26/05/2015 - 16ª - Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação e Informática

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Bom dia. Um bom dia a cada uma e a cada um.
Havendo número regimental, declaro aberta a 16ª Reunião da Comissão de Ciência Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura, que se realiza nesta data, 26 de maio de 2015.
Iniciando os trabalhos da reunião, informo que realizaremos hoje uma audiência pública em atendimento ao Requerimento nº 29, de 2015, da CCT (Comissão de Ciência e Tecnologia), de minha autoria, aprovado pelo Plenário desta Comissão.
Destina-se esta audiência a instruir o Projeto de Lei da Câmara nº 70, de 2014, que tramita em conjunto com os Projetos de Lei do Senado nºs 438, de 2013, e 45, de 2014, que alteram dispositivos dos arts. 14, 15 e 17 da Lei nº 11.794, de 8 de outubro de 2008, para dispor sobre a vedação da utilização de animais em atividades de ensino, pesquisas e testes laboratoriais com substâncias para o desenvolvimento de produtos de uso cosmético em humanos e aumentar os valores de multa nos casos de violação dos seus dispositivos.
A motivação desta audiência é a lei, que é de autoria do Deputado Ricardo Izar Junior, que nos vai dar a honra de participar do debate, mas que ainda não chegou, está chegando; quando ele chegar, tomará assento aqui ao meu lado e falará.
Eu convido, portanto, seguindo a ordem depois dele: o Sr. José Mauro Granjeiro, que é Coordenador do Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação; o Sr. Thales de Astrogildo e Tréz, que é Professor do Departamento de Ciências Humanas da Universidade Federal de Alfenas - pode tomar assento à Mesa, por favor -; a Srª Vânia de Fátima Plaza Nunes, que é Diretora Técnica do Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal; o Sr. Márcio Lorencini, Gerente de Avaliação de Produtos e Assuntos Regulatórios do Grupo Boticário; e, finalmente, o Sr. Joel Majerowicz, Assessor da Diretoria de Gestão da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Informo que contaremos com os serviços de interatividade do Senado para a participação popular dos cidadãos que estão nos assistindo ao vivo pelo portal e-Cidadania no endereço www.senado.leg.br/ecidadania. Ou pela TV Senado ou pelo portal e também pelo Alô Senado no número 0800-612211. O cidadão poderá enviar comentário ou perguntas, que serão repassadas aos nossos convidados.
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Muito feliz com a presença do Deputado Ricardo Izar, porque tudo isso é motivado pelo projeto de lei de sua autoria.
Como eu estava colocando na abertura, Deputado, os comentários e perguntas que vierem sofrerão triagem, conforme definido nos termos de uso do portal, não com base na qualidade do comentário ou no mérito da pergunta, mas, sim, quanto ao cumprimento de regras de respeito e urbanidade, bem como de conexão com a finalidade do debate.
Passaremos, então, às exposições pelos convidados e, ao final, às Sras e Srs. Senadores presentes, na ordem de inscrição.
Durante o curso da audiência, esta Presidência também poderá fazer intervenções, assim como apresentar comentários e questionamentos enviados pelos que nos assistem.
Cada expositor terá um tempo... Quinze minutos? Dez minutos?
O SR. RICARDO IZAR (PSD - SP) - Posso concluir ao final.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Concluir, perfeito. Então, é como estava aqui. Aqui a ordem está: José Mauro Granjeiro... A ordem é a que eu chamei, cada um pode ver aqui.
Eu passo a palavra, inicialmente, ao Sr. José Mauro Granjeiro.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. JOSÉ MAURO GRANJEIRO - Exmo Sr. Senador Cristovam Buarque, Presidente da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática do Senado Federal; Exmos Srs. Legisladores aqui presentes, colegas presentes a esta mesa e todos os presentes, bom dia.
O Concea (Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal), criado em 10 de outubro de 2008 pela Lei nº 11.794, é um órgão integrante da estrutura do Ministério de Ciência e Tecnologia. É instância colegiada multidisciplinar, de caráter normativo, consultivo, deliberativo e recursal, para coordenar os procedimentos de uso científico de animais e tem, dentre suas competências legais, o dever de formular e zelar pelo cumprimento das normas relativas à utilização humanitária de animais, com finalidade de ensino e pesquisa científica; estabelecer e rever, periodicamente, as normas para o uso e cuidado com animais para ensino e pesquisa, em consonância com as convenções internacionais das quais o Brasil seja signatário; monitorar e avaliar a introdução de técnicas alternativas que substituam a utilização de animais em ensino e pesquisa.
As atividades do Concea iniciaram após regulamentação pelo Decreto nº 6.899, de 15 de julho de 2009, que define a composição do Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal, o Concea, estabelecendo as normas para o seu funcionamento e de sua Secretaria Executiva e cria ainda o Cadastro das Instituições de Uso Científico de Animais, o Ciuca.
O Ministério da Ciência e Tecnologia... A partir de 2010, o conselho foi estruturado, tendo titulares e suplentes, representantes dos Ministérios da Ciência Tecnologia e Inovação; da Saúde; do Meio Ambiente; da Educação e Cultura; da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; também do Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); Conselho de Reitores das Universidades do Brasil (Crub); a Academia Brasileira de Ciências (ABC); Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC); Federação das Sociedades de Biologia Experimental (FeSB); Sociedade Brasileira de Ciência em Animais de Laboratório (SBCAL), nova denominação do Colégio Brasileiro de Experimentação Animal; Federação Brasileira da Indústria Farmacêutica, a Febrafarma, nova denominação da Federação Nacional da Indústria Farmacêutica; e ainda, muito importante, de dois representantes e respectivos suplentes das sociedades protetoras de animais legalmente estabelecidas no País.
No exercício da Presidência do Concea, o Ministro de Estado de Ciência, Tecnologia e Inovação é substituído, nos seus impedimentos ou afastamentos, pelo Secretário-Executivo do respectivo Ministério e, nos casos dos impedimentos destes, pelo Coordenador do Concea, posição que atualmente ocupo.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Dez e prorroga-se um pouco, ninguém vai - como eu disse ontem - usar guilhotina para os que passarem do tempo.
Eu quero perguntar ao Deputado, que é o autor do projeto, em que ordem quer falar, o senhor tem a prerrogativa. Quer começar? Quer concluir?
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Desde então, o Concea vem trabalhando na regulamentação da Lei nº 11.794, de 2008, atuando no credenciamento de instituições públicas e privadas envolvidas na produção, manutenção e uso de animais para atividades de ensino e pesquisa científica, na definição da base legal para o licenciamento dessas atividades e na articulação interministerial para o estabelecimento do processo de fiscalização. Para tanto, tem elaborado o Guia Brasileiro de Produção, Manutenção ou Utilização de Animais para Atividades de Ensino ou Pesquisa Científica, elaborou a Diretriz Brasileira para o Cuidado e a Utilização de Animais para Fins Científicos e Didáticos (DBCA) e as Diretrizes da Prática de Eutanásia do Concea, dentre outras resoluções e orientações técnicas.
A utilização de animais para atividades científicas e de ensino vem ocorrendo há mais de dois mil anos, como relatado por Hipócrates, que data da época de 450 a.C., relacionando, à época, órgãos humanos doentes com os de animais. Atualmente, o desenvolvimento de novos e eficientes medicamentos para o combate do câncer, de doenças parasitárias, doenças imunológicas, envelhecimento, entre outras, tem forte base no conhecimento de como essas doenças se iniciam, evoluem e afetam o organismo como um todo. Somente com o uso de modelos animais tem sido possível entender os complexos mecanismos dessas doenças e, a partir daí, propor tratamentos que possam ser testados e desenvolvidos para uso clínico em humanos nos animais, sem afetar o ambiente.
Claro que existem diferenças entre os humanos e os modelos animais, como, por exemplo, os roedores, mas, a despeito dessas diferenças, quando bem formuladas questões importantes quanto aos mecanismos biológicos, podem ser, ao menos, melhor compreendidos, em um processo de construção do conhecimento, colaborar para o avanço científico aplicável às pessoas e aos animais sem afetar o ambiente. Ainda, justamente por haver diferenças entre os humanos e os modelos animais, e sendo o poder preditivo desses testes inferior a 100%, o que é necessário, durante o desenvolvimento de um novo fármaco, é a existência de uma etapa final que contém quatro fases de pesquisas em seres humanos. Mas, hoje, sem o uso de modelos animais para testes toxicológicos, ou seja, testes de segurança, não seria possível desenvolver, em conjunto, novos medicamentos.
Sim, é preciso melhorar a capacidade preditiva dos testes toxicológicos. Sim, é preciso desenvolver métodos alternativos validados capazes de minimizar o risco de medicamentos ineficientes. Porém, esse desafio, que é mundial, é um caminho ainda a se percorrer. O banimento completo e imediato dos testes em animais deixaria um vazio completo de referências e colocaria a saúde da população humana e do ambiente em risco imediato.
Para substituir o uso de animais, é imperativo ter algo para colocar no seu lugar. Esse é um tremendo desafio científico mundial, ao qual o Brasil também se associa. E o mundo, como também o Brasil, por ações do MCTI, com a criação da rede nacional de métodos alternativos, a Renama, vem investir no desenvolvimento e na disseminação de métodos alternativos validados para a redução, e, quando possível, substituição do uso de animais em testes toxicológicos.
Mas o que são métodos alternativos? Por que devem ser validados? Para entender essas questões, devemos também entender qual a necessidade dos testes toxicológicos. Em nosso mundo moderno, estamos em contato permanente com diversos produtos químicos: a tinta em nossa roupa, aditivos em nossos alimentos, produtos eletrônicos e suas baterias, medicamentos, agrotóxicos, entre outros.
Segundo Thomas Horton, do centro de alternativas ao teste com animais, CAAT, do Hospital John Hopkins, nos Estados Unidos, em 2010, havia mais de 70 milhões de compostos químicos sintetizados e registrados no Chemical Abstract Service.
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O uso de produtos químicos para o aumento e melhora da vida é uma prática generalizada em todo o mundo, mas, a despeito das vantagens destes produtos, há, também, a possibilidade de efeitos adversos que podemos chamar de risco para o ambiente ou as pessoas. O risco advém da relação entre o perigo inerente ao composto químico e à exposição a esse composto. O perigo pode ser físico, por exemplo, explosivos, inflamáveis; para a saúde, por exemplo, toxicidade aguda, corrosão, irritação dos olhos ou da pele, carcinogênese, toxicidade reprodutiva; e para o ambiente, seja aquático ou à camada de ozônio.
Assim, quando surge um novo produto para uso pelas pessoas ou animais, é necessário determinar a segurança de seu uso quanto aos perigos físicos para a saúde e ambiente.
Especificamente para o estabelecimento do perigo para a saúde, os testes necessários podem ser: toxicidade aguda, corrosão, irritação cutânea, lesões oculares graves ou irritação ocular, sensibilização respiratória ou da pele, mutagenicidade em células germinativas, carcinogênese, toxicidade reprodutiva, toxicidade para órgãos alvos específicos, exposição única ou exposição repetida e perigo de aspiração. Esse conjunto de testes permite estimar o perigo de um determinado composto e, por conseguinte, orientar quanto a sua adequada manipulação ao uso, protegendo a pessoa e o ambiente.
Métodos alternativos como definidos no Decreto nº 6.899 são procedimentos internacionalmente validados e aceitos que garantem resultados semelhantes e reprodutíveis para alcançar, na medida do possível, o mesmo objetivo de procedimentos substituídos, ou seja, semelhantes ou melhores que as metodologias com animais, que permitam substituir o uso de animais, usar espécie de menor ordem, usar menos animais, a redução, usar sistemas ex vivo, ou promovam refinamento.
A definição de metas alternativas está alinhada com as melhores práticas internacionais e, atualmente, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) publica o guia de testes de produtos químicos. Trata-se de uma coleção de cerca de 150 métodos de ensaio internacionalmente acordados e mais relevantes, utilizados por governo, indústria e laboratórios independentes, para identificar e caracterizar os potenciais perigos dos produtos químicos. Eles são um conjunto de ferramentas para os profissionais usarem, principalmente em teste de segurança regulatória e avaliação química, registro e posterior notificação de produtos químicos. Eles também podem ser utilizados para a seleção e classificação de produtos químicos candidatos durante o desenvolvimento de novos produtos químicos e na investigação toxicológica.
Esse grupo de testes abrange efeitos na saúde. Contudo, apenas alguns desfechos específicos podem ser substituídos por métodos alternativos integrados, como irritação e corrosão ocular, pelos guias da OCDE 437, 438, 460; ou da pele, guias 430, 431, 435, 439; fototoxicidade, que é o guia 432; sensibilização da pele, guia 442B, publicado em fevereiro de 2015. Os outros testes, como toxicidade aguda, carcinogênese e toxicologia reprodutiva, entre outros, representam ainda um tremendo desafio, pois não há teste alternativo validado ou disponível.
E importantíssimo destacar a importância dos métodos que, ao menos, reduzem ou refinam o uso de animais, pois, como apresentado, se utilizássemos apenas os métodos que substituem em detrimento dos que reduzem e refinam, muitos animais deixariam de ser poupados em função da limitada disponibilidade de métodos alternativos validados que substituem os animais.
Outro aspecto igualmente relevante é que cada método alternativo validado para um determinado desfecho serve para qualquer tipo de composto químico, independente de sua aplicação como produto final, como cosmético, composto químico industrial, agrotóxico, medicamento ou outro.
É evidente, então, que os métodos alternativos validados podem responder por algumas etapas da cadeia de testes para o estabelecimento da segurança de compostos químicos, mas não por toda ela. No caso de produtos de higiene pessoal e cosméticos, observamos uma longínqua história de desenvolvimento com a utilização de ingredientes muito bem conhecidos dos cientistas e das empresas quanto a sua segurança para as pessoas e o ambiente. Deste modo, há coerência em utilizar tal conhecimento existente e não se repetir testes já realizados, pois, como disse, para os ingredientes conhecidos, utilizados em produtos de higiene pessoal e cosméticos, sua segurança está bem estabelecida.
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Destarte, o Projeto de Lei da Câmara (PLC) nº 70, de 2014, originário do Projeto de Lei 6.602, 2013, do Deputado Ricardo Izar, traz em seu conteúdo um positivo e claro racional de que, para ingredientes conhecidos, não há necessidade de realizar testes com animais.
Outro ponto importante deste projeto de lei é a ressalva para ingredientes com efeitos desconhecidos. Essa ressalva de vedação terá efeito em até cinco anos, a partir do reconhecimento de métodos alternativos capazes de comprovar a segurança para uso humano.
Essa ressalva é importante por duas razões: primeiro, contribui para a segurança da população, por não permitir que um ingrediente novo, não testado, seja utilizado em cosmético sem a devida análise quanto à sua segurança; segundo, contempla o período necessário para a implementação de um método alternativo. Isso se deve ao fato de que os métodos alternativos devem ser executados em laboratórios reconhecidos em Boas Práticas de Laboratório (BPL).
Hoje, no Brasil, dentre os 31 laboratórios reconhecidos em BPL pelo Inmetro, apenas cinco realizam testes toxicológicos e, destes, apenas um realiza teste in vitro. Em outras palavras, o País não tem infraestrutura laboratorial de imediato capaz de absorver a demanda pelos testes in vitro em condições de BPL, como requerido pelos guias da OECD.
É urgente uma ação estratégica de qualificação técnica, infraestrutura e manutenção de laboratórios capaz de atender os guias da OECD para testes in vitro.
Os cientistas desejam, em geral, contribuir para o desenvolvimento da qualidade de vida das pessoas e do ambiente, em seu ambiente mais amplo. À medida que modelos de estudo mais adequados estejam disponíveis, certamente os modelos com animais serão deixados de lado. Contudo, no presente momento, há enorme necessidade de recursos para o desenvolvimento de estratégias integradas de testes...
O SR. JOSÉ MAURO GRANJEIRO - ...para substituir o uso de animais.
Não tenho dúvidas de que apenas com a ação conjunta convergente e integrada de toda a sociedade, incluindo cientistas, legisladores, leigos, poderemos avançar nesse tema.
Assim, o Conselho de Controle de Experimentação Animal (Concea) manifesta-se favorável à aprovação do PL 70, de autoria do Deputado Ricardo Izar.
Muito obrigado.
(Soa a campainha.)
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Obrigado, Dr. José Mauro.
Passo a palavra agora ao Dr. Thales de Astrogildo e Tréz.
O SR. THALES DE ASTROGILDO E TRÉZ - Bom dia a todos os presentes.
Na minha apresentação hoje, não conseguirei esgotar o assunto, em 15 minutos, tampouco numa audiência pública, mas, na medida em que o PL se reporta ao uso de animais para fins de estudos toxicológicos, vou abordar a questão a partir dessa delimitação temática.
O uso de animais para avaliar o risco tóxico em seres humanos parte do seguinte princípio: espécies não humanas de animais, quando submetidas ao contato com substâncias candidatas a componentes de um produto qualquer, podem gerar dados relevantes para o sistema biológico humano. Essa é a premissa de se testar em animais para avaliar o potencial de risco ou de toxicidade, que é o que está em questão.
Então, se uma substância específica for considerada tóxica para essas espécies não humanas, assume-se que a substância então seja tóxica para os seres humanos. Trata-se de uma inferência biológica que distorce, simplifica por demais os processos biológicos e metabólicos presentes em cada espécie com aquilo que chamamos de conceito espécie específica dentro das ciências biológicas. Eu digo isso para situar essa prática experimental como uma herança direta de um conceito biológico passado que não mais condiz com a realidade moderna, uma leitura moderna de dentro da própria biologia, como a biologia evolutiva ou a própria biologia da complexidade, ou seja, existem abordagens das ciências biológicas que já consideram essas premissas como sendo, digamos, inadequadas do ponto de vista biológico.
Vale lembrar que os animais foram estabelecidos como modelos ou como instrumentos de pesquisa há mais de três séculos na nossa história, num contexto de conhecimento e de realidade tecnológica que não mais condiz com a que temos hoje disponível.
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Agora, com os dois pés no século XXI, existe uma série de aspectos que devemos passar a considerar quando o assunto é eliminar os testes para fins de toxicidade ou de avaliação de risco, que é o que está em questão. De novo destaco isto: a gente não está falando em eliminar os testes para desenvolver terapias para doenças como câncer, enfim, é avaliação de risco tóxico.
O primeiro aspecto, e talvez o mais importante, seja a questão da sociedade civil, o impacto negativo que essas práticas provocam junto à sociedade. Existe uma dimensão social explícita colocada por essas práticas, e é inegável o impacto negativo que essas práticas produzem, o que é inerente a elas próprias e à própria sociedade, que se encontra cada vez mais avessa a esse morticínio promovido por esses procedimentos científicos, especialmente por questões de ordem moral e ética. Não é o caso de delimitar aqui - talvez a Drª Vânia desenvolva -, mas a presença da sociedade civil nesse debate é importante, porque, realmente, é uma parcela diretamente interessada nessa resolução.
Quando falo em morticínio - esse gráfico talvez represente bem o que quero dizer com isso -, quando a gente vê os estudos de toxicidade, percebe que eles correspondem a 9% do total do uso de animais utilizados para a finalidade de pesquisa. Considerando esses 9%, a gente tem uma estimativa recente, de 2008, que diz que esses 9% correspondem à morte de 10 milhões de animais por ano. Quer dizer, não é um número irrelevante. Mas, ainda assim, considerando, por exemplo, o desenvolvimento de drogas para fins de terapia, produção de vacinas, pesquisa básica, essa é uma parcela relativamente reduzida do total do número de animais empregados na ciência. Então, o primeiro aspecto é um aspecto social.
O segundo aspecto diz respeito a um contexto que surge dentro da própria ciência, que está revisando, que passa a revisar criticamente a relevância dos dados gerados a partir de outras espécies quando o recipiente final é o sistema biológico humano. Essa revisão vem levantando questões diversas, que eu vou pontuar brevemente aqui.
A primeira delas é que um dos ensaios mais clássicos para avaliar a toxicidade é o ensaio com roedores, que é considerado um padrão ouro nos estudos de toxicidade, especialmente naqueles com endpoint ou com desfecho sistêmico, que visam identificar carcinogenicidade, genotoxicidade. Um padrão ouro nada mais é do que um teste de referência. Então, nos estudos toxicológicos, os ensaios com roedores são considerados testes de referência. A ideia por trás desse ensaio é expor ratos e camundongos a doses relativamente altas de uma substância sendo testada por um longo período de tempo nos estudos crônicos ou, então, nos estudos de toxicidade aguda, onde o tempo é reduzido, e avaliar os efeitos dessa exposição. Depois desse tempo de exposição, curto ou longo, o rato é morto e se avalia, por exemplo, tumores nos órgãos onde eles ocorreram. A gente tem um aspecto qualitativo e um aspecto quantitativo. Por extrapolação, determinar a dose que seria tóxica para o ser humano. A ideia é de extrapolar os dados.
Existem duas premissas básicas nesse tipo de ensaio. A primeira é de que a resposta em animais e humanos será a mesma ou será próxima. A segunda é de que os efeitos provocados pelas altas doses em animais são relevantes para a exposição humana. Mas, esse ensaio, em particular, permaneceu inalterado desde que foi estabelecido na prática científica, há quase cinquenta anos. Ou seja, muito pouco se mudou do protocolo experimental desse ensaio com roedores.
Além da sensibilidade desse teste ser alta, são constatados ainda muitos falsos positivos, substâncias que causam câncer em roedores, mas não causam em humanos, e falsos negativos, substâncias que não causam câncer em humanos e nem em roedores.
O segundo ponto é que muitos produtos que a gente consome rotineiramente no nosso dia a dia podem causar câncer em animais, mas são inócuos no nosso dia a dia, na nossa rotina; é o que a gente chama de falso positivo. Por exemplo, o açúcar e o sal são comprovadamente genotóxicos. O cafezinho que a gente toma, das trinta e uma substâncias testadas que o compõem, vinte e três foram consideradas carcinogênicas. Felizmente, não há correspondência desses dados em humanos.
Existe um aforismo irreverente na Biologia, que a gente chama de lei de Morton, que diz o seguinte: se ratos são experimentados, eles desenvolverão câncer. Em outras palavras, esses organismos são muito sensíveis à exposição de substâncias, gerando, então, muitos falsos positivos, de forma que é uma grande tendência que qualquer substância, dependendo da dosagem, vai ser considerada tóxica para o uso humano. Isso traz uma série de problemas do ponto de vista da regulação, porque implica políticas restritivas irreais e desnecessárias, especialmente do ponto de vista do mercado.
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O segundo eslaide também mostra um dado importante. Um relatório recente sobre a correlação de efeitos de toxicidade hepática, a partir de duas bases de dados distintas — aqui é a Medline e aqui é a base do Emea -, que totalizam quase 900 substâncias diferentes, revelou que há pouca correlação entre os resultados obtidos entre os roedores, os não roedores e os humanos.
Quando a gente analisa aqui este gráfico, por exemplo, da base da Medline, a gente tem uma correlação de 60% de toxicidade entre humanos e roedores. Ela cai para 19% entre humanos e não roedores. Então, em média, o que a gente tem é 60% de correspondência tóxica entre roedores e seres humanos, em média, e 46% na outra base, quer dizer, aqui na base do Emea a gente tem essa correspondência baixa. Estou falando aqui não é de sensibilidade. Estou falando é de predição, ou de correlação.
Os dados, os próprios autores comentam: a análise mostra que entre 38% e 51% dos compostos com efeito hepático registrado em humanos não são detectados em testes pré-clínicos com animais. Ainda, de 13% a 33% dos casos, a evidência de efeitos hepáticos em testes pré-clínicos com animais não se reflete em humanos. Ou seja, isto aqui é um dado de 2008, com um sistema de análise também bastante sofisticado que não vai entrar em detalhes. O fato é que há uma série de estudos recentes na literatura científica, chamados de revisão sistemática ou metanálises, que têm revelado essa discrepância entre os dados obtidos entre animais e animais não humanos.
Além dos estudos toxicológicos com animais serem pouco preditivos, como a gente está vendo neste eslaide, existe um outro problema crítico e crônico desses experimentos, que é a falta de reprodutibilidade desses experimentos.
Os animais são organismos complexos, portanto sensíveis a uma infinidade de variáveis. Um artigo recente publicado na Nature do ano passado, se não me engano, mostrou que, se o manipulador for um homem, os dados obtidos de animais são uns; e, se o manipulador dos animais for uma mulher, os dados obtidos dos mesmos animais são outros.
Então um experimento que não pode ser reproduzido não pode ser considerado científico porque ele fere um dos preceitos do conhecimento científico que é o da sua universalidade. Não adianta nada o meu laboratório demonstrar que os dados foram gerados de um jeito, se, seguindo o mesmo protocolo, um outro laboratório chega a dados diferentes. Há uma inconsistência, ou seja, há uma validade interna pobre dos experimentos com animais.
E, por fim, existe um contexto científico e tecnológico novo, que vem se desenvolvendo com rapidez em direção aos protocolos de pesquisa mais seguros, econômicos e eficazes na avaliação de risco tóxico. E nesse rol de novas abordagens e tecnologias há que se considerar também inovações radicais e incrementais no campo da pesquisa in vitro, in silico, in chemico, também nas suas combinações. Então é importante pensar nessas combinações entre essas tecnologias. E esse novo contexto vem provocando um arejamento dessas práticas de pesquisa e tornando essas práticas obsoletas.
É possível afirmar atualmente que o País que não investir em métodos substitutivos corre o risco de perder competitividade num mercado, ou num cenário de mercado não muito distante, onde a tendência é a demanda crescente de produtos de higiene pessoal e cosméticos livre de testes em animais.
Então, dito isso, fica lançado o argumento de que o uso de animais como ferramenta preditiva para a avaliação de risco está longe de garantir segurança a substâncias para consumo humano. E as agências reguladoras, em nível mundial, estão, aos poucos, passando a compreender a necessidade dessa transição.
O PL em questão tem um mérito inegável de tocar numa questão que deveria ter sido contemplada de fato pela atual versão da Lei nº 11.794.
O uso de animais para definição de risco tóxico, de substâncias candidatas ao uso de higiene pessoal e cosmética não se justifica em hipótese alguma. É sabido que os desfechos toxicológicos tópicos, como o Granjeiro comentou, já contam com uma variedade considerável de métodos alternativos validados ou em fase avançada de validação. E que nos desfechos sistêmicos, como genotoxicidade, toxicidade reprodutiva, carcinogênese, por exemplo, ainda há muito o que se trilhar.
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Mas a validação não é um ponto pacífico entre os pesquisadores, isso é importante frisar. Por quê? Porque os métodos alternativos são validados a partir dos testes padrão ouro, que envolvem animais. Ou seja, eu comparo os dados obtidos a partir de uma abordagem pobre, que envolve animais no seu desenho, com dados gerados a partir de abordagens mais sofisticadas. Em outras palavras, a validação ou o processo de validação amarra essas novas tecnologias ao passado, quando a referência de testes passa a ser aquele baseado em animais.
Então, condicionar a proibição dos testes em animais ao processo de validação, como presente no atual projeto de lei, tem implicações que podem retardar essa tão desejável transição. Primeiro, porque o método alternativo pode ainda utilizar animais. A Anvisa, recentemente, chancelou o uso de dezessete métodos alternativos, mas observem que sete deles ainda exigem o uso de animais. Apenas dez são, de fato, substitutivos. Porque entra naquela questão: quando a gente fala em método alternativo, a gente não está falando necessariamente em substituir os animais. A gente pode falar em refinar ou em reduzir o número de animais. E, ainda assim, isso é considerado pela ciência ou pela prática de pesquisa como sendo um método alternativo.
E segundo porque a validação é um processo moroso, é um processo lento - dura de sete a dez anos para um comitê de validação chegar a uma decisão de validade de um método e ainda mais alguns anos para que as agências reguladoras chancelem ou possam referenciá-los como métodos válidos. Por exemplo, a Anvisa reconheceu nessa lista de dezessete métodos...
A SRª VÂNIA DE FÁTIMA PLAZA NUNES - Bom dia a todos. Eu saúdo toda a Mesa através do cumprimento ao Senador Cristovam Buarque.
Na verdade, eu vou, talvez, passar um pouquinho no tempo, porque a informação que eu tive é que a gente teria de quinze a vinte minutos. Então, eu peço mil desculpas se isso acontecer.
Eu gostaria, primeiro, de dizer a todos que o Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal é uma ONG, criada em 2000, na cidade de São Paulo, que congrega mais de cem entidades de proteção animal e ambiental em dezenove Estados brasileiros.
Há quinze anos, nós atuamos na disseminação do respeito, da proteção e defesa dos animais. Lutamos para construir uma nova sociedade, onde a compaixão pela vida seja um valor nacional, compartilhado por todos os brasileiros.
Temos ONGs afiliadas, que proveem cuidados diretos para milhares de animais que são vítimas de abuso, abandono e do tráfico de animais silvestres. Em suas ações para defesa e proteção dos animais, atua em parceria, de forma integrada, agilizando e promovendo, com maior solidez, a implantação das ações necessárias para alcançar seus objetivos. Então, aqui é só um exemplo de algumas entidades que são afiliadas ao Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal pelo País.
(Soa a campainha.)
O SR. THALES DE ASTROGILDO E TRÉZ - ... métodos que haviam sido validados já há mais de dez anos, por exemplo. Então, esperar por esse processo é algo que pode amarrar o processo de transição para um efetivo término desses testes para fins de uso de cosméticos. Estou finalizando aqui.
Então, proibir os testes de produtos acabados, bem como de ingredientes de toxicidade desconhecida, é colocar a política regulatória do Brasil afinada a uma perspectiva inovadora radical, que encontra fundamentação científica e também de mercado.
Com a proibição, é possível que passemos a investir mais no desenvolvimento de métodos substitutivos, pois criamos uma situação imperativa ao setor industrial. Aliás, setor industrial esse que, no caso de algumas empresas, já se encontra afinado a essa proposta da substituição, como é o caso de O Boticário, da Natura e de outras empresas que a gente tem no Brasil.
Por fim, vale lembrar que as possíveis e desejáveis emendas que podem passar a fazer parte desse importante PL não acabarão com experimentação animal no Brasil. O maior gargalo no consumo de animais por parte da atividade científica no Brasil encontra-se infinitamente mais volumoso para fins de pesquisa básica do que para fins de estudos toxicológicos.
Há muito trabalho a se fazer nesses outros empregos e, na minha opinião como educador, serão resolvidos e encaminhados muito mais fora do âmbito da regulamentação e muito mais no âmbito de promover esse debate junto à formação dos nossos futuros pesquisadores.
É isso.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Muito obrigado.
Eu passo a palavra agora à Drª Vânia de Fátima Plaza Nunes. Ela é Diretora Técnica do Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal.
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O Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal trabalha com programas e campanhas. E, entre essas campanhas, ele trabalha com a campanha Sem Crueldade, em que um dos temas é exatamente esse que estamos aqui discutindo hoje, que é o fim dos testes com animais para produtos cosméticos. Então, temos parcerias, e uma delas é com a Humane Society, que, na verdade, desenvolve todo esse trabalho pelo País há bastante tempo, com muita qualidade.
Não é a primeira vez que temos a honra de estar aqui com vocês, em Brasília. Temos já o hábito de fazer algumas visitas à Frente Parlamentar Ambientalista, aqui em Brasília.
Falando sobre o tema: testes de cosméticos em animais, esta aqui é uma imagem do início do ano passado, do dia 21 de janeiro, quando nós, do Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal, estivemos junto ao Governador do Estado de São Paulo pedindo a sanção da lei no Estado de São Paulo, que foi feita graças a esse movimento feito pela sociedade. Se vocês olharem ali no fundo, no sofá, há uma caixa com milhares de assinaturas colhidas de pessoas da sociedade apoiando a sanção do projeto de lei.
Falando um pouquinho sobre testes toxicológicos em animais, eu gostaria que todos vissem que estamos falando sobre esta situação: animais que, na verdade, são utilizados dessa forma.
Nós não devemos esquecer que os animais são seres sencientes, já reconhecidos pela União Europeia, desde o Tratado de Amsterdã, em 1997. E, recentemente, no Reino Unido, mais de 20 dos maiores neurocientistas do mundo, que desenvolveram muitas linhas de pesquisa mostrando a capacidade de senciência e, mais do que isso, de consciência em diferentes graus dos animais, se reuniram e tornaram pública a Declaração de Cambridge, em que eles dizem que as estruturas do cérebro responsáveis pela produção e consciência são análogas em humanos e outros animais. Acho que isso faz com que tenhamos que pensar sobre a decisão que vamos ter em relação a aceitar ou não algumas coisas absolutamente desnecessárias nos dias de hoje.
Aqui, é só para mostrar, não vamos discutir isso. O Prof. Thales conhece isso bem e acabou de falar, assim como o Dr. Granjeiro, a respeito de alguns testes que são feitos. Na verdade, é sobre esses testes que estamos aqui conversando.
Existem limitações científicas nos testes que são feitos com esses animais. Então, como o Prof. Thales falou, espécies diferentes frequentemente possuem suscetibilidade diferente em relação a substâncias químicas. Então, de uma espécie para outra, há diferenças. Isso não é uma imaginação, uma suposição. Isso é um fato amplamente conhecido pela comunidade científica há muito tempo.
Inúmeros e diferentes fatores e incertezas são comumente aplicados por reguladores. Então, constantemente, se pegarmos as bulas dos diferentes produtos ou as explicações que vêm com eles, vemos que há uma quantidade enorme de informações sobre riscos e cuidados que devemos ter no consumo de muitos produtos, especialmente cosméticos, já que esse é o tema da nossa conversa, que usamos no nosso dia a dia. Só para vocês entenderem, por exemplo, fatores baseados em peso corporal, fração do peso corporal, superfície do corpo, taxa metabólica, expectativa de vida, entre outros, foram todos propostos, mas não se chega a um consenso sobre qual é o mais eficiente na previsão. Então, podemos achar que, realmente, é fácil e que tudo está garantido quando usamos os animais para os testes, mas isso não é verdade. Esses fatores e incertezas são simplesmente estimativas conjeturais, com pouco embasamento científico infelizmente.
E será que temos, então, pensando nisso, que continuar usando os animais para testes de cosméticos? Vários países já proibiram esses testes de cosméticos em animais definitivamente. Justificativas éticas, econômicas e comerciais de manutenção de testes de cosméticos em animais nos mostram que, provavelmente, tudo isso é muito frágil.
Existe um forte apoio do público a favor da proibição. E, em 2013 - eu gostaria de lembrar que essa pesquisa foi feita antes da ocorrência da remoção dos animais do Instituto Royal -, logo após a União Europeia e Israel proibirem os testes de produtos e ingredientes cosméticos em animais, foi feita uma pesquisa de opinião no Brasil. E 66% das pessoas entrevistadas, simplesmente, numa pesquisa rápida de sim ou não, se eram favoráveis ou não, eram contra o uso de testes em animais. Então, depois do Instituto Royal, a gente sabe que a nossa sociedade viu, escancaradamente, tudo que acontecia em muitas situações desconhecidas pela população.
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Quando nós, então, nos aproximamos da situação que nos trouxe hoje, aqui, para discussão, que é o PLC nº 70, nós precisamos entender que temos dois parágrafos bastante importantes na discussão e é sobre esses dois parágrafos que eu gostaria de conversar agora com vocês.
O §7º diz o seguinte:
§7º É vedada a utilização de animal de qualquer espécie em atividades de ensino, pesquisa e testes laboratoriais que visem à produção e ao desenvolvimento de produtos cosméticos e de higiene pessoal e perfumes quando os ingredientes tenham efeitos conhecidos e sabidamente seguros ao uso humano ou quando se tratar de produto cosmético acabado nos termos da regulamentação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
Aparentemente, quando a gente olha, tenho certeza de que todos vocês, ao ouvirem, eu li o texto aqui, acharam que estava tudo certo. Mas, na verdade, nós temos problemas no §7º. Nenhuma empresa de cosméticos vai testar um ingrediente que já, sabidamente, é seguro ao ser humano. Isso significa investimento, isso significa diminuir os meus lucros. Então, na verdade, a gente sabe que, num mundo absolutamente capitalista e consumidor como o nosso, qualquer dinheiro que for investido e não for bem aproveitado vai significar prejuízo ou diminuição do lucro. Então, na verdade, esses testes de cosméticos em animais são feitos para avaliar a segurança dos cosméticos. E qual é o conceito, então, de uma empresa de cosméticos testar a segurança de alguma coisa que já está comprovada? Não tem por quê.
Outro problema é que fala sobre produtos cosméticos acabados. Produtos cosméticos acabados não são testados em animais há, pelo menos, duas décadas, já, na União Europeia. De acordo com a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos, e representa essa Associação 97% do mercado brasileiro produtor, eles próprios admitiram que esses testes já não fazem parte mais da realidade brasileira. Então, nós estamos falando de qual mercado exatamente? Então, o §7º proíbe testes em animais que já não acontecem. Portanto, ele é totalmente inócuo.
Quando nós falamos do § 8º...
A SRª VÂNIA DE FÁTIMA PLAZA NUNES - ... ele diz o seguinte:
§ 8º No caso de ingredientes com efeitos desconhecidos, será aplicada a vedação de utilização de animais de que trata o §7º, no período de até 5 (cinco) anos, contado do reconhecimento de técnica alternativa capaz de comprovar a segurança para o uso humano.
Aqui nós temos problemas também. Por quê? Porque aborda os testes nos quais os animais são realmente utilizados. Então, esse parágrafo, de fato, é o parágrafo que realmente tem problemas muito complicados. Ele, na verdade, fala de testes de ingredientes com efeitos desconhecidos. Diz o seguinte na verdade: ele não obriga as empresas a usarem métodos alternativos para esses testes num prazo de cinco anos, mesmo após o reconhecimento da técnica. Isso quer dizer: há uma técnica nova, mas a empresa tem até cinco anos para, de fato, se apropriar disso e implantar. Ou seja, pelos próximos cinco anos, nós vamos continuar tendo a mesma situação. Levando em conta o que o Prof. Thales acabou de dizer, vai ser muito mais tempo do que isso, porque ele explicou que um teste de validação é muito mais complexo, na verdade, do que isso. Leva de dez a quinze anos.
O que é importante é que ele está em conflito com uma lei já consagrada, brasileira, que é a Lei de Crimes Ambientais, a Lei nº 9.605, que é uma lei de 1998. Olha, uma lei, até, do século passado, do final do século passado, que condena a até um ano de prisão quem realiza experiências dolorosas ou cruéis em animais vivos, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos. Ou seja, isto é um retrocesso. Nós vamos, na verdade, "voltar atrás". Não é possível.
(Soa a campainha.) (Palmas.)
A SRª VÂNIA DE FÁTIMA PLAZA NUNES - É inadmissível.
Uma outra coisa que o §8º tem de problema é que ele afirma a necessidade de técnica alternativa capaz de provocar a segurança para uso humano. Ele afirma, de forma implícita, que testes em animais são capazes de fazer essa comprovação, de segurança para uso humano, o que, na verdade, é tendencioso e falacioso. Ou seja, com o uso das palavras, tenta-se construir o pensamento de que: sem os animais, não dá, todo mundo terá problemas; com os animais, é absolutamente seguro. E sabemos que isso não é verdade. Não somos nós quem estamos dizendo, são os trabalhos sérios e adequados que estão disponíveis não só na ciência brasileira, onde temos muita coisa, mas em outros países.
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E mais, introduz um regime especial para empresas de cosméticos: que tenham prazo de até cinco anos para usar os métodos alternativos, enquanto para pesquisadores do setor farmacêutico, por exemplo, o uso de alternativas não tem prazo, ou seja, existe um conflito de interesse dentro da própria questão da experimentação. E isso é inaceitável.
Se estamos falando em ética, respeito, responsabilidade, conhecimento científico, direito científico, alguma coisa está errada no que está proposto. Vocês podem ter certeza de que, se este PL for aprovado da forma como está, as pessoas vão se apropriar, com tudo isso que está aí, porque é muito claro para uma pessoa que tenha o mínimo do conhecimento e do entendimento do concatenamento que foi feito de palavras dentro dessa proposição desses dois parágrafos.
Então, só para lembrar aos senhores, a União Europeia, um dos grandes mercados consumidores daquilo que o mundo produz, já tem a proibição de venda e fabricação de cosméticos testados em animais desde março de 2013, ou seja, temos 26 meses de atraso em relação ao mercado competidor que está aí fora, e o País está mais do que nunca precisando ganhar esse mercado.
Quando pegamos a legislação da Anvisa, apoiada pelo Concea, como o Dr. Thales falou, tivemos a publicação de 17 métodos recentemente, amplamente reconhecidos e empregados, entretanto, muitos desses métodos já eram disponíveis há muito tempo, muito antes disso, ou seja, continuamos atrasados, podíamos ter feito isso na semana seguinte à suspensão pela União Europeia, mas, na verdade, estamos falando de interesses que, muitas vezes, não conseguimos entender.
Eu queria dizer que as mudanças só ocorrem devido às restrições dos mercados consumidores dos países importadores. Acordos multilaterais de caráter econômico são importantes, é claro que são. Mas se fazemos isso simplesmente dentro dos gabinetes, sem que a sociedade possa optar por aquilo que ela quer escolher, como ficamos?
Se mantivermos esta lei como ela está, quais são os riscos que corremos? Manter uma atividade passiva até a validação dos métodos alternativos. Vamos autorizar, de fato, as empresas a continuarem a usar os animais para testes, legalmente vamos fazer isso. E vamos manter ad aeternum o uso, sem se preocupar com o desenvolvimento de testes, avaliações seguras e alternativas ao uso dos animais.
Testes em animais não são capazes de prever os efeitos em humanos de maneira segura, isso é definitivo, senhores. O Dr. Thales falou bastante, eu repeti várias vezes, e vocês precisam ter isso claro na mente de vocês neste momento. Não temos métodos alternativos para alguns testes de toxicidade a longo prazo. Então, dizer que, de fato, o uso de animais vai garantir, de novo, não vai garantir. Menos de 0,1% dos produtos necessitam de testes novos para componentes. Será que temos tantos produtos assim que precisam ser pesquisados como uma coisa inovadora, com a grande quantidade de produtos que já temos, com um mundo tão complexo e delicado do ponto de vista de destinação de resíduos?
Métodos e testes in vitro crescem, em média, 15% ao ano, não é só uma questão ética e científica, é também uma questão de caráter econômico. Muitas tecnologias já estão disponíveis. O custo de implantação disso pode ser muito baixo, o que precisa é que as pessoas realmente se disponibilizem a sair do discurso e ir para a prática.
O que leva à busca das inovações e de novas técnicas é a proibição de qualquer uso dos animais como modelo de testes através da lei, ou seja, precisamos de uma lei que proíba definitivamente e imediatamente o uso dos animais em testes de produtos cosméticos.
Finalmente, inúmeros e eficientes métodos alternativos reconhecidos já foram desenvolvidos e validados. Precisamos, então, de uma proibição efetiva, sem brechas, num prazo razoável, e um verdadeiro incentivo para que as empresas desenvolvam e usem métodos alternativos.
Acabar com o sofrimento e a crueldade com os animais é exatamente o que temos de fazer e temos conhecimento e capacidade de fazer isso.
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Existem alguns pontos que aqui nós vamos deixar como sugestão. Caso as pessoas queiram, nós temos toda a disponibilidade de encaminhar isso, de sentar para discutir, na maior humildade e simplicidade possível, que seria proibir totalmente os testes em animais para cosméticos imediatamente, testes proibidos em animais para componentes ou produtos cosméticos acabados - isso tem que ficar bastante claro -, definir claramente o que é um produto cosmético, e proibir a venda de componentes e produtos acabados, testados em animais, evitando que os testes ocorram em outros países. Ou seja, ninguém vai sair endossando práticas de outros países para o consumo aqui no Brasil. A gente não quer que territórios deste Planeta sejam usados para isso. Está certo? Então, existe uma ética e uma responsabilidade por todos os animais, e não apenas por alguns. E é lógico que a gente sabe que isso tem que ser avaliado e discutido nos mercados de exportação de produtos brasileiros, sem dúvida alguma, então com um prazo adequado.
Então, aqui temos uma proposta que nós podemos encaminhar. Eu não vou ler, pelo adiantado da hora, para todos vocês. Mas seriam três novos parágrafos substituindo, na verdade, os dois parágrafos que estão propostos, de alteração, hoje em dia.
Portanto, senhores que estão aqui hoje, eu espero que vocês escutem os animais sempre. Aqui nós estamos pedindo que vocês escutem o que eles dizem para nós todo o tempo em relação ao uso desses animais no teste de produtos para a indústria cosmética. Mas os animais precisam ser ouvidos em muitas outras práticas onde eles são usados e abusados sob diversas alegações da nossa cultura, da nossa necessidade como espécie superior às demais do Planeta.
Eu agradeço a todos pela oportunidade de estar aqui e trazer algumas pequenas informações para todos. Muito obrigada. Gratidão. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Eu passo a palavra agora ao Sr. Márcio Lorencini, Gerente de Avaliação de Produtos de Assuntos Regulatórios do Grupo O Boticário.
O SR. MÁRCIO LORENCINI - Bom dia a todos. Eu agradeço, primeiramente, o convite para participar desta discussão numa temática tão interessante.
Eu acho que vou compensar um pouquinho o tempo da Vânia agora. Vou começar então trazendo para vocês a experiência do Grupo Boticário com os testes de cosméticos, com relação a segurança e eficácia. Então, dentro do grupo, assim como nós temos outras ações bastante voltadas para a sustentabilidade, em questões de preservação ambiental, manutenção de áreas de preservação, nós também não realizamos testes com animais. Essa prática já é adotada dentro do grupo há algum tempo, não é tão recente. E muito do que a gente aplica tem bastante alinhamento com o que foi trazido anteriormente, em algumas das contribuições, no sentido de que nós produzimos os nossos produtos para o Brasil e nós também exportamos alguns produtos. Então, nós temos que ter também algumas adequações para o mercado europeu ou para mercados externos. Então, nós não realizamos os testes em animais.
Eu acho que é importante deixar bastante claro aqui também que o grupo, além da adoção dos testes alternativos que já são validados - há algum tempo a gente já utiliza esses métodos que foram aceitos e reconhecidos pela Anvisa, e vamos continuar utilizando -, nós trabalhamos também no desenvolvimento de novas metodologias.
Eu acho que é bastante pertinente colocar aqui uma situação por que o nosso País está passando recentemente. Eu acho que, nos últimos quatro ou cinco anos, a gente está passando por uma revolução dessa temática no cenário nacional. Então, a gente teve a instituição do BraCVAM, o nosso Conselho Brasileiro para a Validação de Métodos Alternativos. A gente tem também a constituição, um pouco mais recente, da SBMAlt (Sociedade Brasileira de Métodos Alternativos à Experimentação Animal) , que reúne os pesquisadores e membros da comunidade científica que têm alguma afinidade com essa temática também. Além disso, a gente teve a constituição, junto ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, da Rede Nacional de Métodos Alternativos (Renama). Então, todas essas iniciativas são bastante ricas e contribuem para que a gente, no cenário nacional, consiga adotar essa prática de desenvolvimento dos métodos alternativos de forma bastante consistente.
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O que eu posso colocar, como empresa de cosméticos, especificamente, eu acredito que essa discussão é bastante válida. Ela poderia estar acontecendo há algum tempo. Acho que o momento é oportuno. Estamos num momento de riqueza nessa temática e nós, por exemplo, temos projetos aprovados junto a Rede Nacional de Métodos Alternativos. Então, além de testes que já foram descritos aqui, temos uma série de metodologias para aplicar na substituição dos testes de animais, na prática.
Então, nós temos os métodos in vitro, que foram discutidos aqui, e nós também temos outra categoria de testes que utilizamos e que está bastante crescente no mundo todo, que são os métodos que chamamos de in silico ou métodos computacionais. Então, a partir dessas metodologias, podemos avaliar similaridades de moléculas para contribuir para previsão de possíveis efeitos num organismo biológico.
Então, esse é o posicionamento que o grupo adota. Acho que um projeto de lei nesse sentido tem muito a contribuir nesse cenário que estamos vivendo agora.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Obrigado, Dr. Márcio.
Eu passo a palavra agora ao Dr. Joel Majerowicz, que é Assessor da Diretoria de Gestão da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
O SR. JOEL MAJEROWICZ - Bom dia a todos. Cumprimentando o Exmo Sr. Senador Cristovam Buarque, Presidente da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática do Senado Federal, cumprimento os demais Exmos Srs. Senadores, os colegas de Mesa e todos os presentes.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), criada pela Lei nº 9.782, de 26 de janeiro de 1999, é uma autarquia sob regime especial. A agência atua na proteção à saúde humana em todos os setores relacionados a produtos e serviços que possam afetar a população brasileira, os quais envolvem alimentos, agrotóxicos e toxicologia, cosméticos, derivados do tabaco, insumos farmacêuticos, medicamentos, saneantes, sangue, tecidos e órgãos, além do trabalho de fiscalização dos portos, aeroportos e fronteiras, bem como com a cooperação com os laboratórios oficiais de diagnósticos, controle de insumos e produtos para a saúde e higiene. Sua competência abrange tanto a regulação sanitária quanto a regulação econômica do mercado.
A Anvisa também é responsável pela coordenação do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, de forma integrada com outros órgãos públicos relacionados, direta ou indiretamente, ao setor de saúde. Na estrutura da Administração Pública Federal, a agência encontra-se vinculada ao Ministério da Saúde e integra o Sistema Único de Saúde.
Ao longo dos 16 anos de existência, a Anvisa sempre pautou a análise de risco pelo estabelecimento de normas, de modo que se obtenha as melhores evidências de segurança e eficácia dos produtos sobre sua responsabilidade. Para o cumprimento de muitas de suas funções, como ocorre em todas as agências reguladoras e órgãos de controle sanitário no mundo, necessita de informação sobre a segurança, a eficácia e a qualidade de insumos e produtos de uso humano e mesmo daqueles que podem gerar risco à saúde da população.
A obtenção desses dados envolve diversas metodologias, algumas das quais requer o uso de animais. Através de estudos pré-clínicos e não clínicos, in vitro, in vivo, in silico, e ensaios clínicos obtêm-se dados e predições que permitem prognosticar efeitos farmacológicos, eventos adversos, definir limites e prever condições de segurança no uso de produtos utilizados para diagnósticos, tratamento ou prevenção de doenças em seres humanos.
Nas resoluções da agência, há indicação clara e inequívoca de que os ensaios exigidos e que envolvam animais devam ser conduzidos de acordo com a legislação nacional - Lei nº 11.794, de 2008; Decreto-Lei nº 6.899, de 2009; e as resoluções do Conselho Nacional de Controle e Experimentação Animal -, além da necessidade de atenderem ao preconizado nos guias de boas práticas de laboratório da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico e da Organização Mundial da Saúde.
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De acordo com a definição conferida pela legislação vigente - Drª Vânia, fica bem clara aqui qual é a definição de cosméticos -, cosméticos, produtos de higiene e perfumes, abre aspas, essas são determinações da legislação da Anvisa: "São preparações constituídas por substâncias naturais ou sintéticas, de uso externo nas diversas partes do corpo humano, pele, sistema capilar, unhas, lábios, órgãos genitais externos, dentes e membranas mucosas da cavidade oral, com o objetivo exclusivo ou principal de limpá-los, perfumá-los, alterar sua aparência e/ou corrigir odores corporais e/ou protegê-los ou mantê-los em bom estado." Essa é a definição de cosmético.
A avaliação da segurança deve preceder a colocação do produto de higiene pessoal, cosmético e perfume no mercado. A empresa produtora é responsável pela segurança dos produtos, conforme assegurado por Termo de Responsabilidade, onde a mesma declara possuir dados comprobatórios que atestam a eficácia e segurança de seus produtos.
Uma vez que os produtos cosméticos de higiene pessoal e perfume são de livre acesso ao consumidor, os mesmos devem ser seguros nas condições normais ou razoavelmente previsíveis de uso. A busca dessa segurança deve incorporar permanentemente o avanço do estado da arte da ciência cosmética.
O Projeto de Lei da Câmara nº 70, de 2014, originário do Projeto de Lei nº 6.602, de 2003, do Deputado Ricardo Izar, aqui presente, traz em seu conteúdo a premissa da Agência Nacional de Vigilância Sanitária em “promover e proteger a saúde da população e intervir nos riscos decorrentes da produção e do uso de produtos e serviços sujeitos à vigilância sanitária".
Nas tratativas com o Deputado Ricardo Izar, sua equipe, assessores e segmentos da sociedade, evidenciou-se que para as atividades de ensino, pesquisa e produção de produtos cosméticos e de higiene pessoal e perfumes, nos quais ingredientes que tenham efeitos conhecidos e seguros, ou de produtos acabados no termo da regulamentação da Anvisa, o uso de animais de qualquer espécie não é requerido, sendo a vedação de seu uso o mais apropriado. No entanto, para o ingrediente com efeitos desconhecidos, é fundamental, para a segurança da população, que teste de segurança, em alguns casos, teste de eficácia, sejam exigidos para registro na Anvisa.
Do cumprimento de muitas das suas funções, a Anvisa, assim como qualquer outra agência congênere ao redor do mundo, necessita de informações sobre a segurança e eficácia de produtos de uso humano, ou daqueles que possam gerar risco à saúde.
Outro aspecto importante de ser considerado, ainda na segurança sanitária - esse é o mais importante, segurança sanitária -, é que a vedação total do uso de animais para qualquer categoria de produto de higiene pessoal, cosmético ou perfume terá, como consequência, perda inestimável para as empresas nacionais de um mercado promissor no desenvolvimento de novos produtos com base em novos ingredientes oriundos da nossa biodiversidade e de novas tecnologias, principalmente daqueles frutos da nanotecnologia.
Atualmente temos um mercado consumidor, espantem-se senhores, de R$30 bilhões de reais, sendo o terceiro mercado mundial e tendendo a ser o segundo.
Paralelamente a toda essa discussão, a Anvisa vem trabalhando em cooperação com o Conselho Nacional de Experimentação Animal, o Concea; com a Rede Nacional de Métodos Alternativos (Renama), do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação; e com o Centro Brasileiro de Validação de Métodos Alternativos (BraCVAM), do Instituto Nacional de Controle e Qualidade em Saúde da Fundação Oswaldo Cruz, no sentido de aceitação de métodos alternativos ao uso de animais, validados internacionalmente para efeito de registro e produtos sujeitos à vigilância sanitária.
Importante frisar que métodos alternativos ao uso de animais, validados internacionalmente, disponíveis, são ainda em pequeno número e se prestam a determinados eventos específicos, não cobrindo, portanto, todas as exigências legais para que dê a segurança e eficácia de produtos sujeitos à vigilância sanitária.
Nesse sentido, é imperioso o apoio político e aporte de recursos para a adequação de laboratórios públicos e privados, visando ao atendimento das boas práticas laboratoriais para implantar e desenvolver métodos alternativos válidos e passiveis de reconhecimento internacional, para impulsionar no País técnicas que possam substituir o uso de animais.
Antes de finalizar, eu gostaria de esclarecer ao Dr. Thales e à Drª Vânia que a Anvisa não levou dez anos para o reconhecimento de métodos já validados na Europa. Nos seus manuais, isso está no site da Anvisa, já reconhece, já são aceitos os métodos alternativos desde que validados internacionalmente. O que ele fez? Em uma dinâmica em que o Concea demanda às exigências reguladoras, tanto o Mapa, a Anvisa, como o Ibama, a aceitação desses métodos alternativos dentro de uma prática comum, a Anvisa já o fez assim: como já estava aceitando, apenas foi uma praxe processual que o próprio Concea estabeleceu.
Por fim, de todo o exposto, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária é de opinião pela aprovação, na íntegra, do presente projeto de lei.
Muito obrigado.
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O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Muito obrigado.
Eu passo a palavra agora ao Deputado Ricardo Izar, que é o autor do projeto de lei que estamos discutindo, embora tenhamos dois outros projetos que estão também envolvidos, que são o PLS nº 438, de 2012, do Senador Valdir Raupp; e o PLS nº 45, de 2014, do Senador Alvaro Dias.
Deputado, muito obrigado por sua presença.
O SR. RICARDO IZAR (PSD - SP) - Eu que agradeço. Agradeço a atenção do senhor e eu queria até perguntar se eu poderia dividir o meu tempo com o Frank Alarcón, que foi quem me acompanhou em todas as tratativas que nós fizemos dentro da Câmara dos Deputados. Ele é representante da ONG Cruelty Free, que foi uma das ONGs responsáveis pela campanha que houve de banimento de testes na Europa. Eu acho que acrescentaria, de forma técnica, ao que foi acordado aqui.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Antigamente diziam que o tempo é o senhor da história. Aqui o senhor é senhor do seu tempo.
O SR. RICARDO IZAR (PSD - SP) - Está bom. Obrigado, Senador.
Eu queria só, antes, me apresentar. Eu sou Ricardo Izar, sou Deputado Federal. O Senador Hélio já me conhece, somos do mesmo Partido e nós vimos trabalhando bastante, com a Frente Parlamentar, algumas políticas públicas de animais que nunca foram assunto aqui e na Câmara dos Deputados. Há muitos anos não era votado um projeto de lei que dizia respeito a animais na Casa. A Simone acompanha direitinho, ela sabe disso.
Nós abrimos uma porteira com esse PL nº 6.602. Eu acho que, de qualquer forma, independente de pessoas concordarem ou discordarem, ele foi o primeiro projeto a ser votado no plenário da Casa que fala de direitos dos animais. Isso foi um ganho. A gente já tem acordados mais alguns projetos que devem vir para plenário nos próximos meses, e tudo graças, até, à polêmica causada pelo PL nº 6.602. Eu acho que ele serviu como um projeto pioneiro.
No início, quando a gente apresentou esse projeto, ele bania totalmente o teste em animais para desenvolvimento de produtos cosméticos. O texto era simples e contemplava todo o tipo de ingrediente. Depois, quando houve a questão do Instituto Royal, aquelas manifestações, até a Luisa Mell nos ajudou, na época, ela divulgou o pedido de votação desse projeto de lei. E o Henrique Alves, que era o Presidente da Câmara, nos chamou e disse: "Ricardo, nós vamos votar esse seu projeto, porque eu estou recebendo muitos pedidos da sociedade". Então, daquele ponto em diante, a gente começou as tratativas de votação. E nós esbarramos nas tratativas que a gente fez com a Anvisa e com o Concea. Foram tratativas longas, demoradas. No início, o que foi proposto pelo Concea foram vinte anos de prazo para a validação dos testes. E a gente foi, em uma tratativa, tentando diminuir isso ao máximo, e a gente só conseguiu, no texto, manter os cinco anos.
A questão de novos ingredientes, o que ninguém está falando aqui, são fatos, são números. A gente fez um levantamento no mercado e, na Europa hoje - isso o Frank vai poder falar melhor do que eu -, apenas 1% dos produtos cosméticos desenvolvidos são feitos com novos ingredientes. Todos os outros são feitos com ingredientes já conhecidos. Aqui no Brasil, esse número é um pouco maior, chega perto de 10%.
Então, com esses dados na mão, é que nós resolvemos aceitar e negociar a questão dos vinte anos para os cinco anos, quando foi formatado o acordo.
Eu concordo com tudo o que a Drª Vânia colocou aqui, menos em um ponto. A Lei de Crimes Ambientais não é alterada com esse projeto. Pode até ter gente que fala que sim, mas eu nunca vi laboratório nenhum, no Brasil, ser fechado, porque estava infringindo a Lei de Crimes Ambientais. Eu vi, sim, o Instituto Royal ser fechado por causa de uma representação de minha autoria na Procuradoria Geral da República, por apropriação indébita de recursos federais. Por isso, sim, foi fechado o Instituto Royal.
Então, vamos deixar bem claro que essa Lei de Crimes Ambientais, sendo alterada ou não, não funciona no Brasil. Assim, o que a gente tem que ver é a questão dos testes em animais. Essa questão dos testes em animais não é o meu sonho, não é o que eu queria nesse projeto de lei. Eu a queria como a gente apresentou, mas eu percebi que é impossível. Então, eu vou deixar agora na mão do Senador Cristovam Buarque, que é o Relator, a decisão.
Eu acho que o Governo fez um acordo com a gente que não cumpriu, Senador. Ele prometeu para a gente que, se a gente votasse daquele jeito o texto, ele seria aprovado no ano de 2014. Isso seria um ganho e, pelos números, a gente estaria salvando 90% dos animais utilizados em desenvolvimento de produtos cosméticos. Não foi cumprido o acordo, o Governo não fez votar isso, mudou até o Relator - era o Senador Ricardo Ferraço, agora, passou para as suas mãos. Então, se o senhor quiser atender as emendas e fazer o projeto do jeito que a gente queria, fica à sua disposição. Mas o senhor, mais do que eu, com muito mais experiência, sabe que, quanto à probabilidade de esse projeto voltar para a Câmara e ser aprovado, a gente vai ter que esperar quatro, cinco, seis, vinte anos, talvez, enquanto, de uma forma ou de outra, ele sendo aprovado do jeito que está, estaria começando a salvar uma parte dos animais.
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Agora, eu concordo que existem, dentro da proteção animal, os bem-estaristas, os abolicionistas. Eu não sou nem um nem outro. Eu estou lutando para poder salvar de animais, e, como esse projeto salva um pouco de animais do jeito que está, por mim, eu manteria o texto como está e deixaria ser votado no Senado e já promulgada logo a lei. E entraria, na sequência, com novos projetos de lei, em que a gente contemplaria todos os tipos de ingredientes, instituições de ensino, como a gente já fez com materiais de higiene, de limpeza, etc. e tal.
Queria passar a palavra ao Frank Alarcón.
O SR. FRANK ALARCÓN - Obrigado.
Apresento-me. Meu nome é Frank Alarcón. Eu falo em nome da organização sem fins lucrativos Cruelty Free International, que foi a organização que conduziu o banimento de testes animais na cosmética na Europa, após uma luta de 20 anos, e que enfrentou, naturalmente, todas as resistências que estamos vendo serem enfrentadas aqui no Brasil.
Essa audiência, eu acho que ela veio muito oportunamente a acontecer, porque ela está mostrando, claramente, através dos discursos dos integrantes do Governo Federal presentes à Mesa, que é o Governo Federal, na pessoa da Anvisa, do Ministério da Ciência e Tecnologia, do CNPq, que bloqueiam e que impedem a implementação de um banimento imediato do uso de animais na cosmética.
Como todos ouviram na fala do representante da Concea, da Anvisa, dizem que os testes alternativos, hoje, não são possíveis de serem implementados sem o uso de animais. Inclusive, eles plantam a ideia e deixam muito claro que testes alternativos, para eles, são testes que seguem a filosofia dos três erres: a da substituição, do refinamento e da redução, ou seja, são testes que ainda empregam animais, ainda que eventualmente em menor número.
É desejo de todos aqui nessa audiência e da sociedade que o uso de animais seja completamente abolido na produção e desenvolvimento de cosméticos. Eu acho que isso é indiscutível. Justamente por causa disso, por ter reconhecido no projeto do Deputado Ricardo Izar, na sua origem, que, ainda que simples, ele buscava essa proibição plena, iniciamos uma conversa, uma tratativa com o Deputado, e, qual não foi a surpresa, encontramos grande resistência no Palácio do Planalto para poder implementar tudo isso que a Drª Vânia e o Dr. Tales falam, e que, naturalmente, é desejo da entidade que eu represento, até porque nós, da entidade, trabalhamos no mundo inteiro com essa meta.
Estamos agora trabalhando no Parlamento russo, no Congresso americano. Conseguimos o banimento, agora, na Nova Zelândia, em maio. Conseguimos o banimento na Índia. Na Tailândia, já concordaram que, até 2017, eles vão acabar com os testes em produtos acabados; em ingredientes eles ainda têm que se capacitar. No Vietnã, eles proibiram o teste Draize, mas os outros eles ainda permitem.
Ou seja, é muito claro que a resposta mundial à proibição de uso de animais na cosmética é variável, como é parte da agenda. Até porque nós conseguimos isso em 28 países na União Europeia, seria absurdo imaginar que a Cruelty Free International no Brasil tivesse outro objetivo que não esse. Aliás, toda essa polêmica da questão do 6.602 serviu para alimentar justamente a abertura de novas frentes de negociação e de proibição, inclusive em outros países da América Latina.
Volto a frisar que está muito claro que a interferência do Governo Federal na mudança desse projeto, que, originalmente, pedia, simplesmente, o fim de uso de animais em produtos cosméticos, criou toda essa polêmica. Portanto, entendo que este momento é propício justamente para deixar claro quais são os atores que estão jogando nesse jogo cruel de abuso de animal.
Talvez o representante do Boticário possa nos dar um panorama um pouco mais realista da quantidade de ingredientes novos que são usados na indústria que ele, obviamente, representa.
Na Europa, a quantidade de ingredientes novos introduzidos em produtos cosméticos gira em torno de 1% e percebo que existe um desconhecimento muito grande da legislação europeia que implementou a proibição do uso de teste de animais na cosmética.
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Por exemplo, a lei europeia não proíbe que ingredientes de uso amplo, que não sejam exclusivos da cosmética, sejam testados em animais. A proibição vale para produtos exclusivamente cosméticos, exclusivamente usados na cosmética. Nesse sentido, os ingredientes fabricados pelas indústrias, quando são gerados, sequer têm um objetivo claro de onde vão se encaixar na vasta indústria humana: alimentícia, farmacológica, bélica, cosmética.
O desenvolvimento de novos ingredientes é um processo custoso, caro, demorado e que não garante um sucesso mercadológico a quem os está desenvolvendo. Cosméticos, na sua essência, aparentam-se muito com receitas de bolo. Um bolo, por exemplo, é composto de ingredientes muito conhecidos: a farinha, o açúcar, alguma essência, no caso daqueles que ingerem ovos, ovos; mas os diferentes bolos que se encontram no mercado são resultado de diferentes combinações desses produtos que são sabidamente seguros ao uso humano. Cosméticos são, na sua essência, novas organizações, novas misturas de produtos que já se conhecem, que são sabidamente seguros ao uso humano, e, muitas vezes, cosméticos apenas são reapresentações de produtos que já se conhecem, em proporções já conhecidas, com um novo nome. O representante de O Boticário talvez possa corroborar com essa minha fala ou discordar dela.
Concluindo, entendo que emendas a esse projeto são sempre muito bem-vindas. Naturalmente, eu acho que ninguém teria coragem de dizer o contrário, até porque queremos todos o fim absoluto e imediato do uso de animais em cosméticos, produtos de higiene pessoal, perfumaria e assemelhados. Na verdade, a campanha é muito maior: queremos o fim do uso de animais em produtos sanitários. A Cruelty Free International tem como meta o fim do uso de animais em experimentação. Esse é o logo dela e essa é a tradição dela há mais de cem anos, na Inglaterra. Com o banimento, em 2013, ela entendeu que era estrategicamente correto, neste momento, começar a trabalhar amplamente, no mundo inteiro, buscando essa proibição, a que, naturalmente, ela encontra resistências, como está claro aqui, no caso do Governo brasileiro.
Emendas, entendo que são bem-vindas, mas, por outro lado, o Senador Cristovam Buarque, o Deputado Ricardo Izar e todos os outros Parlamentares aqui sabem que quando existem emendas, esses projetos, muitas vezes, caem num limbo e nunca mais são resgatados. A questão de ordem aqui é a seguinte: queremos salvar 100% dos animais, certamente esse é o nosso desejo. Na prática, o que é possível? A nossa experiência na campanha e no mundo inteiro, inclusive na Europa, onde hoje a proibição é total, para o caso de produtos acabados e cosméticos, ingredientes cosméticos, é que isso veio de uma forma gradativa. Foi demorado, foi doloroso, foi horrível, mas, a partir do momento em que determinadas parcelas dessa proibição eram contempladas, animais eram poupados de sofrimento absurdo e da ineficácia dos testes de segurança toxicológica. E certamente a Anvisa, o Concea, o MCTI discordam desse ponto de vista. A fala deles foi muito clara com relação a isso.
Então, a pergunta que a sociedade tem que fazer é: o que nós queremos? Uma proibição 100%? Certamente. Quando ela acontecerá, com esse posicionamento do Governo Federal? Sejamos sinceros. Acontecerá em dois anos, em quatro anos, em dez anos? Entendo, portanto, que a discussão que se planta é: queremos salvar uma parcela desses animais, 10%, 50%, 70% a 100%, e o que efetivamente acontece. A Cruelty Free International conseguiu resultados concretos de proibição e, no caso, de salvamento de animais.
Naturalmente... Os Estados Unidos, por exemplo, que são um poderio na indústria cosmética, resistem de toda forma a poupar que seja 1%. O texto do Deputado Ricardo Izar, na forma como foi alterado pelo Governo Federal, permite que um percentual talvez desprezível para os nossos desejos seja poupado. Cabe, então, ao Senador Cristovam Buarque e aos seus assessores entenderem se na forma como está é um ponto de partida para o melhor, que deve ser buscado sempre - certamente não devemos parar por aí -, ou se devemos fazer com que esse projeto emendado retorne à Câmara para que depois volte ao Senado sabe-se lá quando.
Essa é minha fala.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Obrigado.
Antes de passar a palavra, eu quero dizer que tenho aqui uma posição da Presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, Profª Helena Nader, e do Presidente da Academia Brasileira de Ciências, Jacob Palis.
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Eles mandaram uma carta para mim dizendo:
A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e a Academia Brasileira de Ciência vêm, por meio desta, manifestar apoio à aprovação do PLC 70/2014, de autoria do Deputado Ricardo Izar, na forma da redação final aprovada na Câmara dos Deputados, e fundamentado pela exposição que o Profº Dr. José Mauro Granjeiro, Presidente do Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal, fará na audiência pública.
O PLC 70/2014 altera dispositivos dos arts. 14, 17 e 18 da Lei nº 11.794, de 8 de outubro de 2008, para dispor sobre a vedação da utilização de animais em atividades de ensino, pesquisas e testes laboratoriais com substâncias para o desenvolvimento de produtos de uso cosmético em humanos e aumentar os valores de multa nos casos de violação de seus dispositivos.
Eu conversava há pouco com o Deputado que proíbe o uso de cosméticos em humanos. E quando começarem a fabricar cosméticos para os próprios animais, a gente vai deixar? Acho até que deveria ser "proíbe o uso de cosméticos". Ponto.
Tal vedação é para o caso de testes de ingredientes que tenham efeitos conhecidos e sabidamente seguros ao uso humano ou quando se tratar de produto cosmético acabado nos termos da regulamentação da Anvisa. (...)
Desde já agradecemos a atenção de V. Exª e solicitamos, se possível, que nossa posição seja externalizada na referida audiência pública.
Está externalizada.
Deixem-me dizer duas coisas, antes de passar a palavra, Senadores.
Quando fui instigado por ela a ser o Relator, muitos disseram: "Para que entrar num problema como esse?" Mas creio que isso faz parte de um dos problemas éticos da humanidade neste momento. E é obrigação de um Senador entrar nisso, por mais que seja polêmico e difícil.
Além disso, eu, pessoalmente, tenho uma posição - não vou dizer nem que sou simpático - de muita preocupação com o assunto, como coloquei nesse texto aqui, o qual elaborei para a Rio+20. É um livro Desafios à Humanidade - Perguntas para a Rio+20. São 250 perguntas divididas em 80 temas. Um dos temas é Animais: como respeitá-los. Esse é um dos problemas centrais nossos. Perguntas. Vai ser difícil ter todas as respostas.
Eu coloquei: Tanto quanto devem respeitar a diversidade, por meio da defesa das espécies - a diversidade defende as espécies, não defende os indivíduos -, evitando a extinção delas, os seres humanos - nós - têm diante de si o desafio de definir o tratamento a ser dado a cada indivíduo de cada espécie. Como tratar a questão do uso de animais como cobaias, ou como atração de circos e de zoológicos? Cada uma destas opções tem uma lógica própria que traz vantagens e desvantagens.
Aí coloquei, para esse tema, três perguntas: Como alimentar os seres humanos respeitando os outros animais? Até porque eles não nos respeitam, haja vista se passarmos na frente do leão. Mas como fazer isso? Nós temos consciência, o leão não tem. E nós podemos buscar alternativas, ele não.
É possível o avanço da ciência sem o uso de cobaias animais?
O futuro da alimentação estará em uma alternativa vegetariana ou química, no lugar da carnívora?
Ou seja, eu tenho estado envolvido nisso. Essa é uma das razões pelas quais, Deputado, aceitei na hora: por simpatia com a necessidade de proteção dos animais e pela preocupação com a dificuldade de decidir os limites disso. Por exemplo, aqui mesmo vou deixar uma pergunta: Como eu diferencio o uso de animais para pesquisa relacionada a cosméticos e a doenças de pele? Eu confesso que, como laico, não sei qual a diferença entre um creme para ficar mais bonito, envelhecer mais devagar, de um creme para curar um problema. Então, seria igual.
Eticamente, a gente vai colocar a defesa dos direitos animais na frente, por exemplo, das pesquisas para acabar com a raiva, com o Parkinson, com o Alzheimer, com o câncer? São questões éticas que não estão resolvidas para mim. Não fiz essa opção tão grande pelos animais contra o bem-estar e a saúde dos seres humanos. Contra os cosméticos, sim, aí não tenho dúvida, até porque poderia parecer que seria por interesse próprio, para curar careca. Não, eu sou contra para cosméticos. Mas há muitas perguntas que não estão sendo respondidas.
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Antes, porém, de fazer essas perguntas, aqui há uma pergunta que é legislativa, não é ética: "Justifica adiar a aprovação desse projeto ou não?" Eu não tenho essa resposta, até porque tenho a impressão de que o que se busca com emendas seria mais rápido com um novo projeto de lei do que com as emendas. Nós conhecemos esta Casa, hoje, e sabemos a velocidade com que anda projeto de lei quando se quer, e emendas quando não se quer: para, engaveta.
Tudo isso eu vou levar em conta no momento. Eu quero é que seja rápido e que a gente traga o máximo de proteção. Vejam, o máximo de proteção! As proteções que essa lei não traz eu gostaria de incorporar. Mas quero também que até lá a gente não trate mal os bichinhos enquanto esperam uma lei melhor.
Tudo isso eu vou ter tempo para refletir, pensar e dialogar com vocês, fora de audiência. Vou dialogar com vocês. Até lá, como o papel da audiência, eu vou deixar para ler as perguntas... Aliás, não chegaram perguntas... um momento, um momento.
Não chegaram perguntas, chegaram posições, e todas favoráveis aos animais, algumas pela aprovação como está, outras querendo emendas, mas todas favoráveis.
Eu vou passar a palavra, primeiro, como é o regulamento, para os Senadores que se inscreveram.
Em primeiro lugar, passo ao Senador Hélio José, que é o Vice-Presidente desta Comissão.
O SR. HÉLIO JOSÉ (Bloco Maioria/PSD - DF) - Queria cumprimentar o Senador Cristovam Buarque pela direção dos trabalhos. Cumprimentar todos os membros aqui presentes. Cumprimento o Sr. Thales de Astrogildo e Tréz, da Universidade Federal de Alfenas. É isso? José Mauro Granjeiro, do Concea/MCTI; Vânia de Fátima Plaza Nunes, do Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal; Ricardo Izar, nosso querido Deputado Federal, do PSD de São Paulo; Joel Majerowicz, da Anvisa; o Sr. Márcio Lorencini, do Grupo Boticário; e o nosso querido Senador José Medeiros, sempre presente também; todos os que estão aqui na nossa importante audiência pública e os nossos ouvintes.
Acho de alta relevância o projeto apresentado pelo Deputado Ricardo Izar e também pelos nossos Senadores Valdir Raupp e Alvaro Dias. O assunto está realmente na ordem do dia. Vimos há pouco tempo aquela situação em São Paulo dos cachorrinhos, que chamou bastante atenção do nosso País. A gente precisa ter clareza de uma coisa: eu sinceramente defendo a família e defendo a vida. Se tiver que fazer uma opção, eu vou optar pela vida e, em ordem de prioridade, a vida humana. Então, não vou deixar de priorizar alguma questão que tenha de ser feita para se ter a cura de um mal insanável para o ser humano.
Mas com relação à cosmética - como nosso Presidente muito bem expressou - a gente dá um jeito, vai dando um jeito. Acho que não dá para ficar causando tanto sofrimento, fazendo tanta judiação com seres que são irracionais e não têm como se defender.
Consequentemente, o projeto do nosso Deputado traz uma clareza de ação quanto a esses fatos. E não tenho dúvida, Ricardo, de que está em boas mãos a relatoria: nas mãos do Senador Cristovam Buarque. E com todo o cuidado vamos tentar juntos acelerar o máximo possível esse relevante projeto.
Cristovam já expressou essa questão das emendas que a gente tem que avaliar com mais cuidado. De repente vai atrasar mais do que agilizar. E a gente pode discutir um segundo projeto, dependendo o tipo da emenda, até para não agilizar um expediente.
Compreendo que a questão da Anvisa e a do MCTI é mais no âmbito da cautela necessária para defender a primeira premissa que coloquei aqui, que é a questão da vida, porque acho que eles não estão aí querendo defender que a empresa de cosméticos a ou b tenha primazia sobre o sofrimento dos animais nesse tipo de situação.
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Eu sou da Base do Governo, não nego. O Governo tem seus erros e seus acertos. Creio que aqui temos que fazer críticas necessárias e construtivas ao Governo, votar contra o Governo quando necessário e a favor quando o Governo estiver certo. Não é porque sou da Base do Governo que sou obrigado a votar assuntos sempre de interesse do Governo. Vou votar de acordo com a minha consciência. Sou servidor público concursado, não preciso da política para a minha sobrevivência. Estou aqui defendendo a política pelo bem do ser humano, pelo bem da sociedade, para proporcionar uma vida um pouco melhor para todos, inclusive para os nossos animais.
Sou sensível ao tema e respeito muito a posição da Ufal, uma das melhores universidades do País, com excelência na questão de tratamento de animais e da agronomia, áreas tão importantes para o País, uma universidade que eu invejo, assim como respeito a posição de todos que aqui se pronunciaram.
Eu prefiro não entrar em detalhes, apenas quero saber que posição vocês consideram mais coerente dentro dessa tese, sem esquecer a prioridade da vida humana, e também como podemos ajudar a amenizar o mais rápido possível essa situação de sofrimento extremo. Porque alguns animais sofrem para que haja, de repente, um rímel mais bonito ou mais permanente, ou um aplique no cabelo, algo assim, o que não seria o ideal.
Existe uma diversidade imensa no Brasil, muita coisa a ser descoberta em nossa natureza, na nossa Amazônia, que muitas vezes é destruída. Acabamos de discutir aqui uma lei importante, a Lei da Biodiversidade, que vai fazer com que o País seja vanguarda nessa discussão, sem que seja preciso sacrificar este ou aquele animal. Eu não sou fundamentalista, não sou radical nem conservador em relação a isto ou àquilo. Estamos aqui para avaliar a situação adequada.
Muito obrigado, Senador Cristovam Buarque. Estamos juntos nessa batalha. V. Exª conte comigo no que precisar em relação ao projeto que vai relatar.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Obrigado, Senador.
Senador José Medeiros.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Sr. Presidente, senhores palestrantes, público presente, todos que a nós assistem pela TV Senado, há poucos dias, assisti a um programa de tevê em que havia uma discussão nesse sentido. Um dos palestrantes afirmou que o não uso de animais atrasaria a ciência e que isso traria grande prejuízo. Numa linha totalmente diferente, outro palestrante contrapôs que, na verdade, o uso de animais faz parte de um ciclo arcaico e que isso atrasaria o desenvolvimento da ciência porque essa prática impediria a inovação no setor. Eu queria ouvir a opinião de vocês a esse respeito.
Outra coisa que eu queria ouvir do representante do Governo é por que o Governo é contra esse projeto.
Na linha do que o Senador Cristovam falou, há poucos dias estive no zoológico de Brasília. Meus filhos insistiram para que eu fosse, e eu confesso que saí de lá deprimido, principalmente por ter visto na jaula uma espécie de águia, pois fiquei pensando que aquele animal, que é para voar longas distâncias, está lá preso. Assim como todos os outros. Nota-se que não estão felizes ali.
Eu creio que nós estamos no caminho certo ao começar a discutir isto aqui no Parlamento, mas Hollywood já começou a discussão faz tempo. Há poucos dias, eu estava assistindo novamente ao filme Planeta dos Macacos, que é um filme antigo, mas em que já havia a discussão sobre o tema. Ele realmente nos faz pensar e nos coloca diante de um dilema.
Agora mesmo, cedo, eu saí de casa, minha filha tem um yorkshire, um cachorro pequenininho, ele tem cinco anos e não pesa dois quilos, mas é da família, precisa fazer um tratamento de tártaro e tem que tomar anestesia. E a preocupação da família, desde ontem, era em torno desse cachorro.
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Eu fico pensando, às vezes, que o nosso amor e o nosso desprendimento são um pouco seletivos, porque lá em casa, por exemplo, jamais seria permitido qualquer teste naquele cachorro, que é como se fosse... E, ao mesmo tempo, a gente... Com outros animais, às vezes, você não tem o mesmo cuidado. Eu coloco isso para dizer como é difícil resolver esse tipo de questionamento.
Há poucos dias - para a gente ver como a questão não é fácil - eu fui a um leilão, no norte de Mato Grosso. Estávamos minha esposa e eu, e eles servindo aqueles churrasquinhos ali. Os bezerros correndo, porque eles movimentam os bezerros para mostrar o lote e vender. Ela estava escandalizada com o sofrimento deles, porque estavam ali correndo, com medo e tal. Eu disse: "Pior não é situação daqueles, mas a desse bezerro que está aqui no prato!" Então, ela parou de comer, dizendo: "Não vou comer mais!" Então, o que acontece? Nós temos um dilema muito grande.
Eu queria deixar mais uma reflexão aqui, por ser também um pouco jurídica. Esse tema que estamos enfrentando, como eu já disse, é um dos mais difíceis e envolve um intricado dilema moral que implica em definição do enquadramento conferido pelo nosso sistema legislativo aos animais, que é uma questão importante de saber. Como ele se posiciona no nosso ordenamento jurídico? São eles meramente um objeto? Sujeito de direito ou uma espécie híbrida? Até por isso, trata-se de questão jurídica de alto relevo.
Um mero passar de olhos pela Constituição basta, para perceber que há princípios apontando para os dois lados. O inciso VII do art. 225 veda a submissão dos animais a praticas cruéis. Já o §1º do art. 218 trata a pesquisa básica e tecnológica como prioridade estatal, ao passo que o art. 196 põe a redução dos riscos de doenças como dever do Poder Público.
Do ponto de vista jurídico, portanto, penso que devemos buscar uma fórmula que otimize todos esses preceitos. Isso passa pela análise precisa da eficiência dos testes em questão, assim como pela ponderação dos motivos que ensejam os testes. Somente teste que seja possível servir de parâmetro para o organismo humano, assim como aves, para reduzir o risco à saúde das pessoas, são os que considero legítimos, assim mesmo com alguma dificuldade. Além disso, o grau de tolerância com as agressões orgânicas aos animais há de ser fixado conforme a essencialidade das medidas testadas. Quanto mais superficial e objetivo, menos permissivas parece-me que devem ser as normas.
Diante disso, Sr. Presidente, eu gostaria de ouvir dos convidados - eu creio que alguns até já falaram sobre o tema, mas só para ficar mais claro - se há alguma espécie de controle de eficiência dos testes para fabricação dos cosméticos. Os resultados testados se têm mostrado compatíveis com os efeitos nos humanos? Além disso, eu gostaria de ouvir alguns exemplos dos riscos que tais produtos cosméticos gerariam para os humanos.
É isso. Eu creio que não se vai resolver aqui.
Com essa pergunta eu também fico em dúvida, mas do ponto de vista pragmático, a respeito da pergunta legislativa, seria - porque aqui a gente não consegue o que quer, consegue o possível - o caso de mandar esse projeto do jeito que está já para uma aprovação e se pensar já em um outro para modernizar esse, vamos dizer assim, porque eu também concordo com que se ele voltar, vai entrar, realmente, no limbo da eternidade.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Senador, tudo isso que o senhor chamou de dilema é essa realidade que a gente vive muito contraditória, em que a ciência avança mas a ética não tanto. Ou então a ética quer avançar e não sabe como, com algumas nuance. Por exemplo, a sua relação com esse cachorrinho de vocês é uma relação de amor, de afeto, que não entra aqui.
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Aqui estamos discutindo ética, que é uma questão de solidariedade. Claro, a solidariedade, às vezes, vem de uma relação de amor, que se espalha. Mas estamos discutindo solidariedade ética.
Comecei a me afastar, embora não tenha rompido até hoje o hábito de comer carne, no dia em que estava aqui na zona rural de Brasília, convidado por um amigo que é cozinheiro, gosta de cozinhar, comendo uma carne maravilhosa, e começou a haver um barulho perto, de um bicho. Eu perguntei: "O que está acontecendo com esse bicho?" Ele disse: "É a mãe do bezerro que você está comendo, com saudades dele." Não consegui continuar. Ele disse isso com uma espontaneidade total, com uma frieza absoluta! E é uma figura humana para outras coisas.
Temos que trazer a humanidade também para a relação com os animais. Não me refiro ao animal doméstico, que, como digo, tem relação de afeto, como temos também uma relação com os nossos filhos diferente daquela que temos com os que estão morrendo no Mediterrâneo, querendo ir da África para a Europa. Assistimos na televisão e às vezes nos incomodamos um pouquinho. São dois minutos e pronto. Esse é um problema.
Outro problema são as contradições que têm entre o produto que virá do tratamento com os animais. Nem falo da alimentação que o substitui.
Por exemplo, o senhor e nós não queremos que o cachorro vá fazer o tratamento de tártaro, que é horrível! Quem já fez sabe que incomoda. Mas se fôssemos usar animais para pesquisar como cuidar dos dentes sem sofrer, como sofremos com dor na hora do tratamento de eliminar o tártaro, entre outras coisas?
É uma questão de solidariedade, de ética e de dosagem de tudo isso na relação entre os seres humanos e entre seres humanos e animais. É muito complicado.
Mas quero dizer a vocês que estou surpreso com a unanimidade que se tem aqui com relação a esse projeto e muito contente com a posição do setor industrial, que reconhece que essa lei pode ser positiva. A divergência que está aqui é na questão das emendas que visam a ampliar, e no tempo que se ganharia com isso.
Uma das coisas que vou querer ver, e foi o próprio Deputado que me trouxe a sugestão, é se, excluindo o §8º - e parece que isso atenderia a maioria - significaria uma emenda de mérito ou emenda de redação. Tenho impressão que, se for de redação, não voltaria. Tenho impressão. Não sou regimentalista. Consultei o assessor e ele acha que mudaria o mérito. Aliás, ele não disse que mudaria. Ele disse que, se mudar, volta. Vamos discutir. Talvez não mude o mérito. Não sei. Talvez seja uma questão de redação, e, nesse caso, não voltaria.
Mas fico feliz que estejamos debatendo o tema com essa complexidade, e outros virão daqui para frente, por exemplo, relacionados com droga, com o aborto, que vai chegar em algum momento aqui, a questão do direito à morte assistida. Vão chegar aqui em algum momento, e vamos ter que enfrentar esses dilemas, como disse o Senador José Medeiros.
Dito isso, passo a palavra, na ordem da direita para a esquerda, já que viemos mais ou menos assim, para responderem às perguntas. Gostaria de deixar aquela pergunta de como diferenciamos o produto que vai para cosmético do que vai para tratamento de doenças de pele.
O SR. MÁRCIO LORENCINI - Vou tentar dividir um pouco as reflexões aqui, para trazer isso para uma questão mais científica.
Acredito que a primeira questão sobre como diferenciar um produto de aplicação cosmética de um produto de tratamento é a própria definição de cosméticos que a vigilância sanitária preconiza. Se eu apresentar um produto com finalidade de tratamento, não vai ser registrado como cosmético, porque não vai passar nos critérios de análise de um produto cosmético pela vigilância sanitária. Acho que esse é um ponto de restrição bastante importante para colocarmos aqui.
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Qualquer proposta diferente daquele conceito preconizado vai ser questionada, e se não houver respostas satisfatórias, aquele produto não vai ter licença para ser comercializado como cosmético. Acho que esse é um primeiro ponto.
Uma outra reflexão com relação à quantidade de novos ingredientes... Na verdade, eu estava tentando formular um raciocínio aqui, mas a questão é que eu não sei precisar a quantidade exata de novos ingredientes que a gente coloca. Eu precisaria fazer uma análise de portfólio hoje, mas acho que uma pergunta viria um pouco antes disso: o que são considerados novos ingredientes?
Acho que essa pergunta é bastante importante quando se pensa em cosmético. Estou falando de um novo ingrediente para cosméticos, que já foi aplicado num fármaco, que já teve n testes realizados, mas nunca foi aplicado com a finalidade cosmética. Isso é um novo ingrediente? Para cosméticos, sim. Para produtos em geral, não.
Uma outra reflexão que tem de ser feita - e, no mercado cosmético, acho que a gente lida bastante com essa situação - é a questão de misturas. Muitos ingredientes considerados novos no mercado cosmético são misturas. Então, fala-se muito dos extratos vegetais, extratos de origem vegetal. O que é um extrato de origem vegetal? Isso é considerado um novo ingrediente?
Se eu considerar mistura, ela é uma nova mistura, mas, por trás daquela nova mistura, eu tenho uma composição específica de ingredientes que pode ser avaliada por métodos físico-químicos adequados, e eu posso tentar avaliar o histórico que existe para cada um daqueles componentes da mistura.
Acho importante a gente pensar nessas definições antes de ir para perguntas assim. Do contrário, a gente realmente se restringe muito. Uma nova mistura formada por ingredientes conhecidos tem um histórico; tem histórico, tem testes realizados, que podem ser utilizados e que não exigem a necessidade de novos testes, principalmente em animais.
Portanto, acho que essa é uma reflexão importante. Não sei se esclarece um pouco desse ponto, mas acho que nos ajuda a pensar a respeito disso.
E mais uma reflexão também para a gente pensar aqui é o seguinte: quando a gente fala de uma análise toxicológica, a análise toxicológica pauta-se em alguns elementos. O primeiro elemento que a gente tem de avaliar numa análise toxicológica é o nível de exposição. Há um ditado famoso que diz que tudo é veneno e nada é veneno; depende da dose.
Então, a questão é pensar no nível de exposição. Inevitavelmente, ou implicitamente, o nível de exposição de determinado ingrediente a que uma pessoa se sujeita para determinado ingrediente numa formulação cosmética é bastante reduzido, primeiro, pela concentração desse ingrediente; segundo, pelo uso tópico. Claro que é uma questão de se avaliar caso a caso, mas, no geral, o nível de exposição gerado, se a gente for avaliar a toxidade sistêmica, é muito reduzido para cosméticos, pela própria natureza do produto. Isso já é um argumento extra que nos favorece a uma análise simplificada daqueles ingredientes.
Quando vamos compor um dossiê especificamente para um produto cosmético, alguns critérios devem ser levados em conta. Então, quanto ao nível de exposição. Vou ter de levar em conta o tipo de uso que vai ser feito; a quantidade do ingrediente que vai ser aplicado na concentração final da formulação; se existe um histórico de estudos de segurança ou até de uso rotineiro para aqueles ingredientes ou para substâncias muito similares àqueles ingredientes. Outra coisa é se existem, então, os métodos alternativos que podem ser feitos para comprovação simples de eficácia. Por exemplo, para irritação dérmica ou irritação ocular, já temos métodos valiados. Isso já supre uma quantidade imensa de avaliações que podem ser feitas, para não falar todas - eu acho que mais de 90% das análises que a gente precisaria fazer.
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Aí, eu acho que a questão é que, se, com tudo isso, ainda restarem dúvidas com relação ao ingrediente, com relação ao componente, cabe um posicionamento corporativo, que, no nosso caso, é: se for para teste em animais, nós não vamos aplicá-lo neste momento. Então, essa é a posição que a gente adota como Grupo Boticário e como empresa hoje.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Dr. Joel.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Mas a minha pergunta é durante o processo de pesquisa para desenvolver o produto.
O SR. JOEL MAJEROWICZ - Obrigado.
Acho que o Dr. Márcio Lorencini já respondeu grande parte das perguntas que me caberiam, mas é importante alertar, na sua fala, de que extratos de plantas que são conhecidos e são misturados, se nunca foram misturados, a gente tem um fator adicional a isso tudo que deve ser avaliado. Pode haver uma adição de componentes que levem a efeitos que eles sozinhos não apresentem, numa nova formulação. Então, essa é a preocupação da Anvisa.
Eu gostaria de reforçar a questão de que a competência da Anvisa abrange tanto a regulamentação sanitária quanto a econômica. A gente não pode deixar de considerar que o mercado nacional, em termos de cosméticos, é um mercado crescente. Basta a gente olhar uma publicação da ABIHPEC, que diz que em aproximadamente um ano nanomateriais de referência para aplicação em produtos de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos, por meio da nanotecnologia (nanomateriais), que darão maior valor agregado, tecnologia e competitividade ao setor, poderão estar à disposição da indústria, pela primeira vez na história do País.
Ou seja, novos produtos oriundos de nanotecnologia poderão ser aplicados sem nenhum tipo de segurança? Nós estamos falando de materiais como ouro, dióxido de titânio, óxido de zinco, dióxido de silício. Quais são as implicações nas doses desses produtos em um componente cosmético? Basta dizer que a Anvisa precisa estar, e está, sempre atenta à questão regulatória e à questão sanitária.
Por exemplo - temos dado aqui vários exemplos -, numa viagem de volta do Rio de Janeiro a Brasília, eu peguei... Não vou dizer qual a companhia aérea e nem o produto, mas havia uma propaganda de um sabonete em forma de picolé. Ou seja, o fabricante não sinalizava que aquele produto era para uso humano, simplesmente fornecia um sabonete em forma de picolé com odores das frutas. Tinha de melancia, de manga... Eu não lembro quais deles. Essa é uma infração sanitária grave, porque isso, na mão de uma criança, possivelmente vai ser levado à boca, e o produto cosmético, um sabonete, não pode ser ingerido. Então, a gente deve ter muito cuidado com o que vem ao mercado. E este é um exemplo de que a gente não pode descuidar, como agência reguladora nacional - e todas as agências reguladoras precisam olhar para a sua fatia do mercado, e a Anvisa não faz diferente -, da preocupação, porque erros acontecem, equívocos acontecem e podem levar a um grande agravo da saúde da população.
O Senador Cristovam Buarque disse que o Márcio já respondeu sobre a diferença entre cosmético e produto para tratamento de pele. Na realidade, quando a indústria vai à Anvisa peticionar um registro, ela já diz claramente para que é e segue todos os protocolos dentro dos registros que a Anvisa exige para caracterizar como cosmético ou como produto farmacológico, de tratamento para saúde.
O SR. MÁRCIO LORENCINI - Ele sabe que vai ser para cosméticos ou...
O SR. JOEL MAJEROWICZ - Não, normalmente, é o que hoje faz a Europa.
A Europa aboliu o uso de testes para cosméticos em animais, mas o próprio Alarcón já falou aqui, já deixou bem explícito que se desenvolvem os produtos e depois se define o que são. Então, na realidade, estão-se desenvolvendo produtos usando animais, fazendo testes de fototoxicidade e outros que usam animais e, no final da história, ele serve para cosmético, e vira produto cosmético regular no País.
Então, essas questões não são claras ainda no desenvolvimento do produto. No desenvolvimento do produto não está claro que é para cosmético. O que a proposta do Deputado Ricardo Izar traz é exatamente para cosmético, e a preocupação da Anvisa é exatamente no sentido de que novos ingredientes ou nova mistura de ingredientes conhecidos que nunca foram associados não venham causar dano à saúde da população.
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A gente tem aqui claramente duas posições. Uma posição é a abolicionista. Não sou contrário à abolição, a minha formação é medicina veterinária, não sou contrário, mas, como havíamos conversado na salinha com a Profª Vânia, tudo é um crescimento, tudo é uma evolução da ciência. Hoje, impedir que a ciência use animais de laboratório, que é um padrão ouro, não é um padrão que não foi validado, mas é um padrão ouro que vem se mostrando eficiente...
Tanto é eficiente que hoje, no Brasil, nós temos o melhor programa de imunização do mundo. A varíola foi erradicada; hoje, nós temos um índice muito baixo de poliomielite, sarampo, febre amarela. A melhor vacina do mundo, a única produção de talvez 90% da produção mundial está na Fundação Oswaldo Cruz, em Biomanguinhos, é a produção de febre amarela. E todos eles usam animais na sua produção ou nos seus controles.
Abolir o uso de animais de uma vez, sem levar em consideração todos os prejuízos que possam trazer à população e à nação brasileira, desculpe a expressão, mas se é para ser enfático como eles estão sendo, é uma irresponsabilidade.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Eu só queria dizer que nós conseguimos abolir poliomielite, varíola, qual outro?
O SR. JOEL MAJEROWICZ - Eu chamaria de doenças negligenciadas: a fome e a pobreza.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Agora não abolimos analfabetismo, não abolimos fome. Sabe por quê? Porque essas duas não pegam. Você chega junto de uma pessoa com fome e não fica com fome. Se você tiver contato com uma pessoa com poliomielite, pode ser contaminado. Aí a elite brasileira...
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Mas são negligenciadas por isto, porque não pega na elite, não são transmissíveis. A elite resolveu o problema das doenças que vêm de vírus, porque, se não resolver no pobre, chega para ela. Aí resolveu. Mas a que não chega fica negligenciada. Por isso que há tanto esforço para uma porção de tantas outras doenças e não para algumas que contaminam as massas.
Deputado Ricardo Izar. Ofereci a ele ser o último a falar, como autor do projeto de lei, mas ele disse que falará igual aos outros.
O SR. RICARDO IZAR (PSD - SP) - É rapidinho.
Eu queria só responder algumas perguntas que o Senador José Medeiros e o Senador Hélio José fizeram.
O Senador José Medeiros perguntou qual é o atraso da gente não ter uma legislação que proíbe a utilização de animais para cosméticos. A gente tem dois tipos de atraso: o atraso moral, que é a questão do respeito aos animais, e o atraso mercadológico. Esse atraso mercadológico representa hoje, segundo estudos que a gente fez, levantamentos junto ao MDIC, o impedimento da exportação de €900 milhões de produtos cosméticos para a Europa, já que a Europa não aceita a compra de países que ainda utilizam esses métodos.
O segundo ponto que o Senador José Medeiros levantou é quanto à natureza jurídica, porque como o animal está enquadrado hoje... Já tramita na Câmara dos Deputados um projeto de minha autoria, que é o 6799 - inclusive dia 16 agora vai haver uma discussão com todas as OABs do Brasil -, que altera a natureza jurídica do animal. Ele deixa de ser uma rês, como é tratado no Código Civil, uma coisa, e passa a ser um sujeito sui generis, aquele que tem direitos, mas não tem deveres. Eu acho que esse projeto vai ser um grande ganho para a questão dos direitos animais no Brasil.
Quanto à pergunta do Senador José Medeiros, se não seria melhor aprovar esse projeto e dar entrada em outros projetos, acho que esse seria o melhor caminho. Minha opinião é essa. Inclusive, se a gente conseguisse suprimir o §8º, como foi colocado aqui, sem alterar o mérito, ele não voltaria. Então, seria um ganho grande para o projeto a supressão do §8º e, posteriormente, a gente daria entrada em outros projetos, a exemplo dos que já existem, que tratam de materiais de limpeza e outros fatores mais.
Queria aproveitar que estou aqui com a Anvisa e com o Consea e perguntar o seguinte: será que, em vez de ser feito o investimento altíssimo na Rebiotério, a rede de biotérios que está sendo desenvolvida e que vai utilizar mais de cinco milhões de animais envolvidos, não seria melhor investir no desenvolvimento e na tecnologia de técnicas substitutivas e alternativas?
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Para complementar, eu queria só colocar um ponto do qual muita gente aqui está falando: existe uma grande diferença entre testes alternativos e testes substitutivos. Digo isso principalmente para os Senadores ficarem sabendo que o alternativo, muitas vezes, pode até diminuir só o número de animais, como a Drª Vânia falou, mas que o substitutivo elimina a utilização de animais. Hoje, na Europa, os testes alternativos continuam sendo utilizados. Isso é bom a gente frisar aqui.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Muito obrigado, Deputado.
Com a palavra, a Drª Vânia.
A SRª VÂNIA DE FÁTIMA PLAZA NUNES - Muito obrigada.
Na verdade, já foram feitos tantos esclarecimentos aqui, mas eu gostaria de fazer algumas colocações.
Primeiro, é o seguinte: quando a União Europeia definiu pela proibição, ela, realmente, já tinha feito todo esse protocolo prévio de análise, de validação de testes e tudo mais, e a Índia, quando assumiu esse papel de buscar essa proibição, fez isso no prazo de um ano, ou seja, isso foi dado como prioridade.
Também acho, senhores, que a sociedade... O senhor mesmo, Deputado Ricardo Izar, colocou que o que ocorreu no Instituto Royal e a rapidez com que algumas coisas tramitaram - inclusive, a própria lei inicial, como o senhor colocou - deveram-se à mobilização da sociedade em prol da mudança que nós queremos. Aqui, onde nós estamos, há a representação da sociedade brasileira, que se mobilizou fortemente.
Então, acho que a gente precisa tomar cuidado para "não jogar fora o nenê com a água do banho", como diz o ditado popular. Aproveito o que os meus colegas e companheiros de mesa colocaram, porque a gente tem de tomar muito cuidado. Por exemplo, há riscos, e, na verdade, a gente deu uma moratória desnecessária para muita coisa que já está resolvida. Então, nisso a gente tem de pensar.
Eu gostei muito do que o senhor disse: que, talvez, exista uma alternativa dentro da tramitação, para que a gente possa achar uma solução, melhorar e, aí sim, correr atrás de outras coisas. Mas temos de tomar bastante cuidado e, realmente, olhar para todos os lados.
Por isso, senhores, quando fiz minha apresentação, tentei pegar tópicos que estavam muito claros e subentendidos. Na verdade, é o que vai acontecer. Na verdade, acho que isso é uma coisa bem clara.
Eu queria deixar claro algo que, quando falei, não coloquei: seres sencientes - digo isto para quem nunca ouvir falar neste termo - são os seres capazes de ter sensações de alegria, de felicidade, de tristeza. Os animais são capazes disso. Já existem trabalhos científicos mostrando isso em todos esses animais que são usados pela ciência para testar aquilo que nós usamos, independentemente do que seja, que, neste caso, são principalmente os cosméticos. Mais do que isso, quando eu disse que, em 2012, foi feito o reconhecimento e a publicação de que os animais são conscientes em escalas diferentes de consciência, eu o disse porque esse é um fato.
Adorei o que o senhor falou: como é difícil a gente tomar uma decisão! Temos de enfrentar esses problemas. Não dá para a gente continuar gerando conhecimento científico, conhecimento científico, conhecimento científico, para guardá-lo na gaveta. O conhecimento científico se justifica em todas as áreas, inclusive na moralidade e na ética, para que a gente, na verdade, coloque isso na prática da nossa relação social.
Quanto mais violência se gera, mais violência... E a gente faz de conta que não está vendo. Eu também gostei muito do que o senhor falou em relação ao que está acontecendo com populações do mundo que estão sendo mortas única e exclusivamente por diferenças.
Então, acho que a gente está precisando pensar nisso. Neste momento, temos de pensar nisto aqui. Nós vamos continuar achando que podemos deixar para depois? E nós não precisamos reinventar tudo. Já existe muita coisa pronta que nós podemos adotar.
Para mim, ficou muito claro que, realmente, cada um olha para as coisas de uma forma, quando o Márcio fez uma colocação em relação à combinação de alguns produtos e aos nomes que se colocam.
Dr. Joel, na verdade, quando falei a palavra "cosméticos", eu o fiz por essas questões, que não estão claras. Entendeu?
Então, a gente precisa tomar cuidado. O passo que vamos dar é bastante importante. Se existir uma alternativa para que possamos garantir isso definitivamente e ponto, ótimo! Senão, é melhor que nós repensemos. Por quê? Preocupa-me quando o senhor diz que a Lei nº 9.605 não é uma lei aplicável. Olha, eu moro numa cidade e milito, trabalho na proteção animal há mais tempo até do que existe a lei. Posso lhe dizer que ela já foi muito útil e aplicável para punir muita gente onde eu moro, uma pequena cidade no interior do Estado de São Paulo, que é Jundiaí. O senhor é de São Paulo e a conhece, com certeza.
Então, na verdade, o que a gente colocou ali é que existe um conflito. No que está sendo proposto, dando um prazo de cinco anos, a gente vai continuar dizendo - e já dissemos isto hoje - que os animais, pela Lei nº 9.605, não podem ser submetidos à crueldade, a maus-tratos, a abuso e à negligência, quando existem técnicas alternativas. E isso hoje já acontece. Então, vamos protelar por mais tempo que isso continue a acontecer?
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A lei só é aplicada quando, de fato, nós olhamos para ela, tiramos da gaveta e tomamos uma atitude.
Se nós vamos ter que cancelar e começar de novo, vamos fazer, pegar o que está pronto e colocar em prática em um ano aqui. (Palmas.)
A SRª VÂNIA DE FÁTIMA PLAZA NUNES - Eu recebi uma pergunta da Simone Lima, da ProAnima. Ela pergunta o seguinte: "Gostaria que comentasse sobre o perigo de não haver uma proibição de vendas de produtos importados no PL, ao contrário do que foi estabelecido na União Europeia, na Nova Zelândia e na Índia."
Temos mais esse problema. Há mais um detalhe: como vai ficar a comercialização de produtos que foram testados nos animais aqui dentro do nosso mercado brasileiro? Já que nós temos tantos interesses comerciais, e podemos usar algumas vezes essas prerrogativas para muitas negociações, acho que esse é um outro ponto que não foi abordado - muito bem lembrado pela Simone -, e precisamos também entender como ficamos. Isso vai estar dentro desse projeto de lei, isso vai ter que ser uma lei nova, mas é um assunto que, infelizmente, não foi tratado.
Por que não? Nós não somos capazes? É claro que somos! É claro que nós somos! Nós somos e nós estamos dentro da Casa que define a prioridade das coisas. Quem sabe, havendo essa coragem, enfrentando isso, nós vamos conseguir mostrar que é possível mudar posturas éticas e morais dentro da nossa sociedade com clareza, porque é por pequenos passos que se constrói uma grande transformação na sociedade.
Eu queria que vocês, como Comissão, tivessem a delicadeza e o cuidado de analisar cada um desses passos, porque, com certeza, esse e outros temas tão mais delicados, como o senhor colocou, precisam ser, de fato, entendidos. E entender que nós saímos, há muito tempo, do termo de que os animais são seres irracionais. Não. Os animais são seres sencientes, reconhecidos já, há mais de 18 anos, no mundo todo pela ciência, como seres sencientes. A ciência do bem-estar animal trouxe isso.
É importante deixar claro que a ciência do bem-estar animal não tem nada a ver com nenhum movimento abolicionista ou bem-estarista que exista. Acho que precisamos separar as coisas. Na verdade, elas nos fornecem, sim, cada vez mais argumentos para entendermos que tudo o que nós fazemos pelos animais é entendido por eles de alguma forma. Por isso, moral e eticamente, nós precisamos defendê-los.
Era isso. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Duas coisas. Primeiro, há uma pergunta aqui que chegou do público para você.
O SR. RICARDO IZAR (PSD - SP) - Em relação a essa questão dos ingredientes importados, Simone, foi feita, na época, uma emenda no plenário que foi rejeitada pelo Deputado Sávio. Está sendo feito um novo projeto de lei. Só que só se pode dar entrada nesse projeto de lei depois que este já não estiver na Casa, se não ele vai ser apensado. Então, estamos usando as estratégias regimentais para poder dar prioridade ao projeto.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Fiquei com uma dúvida. Você fala que haveria um retrocesso, mas as leis que estão aí em vigor continuam. Essa aqui traz mais...
A SRª VÂNIA DE FÁTIMA PLAZA NUNES - Não, não. Infelizmente, Senador, na verdade, não é bem assim. Nós, na verdade, precisamos tomar bastante cuidado, porque a organização e a forma das palavras muitas vezes podem gerar mais do que uma interpretação, que é o que está acontecendo. Se pudéssemos voltar, na verdade, na colocação, eu deixei apontado. Isso ficou disponível, mas como, às vezes, eu usei como uma tarja em cima, quando você imprime, não sai; sai a tarja em cima. Então, nós podemos, na verdade, colocar. O problema também é que, por exemplo, só se suprimiu o 8; o 7 é muito inócuo. Portanto, precisamos ponderar exatamente o que vamos conseguir avançar.
Represento aqui o Movimento de Proteção Animal, que é o Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal. Temos mais de 100 entidades. Temos uma rede de afiliadas, e, antes de vir aqui, discutimos a matéria amplamente dentro de uma rede de afiliadas nacional, para saber qual era a posição que traríamos aqui. É lógico que achamos a iniciativa do projeto de lei maravilhosa, sem dúvida. Isso é inquestionável, mas nós precisamos entender o que vamos escrever ali, porque, muitas vezes, prazos dão alternativas para que situações críticas se mantenham. E o que é pior: com a anuência de uma lei. A lei está autorizando que aquilo continue.
Precisamos, realmente, entender exatamente, pegando a lei como um todo, onde é que vamos aceitar ou não aceitar as coisas.
Honestamente, como eu disse, e quero repetir, existe legislação mundial proposta em outros países que se adequam muito bem à nossa realidade, sem grandes problemas, de forma muito simples. Por que não fazer o que fez a Índia? Quer um país maior que a Índia, muito maior que o nosso e que vem crescendo no mercado comercial mundial?
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Se eles foram capazes de fazer isso, com toda aquela diversidade que eles têm, por que nós não podemos tentar fazer algo semelhante? Não sei se esse é o caminho. Eu estou fazendo uma proposta dentro daquilo que vemos como factível, possível e adequado.
Acho que temos de pensar nisso, sim, Senador, porque nós podemos ter problemas. E acho que nós não podemos mais andar para frente e para trás ou andar de lado, que nem caranguejo, achando que já avançamos muito, mas avançamos muito pouco, depois de todo o trabalho de tramitação de um projeto de lei como vocês aqui estão colocando. Acho que a sociedade, do lado de fora, está esperando desta Comissão e do andamento dessa lei uma proposta que, de fato, tire os animais do sofrimento a que são submetidos hoje em dia sem nenhuma necessidade.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Passo a palavra ao Dr. José Mauro Granjeiro.
O SR. JOSÉ MAURO GRANJEIRO - É favorável à aprovação do PL 70. Foi a conclusão da minha fala.
O SR. JOSÉ MAURO GRANJEIRO - Obrigado, Senador.
Eu vejo que nós temos uma grande convergência. O Concea não é contra o PL; ao contrário, é favorável.
O Sr. Frank...
O SR. JOSÉ MAURO GRANJEIRO - Eu vou explicar para a senhora. Só um instantinho.
Segundo os dados do próprio Sr. Frank, 99% dos produtos são ingredientes conhecidos. Eles vão entrar no primeiro trecho da regra e, portanto, não vão requerer testes em animais.
Por que a ressalva dos cinco anos? Acho que esse é o ponto crítico. Não é por conta de cosméticos, especificamente, porque o método alternativo é destinado a qualquer composto químico, independentemente da sua aplicação.
O Concea é absolutamente consciente de que os animais são seres sencientes, tem uma preocupação enorme com essa questão, mas existe aqui um momento de transição, que vou endereçar daqui a pouco em resposta ao Deputado Izar.
Volto à questão do 1% ou de por que esse prazo. Lá no Concea, inicialmente, pensamos em um ano, três anos, cinco anos, e acabamos propondo os cinco anos, junto com a discussão com o Deputado Izar. Por quê? Hoje, não há laboratório no Brasil capaz de realizar qualquer um desses ensaios alternativos em condições de BPL. Não temos! Há um laboratório que pode fazer o teste de cometa in vitro. Então, se a mudança for imediata, a repercussão também é imediata. Os representantes de O Boticário, da Natura podem todos atestar que eles acabam mandando os ensaios para fora do País.
Concordo com a Drª Vânia com relação à questão do investimento, mas foge do âmbito do Concea a capacidade de gerir isso. Nós, quando estabelecemos a regulamentação, nos preocupamos, sim, com a questão dos animais, mas também com a questão dos animais "barra" humanos e do meio ambiente com relação à aplicabilidade dos ensaios. Eu gostaria muito, gostaria muito de, saindo daqui, ter a certeza de que, daqui a seis meses, a um ano, nós tivéssemos uma rede de laboratórios minimamente capacitada a realizar esses ensaios que estão propostos. Minimamente capacitados. Esse é um aspecto.
No outro 1%, não tenho dúvida, como a própria indústria já se manifestou, que, em função da vocação da indústria brasileira, pouco se faz ingrediente novo; busca-se a recombinação, e não se fazer testes em animais. Então, praticamente não haverá testes em animais. A preocupação maior é com o sentido da história, o sentido do teste. Esse é um aspecto.
O outro aspecto é com relação à questão que a Drª Vânia colocou de interesses ocultos, porque o Concea pediu esse prazo. Não é oculto; é isso que estou dizendo. A nossa preocupação é ter laboratório capaz de fazê-lo.
Tanto o Thales quanto o Frank comentaram sobre a questão de o método de validação se reportar aos animais. Então, quero fazer um raciocínio - é claro, há diferentes opiniões - com o seguinte exercício: olhando a história da humanidade, do ponto de vista da longevidade e qualidade de vida, há dúvida de que evoluímos? Não. Há produtos mais seguros do que antes? Há. Em média, há. As pessoas têm melhores condições de vida?
(Intervenção fora do microfone.)
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ORADORA NÃO IDENTIFICADA (Fora do microfone.) - Depende.
O SR. JOSÉ MAURO GRANJEIRO - Dependendo do padrão social, sim. Estou considerando o Primeiro Mundo.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. JOSÉ MAURO GRANJEIRO - Há falhas nos atuais sistemas preditivos nos animais? Sim. Sim, há falhas, o Thales mostrou. Mas ele mostrou dois números sobre os quais quero refletir. Sessenta por cento de correlação do animal, não humano e humano; na questão hepática de 13% a 33% dos testes hepatotóxicos não têm correlação. Vamos inverter o número? Se de 13% a 33% não têm correlação, significa que de 87% a 70% têm correlação. Olhem, entendam, como eu disse na minha apresentação, nós queremos evoluir para um sistema melhor, que não use animais. Tenho muito medo, Senador e Deputado, de apostar naquela velha história de que com um tiro resolvo todos os problemas.
Respondendo à pergunta do senhor: investir em rede de biotérios ou investir em novos métodos alternativos? Acredito completamente que em ambos e vou dizer por quê. Por que métodos alternativos? Nós temos de avançar, nós temos de apresentar modelos que independam de animais, deve haver recurso. Os europeus, que desenvolveram todo esse processo de banimento, fizeram-no em cerca de 20 anos com cerca de €300 milhões. Os americanos resistem e colocam fortunas no desenvolvimento dos sistemas de testes integrados à toxicologia do século XXI em alta capacidade de avaliação de ômicas para se livrar dos testes de animais e é lá que nós temos de ir, com certeza. Mas, quando se tira hoje uma referência que - vamos lá - no limite está a 50% ou 60% de previsão, a gente evita muito efeito indesejável, evitamos algum. Se tirarmos completamente, o que restará? Alguém fez esse estudo? Excluir completamente... Estou falando em termos gerais. Voltarei à questão do cosmético.
Respondendo à sua pergunta, Sr. Deputado, sim, temos de investir em métodos alternativos pesadamente. Mas, como o nosso colega Thales apresentou, 90% da pesquisa com animais não é para ensaio toxicológico, é desenvolvimento: câncer, vacina, doenças parasitárias, doenças negligenciáveis fora fome e pobreza, analfabetismo. Nesta outra situação, vemos uma outra realidade. É fato, existe uma publicação da Nature que mostra limitações do modelo in vivo.
No ano passado, em 2014, a própria Nature publicou um estudo reavaliando 64 trabalhos exclusivamente voltados ao estudo de câncer in vitro, estudos in vitro para análise de câncer, e apenas 20% foram repetidos. O nosso mundo hoje - não é Brasil, não - vive um desafio tremendo em termos da reprodutibilidade de resultados publicados em revistas científicas, seja usando animais, seja usando células in vitro. Vou dar um exemplo da parte de célula, porque, como servidor do Inmetro na área de bioengenharia, eu trabalho com um programa de células de qualidade certificada. Por que o Inmetro está preocupado com isso? Porque as células utilizadas nos ensaios in vitro e utilizadas na terapia celular de doenças devem estar livres de contaminantes. O Brasil apresenta hoje, em média, cerca de 30% das células utilizadas em ensaios toxicológicos contaminadas com microplasma. É uma mínima bactéria que contamina a célula e enviesa, altera os resultados. Nós temos... Isso é a média mundial, e o Japão, em 2008, atingiu 80% de contaminação.
Há uma publicação demonstrando que a média mundial de células não autênticas é da ordem de 10%. O que são células não autênticas? O cientista utiliza uma célula para um estudo sobre câncer, sobre toxicologia achando que é uma célula humana e é de camundongo; ou ele acha que célula é do intestino e ela é da glândula mamária. Isso é uma realidade, senhores e senhoras. Eu peço a atenção de vocês para isso: é um desafio mundial melhorar a qualidade da pesquisa científica.
E aí, eu volto à questão que o nobre Senador colocou sobre a pesquisa: com animais atrasa ou sem animais atrasa? Quem atrasa quem? Eu entendo justamente que é um momento de transição.
ORADORA NÃO IDENTIFICADA (Fora do microfone.) - Não, depende do que é qualidade de vida.
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Nós temos de somar forças para evoluir do que temos hoje de in vivo, que, bem ou mal, com as restrições que ele apresenta, nos dá alguma direção, para um sistema melhor, mas esse sistema melhor não é imediato, não será amanhã, não será daqui a dois anos.
Somos a favor do PL 70. Argumentamos com os senhores e as senhoras, os Exmos Legisladores, a respeito da necessidade de equipar o parque de laboratórios do País, porque, do contrário - nós temos uma pequena cidadã aqui -, todos nós estaremos expostos a produtos que, se os testes forem malfeitos ou realizados em condições inadequadas, mais mal farão do que bem. O teste in vitro, com célula contaminada, dá resultado incorreto, com certeza.
O SR. JOSÉ MAURO GRANJEIRO - Onde vamos apoiar a saúde da nossa população humana e dos animais não humanos e o risco para o meio ambiente? Nessa seara, entra agrotóxico, entra aditivo alimentar.
O meu caro colega Joel comentou das nanotecnologias. Dióxido de titânio é um corante usado em várias fontes, é usado largamente, é seguro. Que outros produtos virão cujos comportamentos não conhecemos?
(Soa a campainha.)
O SR. JOSÉ MAURO GRANJEIRO - Só para concluir.
Somos favoráveis ao PL. Eu argumento pelo tempo de transição para aquele mínimo percentual que vai ficar resguardando o ingrediente novo, que, no contexto nacional, deve ser desprezível ou inexistente. Mas apoiamos o PL.
(Soa a campainha.)
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Aqui chegou uma pergunta dirigida ao senhor: "Em que etapa está o fornecimento de informações solicitadas nesse requerimento?" Não sei qual o requerimento. Neste aqui, não há. É algo de abril de 2014.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Mas o que há aqui de informações?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - É, não há.
A SRª VÂNIA DE FÁTIMA PLAZA NUNES - Desculpe, mas está falando aqui: altera o dispositivo para dispor sobre a vedação e a utilização de animais em atividade de ensino, pesquisa e teste de laboratório com substâncias... É esse projeto aqui.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Sim, mas quais são as informações solicitadas?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Não.
Bem, Thales, por favor.
O SR. THALES DE ASTROGILDO E TRÉZ - Como eu sou o último a falar, talvez já a maioria dos esclarecimentos tenham sido feitos.
Um último comentário talvez seja de que por trás dessa discussão toda há a questão da cultura científica sobre o que estamos testemunhando agora. Realmente, é uma transição o que está acontecendo. Se pegarmos o discurso há dez anos aqui, no Brasil, havia uma polarização bastante forte, com a posição dos cientistas, dos pesquisadores bastante firme no posicionamento em relação à modelagem animal; hoje, já vemos um discurso que não é tão polarizado, em que se reconhece, inclusive, o potencial das novas tecnologias, inclusive, como o próprio Granjeiro falou, reconhecendo os limites dessas tecnologias e sabendo que esses limites estão sendo também aperfeiçoados ou melhorados.
As boas práticas de laboratório, por exemplo, são um caminho possível de incremento dessas novas tecnologias. Então, percebemos que essa autocrítica por parte da própria ciência vem acontecendo e vem provocando, naturalmente, resistência, principalmente por parte dos órgãos reguladores, o que é um comportamento natural dos órgãos reguladores, e por parte de muitos cientistas que, biograficamente, têm um envolvimento com a pesquisa com animal, com a cultura da experimentação animal. Então, é natural que, ainda que haja convergências, se percebam, de formas ainda bastante distintas, os papeis que a modelagem animal e outras modelagens representam para o avanço científico. Eu acho que isso ficou muito claro aqui hoje.
Em relação aos encaminhamentos do PL, eu confesso que sou leigo. Eu acho que está em boas mãos, as do Senador Cristovam Buarque e da Comissão de Ciência e Tecnologia, para fazerem o encaminhamento o melhor possível, a partir das reflexões que foram tecidas hoje aqui.
Como muito já foi dito, só para finalizar um pouco, não podemos pensar também, dentro dessa controvérsia científica... Identificamos um dilema moral muito claro, isso está muito bem definido, e existe um dilema científico também muito claro.
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Só que dentro desse dilema, a gente não pode pensar a resolução numa saída, por exemplo, de ganhar ou perder, necessariamente. Há quem entenda, dentro da ciência, que, enfim, a experimentação animal provocou uma série de atrasos, de retardo no desenvolvimento de terapêuticas humanas. Tendo a me identificar, a me simpatizar com essa perspectiva, mas a gente pode entender também, a partir do que foi falado aqui, que essas inovações podem gerar um resultado ganho a ganho. Quer dizer, o ser humano não precisa sair perdendo com essas inovações, nem os animais também precisam. Aliás, os animais são os sujeitos em questão que precisam talvez mais sair dessa situação na qual se encontram já durante muito tempo.
Eu queria solicitar ao Senador Cristovam Buarque, talvez aproveitando uma fala mais reduzida... Eu vi que o George Magalhães solicitou a fala, e ele é uma das pessoas que representam um movimento importante de defesa dos direitos animais e queria solicitar à mesa e ao próprio Senador se há interesse de ouvir brevemente a exposição do colega.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Claro, eu só queria antes ler aqui as perguntas que chegaram. Aliás não são perguntas, são posições.
Um que vem de alguém daqui que não colocou o nome:
"O Boticário diz que é completamente possível inovar na área de cosméticos sem testes em animais."
"Anvisa e Concea defendem o projeto como está."
"As sociedades de proteção animal são contra o projeto de lei como está, pois ele é inócuo. Ou assim perdurará para a gente fazer uma proibição maior."
Não é uma pergunta é uma colocação separando os dois grupos.
Agora, vejam o interessante. Há uma participação muito grande, todas contra o uso de animais. Alguns contra o projeto, outros não.
Tem um que deixou uma pergunta interessante, colocando dúvida.
Como tem gente que mandou diversas mensagens, não vou ler todas. Mas vou ler de todo mundo.
Paula Nasser: "Os testes com modelos animais não são indispensáveis. Esse argumento é cientificamente equivocado."
João Valentim: "A questão é que quando se precisar de um remédio para o filho ou para a mãe, o brasileiro vai exigir a importação deste dos Estados Unidos, onde esse remédio foi desenvolvido em animais. Assim fica a pergunta: qual a diferença entre um animal americano e um animal brasileiro?"
Pelo menos entre os animais eu não sei, mas entre os americanos e os brasileiros é que nós teremos uma ética de proteção aos animais que eles não têm. E é cosmético e não remédio.
Letícia de Oliveira: "Chega de testes em animais."
Catharina Camargo: "Bom dia. A sociedade quer o fim dos testes em animais. Porém, o PLC 70, de 2014, precisa de emendas para garantir a proibição total dos testes em animais, inclusive a proibição de importação de produtos testados em animais."
Caipi Violet Paula Ferreira fez muitas colocações, mas resume tudo nisso: "Existem outras maneiras de testar medicamentos sem precisar utilizar animais."
Ivana Moraes: "Basta de exploração de inocentes. Fim dos testes em animais."
Gisele Kam: "Os animais que foram resgatados no Instituto Royal são a prova de como os testes no Brasil não seguem nenhum padrão, servem apenas para fazer essas empresas lucrarem."
Catharina Camargo: "Esse PLC 70, de 2014, não pode ser sancionado dessa forma. Por favor aceitem emendas para que seja garantida a proteção dos animais utilizados em testes."
Christiane Cordovil dos Santos: "Sou contra o PLC 70, de 2014, que dispõe sobre vedação da utilização de animais em atividades de ensino, pesquisa e testes laboratoriais. Acredito que há outros métodos."
Antônio Carlos Pesce: "Totalmente contra."
Katiucia Ribeiro: "Sou totalmente contra o uso de animais para teste."
Luan Chahim: "Teste com animais. Um crime de que iremos nos arrepender no futuro, assim como nos arrependemos da escravidão e da violência contra as mulheres."
Essa é uma das raras unanimidades que eu já vi nesta Casa.
Com a palavra, pedimos só que em pouco tempo, porque já está ficando muito tarde.
O SR. GEORGE GUIMARÃES - Serei breve, Senador. Obrigado, Thales, pela solicitação.
Obrigado, Senador, pela permissão. Senador que eu já admiro de outras frentes de luta.
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Meu nome é George Guimarães. Sou presidente da ONG Veddas e estou aqui hoje, na verdade, representando 32 organizações não governamentais que estão participando junto à campanha "#alterapl6602", que foi lançada logo após a sua aprovação na Câmara. Eu também faço parte da comissão permanente antivivisseccionista da Assembleia Legislativa de São Paulo. Hoje, no Estado de São Paulo, é proibido o uso de animais para fins cosméticos, ponto. Sem prazos. Também trago aqui e vou entregar logo mais, Senador, 15.900 assinaturas pedindo que o PL seja alterado, em especial em relação ao §8º.
Eu fiquei muito feliz em escutar a colocação dos dois Senadores aqui sobre a sensibilidade deles em relação aos animais, apesar de eles terem saído, infelizmente. Também não duvido da sensibilidade que o Deputado Ricardo Izar tenha, e da intenção inicial dele em relação ao PL. Porém, há uma confusão grande, como o senhor já percebeu. Parece que todos aqui na mesa estão favoráveis a que os testes sejam reduzidos ou eliminados. No entanto, há aquela visão de que esse PL seria um retrocesso, portanto não está de acordo com os interesses dos animais. E há alguns poucos que defendem que é melhor o PL passar como está. Ele não está protegendo os animais. Essas pessoas que assinaram aqui... Foi nesse teor, de que é um retrocesso, como a Drª Vânia bem expôs. Os pareceres a que eu me referi - que já estão no seu gabinete, mas eu vou entregar novamente - são escritos por promotores de justiça, juízes, biólogos, químicos e advogados, e todos eles demonstram, pontuam, por exemplo, em relação ao excludente de ilicitude, que há, sim.
O art. 32 hoje criminaliza a prática quando há métodos alternativos. Se ele é aplicado ou não é uma questão de falha do Executivo. Tornar o art. 32 mais fraco ou inaplicável não faz com que ele fique mais forte. O Deputado me perguntou antes: "quero ver onde já foi proibido, onde o 32 já funcionou". O primeiro laboratório de vivissecção que foi fechado no Brasil, em junho de 2006, foi fechado pelo Veddas, utilizando o art. 32. Isso foi ainda antes da Lei Arouca, pouco antes da aprovação da Lei Arouca. Hoje a gente já não consegue mais pelo mesmo caminho, porque a Lei Arouca, que criou o Concea, regulamenta e portanto permite que a vivissecção seja praticada com mais tranquilidade.
Outra coisa que eu queria pontuar: fica claro que a Anvisa e o Concea defendem o PL. O Deputado deixou claro, em várias entrevistas, conversas nossas e reuniões, que o PL foi escrito em conjunto. Lembro que ele falou em nove pessoas estavam na mesa, o Ministério de Ciência e Tecnologia, o Concea, a Anvisa. Portanto, as pessoas que escreveram o PL são pessoas que têm interesse na vivissecção. Então, de fato é de admirar que haja alguma confusão sobre se o PL protege animais ou não. O PL, como está, não protege os animais.
Não existe nenhuma entidade, Senador - eu vou repetir -, não existe nenhuma organização não governamental registrada no País que defenda o PL como ele está. Nós temos uma organização, que é internacional, estrangeira, que defende o PL como ele está. Todas as organizações que já atuam há décadas no País - todas, sem exceção - defendem que o PL seja emendado, defendem que ele é um retrocesso, que ele cria um excludente de ilicitude.
Além disso - não foi apresentado -, o PL também reverte leis estaduais. Logo após o Instituto Royal, começaram a aparecer leis estaduais e municipais. O Concea e o Ministério da Ciência e Tecnologia precisavam, de alguma maneira, frear isso. Daí veio essa primeira emenda, ainda na Câmara, ao PL. São Paulo, rapidamente, em novembro de 2013, criou uma lei. Hoje, é proibido no Estado de São Paulo. Então, com a lei federal permitindo os cinco anos, deixa de ser crime no Estado de São Paulo, porque apenas a União pode versar sobre aquilo que é crime. Hoje, no Estado de São Paulo, é proibido teste de cosméticos. Com essa lei, vai passar a ser permitido novamente.
Aqui há esses pareceres, inclusive um é de um juiz que fala muito bem sobre isso. Vou deixar com o senhor. Não é a minha opinião, simplesmente. Não é uma questão de crença se o PL, como está, é prejudicial ou não aos animais. Ele é definitivamente um retrocesso.
Eu escutei aqui uma fala segundo a qual é importante ir de maneira gradativa. Ainda que se concorde com isso, não é o caso, porque "gradativo" é no sentido de avanço. Esse PL não está sendo gradativo, ele é um passo para trás. Portanto, a opinião de quem assinou isso aqui, das ONGs que estão participando desta mesma campanha, e dos pareceres, como o senhor e outros membros da Comissão poderão ver, é de que o PL como está não defende os interesses dos animais; e se ele vai ser emendado e vai ficar 30 anos esquecido no Congresso, é melhor não fazer nada do que dar um passo para trás, porque hoje ele é, sim, um retrocesso.
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Para finalizar, como eu disse, eu acredito na intenção inicial do Deputado Ricardo Izar. Nós tivemos diversas oportunidades, inclusive nos reunimos na Assembleia de São Paulo em conversas particulares, em conversas em que eu coloquei o megafone de lado na frente do gabinete dele quando ele nos convidou para conversar, e, nessa época aí, pré-eleição, essa reunião foi em agosto, eu me lembro, ali na Assembleia Legislativa de São Paulo, estavam presentes outras ONGs, juízes, biólogos. O Deputado compreendeu... refletiu e comprometeu que o art. 8º precisaria, sim, ser suprimido. Naquela época de eleição, fez essa promessa, e eu escuto hoje o Deputado dizer que gostaria que a lei passasse como está. A argumentação anterior é de que é melhor assim do que nada. Parece que, à época, o Deputado entendeu que precisaria ser suprimido, mas hoje escutei uma opinião diferente.
Então, Senador, agradeço por esta oportunidade de me expressar. Eu espero que o senhor e outros membros tenham a oportunidade de olhar, sim, de maneira mais detida, porque essa confusão aparente vai se tornar mais clara, no sentido de que não existe nenhuma organização nacional que defenda o PL como está e existe uma série de especialistas, de juristas, inclusive, que apontam erros graves no texto atual.
Agradeço.
O SR. GEORGE GUIMARÃES - ...(Fora do microfone.)... o argumento de que, se não passar assim, vai voltar e pode levar anos. A nossa posição é de que é melhor que leve anos do que passe como está, porque será um passo para trás.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Obrigado.
Deixe-me dizer aqui: eu interpreto a posição do Deputado muito claramente. A retirada deste §8º melhoraria. Ele defende isso.
O SR. RICARDO IZAR (PSD - SP. Fora do microfone.) - Eu pedi a retirada.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Mas se essa retirada levar o projeto a voltar para a Câmara e ficar lá por quanto tempo for, ele acha que é um avanço manter a lei dele obviamente. E eu tenho certeza de que, se a gente convencê-lo e a mim também, antes, de que é um retrocesso, é bem capaz de ele próprio querer que a gente faça isso.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Então, vamos discutir isso. Vamos ter tempo de conversar um com o outro para ver isso, ouvindo o Deputado também.
Quero dizer que havia aqui outras colocações que eu não li.
Helton de Araújo: "Sou contra testes em animais [...]"
Gabriela Uliana: "Sou absolutamente contra [...]"
Myleide Barbosa: "Sou contra o uso de animais para testes! [...]"
Marcio Boaventura: "Humanizar nossa postura frente aos animais é algo urgente [...]"
Jessamine David Ruas: "Sou totalmente contra os testes em animais [...]"
Tatiana Corsini: "Já passou da hora de acabar com os testes em animais."
Sandra Albieri: "Sou totalmente contra o uso de qualquer tipo de animal em testes [...]"
Mauricio Rosemberg: "Utilizar animais para testes é uma violência contra a sociedade e a vida."
Renata da Rocha Correa: "Completamente a favor da lei de vedação da utilização de animais em atividades de ensino, testes laboratoriais!!!!"
Angela Lamas Rodrigues: "Estou orgulhosa de poder participar deste debate tão urgente e dizer que sou absolutamente contra testes em animais [...]"
Rose Carnio: "Chega de sofrimento para os animais [...]"
Vera M. S. Carmo: "Sou completamente contra o uso de animais [...]"
Rose Carnio: "Sou totalmente contra o uso de animais em testes, porque achamos que somos melhores que eles??? "
Vera M. S. Carmo: "Sou absolutamente contra [...]" Eu já tinha falado da Vera.
Marina Moreira: "Sou a favor da vedação da utilização de animais [...]."
Lurdes Bueno de Souza: "[...] sou completamente contra o uso de animais em testes [...]".
Vê-se que é uma unanimidade nacional, o que me surpreende positivamente. Fico feliz que haja hoje essa consciência. O que temos é que resolver os limites disso e como fazer para ir mais rápido ou mais devagar, mais profundamente ou mais superficialmente.
Eu quero agradecer a todos. Foi uma bela audiência. Muito obrigado a todos.
Está encerrada a reunião.
(Iniciada às 9 horas e 31 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 14 minutos.)