23/09/2015 - 43ª - Comissão de Meio Ambiente

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Bom dia, senhores e senhoras!
Declaro aberta a 43ª Reunião da Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura.
Submeto aos Srs. Senadores e Srªs Senadoras a dispensa da leitura e a aprovação da ata da reunião anterior.
Aqueles que concordam permaneçam como estão. (Pausa.)
Aprovada a ata.
A presente reunião atende ao Requerimento nº 73, de 2015, da Comissão de Meio Ambiente, de autoria do Senador Donizeti Nogueira, e destina-se a instruir o Projeto de Lei do Senado nº 248, de 2014, que versa sobre a instituição de regras para a preservação da calha principal e o curso natural do Rio Araguaia.
Esta reunião será realizada em caráter interativo, ou seja, com a possibilidade de participação popular. Dessa forma, os cidadãos e as cidadãs que queiram encaminhar comentários ou perguntas, podem fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania, no endereço: www.senado.leg.br/ecidadania, ou ligando para o número 0800- 612211.
Vamos dar início à nossa audiência pública.
Desde já eu quero agradecer aos convidados e às convidadas que estão aqui para colaborar conosco nesse debate tão importante que trata do Rio Araguaia. O Rio Araguaia é uma rio nacional, que tem uma importância muito grande para o nosso País, principalmente para o meu Estado, o Tocantins, os Estados de Goiás, Mato Grosso, Pará, que são banhados por esse importante curso de águas.
Para compor a nossa Mesa, e para participar desta audiência eu convido, então, para tomar assento à Mesa: Adriana Lustosa, Diretora de Recursos Hídricos do Ministério do Meio Ambiente (MMA); convido também a Professora Liliana Pena Naval, da Universidade Federal do Tocantins (UFT), e Heloísa Aquino, Assistente Técnica da Secretaria de Patrimônio da União (SPU/MPOG) do Ministério do Planejamento.
Agradeço aos presentes e informo que também o ICMBio havia sido convidado, mas, conforme acordado com o Ministério do Meio Ambiente, entenderam que a representação ideal seria a do Ministério do Meio Ambiente, que tem mais informações sobre o tema e que reúne mais condições para o debate. Mesmo assim, eu quero agradecer ao Presidente do ICMBio que, de pronto, havia confirmado sua presença. Mas, conforme entendimento, ele nos comunica a decisão, e nós não só a respeitamos como louvamos a importância dada ao tema, tanto que levou o Ministério do Meio Ambiente a fazer uma reunião anterior à audiência pública.
Também enviamos convite ao Instituto Socioambiental Araguaia, um instituto de proteção ambiental, mas a instituição não indicou representante. Certamente, contaremos com a presença do instituto em outra oportunidade.
Antes de passar a palavra às nossas convidadas - hoje nós temos aqui uma Mesa majoritariamente feminina, então, certamente, nós teremos um debate ainda melhor -, trago à lembrança o nome de um poeta conhecido pelos goianos, tocantinenses e pelos os candangos também, Pedro Tierra, que fez um poema quando da inauguração da Hidrelétrica de Lajeado. O nome do poema, se não me engano, é Barragem.
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Um rio quando barragem
tem a espinha quebrada,
vira um rio paralítico
feito um animal vivo
que morreu só a metade:
a outra metade viva pulsando
solta, como veia aberta a foice...
Um rio quando barragem anoitece
as manhãs que cultivava...
O rio teima em manter-se rio, corrente:
uma veia de esmeralda líquida e retesa
varando o ventre do lago,
feito alma submersa
e luminosa a lhe dar sentido.
Vencido, o rio se abranda em barros e silêncios.
Grávido, cálido, fermentado.
Engendrando o desconhecido
Belo ou monstruoso que saltará sobre nós.
Esse poema é de Pedro Tierra. O nome dele é Hamilton Pereira, mas no tempo da ditadura usou o pseudônimo de Pedro Tierra, como o poeta ficou conhecido.
Devo registrar também, para as nossas convidadas, que nós já realizamos uma primeira audiência pública, com a presença da Aneel, da Antaq, do Ministério dos Transportes e do Ministério da Agricultura.
Farei um resumo do que foi discutido anteriormente.
O argumento central do projeto é que o potencial turístico do Araguaia supera seu potencial de geração de energia elétrica e, por isso, seria necessário vedar a construção de barragens no rio. Entretanto, na semana passada ouvimos, na primeira audiência pública destinada a discutir esse projeto, diversas objeções ao incremento do nível de proteção ambiental do rio.
O representante da Agência Nacional de Águas (ANA), Sr. Wagner Vilella, ressaltou que a Política Nacional de Recursos Hídricos impõe um uso múltiplo desses recursos e que a legislação vigente já prevê um nível adequado de proteção dos nossos rios. Ainda de acordo com a ANA, a eficácia na proteção do Rio Araguaia depende muito mais de uma abordagem no nível de bacia hidrográfica do que exclusivamente da calha do rio.
A representante da Agência Nacional de Energia (Aneel) informou sobre os estudos em andamento para a viabilidade técnica e ambiental da construção de três usinas hidrelétricas no curso do Rio Araguaia: Couto Magalhães, Torixoréu e Santa Isabel. Juntas, as três teriam a capacidade de gerar cerca de 1,6 mil MW de energia. Os novos estudos devem ficar prontos até novembro de 2016.
O representante da Agência Nacional de Transportes Aquaviários declarou-se contrário ao projeto, uma vez que criaria barreiras à exploração do potencial hidroviário dos trechos navegáveis do Araguaia.
De maneira geral, as manifestações na primeira audiência pública foram críticas ao projeto.
Ressalto que o desafio aqui é encontrar uma forma de elevar o nível de proteção ambiental do Rio Araguaia sem criar barreiras intransponíveis ao uso múltiplo dos seus recursos hídricos.
Na audiência de hoje, ouviremos a opinião de representantes da área ambiental do Poder Executivo, da Universidade Federal do Tocantins e do Patrimônio da União. Gostaria de já deixar uma pergunta para avaliação das componentes da nossa Mesa: qual a opinião das senhoras sobre uma eventual inclusão no Sistema Nacional de Unidades de Conservação, Lei nº 9.985, de 2000, de uma nova categoria de Unidade de Conservação de Uso Sustentável que contemple a proteção de um rio?
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Aqui já não falo mais apenas do Rio Araguaia, mas da criação da categoria de Unidade de Conservação Rio-Parque. Poderíamos ter o Rio-Parque Araguaia, o Rio-Parque São Francisco, o Rio-Parque Taquari, que seriam criados pelo ICMBio, de acordo com o rito estabelecido na lei do SNUC. Poderíamos inclusive pensar em estabelecer restrições de uso temporário, no sentido de favorecer a recuperação de uma determinada bacia ou microbacia hidrográfica. Nesse caso, se as senhoras acharem que essa pode ser uma boa ideia, quais seriam os objetivos e as características de uso dessa nova categoria de Unidade de Conservação (UC)?
Nós estamos fazendo essas audiências, para instrumentar o projeto de lei da Senadora Kátia Abreu, que versa sobre a questão do Rio Araguaia, da proteção da calha, da restrição a alguns usos do rio. Resolvemos fazer essas audiências públicas, que eram duas, agora estamos estendendo para três - vamos pedir à Comissão que aprove mais uma - para ouvirmos os Secretários de Meio Ambiente e de Agricultura de Goiás, do Mato Grosso, do Pará, do Tocantins e do Maranhão, para sabermos as posições dos Estados de construirmos, de repente, um marco regulatório específico para o Rio Araguaia, dada a diferença que ele traz, por ser um rio novo, um rio de planície, bastante caudaloso, que está dentro de uma região que envolve mais de um Bioma - Cerrado, Floresta Amazônica, Pantanal -, e isso faz do Rio Araguaia um rio diferente de outros, como o Rio Tocantins, que já tem cinco hidrelétricas. O Rio Tocantins caminha para ser um grande lago, um grande e único lago.
Então, era isso o que gostaríamos de discutir com vocês aqui hoje.
Eu vou chamar, para fazer as suas considerações iniciais, a nossa companheira do Ministério do Meio Ambiente, Drª Adriana Lustosa, Diretora de Recursos Hídricos do Ministério do Meio Ambiente. Penso que podemos ouvi-la, primeiro, por 15 minutos. Se a senhora precisar de mais um tempo, teremos mais cinco minutos.
A SRª ADRIANA LUSTOSA - Bom dia!
Primeiramente, agradeço o convite para, em nome do Ministério do Meio Ambiente, trazer o nosso posicionamento com relação a esse projeto de lei que estabelece regras para preservar a calha principal e o curso natural do Rio Araguaia.
Eu vou utilizar o apoio desse PowerPoint. Não sei dá para todos enxergarem.
Inicialmente, eu quero colocar que o Ministério do Meio Ambiente reconhece o mérito da proposta, que se preocupa com a preservação de um rio tão importante, um rio nacional tão importante para o País, só que nós gostaríamos de levantar algumas questões de implicância em relação à Política Nacional de Recursos Hídricos.
Ali está um mapinha. Eu vou levantar para poder...
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Mas a senhora precisa...
A SRª ADRIANA LUSTOSA - Ah, precisa gravar, não é?
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - É.
A SRª ADRIANA LUSTOSA - Esse mapinha que está demonstrado... Eu estou baseando a minha fala em dois documentos: um é o Plano Estratégico de Recursos Hídricos Tocantins-Araguaia, aprovado em 2009, pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos, que traz orientações em relação à gestão de recursos hídricos na bacia ou região hidrográfica Tocantins-Araguaia. E outro documento é a própria Lei nº 9.433, que estabelece a Política Nacional de Recursos Hídricos e cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.
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Esse mapa que vocês veem da bacia do Rio Araguaia trata os principais problemas e conflitos identificados na bacia na ocasião de elaboração desse plano, e observamos, naquela mancha lilás, no trecho médio do Rio Araguaia, é a área mais sensível, o trecho mais sensível do rio, porque comporta terras indígenas, comporta áreas de preservação ambiental, um sítio Ramsar, que é um sítio de área úmidas; existem compromissos do Brasil no sentido da conservação dessas áreas úmidas, é uma área sensível da bacia e que merece uma preocupação, e o plano orienta que qualquer tipo de outorga que vá influenciar nessa área da bacia deve levar em conta, antecipadamente, quais seriam as consequências disso no fluxo, na dinâmica do rio como um todo.
Essas áreas verdes também relacionadas à bacia do Araguaia são áreas de inundação, são problemas relacionados à inundação; e essa área laranja, mais embaixo, é uma área onde ocorrem processos erosivos.
Outra questão, todo o pontilhado do rio, praticamente todo o curso do rio tem problemas relacionados ao impacto da indústria turística na questão ambiental. Então, o próprio turismo, que é um uso ressaltado pelo projeto de lei, traz impactos ambientais para a calha do Rio Araguaia.
A gestão de recursos hídricos divide essa Bacia do Araguaia em algumas unidades de planejamento e, dessas unidades, a principal, a maior preocupação, em termos do ponto de vista ambiental, está relacionado ao Médio Araguaia.
Pode passar.
Como disse, nosso posicionamento está baseado na Política Nacional de Recursos Hídricos, e a política traz, entre seus fundamentos, que a gestão de recursos hídricos deve proporcionar os usos múltiplos da água. Na medida do possível, deve-se buscar acordos e consensos na bacia hidrográfica para conciliação dos diversos usos possíveis daquela água.
Outra questão levantada pela política é que a bacia hidrográfica deve ser a unidade territorial para implementação da política e a própria atuação do sistema de gerenciamento de recursos hídricos. A preocupação com a bacia se reflete, claro, na calha do rio. Então, muitas vezes, uma preocupação em você restringir usos na calha do rio não vai resolver o problema do rio. Às vezes, o problema do rio, e no caso desse especificamente, está relacionado ao uso e ocupação do solo na bacia. Diversos empreendimentos na bacia afetam a calha do Rio Araguaia. Por isso, olhar somente a calha, esquecendo do contexto da bacia hidrográfica pode ser não efetivo no sentido de preservar esse rio.
A outra questão também colocada pela lei é que a gestão deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades. Portanto, a tomada de decisão em relação à gestão de recursos hídricos deve envolver esses diversos atores que fazem parte dos colegiados de recursos hídricos.
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No caso da bacia, ela hoje ainda não conta com o Comitê de Bacia Hidrográfica, mas, onde não existe comitê, quem decide sobre a questão da gestão na bacia é o Conselho Nacional de Recursos Hídricos, principalmente, quando envolve aproveitamentos de recursos hídricos, cujas repercussões extrapolem o âmbito dos Estados. Então, a política se organiza por meio desses colegiados de recursos hídricos. Portanto, é uma política que sai daquela perspectiva do comando e controle, regulação, e passa para uma perspectiva de decisão consensuada, deliberação conjunta para decisões, envolvendo a gestão das bacias hidrográficas.
No Plano Estratégico Tocantins-Araguaia, eles trabalham, ao final de todas as etapas do plano, uma análise integrada desses resultados levantados e levantam algumas potencialidades para a bacia como um todo, algumas dessas especificamente relacionadas à Bacia do Araguaia. É uma bacia que tem água em abundância, que favorece o desenvolvimento dos usos múltiplos da água. É uma bacia que tem um potencial hidrelétrico grande, a Bacia Tocantins-Araguaia, mas grande parte desse potencial está localizado na região da Bacia do Tocantins. A sub-região do Araguaia detém apenas 16% desse potencial, e, atualmente, não possui usinas hidrelétricas em operação.
A questão agropecuária, que não está na cara, está na bacia, no solo, encontra, na bacia como um todo, condições favoráveis para o desenvolvimento e vem crescendo acima da média anual.
A irrigação também se encontra com grande potencial de crescimento na bacia.
A pesca e a aquicultura, principalmente no Rio Araguaia existe uma grande produção pesqueira, também na perspectiva do uso turístico, com a prática da pesca amadora. Você também tem a possibilidade do desenvolvimento do Corredor Norte-Sul, com potencialidade de integração dos sistemas de transportes hidroviário, ferroviário e rodoviário, melhorando o fluxo de commodities no País.
O turismo se encontra muito localizado na região do ecoturismo, das praias do Araguaia, também muito voltado para a questão da pesca esportiva.
Também a questão da biodiversidade, as principais Unidades de Conservação e áreas de proteção estão concentradas naquela região que mencionei anteriormente, que é a região do Submédio Araguaia.
As fragilidades identificadas. A questão da alteração dos regimes dos rios em função dos barramentos ocorre, principalmente, na região do Tocantins, se a gente está olhando a bacia como um todo.
O uso excessivo dos recursos hídricos, que tende a crescer, principalmente relacionado aos empreendimentos agrícolas. A bacia também sofre com secas e inundações. Naquele mapa que mostrei, alguns trechos do Rio Araguaia sofrem, especificamente, com inundações. Além do fenômeno natural, a drenagem urbana daquela região lindeira da bacia extrapola e aumenta os impactos dessas inundações.
A navegação é dificultada, principalmente, na área do Tocantins, por causa da inexistência de eclusas nos barramento hidrelétricos.
Existe a contaminação dos cursos de água, com baixo nível de tratamento dos esgotos municipais, na bacia como um todo, inclusive, na Bacia do Araguaia.
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A biodiversidade terrestre e aquática. Esses grandes projetos agropecuários com uma pressão sobre a vegetação implica conservação da biodiversidade terrestre, e os barramentos também prejudicam a biodiversidade aquática.
O nível econômico e de desenvolvimento local da bacia como um todo são abaixo da média nacional e também provocam algum tipo de prejuízo na gestão.
A questão do saneamento básico é bastante importante na bacia, porque os índices de atendimento estão abaixo da média nacional.
A questão da governança, a necessidade de fortalecer os órgãos gestores de recursos hídricos que atuam nos Estados e também a articulação desses órgãos com o Poder Público Federal é fundamental para melhorar a gestão na bacia.
E também a situação das populações tradicionais remanejadas principalmente em função dos barramentos e das inundações para represamento de águas.
São algumas fragilidades.
O plano aponta como ameaças para a bacia a visão segmentada e setorial sobre o desenvolvimento da região. Então, os diversos usos previstos na bacia e em desenvolvimento na bacia são planejados setorialmente, sem uma lógica integrada.
A questão do ingresso cada vez maior dos empreendimentos sem um adequado planejamento. E essa visão integrada com diversos usos pode gerar uma pressão ambiental em especial sobre os recursos hídricos.
E alguns desafios que o plano elenca é que, no Rio Araguaia, a água desempenha, não só no rio, mas na bacia como um todo, um papel estratégico na região, tanto em termos de disponibilidade quanto à questão da qualidade da água. E é necessário cada vez mais aprimorar o planejamento e a gestão para a sua utilização e conservação.
Também é necessário que, no âmbito dos Governos, tanto Federal como Estadual, haja uma melhor articulação dessas políticas públicas, setoriais. E aí podem ser pensados mecanismos para essa articulação.
E, finalmente, hoje a bacia ainda não conta com um colegiado de recursos hídricos que reúna os diversos atores interessados na gestão para discutir o desenvolvimento da bacia hidrográfica como um todo.
Então, é importante preencher essa lacuna institucional, buscando a formalização desse colegiado de recursos hídricos.
Aí estão as referências, basicamente o plano e a Lei nº 9.433.
Eu acho que termino aí.
Concluindo, reconhecendo o mérito da proposta, a gente considera que a proposta tem algumas implicações contra o que dita a Lei nº 9.433, que é a lei que rege a política de recursos hídricos. E é válido aprofundar a discussão e pensar, talvez, numa lógica que ultrapasse a visão da calha do rio e pense a bacia hidrográfica como um todo, porque, como foi colocado aí e você perceberam, os problemas normalmente não estão nas intervenções na calha do rio, mas nas intervenções relacionadas ao uso e à ocupação do solo que afetam a calha do rio.
Por enquanto é isso, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Muito obrigado, nossa Diretora do Ministério do Meio Ambiente, pela contribuição valiosa. Na verdade, aumentam ainda mais as nossas preocupações, porque quando você ouve um lado, pende para ele, depois ouve o outro... Mas é isso mesmo, a gente precisa ouvir as posições divergentes para a gente encontrar uma média que possa contemplar o que é melhor para a sociedade brasileira sem, contudo, ser sectário em uma posição ou em outra. Então, é muito importante isso.
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Nós vamos ouvir, agora, a Srª Heloísa Aquino, Assistente Técnica da Secretaria de Patrimônio da União. A SPU é quem cuida das áreas do Governo Federal nas margens dos rios nacionais. O patrimônio da União todo a SPU cuida e cuida também com essa obrigação de ter a visão da preservação ambiental.
Drª Heloísa, V. Sª tem a palavra por quinze minutos. Caso seja necessário um pouco mais, a gente cede-lhe mais cinco minutos. Não precisa ter pressa para falar, como a Diretora Adriana, que ficou com medo de o tempo não dar, mas o caso não isso ocorra, daremos um jeito.
A SRª HELOÍSA AQUINO - Antes de tudo, nós, da Secretaria de Patrimônio da União, gostaríamos de agradecer ao Senador Donizeti e a esta Casa o convite para participar desta audiência pública que a gente considera ser de muita relevância. De grande relevância porque o próprio Rio Araguaia é um dos principais do Brasil e se constitui dentro dessa malha hídrica, dessa rede hídrica que nós temos no País e, particularmente, na Amazônia, um dos rios principais. Então, a gente quer muito agradecer. Drª Cassandra não pôde estar presente e pede desculpas. Inclusive, ela está em férias, merecidas. A gente vem aqui, então, fazer esta representação.
A princípio, nós fizemos um estudo sobre o projeto de lei e a gente queria concordar com nossa colega do Meio Ambiente sobre o mérito dessa proposta. De fato, é um projeto de lei de relevância e que tem sua grande importância com relação e essa preocupação com o Rio Araguaia, dada até todas as características que Drª Adriana já colocou. É um rio bastante importante por tudo isso que já foi mostrado.
A gente queria louvar bastante esse projeto de lei da Senadora Kátia Abreu com relação à preocupação de que é preciso se preservar, de fato, esse rio.
Com relação ao que cabe à Secretaria de Patrimônio da União (SPU), os rios federais são considerados patrimônio da União, mas não são patrimônios, pura e simplesmente, como o patrimônio do Governo, mas o patrimônio do povo brasileiro. A gente queria deixar bem frisado que o Rio Araguaia, como rio da União, por ser um rio federal, se constitui, acima de tudo e também um patrimônio do povo brasileiro e daquelas pessoas que ali vivem e moram. O papel fundamental da SPU, vamos dizer, tem a missão principal de zelar por esse patrimônio e fazer com que esse patrimônio possa, de fato, cumprir com sua missão socioambiental, mas sempre compatibilizando essa missão, esse cumprimento da função socioambiental, com os interesses da Nação, para o País.
Então, a gente vê que o projeto de lei, apesar de seu grande mérito, a gente precisa compatibilizar o que está proposto aqui dentro do projeto de lei com os vários usos e com as outras - vamos dizer - questões que são importantes também para o País. A SPU funciona, vamos dizer assim, como a gente repassa, na verdade, as áreas da União para esses usos, e aí envolve-se tanto a questão da regularização fundiária nas áreas da União, nas áreas ribeirinhas e com relação às comunidades tradicionais, mas muito em função de nosso papel, talvez, de não só compatibilizar esses usos, mas um papel principalmente em que a gente tem de repassar essas áreas da União para que elas possam cumprir sua função socioambiental de fato. Acho que, do que está colocado do projeto de lei, nosso papel é muito de oportunizar essas áreas da União para os seus diversos usos.
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A SPU não tem ainda um posicionamento fechado com relação ao projeto de lei. Nós estamos ainda fazendo um estudo, dentro da Secretaria do Patrimônio da União, as várias áreas da SPU estão ainda fazendo análise desse projeto de lei e, portanto, ainda não temos um posicionamento fechado, mas consideramos, assim como a nossa colega aqui do MMA, que tem que haver um debate amplo. Acho que é importante fazermos esse debate amplo. Eu acho que esse projeto de lei vem abrir esse debate. Ele abre, no Senado, nesta Casa, esse debate, que é importante. É importante fazermos essa ampliação e ouvirmos outros órgãos de Governo, mesmo aqueles que já se manifestaram aqui, inscritos, como o Senador Donizeti colocou. Achamos que isso tem que ser ampliado.
Então, é isso. A Secretaria do Patrimônio da União se coloca à disposição - esse é o nosso papel - para as áreas da União para que elas, efetivamente, possam ter a sua função socioambiental sendo cumprida. E a gente acha que uma das questões importantes é também a questão da preservação ambiental. É claro que isso deve ser compatibilizado com o interesse público. E nós estamos sempre à disposição para fazer esse debate.
Senador, por enquanto, acho que é isso que nós temos a dizer. Esse projeto de lei tem um caráter muito mais na questão ambiental, mas a Secretaria de Patrimônio da União se coloca para a ampliação desse debate e está presente nessa ampliação se assim for entendido. Por enquanto, agradecemos e estamos à disposição.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Nós que agradecemos sua participação aqui, Drª Heloísa.
Esse debate precisa mesmo ser feito com muita profundidade. Nós estamos vivendo no País, neste momento, uma profunda crise hídrica, com sérios problemas. Nós vivemos em lugares que têm muita água concentrada e, ao mesmo tempo, falta água em regiões próximas. O meu Estado vive isso. Nós temos dois grandes rios, o Araguaia e o Tocantins, e uma série de rios que são afluentes desses rios, mas temos problema de seca violenta em algumas regiões. É preciso que cuidemos enquanto há tempo, para que isso não se agrave, sem, contudo, ter uma visão míope de que só existe um meio de resolver isso. Nós, certamente, haveremos de encontrar a possibilidade de preservação com prosperidade, porque a sustentabilidade não vai se dar se as pessoas estiverem passando fome, se não tiverem energia, principalmente em Palmas, onde faz um calor danado.
Então, agradeço mais uma vez. Estou muito feliz de participar deste debate aqui e ter tido, junto com a minha assessoria do gabinete - especialmente o Ciro, que acompanha isso -, a visão de que precisávamos fazer essas audiências públicas.
Vamos ouvir, agora, a Profª Liliana Pena Naval, da nossa grande e jovem Universidade Federal do Estado do Tocantins.
A SRª LILIANA PENA NAVAL - Bom dia!
Em nome do Reitor da Universidade Federal do Tocantins, Prof. Márcio Antônio da Silveira, nós agradecemos imensamente o convite, porque é um debate extremamente importante e que nos interessa diretamente, como defensores do Estado do Tocantins pelo menos.
E, como já dito aqui anteriormente, tanto o Rio Tocantins como o Rio Araguaia compõem o que é denominado Bacia Tocantins-Araguaia, que é a bacia hidrográfica mais importante do País - não só mais importante porque é a maior, mas porque provê maior quantidade de água.
O que o Senador acaba de colocar é verdadeiro e muito importante, porque o Tocantins tem os dois maiores rios do País, a maior bacia hidrográfica nacional, e nós temos escassez de água dentro do Estado do Tocantins. Então, isso está relacionado à gestão, me parece.
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E, com isso, eu gostaria de dizer, gente, que a posição que eu trago aqui é favorável à proposta de criação do Rio-Parque, considerando que essa proposição de criação do Rio-Parque que não exclui os usos múltiplos que, me parece que é uma preocupação bastante importante e que ela é concernente à Política Nacional dos Recursos Hídricos, que preconiza, então, a utilização múltipla dos recursos, mas eu gostaria que fosse entendido também que, quando se fala em usos múltiplos, não necessariamente há de se contemplar a produção de energia ou o derrocamento das bordas do rio para construção de... Sei lá, para que ele se torne navegável.
Então, usos múltiplos são vários usos, e não necessariamente a inclusão de usos específicos, que me parece que está sendo a preocupação aqui.
Também foi mencionada aqui a questão dos sucessivos barramentos no Rio Tocantins, mas virão, estão previstos, se eu não me engano, talvez a Srª Adriana possa confirmar isso, a longo prazo, Senador, 17 barramentos, mais 17 barramentos. Isso inviabilizaria, quer dizer, descaracteriza completamente o rio. Ele vai passar a ser um grande reservatório. E não sei se é sabido de todos, mas, de tempos em tempos, e infelizmente em tempos curtos, nós temos observado mortandades de muitos peixes no Rio Tocantins. São toneladas e toneladas de peixes que morrem e as causas não estão muito bem elucidadas, mas nós pensamos que elas estão vinculadas um pouco aos barramentos realizados.
Gostaria de colocar também, gente, a importância de trazer um debate sobre a viabilidade da utilização de outras formas de energia. Os Estados que são abrangidos pela bacia hidrográfica, e o Brasil como um todo, têm uma quantidade de energia solar disponível enorme, e o Tocantins, todavia, mais. Ele é uma das regiões de maior incidência solar do Planeta. Então, nós poderíamos pensar em alternativas nesse sentido e, também, na produção de energia eólica, que são outras duas formas de energia limpas e menos potencialmente impactantes que a energia produzida pelas hidrelétricas, a qual nós reconhecemos a importância, mas existem outras formas de fazer produção de energia limpa.
E essa preocupação em garantir o que está preconizado na Política Nacional das Águas, na Lei nº 9.433, de 1997, que traz a Política Nacional dos Recursos Hídricos que regula toda a gestão de uma bacia, eu não vejo que ela fique comprometida e nem que essa prática seja uma afronta à política. De forma alguma. Parece-me que a aprovação, a criação de um Rio-Parque ajudaria muito, porque a gestão do Rio-Parque, se é assim que pode ser denominado, não seria feita pelo Tocantins ou pela... Continuaria tendo a mesma forma de gestão, porque é interestadual, seria interestadual. Então, eu não vejo que a gestão gerasse qualquer tipo de conflito e, do contrário, eu vejo que ela facilitaria, seria um facilitador para a execução do Plano Nacional de Recursos Hídricos, a considerar, e sem desrespeito e julgamento de méritos, porque eu acredito, eu, particularmente, acho que a Agência Nacional de Águas faz um trabalho muito importante e bom, muito bom mesmo, mas, assim, infelizmente, não consegue atender às demandas, não consegue.
Então, a criação do Plano Nacional de Recursos Hídricos se deu em 1997, e nem por isso nós tivemos a recuperação de rio algum ou a garantia da qualidade ou quantidade de água. Eu estou falando com conhecimento de causa própria, porque isso está no quintal da minha casa. Infelizmente, não vejo que isso, lamentavelmente, desde que se crie a política até que ela entre em prática, existe uma espaço muito grande.
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Sinceramente, minha proposição é pela criação. Acho que avançaríamos. Há riscos, sempre há riscos, mas não vejo que a criação de uma área de proteção inviabilize os usos múltiplos. Não vejo que ela seja contraditória à Política Nacional de Recursos Hídricos. Parece-me que ainda sairíamos, teríamos uma atitude de vanguarda no sentido de criação de um patrimônio natural, da preservação de um patrimônio natural. Estava até comentando com as colegas aqui antes do início formal da reunião, que, por exemplo, o continente europeu tem um patrimônio arquitetônico enorme, que faz com que nós o visitemos e que todos nós queiramos conhecer a Europa. Por que as pessoas vêm ao Brasil? Por causa do patrimônio natural, não vêm por causa do patrimônio arquitetônico, excetuando Brasília. Os outros Estados não detêm um patrimônio arquitetônico tão interessante que atraia turistas; os turistas vêm por conta de patrimônio natural. Então, penso que seria uma atitude de vanguarda, pensando no clichê das gerações futuras, se garantirmos, não sei se todos conhecem o Rio Araguaia, mas ele é belíssimo, só pelas características físicas dele, já entra em processo de proteção, por causa da beleza cênica ele já se enquadraria como um organismo a ser protegido, porque ele é lindíssimo.
Contemplando um pouquinho a fala da Srª Heloísa sobre o patrimônio humano e socioambiental, que me parece extremamente relevante, porque sempre estamos pensando na humanidade, mas aquela que consome, mas esquecemos que precisamos da produção da energia. É lógico que também faço parte desse grupo, mas acho que não podemos fechar os olhos para as comunidades ribeirinhas. No caso do Araguaia, no Estado do Tocantins, como a Srª Adriana comentou, no percurso desse rio, há várias aldeias indígenas. No Tocantins, há oito etnias indígenas, que normalmente são ribeirinhas.
O que acontece quando se constrói uma barragem? A primeira coisa é realocar essas comunidades. Elas ficam piores? Não, elas não ficam piores financeiramente talvez, não, elas começam a acessar mais materiais, mas certamente elas perdem identidade e memória, que é o que tem valor mesmo.
Penso que deveríamos considerar algumas possibilidades. Entendo que, sobretudo agora, o Brasil está numa crise terrível, que temos de pensar em ações que economicamente sejam importantes, temos de pensar em geração de riqueza, mas acho que podemos pensar em geração de riqueza de uma forma sustentável. Não precisamos continuar na linha da construção de barragens, podemos, mas por que não preservar o Rio Araguaia, se já temos o Tocantins e tantos outros rios que sofrem, onde são construídos barramentos, e preservar o Rio Araguaia? Com isso, não significa que os usos múltiplos fiquem comprometidos, de forma alguma. Captação de água para abastecimento humano é possível; captação de água para dessedentação de animais é possível; para irrigação, é possível; para lazer, é possível; para pesca, é possível; para o turismo, é possível.
Gostaria de chamar atenção também para o que foi dito em relação aos impactos gerados pelo turismo. É possível. Mas qual é o quantitativo de turistas que acessam o Rio Araguaia, que causam o impacto maior do que causaria a construção de um barramento ou de uma hidrovia? Qual é a dimensão desse turismo que traz problemas ambientais de ordem sanitária, que não as cidades? Não vejo que o turismo possa ser considerado um fator negativo. Pelo contrário. Acho que o turismo ordenaria. Sendo considerado um Rio-Parque, então ele vai ser submetido a todas as normativas que já regem os parques, e não vejo de que forma o turismo poderia comprometer a qualidade da água - de forma alguma, porque o rio vai ser uma área de proteção ambiental. Então ele vai estar regido pelas normas das áreas de proteção ambiental. Não seria possível a contaminação.
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Eu, sinceramente, não vejo por que não olharmos com um pouco mais de crédito para a proposta.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Obrigado, Professora, pela contribuição valiosa.
Vou fazer algumas ponderações para devolver para vocês.
A Antaq diz o seguinte: a navegação, a hidrovia vai poluir menos o rio do que as voadeiras do período de temporada de praia, porque as voadeiras deixam o óleo dentro do rio, e a navegação não joga o óleo para dentro do rio.
Outra alternativa que a Antaq coloca é que, em vez de fazer derrocamento, é como se fizesse um desvio, uma espécie de eclusa um pouco mais natural. Quando tivessem de passar as embarcações, ela se fecharia, se encheria, e as embarcações passariam. Aí não se faria o derrocamento, mas um canal de desvio. Passando as embarcações, fecha-se aquela passagem de água, e volta a água toda - 100% - para o curso natural do rio. Então, na visão da Antaq - e é uma pessoa que conhece o rio, a pessoa que esteve conosco conhece muito o Rio Araguaia, que é o Adalberto Tokarski - existe a possibilidade de fazer a hidrovia no Araguaia, inclusive como um meio de manter e de assegurar mais a calha natural do rio. E aí ele não entra no mérito da questão das hidrelétricas, que é diferente.
Quanto a esta questão de que não existe lá um Comitê de Bacias local, há uma espécie de um colegiado nacional. Que caminhos podemos fazer para contribuir na construção desse Comitê de Bacia? Ele envolve quatro Estados: Goiás, Mato Grosso, Pará, Tocantins, e até o Maranhão; o Araguaia não banha o Estado do Maranhão, mas, quando o Rio Araguaia e o Rio Tocantins se encontram, dando origem ao Rio Tocantins, o Maranhão está lá. O que poderíamos fazer? De que forma poderíamos ajudar nisso?
Há a questão do planejamento integrado do uso múltiplo. Aí, com a compreensão do que colocou a Professora da Universidade Federal, a Professora Liliana, tenho certa tendência a ficar com esta ideia: uso múltiplo não quer dizer que se vai usar 100% daquilo que o rio oferece. Vai-se usar aquilo que é mais viável do ponto de vista econômico, social e ambiental. Temos que considerar essas três nuanças. Porque, de repente, se eu for usar 100%, vou trazer prejuízos sociais e ambientais, meramente com a finalidade de ter resultado econômico.
Depois, as três hidroelétricas que estão sendo pensadas, que geram 1.600MW, do meu ponto de vista, acho que podem ser substituídas pela produção de energia alternativa, como as colocadas pela Professora. Mas também há rios menores no Tocantins, que poderiam ter hidrelétricas, o que ajudaria a compensar, dada a necessidade de energia, se ela tiver mesmo de ser feita.
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Fico com a impressão de que é possível proteger o rio, tirar os benefícios econômicos e sociais dele, levando-se em conta inclusive a hidrovia. Porque ali, ficando com o que sonhava Bernardo Sayão, quando iniciou a Belém-Brasília, quando estava em Ceres, na colônia agrícola, que queria construir uma avenida de produção que ligasse o Sul e o Norte, hoje podemos pensar no Araguaia como uma avenida de produção ou uma veia transportadora de alimentos, commodities em geral, sem contudo destruí-lo muito, degradá-lo muito, porque sempre haverá um nível de degradação.
Então, tendo a pensar que precisamos encontrar alternativas à questão hidrelétrica e trabalhar com a ideia de que é possível ter uma hidrovia, dado que hoje você tem tecnologia de navegação que permite navegar em rios muito rasos, que antes não era possível. Hoje a navegação se adapta ao rio e não o rio tem que ser trabalhado para ser adaptado à navegação.
Eu gostei muito dessas duas colocações: patrimônio natural e beleza cênica. Como ser o Rio Araguaia um diferencial para trazer os turistas estrangeiros? Como potencializarmos isso mais e dar um retorno econômico importante para a sociedade brasileira, que aumente as nossas receitas, que traga divisas para o País, a exportação da imagem que as pessoas queiram ver? Acho que isso não está bem pensado e pode ser pensado pela Embratur, pelo Governo brasileiro. E essa ideia de ter o Rio-Parque, essa figura da Unidade de Conservação Rio-Parque para atender inclusive o olhar para a bacia como geral, isso vai ser uma coisa nova, pelo menos no Brasil. Nós estaríamos criando uma coisa nova que poderia atrair investimentos, poderia atrair muito turista para cá.
Então, penso que a adaptação do projeto para criar a figura de Unidade de Conservação Rio-Parque, e aí não especificamente para o Araguaia, porque pode ser pensado para outros rios, me parece mesmo muito importante. Acho que é um caminho que nós estamos construindo que, ao final dessas audiências públicas, podemos dar esse contorno com um projeto de lei da Senadora Kátia Abreu, que está tendo uma relevância muito grande para nós, porque nos oportuniza a fazer esse debate. Ou seja, aquilo que alguns contestam como restrição está nos levando a aprofundar a discussão e pode dar uma contribuição muito grande para o País.
E queria inclusive justificar a ausência de Senadores aqui, a gente assovia e chupa cana, porque estamos em duas, três comissões ao mesmo tempo. Ontem tivemos sessão do Congresso Nacional e nós saímos daqui 2h30 da manhã, alguns ainda ficaram, mas eu saí às 2h30 da manhã. Então a turma também está um pouco atrasada.
Mas era isso.
Eu devolvo a palavra para a Drª Adriana Lustosa, Diretora de Recursos Hídricos do Ministério do Meio Ambiente, para suas considerações e ponderações em função das falas dos outros convidados e também para acrescentar mais informações que sei que possui e pode contribuir muito para esse debate aqui ainda.
A SRª ADRIANA LUSTOSA - Ouvindo os outros posicionamentos, tendo a concordar muito com o que a Professora Liliana colocou em relação à preocupação ambiental de conservação do Rio Araguaia e os mecanismos que podem levar a essa atitude de conservação ambiental, mas sem esquecer de ampliar o debate.
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Eu acho que é importante que os colegiados, no caso, o Conselho Nacional de Recursos Hídricos possa ser ouvido também. E a lógica do colegiado não é uma lógica de disputa de espaço, ou não deveria ser - pode até vir a ser em alguns casos -, mas a ideia não é a disputa de espaço pelos diversos usos ali na bacia hidrográfica, mas sim que esses diversos usos tenham o entendimento dos diversos usos, cada um tendo um entendimento do outro, e que se pense em uma forma de utilização integrada em que nenhum uso seja prejudicado em função do outro.
E é claro que isso vai estar muito relacionado à vocação da bacia hidrográfica. Não quer dizer que abrindo-se para os diversos usos, todos os usos vão ter de ser implementados em um rio como foi bem colocado pelo Senador.
Então, é importante levar esse debate para o colegiado de recursos hídricos. É importante também a participação do ICMBio para avaliar a questão desses parques, esse Rio-Parque. Eu, pessoalmente, não tenho muito a contribuir em relação à proposta, porque conheço pouco sobre a gestão das Unidades de Conservação e como isso poderia ser planejado. Mas o sistema de recursos hídricos também está aberto a essa discussão de pensar essa alternativa.
E lembrando também que a área ambiental, o setor turístico, a sociedade civil organizada, as universidades todas têm assento no Conselho Nacional de Recursos Hídricos. Então, na ausência atual de um Comitê de Bacia Hidrográfica para a região, o Conselho é um locus importante a ser considerado, onde todas essas visões têm espaço para discussão. Inclusive para verificar uma solução que, às vezes, se perde individualmente, mas, coletivamente, se ganha com essa solução.
A questão das hidroelétricas é uma preocupação importante, mas lembrando que elas afetam mais a calha do Rio Tocantins; o potencial hidroelétrico para a região do Araguaia é bem menor, é dezesseis por cento do potencial... (Risos.)
...mas existem as usinas planejadas, e essas usinas certamente vão enfrentar, esses projetos também vão enfrentar algumas discussões, como temos visto a sociedade se posicionando em relação a esses projetos hidroelétricos.
Quanto à questão da conservação do rio, como um todo - a conservação em uma ótica estritamente ambiental - seria de se refletir se seria o rio inteiro ou se seriam trechos do rio mais relevantes, como é o caso do Médio Araguaia, que é realmente uma área importante para a conservação.
A questão turística, pelo diagnóstico desse Plano de Recursos Hídricos do Tocantins-Araguaia, ele demonstra que tem um impacto alto no meio ambiente. Então, é importante a gente ter essa valorização do rio por usa beleza cênica, por seu potencial turístico. Isso traz divisas também, mas esse turismo tem que ser muito bem controlado, muito bem regulamentado, porque como está hoje vem causando impacto no rio. Então, tem de se refletir também. Até porque o projeto de lei enaltece esse uso em detrimento até dos outros usos, mas há que se refletir em que medida esse uso está também provocando impactos no rio.
Por isso, uma alternativa seria pensar a respeito, refletindo sobre transformar o rio em um parque, em um Rio-Parque, em uma Unidade de Conservação. E isso implicaria em discussão que, realmente, seria relevante a participação do ICMBio.
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É importante também se avançar no sentido de se buscar um Comitê de Bacia para bacia hidrográfica como um todo. E aí tem uma resolução do Conselho que orienta como é que esses comitês são instalados, mas, principalmente, os Estados, os órgãos estaduais, têm que demonstrar um interesse na instituição desse Comitê de Bacia Hidrográfica, e também os Municípios têm que se manifestar a respeito disso; tem que ter uma adesão, porque o comitê ele é criado, não sempre, mas a ideia é que ele seja criado de baixo para cima, e que essa demanda venha da sociedade local, tanto o Poder Público, usuários e sociedade civil local.
Então, existe uma regulamentação do Conselho que orienta a formação desse comitê. Hoje, em função da elaboração do plano, foi criado um comitê gestor do plano. Então, a própria elaboração envolveu uma série de instituições locais, dos Estados, da bacia, e teve uma discussão local, teve participação pública na elaboração do plano. Esse comitê gestor também tem a responsabilidade de acompanhar a implementação do plano, mas ele não faz as vezes de um Comitê de Bacia Hidrográfica. O próprio plano recomenda é que se avance para se pensar nesse colegiado de recursos hídricos para bacia.
Reconhecendo o mérito da proposta, eu considero que deve ter um aprofundamento do debate, levando em conta outras questões técnicas mesmo, relacionadas às implicâncias de uma proposta dessa natureza, porque você vedar empreendimentos na calha do rio pode ter impactos sociais, econômicos também, que devem ser analisados e que vão estar muito relacionados à realidade de cada um dos Estados da Federação.
Então, a linha, assim, a nossa recomendação final, é nessa linha: de tentar, apresentar até, talvez, esse projeto, se for o caso, no Conselho Nacional de Recursos Hídricos, buscar alguma contribuição do Conselho Nacional de Recursos Hídricos, nesse primeiro momento, e buscar ampliar e aprofundar o debate em relação à proposta, da forma como ela se encontra hoje.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Obrigado, professora.
Eu queria ter feito uma consideração antes - aí, doutora, se for preciso a senhora volta, porque eu vou fazê-la agora -, no sentido do que temos observado no Tocantins em relação às hidrelétricas, do meu ponto de vista, viu, Professora? Acontece que destrói toda uma lógica anterior, natural. Que é que era essa lógica natural, assim, grosseiramente falando, como sertanejo, segundo minha visão? Quando tínhamos enchentes, os afluentes represavam e decantavam a areia no seu leito próprio e ela não ia, com toda a força ou todo o volume, para a calha do rio. Depois da hidrelétrica, isso está acontecendo. Quer dizer, como, entre uma barragem e outra, não tem mais enchente, porque é controlada, nós temos tido, nos afluentes, enchentes muito fortes que estão levando muita areia, muita terra, para poder decantar naquela área do rio e o assorear. Isso está acontecendo. Eu vi com os meus próprios olhos, por exemplo, que na praia do Rio Sono, lá em Pedro Afonso, uma praia bacana, muito boa, este ano não tinha areia na praia, tanto que foi preciso colocar areia, porque, como não tinha represamento, a enchente veio muito forte e levou a areia para o leito do Rio Tocantins.
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Mas há um outro fator: nesse trecho não tem mais vazante. A vazante era assim: como represava e inundava aquela área, a decantação era feita ali, fertilizando aquela região, e ali o ribeirinho plantava, cultivava a terra de forma muito produtiva, porque é terra muito fértil, isso não tem mais também. E mais: acima da barragem também não tem mais isso, porque são braços que viraram lagos; aonde era vazante agora é lago.
Então, isso altera muito a questão da convivência dos ribeirinhos, daquelas populações que viviam dessa lógica da exploração de forma natural, que a natureza trazia, que não tem mais. E os assentamentos dos atingidos por barragem, via de regra, você tira da margem do rio, dessa cadeia de produção que ele tinha, e coloca ele na chapada, e aí não dá bom resultado.
Então, eu penso que isso é algo para ser discutido para as próximas hidrelétricas pelo Ministério do Meio Ambiente, pelo Ibama, ou seja, quem está na área possa discutir, além dos atingidos, é que se se tem que realocar o ribeirinho, que ele seja colocado às margens do lago. Como ele vivia às margens do rio, que ele seja alocado às margens do lago. Outra alternativa é de ele ser sócio do empreendimento. Que ele passe a ter participação na distribuição de dividendos, porque o reassentamento do ribeirinho tem sido catastrófico, pelo menos é o que eu vejo no Estado do Tocantins. É uma catástrofe esses assentamentos dos atingidos pelas construções de barragens. Sequer tem-se conseguido fazer com que as pessoas tenham aquela qualidade de vida mínima que elas tinham quando viviam às margens do rio. Isso eles não têm mais.
Isso também vai alterar a questão da pesca. A professora se referiu a isso muito bem aqui. Eu estive em Miracema, reunido com a colônia de pescadores, e uma das grandes reclamações é sobre a mortandade de peixes que está havendo lá na Hidrelétrica do Lajeado. Existe lá um mecanismo de fazer o peixe subir; mas, de vez em quando, o encarregado dessa tarefa falta, então, fica fechado e os peixes batem lá e morrem, toneladas e toneladas.
Mas é isso.
Eu queria fazer essa consideração. Não sou contra as hidrelétricas, mas eu pauto a minha vida no seguinte: se eu não posso impedir, que eu participe, pelo menos, para ajudar a melhorar. É isso que é a minha visão em relação a esses investimentos.
Agradecer a presença aí do nosso Senador Douglas Cintra, que é o Relator deste PLS nº 248, gentilmente está aqui conosco, depois de uma suada madrugada de debate na votação dos vetos, e que também vai ter um material vasto, Senador, para que possamos trabalhar juntos e repensar em como não perder esse projeto. O senhor está chegando, mas se quiser fazer uso da palavra está aberto o espaço.
O SR. DOUGLAS CINTRA (Bloco União e Força/PTB - PE) - Eu prefiro escutar um pouco mais.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Então, vamos ouvir agora a Srª Heloísa Aquino, Assistente Técnica do Ministério, lá da SPU, para suas considerações e observações em relação a tudo o que foi colocado aqui.
A SRª HELOÍSA AQUINO - Bom, a gente considera essa ideia bastante inovadora, a ideia do Rio-Parque. Realmente, é um processo bastante inovador. E, claro, as Unidades de Conservação têm um objetivo bem claro.
Sob o ponto de vista patrimonial, todo e qualquer imóvel que estiver dentro de áreas da União - e aí nós estamos falando do Rio Araguaia, que é um dos rios federais, portanto da União, a gente sempre pensa que esses usos, os vários usos que já foram colocados aqui amplamente tanto pela Adriana como pela Professora Liliana, sob o ponto de vista patrimonial isso deve ser compatibilizado. E a compatibilização disso é com o diálogo, é com a ampliação desse diálogo, como a gente já bem frisou aqui nessa Mesa.
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Chamo atenção - e aqui a gente precisa realmente aprofundar - com relação ao Rio-Parque, a essa ideia do Rio-Parque, porque normalmente os parques, como os parques nacionais, por exemplo, são Unidades de Conservação de proteção integral. Então, acho que a gente há de observar como será essa modalidade efetiva de Rio-Parque já que, a rigor, os parques são unidades de proteção integral, e isso acarreta uma série de restrições.
Nós estamos entendendo que a ideia da proposta seja de que se possam compatibilizar os vários usos, os múltiplos usos que existem do rio. E não só no rio, porque o rio não é sozinho; o rio tem uma calha, mas ele traz, nas suas margens e na rede hídrica que ele forma com seus afluentes e com outros rios, uma unidade, vamos dizer, de gestão territorial, que é também uma unidade de gestão territorial por parte do patrimônio da União.
Então, acho que a gente precisa observar bem como essa proposta pode ser construída. E aí eu reafirmo essa questão do diálogo amplo e da compatibilização dos vários interesses públicos, sendo que interesse público não é o interesse apenas da União, mas é interesse da população, é interesse do povo, das pessoas que estão lá, das pessoas que efetivamente, vamos dizer assim, moram às margens desses rios e que fazem, na verdade, o rio e que muitas vezes ajudam a preservar esse rio. Então, quando a gente fala sob o ponto de vista de patrimônio, a gente também está falando de pessoas. Acho que a gente tem que levar em conta isso, tem que levar em consideração isso.
Acho que a ideia é bastante interessante, mas a gente precisa observar bem como será essa questão do Rio-Parque, já que, a rigor, os parques e reservas biológicas e outras Unidades de Conservação são de proteção integral. Já aí haveria uma discussão sobre em que categoria, vamos dizer assim, essa proposta poderia se colocar.
Por enquanto, é isso, Senador. Vamos adiante.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Obrigado, Drª Heloísa.
Vamos, então, passar aqui a palavra para a Drª Liliana Pena Naval - "Naval" é de navegação?
A SRª LILIANA PENA NAVAL - É de navegação.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Ela é Professora da Universidade Federal do Tocantins e veio aqui contribuir conosco, com suas ponderações.
A SRª LILIANA PENA NAVAL - Bom dia, Senador.
Srª Heloísa, se a senhora me permitir, eu fico bem feliz que a sua preocupação seja em relação à conservação integral, mas existem várias modalidades de áreas de proteção, e o que está sendo proposto é uma APA, que é uma Área de Proteção Ambiental. Esse tipo de Unidade de Conservação permite ações, quaisquer tipos de ação, desde que se promova a sustentabilidade. Pode ser qualquer uma, de repente até a construção de uma usina, desde que se comprove a minimização ou a ausência dos impactos que seriam relevantes.
Eu gostaria, Senador, de retornar à sua fala sobre a construção das hidrelétricas, dos barramentos. Não se trata de ser contra ou a favor - acho que a discussão nem trata disso hoje -, mas é muito preocupante. Embora seja produção de energia limpa, a gente não precisa discutir aqui os impactos que ela promove.
E eu gostaria de ressaltar o seguinte: a Usina Hidrelétrica de Lajeado é uma das maiores usinas hidrelétricas do Brasil, uma das que mais produzem energia. Essa energia não fica no Tocantins, e a energia hidrelétrica do Tocantins é a mais cara do Brasil. Então, eu gostaria de fazer esta colocação: nem sempre a atração de um investimento se reflete sobre a comunidade local.
Sobre as vazantes, o senhor tem completa razão. É isso mesmo. Não só as comunidades ribeirinhas, como os indígenas têm sofrido bastante com essa questão, porque as vazantes formam um berçário natural, e, quando se tira isso, esse berçário natural, que é onde os organismos se desenvolvem, não vai acontecer mais, e aí vem a minimização da produção de peixes, de crustáceos, enfim, dos organismos todos que eles usam.
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Eu gostaria de pôr à disposição, Senador - sobretudo ao senhor, que é do Tocantins -, vários estudos que temos na universidade, realizados nos programas de pós-graduação por estudantes de mestrado e de doutorado, acerca de alguns impactos, sobretudo relacionados ao deslocamento de algumas populações. Talvez isso possa auxiliar em algo dessa natureza. E quero reforçar: eu entendo que a criação de um parque não seria contraditória ao que é inerente, ao que está prescrito, ao que está preconizado pela Política Nacional de Recursos Hídricos.
A Srª Adriana tem completa razão: você não cuida de um rio cuidando da calha dele, você cuida de um rio cuidando da bacia hidrográfica. Mas, infelizmente, nós não damos conta da bacia hidrográfica. Por enquanto, ainda não. Então, eu vejo que, na criação de um parque, a gente pode ser extremamente cuidadosa com esses requisitos para não inviabilizar nada no futuro - porque a gente toma umas atitudes agora e, daqui a dez anos, vai ficar repensando sobre isso -, e que há possibilidades inúmeras. Mas eu vejo como um componente que apoiaria a execução daquilo que está preconizado na política, que, em última instância, é a proteção da qualidade e da quantidade das águas de um corpo hídrico para os diferentes usos.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Nós é que agradecemos a sua vinda.
A SRª LILIANA PENA NAVAL (Fora do microfone.) - Eu estava em uma reunião em São Paulo e vim ontem. Eu queria hoje, mas foi uma confusão...
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Se viesse hoje, teria saído às 4h da manhã de casa para chegar aqui, porque está difícil esse negócio dos voos.
Senador Douglas Cintra, já vou colher a sua opinião.
Depois de fazermos a primeira e encaminhada a segunda audiência, como foi combinado nesta Comissão, nós estamos apresentando um novo requerimento para fazermos uma audiência pública com os Estados por onde passa o rio, que são Goiás, Mato Grosso, Pará, Tocantins e Maranhão. O Maranhão nem o Araguaia banha, mas, como no encontro do Rio Araguaia com o Tocantins está o Maranhão também, qualquer atitude tomada no Araguaia não deixaria de ter impacto no Maranhão.
Eu gostaria de saber a sua opinião, e passo-lhe a palavra para, se for da sua vontade, fazer algumas indagações às nossas convidadas. Veja que a Mesa hoje aqui está majoritariamente feminina, o que não é muito próprio nesta Casa.
O SR. DOUGLAS CINTRA (Bloco União e Força/PTB - PE) - Sr. Presidente, Senador Donizeti Nogueira, que com muita competência tem tratado não só de assuntos ambientais, mas de tantos assuntos que também não são apenas do Estado de Tocantins, mas do nosso Brasil, eu tenho alguns pontos a considerar.
O primeiro é que, quando eu estava fazendo o relatório, V. Exª me procurou, e eu suspendi o nosso relatório para que pudéssemos debater mais o assunto. E, obviamente, estas audiências públicas não só trazem informação, mas trazem, sobretudo, a possibilidade do diálogo e da construção de novos modelos que, sem dúvida alguma, viabilizam tanto do lado ambiental como do lado econômico.
Eu também tenho uma vertente ambientalista, faço parte de um grupo no nosso Estado de Pernambuco, mas sabemos que a melhor forma de preservar o meio ambiente é permitir que ele dê a sustentabilidade ao ser humano. Porque, se a gente não fizer essa integração, aí sim a gente verá a força contra o meio ambiente para que se use de forma inadequada.
Então, acho que o grande segredo, em todos os casos, mas especialmente nesse rio - que não conheço pessoalmente; vou marcar para lá estar, afinal de contas só tenho boas referências e boas visualizações, seja por fotografia ou filmagens -, é que nós poderemos ter um texto que permita não só contribuir, mas estimular a preservação do rio, em sua forma mais ampla, como a gente fala, não só da calha.
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Quando eu falo, por exemplo, Senador Donizeti, no Rio São Francisco, que é, no nosso caso, no Nordeste, o grande rio que dá não somente energia, mas dá água, deu transporte também, antigamente, à nossa Região, nós temos que pensar em como andam os rios afluentes, temos que pensar no que tem sido na preservação desses afluentes, nas matas ciliares desses afluentes. Ou seja, é um contexto bem mais amplo.
Essa é a nossa ideia, e eu parabenizo V. Exª por exatamente fazer essas audiências públicas, porque, como eu disse inicialmente, com certeza nós teremos boas proposições, bons caminhos.
Eu acompanhei um pouco já, para entender não só o que já temos hoje de energia sendo trabalhado no rio, mas os projetos previstos de uso para gerar energia, e todos eles já não utilizam mais como ideia a questão de construir grandes barragens e de mudar de forma, vamos dizer, forte o nosso rio. Todos eles usam um novo modelo, que é o da energia a fio d'água. Não vou dizer que não haja impacto, afinal de contas eu não consigo perceber a ação humana em qualquer meio ambiente sem haver impacto. Todos nós, na nossa convivência com a natureza, produzimos algum impacto, como também todos os outros animais que nela vivem. A diferença é que temos que trabalhar para que haja um impacto equilibrado. Essa é a nossa visão.
Mais uma vez, parabenizo V. Exª por estar também trilhando esse caminho de pensarmos, obviamente, na preservação, mas pensar em como poderemos produzir riquezas com o rio. Afinal de contas, não só o Estado de Tocantins, mas principalmente - ele já chega à Região Amazônica - nós temos que pensar em como tirar proveito desse grande bem da natureza que temos, que é essa água, principalmente, para as Regiões Centro e Norte.
Uma das coisas que já temos debatido, e eu já falei isso inclusive em plenário, é que hoje os Estados produtores de energia, por exemplo, não têm receita de impostos sobre essa produção. O Estado do Pará, por exemplo - acho que é onde o Rio Araguaia chega lá, junto com o Tocantins -, fornece energia para grande parte do Brasil e não tem receitas oriundas disso. E o que nós vemos? Vamos preservar toda a água do Pará? Justo, ótimo, excelente, interessante. Sim, mas aí o cidadão paraense, o Estado em si não recebe recursos financeiros por estar provendo o Brasil dessa grande oportunidade que é, ao preservar os seus rios, também fornecer riqueza na forma de energia para outros Estados.
Então, não tenho dúvida de que encontraremos aí caminhos, que eu não considero do meio, são caminhos retos, caminhos que aproveitam as oportunidades econômicas, mas tendo - repito a palavra - o menor impacto ambiental possível, porque impacto zero eu realmente não conheço e não sonho com isso. E não só sonho, mas trabalho e tenho certeza de que o Senador Donizeti trabalha também para que esses impactos possam ser não só minimizados, mas completamente suportados pelo meio ambiente. Porque, havendo esse suporte, havendo essa possibilidade de não haver diferenças grandes no meio ambiente, com certeza podemos usar da melhor forma possível.
Acho também que a questão turística lá pode não só trazer mais recursos financeiros para a Região, mas pode também divulgar e mostrar e dar... Porque aí eu acho até o inverso: quando falo em turismo, refiro-me a dar oportunidade ao restante do Brasil e do mundo de aproveitar essas grandes riquezas naturais que existem naquela Região. Então, no fundo também o Estado de Tocantins, os Estados dos rios dessa Região estão doando ao nosso País não só a possibilidade da energia e de riquezas, mas a possibilidade também de viver integrado com a natureza e de aproveitar aquilo que ela tem de bom.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Obrigado, Senador, pela sua participação.
Pergunto à Mesa se tem mais alguma consideração a fazer.
A SRª LILIANA PENA NAVAL (Fora do microfone.) - Eu gostaria, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Professora Liliana, por favor.
A SRª LILIANA PENA NAVAL - Desculpem-me o inconveniente, mas é que eu me esqueci de algo.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Não há inconveniente.
A SRª LILIANA PENA NAVAL - Eu gostaria - e isso já foi dito aqui nesta Mesa - que se pensasse... Isto não é uma posição contrária nem favorável à construção da hidrovia no canal. Não é isso. Mas eu acho que no Brasil a gente tem que aprender a otimizar recursos. Então, por que não pensar na colocação das eclusas no Rio Tocantins que já está comprometido?
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Por que a gente tem, obrigatoriamente, que fazer uso do canal do Araguaia para a hidrovia? Por que não se faz a hidrovia no Rio Tocantins, que já tem lá a sequência das hidrelétricas, que já tem o seu comprometimento posto? Isso não significa "vamos acabar com ele", mas, enfim, se a gente vai fazer um planejamento para que seja navegável o Araguaia, por que nós não planejamos isso no Tocantins?
E a segunda...
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO. Fazendo soar a campainha.) - Só para dar...
A SRª LILIANA PENA NAVAL - Sim?
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - ... uma informação do Ministério dos Transportes, que esteve aqui conosco na última audiência, na primeira audiência. Ele disse que, no Ministério dos Transportes, não existe, dentro do planejamento do Ministério, até 2031, nenhuma previsão de torná-lo uma hidrovia. Mas isso não quer dizer que, daqui para lá, não venha a ser.
A SRª LILIANA PENA NAVAL - Isso seriam apenas 15 anos. Não contabiliza nem uma geração nossa.
Senador, se o senhor me permite, quero fazer um relato sobre as barragens a fio d'água.
O barramento da hidrelétrica lá do Lajeado é uma barragem a fio d'água. Ela foi a primeira barragem a fio d'água do Brasil - foi um experimento, inclusive. E o que acontece lá? Na verdade, o reservatório ocupa mais de 500 quilômetros quadrados. As áreas que realmente estão a fio d'água, porque a maior parte não está, e a gente nem sabe se isso é bom ou ruim... Parece melhor que ela não esteja a fio d'água porque, onde está o fio d'água, que é a parte rasa, a média de profundidade é de 40cm. Repito: 40cm. O que acontece com essa profundidade? Dada a incidência luminosa, pelo menos no Estado do Tocantins, o contato direto ali com a poluição difusa que entra... E olhem que a cidade de Palmas tem todo o seu esgoto tratado, o que é algo inédito neste País. Nós temos 98% de água tratada e aproximadamente 50% de esgoto coletado e tratado, e o restante está tratado lá nas suas casas, que a companhia de saneamento recebe em caminhões-pipa. Quer dizer, a gente não faz lançamento, em Palmas, de esgoto sem tratamento no reservatório. Porque o destino final dele vai ser lá no reservatório. Por quê? Não era no reservatório, era nos afluentes, mas, com a criação do reservatório, o reservatório cobriu os afluentes, e nós não temos mais esses afluentes. O que eram afluentes se transformou em reservatório.
Então, com a entrada dessa pouca concentração, que atende à legislação - porque a companhia de saneamento não lança esse esgoto tratado com concentrações acima daquilo que está preconizado pela 430 do Conama, que regulamenta a disposição de afluentes -, mesmo assim, temos um crescimento algal muito grande. E olhem só que engraçadinho: esse crescimento algal não veio com algas "do bem", vieram as algas "do mal". Então, nós tivemos um crescimento lá não de uma espécie, mas de uma nova espécie, na verdade, que são cianobactérias, cuja classificação ainda não está muito bem definida. Essa cianobactéria é um organismo que produz uma toxina, e essa toxina é legal. E adivinhem? Ela está lá em Palmas. Por causa disso, a companhia de saneamento não consegue fazer a captação, porque nós não temos tecnologia disponível para a eliminação da toxina.
Não estou querendo aqui dizer "ai, meu Deus"... Mas, enfim, temos que trazer para o debate, porque temos que tentar visualizar situações futuras. E, enquanto a gente não tratar todo o esgoto deste País, nós sempre vamos ter situações de comprometimento de qualidade da água. E o que eu acho mais estranho é que as pessoas não se dão conta de que elas bebem esgoto. Porque, se você lança aqui, há alguém que mora aqui abaixo, e você sempre mora abaixo de alguém.
Enfim, Palmas passa por um problema sério de abastecimento de água. Nossas fontes de captação estão bastante comprometidas com a vazão, bastante comprometidas mesmo, não só pelas questões de seca e pelas questões ambientais, mas porque a população aumentou muito, e a gente não consegue fazer a captação da água do reservatório porque ela está contaminada. Então, é bastante complexo.
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O SR. DOUGLAS CINTRA (Bloco União e Força/PTB - PE) - Professora Liliana, eu concordo, obviamente, com as suas palavras, e o intuito do entendimento é exatamente esse. A palavra que eu usei é "minimizar" os impactos que a gente sabe que haverá.
Essa questão do saneamento e de se jogar não só detritos orgânicos, mas industriais nos nossos rios, poluindo-os, é uma questão seriíssima.
A senhora está falando de Palmas, que não consegue ter essa captação tão tranquila. Na minha cidade, nós passamos - acho difícil alguém compreender isto - mais de dez anos tendo água na torneira um dia por mês - um dia por mês! E a pergunta que se faz: como é que vocês viviam lá com isso?
Foi usado um dinheiro para construir um novo reservatório sem sequer se construir o saneamento da cidade, que está exatamente ao lado dele. E todo o seu resíduo, o seu esgoto é jogado dentro do reservatório. Então, tenha a certeza de que temos essa compreensão. E temos um dever de casa muito grande a fazer no Brasil.
A minha cidade é cortada pelo Rio Ipojuca que não é mais um rio. Simplesmente não corre mais água ali. O que corre é esgoto. Porque não só a nossa cidade, mas todas as outras cidades no seu caminho utilizam-no da mesma forma.
Então, esse dever de casa tem que existir, ele depende de muito investimento, e eu considero, sem desconsiderar tantas outras situações necessárias em nosso País, como emergente este assunto, de a gente poder cuidar, de preservar, de fazer renascer esses reservatórios d'água, essas calhas e rios, proporcionando mais saúde para a população. Sabemos que, no fundo, tudo está integrado. Imagina o que causam não só ao meio ambiente mas também à saúde pública tantos e tantos canais abertos cortando, cruzando e saindo de regiões mais afastadas nas grandes metrópoles, onde crianças e todo mundo convive com isso.
E há uma situação de que a senhora falou, que é a de consumir o esgoto de quem vem de cima. E, nessas cidades, se consome o esgoto da própria rua, da própria casa, porque está a céu aberto.
Se a senhora visitar a cidade do Recife, por exemplo, verá a situação crítica dos manguezais hoje; é de dar pena, não só do meio ambiente, mas, sobretudo, dos homens, dos seres humanos que frequentam aquele meio ambiente, convivendo com tamanho descaso, com tamanha quantidade de dejetos, de sujeira e de focos de doença.
Então, não só concordo com a senhora, mas me coloco à disposição para, através de debates, encontrarmos soluções para isso. E, por meio da ação dos Senadores, daremos um rumo melhor ao País, propondo investimentos necessários para consertarmos o mais rápido possível esse conjunto de problemas sérios que nós temos em relação - repito - não só ao meio ambiente, mas, sobretudo, à dignidade humana.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Obrigado, Senador, mais uma vez. É muito importante a sua consideração. Certamente, há muito o que fazer. E nós estamos correndo contra o tempo. A população cresce, a água tem diminuído. É preciso uma tomada de consciência e, de certa forma, um pacto de Nação em relação a essa questão da recuperação da água.
O Rio Ipojuca, de que V. Exª falou, é um rio morto. Ele, que seria uma veia aberta para a saúde, para a vida florescer, está morto. Mas temos como recuperá-lo. É preciso termos sabedoria e, através do diálogo, encontrarmos saída para isso, como o senhor colocou muito bem.
Considero muito produtiva a nossa audiência. Estou muito feliz; todos estamos muito felizes.
R
Agradeço à assessoria da Comissão, que está sempre presente aqui e não nos deixa perder o rumo. De vez em quando, perdemos os papéis, mas não perdemos o rumo, porque temos a ajuda da assessoria.
Agradeço à assessoria do nosso gabinete, que está sempre aqui conosco, como também a da Liderança do Governo, sempre presente.
Declaro encerrada esta audiência, com a certeza de que nós estamos construindo algo melhor para o nosso Rio Araguaia. E, certamente, a experiência que teremos para propor para o Rio Araguaia poderá ser transportada para muitos outros rios, para o bem do País e do povo brasileiro.
Boa tarde!
Está encerrada esta audiência pública.
Muito obrigado pela presença de todos.
(Iniciada às 10 horas e 04 minutos, a reunião é encerrada às 11 horas e 45 minutos.)