24/11/2015 - 45ª - Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Havendo número regimental, declaro aberta a 45ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional.
A nossa Comissão se reúne hoje, extraordinariamente, para receber, em audiência pública, o Ministro de Relações Exteriores, Mauro Vieira. Eu assinalo que é a quarta vez que o V. Exª comparece perante esta Comissão, Ministro. Eu saúdo as suas visitas e a sua participação em nossos trabalhos como um sinal de um bom relacionamento entre a nossa Comissão, o Congresso e o Ministério de Relações Exteriores.
Esta audiência visa a debater dois temas. O primeiro sobre as consequências para o Brasil da celebração da parceria transpacífica. Esse tema foi debatido várias vezes aqui na Comissão, Ministro, e várias vezes Senadores integrantes da nossa Comissão manifestaram reservas e críticas ao fato de que o Governo brasileiro apostou todas as suas fichas nas negociações da OMC, deixando de atuar com a mesma ênfase em outros tabuleiros importantes.
E o Governo brasileiro repete o mantra de que é fundamental nós defendermos a conclusão da Rodada Doha porque - cito palavras do Ministro - através da Organização Mundial do Comércio, poderemos estabelecer regras claras, sólidas de comércio internacional.
Ora, a conferência ministerial da OMC deverá se realizar proximamente em Nairóbi e informações que temos - gostaria de ouvir V. Exª sobre isso - é de que a Rodada Doha será sepultada nessa reunião. O que nos deixa frustrados porque as ambições brasileiras, notadamente em relação à área da agricultura, não teriam sido alcançadas.
Por outro lado, em outubro, foi concluída a parceria transpacífica, que também é objeto de duas audiências públicas aqui na nossa Comissão. Essa parceria transpacífica, grupo de 12 países, 40% da economia mundial, deve se juntar a eles países importantes, como a Colômbia e a Coreia do Sul. Há dois países sul-americanos que já fazem parte - o Chile e o Peru. A nossa preocupação é saber se esse acordo poderá implicar perdas de oportunidades de comércio para o nosso País.
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Especialmente porque, sem a participação do Brasil - e não sei se o Brasil indicou algum observador para essas negociações da TPP -, o fato é que, nessa parceria, foram incluídos temas que, seguramente, estarão presentes em outros acordos internacionais de grande porte e que não se referem apenas a tarifas, mas a regras comerciais, como medidas sanitárias, fitossanitárias, defesa comercial, investimentos, compras governamentais, propriedade intelectual, comércio eletrônico, padrões trabalhistas, ambientais. São novos temas que estão entrando em negociações de comércio internacional que vão muito além das tarifas. E essas normas tendem a se tornar referência e padrões para outros acordos.
Então, eu gostaria que o Ministro Mauro Vieira fizesse sua apreciação sobre como o Governo brasileiro encara esse fato e que medidas toma o Governo para minorar as eventuais consequências negativas que a não participação do Brasil nesse acordo poderá trazer para a nossa economia.
Ainda no tema do comércio internacional, eu queria me referir a uma notícia que foi publicada ontem no jornal O Valor, p. 5. Notícia de que, com o pleno reconhecimento da China como economia de mercado a partir de 2016 - economia de mercado que obviamente a China não é -, nós deixaremos de aplicar taxas antidumping que hoje protegem pelo menos 50 ou 60 produtos industriais brasileiros, alguns de grande relevância para o Estado do Rio Grande do Sul, como a indústria calçadista, e também para São Paulo, Birigui, Franca, Jaú, onde temos indústria calçadista muito forte, mas também tubos de aço, vidros. Produtos que, quando entram no Brasil, são sobretaxados, uma vez que há constatação de prática de dumping por parte da China.
Com o pleno reconhecimento da China como economia de mercado, gostaria de saber que mecanismos de defesa poderão ser adotados em relação a esses setores de uma concorrência evidentemente desleal.
Outra questão que foi levantada e que é correlata ao primeiro tema, Ministro, é referente ao Mercosul. Tivemos aqui uma audiência pública muito concorrida sobre esse tema e, mais uma vez, foi expresso aqui o ponto de vista de que o Brasil se encontra excessivamente amarrado na sua soberania comercial, tolhido na sua soberania comercial em razão das regras do Mercosul, especialmente, como foi referido aqui, a Decisão 32, de 2000.
A pergunta que se faz é se o Brasil tem intenção, especialmente agora depois da eleição de Macri, de flexibilizar essas regras de modo que possamos ter uma integração mais, digamos, dinâmica com outras regiões do mundo na área de comércio internacional.
Depois, temos aqui um outro tema, Ministro, que é a vexata quaestio da Venezuela. Mais uma vez a Venezuela. Nós estamos nos aproximando das eleições, marcadas para 6 de dezembro. Os sinais são extremamente preocupantes. É uma eleição em que líderes políticos não poderão concorrer - um dos mais expressivos, como Leopoldo López, Maria Corina Machado. Leopoldo López está preso! Maria Corina Machado, banida do pleito eleitoral por uma decisão arbitrária!
Ainda há poucos dias, o Presidente da OEA enviou uma carta ao Presidente Maduro, em que ele enumera - seguramente o senhor teve conhecimento dessa carta -, de uma maneira exaustiva, todas as violações aos direitos democráticos da oposição ocorridos no governo Maduro e que levam à séria preocupação de que essa eleição seja uma fraude.
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E se não for uma fraude, há preocupação com o banho de sangue, que foi anunciado pelo Presidente Maduro, que disse - declarações foram amplamente repercutidas na imprensa - que, se porventura o governo perder as eleições, ele está preparado para reagir, inclusive, militarmente. Ora, é uma situação intolerável! E mais intolerável ainda, perdoe-me, Ministro, é o silêncio do Governo brasileiro diante disso tudo. É como se fosse um assunto irrelevante para o Governo brasileiro.
Quando o senhor esteve aqui, da primeira vez, logo no início da Sessão Legislativa, se reportou ao entendimento havido entre o Governo brasileiro, a Colômbia e o Equador, que constituíram uma comissão de chanceleres para se entender com a presidente do conselho eleitoral da Venezuela. E que havia um compromisso de que haveria uma observação do pleito eleitoral enviada à Venezuela em tempo hábil, uma observação que seria realizada por uma delegação robusta. Depois, tivemos o episódio Jobim, que, no meu entender, foi um vexame. Um completo vexame porque o nome do Jobim foi aceito - V. Exª me reportou, inclusive - pela Presidente da República com entusiasmo. O senhor levou à Presidente da República a sugestão, excelente sugestão, de um nome que daria à comissão - tivesse ela o nome que tivesse, observação, acompanhamento, o que fosse - que daria respaldo a todos aqueles que querem que as eleições sejam limpas.
O nome de Jobim foi vetado. Não houve nenhuma reação do Governo, embora tenha havido uma reação dura do Poder Judiciário, do TSE, reação dura do Congresso Nacional. Mas, mais uma vez, o Governo silenciou diante dessa gesto que eu considero afrontoso.
Eu trago essa preocupação ao senhor, acho que as coisas começam a mudar com a eleição de Macri. Macri deu umas declarações muito incisivas em relação à aplicação das sanções previstas nas cláusulas democráticas. Concedeu uma entrevista à imprensa ao lado de Lilian Tintori, esposa de Leopoldo López, ele presidente eleito. Lilian Tintori que não foi recebida pelo senhor, nem pelo Secretário-Geral; pela Presidente, nem pensar! Aliás, ela não teve sequer uma resposta da Presidente da República. Então, esses são assuntos, Ministro, que eu tenho obrigação de colocar ao senhor com toda franqueza, porque são assuntos políticos delicados e penso que seria de todo conveniente, dada a posição amplamente majoritária no Congresso, no Senado, em relação a esse tema, que nós tivéssemos, o Congresso Nacional e o Ministério das Relações Exteriores, um diálogo mais franco, mais aberto, em que nós pudéssemos trabalhar de uma maneira, digamos, harmoniosa em relação a um tema que não é apenas uma idiossincrasia da oposição. Há muitos Parlamentares e Parlamentares de grande prestígio na base do Governo - inclusive o Presidente do Senado... Vejo aqui o Senador Fernando Bezerra, Senadores que hoje militam na oposição que têm uma posição, todos eles são concordes de que nós não podemos mais continuar com esse silêncio que é chocante do ponto de vista inclusive da consciência democrática do Brasil. Também eu considero um desrespeito à própria Constituição brasileira, que determina que um dos princípios que devem reger as relações internacionais do Brasil é o respeito aos direitos humanos, e que estão sendo abertamente violados pela tirania venezuelana.
Feitas essas considerações, independentemente das indagações que serão feitas pelos Senadores, renovo as boas-vindas, a manifestação de consideração e de respeito ao senhor e ao Ministério das Relações Exteriores do Brasil.
V. Exª tem a palavra.
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O SR. RICARDO FERRAÇO (PMDB - ES) - Pela ordem, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Pois não.
O SR. RICARDO FERRAÇO (PMDB - ES) - Cumprimentando V. Exª e naturalmente o nosso Chanceler que nos honra aqui com sua presença, hoje é um dia muito difícil para todos nós aqui no Senado, porque estamos com a Comissão de Assuntos Econômicos em seu dia natural, permanente, e temos decisões importantes a serem tomadas lá na Comissão de Assuntos Econômicos. Portanto, o tempo hoje se apresenta muito mais como inimigo do que como aliado.
A questão que eu gostaria de submeter a V. Exª e evidentemente aos nossos pares é se não seria viável que invertêssemos a ordem dos fatores, para que primeiro pudéssemos colocar as nossas questões para o nosso Chanceler, para que ele inclusive focasse a sua fala em torno daquilo que se apresenta. Nós ganharíamos tempo com isso e prestigiaríamos - se assim me permite - a presença do nosso Chanceler Mauro Vieira na Comissão de Relações Exteriores. É a proposta que faço humildemente a V. Exª.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Se o Ministro não tiver objeções, acho que isso... Também o Ministro está hoje com o dia apertado.
Essa reunião extraordinária foi proposta por mim ao Ministro, uma vez que ele deverá estar em Cuba hoje à tarde. Viaja para Cuba no final do dia e chegaria aqui na quinta-feira, muito em cima da reunião ordinária nossa e de uma reunião que está marcada já para ouvir o relatório de V. Exª a respeito da indústria de defesa brasileira. De modo que foi o espaço que encontramos na nossa agenda para fazer essa reunião extraordinária.
Então, acho interessante a sua proposta. Se não houver objeção dos Senadores, vamos começar por aí.
A primeira inscrita é a Senadora Ana Amélia. A primeira inscrita e a primeira a chegar também.
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Eu queria... O requerente da audiência penso que tenha...
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Tasso Jereissati.
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - É. Ele tem preferência.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - É verdade.
O SR. TASSO JEREISSATI (Bloco Oposição/PSDB - CE. Fora do microfone.) - Mas a preferência é da Senadora mulher.
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Não, Senador. Eu preciso aquecer os meus motores. Eu estou muito tensa. Essa eleição...
O SR. RICARDO FERRAÇO (PMDB - ES. Fora do microfone.) - Se nenhum dos dois quiser, eu me apresento! (Risos.)
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Está bom. Então está bom.
O SR. RICARDO FERRAÇO (PMDB - ES. Fora do microfone.) - Não precisam brigar por causa disso, não.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Tasso.
O SR. TASSO JEREISSATI (Bloco Oposição/PSDB - CE) - Presidente, Senador Aloysio; Ministro Mauro Vieira, que nos honra com sua presença, nos últimos dias se tem acentuado de maneira bem clara que a nossa política externa tem levado o Brasil à enorme distância do resto do mundo desenvolvido.
O recente anúncio da assinatura do chamado TPP, que envolve vários países das Américas, inclusive da América do Sul, realçou, enfatizou esse isolamento. Uma professora da Fundação Getúlio Vargas, especialista em política externa - no momento me foge o nome dela - esteve aqui e nos fez...
O SR. RICARDO FERRAÇO (PMDB - ES. Fora do microfone.) - Vera Thorstensen.
O SR. TASSO JEREISSATI (Bloco Oposição/PSDB - CE) - Oi?
O SR. RICARDO FERRAÇO (PMDB - ES) - Vera.
O SR. TASSO JEREISSATI (Bloco Oposição/PSDB - CE) - Vera.
Ela fez um gráfico aqui mostrando todos os acordos internacionais que foram feitos: grandes acordos, pequenos acordos; e mostrando o total isolamento em que o Brasil ficou, estando praticamente isolado do contexto da chamada produção global... criação de valor de produção global.
Isso foi feito, Ministro. Não é apenas uma coincidência, isso é em função das premissas da política externa. Essas premissas foram levadas a público em discursos proferidos pelo ex-Presidente Lula e pelo ex-Ministro Celso Amorim.
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Estão escritas nos discursos deles as premissas: o declínio inevitável do poderio dos Estados Unidos; a veemente crítica ao processo de globalização econômica e financeira; mudança no eixo da dependência comercial do Brasil, pela redução da influência dos países desenvolvidos e pelo aumento da cooperação com os países em desenvolvimento; ampliação das relações Sul-Sul, uma das prioridades da política externa, com maior aproximação e ativismo na América do Sul, na África e no Oriente Médio, e a participação nos blocos integrados por países dessas regiões e outros emergentes; ampliação da integração regional e fortalecimento do Mercosul e sua expansão, com o objetivo de formar uma área de livre comércio na América do Sul como forma de oposição aos Estados Unidos; prioridade absoluta nas negociações comerciais multilaterais da Rodada Doha e a insistência em seguir na contramão das tendências atuais de maior integração de economia global; a partidarização da política externa e a criação de um canal paralelo ao do Itamaraty, o que culminou em uma política de afinidades ideológicas e generosidade exagerada, e uma chamada paciência estratégica nas relações econômicas e comerciais com os países sul-americanos tais como Venezuela, Argentina, Bolívia, Cuba, e com países africanos.
Sr. Ministro, para ser bastante objetivo, enquanto a crise econômica interna é séria, a integração do Brasil com o mundo poderia ser a grande alternativa para aliviar a crise social que já estamos vivendo. Nós não estamos fazendo isso. Qual é o projeto de política externa que o senhor está liderando neste momento? Qual é a perspectiva das negociações com a Comunidade Europeia, em vista das notícias da resistência de alguns países europeus, pelo nível aquém dos esperados 87% em vez de 90% pela União Europeia? Quando a União Europeia vai responder ao Mercosul?
Recentemente, já em relação ao Mercosul - ontem, aliás -, o Presidente Macri, recém-eleito, numa de suas primeiras declarações, enfatizou que vai pedir o afastamento da Venezuela do Mercosul, caso a Venezuela não comprove... Caso as eleições que vão ocorrer no mês que vem, na Venezuela, não sejam feitas de acordo com o processo democrático, livre e transparente, e se o governo venezuelano não entregar, não passar o poder, caso perca a eleição, qual será a posição do Brasil? O País vai ficar a reboque, novamente, nessa questão? Já que nós estamos a reboque, há algum tempo, da política bolivariana, no caso da Argentina já tomando claramente uma posição diferente, o Brasil passaria a ser o único bastião forte, dentro do Mercosul, defensor das repúblicas bolivarianas?
E mais uma vez, Ministro, como disse aqui o Senador Ferraço, nosso tempo está escasso. Eu não vou querer me alongar muito. Eu queria fazer mais uma vez a pergunta sobre o número de embaixadas.
Na semana passada, dentro dessa crise no noticiário, já fizemos essa pergunta e ninguém aqui ficou satisfeito com as respostas, já que praticamente em todos os organismos internacionais que o País está envolvido nós estamos atrasados com pagamentos de contas de luz, enfim, de coisas mais corriqueiras possíveis, e insistimos na abertura de embaixadas em países, o que absolutamente não tem justificativa.
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Semana passada, nós aprovamos aqui o embaixador para a República de São Vicente e Granadinas, e ele mesmo nos falou que aquele país tem apenas quatro embaixadas. Nenhum país rico do mundo tem embaixada nesses países São Vicente e Granadinas. Não tem dos Estados Unidos, Inglaterra, Alemanha, França etc. E nós continuamos, a meu ver, de uma certa maneira perdulária, em função de possíveis votos para alcançarmos determinadas posições que seriam inviáveis nesse momento.
Então, novamente eu gostaria de perguntar se existe uma perspectiva de revisão dessa política, pelo menos enquanto o Brasil está nessa gigantesca crise fiscal?
É só isso, Ministro. Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - A Senadora já deve ter esquentado os motores.
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Senador, nosso Presidente Aloysio Nunes Ferreira; caro Chanceler Mauro Vieira, eu, ao longo da minha vida profissional como jornalista e agora como Senadora, até esse período, tenho reconhecidamente, publicamente, reafirmado a minha admiração pela diplomacia brasileira.
Lembro até que, no regime militar, a diplomacia brasileira era respeitada pelos adversários do regime por ser uma política de Estado voltada para os interesses nacionais. Todo esse valor da Casa de Rio Branco se foi, no meu modesto juízo. Por admirar tanto a Casa e conhecer tantos diplomatas de alta qualidade, eu, como cidadã brasileira e como Senadora, vejo a diplomacia brasileira se apequenar. Isso não é bom para o Brasil, pela posição estratégica que tem em questões regionais, multilaterais, bilaterais.
Vamos iniciar pela razão desta audiência com V. Exª, requerida pelo Senador Tasso Jereissati, sobre o Acordo de Parceria Transpacífico. Começo por ela lembrando que o Governo brasileiro apostou todas as fichas nas negociações da OMC, Rodada Doha. Essa aposta foi muito equivocada, pois deveríamos ter atuado num ambiente mais amplo incluindo o bilateral regional, e não houve evolução. Eu queria saber de V. Exª se há um plano b para compensar as eventuais perdas já visíveis decorrentes do desvio do comércio. Há alguma estratégia de aproximação com os países integrantes da TPP? Como fazer para que o Brasil se reincorpore às grandes negociações e se integre na nova arquitetura do comércio internacional?
O caso da Argentina com a China foi exemplar no enfraquecimento e na revelação de que Mercosul perdeu o sentido porque o nosso comércio com a Argentina, um dos maiores blocos, caiu a metade. Então, qual é a solidariedade? Qual é a justificativa?
Há também um equívoco, porque um dos princípios da diplomacia, especialmente considerando o Continente Sul-Americano, é da não interferência nas questões internas, e no caso não só específico da Argentina agora, mas houve o caso do Peru, o próprio caso da Venezuela, há uma interferência até pessoal dos mandatários brasileiros apoiando determinados candidatos nesses países. Foi visível a demonstração pública do ex-Presidente Lula e da Presidente Dilma ao candidato da Presidente Cristina Kirchner na Argentina, como foi em relação ao Peru e na Venezuela está sendo agora. Então, essas questões estão dentro dessa linha, dessa lógica.
E também o Brasil votou a favor da Venezuela - já que esse tema ficou um pouco mais forte agora, com o resultado da eleição na Argentina - nas últimas eleições para o Conselho de Direitos Humanos da ONU.
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As credenciais do governo Maduro são questionadas em toda parte. No Brasil, o Supremo Tribunal Federal reconheceu violações de direitos humanos e a falta de independência do Judiciário venezuelano numa decisão sobre extradição de um cidadão venezuelano. No Chile, a Corte Suprema determinou ao Executivo chileno requerer à Comissão Interamericana de Direitos Humanos que investigue a situação de presos políticos na Venezuela.
O apoio acrítico à eleição da Venezuela no Conselho de Direitos Humanos da ONU é consistente com o princípio constitucional da prevalência dos direitos humanos nas relações internacionais? É a pergunta que faço a V. Exª. E deixo até de trazer outras questões, lembrando apenas uma aqui em relação a Mercosul, porque como sou uma Senadora do Rio Grande do Sul, o qual é altamente impactado por todo o processo de Mercosul, especialmente na relação com a Argentina.
Quando a Argentina levantou as tais autorizações prévias - que têm um nome complicado - para a importação, chocolate e calçado brasileiros ficaram um ano presos no Porto de Uruguaiana, sem poder chegar a cumprir as encomendas feitas pelos importadores argentinos, não houve nenhuma ação. As ações eram periféricas, eram pouco eficazes em relação aos prejuízos que a indústria calçadista do meu Estado teve.
Além do mais, o Rio Grande do Sul é o exportador de máquinas agrícolas para a Argentina. As máquinas lá e a dona Cristina Kirchner veio e disse: "Querem exportar? Venham para cá. Transfiram-se do Rio Grande e venham para produzir aqui na Argentina."
Pode ser até uma política de Estado, mas isso tem que ser feito numa dosagem, de uma forma que não comprometa os princípios da boa relação.
A tarifa externa comum é uma ficção. Brasil e Argentina têm a possibilidade de colocar cem produtos na lista de exceção. Uruguai e Venezuela, 225; Paraguai, 649. Além disso, bens de capital e bens de informática e telecomunicações estão submetidos a regime de ex-tarifário, isto é, tem redução temporária da alíquota do imposto de importação. A administração dessas exceções tornou-se um balcão de negócios. Por que nos últimos doze anos não se avançou nas eliminações dessas exceções ou na consolidação dessa união aduaneira que não tem funcionado?
E, por fim, qual é a expectativa que V. Exª tem com esse novo governo da Argentina em relação a esse sonhado, pretendido acordo Mercosul - União Europeia, que parece nunca sair do papel?
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Em matéria de esquentamento de motores V. Exª está realmente parecendo... Está com toda a corda. Lembra-me da nossa visita à Embraer. Fizemos juntos uma visita à Embraer. Aliás, uma visita...
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Ali é um outro Brasil, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - ...a um outro Brasil.
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Ali é um outro Brasil.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Muito bem.
Senador Ferraço, por favor.
O SR. RICARDO FERRAÇO (PMDB - ES) - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Srªs e Srs. Senadores; Ministro Mauro Vieira, V. Exª não pode ser considerado o arquiteto dessa tragédia, uma das tragédias que o nosso País está vivendo nos últimos anos, dentre tantas. Nós temos a tragédia política, temos a tragédia econômica, temos a tragédia moral de um Governo que perde popularidade. E popularidade são circunstâncias que os governos vivem e passam; mas um Governo que perde credibilidade... Dentre essas tragédias do Governo da Presidente Dilma, há a manutenção, o aprofundamento e - por assim dizer - a redobrada dos esforços em relação a essa coleção de equívocos em relação à política externa brasileira em todas as suas dimensões.
Não é possível responsabilizar V. Exª por essa arquitetura, porque a arquitetura dessa política de fato tem nome, tem endereço, tem CPF: a Presidente Dilma, o Ministro e assessor Marco Aurélio Garcia... Mas V. Exª é parte dessa política desde o período em que ocupou a Embaixada do Brasil em Buenos Aires, ocupou a Embaixada do nosso País em Washington; é Chanceler da nossa República, enfim. Se V. Exª exerceu e exerce essas funções, na prática é porque V. Exª está em linha ou concorda com essa orientação. Se não é o arquiteto, é um dos construtores dessa tragédia.
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É evidente que nós não estamos aqui questionando, sob certa razão ou não, a legitimidade dessas ações da política externa brasileira, porque é um Governo que está legitimado pelo voto direto, em que pese não ter discutido com a sociedade brasileira o que faria com sua política externa. Então, até mesmo a legitimidade é questionável, porque não houve um debate e tampouco essas bases foram apresentadas à população brasileira. Parte dessas bases foi aqui declinada pelo Senador Tasso Jereissati. As bases estão lá no governo de Lula e do Chanceler Celso Amorim, que apostaram no declínio dos Estados Unidos e colocaram de pé a política Sul-Sul, deixando de lado um conjunto de outras ações. Não que a política Sul-Sul não seja importante, claro que é importante, mas ao abdicar do resto, isso se transformou efetivamente num contorno de resultados - a meu juízo, pelo menos - absolutamente decepcionante.
Em dez anos, nós caímos de 26º para 32º lugar entre os maiores exportadores mundiais de manufaturados. O Brasil representa hoje pouco mais de 1% das trocas internacionais. Evidentemente, isso não é simplesmente em razão da política externa, existe um conjunto de outras variáveis que fizeram com que o nosso País perdesse competitividade em função dos equívocos de política econômica, em função das orientações relacionadas à substituição de importações 2.0 e assim por diante.
O fato é que estamos no pior dos mundos. O Brasil é protagonista de um isolamento sem igual, correndo inclusive o risco de se isolar dentro do Mercosul, à medida que o ex-Presidente Lula e a Presidente Dilma fizeram campanha escancaradamente para o candidato derrotado.
A Presidente Dilma recebeu, no Palácio do Planalto ou no Palácio da Alvorada, o candidato Daniel Scioli, que, ao sair da audiência com a Presidente Dilma, disse que tinha orientação ou autorização da Presidente Dilma para dizer que o seu Governo e ela própria apoiavam a candidatura ou a manutenção dos equívocos também na Argentina.
Então, nós estamos diante de um fato novo. Há contrariedades em relação à forma pela qual temos nos postado no Paraguai; há contestações em relação ao Uruguai com relação à forma pela qual o Brasil tem se postado no Mercosul. E estamos diante de uma nova cúpula que vai se reunir em 21 de dezembro, já com manifestações antecipadas do Presidente Macri, da Argentina, de que vai invocar as cláusulas democráticas do Tratado de Assunção, coisa que o País não tem cumprido. Isso já foi largamente aqui apresentado pelo Presidente Aloysio Nunes e pelos Senadores que me antecederam.
Nós estamos, portanto, diante de uma nova conjuntura em nossa política externa brasileira. Como o Governo brasileiro, como V. Exª está fazendo a leitura dessa conjuntura vis-à-vis com o que está acontecendo na América do Sul, no mundo?
O Governo sempre faz uma leitura muito Pollyanna dos fatos objetivos em relação à política externa globalmente falando. É como se nós estivéssemos no caminho certo. Eu acho que nós estamos no caminho do abismo. Perdoe-me, mas essa é a realidade. Mas o Governo sempre se coloca diante dos fatos como se nada fosse surpresa para ele.
Não foi surpresa para o Governo a aliança para o Pacífico; não tem nenhuma consequência para a nossa política externa. Não foi surpresa para o Governo a Parceria Transpacífico. Não será surpresa para o Governo a Parceria Transatlântica. Nada é surpresa para o Governo! E nós estamos caminhando a passos largos na direção da decadência mais absoluta em relação à nossa presença e ao nosso protagonismo.
A inserção do Brasil no Conselho de Segurança Nacional virou piada nas rodas internacionais, dada a baixa condição e capacidade do nosso País se colocar.
Então, diante desses fatos todos, o Governo está revendo a sua orientação de política externa?
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Ou o Governo vai insistir em dobrar a sua aposta em relação a essa coleção de equívocos que está se traduzindo num prejuízo de todas as dimensões para o nosso País?
É o questionamento que faço a V. Exª, na condição de nosso Chanceler.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Obrigado, Senador.
Senador José Medeiros, por favor.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Sr. Ministro, Sr. Presidente, gostaria de parabenizar a Comissão por trazer o Ministro aqui. Creio que estamos precisando muito falar sobre a relação do Brasil, a atitude do Brasil em relação à política exterior. Eu digo isso porque quanto mais eu converso com pessoas, mais eu sinto que as decisões tomadas pelo Brasil em certos momentos até causam vergonha alheia no cidadão.
Eu me lembro de que, no meio deste ano, Ministro, fomos à Venezuela, porque tínhamos recebido nesta Comissão uma comissão de senhoras, esposas de presos políticos da Venezuela, que denunciaram coisas gravíssimas aqui. Eu confesso que fui ali com o espírito totalmente desarmado, desprovido de qualquer ranço, realmente estava curioso para saber quais eram as condições da Venezuela, se ela era essa vítima que apregoava ser ou se era esse monstro que também uma ala dizia ser.
Nós chegamos ali numa missão oficial aprovada aqui no Senado, que com certeza o senhor acompanhou muito bem. E mal conseguimos descer do avião. A comissão de Senadores ficou presa por uma hora dentro da aeronave. Depois começaram a munganga, carregando a gente, e se não fosse um dos membros da Comissão Exterior desta Casa, nem sei aonde eles tinham levado a gente. E o desenrolar dos fatos todo mundo já sabe.
Eu não precisei nem adentrar o território venezuelano para ver que nós estávamos diante de um governo pequeno, que aquele povo não merece. Mas, nesse mesmo tempo, a gente via e vê total cumplicidade do Governo brasileiro em relação a esse país e a esse tipo de política. E aí, como foi bem explanado aqui - o que nos preocupa -, ao contrário das coisas que estão acontecendo no mundo, o Brasil se une a esse grupelho e nós começamos a perder oportunidades importantíssimas para nossa economia.
Ao passo também que nos faz lamentar - como a Senadora Ana Amélia colocou aqui -, porque o Instituto Rio Branco sempre foi o sonho, até no imaginário dos jovens quando estudavam para o vestibular, ir para o Itamaraty e seguir essa carreira. Hoje vemos com muita frustração. Chega-se nas embaixadas, obviamente, não se fala oficialmente, mas os funcionários nos dizem: "Está faltando dinheiro para pagar luz." Eu não sei o que está acontecendo. Eu pensei que fossem embaixadas - Senador Tasso - mais periféricas. Eu falo de embaixadas importantíssimas, como de Londres, como dos Estados Unidos, as pessoas estão com extrema dificuldade. Eu não sei como podemos ser protagonistas no cenário mundial se o nosso principal instrumento para sermos esse País grande está sucateado praticamente.
Mas eu tenho uma pergunta mais específica acerca do que me preocupa em relação à economia brasileira e afeta o meu Estado de Mato Grosso.
Posso imaginar que o Itamaraty acompanhou os longos e difíceis entendimentos que redundaram no anúncio da Parceria Transpacífica. Sendo assim, qual avaliação do Ministério das Relações Exteriores sobre o impacto da parceria na nossa economia? Se há algum estudo. Na hipótese de existência de algum trabalho interno sobre as negociações dessa parceria e sua a sua repercussão no Brasil, poderia ser compartilhada com Senado?
Outra pergunta. No domínio do agronegócio, o Brasil, além de não abrir novos mercados, passa a conviver com risco de perder com o advento da parceria os já conquistados.
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Segundo declarações feitas durante o anúncio do acordo, prevê-se redução tarifária de 40% nas exportações de frango e de 35% nas vendas de soja. Somem-se a essa circunstância aspectos sanitários e ambientais e outros regulamentos que estão além do preço e que irão beneficiar nossos concorrentes, de modo destacado os Estados Unidos da América, que são fornecedores preferenciais dos demais onze países envolvidos na parceria. Esse o quadro. Qual a estratégia do atual Governo: insistir com Mercosul, Unasul e bolivarianos ou temos alguma saída da qual ainda não sabemos?
São minhas colocações, Sr. Presidente. Tem nos inquietado muito essa forma... De repente até o Brasil está com uma política que não sabemos, há alguma mexida. Nesses dias falaram: "Olha, às vezes estamos jogando xadrez, vemos uma jogada e você fala que isso está totalmente errado, mas ela está tão errada que você pensa que é uma estratégia do adversário e fica ali." De repente vai ver que não, era uma jogada errada mesmo.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Muito bem.
Passo a palavra agora ao Chanceler Mauro Vieira.
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Muito obrigado, Sr. Presidente Senador Aloysio Nunes Ferreira, Srs. Senadores, membros da Comissão, colegas do Itamaraty que vejo aqui.
Eu queria, em primeiro lugar, dizer que é uma honra vir mais uma vez. Como V. Exª registrou, é a quarta vez que venho a esta Comissão discutir temas de política externa. Eu acho que esse fato é estimulante. Venho, evidentemente, com o sentido de dever, mas também com grande interesse e disposição.
A execução da política externa está evidentemente relacionada à capacidade que o Ministério das Relações Exteriores tem de atuar não só no exterior, mas também de articular dentro do País com os demais órgãos de governo, com o Congresso Nacional e com a sociedade quais são os objetivos e como nós vemos o mundo na atualidade.
Eu queria, antes de tudo, agradecer a V. Exª, Sr. Presidente. Também agradeço a compreensão do Senador Tasso Jereissati, que foi o proponente dessa iniciativa e permitiu a mudança da data para que eu viesse hoje, numa reunião extraordinária e não na quinta feira, porque eu tenho um compromisso hoje ainda, no final da tarde, em uma visita ao exterior, a Cuba, e o regresso seria arriscado, eu chego na quinta-feira de manhã, seria muito arriscado comprometer o horário do início da Comissão.
Então, eu queria agradecer muito a compreensão de todos e dizer que tenho muita satisfação em conversar sobre os dois temas principais que foram objeto do requerimento e do convite desta Comissão e sobre todos os outros, como a Parceria Transpacífica e a questão das eleições e da Comissão da Unasul para as eleições da Venezuela e também sobre qualquer outro tema que seja de interesse.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Aliás, se o senhor puder dar uma palavrinha depois sobre a sua visita a Cuba, de qual agenda vai tratar, seria muito interessante para a Comissão.
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Com muito prazer.
Eu tinha também intenção, mas pelo horário que hoje é reduzido para os senhores entendo que não seria possível, de fazer neste momento uma avaliação geral da política externa do Governo brasileiro neste primeiro ano em que estou à frente do Ministério, desde o convite que recebi da Presidente Dilma Rousseff em dezembro do ano passado, com a posse no início do segundo mandato.
Posso começar pela Parceria Transpacífica ou pela Venezuela?
A Parceria Transpacífica não está concluída. Houve o fim das negociações em nível técnico, ainda tardará para ser assinada e para ser posta em vigor mais ainda, serão anos. Basta dizer que os últimos acordos de livre comércio dos Estados Unidos com alguns países da Ásia levaram quatro ou cinco anos para serem mandados ao legislativo americano e depois houve toda questão do exame no legislativo.
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A Parceria Transpacífica é a evolução de um acordo assinado em 2006, entre o Chile, Nova Zelândia, Singapura e o Brunei. Era também um acordo resumido a quatro países, limitado a quatro países, mas que previa reduções tarifárias. Com relação a esses países, essas reduções tarifárias já existem, já estão em vigor. A partir de 2008, os Estados Unidos então tiveram interesse de se aproximar e negociar com esses países liberações em serviços financeiros. Mas foi só. Também depois, aos poucos, outros países foram se interessando, como Austrália, Vietnã e Peru, no continente.
Em termos estritamente comerciais, os Estados Unidos, a partir de 2009, do início do primeiro mandato do Presidente Obama, iniciou então uma aproximação e uma negociação ampliada, que envolvia praticamente todos os países que agora concluíram as negociações. Inclusive, tardou um pouco para que países como o Japão e a Austrália aderissem. O Japão tem legislações muito protecionistas em várias áreas, sobretudo quanto a produtos agrícolas. Agora, a adesão do Japão, que é recente, de 2012/2013, realmente faz o bloco ser importante e acrescenta um aspecto interessante.
Antes da adesão do Japão, do início do Japão nas negociações, 95% das trocas Estados Unidos já eram feitas com os países da região que estava negociando já eram feitas com países com os quais os Estados Unidos tinham acordo de livre comércio. Então, na realidade, acrescentava muito pouco. O fato do Japão, sim, porque aí passaram a ser os países com que os Estados Unidos não têm acordo livre comércio na região. Quer dizer, os extras TLCs, com a presença do Japão, passaram a ter 20% do volume de comércio dos Estados Unidos com esses países que não têm acordo de livre comércio.
Esse fato é importante e creio que vale a pena ser registrado. Foram muitas as negociações com esse novo formato. Começaram a se desenvolver a partir de 2012/2013, com o ingresso, então, do Japão e da Austrália. Deve-se dizer que foi uma longuíssima negociação, como já mencionei, foram mais de 19 rodadas de negociações oficiais e 23 rodadas técnicas. A última técnica delas aconteceu agora em setembro, nos Estados Unidos, em Atlanta, quando foi anunciado o fim das negociações no nível técnico. Isso ainda implicará depois, evidentemente, acertos políticos e futura assinatura do acordo, sobretudo aprovação no Congresso americano. Já assistimos à campanha para as eleições presidenciais nos Estados Unidos e os principais candidatos dos dois lados já se manifestaram contra o acordo.
Com relação ao acompanhamento do Brasil, é importante ter em mente que o Brasil não foi convidado, o Brasil não é membro da Bacia do Pacífico e não estava no acordo inicial de 2006, não foi convidado. E uma coisa importantíssima é que a grande parte da polêmica gerada em vários países com relação ao TPP deve-se ao fato de que esse acordo foi negociado entre os estados que foram convidados a portas fechadas, não houve divulgação praticamente nenhuma de dados, de aspectos, de conteúdos importantes durante a negociação. Nós esperamos ainda a divulgação do texto técnico que foi feita muito recentemente, mas ainda sem todos os detalhes. Está sendo feita uma avaliação.
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Mas o que é importante é ter em mente que a TPP consagra esse movimento gradual de distanciamento também dos Estados Unidos do multilateralismo comercial que foi inspirado pelo próprio governo americano, no fim da Segunda Guerra, com todos os organismos Bretton Woods e todo multilateralismo. Isso é também feito como uma medida, como um instrumento de promover interesses - e é óbvio que seja assim - do comércio norte-americano. E esse tipo de acordo favorece a proteção da propriedade intelectual e a promoção dos interesses americanos em relação à propriedade intelectual e disciplina também a regulamentação de investimentos.
A TPP consolida circuitos produtivos existentes na região do Pacífico onde há uma grande integração produtiva e as tarifas aplicadas pela maioria dos países da TPP são já, há muitos anos, muito baixas, muito mais baixas que as tarifas em qualquer outra região, com algumas exceções em mercados menores, evidentemente.
Por essas razões, o desvio de comércio gerado por esse acordo na área industrial até o momento não é avaliado como tendo um impacto muito grande, sobretudo para terceiros países, como o Brasil ou para países de outras regiões.
No entanto, na área agrícola, os grandes mercados da TPP aplicam restrições tarifárias significativas e isso, sim, pode trazer prejuízos para o Brasil. Seria também necessário um exame detido em agricultura, mais do que as barreiras tarifárias são as barreiras sanitárias que podem ser importantes. Isso é, sem dúvida, um tema de interesse e de acompanhamento pelo Governo brasileiro, pelo Ministério das Relações Exteriores e pelos outros ministérios envolvidos, como o Ministério da Indústria e Comércio, como o Ministério da Fazenda e outros.
É preciso evidentemente analisar, porque é apresentado pela imprensa em geral - não só brasileira, mas de todo o mundo - como um grande feito, apregoado como uma grande vantagem e quem está fora está prejudicado. Também se tem que dizer que é a primeira grande negociação plurilateral dos Estados Unidos em mais de 20 anos, desde a conclusão do Nafta. Também tem esse aspecto.
O acordo impõe também obrigações para os seus membros que eliminam parte das vantagens que poderiam ser aferidas somente com a questão de reduções de tarifas. Por exemplo: o Vietnã assumiu o compromisso de permitir a liberdade sindical e isso não é uma coisa que evidentemente vai encarecer as exportações do Vietnã, sobretudo na área têxtil, mas isso não é exclusivo dos países da TPP. Todos os países se beneficiarão do aumento da elevação do custo das exportações do Vietnã, já que são permanentes, são custos estruturais da produção.
Também há compromissos para evitar a manipulação cambial, o que também beneficia todos os países que comerciam com essa região.
Quanto à crítica de que a estratégia brasileira apostou demasiadamente no multilateralismo da Rodada de Doha, da OMC, eu acho que não é totalmente válida. Um país como o Brasil, que é um ator global e que negocia com todos os países do mundo, não pode depender de um único mercado, de uma única região.
Nós estamos inseridos em todo o mundo: na África, na América Latina, no Caribe, na América Central, nos Estados Unidos e na União Europeia e não poderíamos evidentemente deixar de considerar o multilateralismo, inclusive porque, isso sim, é um princípio básico da política externa brasileira e é também um preceito constitucional, como é a integração latino-americana, como é a defesa do multilateralismo.
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São preceitos constitucionais que não poderíamos deixar de levar. E é importante dizer que, no âmbito da OMC, são negociações que visam a regulamentar o comércio num universo de pelo menos 150 países e não apenas dos doze que compõem a TPP. Também é importante dizer que as questões que muito interessam ao Brasil estão regulamentadas e são defendidas na OMC, como a questão dos subsídios agrícolas para Estados importantes, como o Estado do Rio Grande do Sul e tantos outros do Centro-Oeste brasileiro, grandes produtores e todos os Estados brasileiros produtores e exportadores.
Nesses acordos plurilaterais, as condições são adversas para o Brasil. Nós temos que lutar, ser ativos e criar um sistema, um mecanismo de comércio internacional que defenda os nossos interesses. E aí eu não vejo outra alternativa se não fortalecer a OMC para que crie regras, sobretudo nessas áreas em que temos grande interesse, que defendam os nossos interesses e que criem um sistema, uma rede internacional em que haja pleno conhecimento, em que haja transparência e em que haja...
O SR. RICARDO FERRAÇO (PMDB - ES) - Perdoe-me a imprudência, mas o Governo brasileiro pretende aprofundar a tese do multilateralismo?
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Também tenho uma pergunta. Qual é a sua expectativa em relação à reunião de Nairóbi?
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Em Nairóbi eu chegarei.
O multilateralismo é indispensável em todas as áreas - político, econômico e social -, em todas as áreas é indispensável. Para um país como o Brasil, se não fosse a ONU, se não existissem as regras da ONU, se não existisse multilateralismo, nós estaríamos...
O SR. RICARDO FERRAÇO (PMDB - ES) - Mas os acordos regionais estão se sobrepondo com muita força ao multilateralismo. É basicamente isso.
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Mas os acordos regionais ou plurilaterais não são tantos. O que existe - posso aqui me referir a isso - e eu já havia feito referência, esse é o primeiro acordo plurilateral em mais de 20 anos. Pode haver algum acerto, mas os acordos comerciais têm que ser compatíveis com as normas e as regras da OMC para todos os países que são membros da OMC. Todos os países são membros - quase todos, um grande número - ou estão em processo de adesão à OMC.
Eu gostaria só de continuar dizendo que eu acho que é uma escolha correta para o Brasil valorizar a OMC. Mas que não seja só a OMC, temos que estar presentes em todas as áreas e em todos os foros. O Brasil já participou no passado de uma quantidade enorme acordos de matérias-primas que depois foram perdendo validade, foram sendo esquecidos e substituídos por outros mecanismos. Nós temos, sim, interesses e fazemos muitos acordos. Eu vou me referir em seguida aos nossos acordos.
Eu acho fundamental que se atue ao mesmo tempo em diferentes áreas, em diferentes foros e a questão da OMC é indispensável. Se não tivermos regras claras, precisas, aprovados por consenso por todos os países, nós vamos entrar numa guerra comercial em que nenhum país vai poder defender seus interesses, a não ser os interesses dos mais fortes.
O multilateralismo, evidentemente, é um princípio básico, é basilar da política externa brasileira porque um país como o Brasil, que não se impõe pela força, que não se impõe pelas armas tem que ter a capacidade de dialogar, de conversar com todas as regiões do mundo, com todos os países.
Eu gostaria ainda de dizer que - já me referi rapidamente, tenho aqui no meu roteiro - os subsídios agrícolas só são negociados na OMC. Portanto, não podemos deixar de lado, não podemos abandonar e não podemos deixar de investir energia e tempo e, sobretudo, lutar para que se chegue a Doha com uma posição firme.
A posição do Brasil é de lutar e nessas negociações reduzir significativamente os níveis de proteção e os subsídios agrícolas. Eu acho uma aposta lógica para o Brasil. A Rodada Doha foi lançada há 14 anos, com um mandato de desenvolvimento e de comércio como promoção do desenvolvimento.
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O Brasil é membro fundador do antigo GATT, que se transformou, no final da década de 90, em OMC. E o Brasil jamais esmoreceu, em nenhuma das rodadas, em todas as anteriores, Rodada Uruguai, Rodada Tóquio, na defesa dos setores que são fundamentais.
E nós acreditamos ainda, sim, em Nairóbi, a reunião ministerial da OMC se realizará de 14 a 18 de dezembro, que possa haver um pacote que inclua entendimentos sobre os subsídios da exportação agrícola, a questão chamada de competição das exportações; as regras especiais, que já vêm também de longo tempo, para os países de menor desenvolvimento relativo; medidas de transparência e, sobretudo, que a declaração ministerial final da rodada dê rumos e indicações de como prosseguir com as negociações da rodada.
Há países que defendem o fim da rodada, e são países grandes atores no comércio internacional, que preferem manter a situação como está, porque se preservam algumas situações favoráveis e positivas e algumas vantagens. E há outros países, como é a posição do Brasil, que queremos continuar. Nós não podemos ceder diante das críticas de que a rodada leva 14 anos, construções de outros mecanismos levam muito mais tempo.
A União Europeia, por exemplo, demorou 50 e poucos anos para chegar ao nível atual. Da mesma forma que o Mercosul demora também vários anos para evoluir e se consolidar. Eu acho que não se deve ceder a essa questão de críticas porque estamos há 14 anos discutindo.
Eu acho houve, ao longo dos 14 anos, avanços importantes e conquistas importantes. Posições do Brasil que foram defendidas e foram colocados, a mais de dez anos atrás, vêm se consolidando, estão presentes nas decisões. Então, precisamos saber qual vai ser o resultado de Nairóbi. É difícil, eu não posso dizer que vamos chegar a um acordo ou vai ser um fracasso absoluto.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - É agora na segunda quinzena de dezembro?
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - É 14 a 18 de dezembro.
Evidente que, no multilateralismo e na discussão entre pares, sempre se pode chegar a um impasse, marcar uma outra reunião para se tentar aplainar dificuldades. Agora, o que eu acho que é importante é que os países emergentes, os países em desenvolvimento, tenham atendidas as suas necessidades básicas de produção. São todos grandes exportadores, com uma participação importante das exportações agrícolas no seu produto interno, eu acho que é importante que haja uma proteção.
E eu creio que a solução em Bali, se não prorrogar a rodada, eu acho que não deve haver dúvida, deve haver posições firmes de que os temas que são de interesse, os temas agrícolas, os subsídios, transparência, competição, exportação, têm que continuar, tem que haver um compromisso que continue em debate. Nós não podemos fechar esse ciclo. Aí sim eu acho que seria objeto de críticas, depois de 14 anos sem avanços significativos, por causa de defesa de interesses de alguns grupos.
Eu acho que esse pacote, se for negociado dessa forma, pode mostrar que a OMC continua sendo um instrumento relevante para o comércio internacional, mesmo com o surgimento de alguns acordos regionais ou plurilaterais, sem dúvida nenhuma.
O Brasil tem liderado e tem empenho na retomada de vários acordos que são do nosso interesse, um deles, que foi mencionado aqui pelos Srs. Senadores, é a questão do acordo Mercosul e União Europeia. Esse acordo é considerado, pelo Governo brasileiro, recebi instruções específicas, da Presidenta Dilma Rousseff, de atuar nesse sentido, como prioritário, importantíssimo.
Aliás, esse acordo já vinha sendo negociado há muito tempo, também já temos 14 ou 15 anos de negociação, e foi, em muitas ocasiões, prejudicada a negociação, por outras tentativas que não avançaram, como a Alca, ou foram ainda, em algum momento, prejudicadas porque havia outros grandes acordos, como as propostas americanas, desde 2009, do TPP e outros que dificultaram um pouco, e depois com a própria, chamada na sigla inglesa de TTIP, que é o acordo Estados Unidos com a União Europeia. Mas eu acho que há um convencimento total de que esse acordo é prioritário.
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Do ponto de vista do Brasil, essa posição é resultado de uma grande consulta entre os órgãos do Governo brasileiro, entre os diferentes representantes dos setores privados, em várias áreas, agrícola, industrial, serviço, há um grande interesse.
O Brasil teve a Presidência Pro Tempore do Mercosul, no primeiro semestre deste ano. E eu transmiti aos meus colegas, Ministros do exterior dos países do Mercosul, essa posição e desenvolvemos um longo e minucioso trabalho de negociação e preparação das ofertas.
Esse acordo já teve dois momentos de interrupção das negociações. O acerto que nós tivemos no relançamento das negociações é de que as ofertas deveriam ser, pelo menos, superiores a uma das interrupções, que foi em 2004. E assim foi.
Nós tivemos, em 2014 - eu ainda não estava nas funções - uma reunião, em Bruxelas, entre o Mercosul e a unidade de negociação da União Europeia, da Comissão de Comércio, em que o responsável pela União Europeia aceitou estes termos, que a oferta do Mercosul deveria cumprir com determinados requisitos que seria situar-se entre 87% a 90% da cobertura de todo o comércio.
Muito bem, isso foi feito. Nós, o Governo brasileiro com os outros membros do Mercosul, continuamos as negociações e nós chegamos a isso. Aí sim isso aconteceu este ano, no primeiro semestre deste ano, intensas negociações, em que contei sempre também com o apoio total do Ministério da Indústria e Comércio, com a presença inclusive do Ministro e Senador Armando Monteiro, na construção dessa oferta e também na negociação, me acompanhou em negociações mais recentes no Paraguai, que assumiu a Presidência Pro Tempore do Mercosul, em julho, e que coordenou essa negociação.
Nós estamos lá, os quatro países que participam: Argentina, Brasil, Uruguai e Paraguai, são os quatro que estão negociando, os demais ainda estão em processo de adesão, de ascensão ao Mercosul, portanto, não estão negociando. Esses quatro países concordaram em uma oferta que cobre 87% do comércio e que é uma oferta interessante, porque há também componentes na área de serviço de compras governamentais. É, sem dúvida nenhuma, uma oferta atrativa.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - E essas outras normas, Ministro, de propriedade intelectual, barreiras sanitárias, fitossanitárias...
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Propriedade intelectual.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - ...questões trabalhistas. Isso tudo são componentes das ofertas?
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Esses aspectos todos serão componentes na negociação. O importante ter presente é que a conclusão das ofertas nos habilita, nos permite assentar com a União Europeia, com a Comissária de Comércio, Cecilia Malmström, e proceder a troca das ofertas.
Eu estou examinando do lado nosso. Agora, tem que ver do lado da União Europeia. Porque...
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Eles não apresentaram...
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Não, eles não apresentaram. Nós não impusemos nenhum limite, não dissemos que oferta deles tem que ser de 90%. Nós estamos esperando.
Realmente, há rumores, pela imprensa, aqui, fora, as especializadas sobre tudo em Bruxelas, de que havia uma expectativa que a oferta do Mercosul deveria ser mais alta. Eu não vejo por que, porque não foi o acordado. E isso é um ponto de partida, nós vamos começar a negociar.
Temos que ver qual vai ser também a oferta da União Europeia, se é ambiciosa, se não é, se é modesta, se é retraída, se é uma oferta interessante aos países do Mercosul, são, todos os quatro que estão negociando, portadores importantes.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Esse tema constou na agenda do encontro da Presidente Dilma com a Chanceler Merkel? Essa questão...
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O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Sem dúvida, foi e eu vou me referir a isso. Mas eu queria só dizer que a União Europeia é muito protecionista e, evidentemente, não poderia deixar de ser, tem que defender seus interesses. E, sobretudo em agricultura, há grandes países que são muito próximos do Brasil, com os quais temos relações importantes e intensas, e que são também grandes produtores e que têm esses interesses. Nós precisamos ver e conhecer qual é a posição da União Europeia.
E nós queremos, nessa reunião de junho último, que a Presidência do Mercosul ainda estava com o Brasil, eu chefiei a delegação do lado do Mercosul, nós pedimos e depois anunciamos formalmente, por meio de um comunicado, que a troca de ofertas se realizaria no último trimestre deste ano. Portanto, nós estamos insistindo para que isso aconteça.
Agora, sexta-feira, dia 27, haverá uma reunião importante em Bruxelas, da Comissão de Política Externa, em que os países membros da União Europeia se reunirão e ouvirão o relato atual do estado dos encontros, dos entendimentos do Mercosul com a União Europeia, a Comissária Cecilia Malmström fará essa apresentação e pedirá, então, o mandato da Comissão para que se proceda a troca de ofertas.
A troca de ofertas é em um primeiro momento, se houver interesse do lado da União Europeia, evidentemente haverá uma negociação e poderemos aumentar. Não se entra em nenhuma negociação com uma posição final. Tudo pode ser visto, examinado e adaptado, de acordo também com o que nos foi oferecido.
A União Europeia, eu dizia, é muito protecionista em vários setores, em várias áreas, por alguns países. E também eu não vejo por que... Por isso não dou razão a esses rumores de imprensa de a nossa oferta deveria ser maior, tendo em vista que a União Europeia, no acordo com o Japão, que começaram a negociar, fez uma oferta que cobre apenas 84% do comércio.
E, por outro lado, a negociação da chamada TTIP, que é a Parceria Transatlântica, com os Estados Unidos e União Europeia, aceitaram começar a negociação com uma cobertura de 80% oferecida pelos Estados Unidos. Então, eu acho que nós estamos perfeitamente habilitados, estamos dentro desse padrão. É fundamental, é importantíssimo.
Recebi instruções diretas da Presidenta para que agisse nesse sentido, e tenho me esforçado, me concentrado. Eu fiz, diante dessas informações que circularam, uma série de gestões, sempre agora coordenadas com a Presidência Pro Tempore paraguaia e com o Ministro do Exterior do Paraguai, Eládio Loizaga, com quem falo sempre. Ele acabou de estar em Bruxelas para, em nome do Mercosul, propor que se realize e oferecer datas alternativas. Essas datas estão sendo estudadas pela União Europeia e nós gostaríamos que fosse este ano ainda.
Mas eu fiz várias gestões, não só diretamente na comissão, com a Comissária Cecilia Malmström, por telefone todas, mas com Ministros do Exterior ou encarregados de comércio exterior dos países grandes atores da União Europeia, como a França, a Espanha, a Itália, o Reino Unido, a Holanda e a Alemanha, sobretudo.
E o tema foi levantado pela Presidenta Dilma Rousseff quando recebeu aqui a Chanceler Merkel e também quando esteve na Itália e foi recebida pelo Presidente da Itália e pelo Primeiro-Ministro Renzi. Eu também voltei a insistir quando recentemente veio o Ministro do Exterior Gentiloni, expressando o desejo do Mercosul que passássemos a fase da troca de ofertas. Nós não podemos ficar eternamente nessa posição, nesse compasso de espera e precisávamos então proceder a isso e conhecer o outro lado, conhecer quais são as cartas que o outro lado tem na mão.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Permita-me só uma pergunta.
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Pois não.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - E os entendimentos entre os Estados Unidos e a União Europeia, em que pé estão? Estão mais avançados?
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Não, que eu saiba também não. Até agora, como no caso da TPP, não há um anúncio total, também é uma negociação dificílima. Se a negociação da TPP com o Pacífico, que vem de uma base, de um acordo aprovado em 2006, demorou de 2009, formalmente os Estados Unidos presente até agora, no da União Europeia, há grandes dificuldades na área agrícola, na área de denominações geográficas e denominações de origem, de propriedade intelectual e também de investimentos, de proteção de investimentos. Há grandes dificuldades e há uma grande diferença de posições.
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Então, eu não sei, quer dizer, eu não tenho conhecimento, o Brasil, como não é membro de nenhuma das duas regiões que está negociando, não tem acesso.
Algum dos Srs. Senadores perguntou se o Brasil tinha tido observadores nas negociações. Não, porque não é admitido; não é admitido, não existe. É um clube fechado, são os membros, é como negociações do Mercosul com a União Europeia, ou participam ou membros do Mercosul ou da União Europeia.
Mas gostaria de dizer ainda, com relação aos acordos comerciais, que tanto o Brasil como o Mercosul estão muito presentes e conscientes da necessidade de acordos regionais. Temos muitos acordos e isso tudo é um processo, é uma arquitetura que está sendo construída. O Mercosul ainda é relativamente jovem, com pouco mais de 20 anos, e precisa ainda consolidar uma série de negociações. Mas nós temos acordos quadros com a Índia, com Israel, com a Palestina, com o Egito - acordos quase já comerciais -, com a União Aduaneira da África Austral, e temos acordos quadros já negociados com o Líbano e com a Tunísia, que têm também interesse em aprofundar e passar do acordo quadro para um acordo de livre comércio.
Da mesma forma com a EFTA, a Associação de Livre Comércio Europeia, que é um pouco até mais antiga que a União Europeia, mas limitada a quatro países apenas. As duas grandes forças são a Suíça e a Noruega, países que têm, evidentemente, uma capacidade de investimentos, uma capacidade de comércio também importantes. E isso é um diálogo exploratório que vem sendo feito. Da mesma forma com o Canadá. O Canadá manifestou interesse e o novo governo recentemente eleito já reiterou essa posição.
É importante dizer que o Brasil tem acordos de livre comércio com os países associados do Mercosul, e que o Mercosul tem também; a nossa rede de acordos cobre toda a América do Sul e o México, e há acordos em discussão com a América Central. O Brasil já assinou acordos de livre comércio com todos os países sul-americanos não membros do Mercosul e acordos, evidentemente, de união aduaneira com os países do Mercosul. Nós temos acordos importantes com a Colômbia, com o Chile e com o Peru, e uma rede de acordos, não é só uma questão de acordos de comércio, mas, por exemplo, acordos de cooperação e facilitação de investimentos importantes que foram concluídos já com o México, com a Colômbia, e, ontem ainda, por telefone, o Ministro Armando Monteiro, que estava em uma missão no Chile, confirmou-me que foi concluído o acordo com o Chile, o que é muito importante.
Com isso, uma rede de dez países da região está integrada por acordos comerciais. Somente o Mercosul, com a sua constituição atual de seis membros, representa 77% do território, 70% da população e 72% do PIB da América do Sul, portanto, creio que seja um dado importante.
E os outros acordos que nós temos, como, por exemplo, o acordo com o México, na recente visita de Estado da Presidenta Dilma Rousseff ao México foi decidido o aprofundamento desse acordo. Esse acordo será ampliado para cobrir a grande maioria e chegarmos a uma cobertura muito elevada de todo o comércio bilateral, incluindo o setor automotivo.
Da mesma forma com a Índia. Eu acabei de visitar a Índia, a Presidente se reuniu também este ano com o Primeiro-Ministro da Índia e foi manifestado o interesse de se quadruplicar a cobertura atual do acordo com a Índia. É um país, sem dúvida nenhuma, importante, com uma grande população, com uma grande participação no comércio internacional, com muito conhecimento, com uma presença muito forte nas áreas de tecnologia da informação, indústria farmacêutica, portanto, eu tenho certeza de que será muito importante.
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Quando se fala de comércio exterior, uma via não exclui a outra; acordos bilaterais ou acordos regionais não excluem, evidentemente, a participação em organismos internacionais como a OMC. Eu acho que tudo é complementar, e um país como o Brasil, que é um ator internacional, tem que estar presente em todas essas discussões.
Espero ter, de alguma forma, coberto as principais preocupações com relação à questão do comércio, à questão da TPP e às questões associadas que vieram com relação ao Mercosul.
Com relação ao segundo tema do convite, que dizia respeito à Comissão da Unasul para acompanhar as eleições na Venezuela, eu queria dizer que o Brasil tem participado desde o início da Unasul, e antes, nos outros mecanismos, em todas as possibilidades, em todos os fóruns de concertação política para tentar transmitir sua visão, sua participação nas questões regionais; a visão, a forma com que vemos e podemos transmitir a nossa contribuição para a solução pacífica de controvérsias, para a solução de conflitos entre Estados ou internamente.
Nesse sentido, a Unasul criou em 2014, no início de 2014, uma comissão de chanceleres. Eu não participei, foi o meu antecessor e amigo, o Embaixador Luiz Alberto Figueiredo Machado, que participou desde 2014 ao lado dos chanceleres do Equador e da Colômbia, país que é muito importante na relação com a Venezuela.
A Colômbia é o maior parceiro comercial da Venezuela e vice-versa, a Venezuela é o maior parceiro comercial da Colômbia. São países que dividem uma fronteira comum de 2.200, 2.300 quilômetros, e há uma grande parcela das populações de um país vivendo no outro, há mais ou menos, 5 milhões, ou mais, de colombianos vivendo na Venezuela. Portanto, são relações muito próximas e há uma grande relação entre esses países.
Os três ministros participaram de uma série de reuniões e foi criada essa comissão com o objetivo, a pedido do Governo da Venezuela, inclusive, de se promover e estabelecer um diálogo entre o governo e a oposição na Venezuela. Isso em um momento de acirramento de uma crise política e social na Venezuela, com enfrentamentos na rua que deram razão, que deram causa a várias prisões de manifestantes, políticos, de estudantes e sociedade em geral. Houve muitas prisões, mas essa comissão foi criada com o consentimento, e mais do que isso, até com um pedido do governo venezuelano para estabelecer um diálogo, porque esse diálogo estava suspenso, estava cortado, e não havia possibilidade de o menor entendimento.
Eu acho que nesse primeiro momento, vamos dizer, até o final do ano passado, esta comissão desempenhou muito bem este mandato, promoveu esse entendimento e os conflitos, os enfrentamentos nas ruas cessaram, pararam. Tinha havido também...
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Desculpe-me, mas que diálogo, eu não vejo nenhum resultado de nenhum diálogo. A repressão só se acentuou, as pessoas foram banidas do processo eleitoral; essa é a interrogação que faço.
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Mas houve, e eu agradeço o seu comentário, Sr. Presidente, mas o objetivo e o mandato era evitar os conflitos de rua, que provocaram mortes e saques, que acabassem. E isso ocorreu. E, mais do que isso, a oposição se reuniu por várias ocasiões, eu não sei dizer com precisão, posso ver depois, eu não participei porque isso foi em 2014, mas houve uma série de missões, como a comissão dos três chanceleres. Algumas que estavam previstas para durar 24, 48 horas se esticaram por quase toda uma semana porque foi estabelecido um verdadeiro diálogo. Foi estabelecido um diálogo com o governo. Eu ouvi e vi relatos sobre essas reuniões em que se sentava o governo de um lado, a mesa de unidade democrática da oposição do outro lado e o debate era dirigido pelos ministros dos três países.
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Eu acho que o resultado disso foi, primeiro, que cessaram os enfrentamentos na rua; foi possível parar e evitar que se continuasse em um movimento trágico em que houve mortes, não sei quantas, mas houve algumas mortes. Depois, eu acho que a oposição reconheceu que a solução para o conflito, para o estado atual da vida política e social da Venezuela, passaria, necessariamente, pelas eleições legislativas que ocorrerão agora no mês de dezembro. Isso foi, vamos dizer, o primeiro período, o primeiro momento dessa comissão. A partir do início deste ano houve uma convocação, mais de uma, eu participei, eu fui duas ou três vezes a Venezuela, fui uma vez a Quito e fui uma vez a Montevidéu participando com os meus colegas da Colômbia e do Equador, e algumas dessas reuniões eram só com o governo, outras com o governo e a oposição, outras encontros só com a oposição, mas tivemos.
Uma coisa muito importante é levar em conta que o Vaticano teve um papel muito importante. Inclusive, grande parte desses diálogos foram promovidos na sede da Nunciatura Apostólica em Caracas, um território neutro em que todos se sentiram seguros e, portanto, aptos a expressar suas posições. Eu participei de uma dessas reuniões na Nunciatura e ouvi claramente de todos os líderes da oposição... Dos 12, acho que são 12 partidos que integram a mesa de unidade democrática, dez deles estavam presentes, e, dentre eles, dentre as lideranças presentes, o Governador Henrique Capriles é, sem dúvida nenhuma, a maior a liderança. Ele alcançou quase 49% dos votos nas últimas eleições presidenciais, foi uma vitória do governo de 2,5%, 3%, e ele é, eu acho, uma importante liderança, uma voz, portanto, autorizada. Ele, claramente, em público, manifestou o agradecimento pela participação dos países da Unasul, especialmente dos três países que formavam essa comissão. Agradeceu muito e disse que via nisso um apoio à institucionalização política na Venezuela, que agradecia essa participação e que não havia solução possível que não fosse pelas urnas. Eu acho que foi uma manifestação importante.
Nesse sentido, continuamos as conversas, os entendimentos. As eleições foram, como os senhores sabem, marcadas para dezembro próximo. Na Venezuela, o Conselho Nacional Eleitoral é um poder independente e que, segundo a legislação, fixa, inclusive, a data, não há uma data constitucional fixa. E, dentro do que estabelece a lei, não conheço os detalhes, mas teria que ser até fim de janeiro, a realização das eleições foi marcada para o mês de dezembro.
O Conselho Nacional Eleitoral formulou os convites para as missões de acompanhamento da Unasul e também houve convites a representantes do Mercosul, da Celac, para a participação do Parlasul e do Parlatino, todos eles feitos pelo Conselho Nacional eleitoral. Houve também um convite dirigido ao Ceela, com c, que é o Conselho de Especialistas Eleitorais da América Latina e convites a alguns países específicos, como, por exemplo, Índia, Coreia do Sul, Filipinas. Eu acho que isso deu uma participação, um acompanhamento, uma dimensão plural e multinacional.
O Brasil, depois de marcada a data das eleições, o Governo brasileiro participou das negociações que eram indispensáveis de um convênio entre a Unasul, como bloco, e o governo venezuelano. Esse convênio, esse memorando de entendimento estabelecia as bases para que se pudesse realizar, que sustentasse a realização dessa comissão. Isso foi uma negociação, que não foi rapidíssima, mas que demorou o tempo que, evidentemente, era necessário levar.
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Essa negociação, que contou amplamente com uma grande discussão, foi feita no âmbito do Conselho Eleitoral da Unasul. Os órgãos eleitorais de cada país participaram e puderam expressar suas opiniões. Chegou-se agora, nos primeiros dias de novembro, se não me equivoco, à conclusão desse acordo, desse convênio.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Ministro...
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Sim.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - O principal órgão eleitoral do Brasil é o Tribunal Superior Eleitoral. O Tribunal Superior Eleitoral disse claramente pelo seu presidente que, dada a protelação de uma resposta da comissão eleitoral venezuelana sobre as condições de realização dessa missão de observação, dado o fato de que, àquela altura, quando veio a resposta, uma boa parte do processo preparatório das eleições já tinha sido concluído, especialmente a preparação das urnas eletrônicas, etc., o principal órgão eleitoral da América do Sul, que é o TSE, disse: isto não vai dar certo.
Como é que o Governo brasileiro continua apegado a essa fantasia? Perdoe-me, eu nem sei se essa Comissão da Unasul já começou a trabalhar, nem sei se já chegou lá, talvez tenha chegado esses dias, mas isso é uma fantasia. Nós corremos o risco, Ministro, de legitimar uma farsa, uma farsa, esse é o meu receio.
Eu não vejo também... Veja, a minha preocupação é com a escalada verbal deste presidente da Venezuela, esse Sr. Maduro, que diz as maiores barbaridades, as ameaças mais truculentas contra a oposição, inclusive ameaçando mobilizar o Exército, as Forças Armadas se, porventura, vier a perder, sem que o Governo brasileiro diga nada. Pode ser que diga em recinto fechado, mas nada que tenha relevância pública à altura do peso brasileiro, da tradição brasileira, cuja diplomacia sempre primou por combinar o realismo com o ideal, com inspiração, com valores; essa é a minha angústia.
Eu estou vendo as coisas caminhando no sentido, eu receio muito, de que aquilo não vá se concluir, não tenha uma boa solução. Em uma eleição em que dirigentes, líderes políticos estão presos, não têm condição de usar os meios de comunicação, o que eu esperaria, o que eu espero é que o Governo brasileiro tenha uma palavra, uma palavra pública.
Eu me referi a isso na abertura, a Srª Lilian Tintori implorou por ter um audiência em um nível elevado, e foi recusado a ela. O senhor recebeu um pessoa que, se não me engano, é defensor del pueblo, ou coisa que o valha, e que é um homem do governo, no mesmo momento em que o senhor negou a audiência solicitada pela senhora Lilian Tintori.
Então, eu vejo sinceramente, Ministro - eu tenho obrigação de lhe dizer isso porque eu estou expressando o ponto de vista não só do meu Partido não, mas o de uma ampla maioria de Senadores -, a posição do Governo brasileiro muito aquém daquilo que nós teríamos o dever de fazer para expressar um mínimo de solidariedade com os democratas venezuelanos.
Este Governo é presidido por uma pessoa que foi vítima da ditadura. Nós tivemos presidentes, Fernando Henrique Cardoso, Lula e agora Dilma Rousseff, que foram pessoas que se opuseram ao regime ditatorial, e, de repente, agora, quando o povo venezuelano, que acolheu muitos exilados brasileiros, pede o socorro, a voz do Brasil, o que se ouve é um ensurdecedor silêncio.
V. Exª me perdoe, Ministro, eu tenho uma enorme admiração pelo senhor, gosto do senhor pessoalmente, agora essa é uma indignação que eu não posso calar, porque eu estou vendo que nós estamos chegando perto das eleições, até agora houve protelação e o nome Jobim foi barrado pela Venezuela. Diga-se o que se queira dizer, mas basta conversar com o Ministro Jobim e ele dirá exatamente o que eu estou dizendo, o nome dele foi vetado pelo governo venezuelano, com a cumplicidade da Unasul e do Presidente da Unasul, esse Sr. Samper, que veio aqui para dar palpite na política brasileira e, em boa hora, eu neguei, eu desmarquei uma audiência com ele.
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Então, desculpe-me, mas não poderia deixar de expressar esse ponto de vista com a indignação de que sou tomado todas as vezes em que o assunto vem à baila.
Obrigado.
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Pois não.
Agradeço os comentários de V. Exª e queria apenas explicar que a comissão de acompanhamento das eleições teve uma negociação com indas e vindas. Inclusive foi aceito por todos os países e pela Venezuela o convênio final, que foi aprovado pelo TSE. O Tribunal Superior Eleitoral do Brasil aprovou por escrito. O Tribunal era o órgão que representava o Governo brasileiro no Conselho Eleitoral da Unasul. Todas as consultas recebidas pela Presidência Pro Tempore do Uruguai eram passadas para o TSE, que aprovou o convênio tal como está, com uma declaração, com uma fórmula declaratória no final, em que fazia referência aos preceitos democráticos das cartas democráticas, dos compromissos nas Nações Unidas e na OEA. Declaração essa que foi aceita pela Venezuela e pelas outras partes, inclusive incorporada no voto final de outros países que aceitaram, com declarações muito semelhantes.
A comissão já foi constituída. Há um comando político, há um representante da Unasul e há um coordenador técnico. O comando político é do ex-Presidente Leonel Fernández, que já instaurou a comissão. A comissão está em Caracas, começando a trabalhar a parte técnica, através do responsável técnico, verificando documentos, enfim, todo o processo. A comissão voltará nos próximos dias, até a realização das eleições. O Tribunal Superior Eleitoral decidiu não participar das negociações. Contávamos que pudesse haver técnicos ou algum representante do Tribunal, mas a decisão foi de não participar, e foi assim transmitida à Presidência pro tempore da Unasul.
Com relação ao veto, eu gostaria de dizer que, até onde chega o meu conhecimento - e conversei com o Ministro Jobim sobre esse aspecto -, não houve o veto. O veto foi negado pela Unasul. Foi negado. Eu perguntei especificamente à Unasul, às autoridades venezuelanas inclusive e a outros países-membros por que não estávamos ainda no momento de discutir quem teria a direção política. Havia outros nomes. O nome do Ministro Jobim tem toda a qualificação como ex-Ministro de duas partes importantes.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Ele inclusive chegou a Presidente.
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Exatamente. Ex-Presidente do TSE e do STJ, Ministro da Justiça, Ministro da Defesa, amigo pessoal de todos nós, do senhor e meu também. Não há dúvidas sobre a capacidade e todos os títulos que tem.
Eu recebi a indicação do nome dele do TSE e submeti à aprovação da Presidenta, que aprovou. Nessa condição, foi transmitido o nome à Presidência pro tempore da Unasul. Outros países submeteram nomes também. Quando nós fomos chamados a oferecer um nome, não era um convite para indicar o representante político. Era para oferecer nomes que seriam objeto de consulta entre todas as partes, não só entre os demais países da Unasul, que compunham, que assinavam o convênio, mas também da própria Venezuela, que tem, pelos estatutos do conselho eleitoral, o direito de se manifestar.
Eu não sei como surgiu, de que forma, se foi um rumor ou o que foi, mas ainda não estávamos no ponto de discussão dos nomes, isso eu posso lhe garantir. Havia outros quatro nomes pelo menos, de outros países. Terminada a negociação do convênio, passou-se ao ponto das consultas. Nesse momento, o Ministro Jobim, diante de toda a polêmica gerada, já havia dito que retirava o nome dele, que não queria mais participar, o que é mais do que compreensível, já que se trata de uma pessoa com tantos títulos. Ele não queria que seu nome continuasse no meio de uma discussão.
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Eu apurei os dados que estou transmitindo aqui ao senhor e aos Srs. Senadores com todas as fontes, não apenas com a Unasul, mas diretamente com o governo da Venezuela e com outros países-membros da Unasul.
Com relação à posição do Brasil, por tudo que eu disse até agora, o Brasil acompanha e participa de todos os esforços no sentido de promover o diálogo e o entendimento. Para o Brasil, a Venezuela também é um país muito importante, um importante parceiro, com quem tem uma fronteira enorme numa região importante e frágil. Enfim, não preciso perder tempo aqui falando sobre esses aspectos. A falta de uma atitude pública não quer dizer que não haja uma diplomacia reservada ou silenciosa. Eu mesmo já tive a ocasião de, em contato com autoridades da Venezuela, expressar o desejo de que as eleições ocorram num clima de paz, de tranquilidade, que haja transparência, que haja liberdade para que todos exerçam o direito do voto. Isso jamais deixou de ser dito e defendido. Mas também penso que não podemos julgar aprioristicamente. Estamos empenhados, com muita energia e a boa vontade, para promover o entendimento.
Temos que esperar o resultado das eleições. Foram muitas até hoje. Não é a primeira vez em que há uma missão de acompanhamento da Unasul. Já houve três pelo menos, e já houve muitíssimas...
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Inclusive no tempo do Chávez. O Centro Carter estava presente lá.
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Exatamente. Foi a OEA, o Centro Carter e vários outros. Eu mencionei agora os que foram convidados atualmente, que considero um conjunto também representativo e plural. Não se pode dizer que foram convidados só os que estão ideologicamente próximos do governo.
A Venezuela tem passado por uma quantidade enorme de eleições. Eles inclusive têm um instituto que é muito peculiar: o referendo revogatório - não sei se existe algum outro país que tem isso -, uma espécie de plebiscito em que pode ser revogado o mandato do chefe de Estado no curso de seu mandato. Eles já passaram por todas essas eleições, como V. Exª fez referência, se não me engano, com a participação da OEA e do Centro Carter no referendo revogatório. Todos foram unânimes em dizer que as eleições foram lisas e transparentes e todos tiveram o direito de voluntariamente votar. Não houve dúvidas. Eu acho que o Centro Carter leva o nome de uma pessoa que está acima de qualquer suspeita: o Presidente Carter.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Que saiu por falta de condições de permanecer lá.
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Sim, mas neste momento não está presente porque, segundo informações do Centro Carter, não ouvi os dois lados, não sei, não havia diálogo e porque eles estavam, por questões orçamentárias, reduzindo a participação, não ficariam lá presentes permanentemente e não estavam com nenhuma atividade acertada para os próximos meses.
Eu acho que é muito importante...
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Esta é a última interrupção que eu vou fazer sobre este tema.
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Por favor, Senador. Faça todas que precisar.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - É o seguinte: eu registro com enorme preocupação, Ministro, as declarações, a escalada verbal do Presidente Maduro. O que eu tenho lido na imprensa são ameaças de uma truculência inaudita, que por si só já configuram uma interferência na liberdade do voto.
O Presidente da República, conhecido pela musculatura, digamos, com que atua, inclusive com forças paramilitares, dirige ameaças à oposição. Ele disse mais de uma vez que é a revolução, ou o que ele chama de revolução de um país que está se acabando, de um país que vai ter este ano uma queda no PIB de 10% e uma inflação de 200%, mas que, enfim, ele chama de revolução, e ela não se deterá diante do resultado das eleições. E ameaça inclusive recorrer à violência.
Esse é um dado que está colocado publicamente, Ministro. E eu esperaria ter do Governo brasileiro alguma manifestação sobre essa questão, porque me parece uma questão grave. Já é uma interferência, já é uma agressão à liberdade de expressão quando um presidente se dirige ao seu povo nesses termos, e é a ameaça de algo que poderá redundar em um banho de sangue.
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Por isso é que eu insisto, e não voltarei mais ao assunto, que considero essencial uma manifestação do Governo brasileiro a fim de prevenir o eventual agravamento da situação em razão do resultado das eleições.
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Agradeço os comentários de V. Exª, mas acredito que, estando agora a comissão em funcionamento - e os termos do convênio dão total liberdade aos membros da missão para fazer contatos, expressar posições e emitir juízos no final e relatórios sobre a forma como foram executados - isso é uma garantia. Nunca houve duvidas, nem mesmo por parte da oposição, de que as eleições eram um instrumento indispensável, e eles acreditavam, queriam, pediam a participação da Unasul no acompanhamento.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - E nós saudamos a fixação da data das eleições.
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Esse foi um dado, sem dúvida nenhuma, importante. A constituição da missão foi muito importante. O Brasil depositou aí toda a sua energia e disposição, junto com outros países.
Temos que dizer que o Uruguai, que está na Presidência Pro Tempore, merece também todo o nosso apoio e estímulo, pois participou da difícil negociação a fim de chegar a um denominador comum, como chegamos, e da organização da missão.
Eu acho que com essa missão em função nós vamos ter uma avaliação no final. Temos que esperar, não podemos julgar aprioristicamente. Ouvi declarações do Presidente Maduro, conversei rapidamente com ele em Riad, há duas semanas, por ocasião da reunião de países da América do Sul e países árabes. Ele foi muito enfático na defesa das conquistas sociais do governo do Presidente Chávez e do dele. Disse que tinha que fazer essa defesa de forma muito presente e muito clara, que não podia admitir que houvesse retrocessos nessa área e que respeitaria todos os compromissos assumidos no convênio com a Unasul para a realização das eleições, como, aliás, já havia feito particularmente.
Eu insisto que o Governo brasileiro jamais se omitiu de expressar suas posições com relação a essa comissão ou a todos os outros eventos que envolveram eleições ou a vida política da Venezuela. Só não o faz mais de público por respeito também ao preceito constitucional de não interferência em assuntos domésticos aprioristicamente. Como eu disse anteriormente, a diplomacia pode ser discreta e silenciosa e se desdobrar em várias ações, algumas públicas, como foi a nossa participação na constituição da comissão, e outras reservadas, em que se passam mensagens, etc. Eu acho que temos que esperar, temos que ter confiança em que as instituições e os países que estão presentes garantirão que haja transparência nessas eleições.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Ministro, mais uma vez agradeço a sua presença. Eu expressei com alguma veemência, aliás com muita veemência, alguns pontos de vista, mas isso faz parte do meu estilo. Não veja nisso nenhum desapreço ao senhor ou ao Itamaraty, aos seus colegas, ao trabalho que desempenha. Eu já cheguei a registrar em plenário mudanças importantes na gestão do Itamaraty a partir da sua chegada como Ministro das Relações Exteriores, e em outros momentos a nossa Comissão fez coro a esse registro.
Mais uma vez agradeço a sua presença. Penso que agora só no ano que vem.
O SR. MAURO LUIZ IECKER VIEIRA - Muito obrigado. Eu agradeço a V. Exª, Sr. Presidente, o convite. Esta é a quarta ocasião em que aqui venho, como eu disse no princípio, e para mim é motivo de muita satisfação. Creio que é indispensável discutir política externa com esta Casa, com a Câmara, com a sociedade brasileira.
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Eu agradeço a forma cortês e amiga com que sempre fui tratado aqui nesta e nas três ocasiões anteriores, em que me submeti às sabatinas, preceito constitucional para ocupar postos no exterior.
Os comentários de V. Exª, assim como os da Senadora Ana Amélia e de todos os Senadores presentes enriquecem o debate. Eu agradeço muito a V. Exª não só pela organização, mas pela amizade de tantos anos, por esse grande acervo de amizade e de entendimento em tantos pontos.
Eu queria agradecer mais uma vez.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Aloysio Nunes Ferreira. Bloco Oposição/PSDB - SP) - Podemos encerrar, Senadora Ana Amélia?
Se V. Exª não fizer objeção, vamos dar por lida a Ata da reunião anterior e aprová-la. (Pausa.)
Está encerrada a presente reunião.
(Iniciada às 10 horas e 11 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 5 minutos.)