21/05/2024 - 10ª - Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Zequinha Marinho. Bloco Parlamentar Independência/PODEMOS - PA. Fala da Presidência.) - Bom dia a todos.
Havendo número regimental, declaro aberta a 10ª Reunião da Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 57ª Legislatura, que se realiza nesta data, 21 de maio de 2024.
Objetivos e diretrizes desta reunião.
A presente reunião destina-se à realização de audiência pública com o objetivo de debater a relação entre o desempenho econômico do país e o resultado divulgado do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), em atendimento ao Requerimento nº 7, de 2024, desta Comissão, de nossa autoria.
Convido para tomar lugar à mesa o Sr. Tiago Bahia Fontana, Coordenador-Geral de Disseminação e Integração de Dados e Informações do Ministério da Saúde. Por favor, Tiago. (Pausa.)
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Ainda, de forma remota, contamos com a participação da Sra. Camila Ferraz Peixoto, Coordenadora-Geral de Estudos Econômicos e Tributários da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda; e do Sr. Michael Tulio Ramos, Professor do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper).
Informo ainda que foram convidados, mas que não enviaram representantes: o Ministério da Educação; o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome; a Unidade de Desenvolvimento Humano do Pnud Brasil; e o Sr. Marcelo Medeiros, pesquisador da Universidade de Columbia.
O Ministério da Educação declinou da indicação de representantes, informando que o tema da audiência pública está fora do rol de competência do ministério.
O Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome e o Pnud agradeceram o convite e informaram que, em razão de compromissos previamente assumidos, não poderiam participar da audiência pública.
O Sr. Marcelo Medeiros informou que está de férias e não poderia participar aqui do evento.
Antes de passar a palavra aos nossos convidados, comunico que esta reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados pelo Portal e-Cidadania na internet, no endereço senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone 0800 0612211.
O relatório completo de todas as manifestações estará disponível no portal, assim como as apresentações que forem utilizadas pelos expositores.
Na exposição inicial, cada convidado poderá fazer uso da palavra por até dez minutos. Ao fim das exposições, a palavra será concedida aos Parlamentares inscritos para fazerem suas perguntas.
Perguntas via e-Cidadania.
Antes de iniciarmos as exposições, gostaria de compartilhar algumas das manifestações dos cidadãos que recebemos por meio do e-Cidadania e já deixo aberto para que os expositores possam responder a eventuais questionamentos ou fazer comentários que julguem necessários.
Aqui estão algumas perguntas e comentários dos nossos internautas.
Guilherme, de São Paulo, diz o seguinte: "Como essa relação entre o desempenho econômico [...] e o resultado do [...] [Índice de Desenvolvimento Humano] influencia nas políticas públicas do país?". Interessante.
O Kennedy, de Minas Gerais, diz: "Na visão dos convidados, o cooperativismo/ cooperativa poderia ser um instrumento para alavancar o [...] [Índice de Desenvolvimento Humano] das cidades [...]?".
Viviane, de Santa Catarina: "Quais medidas concretas e imediatas o Senado pode adotar para alterar a progressão continuada no ensino fundamental e melhorar [...] [o Índice de Desenvolvimento Humano]?".
Nicki, do Rio Grande do Sul: "Como o crescimento econômico pode influenciar diretamente o [...] [Índice de Desenvolvimento Humano]?".
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Mais três questionamentos.
O seguinte, Aluísio, lá do Estado do Ceará: "Quais são as principais causas identificadas para a estagnação do [...] [Índice de Desenvolvimento Humano] no Brasil, apesar do crescimento econômico em alguns períodos?".
Davi, do Rio de Janeiro: "Quais políticas públicas estão sendo implementadas para promover o crescimento econômico e o desenvolvimento social?". Isso aqui é o âmago de tudo.
Emanuelle, de Mato Grosso: "Quais são as regiões do Brasil que apresentam os maiores desafios em termos de [...] [Índice de Desenvolvimento Humano]?".
A turma é boa, com perguntas significativas.
Vamos começar pelo Dr. Michael Tulio Ramos, que é Professor do Instituto de Ensino e Pesquisa, que está remotamente.
Eu gostaria de pedir à nossa turma aqui da técnica para trazer o Dr. Michael à tela a fim de que ele possa, com tranquilidade, fazer a sua exposição.
Dr. Michael.
O SR. MICHAEL TULIO RAMOS (Por videoconferência.) - Obrigado, pessoal.
Bom dia.
Obrigado pelo convite para estar aqui participando...
O SR. PRESIDENTE (Zequinha Marinho. Bloco Parlamentar Independência/PODEMOS - PA) - Seja bem-vindo, Michael.
O SR. MICHAEL TULIO RAMOS (Por videoconferência.) - Muito obrigado, Senador.
Eu vou colocar a minha apresentação aqui. Só um minuto. (Pausa.)
Pronto. Está aparecendo para vocês? (Pausa.)
Está aparecendo para vocês a apresentação? (Pausa.)
Está?
O SR. PRESIDENTE (Zequinha Marinho. Bloco Parlamentar Independência/PODEMOS - PA) - O.k.
O SR. MICHAEL TULIO RAMOS (Para expor. Por videoconferência.) - Maravilha.
Pessoal, na minha apresentação de hoje, eu vou fazer uma relação com vocês entre a desigualdade racial e o Índice de Desenvolvimento Humano. Em seguida, depois da apresentação, eu posso comentar um pouco mais sobre as perguntas que fizeram.
Eu sou Coordenador do Núcleo de Estudos Raciais do Insper, e já faz algum tempo que a gente tem mergulhado um pouco nessa agenda racial no Brasil, cruzando dados e evidências. E a ideia inicial aqui é discutir um pouco sobre a persistência das altas desigualdades sociais. Essa persistência acaba impactando no IDH no final do dia.
O primeiro ponto que acho que é importante a gente discutir aqui é que, quando a gente olha para várias dimensões da desigualdade racial no Brasil, seja no mercado de trabalho, seja na educação, seja na saúde, a gente não tem avançado de forma significativa.
Este gráfico ilustra um pouco disso. Se a gente olhar ali, da década de 80 até o início dos anos 2000, a evolução de diferença salarial no mercado de trabalho estava estacionada. Houve uma melhora ali nos anos 2000 até 2010. Depois de 2010, continua estacionado ali, com negros ganhando cerca de 40% a menos do que brancos, só que essa é a média que a gente chama de não condicional. Você pega, basicamente, a diferença de média entre todos os brasileiros no mercado de trabalho, e aí você tem essa medida de desigualdade racial no salário. Agora, o mais interessante é esta outra curva aqui, esta primeira. Aqui é o que a gente chama de diferença salarial condicional. O que é isso? A gente aqui está comparando trabalhadores com características produtivas semelhantes. A gente leva em consideração, por exemplo, a localização, leva em consideração a educação, leva em consideração o gênero, a idade, a experiência profissional, a ocupação. No final do dia, o que a gente está fazendo nessa curva aqui é comparando trabalhadores com características produtivas semelhantes, controlando por tudo que é característica observável. E os trabalhadores só estão diferindo ali em relação à raça e a características que a gente não consegue observar. Então, a gente tem essa segunda curva aqui que vai mostrar que, desde a década de 80, negros estão ganhando cerca de 15% menos do que brancos.
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E o mais interessante é que essa curva é relativamente constante ao longo do tempo. Desde a década de 80 até 2020, você tem uma estagnação, você não tem melhora nenhuma na diferença salarial condicional. O que isso significa? Isso significa que se passaram basicamente 40 anos, e a gente não teve melhora nenhuma; significa também que a gente teve um país que teve redemocratização, teve governos da esquerda, teve governos da direita, e, mesmo assim, o gap racial no mercado de trabalho entre brancos e negros está constante.
Isso implica, em certo sentido, que a gente está falhando em políticas públicas. Se a gente está falhando nas políticas públicas para equalizar a igualdade racial no mercado de trabalho, isso também se reflete no IDH no final do dia.
Além disso, por exemplo... Este gráfico está no nosso livro que a gente lançou no final do ano passado, chamado Números da Discriminação Racial. A gente já começa o livro fazendo uma pequena provocação, que seria a seguinte. Imaginem que vocês são negros, se, por exemplo, eu sou um indivíduo branco, e todo mês eu pego essa diferença salarial de cerca de quase 15% do que ganho a mais que vocês e aplico em renda fixa. Isso vai fazer com que, a cada cinco anos, seis anos, eu possa tirar um ano sabático, de férias, e o patrimônio de vocês não vai alcançar o meu. A cada cinco, seis anos, eu posso pegar esse patrimônio e ficar um ano de férias; e, se vocês continuarem trabalhando, o patrimônio de vocês não vai alcançar o meu. Essa é só uma das desigualdades entre várias outras em que os negros acabam ficando em desvantagem em relação aos brancos na sociedade brasileira. E isso impacta, por exemplo, no índice de IDH, na educação, impacta na expectativa de vida e impacta na renda também.
Esse gráfico aqui ajuda a ilustrar, por exemplo, a diferença por gêneros. A gente tem aqui o grupo de mulheres brancas, de homens negros e de mulheres negras em relação aos rendimentos dos homens brancos. A gente percebe aqui que houve uma melhora muito significativa das mulheres brancas nos últimos 40 anos, chegando a ter quase 80% dos salários dos homens brancos. Em comparação, os homens negros estão basicamente estacionados; houve uma melhora ali em 2005, mas continuam estacionados depois de 2010. E as mulheres negras vêm lá embaixo, com uma melhora, mas uma melhora muito baixa ainda. Essa aqui é uma outra dimensão da desigualdade racial no país. A gente percebe que as mulheres brancas avançaram muito. E essa parte da melhora das mulheres brancas está muito em função, por exemplo, da participação no mercado de trabalho, do acesso à educação de maior qualidade e da rede de contatos também. E a gente sabe que, por exemplo, as mulheres brancas tendem a estar distribuídas entre a parte mais rica da população e a parte mais pobre, enquanto os negros tendem a estar mais distribuídos entre os mais podres. E isso também impacta a formação de rede de contato; e rede de contato impacta as oportunidades no mercado de trabalho.
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Por fim, eu queria apresentar só mais esse gráfico sobre a persistência da desigualdade racial no país, a alta persistência. Aqui, a gente plota, por exemplo, o percentil da renda per capita. Então, aqui estão o percentil dos mais pobres da população e o percentil dos mais ricos.
E aqui tem o Índice de Equilíbrio Racial, uma metodologia que a gente desenvolveu no âmbito do Núcleo de Estudos Raciais do Insper. Se olharmos do lado positivo, isso indica uma sobrerrepresentação de negros; do lado negativo, uma sobrerrepresentação de brancos. O que essa curva está mostrando é - a gente plotou aqui 2012 e 2021 - que se passaram basicamente dez anos e que nada mudou quando a gente olha para todo o percentil da renda per capita brasileira. Então, passaram-se dez anos, e basicamente o retrato de 2012 é o mesmo de 2021.
A gente, como país, não tem muito o que comemorar no que diz respeito à desigualdade racial. Na hora em que a gente olha o mercado de trabalho, não houve avanços substantivos. Na hora em que olha a educação, o único ganho substantivo que a gente teve foram os anos de escolaridade da população negra, que estão convergindo para os anos de escolaridade da população branca também, mas, na hora em que a gente olha a qualidade da educação, o nível de aprendizagem, por exemplo, os negros estão ficando para trás e muito para trás.
Agora, nos próximos minutos, eu vou falar um pouquinho rapidamente o que explica essas altas desigualdades.
O primeiro ponto, muito substantivo, é que a riqueza inicial, a dotação inicial que você tem, o patrimônio inicial, antes de você nascer, dita muitas das oportunidades ao longo do tempo; as oportunidades vão ditar uma renda que você vai ter; e, com uma renda maior, você retroalimenta a riqueza. Você tem no país essa questão intergeracional que é muito forte. Se você nasce em um lugar mais favorecido, você vai ter muito mais oportunidades, vai gerar uma renda maior para você que vai retroalimentar a acumulação de riqueza intergeracional. Então, você tem esse mecanismo que é fora do controle do indivíduo, que é onde ele nasce, que acaba determinando muitos resultados atingidos na vida. Mesmo que você tenha uma população predominantemente, vamos supor, só branca ou só negra, se você não levar em consideração nenhuma questão racial, a dotação inicial, por si só, reflete essa persistência da desigualdade ao longo do tempo, só que no Brasil a gente sabe que a desigualdade social está extremamente correlacionada com a racial. Então, os negros já saem em muita desvantagem por terem uma dotação inicial, um patrimônio inicial muito mais baixo que o dos brancos. É claro que a gente sabe que existem brancos desfavorecidos, existem brancos pobres, mas, na hora em que a gente pega o 1% mais rico, os 10% mais ricos, é predominantemente branco. Isso, por si só, já leva a um mecanismo de vantagens para esse grupo e de desvantagem para todos os outros, sendo negros ou brancos.
O próximo fator que incide mais sobre os negros, no caso, e também sobre as mulheres são os vieses - os indivíduos são percebidos e tratados de formas distintas -, ou seja, tem um mecanismo na sociedade que vai fazer com que determinados grupos recebam uma espécie de desvantagem nas interações sociais. E a literatura empírica tem mostrado isso em várias dimensões.
Por exemplo, na educação, tem papers, artigos acadêmicos mostrando que, na mesma família, os pais tendem a investir mais na educação da criança mais branca. Se você tem uma criança branca e uma parda, os pais vão investir mais na educação da criança branca. Se você tem uma parda ou uma preta, os pais vão investir mais na educação da criança parda. Quando essa criança chega à escola, tem paper mostrando que os professores vão penalizar mais a criança negra. Eles fazem isso mostrando que o gap racial dentro da sala de aula, onde o professor observa o aluno, é maior do que fora da sala de aula, quando o professor não observa o aluno.
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Na hora em que o negro chega ao mercado de trabalho, ele também vai ser penalizado lá. Tem paper mostrando, por exemplo, no contexto americano, que, se você pegar dois currículos idênticos e só mudar o sobrenome - um sobrenome de origem mais de população negra e o outro de origem mais de população branca -, isso aumenta a taxa de resposta daquele sobrenome de origem mais branca em 50%, ou seja, tem todo um mecanismo que faz com que parte da população esteja em desvantagem.
E, no caso dos negros, por exemplo, tem uma literatura mostrando também que eles podem começar a perceber que vão ser discriminados no mercado de trabalho lá na frente, começam a perceber que o retorno da educação é muito baixo e nem investem em educação. Isso impacta, por exemplo, evasão escolar e impacta desempenho. Então, a gente tem que começar a pensar a educação de forma integrada, não só dentro da sala de aula, mas todos esses mecanismos excludentes fora da sala de aula também que afetam a educação.
E, para finalizar aqui minha fala, pois já estou estourando o tempo, tem outro fator que é muito importante e que a gente, na sociedade brasileira, não discute direito, que seria assim: mesmo se a gente acabar com os mecanismos discriminatórios, ainda existe uma parte da desigualdade que vai continuar se refletindo ao longo do tempo que é a nossa desigualdade ter gerado uma profunda segregação social, que está correlacionada com a racial também, e que essa segregação afeta as escolhas, gerando escolhas muito desiguais, e essas escolhas desiguais retroalimentam a desigualdade ao longo do tempo. Então, por exemplo, essa segregação gera modelos sociais muito distintos. Se eu estou na periferia, por exemplo, com os modelos sociais que estão lá no meu entorno - minha mãe é empregada doméstica, meu pai é pedreiro -, muitas vezes, eu nem vou aspirar ao ensino superior, porque isso está muito longe da minha realidade, não vou nem aspirar a uma educação de maior qualidade, porque isso está muito fora da minha realidade, e, então, eu começo a replicar o que meu pai e minha mãe fizeram: começo a ter filhos relativamente cedo, saio da educação... Isso retroalimenta a desigualdade ao longo do tempo, enquanto que, nas famílias mais favorecidas, por exemplo, fazer o ensino superior basicamente é o default, é uma escolha padrão. Então, você tem esse outro mecanismo em relação à retroalimentação da desigualdade que aqui no Brasil a gente pouco discute. Na questão racial e de gênero, muitas vezes, a gente dá peso só para a discriminação. Esse é outro processo que também afeta a persistência das desigualdades ao longo do tempo e afeta o IDH também.
É isso, pessoal. Fiz uma apresentação meio correndo aqui, porque eu superestimei o tempo, mas é isso.
Se você tiver alguma pergunta...
E este é o livro que a gente lançou no final do ano passado.
O SR. PRESIDENTE (Zequinha Marinho. Bloco Parlamentar Independência/PODEMOS - PA) - Muito obrigado, Dr. Tulio Ramos, Professor do Insper, instituto de pesquisa.
Agora, vamos pegar aqui o Tiago, que está presencialmente aqui na reunião, e trazê-lo para a sua exposição neste momento. Ele é Coordenador-Geral de Disseminação e Integração de Dados e Informações do Ministério da Saúde - é o homem que sabe dos números e dos percentuais.
Muito obrigado, Tiago, pela sua presença. Com a palavra, para a sua exposição.
O SR. TIAGO BAHIA FONTANA (Para expor.) - Obrigado, Senador.
Bom dia às pessoas presentes e às pessoas que estão participando também remotamente.
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Primeiro, eu queria trazer uma saudação do Ministério da Saúde à Casa, dizendo que o nosso trabalho tem muita afinidade com o assunto e que, de alguma maneira, o setor saúde colabora para orientar o desenho de políticas públicas. A área da saúde se articula fortemente com políticas sociais, mas também todos sabem que são fortemente impactadas pelas políticas econômicas.
O Prof. Michael trouxe contribuições importantes para mostrar que existe um segmento importante que deve ser enfocado quando a gente fala de políticas públicas, que é o mais diretamente afetado por tudo aquilo que a gente faz no setor público. Não é à toa que as desigualdades persistem em alguns segmentos da população e em algumas regiões do Brasil. A gente tem questões históricas que fazem com que a gente tenha o desenho que nós temos hoje e a gente tem que tentar entender a realidade, de preferência a partir de critérios objetivos.
Imagino que vocês esperem que eu vá trazer vários números para falar disso, mas eu fiz uma opção de conversar, de maneira mais abrangente, sobre como o setor saúde contribui para a melhoria das condições de vida.
Vocês sabem que o setor saúde, do modo como ele está configurado hoje... O nosso patrimônio do Sistema Único de Saúde vem de um processo histórico de longa data. São décadas de pleito social para a gente ter um sistema de saúde que possa atender toda a população. Pela literatura da saúde coletiva, o que a gente vê é que houve um avanço parcial do projeto original do SUS, mas a gente percebe que ele se consolidou. O grande desafio é a gente tentar conciliar os interesses públicos com os interesses privados, e para isso a gente tem que tentar fazer com que as políticas públicas de saúde sejam fortes. Desde 2023, especialmente - porque a gente pode falar do momento mais recente -, o Ministério da Saúde vem restaurando a força de políticas públicas consagradas.
O primeiro grande assunto do Ministério da Saúde em 2023 foi o Programa Nacional de Imunizações, que estava sendo avaliado como frágil em relação ao que já havia sido por décadas, e a gente precisava trabalhar para fazer com que ele fosse forte novamente. As coberturas vacinais foram avaliadas e foram trabalhadas para fazer com que a gente tivesse, já no final de 2023, um redirecionamento da tendência das coberturas. Então, ao final de 2023, a nossa Ministra apresentou uma tendência de crescimento das coberturas vacinais para as principais vacinas, e a maioria das vacinas voltou a ter um número de cobertura mais satisfatório. A gente entregou - aí é mais na área em que eu trabalho, que é o Departamento de Monitoramento, Avaliação e Disseminação de Informações Estratégicas em Saúde (Demas) - um trabalho que nunca havia sido feito no Ministério da Saúde, em parceria com o Programa Nacional de Imunizações: o de desenvolver seis modelos de visualizações sobre dados de vacina do calendário nacional. Então, a gente investiu... Conjuntamente, foram quatro secretarias trabalhando, porque o cenário de dados do Ministério da Saúde é complexo. A gente se juntou, Senador, e começou a trabalhar para fazer com que a população tivesse acesso à realidade da vacina.
Por que eu estou falando desse assunto? Porque, para a gente fazer o cálculo do IDH, uma das coisas mais importantes é a expectativa de vida ao nascer, e, durante os mais de 30 anos do Programa Nacional de Imunizações, o que a gente viu foi que a implementação do programa, de alguma maneira, impactou para fazer com que a mortalidade infantil fosse combatida. Então, uma das coisas mais importantes é a gente agir oportunamente, tendo um calendário seguro, fazendo com que as unidades de saúde acompanhem as crianças que nascem no território. Para quem não sabe, toda unidade de saúde acompanha as crianças que nascem, nas suas primeiras semanas, e a maioria do Brasil tem apenas unidades básicas de saúde por perto.
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Então, esse trabalho da saúde da família também está sendo fortalecido.
Recentemente, a Secretaria de Atenção Primária lançou uma nova versão do programa, que fala sobre o fortalecimento das unidades de saúde e das equipes de saúde. Então, a gente está num processo de implementação disso e, de maneira integrada, a gente tem dois outros programas que influenciam também na qualidade de serviço de saúde. A gente tem um novo programa de atenção especializada em saúde que tem um foco em resultados de saúde em vez de procedimentos. Então, a gente de alguma maneira está trabalhando para reorientar a lógica, pensando muito mais no que o cidadão vai ter, no que a cidadã vai ter de serviço de saúde do que no procedimento em si. Então, mais importa a condição de saúde do que puramente a oferta. E uma outra coisa mais nova, que, em 2023, foi um marco no Ministério da Saúde, foi a criação da Secretaria de Informação e Saúde Digital (Seidigi), que é liderada pela Dra. Ana Estela Haddad e que tem muito contribuído para fazer com que a transformação digital seja um bom determinante da saúde.
A gente sabe que os debates daqui da Casa, do Congresso Nacional têm sido muito úteis para mostrar à população a importância da digitalização, principalmente da digitalização de serviços públicos. E, na área da saúde, não tem sido diferente, a gente tem investido para fazer com que o aplicativo Meu SUS Digital ofereça cada vez mais informações do próprio cidadão, e isso é possível por meio de um investimento que vem sendo feito pelo Ministério da Saúde, que, às vezes, não é muito visível, pois é uma estrutura de interoperabilidade de dados que faz com que todos os dados de atendimento possam ser registrados num padrão de informação. A gente tem o que a gente conhece como a longitudinalidade do cuidado, que é entender como a pessoa vem sendo atendida no decorrer do tempo e quais são as questões de saúde que ela traz.
Para entender como as pessoas podem ser beneficiadas, a gente precisa entender o perfil de cada uma delas. Então, já tem um tempo que o Ministério da Saúde se depara com esse desafio, e a existência da Seidigi, essa secretaria nova, tem feito com que o aproveitamento dos dados, a organização dos dados e o trabalho de análise de dados sejam aprimorados no decorrer do tempo. A gente tem feito cooperações inclusive com os entes estaduais e municipais para criar opções em relação a isso. Então, quanto mais consciência sobre os dados a gente tem mais a gente consegue planejar as políticas públicas, e tanto na Seidigi como nas outras secretarias existe um diálogo com outros setores, como, por exemplo, na relação que há entre a Secretaria de Atenção Primária, que trabalha política de atenção integrada à saúde da criança, e o Ministério do Desenvolvimento Social, para a gente fazer com que as políticas que apontam para a saúde e as condições de vida das crianças, principalmente, sejam priorizadas.
Então, na área da saúde, uma das grandes preocupações que há é em relação ao acompanhamento longitudinal das crianças até um ano de idade, depois até dois anos de idade e, com muita importância, até cinco anos de idade. O risco de que uma criança adoeça e eventualmente seja acometida pelo óbito até cinco anos é muito maior do que de cinco anos para frente, de qualquer pessoa. E aí a gente tem que, de alguma maneira, ser apoiado para fazer com que o entendimento sobre a política pública fique mais organizado no decorrer do tempo e que também os esforços sejam conjugados.
Desde que o Ministério da Saúde começou a investir no aprimoramento do monitoramento e na avaliação de políticas, a gente vem conversando muito mais sobre a importância de sua integração. Então, o novo desenho das políticas que foram lançadas faz com que a gente entenda que uma outra maneira de entender a implementação é necessária, fazendo com que, inclusive, os ministérios conversem sobre a implementação e julguem os resultados conjuntamente. Então, quando a gente vai fazer um enfoque, por exemplo, em desigualdades raciais e desigualdades de gênero, a gente vê que tem certas políticas que, quando interagem entre os ministérios, produzem um efeito diferente no decorrer do tempo.
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Um exemplo importante é sobre a interseção entre o programa Bolsa Família e o programa Saúde da Família, na qual há estudos que mostram que uma implementação acertada entre os dois programas reduz a mortalidade infantil no decorrer do tempo. Vocês devem ter conhecimento sobre esse estudo. E esse foi um dos estudos que a gente conseguiu fazer para mostrar que políticas sociais fazem, sim, diferença em relação à qualidade de vida e que a gente pode, sim, pensar conjuntamente. Superando qualquer tipo de desavença entre as perspectivas, sejam políticas ou técnicas, a gente pode conseguir pensar em como o Brasil melhora.
Mais recentemente, nossa discussão vem, por exemplo, para fortalecer as políticas de assistência, fazendo com que haja mais acesso. E uma coisa importante nos últimos anos da saúde, além de acesso, é qualidade. Resultados de saúde são tão importantes quanto o acesso. As pessoas merecem, por conta dos impostos que pagam, ter retorno sobre isso. Então, a gente acredita muito nisso. O Ministério da Saúde e os próprios servidores trabalham com muita dedicação...
(Soa a campainha.)
O SR. TIAGO BAHIA FONTANA - O tempo acabou?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. TIAGO BAHIA FONTANA - ... pensando que tudo o que a gente faz repercute para que as pessoas adoeçam menos e morram menos.
Tem um conceito no campo da saúde, quando a gente fala sobre desigualdades evitáveis, ou óbitos evitáveis, ou adoecimentos evitáveis, tudo aquilo que a gente sabe como ocorre, por exemplo, como é que uma pessoa adoece de rotavírus, ou como é que uma pessoa adoece de influenza, ou como é que uma pessoa adoece de covid... Se a gente sabe que existem doenças que são imunopreveníveis, ou seja, que a gente pode prevenir a doença ou o agravamento dela por vacina, então a nossa tendência é vacinar, correto? Então, para tudo aquilo que a gente sabe qual é a maneira de proteger e de cuidar, a gente investe para poder proteger.
Então, o nosso esforço do momento é fazer com que as políticas tenham coerência entre si, para fazer com que as camadas mais vulneráveis da população sejam protegidas e que a gente possa ver o resultado disso nos índices que mostram a qualidade de vida e saúde da população.
Eu queria, com um tempo, poder responder às pessoas de casa.
"Na visão dos convidados o cooperativismo/cooperativas poderia ser um instrumento para alavancar o IDH [...]?" Eu achei muito interessante essa pergunta, porque o cooperativismo fala sobre um senso de comunidade. Onde há senso de comunidade há uma observação conjunta sobre aquilo que melhora as condições. E, de modo geral, a gente vê que as pessoas que se juntam pensam conjuntamente sobre alimentação, pensam conjuntamente sobre educação e pensam conjuntamente sobre saúde. Então, sim, eu acho que o cooperativismo pode ser um excelente instrumento, principalmente para locais onde a economia não é tão fortalecida na perspectiva industrial, esse investimento pode ser, sim, um dispositivo organizador da sociedade.
"Como crescimento econômico pode influenciar diretamente o IDH? [...]" A gente sabe que, em todos os países, recursos são finitos. Então, haver mais recursos econômicos significa haver mais disponibilidade de investimento em políticas sociais. Existe sempre uma tensão entre políticas econômicas e sociais. No entanto, desde o primeiro Governo Lula, no segundo Governo Lula e até no Governo Dilma, a gente viu que a disponibilidade econômica foi muito útil para o investimento no desenvolvimento social. A gente passou por um momento muito favorável. A gente percebeu que isso impactou muito positivamente no desenvolvimento social e, consequentemente, influenciou na condição de vida da população.
Enfim, tem outras aqui, mas a gente pode ir dialogando, com o decorrer do tempo, sobre as perguntas.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Zequinha Marinho. Bloco Parlamentar Independência/PODEMOS - PA) - Muito obrigado, Dr. Tiago Bahia.
Os números são importantes, são considerações que terminam redundando nas informações que a gente precisa aqui.
Vamos chamar agora a nossa terceira apresentação, com a Sra. Camila Ferraz Peixoto, Coordenadora-Geral de Estudos Econômicos e Tributário da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda.
Dra. Camila, por favor, com a palavra.
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A SRA. CAMILA FERRAZ PEIXOTO (Para expor. Por videoconferência.) - Olá, bom dia a todos e todas. Sou Camila, sou Coordenadora-Geral da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda, a SPE.
Gostaria de agradecer o convite para participar dessa audiência e dizer que é um prazer estar aqui contribuindo no debate com vocês.
Eu vou começar...
Vocês compartilham a minha apresentação, por favor? (Pausa.)
Foi.
Eu vou começar trazendo aqui para discussão as principais medidas econômicas.
Está parecendo certo a apresentação?
O SR. PRESIDENTE (Zequinha Marinho. Bloco Parlamentar Independência/PODEMOS - PA) - Sim.
A SRA. CAMILA FERRAZ PEIXOTO (Por videoconferência.) - Eu vou trazer aqui para discussão as principais medidas econômicas que foram implementadas ou retomadas a partir de 2023. Então, eu acho que algumas das questões enviadas pela audiência já vão ser respondidas aqui nessa apresentação, mas a gente pode continuar com o debate depois dela.
Enfim, essas medidas visam promover o crescimento econômico através do aumento das rendas das famílias, principalmente daquelas famílias de maior vulnerabilidade social, e reduzir a desigualdade de renda no país, quer dizer, as desigualdades de forma geral no país: as desigualdades de renda, obviamente, mas também as regionais e raciais. E, aí, eu apresento aqui também brevemente algumas políticas públicas que foram implementadas ou retomadas nas áreas de saúde e educação.
Bom, eu vou começar apresentando 2023, que foi um ano que apresentou resultados...
Não, pode voltar, por favor. São os resultados. Isso.
O ano de 2023 foi um ano que apresentou resultados bastante positivos. A gente teve crescimento econômico de 2,9%, que ficou bastante acima daquele crescimento projetado pelos agentes do mercado, que participaram da pesquisa Focus e projetavam um crescimento no início do ano de, no máximo, 1%.
Foi observado também um processo desinflacionário em relação a 2022, que permitiu o início do processo de corte da taxa básica de juros pelo Banco Central. Esse gráfico aqui da direita é bastante interessante. Ele foi apresentado no nosso último Boletim MacroFiscal da SPE. A gente observa que esse processo desinflacionário é ainda mais acentuado na população de mais baixa renda. Inclusive aqui, nessa população de mais baixa renda, a inflação já se aproxima do centro da meta já agora em março. E isso acontece porque foi observada uma grande redução da inflação de alimentos, que corresponde à grande parte da cesta de consumo das famílias mais pobres.
E, consequentemente, outro resultado a ser bastante comemorado é a saída de mais de 20 milhões de brasileiros do Mapa da Fome. Houve uma redução da taxa de desemprego, houve aumento da renda e houve a redução da desigualdade. Houve não só aumento da renda do trabalho, mas também da renda de benefícios sociais. E, aí, é essa discussão que eu vou trazer aqui mais aprofundada nessa apresentação.
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Então, o que a gente acredita é que esses resultados positivos já observados na economia brasileira vão ter reflexos positivos no IDH divulgado dos próximos anos. Então, provavelmente, o Brasil, que agora perdeu posições no ranking internacional, vai poder voltar a subir de novo e recuperar essas posições nos anos a seguir.
Pode passar, por favor.
Falando um pouco de números, para contextualizar a dimensão e a importância da PEC da transição, eu apresento aqui uma série histórica de gastos sociais do Governo central como proporção do PIB. A série começa em 2016, vai até 2023, e a gente vê que gastos com benefícios previdenciários, Bolsa Família, despesas de saúde e educação, assistência social, BPC e o auxílio emergencial alcançaram, obviamente, o auge em 2020, sobretudo por causa do peso do auxílio emergencial nas despesas daquele ano, que a gente vê aqui em cinza, na barra de 2020.
Mas, excluindo 2020 da série, 2023 foi o ano em que essas despesas alcançaram o maior valor como proporção do PIB. Então, esse aumento só foi possível graças à PEC da transição, que permitiu que o Orçamento de 2023 passasse a acomodar gastos sociais que não estavam previstos no Orçamento elaborado pelo Governo anterior, que não previu, por exemplo, o aumento do valor do benefício do Auxílio Brasil, apesar de ter sido feita essa promessa do aumento do auxílio durante a campanha eleitoral.
Além disso, com a PEC da transição, foi possível recompor o espaço fiscal das despesas discricionárias, que estava sendo corroído com o limite imposto pela regra dos gastos. Então, programas sociais importantes, como o Mais Médicos e a Farmácia Popular puderam ter o seu orçamento recomposto a partir de 2023.
Também foi possível retomar a regra anterior dos pisos constitucionais de saúde e educação, que voltaram a apresentar crescimento real e crescer pela receita. Então, os gastos de saúde crescem a 15% da receita corrente líquida (RCL) e os gastos de educação crescem a 18% da receita líquida de impostos (RLI).
Foi possível também acomodar a volta da política de valorização do salário mínimo, que impacta diretamente no valor das transferências sociais - eu vou discutir isso mais detalhadamente à frente. Então, comparando 2023 com 2022, a gente vê que os benefícios previdenciários do RGPS e do BPC aumentaram marginalmente - 0,1% do PIB -, graças ao novo salário mínimo.
Já os gastos com o Bolsa Família ampliaram bastante de magnitude, passando de 0,9% do PIB em 2022 para 1,6% em 2023. E os gastos de saúde e educação também tiveram crescimento nessa época - nesse ano, desculpa, em 2023 - graças aos novos pisos constitucionais.
Pode passar, por favor.
Aqui eu apresento a taxa de crescimento real dessas transferências sociais. A gente vê que a média desses gastos, que é aqui apresentada nessa linha tracejada em vermelho - de 2017 a 2022 -, foi baixa, foi de cerca de 3,5%, mesmo considerando o aumento expressivo dos gastos em 2020, no auge da pandemia, quando houve crescimento real de 31% dos gastos.
Em 2021, é observado um forte decrescimento também, em termos reais, de 17,5%, devido a esse efeito base muito elevado em 2020. Já em 2022, os gastos apresentaram crescimento modesto, abaixo da média histórica, e, em 2023, a gente voltou a apresentar um forte crescimento real de 15,6%, e aí a gente vê mais uma vez a magnitude da expansão do novo Bolsa Família.
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A taxa de crescimento real do programa foi de 80,4%, devido não só ao aumento do valor médio do benefício pago às famílias, mas também às medidas de acerto de foco do Cadastro Único.
O que foi isso? Ano passado, o Ministério do Desenvolvimento Social coordenou um trabalho muito bem-sucedido de revisão dos benefícios pagos indevidamente, sobretudo às famílias unipessoais, nas quais estavam as maiores partes de suspeitas de fraude. Além disso, o MDS coordenou uma busca ativa a beneficiários em situação de grande vulnerabilidade social, mas que não estavam inscritos no CadÚnico.
Então, o ministério foi bastante exitoso nesse trabalho, porque ele conseguiu ampliar ainda mais a progressividade do gasto do Bolsa.
Pode passar, por favor.
Em 2004, então - desculpa -, em 2024, os dados da Lei Orçamentária preveem que os gastos com BPC, saúde e educação continuarão crescendo a taxas de crescimento real elevadas; só o Bolsa que apresenta uma taxa de crescimento real negativa de 8,2%, devido a essa extensa revisão do CadÚnico, sobre o qual eu comentei anteriormente.
Então, na verdade, neste gasto, aumentou-se o valor do seu benefício, ficou mais focalizado, e foram excluídas da base do programa pessoas que não deveriam estar recebendo o benefício.
Desculpe, eu me estendi um pouco na apresentação. Vou precisar de um pouquinho mais de tempo.
Pode passar, por favor.
Eu também gostaria de trazer aqui para vocês os principais resultados de um estudo que foi realizado pela Secretaria de Política Econômica, coordenado pela minha Subsecretária de Política Fiscal, Débora Freire, que não pôde participar aqui hoje. Muito brevemente, esse estudo foi realizado recentemente, mas ainda não foi publicado - então, eu até aproveito aqui a oportunidade para convidar todos aqui presentes a participarem desse lançamento no momento mais oportuno.
Enfim, o objetivo do estudo foi realizar exercícios de simulação para estimar os impactos econômicos, em 2023, da expansão das transferências do Bolsa Família e dos demais benefícios sociais.
A expansão do Bolsa já foi discutida aqui, mas eu gostaria de chamar a atenção para esse número de famílias beneficiadas, que passou de 16,9%, em 2022, para 19%, em 2023.
Em relação aos demais benefícios sociais, são considerados aqueles que têm como salário base o salário mínimo e que tiveram, então, seus repasses ampliados em 2023 pela nova política de valorização do salário mínimo. Então, são considerados os benefícios previdenciários do RGPS, em que cerca de 60% dos beneficiários recebem até um salário mínimo, o BPC e, aqui nessa simulação, entra também o pagamento de benefícios do mercado de trabalho, como abono e seguro.
Pode passar, por favor.
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Sobre os resultados, eu não vou entrar em detalhes técnicos do modelo, mas, muito brevemente, as simulações foram feitas através de um modelo de equilíbrio geral computável, e o multiplicador encontrado foi menor que a unidade. Então é uma simulação até conservadora porque há diversos estudos que encontram multiplicadores acima da unidade. E o que quer dizer o multiplicador acima da unidade? Quer dizer que a cada R$1 gasto em benefício social, um valor acima da unidade, maior do que R$1, é revertido em crescimento econômico.
Em relação aos achados, a gente vê que o impacto, a curto prazo, da expansão dos benefícios analisados - que totalizaram R$172 bilhões no crescimento do PIB de 2023 -, foi estimado em 0,53%, o que representa quase um quinto do resultado observado no ano, ou seja, sem a expansão desses benefícios em 2023, o PIB deste ano teria crescido 2,37% em vez de 2,9%. E a gente vê que o Bolsa Família foi o principal responsável por essa expansão observada no PIB.
É possível também observar que há um aumento da participação relativa das famílias de mais baixa renda na renda total, o que evidencia que essas transferências foram progressivas e contribuíram para reduzir a desigualdade. E observa-se que o consumo, sobretudo das famílias de mais baixa renda, é o principal componente da economia estimulada. São observados também efeitos positivos nas importações e na taxa de investimento, mas, como esperado, o consumo é o componente de maior peso nesse impacto estimado do PIB.
Por fim, uma conclusão bastante... Vou falar dos setores. Dentre os setores, tem aqueles que apresentam efeitos mais relevantes, e destacam-se o de bens de consumo industrializados (como vestuário, higiene e limpeza, têxteis, farmacêuticos e móveis) e o setor de serviços (como alimentação, intermediação financeira, eletricidade, transportes e comunicações).
E, por fim, uma conclusão bastante importante é que esses efeitos positivos observados no consumo e na renda das famílias de mais baixa renda também geram efeitos positivos - ainda que, obviamente, em menor magnitude - na renda das demais famílias não beneficiadas pelos programas e nos demais setores da economia, também.
Pode passar, por favor.
Eu já estou finalizando, mas eu queria chamar atenção para algumas outras políticas econômicas implementadas, além da ampliação do Bolsa e da retomada da política de valorização do salário mínimo. A gente observa que essas políticas, obviamente, foram muito importantes na ampliação desse colchão de seguridade social, mas os resultados positivos observados em 2023 só foram possíveis graças a uma conjunção de diversas outras medidas.
Então, em primeiro lugar, eu chamo atenção para um cenário de inflação, em 2023, muito melhor do que o que foi registrado em 2022, a despeito do crescimento real desses gastos, como já foi discutido. E a inflação, em processo de convergência para a meta, possibilitou o Banco Central a iniciar o ciclo de corte na taxa básica de juros.
Tem ainda o novo regime fiscal sustentável, mais conhecido como arcabouço fiscal. Ele tem um papel bastante importante no processo de melhora gradativa das expectativas dos agentes em relação às variáveis fiscais. É importante fazer esta ressalva de que o arcabouço social busca conjugar as responsabilidades fiscal e social; então, essa ampliação de gastos só foi possível porque foi feito um trabalho hercúleo aqui, com o apoio do Congresso Nacional, de recomposição da base tributária, através de correção de injustiças tributárias que tornavam o sistema tributário ainda mais regressivo.
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Então, no âmbito do arcabouço fiscal, é previsto também um processo de revisão de gastos indevidos e de políticas ineficientes, como foi esse processo que aconteceu de revisão do Cadastro Único. E aí essa revisão de gastos possibilita abrir espaço fiscal para políticas públicas mais bem avaliadas e também permite buscar o equilíbrio das contas públicas e da sustentabilidade fiscal.
No médio prazo, a gente tem a aprovação da reforma tributária, que, obviamente, também é um fator bastante relevante. A reforma do consumo buscou racionalizar o nosso sistema tributário, torná-lo mais eficiente, enquanto a reforma da renda vai buscar tornar o sistema mais progressivo. Dentro da reforma, houve a proposição de uma nova cesta básica nacional, que buscou priorizar o consumo de alimentos saudáveis, mas que, sobretudo, levou em consideração a cesta de consumo de alimentos das famílias mais pobres, de forma a tornar esse benefício tributário também o mais progressivo possível.
É sabido que a cesta básica acaba funcionando também como um subsídio ao consumo dos mais ricos. Então, para mitigar essa falha, foi introduzido o cashback, que institui a devolução dos tributos do consumo apenas às famílias do CadÚnico. Ele garante que esse benefício tributário chegue efetivamente às famílias que mais precisam. O cashback também vai servir como um mecanismo de incentivo à formalização da economia.
Muito brevemente, eu vou citar aqui também políticas de crédito que foram desenvolvidas, que aliviam o grau elevado de endividamento da população brasileira, como o Desenrola, que teve efeitos expressivos na desnegativação dos consumidores; o Programa Acredita, que é um programa de microcrédito produtivo orientado; e a limitação dos juros de cartão de crédito. Foram feitas também a correção da tabela do Imposto de Renda, que estava congelada há anos, e a regularização do pagamento de precatórios no ano passado, sendo que a maior parte do pagamento desses benefícios foi previdenciário.
Pode passar, por favor.
Na área de saúde - já foi comentado aqui -, com a reintrodução dos novos pisos constitucionais de saúde e de educação, houve a recomposição orçamentária de programas importantes, como o Mais Médicos e o Farmácia Popular; e, na área da educação, houve a criação de programas que visam reduzir a evasão escolar, aumentar a qualidade da educação e, futuramente, aumentar a produtividade da economia, como a educação em tempo integral, o programa Pé-de-Meia e o Programa Juros por Educação.
O SR. PRESIDENTE (Zequinha Marinho. Bloco Parlamentar Independência/PODEMOS - PA) - Muito bem.
A SRA. CAMILA FERRAZ PEIXOTO - Então, esses programas na área de educação têm - estou terminando já, desculpe-me - também efeitos indiretos, como a redução da criminalidade entre jovens e a redução de gravidez na adolescência.
Pode passar? Eu acho que acabou já.
Obrigada e me desculpe por ter estourado o meu tempo.
O SR. PRESIDENTE (Zequinha Marinho. Bloco Parlamentar Independência/PODEMOS - PA) - Sem problema, Camila. Muito obrigado pela sua exposição.
Eu gostaria de, com muita alegria, fazer a apresentação, mencionando a presença, da D. Maria Augusta. D. Maria Augusta é uma senhora importante da sociedade altamirense, Presidente do Sindicato Rural dos Produtores. É uma satisfação revê-la, é uma satisfação estar aqui com a senhora. Quero apresentar, também, o Dr. Bruno, que é Diretor de Negócios lá do sindicato. Eles vieram a Brasília participar hoje da reunião da FPA, e daqui a pouco mais estaremos nos dirigindo para lá.
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Bem-vinda, D. Maria Augusta!
Eu gostaria de fazer algumas considerações sobre a questão do IDH. Eu acho que é um negócio em que pouca gente se liga, mas que é extremamente importante. Esses números, esses índices servem exatamente para o Governo nortear suas políticas públicas, o que é fundamental para a sociedade. Mas a gente, lamentavelmente, chega a uma conclusão de que o conhecimento sobre o tema é zero, e até mesmo o da imprensa, que seria muito bem-informada, ou deve ser muito bem-informada.
Esta audiência pública nós pedimos porque o Brasil caiu duas posições no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano, o nosso conhecido IDH, que foi divulgado agora, em março deste ano, pela ONU. O país passou a ocupar a posição número 89 da lista de 193 países.
Entre os entraves para o desempenho brasileiro, segundo a ONU, está a dificuldade em dar continuidade às políticas públicas. Quer dizer, as políticas são mais de governos do que de Estado. Então, isso termina parando no meio da estrada, as coisas não acontecem, e aí entra outro governo, mas esse outro governo, naturalmente, não tem o mesmo interesse ou a mesma visão de mundo. Quer dizer, nós somos um país que, em que pese ser grande, importante e ter um PIB grande, ainda está engatinhando, porque aquilo que a gente precisa de forma perene, nós temos que tornar também perene nas suas atividades. Então, políticas de governo importantes não podem ser só de governo, têm que ser de Estado.
Um apanhado aqui da América Latina e do Caribe.
O Brasil fica na 17ª posição, atrás de países como México, Equador, nosso vizinho aqui na América do Sul, Cuba, com a economia arruinada, e estamos atrás também do Peru, nosso outro vizinho aqui. O topo da lista - prestem atenção! - desta região, América Latina e Caribe, é ocupado por alguns países nossos conhecidos aqui, vizinhos também: Chile, Argentina... O Chile, no ranking global, está no 44º lugar; a Argentina, no 48º, no ranking mundial. São Cristóvão e Névis está em 50º, um paisinho pequeno; o Uruguai, nosso vizinho ali no Rio Grande do Sul, também é o 52º; e Antígua e Barbuda está na 54ª posição.
E agora damos uma pincelada aqui sobre os piores. Começa com Haiti, Honduras, Guatemala, Nicarágua e El Salvador, que está passando por uma grande transformação neste momento.
O ranking global é liderado pela Suíça, Noruega, Islândia, Hong Kong, Dinamarca e Suécia. A melhor qualidade de vida do mundo está nesses países aqui. E os piores do mundo: Somália e Sudão do Sul.
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O IDH - vamos só fazer uma reflexão sobre isso - o que é? É uma medida resumida do progresso, a longo prazo, em três dimensões básicas no desenvolvimento humano: primeiro, educação; segundo, saúde; e, terceiro, renda. Então, o IDH é formado exatamente por esses três pontos em que a gente precisa prestar muita atenção. Não se pode fazer gestão pública sem estar de olho nisso exatamente.
Eu fico um pouco triste - depois a gente vai conversar sobre isso - porque o Ministério da Educação não veio e mandou um ofício dizendo que esse tema não faz parte das suas atividades, do seu escopo de atuação. Eu tenho certeza de que não foi o Ministro, em que pese o ofício dizer que foi de ordem do Ministro, mas é preciso a gente considerar isso. A educação influencia, é o ponto número um, e depois sai influenciando os outros todos aqui para baixo, que são a longevidade e a renda.
Então, é por isso que eu chamo a atenção dos senhores. Não é brincadeira, vamos trabalhar e tal. Depois, a gente pega países bem menores, bem pequenos, bem simples, com um PIB, com uma economia que não dá nem para comparar com a brasileira, mas a qualidade de vida nesses países é melhor do que a qualidade de vida do brasileiro. Correto?
O objetivo da criação do IDH foi oferecer um contraponto ao um outro indicador muito utilizado, o PIB per capita, que considera a dimensão econômica do desenvolvimento. O indicador educação refere-se à quantidade média de anos de estudo de uma população. Na variável saúde, avalia-se basicamente a taxa de expectativa de vida dos cidadãos de cada país participante, quer dizer, desses 193 países. No quesito renda, mede-se o valor médio do rendimento dos cidadãos com base no PIB, e por isso é importante. "Ah, porque o nosso PIB foi 'tanto'." Como é que a gente cresce no PIB e perde pontos no IDH? Quem faz gestão não pode dormir de noite com isso ou, então, não sabe o que está fazendo. Não é? Então, a gente precisa tomar cuidado com esse negócio. "Ah estou crescendo, estou crescendo." Aí você vai na avaliação da qualidade de vida das pessoas, e isso está andando de ré, está andando para trás. Isso é complicado. Então, esse quesito renda e o quesito PIB per capita precisam estar o tempo todo. Estou melhorando o meu PIB? Eu também preciso melhorar o meu IDH, porque senão eu estou desconectado da realidade e a minha população está passando por dificuldades.
A utilização de um indicador que envolvesse outras variáveis que não somente a questão econômica ocorreu, pela primeira vez, em 1990 - essa questão do IDH - pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). Esse indicador foi criado pelo paquistanês Mahbub - e aí tem um nome muito esquisito aqui, indiano.
Atualmente, o Brasil está na nona posição do ranking das maiores economias do mundo. Nós não somos mais a oitava economia, nós somos a nona economia. Em 2024, com PIB de US$2,17 trilhões, ficando na frente de grandes países como Canadá, Rússia e México.
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E aí, eu queria fazer aqui uma menção. Os Estados Unidos têm o maior PIB do mundo, com US$26,94 trilhões; China, com US$17,7 trilhões; Alemanha, com US$4,42 trilhões; Japão, com US$4,23 trilhões; Índia, com US$3,73 trilhões; Reino Unido, com US$3,33 trilhões; França, com US$3,04 trilhões; Itália, com US$2,18 trilhões; em nono lugar, Brasil, com US$2,17 trilhões - e aí vamos até o 15º colocado -; Canadá, com US$2,11 trilhões; Rússia, com US$1,86 trilhão; México, com US$1,81 trilhão; Coreia do Sul, com US$1,70 trilhão; Austrália, com US$1,68 trilhão; Espanha, com US$1,58 trilhão.
Agora peguem o ranking do IDH e vocês vão ver como a coisa não está bonita para o nosso lado. Os outros conseguem ter uma certa proximidade entre PIB geral e per capita com a questão da qualidade de vida. Nós somos a nona economia no mundo, mas somos os de número 89, ou seja, estamos em 89º lugar nesse IDH. Que coisa maluca! Estamos numa ponta aqui e na outra ponta aqui para baixo. Nós temos que fazer uma reflexão sobre isso e diagnosticar onde estão nossos problemas, nossos gargalos, nossos entraves, porque, senão, a gente vai continuar... Daqui a um dia, digamos, vamos melhorar a economia, vamos chegar aí entre os oito, entre os sete, entre os seis, e de repente vamos estar chegando ao 90º, ao 100º lugar na qualidade de vida.
Então, melhores IDHs do mundo: Suíça, Noruega, Islândia, Hong Kong, Dinamarca, Suécia, Alemanha, Irlanda, Singapura, Austrália, Chile, Argentina - los hermanos aqui do lado. Argentina -, São Cristóvão e Neves, Uruguai. Uruguai, que nós chamávamos, no tempo da escolinha, a Província Cisplatina. O pessoal da minha idade sabe do que eu estou falando. Estivemos por lá e, depois, recuamos, não é? O Uruguai tem um IDH bem superior ao nosso. Prossigo: Antígua e Barbuda, México, Cuba, e aí Brasil, com 0,760. E, por último aqui, só para não esquecer, a Somália é o pior país do mundo em qualidade de vida.
Fizemos um gráfico aqui interessante sobre essa questão da educação, já que a educação comanda esse processo todo. A OCDE avalia 81 países na educação porque a educação é chave em qualquer processo de desenvolvimento humano. Vamos lá. Pegamos 2018 e 2022 - um pedaço aí que é feito por eles lá.
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Na Leitura, em 2018, nos 81 países avaliados pela OCDE, nós somos o 57º. Em 2022, a gente melhorou um pouquinho, nesse período de 2018 a 2022, fomos para 53º, ganhamos aqui 4 posições entre 2018 e 2022.
Em Ciências, em 2018, nós éramos 64º, melhoramos um pouquinho, ganhamos 3 pontos, fomos para o 61º.
Em Matemática, em 2018, pelo Pisa, nós éramos 70º e melhoramos um pouco, em 2022, fomos para o 65º, ganhamos 5 pontos. Nós estamos muito, mas muito longe dos nossos próprios vizinhos.
Se a gente for pegar o investimento que o Brasil faz na educação em relação ao seu PIB, o Brasil é um dos cinco melhores países, um dos cinco países que mais investe em educação, para vocês terem a noção de que a gente precisa receber dados, fazer a leitura e botar para valer, porque senão a gente jamais vai sair do lugar, vamos é piorar. Então, pega a relação aqui no Brasil de educação, investimento em relação ao PIB.
Nós aprovamos aqui, poucos anos atrás, Tiago, o novo fundo de desenvolvimento da educação, Fundeb, que vai todo ano aumentando um pouco mais, até 2026, se não estou enganado, a fim de que a gente esteja entre os países que mais investem nessa relação PIB e investimento em educação. Então, se a gente pegar o dinheiro que a gente bota na educação e pegar esses índices aqui, colocados pela OCDE, é preciso que a gente entre em campo com a maior rapidez possível, porque senão estamos condenando nossa geração ao atraso perpétuo. Você quer acabar com o país, com o estado, com o município? Dê educação de péssima qualidade aos seus cidadãos, porque eles não terão condições de avançar nunca na vida. Mas eu estou gastando muito dinheiro, mas gastar dinheiro não significa melhoria, eu preciso fazer gestão.
Então, senhoras e senhores, a gente precisa levar em consideração essas informações, que são primordiais, e nós não vamos parar por aqui. Não importa que 99% das pessoas com quem falamos não entendam, mas nós entendemos. E, se nós entendermos, é o suficiente para a gente continuar a luta, continuar a batalha. Vamos conversar daqui para frente com quem precisamos conversar.
Eu gostaria, neste momento, de dar a palavra ao nosso primeiro expositor para as suas considerações finais e também, se for o caso, responder a algumas perguntas feitas pelos nossos internautas, que é o Dr. Michael Tulio Ramos, Professor do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), por favor, para as suas considerações finais e/ou resposta de alguns questionamentos que nos foram feitos pelos internautas.
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O SR. MICHAEL TULIO RAMOS (Para expor. Por videoconferência.) - Obrigado, Senador.
Acho que, assim, do ponto de vista que você colocou, uma coisa que a gente tem que ter em mente: apesar de o país ser o nono em termos de PIB, a gente também é uma das nações mais desiguais do mundo, e isso impacta a forma de fazer política pública e impacta o IDH de várias formas.
Quando a gente olha para a educação, apesar de a gente estar investindo cada vez mais, a gente não pode esquecer que a gente é um país que levou séculos para começar a colocar a educação como uma certa prioridade. Até a Constituição de 1988, por exemplo, a maior parte dos brasileiros não tinha acesso à educação básica. A gente tinha uma taxa de analfabetismo muito alta, a gente ainda tem uma taxa de analfabetismo alta, mas está diminuindo ao longo do tempo. Apesar disso, a gente tem uma taxa de analfabetismo funcional extremamente alta também.
Então, para lidar com isso, literalmente, a gente realmente tem que colocar mais recursos, mas para lidar com a educação, mais uma vez, a gente tem que pensar a educação de uma forma integrada na sociedade. A gente, às vezes, coloca muito peso para a transformação da educação, pensando educação só dentro dos muros das escolas, e esquece, por exemplo, que o estudante que está ali tem que ter uma perspectiva de retorno futuro, de que aquela educação vai impactar a vida dele. Então, por exemplo, se eu estou na escola, acho que eu vou ser discriminado no mercado de trabalho lá na frente, não vou receber um alto retorno da educação lá na frente, isso vai afetar, por exemplo, a minha dedicação dentro da sala de aula, que foi uma coisa que eu tentei trazer aqui na minha explicação. Então, se a gente não construir uma melhor oportunidade para esses estudantes, lá na frente, acessarem o mercado de trabalho, isso impacta a educação aqui atrás.
Então, o ponto central é que a gente construiu um país extremamente segregado, e essa segregação acaba levando melhores vantagens para determinados grupos da população. Lá no mercado de trabalho, essas vantagens impactam. Não é por acaso, por exemplo, que a gente tem um país com uma dominância muito alta de homens brancos de alta renda. Esses homens brancos de alta renda têm vantagens significativas em várias esferas da sociedade. Então, se a gente não corrigir essas vantagens que esse determinado grupo tem, não adianta ter crescimento econômico porque sempre esse grupo vai absorver a maior parte do crescimento econômico. Então, lidar com a educação também é tirar um pouco dessas vantagens significativas que esse determinado grupo tem perante os demais grupos, e isso passa pela educação, isso passa pelo mercado de trabalho, isso passa por várias esferas da sociedade.
Quando a gente olha o sistema político brasileiro, por exemplo, essa característica está lá. A gente é dominado por homens brancos de alta renda. Passam eleições e eleições, e, por exemplo, apesar da maior participação de negros e mulheres no sistema político, o financiamento das campanhas é, predominantemente, para esse grupo. Apesar de esse grupo, em vários casos, por exemplo, ter boa intenção, a gente não pode esquecer que esse grupo também vai ter viés de classe social, viés de raça e viés de gênero; e querer afetar, por exemplo, esse viés é aumentar a representatividade em todas as esferas da sociedade brasileira.
(Soa a campainha.)
O SR. MICHAEL TULIO RAMOS (Por videoconferência.) - Se eu sou um homem branco de alta renda, eu posso ter boa intenção, por exemplo, com a periferia, eu posso ter boa intenção, por exemplo, em afetar um IDH, mas, se eu não tiver, por exemplo, representatividade à minha volta, se eu não tiver mulheres à minha volta, se eu não tiver negros à minha volta, se não tiver negros à minha volta, eu posso fazer políticas públicas muito equivocadas.
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Além disso, ampliar a representatividade no sistema político também afeta a agenda. Mulheres, negros, indivíduos de origens desfavorecidas podem ter agendas muito diferentes, e isso vai impactar a política pública.
Só para finalizar a minha fala, a gente tem que corrigir essa distorção que se gerou na sociedade brasileira também. A desigualdade social contamina o sistema político, contamina as políticas públicas, e essa contaminação das políticas públicas gera políticas muitas vezes inefetivas, que não afetam esses mecanismos de perpetuação das desigualdades ao longo do tempo, o que permite que determinados grupos sempre estejam em posições de vantagem em relação aos outros que retroalimentam as futuras gerações.
Para desestruturar todo esse mecanismo discriminatório e de desigualdade que perpetua na sociedade brasileira, a gente tem que pensar em ampliar a representatividade em todas as esferas da sociedade.
O SR. PRESIDENTE (Zequinha Marinho. Bloco Parlamentar Independência/PODEMOS - PA) - Muito bem. Muito obrigado, Dr. Tulio.
Eu quero chamar agora a Dra. Camila Ferraz para as suas considerações finais ou para responder a algumas das perguntas dos internautas que nós mencionamos ainda no meio da conversa, da audiência.
Camila.
A SRA. CAMILA FERRAZ PEIXOTO (Para expor. Por videoconferência.) - Gostaria de concordar com as colocações do Prof. Michael e chamar atenção não só para as colocações feitas pelo Senador, mas também para o IDH divulgado, cuja medição foi referente ao ano de 2022.
Então, o que eu tentei trazer aqui? Não só o simples aumento do gasto, não só o simples aumento do PIB, porque o PIB em 2022 também cresceu. A gente teve, sim, uma ligeira melhora no IDH deste ano, mas, no ranking internacional, o Brasil perdeu participação. Então, o que eu tentei trazer nessa apresentação foi não só o crescimento do PIB, não só o crescimento das despesas, mas a composição desse gasto, basicamente focado em políticas sociais.
O Brasil é um país extremamente desigual, a gente tem que enfrentar essa questão. Em 2023, a gente iniciou um novo ciclo de política pública com essa preocupação de incluir o pobre no orçamento: tornar o orçamento menos desigual e menos capturado pelas classes mais dominantes.
Concordo com o Senador no ponto em que ele fala sobre o elevado índice investido em educação. A gente precisa constantemente... o MEC tem exames de qualificação para medir o desenvolvimento do ensino, mas, de fato, a gente precisa constantemente monitorar a qualidade desse gasto. A gente precisa monitorar políticas públicas que sejam eficientes ou que não sejam mais eficientes, e entender onde está esse gargalo, que é não só financeiro, mas também de qualidade.
Então, é basicamente isso.
Se alguém tiver mais alguma pergunta, eu estou à disposição.
O SR. PRESIDENTE (Zequinha Marinho. Bloco Parlamentar Independência/PODEMOS - PA) - Muito bem, Dra. Camila. Obrigado pela sua participação e suas considerações.
Eu chamo agora o Tiago aqui, presencialmente, para também trazer as suas considerações finais.
O SR. TIAGO BAHIA FONTANA (Para expor.) - Primeiro, eu queria, mais uma vez, agradecer pelo convite de estar aqui debatendo esse assunto tão importante, agradecer pelas reflexões do Senador, que provocam a gente a pensar em como, interagindo nas políticas públicas, a gente pode melhorar as condições de vida e saúde da população.
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Eu queria fazer uma deferência à fala do Dr. Tulio em relação às desigualdades e, de alguma maneira, apontar que as desigualdades são muito nocivas à gente. Em palavras muito simples, no Brasil a gente tem poucas pessoas com muita qualidade de vida e muitas pessoas precisando de melhorias na qualidade de vida, e a gente sabe muito bem que as políticas sociais colaboram para equilibrar isso. E a gente tem que pensar que peso vai dar para as políticas sociais para reverter essa condição.
Lembro que saúde também é economia. Acho que o Ministério da Saúde vem mostrando a importância do mercado econômico e industrial da saúde para fazer com que exista uma ligação entre o setor social e o setor econômico. Investimento local é importante para que a gente tenha condições de sobreviver às situações com base na pandemia, quando a gente não tinha produção suficiente de máscaras para se proteger. O Ministério da Saúde lançou recentemente políticas que fortalecem o mercado econômico e industrial da saúde e mostram que a gente pode inclusive formar pessoas para trabalhar nesse complexo econômico industrial.
Mais recentemente a gente teve o lançamento de uma fábrica que vai viabilizar a disponibilidade de cerca de 80% de insulina no Brasil. Isso é algo histórico, pois em 20 anos a gente não tinha isso. E isso vai fazer com que a gente tenha melhores condições, vai fazer com que mais pessoas brasileiras trabalhem nesse mercado para gerar condições de vida e saúde para pessoas que têm doenças crônicas.
São certas coisas que às vezes a gente não tem nem tempo de falar, porque no setor saúde e no setor educação a assistência social trabalha fortemente para criar essas condições no dia a dia. Mas nessas oportunidades a gente consegue dialogar sobre isso.
Eu queria deixar a nossa fala sempre disponível para vocês para quando quiserem conhecer um pouco mais, principalmente sobre nossos esforços para criar transparência ativa nos dados da saúde e fazer com que todas as pessoas interessadas possam acompanhar e participar desse processo junto com a gente.
Minha gratidão.
O SR. PRESIDENTE (Zequinha Marinho. Bloco Parlamentar Independência/PODEMOS - PA) - Muito obrigado, Dr. Tiago, pela sua vinda e pela sua participação aqui com a gente.
Antes de fazer o encerramento, eu recebi há uns quatro meses, há quatro ou cinco meses, aqui no gabinete, o Presidente Nacional das Empresas de Tecnologia aqui no Brasil. Ele me trouxe uma notícia assim surpreendente: que nós temos 400 mil vagas de emprego precisando de gente para trabalhar. Mas eu falei: qual o número mesmo? São 400 mil agora e, em 2025, vamos para 700 mil vagas. Mas aonde estão? Estão nas empresas, no setor da tecnologia. E aí, qual é a conclusão a que eu chego como pedagogo numa situação dessas? É que nós estamos educando e formando um cidadão para um mercado que já não existe mais. Ou a gente vai para dentro da educação e redireciona para as matérias que realmente precisam ser redirecionadas ou a gente vai continuar alienado, com a educação para um lado e a economia para o outro.
Quer dizer: de que está adiantando hoje o investimento na educação básica se o menino, quando sai do ensino médio, não entende nada de tecnologia e não fala nada, nem a sua própria língua? Ele ainda escreve errado, fala errado. Ele tinha que sair pelo menos falando mais um idioma: mais o inglês e, de repente, um pouco de espanhol. Nós estamos aqui no Mercosul. Nós não estamos educando para o mercado e não estamos preparando esse cidadão para coisa nenhuma.
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Então, a situação é, assim, de emergência, muito complicada, e a gente precisa fazer um grande debate sobre isso porque não há país do mundo que vá para frente levando em consideração o que está acontecendo hoje. Os dados estão na mão, é só querer usar para a gente poder redirecionar tudo isso.
Nada mais havendo a tratar, agradeço a presença de todos e declaro encerrada a presente reunião.
Muito obrigado a cada um dos senhores que puderam estar com a gente aqui.
Obrigado mesmo.
(Iniciada às 9 horas e 57 minutos, a reunião é encerrada às 11 horas e 18 minutos.)