26/08/2015 - 21ª - Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Inicialmente, quero desejar bom dia a todos.
Havendo número regimental, declaro aberta a 21ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura.
Comunicamos o recebimento de cópia do Ofício nº 131/2015, encaminhado pelo Gabinete da Presidência da Câmara Municipal de Parati, solicitando informações ao Ministério do Meio Ambiente, à Petrobras e ao Ibama sobre quais medidas estão sendo tomadas como contrapartida ambiental e medidas mitigatórias em relação ao empreendimento da atividade de produção e o escoamento de petróleo e gás natural do polo pré-sal da Bacia de Santos.
Cópias do documento encontram-se à disposição dos Srs. Senadores interessados na secretaria de apoio a esta Comissão.
Conforme pauta previamente distribuída, a presente reunião é destinada à realização de audiência pública para debater o pagamento de indenizações pela Companhia Hidrelétrica de São Francisco (Chesf) nas desapropriações ocorridas no ano de 1976 pela construção da Barragem de Sobradinho, Bahia, segundo processos administrativos: NUP 00063001093/2013-88, e também 00063002363/2013-78.
A audiência atende ao Requerimento nº 20/2015-CDR, de autoria do Senador Walter Pinheiro e também da Senadora Lídice da Mata, subscrito pelo Senador Donizeti Nogueira.
Encontram-se presentes na audiência pública o Sr. Márcio Moreira Ferreira, advogado OAB, que já convidamos para estar aqui; também o Sr. Cláudio Sílvio Basto, Presidente da Fetag/BA, nosso convidado para estar aqui presente; Sr. David Wylkerson Rodrigues de Souza, Secretário de Política Agrícola da Contag; e também o Sr. José Gomes de Souza, Presidente da Associação dos Moradores dos Povoados Atingidos pela Barragem de Sobradinho (AMOPOABS). Também já os convidei para estar aqui à Mesa.
Em conformidade com o art. 94, §§2º e 3º do Regimento Interno do Senado Federal, a Presidência adotará as seguintes normas: cada convidado terá 15 minutos para fazer a sua exposição e, em seguida, abriremos a fase de interpelação pelos Senadores e Senadoras inscritos. A palavra às Srªs Senadoras e aos Srs. Senadores será concedida na ordem de inscrição. Os interpelantes dispõem de três minutos, assegurado igual prazo para a resposta do interpelado.
Antes de conceder a palavra aos convidados, informo que as participações dos cidadãos em nossa audiência serão recebidas nos seguintes canais: portal e-Cidadania, que pode ser acessado a partir do site do Senado Federal www.senado.leg.br e também pelo Alô Senado, 0800-612211.
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Antes de passar a palavra ao primeiro expositor, irei fazer a leitura do Expediente encaminhado pela Advocacia-Geral da União no dia de ontem.
Ofício nº 00130, de 2015.
A S. Exª o Sr. Senador Davi Alcolumbre, Presidente da Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo do Senado Federal.
Assunto: resposta ao Ofício 2006/2015.
Sr. Senador, faço referência ao convite encaminhado por V. Exª ao Advogado-Geral da União, para participar, como debatedor, de audiência pública desta Comissão com a finalidade de "debater o pagamento de indenizações pela Companhia Hidrelétrica de São Francisco (Chesf) nas desapropriações ocorridas no ano de 1976 pela construção da Barragem de Sobradinho-BA, segundo os processos administrativos, NUP 00063001093/2013-88 e também 00063002363/2013-78".
A propósito dos referidos processos administrativos, empreendeu-se a pesquisa nos sistemas internos, não tendo sido localizada qualquer tramitação no âmbito da AGU.
Considerando que os processos administrativos em questão foram autuados na numeração da Presidência da República, obteve-se a informação de que o assunto está sendo tratado pela Secretaria-Geral da Presidência da República.
Caso sejam encontrados processos de competência da Advocacia-Geral da União, teremos a satisfação em receber as partes e fornecer quaisquer informações que forem solicitadas por esta douta Comissão e seus membros.
Pelas razões expostas, agradecemos o convite e por ora o declinamos.
Atenciosamente,
Paulo Henrique Kuhn,
Procurador-Geral da União.
Isto posto, concedemos a palavra ao Sr. Márcio Moreira Ferreira para fazer a sua exposição. Como já foi dito, V. Sª tem 15 minutos para fazer a sua exposição.
O SR. MÁRCIO MOREIRA FERREIRA - Bom dia a todos.
Obrigado, Senador, Presidente desta Comissão.
Gostaria de iniciar as palavras agradecendo o convite que foi feito à instituição OAB/BA, representada pelo seu ilustre Presidente, Dr. Luiz Viana Queiroz, que encaminhou uma resposta ao ofício-convite feito por esta Comissão, cujo teor farei a leitura. Peço vênia a V. Exªs e aos senhores que acompanham para fazer a leitura dessa resposta para, após, fazer uma rápida abordagem sobre o que tem acontecido em relação aos processos de busca das indenizações dessas pessoas que moram na região de Sobradinho.
Gabinete da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Seção do Estado da Bahia, Gabinete da Presidência.
Excelentíssimo Senhor, cumprimentando V. Exª, cordialmente, sirvo-me do presente para informar que foi com muita honra e satisfação que recebi o convite para participar, como debatedor, da Audiência Pública promovida por esta Comissão, a fim de discutir "o pagamento de indenizações pela Companhia Hidrelétrica de São Francisco - Chesf nas desapropriações ocorridas no ano de 1976 em razão da construção da Barragem de Sobradinho -BA, segundo Processos Administrativos NUP 00063.001093/2013-88 e 00063.002363/2013-78.
Entretanto, ao verificar a data para a qual essa Audiência Pública fora designada, deparei com compromisso em cidade do interior do Estado da Bahia, cujo agendamento havia sido feito há mais de dois meses. Foram envidados todos os esforços possíveis para que tais compromissos fossem conciliados de forma a permitir meu comparecimento a ambos, mas, infelizmente, em razão da incompatibilidade de horários de voo na data dos eventos, esse intento não foi possível.
Gostaria de agradecer pelo convite e me colocar à disposição desta Comissão para quaisquer eventuais dúvidas/esclarecimentos que, porventura, surjam no decorrer da Audiência Pública, ao passo que informo ter designado o Advogado Márcio Moreira Ferreira para comparecer ao referido evento, para que este possa auxiliar no desenvolvimento dos trabalhos da mesma.
Certos de contarmos com a compreensão de Vossa Excelência e dos demais participantes do evento, apresentamos nossos votos de grande estima e apreço.
Atenciosamente,
Luiz Viana Queiroz,
Presidente da OAB/BA.
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Em razão da ausência do Dr. Luiz Viana, eu farei aqui uma breve abordagem sobre o que tem ocorrido nas ações de indenização promovidas nos Municípios de Sento Sé e Remanso, que são cidades circunvizinhas do hoje Lago de Sobradinho. Essas cidades foram criadas a partir da construção desse Lago de Sobradinho, no ano de 1976, da Barragem do Sobradinho, que formou o lago.
Esse lago, na verdade, inundou as cidades de Remanso, Sento Sé, Sobradinho, Casa Nova, e elas tiveram que ser transferidas para outras localidades, a fim de que, é óbvio, pudessem as pessoas que ali moravam se estabelecerem.
Ocorre que, nessa mudança, nesse deslocamento das pessoas de onde elas viviam durante toda a sua vida para onde foram relocadas, havia a previsão do pagamento de indenização pelos bens móveis e imóveis que possuíam. Entretanto, do que nós temos conhecimento, pelo menos das pessoas que nós temos acompanhado, um pouco mais de 230 famílias não foram indenizadas pela Chesf desde 1976.
Estamos falando de 230 famílias, e muitos dos chefes dessas famílias já faleceram. São quase 40 anos. Foi no ano de 1976, e estamos em 2015. Nesses quase 40 anos, após ter sido ajuizada a ação em 1979, a Chesf, respondendo à ação, defendendo-se da ação, depois de apresentar sua defesa e uma exceção de incompetência para que remetessem os autos do processo para Recife, onde ela é sediada, os autos dos processos, surpreendentemente, desapareceram do cartório dessas cidades, tanto da cidade de Remanso quanto da cidade de Sento Sé.
Passaram-se mais 20 anos, de 1981 até 2002, quando nós, através do Sr. José Gomes, presidente da associação dos moradores que foram atingidos pela criação do Lago, formamos então um novo grupo de pessoas. Quem ainda estava naturalmente vivo - se não estivesse vivo, poderia ser representado - nos deu a procuração, para que nós ajuizássemos ações de restauração de autos, que foram, sim, restaurados. E estamos já numa fase de instrução desses processos. Instrução esta, já dos processos restaurados, que já fez uma avaliação do valor das indenizações que são devidas pela Chesf a esses mais de 230 beneficiados.
Entretanto, em que pese já termos uma avaliação feita por um perito oficial nomeado pelo juiz das comarcas, em que pese ter havido já a juntada desse lado pericial, em que pese todos os nossos esforços, juridicamente falando, no âmbito do processo, para que essa indenização chegasse ao seu cabo e esse pagamento fosse finalmente realizado, infelizmente, não temos até hoje nenhum tipo de resposta da Chesf com relação ao interesse sequer de conversar para fazer esse pagamento.
Portanto, a minha abordagem aqui, muito breve, é em torno exatamente dessa questão do interesse que a devedora Chesf tem ou deveria ter para resolver uma questão que já dura 40 anos, praticamente 40 anos, e muitos, infelizmente, nem mais aqui estão entre nós, mas têm seus representantes.
É uma dívida que, se formos observar pelo aspecto pecuniário, é impagável. Nós estamos falando de pessoas que literalmente passaram necessidade depois que tiveram que ser relocadas, porque não foi dada nenhuma estrutura para que eles pudessem ser relocados para onde foram, nas cidades que foram inauguradas após a formação do lago. E são pessoas que ainda hoje sofrem graves necessidades em razão da impossibilidade, por exemplo, de plantar, de fazer sua cultura na região, porque há uma insegurança muito grande com relação ao Lago de Sobradinho.
Então, minhas palavras são no sentido de tentar auxiliar, na medida do possível, nesta audiência pública, no que for tangente aos processos que tramitam em torno dessas indenizações, e buscar, na medida do possível, uma solução mais rápida para que essas indenizações sejam pagas a essas pessoas que tanto necessitam.
Agradeço pela concessão da palavra e volto a palavra ao Presidente. Obrigado.
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O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Em seguida, concedo a palavra ao Sr. Cláudio Sílvio Basto, para fazer também a sua exposição, pelo mesmo tempo.
O SR. CLÁUDIO SÍLVIO BASTO - Bom dia a todos e a todas.
Eu queria saudar o Senador Wellington Fagundes, Presidente desta Comissão; saudar o Senador Walter Pinheiro, Senador pela Bahia; e também a Senadora Lídice da Mata, pela iniciativa de ter buscado debater este assunto nesta importante Comissão, como também ao Senador Donizeti Nogueira. Eu quero saudar o Sr. José Gomes, presidente da associação que representa aqui as famílias - AMOPOABS; o Márcio Ferreira, da OAB; o David Wylkerson, que é Secretário de Política Agrícola da Contag. E também quero saudar aqui o Vice-Prefeito de Juazeiro, Sr. Francisco, que prestigia este momento e tem buscado intermediar, de forma permanente, junto às representações nessa região, buscando solucionar essa problemática.
Eu quero parabenizar o José Gomes pela sua insistência permanente como Presidente da AMOPOABS. E junto à Fetag/BA, como Presidente da Federação dos Trabalhadores da Agricultura no Estado da Bahia, também juntamente com a Contag, nós temos, de forma permanente, levantado junto ao Governo Federal, ao Governo do Estado, aos órgãos competentes e também judiciais a necessidade urgente de solucionar esse problema da indenização dessas 230 famílias que são atingidas pela barragem do Lago de Sobradinho. Muitas delas, como aqui foi muito bem dito pelo Sr. Márcio Ferreira, não estão mais entre nós, mas têm seus sucessores.
Este é um debate importante que estamos fazendo hoje na ordem do dia, que é o tema da sucessão rural. Nós sabemos do papel que tem a agricultura familiar na garantia da segurança e soberania alimentar do nosso País, e de forma permanente tem contribuído muito fortemente para garanti-la. Hoje já chega a mais de 75% dos alimentos que chegam à mesa do nosso povo brasileiro. E é para nós muito frustrante, angustiante, ver 200 famílias esperando desde 1976 serem indenizadas por conta da construção do Lago de Sobradinho, que é um instrumento importante para a construção do desenvolvimento da região norte da Bahia, sobretudo do Vale do São Francisco.
As famílias não podem ficar desamparadas, excluídas, com a ausência tanto da indenização como do acesso às políticas públicas para consolidar o desenvolvimento, com inclusão social, para melhorar a qualidade de vida das pessoas que estão ali naquela região, que produzem e que, de forma muito aguerrida e permanente, têm contribuído com o desenvolvimento daquela região. Mesmo sem terem sido indenizadas, continuam ali resistindo.
Voltando a repetir, é fato que vários companheiros deixaram a região pela ausência tanto da indenização como de políticas públicas importantes para consolidar, de fato, o desenvolvimento daquela região.
Portanto, eu queria aqui registrar a preocupação da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado da Bahia, que tem feito um papel permanente em defesa dos agricultores e agricultoras familiares, dos trabalhadores e trabalhadoras rurais do nosso Estado.
Mobilizações grandiosas temos realizado no Estado da Bahia, contribuindo com as grandes mobilizações em nível nacional, para pautar o Governo do Estado e o Governo Federal, também o Congresso Nacional, os principais órgãos, no sentido de enxergar a importância que tem esse valoroso setor, que gera renda, inclusão social e soberania alimentar para o nosso País.
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Portanto, agradeço o convite do Senado Federal, sobretudo desta Comissão, e, novamente, volto a parabenizar pela iniciativa o Senador Pinheiro e a Senador Lídice, que têm sido dois grandes Senadores atuantes em defesa do desenvolvimento do nosso Estado da Bahia e, principalmente, dessa região.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Quero agradecer e convidar já, na sequência, o David. É Davi ou David? Porque baiano gosta de colocar nomes sofisticados. Eu sou filho também de um baiano - quero registrar que fui da Bahia para Mato Grosso a pé -, um homem muito simples, sem estudo, que resolveu colocar o nome do último filho Wellington, com tudo o que tem direito. Meu pai não conseguia falar o nome Wellington, e aí foram perguntar para ele por que colocar um nome tão sofisticado. Ele falou: "Porque baiano é assim: se ele não tem dinheiro, pelo menos o nome do filho ele deixa como herança para ser gente grande no futuro".
Então, É David?
O SR. WALTER PINHEIRO (Bloco Apoio Governo/PT - BA. Fora do microfone.) - Mas seu pai não foi para o Mato Grosso atingido por barragem não.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Não, ele foi, na verdade, pela pobreza da região em que ele vivia, Santana dos Brejos.
Wylkerson Rodrigues de Souza. Eu gostaria que você ajudasse a pronunciar o nome, se é David ou Davi.
O SR. DAVID WYLKERSON - Bom dia a todos e todas.
Para descontrair um pouco, quebrando a formalidade, o correto seria David, mas, para mim, tanto faz, eu respondo pelos dois. (Risos.)
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Assim como eu respondo por Welton, Welliton e outras coisas.
O SR. DAVID WYLKERSON - E acho que o meu é mais complexo, porque ele tem as três letras: w, k e y.
Bom, eu quero aqui começar cumprimentando o meu colega Cláudio Bastos, Presidente da Fetag/BA, meu conterrâneo, porque eu também, com muito orgulho, sou da região de Irecê, na Bahia; cumprimentar o Presidente da Comissão, Wellington; o Dr. Márcio, representante da OAB da Bahia; e o companheiro José Gomes, que tem sido um guerreiro nesse pleito em favor dessas famílias que têm sido desassistidas pelo Estado brasileiro, lamentavelmente, de forma tão incompreensível de nossa parte.
Também não poderia deixar de valorizar, reconhecer e agradecer o empenho dos Senadores Walter Pinheiro e Lídice da Mata, dois Senadores que, tenho certeza, tanto honram esta Casa quanto também honram seus mandatos, representando muito bem o Estado da Bahia.
Senhoras e senhores, na nossa opinião, a Contag, há muito tempo, vem acompanhando esse processo tanto administrativa, quanto jurídica e politicamente. Muda a direção da Contag, e o processo continua praticamente na mesma situação.
Mesmo reconhecendo toda a legalidade da tramitação processual que tem sido feita e que tem sido argumentada, inclusive, por parte da AGU, há uma insensibilidade do Governo brasileiro enorme em relação a isso, que tem prejudicado e muito essas famílias. É lamentável que, numa situação dessas, 230 famílias que estão desassistidas pelo Estado brasileiro de seus direitos, de serem indenizadas, 60%, ou seja, mais da metade partiram desta para outra sem conhecerem o resultado, sem terem noção do que seria lhes assistido de direito, o que seria recebido. E, pelo que a gente percebe, a preocupação do José Gomes é de que os 40% vão embora também sem conhecer esse resultado e, na nossa humilde avaliação, é incompreensível que se proceda dessa forma.
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Nós tivemos, ontem, uma reunião com a equipe da Secretaria-Geral da Presidência, é verdade, como a própria AGU já informou, e o que alegam é que, já que foi judicializado, que se espere a decisão judicial, para que depois se discuta ou não o resultado da decisão judicial.
Isso, para mim, é de uma insensibilidade enorme, tendo em vista que há o princípio também da razoabilidade. É possível, é legítimo e é legal que se retire esse processo judicial para fazer um acordo, e a própria associação já vem se disponibilizando, já vem flexibilizando o que seria de direito para essas famílias, para que possam ter acesso a essa decisão.
O companheiro José Gomes tem sido um guerreiro. Não sai daqui de Brasília, de ministério, já foi na Secretaria-Geral, já foi na Presidência, já foi no Ministério de Minas e Energia, esse processo já tramitou umas duas ou três vezes nas Minas e Energia, mas, quando chega à Secretaria-Geral ou à Casa Civil, trava, para tudo, começa do zero. E aí o Senador Walter Pinheiro se sensibilizou com a situação, mesmo sendo apenas uma situação, desculpem, que parece ser insignificante, de apenas 230 famílias, mas são 230 famílias de uma região que poderia estar num patamar muito maior de desenvolvimento, considerando o trabalho dessas famílias. Trata-se eminentemente de agricultores familiares, que poderiam estar produzindo, contribuindo com o desenvolvimento regional, não só municipal; a partir da vocação dessas famílias, eles poderiam estar contribuindo também para o desenvolvimento, e se não estão, a culpa não é deles, a culpa tem sido eminentemente do nosso Estado brasileiro, que, independente do governante que está no exercício do mandato, tem sido o principal responsável.
Então, na nossa avaliação, principalmente a partir de um governo de origem popular, isso deveria estar como prioridade para que seja resolvido o mais rápido possível, porque há possibilidade e há legalidade para resolver. Há vários pareceres jurídicos e administrativos no processo. O objetivo desta reunião aqui é não só subsidiar os Senadores e Senadoras desta Comissão para que nos auxiliem na resolução desse problema, mas também sensibilizar aqueles que não têm ainda total conhecimento do problema.
Tenho certeza de que o companheiro José Gomes trará maior detalhamento, mais esclarecimento. Ele vai falar com a propriedade de quem vivenciou e de quem está vivenciando o problema na pele. Tenho certeza de que as palavras dele serão expressas do fundo da alma de quem está sofrendo esse problema lá na ponta. E, a partir daqui, a gente espera que saiam, de fato, resoluções, que a gente tire encaminhamentos concretos, para que a gente consiga resolver o mais rápido possível para os poucos que ainda restam, os 40% - são poucos, considerando que 60% já faleceram. Que a gente não espere que mais gerações não tenham esse direito recebido e que a gente consiga, assim, contribuir para o desenvolvimento regional, local e também para satisfazer a própria necessidade dessas famílias, no interesse dos direitos desses trabalhadores e trabalhadoras e dessas famílias que estão lá, à mercê de uma decisão do Governo, para que possam alavancar seu trabalho.
Sem dúvida nenhuma, tenho certeza de que, assim que sair esse resultado, ainda há possibilidade de que haja outros processos - individuais ou coletivos, não sei como vai ser. Mas, se a gente for considerar a irresponsabilidade do Estado brasileiro de não ter ressarcido e não ter indenizado essas famílias, ainda caberão ações por todo esse período danoso de que eles foram vítimas, por não receberem para produzir, para contribuir, para melhorar suas vidas, melhorar a vida de seus filhos. Muitos agricultores padecem de recursos para colocar o filho numa boa escola, numa faculdade, para ter acesso à saúde de qualidade, enfim, tudo isso é responsabilidade do Estado. Independentemente desta ação aqui, caberão outras ações. E haverá também nosso estímulo para que isso aconteça, pois, como eu já disse, na compreensão da Contag, é inadmissível, não conseguimos entender por que tanta insensibilidade para resolver um problema tão grave desse, que não é pequeno.
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Se formos colocar em números, na ponta do lápis, tanto número de pessoas, de famílias, como os valores envolvidos, vocês vão ver que é uma economia que daria para alavancar uma região toda, e não apenas um município, no processo de crescimento do Brasil. Nós esperamos contar com vocês para que a gente chegue a um consenso, para que sentem a AGU, a Secretaria-Geral, a Casa Civil e busquem os mecanismos necessários para que seja resolvido o problema.
Então, quero aqui agradecer, em nome da direção da Contag, a oportunidade, porque a gente vem acompanhando esse processo.
Assim, concluo, devolvendo a palavra para o Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Então, agradeço ao David e passo a palavra ao Sr. José Gomes de Souza, que dispõe do mesmo tempo.
O SR. JOSÉ GOMES DE SOUZA - Bom dia a todos. Neste momento, eu gostaria de agradecer ao Presidente desta Comissão por nos ter dado esta grande oportunidade de estar aqui hoje. Agradeço também ao nosso amigo, Dr. Márcio, representando a OAB/BA; ao Dr. David, representando a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag); Cláudio Basto, Presidente da Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Estado da Bahia (Fetag/BA); nosso Senador Walter Pinheiro, que nos deu esta oportunidade de estar aqui hoje; Senadora Lídice da Mata e os companheiros Senadores que nos ajudaram e estão aqui presentes; o Vice-Prefeito da cidade de Juazeiro, que está aqui também, nos ajudando, cooperando; e todos que estão aqui; quero agradecer a todos.
Meus amigos, por que estou aqui hoje? Por que estamos aqui hoje? Porque não tivemos direito ao pagamento dos nossos prejuízos. Era bom que o Dr. Luís Inácio Lucena estivesse aqui presente, mas não está. Se o País for diligente... Se não cumprir com seus deveres... É obrigação: os filhos serão iguais. O Estado deve agir cumprindo a lei. Não podemos ser marginalizados, tratados como indigentes, porque, se assim for, assim será seu povo. Ele não tem desculpa para agir como vem agindo contra a população atingida pela barragem de Sobradinho, direta ou indiretamente. A lei é escrita para ser cumprida, e nada mais.
Por que nós temos de receber as indenizações? Por que elas não foram pagas? Porque os processos sumiram do fórum das duas comarcas. Sumiram do fórum das duas comarcas! A Chesf não tinha que pagar se os autores não tivessem o que receber. Os processos estariam lá até hoje. Se o governo militar errou por não pagar essas indenizações, erraram também os outros que passaram e o que está aqui até hoje. Não desculpo.
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Infelizmente, meus amigos que estão me ouvindo, 60% dessas famílias já são falecidas. É oficial. São graves problemas do governo. Só receberam do Estado brasileiro a tristeza de tirar o direito às suas terras, a suas moradias, e não indenizar. Esse Brasil não foi roubado por marginal e por bandido, foi roubado pelo Estado brasileiro. Uma vergonha! Quantos mais precisamos morrer? A maioria morreu de tristeza e de abandono. E não existe desculpa para esse argumento.
Neste tempo, a Chesf vem faturando em cima das propriedades, das posses dos seus associados - há mais de 30 anos. Nenhum centavo para os ribeirinhos. Infelizmente, gastam mal, com coisa que eu tenho vergonha de falar aqui.
Para finalizar, quero conclamar os homens de bem, que possam auxiliar para resolver esse problema criminoso. Não podemos esperar mais 30 anos para resolver esse grave problema social!
Eram minhas palavras.
Agradeço a todos os presentes. Estou aqui para receber qualquer pergunta da Mesa e de quem estiver presente. Obrigado a todos.
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Encerradas as exposições, queremos convidar agora nosso companheiro Senador Walter Pinheiro, autor do requerimento.
O SR. WALTER PINHEIRO (Bloco Apoio Governo/PT - BA) - Sr. Presidente, meu caro Wellington Fagundes, quero agradecer a V. Exª a colaboração que tem dado, inclusive presidindo esta reunião, também aos Senadores aqui presentes e ao Senador Donizeti, que de pronto subscreveu nossa solicitação.
Quero comunicar que a Senadora Lídice da Mata mandou-me uma mensagem, a Senadora teve que ir a Goiânia hoje de manhã. E o Senador Otto, que está agora numa reunião com nosso Governador do Estado, Rui Costa, na Secretaria de Portos, comunicou-me que, assim que sair da audiência, virá para esta reunião.
Sr. Presidente, eu queria começar com duas coisas. Primeiro, um pouco da minha indignação com o comportamento da Advocacia-Geral da União. Já de pronto, quero avaliar com esta Comissão a possibilidade de produzirmos um documento que seja encaminhado ao Advogado-Geral da União, não só para que ele não cometa esse tipo de absurdo. Não é possível que um ministério responda na noite anterior a uma audiência pública que desconhece o projeto. Esta audiência pública não foi solicitada na noite de ontem. Portanto, a Advocacia-Geral da União deve ter recebido isso, no mais tardar, numa quinzena de maio de 2015, portanto, com tempo suficiente para que seus procuradores, ou melhor, seus servidores pudessem identificar o processo. É uma completa falta de respeito. É uma situação que acho importante avaliar a partir de como são tratadas essas questões.
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Lamento, e mais ainda quando a gente ouve o relato do chamado caminho de volta. Se devolvem as coisas para a Secretaria-Geral, e a Secretaria-Geral vai e comunica, meu caro Wellington, que aquilo está judicializado. Quer dizer, a Advocacia-Geral da União diz que está na Secretaria-Geral da Presidência, tentando tratar isso como se fosse uma questão de mobilização social, uma questão desse tipo. Estamos tratando uma questão de caráter jurídico. Aí, depois, a própria Secretaria-Geral da Presidência informa que o processo está judicializado, e é óbvio que é por isso que a Secretaria-Geral não foi o primeiro órgão suscitado por nós para que este debate pudesse ser promovido, porque a questão está exatamente judicializada.
E lamento mais ainda o desconhecimento do organismo de Governo, levando-se em consideração que isso não é uma matéria nova e isso não é uma matéria inerente só à Bahia. Esse é um processo que se arrasta no Brasil inteiro, temos diversos casos desse tipo. Estamos tratando de uma área que, num período... Inclusive correto, não há nenhum tipo de leitura contrária ao processo de surgimento do Lago de Sobradinho, obviamente que, para aquele período, era muito importante que a gente buscasse a intervenção com várias intenções. A primeira delas era até para regular a vazão do rio. Óbvio que a intenção principal de um lago é promover o armazenamento de água para duas finalidades. Uma finalidade é a de geração de energia. Portanto, você não guarda energia, você guarda água. Na hidroeletricidade, é assim que funciona. E outra era a maior de todas as promessas para o Lago de Sobradinho: que nós teríamos condição efetiva de promoção de toda uma região através do processo de irrigação, portanto, o uso dessa água do lago.
Eu conversava neste instante com o Senador Donizeti e eu dizia que é lamentável que alguém na beira de algo que tem água permanentemente... Então, não podia faltar política de irrigação, política de promoção, inclusive para produção de alimentos.
Uma coisa é ser ribeirinho de um rio que é temporário. Eu conheço essa história da Bahia muito bem. Fui Deputado Federal por quatro mandatos, e uma das coisas que notabilizou meu mandato foi o fato de andar o Estado. Eu chegava a rodar 180 mil quilômetros por ano, meu caro Wellington. Era minha média de quilometragem. E nunca tive avião, portanto, era sebo de carneiro nas canelas, e muita rodagem. Então, por exemplo, caminhei por vários vales. Tive oportunidade, como Deputado, de aportar recursos a um afluente do São Francisco, por exemplo, chamado Rio Santo Onofre, que adentra a cidade de Paratinga e vai até o vale, chegando à serra, próximo à cidade de Macaúbas. Cansei de andar ali, são 70km adentro. Tive oportunidade, por diversas vezes, de aportar recursos para fazer minibarragens. O Rio Santo Onofre é um rio que seca, é um rio temporário.
Então, esses ribeirinhos, naquela época, constituíram como oportunidade de vida usar a beira do rio. E aqui posso citar até o nome de um, para deixar bem a referência, por diversas vezes dormi na casa dele: o velho Vitorino, ou Vitu, como a gente chama. Em 2000, nós já falávamos em usar a energia solar nessa região. Não chegava energia da hidroeletricidade, então, a gente já tinha placa solar, em 2000, com bateria. Vi até um programa do Fantástico, no domingo, mostrando que é possível usar a energia solar para movimentar uma bomba para tirar água do poço. No ano 2000, esses agricultores já me pediam para fazer emenda para isso, numa época em que a gente não tinha tecnologia nenhuma. Só que com uma diferença: esses ribeirinhos do Santo Onofre, esses ribeirinhos de rio de cacimba, de uma parte do trecho do Jacurici, uma região, inclusive, onde meu pai, durante muito tempo, manteve uma propriedade... Quantas vezes fui com meu pai para lugares onde, no período da chuva, a gente passava amarrado numa corda, para não morrer afogado, mas, no período da seca, era tranquilo, não havia nem referência de água de rio?
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A estrada é cortada por três ou quatro riachos oriundos do Jacurici, onde se vive uma expectativa das mais complicadas. Daí surgiu o açude da Camandaroba, que era um açude próximo, construído pelo DNOCS na época para permitir que essas pessoas tivessem água permanente, não só o acesso à água para o consumo, mas o acesso à água como um bem para a produção, inclusive para extrair a sua sobrevivência.
Quando o lago de Sobradinho foi projetado, era uma área de 4.200 metros quadrados mais ou menos, 4.200 quilômetros, uma área imensa, que tomou uma região inteira. A população, para se ter uma ideia, da época do lago, se não me falha a memória, era algo em torno de 12 mil pessoas atingidas. Hoje, só a cidade de Casa Nova tem 70 mil habitantes. Os dois poetas Sá e Guarabira cantaram isso numa música muito interessante, que dizia: "Adeus Remanso, Casa Nova, Sento Sé, Pilão Arcado, Sobradinho. Adeus!" Inclusive é a tese de o sertão virar mar ou o mar virar sertão. E hoje nós temos as grandes contradições.
Semana passada, nós fizemos um debate sobre a questão da cunha salina, lá na Foz do São Francisco. Esse mesmo lago que é formado pelo São Francisco deságua na fronteira entre Sergipe e Alagoas, já no caminho de Carira. E hoje o que se vê é que o rio não chega ao mar. O que se ouve como trajetória e como ditado, meu caro Senador, é que todo rio corre para o mar. O São Francisco não está conseguindo chegar ao mar! A cunha salina, que é exatamente a invasão da água do mar no rio, nesse trecho de que eu falei aqui, da Foz do São Francisco, atingiu, provavelmente há 15 ou 20 dias, algo em torno de 16 quilômetros, o que significa alteração da fauna e da flora, o que significa mudar, meu caro Donizeti, completamente a vida das pessoas nessa região.
O processo que nós vivenciamos não foi pequeno. Eu acompanhei de perto, por exemplo, os índios tuxás, que hoje estão na beira do São Francisco, na cidade de Ibotirama, mas eram pertencentes à aldeia que resultou no Lago de Itaparica. Os índios fizeram a opção de ir para o oeste da Bahia, portanto saíram do norte da Bahia. A região do Lago de Itaparica, para quem não se localiza muito bem com relação ao que estamos falando, ao norte, é exatamente a região fronteiriça ou até, como brincamos muito lá, a tríplice fronteira entre Bahia, Pernambuco e Alagoas. Ainda tem a parte debaixo, de Sergipe. Nessa região, nós temos Xingó, Itaparica, Paulo Afonso. Os índios saíram dali e foram para Ibotirama.
Quantas vezes eu participei de tentativas de negociação com a Chesf, para os índios ocuparem a Chesf, em Salvador?! Tive a oportunidade de participar, ao longo de toda essa trajetória, dessa luta.
O que nós pedimos aos órgãos públicos não era favor para 240 famílias, mas a aplicação de políticas. Essas pessoas foram remanejadas, saíram do seu habitat, foram transferidas para outra região. E se não tivessem condições, eu até admitiria.
Temos outras experiências assim complicadíssimas. Na Bahia, há uma cidade chamada Serra do Ramalho, que foi constituída por agrovilas. Portanto é uma cidade que nasceu sem identidade, porque é uma cidade de remanejados. Tem gente de todo canto do Estado da Bahia, até de Pernambuco. Retiramos as pessoas da beira do rio e levamos para o oeste, meu caro Donizeti, para uma região onde vivem em agrovilas. Então é responsabilidade, sim, do Poder Público e, neste caso particular, da Chesf e da União prover as condições. Ninguém remove alguém de um lugar para outro sem assumir a responsabilidade.
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A Chesf poderia tranquilamente adotar políticas de irrigação, trabalhar com a capacidade de estimular e treinar essas pessoas para atividade correlata com o ambiente em que vivem hoje. Essas 12 mil pessoas de que falei, que viviam na região quando da constituição do lago de Sobradinho, elas foram atraídas para a região da Bahia pela mineração. O objeto de deslocamento desse povo na época foi exatamente por ser uma região que possuía minerais. Aliás, o nosso Vereador - está aqui o Vice-Prefeito Francisco -, o nosso ex-Vereador de Sento Sé, Francisco, o Jackson, durante muitos e muitos anos, vivia exatamente da exploração de pedras e de minerais para a sua vida. Sento Sé é uma das cidades...
Para se ter uma ideia da dificuldade desse povo, meu caro Presidente, há um distrito na cidade de Sento Sé que fica a 200 quilômetros da sede. Eu não estou falando de área desse tamaninho, não! O Município de Lauro de Freitas, que fica perto de Salvador, tem 60 quilômetros quadrados. É um Município desse tamaninho. Um cara a 60 quilômetros por hora tranquilamente cruza o Município. O Município de Madre de Deus, que fica na Baía de Todos os Santos, que fica numa região exitosa, que tem uma grande área da Petrobras chamada Temadre, deve ter 25 quilômetros quadrados. Não sei nem se tem tudo isso. É uma nesga. O Município de Sento Sé vai pegar pelo menos milhares de Municípios de Madre de Deus dentro dele. E não tem nenhum Temadre da Petrobras, não tem nenhuma base de operação. Nós estamos falando de Municípios que são gigantescos em termos de estrutura física e diminutos do ponto de vista de suas oportunidades para o seu povo.
Então nós temos uma situação que não é qualquer uma. Se dissessem assim: "Está bom, os caras estão vivendo num lugar para onde eu tenho que deslocar água"... A água está na beira! Todos esses Municípios que foram atingidos por barragem, ou seja, os novos Municípios nasceram à beira do Lago de Sobradinho. Se chegarmos a Pilão Arcado, o Lago de Sobradinho está ali próximo; Sento Sé, idem. A própria cidade de Sobradinho nasceu exatamente em decorrência disso, já no entorno da própria barragem. Portanto são cidades que foram construídas. Nós tínhamos condição de projetá-las. É diferente daquela época de 12 mil habitantes, quando as pessoas se aglomeraram. Essas novas cidades foram projetadas. Agora, que porcaria de projeto é esse que não leva em consideração as alternativas de vida? Se tivesse sido feito por alguém que não sabia fazer projeto, eu até admitiria. Seria possível dizer: "Não, as pessoas foram lá e fizeram casas na base do sopapo".
Então, na realidade, havia toda uma condição para isso ser inclusive modelo. Nós não deveríamos estar aqui reclamando de algo que não funcionou. Nós deveríamos estar aqui comemorando um modelo exitoso de alocação de pessoas em outra atividade, outro tipo de vida, inclusive muito mais condizente do que aquele para onde elas se deslocaram na época.
Volto a dizer, o Lago de Sobradinho, por mais que baixe a sua vazão, por mais que desça o seu volume d'água, melhor dizendo, é difícil de secar. O São Francisco tem uma vazão hoje, sei lá, de 940 metros cúbicos por segundo, muito baixa por sinal. Se analisarmos a vazão do São Francisco, eu não quero nem analisar na época em que o São Francisco foi assim batizado, pois seria covardia, mas tranquilamente nós chegaríamos a algo como duas vezes e meia ou três vezes mais de vazão. Nós estamos falando de uma vazão de 960 ou 940. O São Francisco já bateu 2.400 de vazão; num período crítico, já chegou a 1.700. E estamos falando de 960.
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Então há toda uma necessidade de se olharem esses aspectos, de permitir... É intervenção simples, adotando técnicas de energia, adotando novas técnicas de irrigação, adotando técnicas para permitir, por exemplo, que o sujeito possa utilizar aquele pescado. A cidade de Casa Nova, por exemplo, tem uma colônia exitosa de pescadores. Por diversas vezes, eu estive lá para contribuir com isso. À época, com um ex-Deputado nosso, falecido, Paulo Jackson, nós fomos várias vezes para essa região, para ajudar essas colônias. Portanto, trata-se de organizar essas colônias de pescadores, organizar para que as pessoas possam tirar do pescado do lago a sua sobrevivência. O que não se pode é ficar dependente só do pescado se tem condição de irrigar.
Ora, meu caro Wellington, as experiências mais exitosas de irrigação, inclusive com fruta para exportação do Brasil, estão nas cidades de Juazeiro e Petrolina, agora, tudo mantido pelos grandes. Para os ribeirinhos, coisa nenhuma. Se você chegar hoje a um dos principais hotéis de Tóquio - vou dar o nome do hotel -, Hotel Osaka, numa das regiões mais caras de Tóquio, se você tomar o café da manhã lá nesse hotel, em Tóquio, você vai encontrar fruta saída exatamente desse vale. A região hoje se arvora a produzir vinho. Talvez ainda não tenha chegado ao vinho da região de Champagne ou, sei lá, à região do Priorat ou à região de Valladolid. Nós estamos disputando no mundo com uma das regiões exitosas. Por que isso? Porque tem irrigação, está produzindo lá uva de boa qualidade. Se analisarmos friamente, no Priorat, que é uma das regiões exitosas da Espanha na produção de vinho, o solo é igualzinho ao dessa região. A única diferença é que do outro lado tem política, do lado de cá tem opressão.
Então, não dá para entender por que essas coisas funcionam desse jeito. E volto a dizer que a reivindicação desse povo, que se resume a 240 famílias, é para tentar resolver esse impasse de uma geração que já se foi, uma geração que remanesce e a expectativa é de que essa geração comece inclusive a entrar num processo de padecimento. Fala-se em fazer coisa do arco da velha, viajam daqui para acolá. "Ah, vamos implantar não sei o que não sei aonde e não sei aonde." E no lugar que tem todas as condições, não se faz nada! Absolutamente nada.
A região hoje recebe vários projetos de energia eólica. Os projetos mais importantes de energia eólica estão nessa região, como o parque de Sento Sém, investimento altíssimo. No Lago de Sobradinho está sendo experimentada agora toda uma tecnologia para a utilização de placas solares sobre o lago. Estamos falando em experiência... Aliás, tem mais! Tem um Minha Casa, Minha Vida usando energia solar lá em Juazeiro. Então, cheio de coisa exitosa. Para quem, cara pálida? Só para os mesmos de sempre?
O canal de irrigação que alimenta... Eu não quero citar o nome de nenhuma grande empresa, mas as grandes empresas que hoje processam frutas ali na região e outros produtos, todos os seus proprietários estão milionários. Portanto, esses caras vão lá e bancam um canalzinho - bancam, não, perdão; sustentam -, usam o canal, porque foi tudo construído, Donizeti, com recurso público. Agora, para essa gente é mais difícil, não dá para fazer. É mais fácil fazer para um que está cheio de dinheiro do que fazer para 240 que, inclusive, foram remanejados. Esses que foram para lá para explorar fizeram isso para ganhar dinheiro. Quem foi remanejado para lá está ali para sobreviver.
Esse é um negócio que machuca muito, dói na alma. Talvez para quem está aqui em Brasília... É por isso que a frieza de um sujeito que assina um documento desse... Talvez o sujeito que assinou esse documento não saiba nem onde fica Sobradinho. Se derem a ele um mapa, há o risco de que ele dê uma olhada na Austrália e depois nos Estados Unidos tentando procurar.
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Eu tenho duas netinhas que, brincando comigo... São duas irmãs. Júlia tem três anos e Luiza vai fazer dois agora, inclusive, na próxima segunda-feira. E Júlia começou a me pressionar muito: "Vovô, vovô, vovô, eu quero um planeta Terra, um planeta Terra!" Eu corri atrás para comprar um globo, tentei comprar inclusive uma peça que eu vi. Um sujeito conseguiu botar o planeta com todos os planetas em volta e, inclusive, o sol. A maior pergunta delas é: "Vovô, por que a Terra roda e vem o dia e a noite?" Aí eu comprei o planeta Terra para ensinar a ela e tal. Cheguei um dia em casa, de viagem, e ela estava o dia inteiro: "Vovô? Cadê vovô? Cadê vovô?" E só mandando pelo celular o recado: "Não esqueça o meu planeta Terra". Eu saí daqui de Brasília semana passada, na quinta-feira, e fui direto, antes de ir para casa, comprar o tal do planeta Terra. E Luiza tem menos de dois anos, vai fazer dois anos segunda-feira. Na sexta-feira, quando eu estava em casa, ela estava brincando lá com o globinho e disse apontando o dedinho: "Vovô, a gente mora aqui". Portanto minha netinha que não tem nem dois anos bota o dedo no globo e já sabe aonde é o Brasil.
O cara lá da AGU talvez bote o dedo ali no globo e não saiba nem onde fica Sobradinho, porque assiste com frieza, não tem nenhum envolvimento, trata isso como quem trata qualquer folha de papel, como qualquer processo que chega. Não identifica que por trás desse processo tem vida, meu irmão. Tem gente que está lá o dia inteiro tentando arrancar vida com a mão. Não é qualquer coisa, não. Não é o sujeito que todo final de mês vai à sua conta e está lá o salário. O cara tem que meter a mão todo dia na terra, tem que correr trecho para chegar ao final da tarde e saber o que bota dentro de casa para comer. Então não é nessa frieza que se analisa um processo desse. O sujeito analisa, não está aqui, vai lá para a Secretaria-Geral, com um verdadeiro desrespeito, sem ter inclusive a capacidade de cumprir o papel para o qual foi designado. Então é um negócio de estarrecer.
Se essa coisa tivesse um ano ou dois, Wellington, eu até me acomodava. Está bom, nós estamos processando, está novo. Nós não estamos falando de um ano ou dois. Nós estamos falando de gerações. Pelo amor de Deus! Não é possível que ninguém se sensibilize com isso! Depois vai um bocado de governante para lá: "Vou inaugurar não sei o quê!" Aí aperta um botão para jogar água. Para quem? Esses canais vão continuar alimentando só, e somente só, as figuras que vão lá e montam impérios.
Eu conheço essa região, Wellington, de andar muito com o meu amigo Grampão, lá no riacho, na beira lá, até a hora em que um jacaré velho se atrela a uma droga de rede daquela. Quando o cara tira o jacaré, lá vem: "Não pode! Tem que devolver o jacaré para lá!" Como é que eu vou devolver o jacaré para lá? O jacaré vive preso na rede, depois o cara vem lá e diz: "Não, vocês mataram o jacaré". Aí o cara ainda tem que dar um jeito de tirar a rede com o jacaré vivo. Legal, ainda tem isso! Há uma expressão que se usa muito no Acre, não é nem na Bahia, não. Eu estava brincando com o Jorge Viana lá. Quando a coisa está difícil, o cara se agarra no jacaré achando que é tronco.
Portanto é esse tipo de coisa. Não estou de brincadeira, não, porque eu estive lá. Você se lembra, Francisco? Nós estivemos lá numa época inclusive de perseguição. Eu fui lá como Deputado Federal para ver um processo de perseguição. Fui lá com uma comissão de direitos humanos. E no dia, exatamente, tinha morrido um jacaré numa rede dessa e o pessoal estava acusando o povo de ter matado. Se o jacaré morreu, vai ter que comer! Vai fazer o quê? Vai jogar o jacaré no mato?
Esse tipo de vida naquela região não é fácil. Mas para sair de Sento Sé, por exemplo, para Juazeiro, são 200 quilômetros de estrada. E é fim de linha. Agora, no ano passado, por exemplo, a única estrada federal que conseguimos fazer na Bahia, depois de muita insistência... Eu, por exemplo, tenho mais de dez anos botando recurso para fazer a estrada federal que nós chamamos de BR-235. A Bahia, meu caro Wellington, só tem pronta uma estrada leste/oeste. Toda BR que começa com 2 é uma leste-oeste. A Bahia só tem uma, que é exatamente no centro da Bahia, a 242, que sai do Paraguaçu, que é um baita rio, e vai até a divisa da Bahia com o Estado de V. Exª, meu caro Donizeti...
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O SR. DONIZETI NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PT - TO) - E o Mato Grosso também.
O SR. WALTER PINHEIRO (Bloco Apoio Governo/PT - BA) - E o Mato Grosso, a 242.
O SR. DONIZETI NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Que integra toda a nossa região, o centro-oeste também.
O SR. WALTER PINHEIRO (Bloco Apoio Governo/PT - BA) - É a única estrada pronta.
Então, nós tentamos fazer mais duas: uma leste-oeste ao norte e outra leste-oeste ao sul. Essa leste-oeste ao norte sai de Sergipe e vai até o Piauí, a 235. O único trecho que conseguimos fazer recentemente foi na região de Remanso, e mesmo assim pouca coisa, estamos tentando terminar, estamos tentando chegar com ela lá em Carira, para chegar à foz, e estamos tentando chegar cá no Piauí com a 235. É uma região que padece de estrada.
Agora nós estamos fazendo um projeto ousado para tentar promover o abastecimento de água mais acima, acima do lago, lá na região de Campo Alegre de Lourdes, onde também temos uma reserva mineral muito grande. A região é rica em minério, calcário, pedras preciosas, e água. Se o solo fosse ordinário, não dava uva! Aliás, este é o segredo da uva: quanto mais difícil o solo, meu caro Donizeti, melhor é a uva, porque a raiz se aprofunda para buscar nutrientes. Essa é a tese da uva, que é a mesma tese das oliveiras. É por isso que você vai encontrar no mundo inteiro o seguinte: no lugar onde geralmente o cara planta uma parreira, ele planta uma oliveira. Em alguns lugares do mundo, a oliveira, hoje, é o defensivo agrícola natural da parreira. É por isto que todas as grandes vinícolas viraram grandes produtoras de azeite: porque plantam as duas coisas. Esse terreno é o mesmo terreno que existe na região, o mesmíssimo terreno!
Por que o incentivo não pode ser dado? Não estamos pedindo favor para essas famílias, estamos pedindo condições para essas famílias viverem, e há todos os meios para chegarmos a isso.
Então, quero encerrar pedindo à Comissão que pudéssemos extrair desta audiência pública aqui algumas iniciativas.
A primeira delas... Eu quero, inclusive... Eu não gostaria de me dirigir pessoalmente ao Advogado-Geral da União, eu preferiria que a Comissão fizesse o comunicado a ele, primeiro, da conduta de desrespeito da AGU em nos comunicar... Eu recebi o comunicado ontem à noite no plenário - chegou aqui à Comissão, e a Comissão prontamente levou ao Presidente da Comissão, que estava no plenário ao meu lado e me chamou para mostrar a hora em que tinha chegado o ofício comunicando essa decisão. Você agora se dispõe a conversar? Por que não se dispôs a conversar em abril, ou melhor, no início de maio, quando a Comissão provocou o órgão de Governo para essa conversa? O que é que há? Por que não? Então, cobrar oficialmente... Eu não quero fazer... Até disse ao Davi Alcolumbre ontem que talvez o que deveríamos fazer era convocar o Advogado-Geral da União, que hoje é Ministro de Estado, portanto, caberia tranquilamente meter um requerimento aqui convocando-o a vir para cá. Mas eu não sei se a presença dele aqui hoje, sincera e honestamente... Eu já cheguei à conclusão de que a convocação do Advogado-Geral da União não resolveria o problema. Significaria eu gastar um instrumento, me chatear para trazer alguém para cá para falar nada de nada, sinceramente.
Então, eu vou optar por um caminho que é um caminho que eu acho que é... Seria importante se a Comissão pudesse notificar, mas eu vou procurar, inclusive, o Supremo Tribunal Federal. Acho que é importante isto: buscar as instâncias do Judiciário para provocarmos, efetivamente, essa discussão, assim como fizemos no caso dos índios, assim como fizemos na questão da demarcação de terras, meu caro Donizeti - envolvemos o Supremo Tribunal Federal -, assim como fizemos nos processos que envolviam novos trechos, novas construções, linhas de transmissão e coisas do gênero, que envolviam barragens, atingidos, áreas, remanejamento. Então, vamos tomar essa providência.
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Eu gostaria muito de contar com a aquiescência da Comissão, com o apoio da Comissão desta Casa para que pudéssemos, a partir dessa audiência... Não podemos ficar aqui só na manhã de lamentos. Podemos ir para os encaminhamentos. Isso é importante para que tenhamos condição de fazer dessa questão, talvez, até um paradigma para resolver outras.
Volto a insistir: não estamos falando de nada que não possa acontecer, até porque nós já tivemos várias experiências desse tipo com desdobramento e com desfecho. Não faz sentido a União achar que tem que esperar o resultado de uma sentença judicial para tomar medidas que podem ser adotadas imediatamente pela Chesf ou por qualquer outro organismo, como a própria Codevasf, que atua na região, ou até pelo Ministério do Desenvolvimento Social, pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, com o envolvimento das instâncias de governo para que, de forma combinada e articulada, pudéssemos produzir políticas ali - por exemplo: com a utilização do Pronaf, com a utilização de recursos da pesca, com a utilização de recursos do Bolsa Família.
V. Exª falou há pouco em Santana dos Brejos. Eu me lembro de que uma vez, meu caro Wellington, o pessoal chegou a Santana dos Brejos e convenceu todo mundo lá a plantar cana. Aí, botou o povo lá... "Estamos agora na política da cana" e depois deram um cano em todo mundo. Não adianta chegar lá e dizer para essas pessoas... É modismo! Aí, o sujeito muda de cultura, mas não tem assistência, não tem assistência técnica, não tem acompanhamento, não tem recurso. São fatos e fatos repetidos historicamente, erros cuja continuidade não podemos mais permitir.
Então, eu queria, nessa linha do encaminhamento, que pudéssemos adotar essas medidas e fazer com que efetivamente esses atingidos pelo Lago de Sobradinho possam ter a oportunidade de desfrutar... Nós ganhamos energia de Sobradinho, mas quem está ao lado de Sobradinho a última coisa que ganha é energia. Eu não duvido nada de que ainda possamos ter situações das mais complicadas. Deve haver gente na beira do Lago de Sobradinho que ainda usa, como dizem na gíria lá, alguma luz de fifó - isso diminuiu muito, porque o programa de Lula, o Luz para Todos, terminou conseguindo atingir todo mundo.
Eu me lembro de que uma vez eu passava por Santana do Sobrado, que é uma localidade que quer até se emancipar agora - é na saída de Casa Nova -, e a turma de Santana do Sobrado, todas as vezes que passávamos por lá, o pessoal dizia: "Pinheiro, está aumentando aqui! Agora já há luz para todos em todo canto e agora há mais gente. Por isso agora a gente quer virar cidade!". Essa foi uma das grandes políticas adotadas pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Eu estive com o Presidente Lula, Donizeti, quando completamos 150 mil unidades alcançadas pelo Minha Casa, Minha Vida. Isso foi feito lá no Derréis. Derréis é uma localidade que fica entre Santo Estevão e Rafael Jambeiro, no meio lá. Na realidade, cortando um pouco pela 116 adentro, entrando ali, fica o Derréis. Ali, entre o Derréis e o caminho de Rafael Jambeiro, fomos com Lula. Uma das coisas que mais me chamou a atenção foi exatamente uma dona da casa dizer a Lula o seguinte: "Eu agora fico brincando aqui com o interruptor, batendo toda hora no botão" - em Salvador muita gente chamava de "chuíte", termo que vem do inglês e terminou ficando lá, mas no interior chamam de botão, interruptor. Outra coisa que ela disse: "Lula, sabe como é que eu via meus meninos? Eu pegava o candeeiro, olhava a cabeça, depois corria com o candeeiro velho para ver o pé, para ver o que estava descoberto. Agora é só bater aqui no botão e iluminar o menino todo!". E os meninos diziam: "Agora vamos poder estudar à noite, porque com a luz de vela a letra ficava sambando". À medida que o vento velho batia à noite ali, no cordãozinho mergulhado no querosene, um candeeiro, na maioria das vezes, feito de garrafa de vidro ou de zinco, bem produzido o candeeiro... Agora, a letrinha de noite, Wellington, não vai balançar mais.
A minha esperança é de que o povo que está vivendo na beira do Lago de Sobradinho possa ter acesso a essa água, acesso à irrigação e, principalmente, acesso à vida.
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O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Esta Presidência gostaria muito de parabenizar o Senador Walter Pinheiro por ser sempre atuante nesta Casa em vários temas. Hoje, agora há pouco, estávamos na Comissão de Infraestrutura e S. Exª deu uma aula para todos nós sobre um tema relevante, que é a implantação das torres de telefonia nas cidades, uma área que ele estuda muito. Percebemos que, quando ele vai a um assunto, vai ao fundo, vai buscar na raiz. Aqui ele demonstrou também essa competência na defesa de um caso que, na verdade, é da Bahia, mas temos esse exemplo em muitos lugares do Brasil.
Há até a indignação de muitos ao ver uma obra pública que é feita impactando uma comunidade, que não recebe diretamente nenhum benefício. Isso aconteceu no meu Estado, Senador Walter, com a implantação da ferrovia no meu Estado, na minha cidade, uma cidade pequena, a mais de 2 mil trabalhadores, o que causou um impacto ambiental e social muito grande e a prefeitura pequena teve de cuidar de tudo aquilo. A obra segue, vai para novas cidades e fica o rastro, porque a prefeitura não consegue atender à questão da saúde, enfim, todos os demais problemas se não tem apoio para receber essa população. Os senhores sabem que, desde doenças, prostituição e outras coisas acabam atingindo uma população que não está preparada para aquilo, para uma mudança abrupta, até cultural.
Por sugestão do Secretário da Comissão, Senador Walter, V. Exª poderia fazer um requerimento para ser encaminhado pela Comissão para o Ministro Adams, que teria 60 dias de prazo para responder, cometendo crime de responsabilidade se não o fizer. Então, é uma sugestão que ficaria como encaminhamento: requerimento de informação sobre tudo que foi discutido.
O SR. DONIZETI NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Sr. Presidente...
O SR. PRESIDENTE (Wellington Fagundes. Bloco União e Força/PR - MT) - Gostaria, antes de passar a palavra ao Senador Donizeti, de convidar para assumir a Presidência o Senador Walter, já que tenho uma consulta médica neste momento. Gostaria de pedir que S. Exª assumisse.
Passo a palavra ao Senador Donizeti, que é coautor deste requerimento.
V. Exª tem a palavra pelo tempo que entender necessário.
O SR. DONIZETI NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Sr. Presidente, Sr. David Wylkerson, Cláudio Sílvio Basto, Márcio Moreira, José Gomes, agradeço o atendimento dos senhores em estar aqui, nesta manhã, para debater um tema tão importante, de grande relevância.
Conheço pouco do problema, não tenho o domínio que o Senador Walter Pinheiro tem sobre o assunto e sobre a exposição que vocês e ele fizeram aqui, mas de muito venho debatendo que, se mantivermos essa matriz de energia da água, as hidrelétricas...
Nós precisaremos mudar o modelo que tem sido levado a cabo. Os ribeirinhos têm que ser sócios da hidrelétrica e têm que ser recolocados na margem do lago. Eles fazem parte de uma cadeia que opera e toca a vida, que depende da água, sobretudo da fertilidade que o rio traz, que alimenta ano a ano as vazantes, a extração pesqueira e de outros produtos.
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Quando fazem bem - neste caso nem indenizaram -, tiram o cidadão da margem do rio e colocam numa chapada, numa casinha quente, num lugar telado, numa moradia de baixa qualidade e querem que ele dê certo. Não vai dar certo. Se ele está na margem do rio e dependem do rio para fazer a hidrelétrica, no meu ponto de vista, Senador Walter Pinheiro, temos que encontrar um modelo em que ele seja participante do investimento.
Acompanhei o caso da Hidrelétrica de Estreito, na secular cidade de Babaçulândia, onde o cidadão, que está ali há muitos anos, teve a sua moradia avaliada em R$15 mil e querem indenizar, porque lá toma uma parte da cidade, com R$15 mil. Isso não vai resolver o problema dele. Então, nós precisamos fazer com que esses atingidos sejam participantes. Esse investimento vai dar retorno para o grupo investidor. Então, uma parcela desse retorno tem que alcançar, ao longo da concessão de 30 anos, também os atingidos por barragens, principalmente os que estão à margem do rio.
Quanto ao encaminhamento que posso dar, já que a Secretaria-Geral recebeu ontem o grupo e deu essa resposta, Senador Walter, é que esta Comissão também tem que ir, pressionar a Secretaria-Geral e fazer uma mesa dos interessados, da Advocacia-Geral e Secretaria-Geral, urgentemente, para debater o assunto, porque numa mesa que envolva os três: a Advocacia-Geral, a Secretaria-Geral e o grupo dos prejudicados pela construção da barragem de Sobradinho é que se poderá encontrar uma saída. Só dizer: "Está judicializado e agora vamos esperar o resultado" é um ato que não espero deste Governo, do qual defendo e participo desde muito. Então, acho que precisamos conversar com a Secretaria-Geral, com a Advocacia.
O encaminhamento que posso fazer, se for o caso, é que façamos uma outra audiência com os três atores. Podemos propor, não precisa da audiência, marcar uma audiência na Secretaria-Geral para que convoquem o Advogado-Geral e os representantes da parte tão sacrificada, pelo que pude perceber aqui.
Tem histórico. Pelo que entendi da fala do Sr. José Gomes, ele disse que, parece, numa época, os processos sumiram, desapareceram dos cartórios. É um trabalho de má-fé, de má vontade, de maldade para com essas famílias que não tem medida. Já vi no meu Estado cartório incendiado etc. Essas coisas, vira e mexe, acontecem. Penso que estamos modernizando e chegará o tempo em que isso não ocorrerá mais.
Então, o meu encaminhamento, Senador Walter Pinheiro, tenho que ir para a Secretaria de Direitos Humanos, porque o Paim está me convocando, sou titular lá e suplente aqui, mas esse tema me interessa, penso que nós deveríamos fazer esse encaminhamento, colocando a Secretaria-Geral, a Advocacia-Geral e a parte interessada também com a presença da Comissão, para ver se conseguimos tirar o encaminhamento que seja melhor do que essa resposta fria e matemática que o Governo deu neste momento.
Obrigado.
O SR. DALIRIO BEBER (Bloco Oposição/PSDB - SC) - Ao ouvir a manifestação do Senador Walter Pinheiro, não resta dúvida de que ele trouxe um assunto extremamente relevante que, de fato, não deveria merecer ou estar sendo tratado assim, digamos, nesta oportunidade, uma vez que um assunto tão pequeno deveria ter sido resolvido há muito tempo, especialmente por se tratar de uma questão de humanidade. São 240 famílias apenas que estão ao lado de um lugar que tem água, existe terra, existe sol, existe energia elétrica, uma vez que o próprio lago foi construído com esse propósito, e existe gente que quer trabalhar, que quer ter a oportunidade de reconstruir a sua vida, a sua atividade econômica com dignidade. E é muito fácil. Deveria ter sido resolvido.
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Nós esperamos que a própria Companhia Hidrelétrica do Rio São Francisco tenha essa sensibilidade de criar um programa, até por sua responsabilidade social. Se não for, digamos, sob a ótica de indenizar, de reconstruir a vida dessas 240 famílias, que seja sob a ótica da responsabilidade social desse próprio empreendimento, que deslocou essas famílias dos locais onde viviam, onde já tinham criado a sua sistemática de vida, e, em razão disso, estão aí há 30, 40 anos, sofrendo. Eu imagino que os filhos desses que já partiram tenham uma profunda dor no seu peito de saberem que os seus pais partiram sem que tivessem presenciado, vivido uma solução.
Então eu acho que o assunto, até pelos que aqui se manifestaram, é muito oportuno. E sobretudo a indignação do Senador Walter Pinheiro manifesta, em profundidade, esse sentimento que, com certeza, envolve todos aqueles que têm proximidade com o problema, principalmente essas famílias que muitas vezes não têm voz. Portanto, esse instrumento de hoje passa, digamos, a criar alguma expectativa de vez. Tomara que nós sejamos felizes em encontrar, através desta audiência pública, um encaminhamento que possa, no curto prazo, devolver a esperança de uma solução para essas 240 famílias.
O SR. PRESIDENTE (Walter Pinheiro. Bloco Apoio Governo/PT - BA) - Obrigado.
Bom, eu vou caminhar para o encerramento e fazer esse encaminhamento aqui proposto para que a gente, inclusive, dê desdobramento a esta audiência. Vou pegar a sugestão, inclusive, do Senador Donizeti.
Particularmente acho também que não há necessidade de outra audiência pública. Acho que o correto agora é atacarmos as diversas frentes. De modo próprio, inclusive, vou fazer a provocação no Supremo Tribunal Federal. Já havia conversado com um dos membros daquela Corte e vou procurar agora o Presidente. Tinha procurado um Ministro para conversar sobre esse tema, até porque fizemos isso várias vezes com o Supremo em outras frentes. Há uma frente. Por isso até eu tinha sugerido que aqui na Casa esse debate fosse patrocinado exatamente nesta Comissão, porque aqui tem sido debatido muito a questão do São Francisco. Aprovamos aqui recentemente um projeto da própria Senadora Lídice e há um debate em curso, encaminhado pelo Senador Otto Alencar, que diz respeito à própria questão da revitalização. Eu agora sou relator de uma matéria, inclusive, apresentada pelo Senador Otto, que trata da questão dos ribeirinhos e tem a ver exatamente com a questão da diminuição e do trato dado à questão do imposto territorial à margem do São Francisco. Então a ideia de trazer para cá era exatamente entendendo que esse é o foco que acho importante a gente tratar. Agora, não adianta eu falar em recuperar o rio, retomar a questão da mata ciliar e resolver o problema de vazão quando a gente tem um conjunto de pessoas ali na beira do rio padecendo.
Eu falei muito aqui do Lago de Sobradinho, mas é importante lembrar que a gente tem problema do outro lado também. Temos problema lá na Barra, temos problema lá em Xique-Xique. Em todos esses lugares, se as pessoas fizerem um pouquinho de exame, criarão na cabeça uma imagem. Nós estamos falando de um lugar que tem água que não acaba mais. A Barra do Rio Grande, como é chamado o Município, é inclusive o ponto de encontro de dois rios. Não é só o Rio Grande, não. Ainda tem o velho São Francisco. Portanto nós temos água de sobra. O problema é que está faltando uma atitude para que a gente possa implementar políticas nessa região.
Eu fico, meu caro Francisco, cada vez mais abismado, porque, como a gente anda muito nessas regiões, eu conheço o sofrimento das pessoas, a gente vê o sujeito vivendo lá na ilha, por exemplo, ali em Xique-Xique, no São Francisco, as pessoas passando dificuldade. Hoje, em vários daqueles trechos ali, as pessoas passam a pé, atravessam a pé, saem da ilha no meio do São Francisco para a beira a pé, sem nenhum problema. Não precisam mais pegar o barquinho.
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Nós tínhamos trechos navegáveis no São Francisco que eram um negócio assim esplêndido. Hoje há dificuldade. Nós tínhamos uma atividade econômica que era desenvolvida de Ibotirama até Juazeiro que levava o algodão da Bahia para lá. Ali de Juazeiro o algodão ia inclusive para algumas unidades de beneficiamento até no Ceará, uma empresa cearense chamada Icofort. Para quem não sabe, a Bahia produz 95% de todo o algodão do Nordeste. Noventa e cinco por cento de todo o algodão do Nordeste é produzido na Bahia. E a gente não tem nem como escoar essa produção por hidrovia, problema sério. Uma imensidão de atividades poderiam ser potencializadas para gerar a renda, para gerar oportunidade, para criar condições na região. É inaceitável que isso não seja olhado de forma mais ajustada. Projetos de piscicultura, projetos, eu diria, de beneficiamento, enfim, uma série de outras coisas poderiam ser adotadas.
Então nós vamos tomar essas providências, buscando resolver essa demanda judicial, acatando aqui a sugestão até de levar uma comissão para promover, junto com a Secretaria-Geral da Presidência, uma reunião com todos os órgãos. Mas eu, particularmente, não vou abrir mão. Já que a querela é judicial, então, vamos, como diz a história, na jugular desse negócio, até o fim e ao cabo. Vamos solicitar a entrada do STF para que esse processo possa, inclusive, subir, para que esse processo possa ser agilizado, para que esse processo possa correr e a gente ter uma sentença. Pior do que a negativa é o silêncio. Portanto a expectativa é de que...
Quem está sofrendo mais do que eu já viu inclusive a sua geração ir embora, principalmente os seus, as suas raízes irem embora, e não veem isso resolvido. Esse é um sofrimento.
Eu me lembro muito de uma coisa que eu conversava com meu pai. Minha mãe tem 90 anos, fez agora, este ano, 90 anos. E eu me lembro de que uma das grandes batalhas do meu pai era a legalização da casa. Meu pai foi uma figura que saiu da roça, foi embora para a cidade grande, e eu, como sou já dos últimos, já nasci na beira do trilho, porque o meu pai foi embora para Salvador, virou ferroviário. O maior dilema do meu pai era esse. Ele sempre dizia assim: "Eu vim da roça, eu tinha minha terrinha, vim para a cidade grande e morava numa casa que a gente pagava todo o ano ali". E a briga que nós estamos travando com o Governo Federal hoje, essa história de área de Marinha e não sei o quê, do dono, fulano de tal, famílias e mais famílias que até hoje ainda, na própria Salvador, vivem lá de casa em casa fazendo arrecadação como donos da cidade, essa foi uma briga da posse. Meu pai faleceu, foi embora e não viu a transferência definitiva de uma casinha que ele adquiriu assim que chegou à cidade de Salvador. Obviamente, depois de ter morado anos e anos num subúrbio ferroviário em Escada, depois se dirigiu para uma área que era fruto de aterro e ali comprou uma casinha. Faleceu e não viu a sua casa ser transferida para o seu nome.
Portanto, este é talvez o maior desespero desses atingidos por barragem hoje: o sujeito viu a sua geração ir embora e não vê nenhuma possibilidade de, no curto prazo, resolver as questões para que a próxima geração, dessa geração que restou, tenha oportunidade de viver dignamente no seu pedaço de terra, e não só viver, como dali também produzir.
Quem acompanha de perto essa experiência da agricultura na Bahia, todo mundo sabe que essas famílias tendem a ir distribuindo a sua terra com os filhos. Essa é uma lógica que é extremamente correta. E nem isso hoje a gente tem como um legado, como herança.
O Wellington falava aqui que o pai dele deixou um nome bom, porque não tinha nome bonito e nem tinha o que deixar.
Lá, do jeito que os cartórios estão dando sumiço nesses documentos, daqui a pouco vão dar sumiço até em certidão de nascimento. Extinção pelo registro!
Está encerrada esta reunião.
(Iniciada às 10 horas e 10 minutos, a reunião é encerrada às 11 horas e 44 minutos.)