduação, o Brasil meteu o pé no acelerador para acelerar a formação de pós-graduados. Embora não eu tenha gráficos, não tenha eslaides, tenho um número que todos nós conhecemos aqui: o último Plano Nacional de Pós-Graduação previa chegarmos a 24 ou 25 mil doutores por ano; chegamos a ter 22 mil doutores por ano. Tem aí um efeito da pandemia, mas é um grande êxito para a sociedade brasileira. Isso ocorreu em paralelo a uma expansão do sistema público das universidades federais, é o sistema Reuni dos institutos federais, das universidades estaduais. Então, tudo isso configura o cenário que nós temos no Brasil hoje.
Nesse cenário, nós temos sinais de crise e, se nós não tivermos capacidade como nação brasileira, como Estado brasileiro, de fazermos o diagnóstico correto, nós teremos enormes prejuízos no futuro imediato da nação brasileira. Não estou mais falando da ciência; certamente a ciência será prejudicada, mas a ciência, como parte essencial do projeto de desenvolvimento da nação, será prejudicada.
Quais são os sinais que estão presentes? Certamente o Vinicius vai acentuar isso. O mais importante é uma sensação de insegurança que toma conta dos nossos pós-graduandos e dos nossos pós-graduados, os pós-doutores. É uma sensação de insegurança, certamente mitigada, como o Charles chamou a atenção, pelos reajustes recentes, mas apenas mitigada, porque persiste dúvida sobre a empregabilidade dos nossos pós-graduados e persiste um cenário de insegurança na coisa mais elementar, que é a estabilidade e, particularmente, o vínculo com a previdência social, enquanto uma pessoa com 23, 24, 25 anos e com o perfil que o Charles chamou a atenção, pessoas na faixa dos 30, 40 anos de idade, pessoas para as quais, portanto, a perspectiva da estabilidade previdenciária é algo essencial. Então, eu acho que nós temos aí o diagnóstico que a gente precisa fechar.
Tem uma ponta que eu não enfatizei aqui desse diagnóstico: o problema da empregabilidade dos nossos pós-graduandos e pós-graduados não se resolve só com mais vagas no ensino superior ou nos institutos superiores, nos institutos federais e universidades estaduais. Nós precisamos equacionar uma maior base de empregabilidade dos nossos doutores na sociedade brasileira em geral, em órgãos públicos, empresas, estados, municípios. Então, eu acho que esse é o cenário sobre o qual a gente deve se debruçar.
Certamente, o problema da previdência é absolutamente crucial. Eu sei que o meu horário já está se aproximando praticamente do final, mas eu diria que mesmo esse problema da previdência é um problema que envolve várias pontas, mas nesse problema, certamente, os legisladores do Congresso Nacional, Senadora Teresa, têm um enorme papel.
Qual é a dificuldade? Na primeira dificuldade - eu lhe digo da minha experiência aqui -, em um ano e pouco, como Diretor Científico do CNPq, assim que nós chegamos, buscamos assessoria jurídica. Nós tínhamos uma faceta disso que estávamos enfrentando, que é atrair de volta, repatriar cérebros brasileiros que estão no exterior, e nós queríamos oferecer-lhes um contrato.
Depois de várias consultas, a conclusão é: não tem segurança jurídica para oferecer contrato para os nossos doutorandos ou os nossos pós-doutorados, deferentemente de vários países na Europa e nos Estados Unidos, onde o pós-doutorado - eu me restrinjo ao pós-doutorado - é uma forma de contrato. Então, não tem essa segurança. É a conclusão depois de várias rodadas de discussão com a nossa Procuradoria Federal, do CNPq, do Ministério da Ciência e Tecnologia.
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A saída que existe - essa é a resposta que nos foi dada pelo Procurador da MCTI - é a seguinte: os legisladores brasileiros precisam criar um quadro legal que permita a contratação por x anos de um pós-doutorado.
O Procurador, o Dr. Leopoldo, chegou a fazer uma brincadeira. Ele disse: "Nós precisamos de um Mais Médicos para a ciência". O que ele queria dizer com Mais Médicos? Teve um momento em que ele também brincou: "Nós precisamos de uma geringonça. Pode ser uma geringonça jurídica, mas, se o Parlamento a aprova, a geringonça dá estabilidade jurídica".
Então, esse é o primeiro problema, a estabilidade jurídica para nós termos contratos.
Tem o problema financeiro, de que, ao irmos para contratos, o custo de um pós-doutorado cresce bastante, e a gente vive o dilema entre reajustar o valor das bolsas ou aumentar o número de bolsas. Existe uma solução intermediária, mas esta solução intermediária também depende de uma solução jurídica, que é essa sobre que o Vinicius certamente vai falar mais; ele fez referência já aí, antes de nós começarmos a sessão. Nós precisamos criar um mecanismo que permita ao nosso pós-graduando e ao nosso pós-graduado bolsista ter um vínculo com a previdência, e isso demanda uma solução jurídica. Certamente, ele pagará alguma coisa, mas não vão ser aqueles 80% ou o que você precisa colocar do valor da bolsa para ter um contrato. Mas, pelo menos, a gente conseguiria ter uma estabilidade no que diz respeito à previdência. Então, esse é um ponto que eu digo, assim, que está ao nosso alcance.
E, por fim, algo para o que também nós dependemos do Parlamento e dependemos do Executivo. Para nós avançarmos no rumo certo de equacionarmos a pós-graduação com o desenvolvimento da sociedade brasileira, precisamos de maiores orçamentos para a ciência e para a pós-graduação no Brasil.
Vou finalizar com um exemplo, Senadora. Na última reunião do Conselho Deliberativo do CNPq, nós tivemos uma discussão muito viva, com a participação muito ativa da Profa. Helena e do Prof. Odi, todos enfatizando o problema da empregabilidade dos doutores que nós estamos formando. Nós saímos daquela reunião, Helena, me permita chamá-la assim, pensando: uma das ideias que está na nossa cabeça, é claro, é a nossa chamada de pós-doutor, uma chamada que está em andamento, uma chamada tradicional do CNPq, o chamado Pós-Doutorado Júnior. Para nós aumentarmos isso, dependemos de orçamento.
Outra alternativa que nós estamos examinando, Helena, é relançarmos alguma coisa no estilo do Rhae, que é um sistema pelo qual a gente paga a bolsa, mas quem se candidata é a empresa, especialmente a pequena e média, que queira absorver doutores na sua equipe. Mas, de novo, nós estamos ainda tendo ou o FNDCT - e nós vamos levar essa luta para lá e eu sei que, certamente, a Helena vai nos apoiar - ou mais orçamento. E, certamente, a Profa. Denise, ao falar dessa dimensão, também vai falar nisso, de que, quando a gente vai para o orçamento de pós-doutorado, de bolsa de pós-doutorado, mesmo o orçamento da Capes não é suficiente para acomodar a atual disponibilidade de doutores que nós temos no Brasil que não estão empregados.
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Então, eu resumo com esta mensagem: nós estamos vivendo um momento crítico, eu diria que é mesmo uma crise, mas uma crise que derivou de opções acertadas do Estado brasileiro. Outros Estados da América Latina não fizeram essa opção: ou se atrasaram mais na formação de cursos de pós-graduação, ou os cursos de pós-graduação são pagos. O Brasil fez essa opção que se desenhou ali, desde o Parecer Sucupira, e se configurou nos últimos 55 anos do nosso sistema de pós-graduação.
Mas o sucesso desse sistema criou esses problemas. E eu finalizo dizendo: é essa insegurança que a gente não pode permitir que se consolide na mentalidade dos nossos jovens, porque os jovens são movidos por sonhos - talvez todos nós sejamos movidos por sonhos.
Se me permite, eu posso contar uma história absolutamente pessoal, que mostra que os sonhos são dos jovens e dos mais idosos. Eu entrei no curso de Engenharia Elétrica e, com dois anos, apaixonado pela Física, eu larguei a Engenharia Elétrica para a Física. Foi um problema. Primeiro que, na minha cabeça, eu não pensava em como seria a minha vida profissional; eu estava movido pela paixão de fazer uma coisa que era mais científica do que a engenharia. E fui fazer o curso de Física. Eu lembro muito que minha mãe foi muito contra, mas meu pai, lá no interior da Bahia, dizia assim: "Mas meu filho vai ser físico nuclear". A palavra "nuclear" ele enchia a boca para dizer. Ele era uma pessoa já idosa, mas tinha essa expectativa de que ciência era uma coisa importante para o futuro do Brasil. Era um momento, particularmente, em que o Brasil estava equacionando o problema do desafio da disponibilidade de energia com as grandes hidrelétricas, com as usinas nucleares...
Nós precisamos, portanto, reencantar a sociedade brasileira e os nossos jovens com a perspectiva de profissões científicas e tecnológicas, porque elas são essenciais para o futuro do país.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Nós é que agradecemos.
Vou passar a palavra agora para o Presidente da Associação Nacional dos Pós-Graduandos, Vinicius Soares, o que faço muita satisfação, porque acho que a coisa está sendo pensada, há experiências sendo refletidas, e está na pauta. Acho que foi muito importante essa afirmação do CNPq.
Passo para você agora, Vinicius, para os seus dez minutos. (Pausa.)
Está sem som. Bote o som.
O SR. VINICIUS SOARES (Por videoconferência.) - Vocês conseguem me escutar aí agora?
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Podemos.
O SR. VINICIUS SOARES (Para expor. Por videoconferência.) - Primeiramente, quero agradecer à Senadora por abrir este espaço dentro da Comissão para que a gente possa discutir esta que é uma importante pauta. A gente até coloca que não é uma pauta corporativista da ANPG, mas uma pauta de interesse nacional, que tem a ver com o desenvolvimento do nosso país.
Apresentando-me, eu sou Vinicius Soares, presido a Associação Nacional de Pós-Graduandos e sou doutorando da Universidade Federal do Rio de Janeiro em Saúde Coletiva, apesar de ser pernambucano - e aqui a gente está numa mesa com alguns pernambucanos; inclusive, quero saudar toda a mesa -, questão importante para todos os políticos da nossa cena da ciência e da tecnologia no país, que podem nos ajudar a acumular força sobre esse debate.
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Quando a gente fala sobre a situação do pós-graduando, da pós-graduação no Brasil, a gente precisa, inclusive, contextualizar que, nos primeiros 15 anos deste século, o Brasil avançou muito. A gente conseguiu expandir o nosso parque nacional universitário; conseguimos expandir especialmente o nosso parque nacional de pós-graduação e de ciência e tecnologia, especialmente com a expansão das universidades.
Então, o Brasil titulava, no início dos anos 2000, cerca de 5 mil doutores por ano; em 2010, a gente colocou como meta do Plano Nacional de Educação o Brasil titular cerca de 25 mil doutores por ano - algo que está muito aquém dos nossos desafios nacionais, mas que, para aquele momento histórico do país, já foi uma revolução muito grande.
Mas hoje o que a gente vem enfrentando, inclusive - é uma perspectiva que nós da ANPG vimos apontando para a sociedade em geral -, é que a gente pode ter uma crise grande de formação de quadros técnicos no país. Por quê? Porque existe uma tempestade perfeita, especialmente como consequência dos últimos anos de negacionismo científico no país, com o processo social acelerado, a partir da pandemia, de uma questão, que a gente vem abordando, que é a falta de perspectiva para quem faz hoje pós-graduação ou para quem quer entrar hoje na pós-graduação.
E isso é algo que, inclusive... Alguns dos elementos dessa crise não são conjunturais; são alguns elementos são sistêmicos, e a gente precisa, de fato, incidir nessa causa para que a gente possa mitigar todas as consequências. E, só para se ter uma noção do que seria essa crise de formação de quadros técnicos, de 2019 a 2022, a partir do nosso entendimento, o Brasil deixou de titular cerca de 9 mil doutores no país, tendo vaga no sistema. Por quê? A gente, em 2018 e 2019, conseguiu atingir o patamar de 25 mil doutores titulados no país, mas, a partir de todo o processo negacionista, como eu já coloquei, e do processo também da pandemia, a gente vê uma decrescente do número de titulados de doutores. Então, a gente tem um contingente muito grande de mestrandos e doutorandos que estão contingenciados hoje nos sistemas, que ainda não conseguiram sair da pós-graduação.
A isso associa-se o fato de que hoje a pós-graduação no Brasil não está sendo mais atrativa para quem sai da graduação. Porque, veja, hoje, um recém-graduado, por exemplo, em engenharia vai precisar optar: ou ele entra numa pós-graduação, normalmente para receber uma bolsa de mestrado que custa R$2,1 mil, ou ele vai entrar no mercado de trabalho, muitas vezes, conseguindo um salário inicial de R$3 mil, R$3,5 mil. E, na conjuntura da crise econômica e social que a gente ainda vive no país, essas pessoas acabam optando por entrar no mercado de trabalho, especialmente porque o mercado de trabalho consegue garantir uma espécie de seguridade social para essas pessoas.
É isso que a gente quer trazer aqui como foco da nossa discussão, porque hoje o estudante de pós-graduação, na prática, acaba tendo uma ausência de direitos sociais. A gente até fala que existe um eclipse de direitos sociais para quem faz pós-graduação no Brasil, porque, por exemplo, quando a gente está na graduação, a gente tem acesso ao Plano Nacional de Assistência Estudantil, especialmente nas universidades federais; mas, quando a gente vira estudante de pós-graduação, esse acesso é vetado, especialmente porque o decreto veta os estudantes de pós-graduação.
Um outro exemplo que fica muito claro é que, por exemplo, a licença maternidade para as trabalhadoras no Brasil foi aprovada em lei ali na década de 1940. E, para as pós-graduandas bolsistas, ela só foi aprovada agora em 2017. E isso só conseguimos aprovar para as bolsistas. As não bolsistas ainda ficam aí à mercê do entendimento dos coordenadores, dos orientadores das dissertações e das teses.
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Então, existe esse eclipse de direitos e que traz justamente essa falta de perspectiva de valorização dos jovens pesquisadores. E, assim, muitas vezes quem está já na pós-graduação acaba pensando duas vezes se continua nos seus projetos ou se sai; e quem está querendo entrar também pensa duas vezes se vai entrar ou não por causa dessa perspectiva.
E aí, essa crise sistêmica de formação de quadros técnicos, inclusive, é agravada por quê? Já existe um fenômeno social hoje na graduação, porque, segundo o Inep, a evasão na graduação já atinge cerca de 60% dos estudantes - isso envolvendo universidades públicas e privadas -, ou seja, a gente tem aí teoricamente 60% de candidatos a menos para entrar em um programa de pós-graduação. Então, a associação de todos esses fatores pode gestar justamente essa crise que a gente vem apontando.
E todos esses desafios nacionais que nós temos hoje no século XXI, em 2024, no Brasil, como, por exemplo, o próprio processo de neoindustrialização, o plano de combate à fome, a questão da transição energética, isso tudo vai requerer que a gente tenha uma formação de recursos humanos; uma formação de alto nível, mas também a absorção desses recursos humanos.
E, por outro lado, a gente tem justamente aí na ponta uma falta de perspectiva para quem hoje está fazendo mestrado e doutorado. A gente, enquanto estudante de pós-graduação stricto senso, pensa muito: o que eu vou fazer quando terminar o meu mestrado, quando terminar o meu doutorado? Porque a gente tem de fato uma lacuna sistêmica em nosso país já que a gente não tem um plano de absorção desses mestres e doutores.
Veja, a gente colocou, e de forma muito acertada, a titulação de 25 mil doutores no país por ano, mas a universidade brasileira não abre 25 mil vagas por ano, então essa conta na prática não fecha. Portanto, vai precisar existir uma indução especialmente do Estado para que o setor produtivo econômico comece a absorver esses doutores. São mais de 150 mil doutores que nós formamos aí, pelo menos, nos últimos dez anos, e o Brasil agora precisa se debruçar para saber como é que a gente vai fazer para que essa mão de obra, que é muito qualificada, seja absorvida.
E nós da ANPG temos uma opinião. Nós precisamos agora, nesse próximo período, trabalhar em duas perspectivas. A primeira é aprovar uma cesta de direitos básicos para os pós-graduandos no sentido de que nós estamos uma condição híbrida: nós estamos entre ser estudantes e trabalhadores ao mesmo tempo. E a própria Constituição brasileira coloca ali, no capítulo da ciência e tecnologia, no art. 218, §3º, que o Estado brasileiro precisa prover condições especiais de trabalho para aqueles que se dedicam à produção científica. E é nada mais, nada menos do que isso que a ANPG vem pautando: uma cesta de direitos básicos que possa incluir direitos estudantis, como o acesso ao Plano Nacional de Assistência Estudantil; direitos trabalhistas, como, por exemplo, o acesso ao adicional de insalubridade, entre outras coisas; e em especial também os direitos previdenciários, para que esse tempo que a gente passa no mestrado e doutorado, de quase seis anos, possa ser contabilizado para o nosso tempo de aposentadoria.
Inclusive, depois da reforma previdenciária que o Brasil aprovou nos últimos anos, a gente hoje não tem perspectiva de se aposentar enquanto pós-graduando, porque atrasamos em seis anos a nossa entrada no mercado formal de trabalho. Então, a gente precisa aprovar esses instrumentos para dar uma seguridade social para os pós-graduandos, inclusive numa perspectiva de valorização de quem já está na pós-graduação, mas também instrumentos para atrair novos talentos para a pós-graduação, para que mais pessoas possam entrar no nosso sistema de pós-graduação. E, dentro dessa cesta de direitos básicos, nós temos pautado muito uma perspectiva do próprio reajuste de bolsas, o que a gente conseguiu fazer no início do ano passado, e agora a gente vem pautando que a gente possa aprovar um mecanismo anual de reajuste, para que, ano a ano, a gente não tenha que fazer uma mobilização política e, à mercê do perfil do Governo Federal, tenha ou não esse reajuste das bolsas. Então, a gente vem pautando um mecanismo anual de reajuste e com uma urgência para que a gente tenha um reajuste das bolsas de doutorado no exterior, porque ele ainda não foi aprovado e a gente sabe que muitos doutorandos que estão no exterior hoje representando o Brasil estão em caráter de vulnerabilidade social.
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Então, hoje a ANPG tem colocado muito esse tema como um debate de desenvolvimento nacional, para que o Brasil possa tomar uma decisão política, porque a pandemia mostrou aí o quanto a ciência define o destino das nações, e o Brasil não pode ficar atrás de nações como Estados Unidos, como China, as potências aí na ciência e tecnologia. Para que a gente possa de fato entrar no século 21, o Brasil precisa tomar essa decisão política de valorizar os seus jovens pesquisadores, de valorizar o seu corpo social de pesquisadores, porque nada é mais justo do que a gente lembrar que 90% da ciência nacional é produzida no âmbito da pós-graduação, ou seja, pelos nossos jovens pesquisadores.
E nós temos aí - já também finalizando a minha fala - ainda uma janela de oportunidade histórica no país, porque o Brasil ainda está fechando a sua janela demográfica, e todos os países que lograram algum nível de desenvolvimento aproveitaram esse momento histórico para investir justamente na juventude, investir em educação, investir em ciência, porque esses são os elementos que podem gerar oportunidades para a população. Então, a gente precisa ainda aproveitar que o maior segmento economicamente ativo do Brasil é a juventude e que a juventude está muito ávida em contribuir com o desenvolvimento nacional, porque nós temos potência, nós temos capacidade; o que falta de fato é a geração de oportunidade para que nossos meninos e meninas possam contribuir para o nosso desenvolvimento nacional.
E aí, já finalizando a minha fala, a ANPG acabou de protocolar na Câmara dos Deputados um projeto de lei para garantir os direitos previdenciários para os pós-graduandos. Então, a gente vai fazer aqui a luta, na Câmara dos Deputados, para que a gente possa aprovar o mais rápido possível, porque isso é uma luta de 40 anos, e em seguida a gente vai seguir no Senado, com certeza, com a ajuda da nossa Senadora Teresa Leitão, para aprovar também no Senado, para que o Brasil possa começar a pavimentar esse caminho de valorização dos pós-graduandos.
Esperamos contar com todo mundo nessa mobilização, para que a gente possa apontar um caminho de reconstrução nacional, valorizando os jovens pesquisadores e também a ciência nacional.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Muito obrigada, Vinicius. O projeto foi protocolado na Câmara; depois, você encaminha para a gente também já começar a dar uma lida, começar a fazer os diálogos necessário .Muito obrigada pela sua intervenção.
A próxima intervenção será da Profa. Denise Pires de Carvalho, Presidente da Capes, por dez minutos iniciais.
Denise, muito obrigada pela presença.
A SRA. DENISE PIRES DE CARVALHO (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigada, Senadora Teresa Leitão.
Todos me escutam bem?
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É um prazer enorme, uma honra, estar aqui com a senhora e com meus colegas: a Lucia Melo, pela SBPC; Helena Nader, pela ABC; Olival Freire, Diretor Científico do CNPq, como Presidente substituto; o Vinicius Soares, Presidente da ANPG; e o Charles, que é o Presidente do Foprop no momento.
Eu vou fazer uma pequena apresentação. (Pausa.)
Todos conseguem ver? (Pausa.) Sim?
A Capes foi criada pelo educador Anísio Teixeira no mesmo ano que o CNPq, em 1951. Eu chamo atenção para esse fato porque, na verdade, a Capes antecede, em mais de uma década, o movimento que levou à institucionalização da pós-graduação, mas já com a intenção de aperfeiçoamento de pessoal de nível superior. Nós sabemos que à época havia apenas a possibilidade de estudo pós-graduado, na maior parte das vezes, fora do país, e apenas a elite podia sair do país e podia prosseguir no mestrado, no doutorado. Muitos ainda faziam, inclusive, graduação fora. Em 1953, havia 79 bolsas; e, em 2023, a Capes distribuiu 104 mil bolsas no Brasil, especificamente mestrado e doutorado.
Eu vou falar um pouco disso e como isso aconteceu ao longo dos anos durante a minha apresentação. Mas eu chamo atenção para que a pós-graduação stricto sensu se institucionaliza, a partir da década de 1960, com o Parecer Sucupira. E, durante todos esses anos... Ressalto que ainda não completamos 60 anos do Parecer Sucupira, portanto o Sistema Nacional de Pós-Graduação, que se constituiu como tal durante esses quase 60 anos, é muito jovem. É jovem, mas já faz com que o Brasil desponte como um dos países que mais produz ciência no mundo. Estamos entre os 15 primeiros: chegamos a 13º, estamos em 14º e eu espero que consigamos avançar.
Então, aqui é um esquema sobre o que havia de programas de pós-graduação em 1970. Vejam a grande concentração na Região Sul e Sudeste; e aqui, o Distrito Federal; poucos cursos na Região Nordeste e um vazio completo na Região Norte, e muito também na Região Centro-Oeste. Havia 167 programas de pós-graduação, em 23 municípios apenas, assim que a pós-graduação é institucionalizada. E os senhores podem ver que, em 2022, havia 4.777 programas de pós-graduação, em 323 municípios. Não é uma coincidência que, durante esse tempo e com a expansão do sistema de pós-graduação em todo o território nacional, o país desponte como um dos países que mais produz ciência no mundo, porque é uma ligação direta entre a atividade de produção de conhecimento e a atividade de pós-graduação.
E aqui eu trago o número de pessoas tituladas ao longo dos anos, a partir de 2000. Na verdade, esse aumento progressivo acontece de maneira paralela com o aumento importante da Rede Federal de educação superior, que foi a rede que mais ampliou em termos de rede pública de educação superior, embora seja a rede pública responsável por cerca de apenas 22%, 23% das matrículas na educação superior. Embora tenha um quantitativo muito pequeno de matrículas na graduação, é essa, a Rede Federal e Estadual, a principal rede em que estão os programas de pós-graduação mais qualificados e que produzem mais mestres e doutores no país, como bem mostrou o Charles.
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Nós atingimos, em 2016, os 60 mil mestres previstos no PNE. Depois, houve uma queda devido à pandemia e também ao subfinanciamento que atacou a ciência brasileira entre 2016 e 2022. O número de mestres chegou a 60 mil, o número de doutores não chegou a 25 mil, o que também estava no Plano Nacional de Educação, mas o número de doutores chegou próximo a 25 mil.
E, vejam, não uma coincidência, mas o número de artigos publicados cresce junto com o número de mestres e doutores. Portanto, se o Brasil quer continuar como um dos países que mais produz ciência e fazer com que essa ciência atinja a sociedade, saia dos muros das nossas universidades, consiga ser transformada em emprego e renda para a nossa população, é um sistema que está absolutamente preparado, mas que precisa ser financiado.
Então, vejam, nos últimos anos, se nós olhamos 2013 a 2022, houve um crescimento do número de ingressos na pós-graduação de 91.853 para 100.908. Portanto, houve um crescimento no ingresso, nessa última década, que foi menor do que 10%. Nesse ritmo nós não vamos alcançar a média da OCDE em termos de percentual de doutores da nossa população.
E por que isso é importante? Porque são os doutores, os pesquisadores que geram conhecimento, que vão gerar cada vez mais conhecimento e, consequentemente, emprego e renda devido à saída do Brasil da economia, que é majoritariamente ainda extrativista, para uma base que seja de produção de alta tecnologia.
A alta tecnologia depende, não só a alta tecnologia, mas a produção de conhecimento que pode levar ao desenvolvimento social e econômico do Brasil, da presença de doutores. Não é coincidência que os países mais desenvolvidos do mundo tenham um percentual maior do que a média da OCDE em termos de doutores. Nós ainda temos cinco vezes menos do que a média da OCDE em número de doutores.
Portanto, precisamos, por um lado, dinamizar a formação de doutores no país. Muitos dos cursos de pós-graduação do país não têm porque ainda ter uma titulação muito longa, como muito bem demonstrado pelo Charles, não há país no mundo que forme doutores tão tardiamente quanto o Brasil, e o Charles tem toda a razão. E nós, que temos um sistema nacional de pós-graduação bem consolidado, precisamos discutir para que esse salto em termos de número de doutores seja dado no país.
Então, nós temos, hoje, no sistema nacional de pós-graduação, e a Capes é responsável por cerca de 80% desse sistema, quase 361 mil pós-graduandos matriculados. Tivemos, em 2022, esse número de titulados e esse número de desligados. Então, esses dados são de 2022, e a gente deve, em breve, consolidar os dados de 2023. Mas são 480 instituições que oferecem pós-graduação, com cerca de 7 mil cursos, ultrapassamos 7 mil cursos em 2023, e mais 4,6 mil programas. E isso tudo, esse avanço necessário para o nosso país, embora ele tenha sido importante, ele ainda está muito aquém do que o Brasil precisa para se tornar uma nação soberana e desenvolvida. Então, vejam que houve aqui, infelizmente, uma parada no ritmo de matrículas na pós-graduação, seja no doutorado e mestrado acadêmicos, e o profissional, um aumento muito pequeno, e o doutorado profissional cresceu, mas as pós-graduações profissionais ainda têm um número pequeno de matrículas. E essa diminuição da procura pela pós-graduação é, por um lado, devida ao fato de não haver uma bolsa com valor suficiente, como já foi dito aqui pelo Vinicius, pelo Charles e pelo Olival, mas também por não ter havido um aumento importante no número de bolsas, e, por outro lado, à diminuição do fomento às atividades científicas que aconteceu, inclusive, com o contingenciamento do Fundo Nacional para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico que aconteceu até 2022, e eu espero, e nós vemos aqui esse acréscimo.
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Aqui já são dados, embora preliminares, de 2023. Então, aqui é o que o nosso Presidente Lula chama de reconstrução do Brasil. Precisamos ampliar muito mais as matrículas na pós-graduação, e isso já aconteceu em 2023. Então, as bolsas do país, em 2022, eram da ordem de cerca de 100 mil bolsas, a maioria no mestrado, mas há também muitas bolsas... A maioria é no doutorado, desculpem-me, mas há muitas bolsas de mestrado, e eu não tenho dúvida que, para o Brasil se desenvolver mais com o Sistema Nacional de Pós-Graduação de excelência que temos, e eu estou falando aqui principalmente dos cursos 5, 6 e 7, precisamos ampliar o número de bolsas de pós-doutorado para que esses cientistas tenham tempo para se inserir e ajudar o Brasil a se reindustrializar.
Vejam: aqui é o impacto importante no orçamento do aumento do valor das bolsas, bolsas essas que estavam com valor sem reajuste durante uma década, e isso afastou muitos os profissionais, porque são profissionais, dos bancos da pós-graduação, o que é muito ruim para o desenvolvimento do Brasil. Então, há uma atração maior pela pós-graduação porque há mais financiamento pelo MCTI e há mais financiamento pelo Ministério da Educação naquilo que é o mais importante, naquela parte da educação que é mais importante para o desenvolvimento socioeconômico mais rápido do nosso país.
Obviamente, o orçamento precisa ser utilizado em todas as etapas de educação, porque o sistema educacional brasileiro todo precisa ser refinanciado e ter um ganho de financiamento e de orçamento para que a gente possa avançar desde a educação infantil até o doutorado e, por que não, também o pós-doutorado de maneira estratégica em áreas que sejam estratégicas para o nosso país.
E eu mostro aqui, por último, a evolução no número de bolsas de mestrado e doutorado concedidas pela Capes. Então vejam que, se compararmos com 2010, nós temos quase o dobro de bolsas. Portanto, em pouco mais de dez anos a Capes praticamente duplica o número de bolsas, e esse número ainda aumentará em 2023. Sairá uma portaria em breve, porque já discuti na semana passada com o Foprop e com a ANPG, e nós temos certeza de que, através da concessão de um pouco mais de bolsas ligadas a programas específicos e às pró-reitorias das nossas universidades, nós poderemos avançar um pouco mais em 2023, apesar das restrições orçamentárias muito bem mostradas pelo Charles. E a nossa sociedade precisa entender e precisa nos apoiar para que haja menos cortes por parte dos relatores do Orçamento no Parlamento, e que a gente tenha aquilo que a gente merece, porque o Sistema Nacional de Pós-Graduação é, sem dúvida nenhuma, o motor para o desenvolvimento do nosso país e da sociedade brasileira. Então, embora esse aumento tenha acontecido em 2023, nós queremos ainda aumentar para 2024 cerca de 10% no número dessas bolsas, e sigamos, então, juntos, Senadora Teresa. São muitas as pessoas que precisam, como é a luta da ANPG, dos direitos previdenciários. É fundamental para que haja ainda mais atratividade para o Sistema Nacional de Pós-Graduação, Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia; depende do trabalho desses profissionais altamente qualificados, que infelizmente estão se evadindo dos bancos da pós-graduação, aquilo que chamamos de evasão de cérebros dentro do próprio país, assim como infelizmente se evadindo para outros países, onde eles são mais valorizados. Vamos valorizar os nossos pós-graduandos.
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Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Nós é que agradecemos, Prof. Denise.
A senhora tocou num ponto fundamental, que é a disputa por orçamento nas Casas Legislativas, e do mesmo jeito eu digo que nós precisamos da pressão popular, para que possamos esticar o Orçamento para além de algumas práticas que insistem em permanecer e vigorar no interior dos Parlamentos.
Muito obrigada pela sua apresentação.
Passo a palavra agora para a Prof. Helena Nader, da Academia Brasileira de Ciências.
Muito obrigada, professora, pela sua presença.
São dez minutos de explanação.
A SRA. HELENA BONCIANI NADER (Para expor. Por videoconferência.) - Muito obrigada, Senadora Teresa. Eu quero lhe agradecer a aproveitar para cumprimentar, na sua pessoa, todos os meus queridos amigos dessa mesa.
E também quero aproveitar, porque eu tenho falado isso fora, mas eu quero falar agora para dentro: agradecer ao Senado, que teve a percepção correta de que sem ciência não vai haver desenvolvimento.
Infelizmente, tudo aquilo pelo que vocês se esforçaram foi derrubado na Câmara dos Deputados. Então o Senado fez a sua parte, e talvez nós, sociedade civil, não tenhamos feito a nossa da forma como talvez devêssemos ter feito. Vocês colocaram ciência, tecnologia e inovação fora do - eu vou continuar chamando teto de gastos, porque já estou numa idade em que não dá para aprender essas mudanças de nomenclatura para a mesma atividade fim que é nociva ao país.
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Então, eu quero lhe agradecer; que a senhora transmita a todos os seus colegas o nosso muito obrigada da Academia Brasileira de Ciências.
O século XXI - eu vou complementar algumas das falas - é o século - e já se passou um quarto dele - da sociedade do conhecimento, que demanda novas competências, habilidades num compromisso de responsabilidade e de ética para o desenvolvimento pleno do ser humano. No Brasil, 8,5 milhões de quilômetros quadrados, 51,1% da população são mulheres e estamos, como o Vinicius já apontou, envelhecendo. E o Brasil não está prestando atenção nisso. A nossa taxa de crescimento caiu, e eu, cada vez que preparo eslaides, Senadora, para quando eu vou falar sobre isso, eu levo um susto: era 0,8; 0,7; 0,5 agora. Então, isso é muito preocupante. Em 2050 nós vamos estar com uma população envelhecida e que não está, talvez, preparada para assumir as funções que ela vai ter que desempenhar.
Teve um artigo que saiu ano passado na Folha de S.Paulo que eu achei muito interessante - aliás, d'O Estado de S.Paulo - a que eles dão o título "Os jovens nunca foram tão preciosos", que é comentando sobre o Censo. E aí tem uma frase que eles trazem de um demógrafo; ele diz assim: "Não há experiência histórica de um país que antes envelheceu e depois enriqueceu". Eu acho que isso deveria ser um lema, porque é agora; essa janela de oportunidade é agora.
Então, o que eu queria complementar é que eu discordo um pouco, viu, Charles, do olhar da idade, porque está sendo olhada ali a pós-graduação no Brasil comparada com a dos Estados Unidos. Não dá para fazer essa comparação, porque lá o indivíduo para, faz o doutorado e depois ele termina a Engenharia ou o Direito ou a Medicina. Aqui no Brasil eles vão fazer tudo isso depois, mas ainda muita gente precisa trabalhar para poder sustentar a pós-graduação, nós não temos bolsa suficiente. Então, temos que olhar; eu acho que valeria a pena fazer um estudo mais profundo sobre isso da idade e ver se tem relação com aqueles que têm bolsa, não têm bolsa... Eu acho que nós temos que ter mais alguns dados.
A outra coisa que eu queria trazer... Tem um artigo - artigo, não; é um livro - que toda vez eu vou atualizando, do Nerard, falando... Porque vocês lembram que nós tivemos um Ministro da Educação, um desserviço, que disse que o Brasil não precisava de doutores.
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Então, eu fui pegar esses números em 2016, que é mais fácil para comparar todos. O Brasil formou cerca de 20 mil doutores. O Reino Unido, que é um país continental como o Brasil, 27.500 doutores. Um outro país continental gigante chamado Alemanha formou 68 mil doutores. E os Estados Unidos, 70 mil doutores.
Então, nós estamos muito aquém do que o Brasil precisa para ser uma nação soberana independente, como já foi apontado por muitos.
Quanto ao número de pesquisadores, engenheiros, doutores e engenheiros por milhão de habitantes, o Brasil está com cerca de 900; enquanto, se nós formos olhar a Alemanha, no mesmo ano, está com mais de 60 mil por milhão de habitantes.
Então, são escolhas. O Brasil tem uma escolha a fazer, e está perdendo o passo. Nós melhoramos no índice de competitividade global, innovation, inovação, mas estamos péssimos. Nós estamos na posição 49, que é muito ruim. O Brasil já esteve na posição 47, em 2011.
Então, isso é por quê? E aí eu venho com uma proposta, que eu acho que o Congresso Nacional deveria fazer, como fez Índia, como fez China, que é: empresa, tem que contratar doutores, tem que ter.
E a gente teve essa oportunidade, mas abriu mão, na época, por exemplo, da indústria farmacêutica. Fazer P&D no Brasil, contratamos nossos doutores. Não obrigamos. A Índia fez, a China fez, está aí aonde eles chegaram e aonde nós chegamos.
Então, existem alternativas. Como é que a indústria que pega dinheiro emprestado do FNDCT não emprega doutores? Está errado. O Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico determinou que esses que pegam dinheiro a baixa taxa, tinham que contratar doutores. Não estão contratando.
Então, nós temos uma maneira de dar um salto tanto na empregabilidade quanto no avanço econômico do nosso país. Tem um dado, Senadora, que me assusta muito: são as principais empresas no Brasil... Eu levei um susto. Cinco delas são bancos. E, curiosamente, jogar na bolsa é investimento; por na educação é gasto. O conceito está errado.
Enquanto o Brasil não mudar esse conceito, nós vamos estar fazendo reuniões... Eu já estou velha, então não sei se eu sobrevivo a tanto tempo de audiências - e eu quero lhe agradecer por fazer mais esta -, mas mostrar que tem que mudar. Tem que mudar enquanto temos jovens. Tem que mudar para alguém poder manter os aposentados, porque, se não, a máquina vai quebrar, e as pessoas não estão percebendo isso. Nesse mapa de cinco bancos, nem vou falar nenhum deles, porque me dá calafrio. E, as empresas são: a Vale, a Petrobras e a Weg. Então, muito poucas, a Embraer um pouco.
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Para concluir, eu gostaria de trazer por que o Brasil precisa de educação e CTI. Não é porque é chique. É porque os países que deram certo investiram em educação e em CTI. Todo mundo quer o milagre da Coreia, mas não investe igual a Coreia; quer o milagre da China, mas não investe igual a China. E tem que ser casado, educação e CTI estão de braços dados. A gente precisa de pessoal qualificado, precisamos de conhecimento avançado sobre processos e produtos; e precisamos continuar avançado, a ciência pelo avanço da inteligência humana, mas a ciência que também se reverte para a sociedade, que é aquela que mantém essa ciência.
Então, quero lhe agradecer pela oportunidade e dizer que sem a ANPG não vai ter mais... E aí eu dou um susto na bancada ruralista, porque eu acho que eles estão precisando tomar um susto. Não vai ter mais porque eles esqueceram que a África tem o mesmo solo, é igual ao do Brasil, é igual ao solo aí de Brasília, dessa região. A tecnologia já está dominada, e exportar para China é mais barato e mais rápido da África do que do Brasil. Então, talvez os filhos da bancada ruralista não tenham as regalias que os pais estão tendo. Se eles pararem para pensar que sem a ciência, e isso é válido para todas as outras empresas...
A ciência é a mola propulsora do desenvolvimento econômico de uma nação e a educação é a base de tudo. Sem ela não tem ciência, não tem tecnologia, não tem inovação. Eu brinco que é o filme do Charles Chaplin, Tempos Modernos. E aquele cara que fica: no começo, educação; depois, ciência; depois, tecnologia; e, finalmente, inovação.
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por vídeo.) - Muito obrigada, professora. Pegaremos essa... Não escadinha, mas essa articulação entre todos esses desafios.
Muito obrigada, pela sua intervenção.
Eu passo a palavra para a nossa última convidada a Profa. Lucia Melo, da SBPC.
O SR. LUCIA CARVALHO PINTO DE MELO (Para expor. Por videoconferência.) - (Falha no áudio.)
Boa tarde, querida, prezada Senadora Teresa Leitão, companheira de várias lutas aqui em Pernambuco pela educação, fazendo já um trabalho muito importante de trazer esse tipo de debate a um ambiente onde ele deve acontecer com mais frequência.
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Eu quero cumprimentar a mesa, todos os aqui presentes, através da minha querida amiga Helena Nader, depois de fazer uma belíssima apresentação, muito instigante, e eu quero ver se eu contribuo para esse debate também.
Eu vou pedir desculpas, porque eu me atrapalhei com a hora da reunião - pensei que fosse às 16h -, quando o seu funcionário me avisa que já começou, então me atrasei por conta disso.
Eu vou compartilhar uma apresentação aqui. Vou tentar ver se eu vou acertar, porque eu mudei aqui o meu computador e agora eu estou... (Pausa.)
(Procede-se à apresentação.)
Bom, então, eu espero que todos estejam vendo. Eu não estou vendo vocês, porque essa foi a maneira como eu consegui aqui com meu computador. Então, se alguém não estiver me entendendo, por favor, faça-me um jeito de eu tentar compreender vocês.
Bom, eu vou tratar um pouco da questão da perspectiva dos pós-graduandos nesse novo mundo. Vou falar um pouco de onde nós estamos, acho que é importante entender as atividades profissionais dos egressos da pós-graduação. Já temos vários estudos nessa direção. O CGEE tem uma plataforma excelente em parceria com a Capes, com o Ministério do Trabalho e com outras instituições que mostram isso, e a situação a gente precisa analisar para entender. Vou falar um pouco da nova era, as transformações em curso e os desafios para um Brasil sustentável e autônomo.
Com relação aos empregos "onde estamos" hoje, é de conhecimento de quase todos vocês que estão aqui - mas é importante registrar junto ao Senado - que o número de empregos para mestres e doutores do Brasil de 2009 a 2021 cresceu de uma forma estável. A gente mostra que, em relação à média do PIB - o PIB é essa linha verde -, o emprego formal nós tivemos, apesar de uma quedinha num momento de crise, uma certa estabilidade no emprego de mestres e doutores; uma queda menor e uma recuperação maior; e nós tivemos uma distribuição importante para ser analisada: onde esses mestres e doutores andaram empregados ou andam empregados. E a gente pode observar que há, evidentemente, uma administração pública federal, estadual e municipal em que predomina o emprego dos mestres e doutores, mas existe, principalmente entre os mestres, as entidades empresariais privadas com crescimento muito grande dos empregos. A gente atribui isso, evidentemente, às instituições privadas na área de educação, e as empresas ainda com uma participação pequena, como a gente vai ver.
Com relação a mestres e doutores, a gente tem, por exemplo, numa abordagem nas indústrias de maior conteúdo tecnológico e menor conteúdo tecnológico, uma presença maior de mestres do que de doutores em alta tecnologia e, em baixa tecnologia, uma presença também maior de mestres do que de doutores.
A gente tem, como uma força de trabalho adicional importantíssima em que se está prestando atenção muito no mundo, as mulheres para entrarem na força de trabalho de ciência e tecnologia. A gente vê que para as mulheres também mestres cresceu o número de empregos; para as doutoras mais ainda, principalmente, para nossa surpresa, nos segmentos mais altos de tecnologia.
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Como a gente sabe, vários países estão tentando incorporar as mulheres cada vez mais na agenda de ciência e tecnologia, como uma forma de ampliar o contingente de pessoas nesse nível de qualificação, que são necessárias para esse novo século pelo qual estamos passando.
Na Europa, por exemplo, constata-se que menos de 25% das mulheres estão em postos importantes, do ponto de vista tecnológico; e o esforço que está sendo feito é muito grande para atrair as mulheres para esse campo, algo semelhante ao que foi feito na Segunda Guerra, quando os homens tiveram que ir para o front de batalha e as mulheres tiveram que ir para a manufatura. Então, nós vamos ter que ampliar, sim, a nossa capacidade de produzir conhecimento com incorporação das mulheres na agenda de ciência, tecnologia e inovação. Mas isso é uma figura, um quadro do que vem acontecendo.
A gente está enfrentando agora uma mudança muito expressiva, muito importante, uma nova era se estabelece, transformações em curso são muito exigentes, são muito presentes em todas as atividades humanas. Particularmente para que a gente avance, no desenvolvimento, nós precisamos de talentos altamente qualificados, mas com habilidades adicionais ao que estamos acostumados a formar, e culturalmente adequados a esta nova realidade.
Um exemplo, por exemplo, é quando a gente vê a postura de uma empresa muito importante no Brasil, que é a Embraer - foi citada aí pela Helena, eu acho que é um dos maiores exemplos de uma empresa brasileira -, em que tem 5 mil pessoas atuando em TID internamente. O diretor de pesquisa e inovação diz que as competências requeridas hoje vão muito além das competências técnicas. Tem a ver com a competência social, visão sistêmica, visão de negócios, interdisciplinaridades, habilidades interpessoais, gestão emocional, e, mais do que tudo, capacidade de aprender a aprender. Esse é o desafio que a gente tem para esse século.
Várias pessoas acham, entendem, que há, advinda da inteligência artificial, uma transformação tão grande na forma de organização e da vida da sociedade, em todos os campos, que tem como consequência imediata um desemprego absoluto. Eu não acredito que será assim. Eu acredito que tem espaço, sim, de adaptação, mas, se os países souberem se organizar muito rapidamente para capacitar as pessoas e as instituições, eles poderão, de fato, tornar essa oportunidade em ganhos de desenvolvimento e qualidade de vida para a pessoa.
A inteligência artificial não pode ser vista apenas como ferramenta ou uma plataforma, mas é uma maneira de se fazerem as coisas diferentemente. E quem não entrar nessa nova categoria, seja universidade, seja empresa e governos, não vai conseguir acompanhar o processo que está em curso pela velocidade nunca vista numa transformação social, como a que nós estamos assistindo aí.
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Então as universidades, em alguns países, estão buscando criar capacidades, exatamente para lidar com esse novo ambiente. No Reino Unido, é um bom exemplo, o Russell Group, por exemplo, em que estão tentando trabalhar com a alfabetização para a inteligência artificial, capacitando, com intensidade, professores, staff e os alunos com essas novas orientações.
Nós temos, evidentemente no Brasil, um conjunto de desafios e oportunidades para que tenhamos um Brasil sustentável, competitivo, que seja gerador de empregos de alta qualificação, que é onde nós vemos nossos pós-graduandos se situarem. Isso tem a ver, primeiro, é indispensável uma ampliação de forma significativa dos investimentos em ciência, tecnologia e inovação. Nós precisamos dar um salto quântico nesses investimentos, ou nós vamos ter que renunciar ao desenvolvimento do século XXI. E aí, como sociedade, nós não teremos bons prognósticos.
Apenas para exemplificar, a China recentemente determinou dez tecnologias que ela deveria liderar e cujo principal competidor ela deveria conseguir superar. Dessas dez, em sete, eles resolveram investir fortemente na formação de pessoas e na capacidade de pesquisa. Para isso, elevaram os gastos em pesquisa, desenvolvimento, ciência e tecnologia e inovação em geral, para 13% do PIB. Quando a gente estava falando que, na Coreia, na Alemanha, etc., eram 4%, 5%, a China ampliou agora, recentemente, por uma determinação do Governo chinês, de atingir 13% do PIB em investimentos em ciência e tecnologia. É nesse país que nós devemos nos inspirar.
É preciso apoiar um intenso processo de atualização e modernização das universidades. No meu entendimento, as universidades não estão preparadas para essa transformação. É preciso haver uma reciclagem muito intensa dos professores. E eu acho que aliando isso com o que a Helena chamou a atenção, a questão demográfica, é urgente que se criem mecanismos de absorção de pessoal jovem, com nova cabeça, nova cultura, nova formação, para que as universidades voltem a ser um lugar atraente para os jovens.
É preciso que as universidades tentem se organizar, de uma forma coletiva, para que possam superar esse obstáculo. Não é só digitalizar, nem dar acesso à internet. É algo muito mais profundo, que deveria fazer com que as universidades se movimentassem e se inspirassem em modelos que já estão acontecendo no mundo.
Finalmente, para que a gente tenha mais empregos para nossos pós-graduandos, nós precisamos desenvolver uma nova indústria, que seja intensiva em conhecimento e inovação. Como é sabido, a nossa capacidade de inovação nas empresas, inovação incremental, até que acontece, ainda modestamente, mas acontece. Mas a inovação radical, aquela inovação que dá condições de competição internacional, aquela que dá condições de liderança, ainda é muito insuficiente, haja vista o pequeníssimo número de empresas que têm atividade de P&D interna.
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Nós temos uma pesquisa recente da Pintec, semestral, que saiu duas semanas atrás, que mostra que, do universo das empresas pesquisadas, apenas 5% têm investimentos em pesquisa internamente.
Uma política industrial para o Brasil foi lançada, com algumas missões e alguns eixos definidos. Grande parte deles tem a ver com a exploração adequada do potencial e do ativo brasileiro, que são os biomas brasileiros, a saúde brasileira, a tecnologia de informação e comunicação, a própria inteligência artificial, os materiais estratégicos que o Brasil precisa encontrar, qual é o caminho para eles.
Para que a gente atinja esse objetivo de ter uma indústria produtiva, competitiva e intensiva em conhecimento, nós vamos precisar, sim, ter um quantitativo de alunos de pós-graduação, de egressos de pós-graduação muito mais intenso, com uma formação muito mais adequada, porque também as empresas, se não se adequarem a essa nossa transformação, não vão conseguir ter no seu seio a atividade de pesquisa e desenvolvimento requerida nesses novos tempos.
Então, acho que o emprego em tecnologias, em indústrias, que é o que a gente quer, na própria agricultura, também intensiva em conhecimento, vai exigir um perfil de recursos humanos que hoje ainda estamos formando muito timidamente.
Voltando ao exemplo da Embraer para encerrar, a própria Embraer cria programas internos em parcerias com universidades para complementar essa capacitação dos seus talentos, principalmente com o slogan de que é preciso aprender a aprender, se reciclar e permanentemente renovar seus conhecimentos.
Então, acho que é o desafio que nós temos no Brasil. Algumas dessas iniciativas estão colocadas, como, por exemplo, a política industrial, mas, se ela não vier pari passu com o aumento expressivo nos investimentos em ciência, tecnologia e inovação, nós vamos continuar a dizer que a indústria moderna é aquela apenas que compra equipamentos modernos.
Então, para se ter gente capacitada lá dentro e para que a gente tenha condições de gerar os conhecimentos para explorar nosso bioma, para explorar nossas oportunidades, que são próprias do Brasil... O Brasil, por exemplo, na área de energia, em que tem uma vantagem competitiva e uma vantagem estrutural enorme, nós não vamos conseguir avançar, porque não vai ter indústria intensiva e conhecimento competitivo sem ter uma base sólida de ciência e tecnologia distribuída pelo país inteiro, como já se mostrou ser possível com a expansão das universidades, a expansão dos institutos federais, que são lócus e vão promover essa capacidade de absorver os pós-graduados, absorver os cientistas, os pesquisadores e transformar cada um dos territórios brasileiros.
Então, eu acho que essa missão é que vamos caminhar juntos. A indústria não se desenvolve, o Brasil não adquire uma posição de moderno, competitivo, sustentável e mais igual se não houver um investimento maciço em ciência, tecnologia e inovação com esses propósitos.
Terminei minha fala e eu vou ficar à disposição para perguntas e debates que virão, provavelmente.
A SRA. PRESIDENTE (Teresa Leitão. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Por videoconferência.) - Muito obrigada, Lucia. Eu acho que você conseguiu muito bem encaixar os desafios no momento conjuntural em que a gente vive, nas propostas de Governo, no plano de crescimento industrial. Enfim, é um apanhado muito importante.
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Tenho certeza, Vinicius, de que as exposições foram complementares - evidentemente, um ou outro enfoque diferente, que é importante que a gente tenha -, mas em relação a todos os anseios que a gente tinha em relação ao que a ANPG nos trouxe, eu, com muita satisfação, digo que estou plenamente gratificada.
Eu vou passar agora a ler - vou ler bem devagarzinho - as perguntas que vieram do e-Cidadania. Algumas eu já olhei aqui, acho que já foram contempladas na exposição inicial, mas se alguém quiser, depois da leitura, fazer algum complemento da sua intervenção inicial, nós temos ainda um tempo suficiente para isso.
A primeira pergunta veio de Rocio, do Paraná: "Trabalhei como pesquisadora cientista pós-graduanda durante 9 anos, tenho direito a seguro desemprego, aposentadoria, férias?". Isso já foi colocado por nós, e não tem. Essa é uma das questões que estamos aí por buscar alternativas.
A segunda é do Georg, do Rio de Janeiro: "Por que o pesquisador pós-graduando, indispensável para o desenvolvimento do país, não é visto como trabalhador? [...] [E] os direitos trabalhistas?". Também já abordamos, Georg, essa pergunta.
Levi, do Maranhão: "No Brasil, qual é o status dos debates sobre [...] [a equiparação do doutorando a] [...] trabalhador assalariado, como ocorre na França?".
Paula, da Bahia: "Como [os] pós-graduandos [...] [serão inseridos] no mercado de trabalho, [...] [se] as vagas exigem experiência e o [...] tempo na academia não é aceito?". Muitas preocupações sobre a mesma temática.
"Quais são os planos do Governo para incentivar pesquisa e desenvolvimento fora das instituições acadêmicas? Há pouca oferta de vagas [...] [em pesquisa] para absorver [...] [pós-graduados]." Essa foi de Luciana, do Paraná.
E agora, Lunaria, de Minas Gerais: "Como pensar e construir um campo de atuação profissional estável para estudantes de humanidades para além da academia?".
E, por fim, Gustavo, do Pará: "Como [...] [rever] o problema da falta de valorização [...] [dos] pós-graduandos que são responsáveis pela pesquisa no país?".
Eu acho que, de uma forma ou de outra, as perguntas estão versando sobre o nosso dilema, que foi aqui exposto por vários dos senhores convidados.
E temos ainda quatro comentários.
O primeiro, de Tássia, do Rio Grande do Sul: "Acredito que, se a pesquisa contasse para a aposentadoria, haveria mais inovação no país e a pós atrairia mais alunos".
Mikayo, do Espírito Santo: "O Governo deveria dar mais incentivos fiscais às empresas que investem em pós-graduandos, a educação é a única forma de desenvolver o país".
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Amanda, do Rio Grande do Norte: "Pós-graduandos são pesquisadores e cientistas [...] [e] devem ser valorizados profissionalmente com direitos trabalhistas: férias e aposentadoria".
Hilton, da Bahia. "Mais que ser um trabalhador que bate ponto, o cientista tem que ser bem remunerado. Aumento das bolsas já".
Mais ou menos sobre a mesma temática, com pequenas variações. Acho que esse foi um ponto muito focal do pedido da ANPG, e, na minha avaliação, as exposições ultrapassaram, porque justificaram e contextualizaram por que isso ocorre. Não é apenas esse fator isolado, mas é um conjunto de questões que envolve a pós-graduação.
Quero dizer que essa questão que a Profa. Lucia levanta sobre nós, mulheres, é um ponto muito importante. Nós estamos inclusive com um programa, no Ministério da Ciência e Tecnologia, de jovens cientistas. Por outro lado, ontem saiu o primeiro resultado que a lei de equiparação salarial entre homens e mulheres exige, que é a primeira apresentação das tabelas das empresas, que vai mostrar uma defasagem salarial entre homens e mulheres - mulheres exercendo a mesma função que os homens.
E destaco que todas as falas, também, para nós do Parlamento repercutem uma grande responsabilidade. Primeiro, o espaço do debate. Ele precisa ser feito nessa perspectiva do valor da ciência, da importância da tecnologia, de como o mundo está acelerado e de como o desenvolvimento demográfico do Brasil está descompensado em relação a isso. Como estimular os jovens a serem cientistas nessa perspectiva de um mundo que está por vir e que já está chegando ao mesmo tempo, considerando, inclusive, outros países e a relação que o Brasil precisa ter e deve ter com esses outros países?
Há o desafio de superar curvas descendentes, como a que houve na Capes, tanto em relação ao acesso quanto em relação às bolsas; e o nó que também é para nós fazer com que o Orçamento que chega do Governo Federal, com as suas prioridades, não seja tão retaliado. E, na hora em que o Executivo manda o Orçamento, ele o está mandando com a responsabilidade que tem de ter sido um governo eleito democraticamente, seja qual for o governo, e um governo eleito com as suas prioridades, com os seus compromissos, que precisam ser refletidos no Orçamento. Sem estrutura e sem dinheiro, a gente não pode fazer uma política pública decente e que chegue à maioria da população, aquela que realmente necessita de políticas públicas.
A desigualdade que existe no Brasil levou o Presidente Lula a cunhar uma frase que é muito emblemática do entendimento que nós temos de Orçamento: "Eu quero botar o pobre no Orçamento e o rico no Imposto de Renda". Mas essa é uma batalha - é uma batalha até ideológica, eu diria - que se trava nas Casas Legislativas. E a gente conta com muita gente que quer preservar o Orçamento, não como uma peça meramente burocrática, muito menos como uma peça decorativa, mas quer que o Orçamento seja algo dinâmico, no atendimento das diretrizes do Governo e, ao mesmo tempo, que
(Falha no áudio.)... uma repartição de recursos justa.
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Então, isso é uma luta contínua que nós temos, porque também o Parlamento, assim como a sociedade, é diverso de pensamentos, de intencionalidades, de convicções. É uma luta boa, sem sombra de dúvida, que a gente precisa fazer com muito destemor, com muita capacidade e, sem sombra de dúvida, com o apoio da sociedade.
Da minha parte, eu estou absolutamente contemplada, agradecida por esses momentos de tanto aprendizado, e pergunto se algum dos senhores e senhoras quer fazer algum comentário sobre os comentários do e-Cidadania. (Pausa.)
Como ninguém se inscreveu, vou fazer como de costume...
Algum Senador - desculpe-me, esqueci de perguntar - se inscreveu, Andréia? (Pausa.)
Também não?
Então, Vinicius, estamos bastante contemplados com o seu requerimento.
Não havendo mais nada a tratar, quero agradecer muito a presença de todos e de todas, desejar uma boa Páscoa, uma boa Semana Santa, e nos encontraremos nas lutas em defesa da ciência, da tecnologia e da inovação, para termos um país cada vez mais democrático e mais igualitário.
Muito obrigada. (Palmas.)
(Iniciada às 14 horas, a reunião é encerrada às 15 horas e 38 minutos.)