26/11/2015 - 40ª - Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - Bom dia a todas e a todos.
Sob a proteção de Deus, iniciamos nossos trabalhos.
Havendo número regimental, declaro aberta a 40ª Reunião, Extraordinária, da 1ª Legislatura Ordinária da 55ª Legislatura.
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A presente reunião destina-se à realização de audiência pública, para instruir a Proposta de Emenda à Constituição nº 102, de 2011, que altera dispositivos da Constituição Federal, para permitir à União e aos Estados a criação de polícia única e dá outras providências.
Conforme o Requerimento nº 34, de 2015-CCJ, de minha iniciativa, e o Requerimento nº 40, de 2015, de iniciativa de S. Exª, a Senadora Gleisi Hoffmann, esta reunião será realizada em caráter interativo, ou seja, com a possibilidade de participação popular.
Dessa forma, os cidadãos que queiram encaminhar comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania, no endereço www12.senado.gov.br/ecidadania/ ou ligando para o número 0800-612211.
Quero, antes de chamar os convidados, pedir desculpas pelo nosso atraso inicial. Além desta reunião da Comissão, nós estávamos tendo agora a leitura do relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o Carf. Era necessária lá a minha presença.
Dito isso, então, tenho enorme prazer de chamar os convidados que integrarão a Mesa desta audiência pública.
Meu caríssimo José Robalinho Cavalcanti, Presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, neste ato representado por meu caríssimo Alexandre Camanho de Assis, Procurador Regional da República e ex-Presidente da ANPR.
Sr. Pedro da Silva Cavalcante, Presidente da Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais, representado neste ato pelo Sr. Jesus Castro Caamano, Diretor Jurídico da Federação.
Sr. Jones Borges Leal, Presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais, representado aqui pelo Sr. Alexandre Cavalcanti Barreto Ferreira, Diretor de Relações de Trabalho da Federação.
Sr. Elisandro Lotin de Souza, Presidente da Associação Nacional dos Praças.
Sr. Sílvio Benedito Alves, Presidente do Conselho Nacional de Comandantes Gerais das Polícias Militares e Corpo de Bombeiros Militares, representado por Alessandri da Rocha Almeida, Assessor Parlamentar do Conselho.
Sr. Marlon Jorge Tesa, Presidente da Federação Nacional de Entidades Oficiais Militares Estaduais, representado pelo Sr. Elias Miler da Silva, Diretor de Assuntos Legislativos da Federação.
Seja bem-vindo.
Sr. Marcos Leôncio Sousa Ribeiro, Presidente da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal.
Sr. Carlos Eduardo Benito Jorge, Presidente da Associação de Delegados de Polícia do Brasil, representado pelo Sr. Wladimir Sérgio Reale, Vice-Presidente Jurídico da Associação e Presidente da Adepol do Rio de Janeiro.
Seja bem-vindo.
Sr. Janio Bosco Gandra, Presidente da Confederação Brasileira de Trabalhadores Policiais Civis.
Por favor, avance.
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Justificaram a ausência nesta audiência pública a Srª Norma Cavalcanti, Presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público, e o Sr. Luiz Eduardo Soares, doutor e especialista em segurança pública.
Bem, já com todos os convidados em seus lugares para estar audiência pública, apresento para os senhores os procedimentos com que transcorrerá esta audiência.
De acordo com o art. 94, §§2º e 3º, do Regimento Interno, esta Presidência adotará as seguintes normas: cada convidado fará a sua exposição e, em seguida, abriremos fase de interpelação para quem assim desejar; aos Srs. Senadores e Senadoras que aqui estiverem presentes será concedida a palavra na ordem de inscrição; os interpelantes disporão de prazo de três minutos, assegurado igual prazo para a resposta do interpelado, sendo vedado interpelar os membros da Comissão; nós concederemos o tempo inicial, com os acréscimos que se fizerem necessários, de dez minutos para melhor dinâmica desta audiência pública.
Dito isso e dando, de imediato, início à audiência, eu tenho a enorme satisfação de ouvir, meu caríssimo Alexandre Camanho de Assis, Procurador Regional da República, ex-Presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República. Dr. Camanho, esteja à vontade.
O SR. ALEXANDRE CAMANHO DE ASSIS - Obrigado.
Bom dia a todos, bom dia, Presidente. É uma honra estar aqui. Quero deixar claro que participo no papel de representante do Presidente atual da Associação Nacional de Procuradores da República, Dr. José Robalinho Cavalcanti, que não pôde vir. Reitero minha saudação a todos os participantes, colegas, amigos, Senador Randolfe.
O tema que me parece majoritário hoje, a ser dito, é a questão da unificação das polícias e outras providências que a emenda aborda. A questão em si da unificação é um tema que, para os Procuradores da República, não traz nenhum percalço e é visto com alguma vantagem, na medida apenas em que essa unificação é uma faculdade que se abre aos Estados, e não uma imposição.
Não me parece lícito desconhecer que uma imposição aos Estados de unificação dos estamentos militares e civis traria, quando menos, imediatamente, por força justamente dessa natureza impositiva e ab-rupta, uma série de dificuldades que hoje me parecem absolutamente incontornáveis. Não consigo ver como determinados Estados, como Minas, São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, pudessem, com facilidade e mesmo com proveito, unificar as suas polícias sem que isso não ocasionasse grandes percalços às instituições e, inclusive, aos cidadãos.
A nota que me parece, portanto, digna de relevo e que precisa ser dita na audiência pública em nome dos Procuradores da República é de que, constitucionalmente, a unificação pode ser bem-vinda se ela vier sob o signo que algo facultativo. Se for dado aos Estados ponderar sobre as vantagens e os procedimentos, ouvidos os estamentos de uma unificação, então, do ponto de vista constitucional, isso, quando menos, não parece ser algo que afronte a Constituição e que se limitaria apenas, enfim, ao advento de um novo modelo, que é comum a vários Estados, a vários países, assim como também mesmo países que hoje compõem o Olimpo dos países civilizados, têm polícias militares sem que isso desfigure a natureza de Estado democrático de direito.
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Parece-me bastante claro que é preciso conjurar a ideia de que polícias militares são resquícios ditatoriais e que são forças marcadas pela opacidade ou pela truculência. É preciso entender que a persistência das polícias militares no Brasil acarretou uma série de mudanças nos seus estamentos, e o que parece fundamental é que essas corporações, crescentemente, alberguem a ideia inafastável de que, sendo uma polícia militar, ela precisa ser uma polícia cidadã, uma polícia, portanto, majoritariamente vocacionada ao serviço do cidadão, à proteção da cidadania.
Com essa nota que me parece imprescindível e crescente no seio das polícias militares, não veem os Procuradores da República, evidentemente, qualquer mal, e não seriam os Procuradores da República a dizerem alguma coisa contrária a esse espírito crescente que nós vemos nas corporações militares.
Algumas coisas periféricas precisam ser ditas em relação à questão da unificação. A unificação, se ela vem, acarretaria um espírito de unicidade e, acima de tudo, determinados papéis que seriam atribuídos de forma universal a uma única polícia, que hoje nós já vemos como um reclamo também crescente e que me parece, Presidente, inexorável, que é a questão do ciclo completo.
Antes mesmo e mais premente, nós deveríamos ponderar sobre a utilidade, sobre o proveito e nós poderíamos fazer uma discussão sobre se seria, ao fim e ao cabo, vantajoso, que nós unificássemos, no âmbito dos Estados, Polícia Militar e Polícia Civil. Essa ponderação não me parece ser dada no âmbito do ciclo completo, porque nós estamos falando de alguma coisa a cuja renúncia, a cuja teimosia em adotar está fazendo com que o País tenha índices vergonhosos de apuração de crime e a adoção do ciclo completo traria uma possibilidade de maior eficácia.
A emenda, a proposta de emenda traz, se eu não me engano, a ideia de um Conselho Nacional de Polícia. Se nós estamos falando realmente desse texto, essa me parece, Sr. Presidente, uma ideia sem sentido. Conselhos nacionais, pensados no modelo europeu e adotados no Brasil já há dez anos, servem para um controle firme e social das chamadas magistraturas constitucionais. No Brasil, existem duas magistraturas constitucionais: o Judiciário e o Ministério Público. As outras instituições não são magistraturas constitucionais, e não haveria por que essa necessidade grandiloquente de nós entregarmos um conselho nacional para a Polícia.
O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - Dr. Camanho, desculpe a interrupção, só para registrar a presença aqui do Presidente da nossa Comissão de Constituição e Justiça, o Senador Maranhão, que nos dá a satisfação de estar acompanhando e prestigiando esta audiência pública.
Dr. Camanho, pode continuar.
O SR. ALEXANDRE CAMANHO DE ASSIS - Agradeço, Presidente.
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É preciso entender, no passado recente, nós vimos a necessidade, o Brasil discutiu determinados temas, sobre possibilidades constitucionais, e, lá pelas tantas, era frequente se dizer, perguntar-se se isso não era um embate de carreira. Não há a mínima possibilidade de colocarmos no mesmo pé, no mesmo estamento, uma magistratura constitucional, que é o Ministério Público, uma instituição cuja carreira é uma magistratura constitucional, e um segmento do Poder Executivo, que é a segurança pública, e, necessariamente, portanto, a polícia. Isso não tem como acontecer, porque é próprio dos Estados democráticos de direito que quem quer que capitaneie o Poder Executivo, seja federal, seja estadual, ofereça à população uma plataforma de segurança pública, e essa plataforma de segurança pública...
(Soa a campainha.)
O SR. ALEXANDRE CAMANHO DE ASSIS - ...precisa ser chancelada pela população. É o governante quem vai dizer: "Eu quero a segurança pública em tal e qual formato", motivo porque não haveria jamais a possibilidade de ascendermos a polícia a um correlato de magistratura. Não há país no mundo, democrático de direito, pelo menos, que tenha uma magistratura armada.
De forma que vai bem o segmento constitucional quando se entrega o controle da polícia a uma magistratura constitucional, que é o Ministério Público. E entrega não pela circunstância, evidentemente, de ser uma magistratura constitucional, mas pelo fato inarredável de que o Ministério Público é o titular da ação penal e que precisa fazer também, majoritariamente, o controle da qualidade da prova e da impecabilidade desse estamento que produz a prova.
Em relação, portanto, ao Conselho Nacional de Polícia, Sr. Presidente, os membros do Ministério Público são, evidentemente, veementemente contra. Não por conta de argumentos de confrontação ou tentativas de equiparação, mas apenas pelo fato de não verem o mínimo sentido em se criar um Conselho Nacional para fazer o controle de um setor do Poder Executivo.
O Ministério Público Federal, junto com um gabinete de segurança pública, tem proposto o ingresso único na carreira. Ao invés de perpetuarmos determinadas condições, determinadas situações, determinadas circunstâncias, que têm se provado absolutamente contraproducentes, o Ministério Público, junto com várias instituições policiais, tem proposto um novo modelo de segurança pública, que fale de ciclo completo, que fale de ingresso único na carreira. Temos proposto isso porque entendemos que a investigação não pode continuar sendo como é hoje em dia, um simulacro de processo, com mil burocracias, com mil reverências, enfim, com mil terminologias que privilegiam o jurídico e que menosprezam aquilo que deveria ser essencial, que é a apuração do fato criminoso. Os senhores entenderão.
Sempre me parece, Sr. Presidente, pernicioso o apelo à experiência, mas o Sr. Presidente me fará uma concessão. Sou membro do Ministério Público, sou Procurador da República há vinte e dois anos. Eu sei bem dizer o que era abrir prorrogação de prazo e ver inquéritos fazendo um pequeno calvário de delegacia para delegacia, com uma série de enfeites documentais, sem que muitas vezes uma única providência se tome.
Não é o momento de aqui se fazer um libelo contra isso, contra aquilo.
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O que nós firmemente temos buscado é a adoção de um modelo que supere algo que não nos é dado desconhecer, que é a absoluta ineficiência de determinadas dinâmicas que se comprovaram obsoletas, arcaicas. Elas se comprovaram, elas se provaram...
(Soa a campainha.)
O SR. ALEXANDRE CAMANHO DE ASSIS - ...aliadas da impunidade, quando não de coisas piores.
Ao invés de privilegiarmos determinadas carreiras e colocarmos em nível de Constituição, porque quem capitaneia uma investigação precisa ser um Bacharel em Direito, o que o Ministério Público, junto com várias outras instituições, tem pedido é que renunciemos, no Brasil, a esse modelo e que adotemos um modelo de eficácia, em que o investigador, em que a polícia terá um único cargo, como aqui mesmo no Brasil já temos, e que a investigação será feita por quadros que privilegiem a técnica, o conhecimento, a experiência e, acima de tudo, a necessidade inevitável, a necessidade incontornável de o Sistema de Segurança Pública ser mais eficiente na prevenção e na repressão do crime.
Eu penso ter dito o essencial, Sr. Presidente. Agradeço por ter aberto este espaço aos Procuradores da República. Com isso, mais uma vez, agradecendo a atenção de todos, termino o meu pronunciamento.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - Dr. Alexandre Camanho, nós que agradecemos a presença da ANPR, representada por V. Exª nesta audiência pública, e a contribuição que traz.
Ato contínuo, passo a palavra ao Sr. Jesus Castro Caamano, Diretor Jurídico da Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais.
O SR. JESUS CASTRO CAAMANO - Bom dia, Sr. Presidente.
Eu gostaria de saudar toda a Mesa, todas as autoridades presentes, todas as entidades representativas de classe, de categorias aqui presentes. Eu gostaria de dizer também, afirmar que aqui venho representar a Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais, cujo Presidente é o Sr. Pedro Cavalcanti.
Com relação a essa unificação das polícias, parece-me que tem um fim, um caráter, associa-se à desmilitarização, porque, necessariamente, vai-se unificar. Quando se fala em polícia, naturalmente, cai-se naquela divisão entre Polícia Civil e Polícia Militar. Então, necessariamente, vai ter de se fundir para um tipo apenas. Naturalmente, parece-me que tem vínculo, tem uma relação direta com a desmilitarização.
Nesses debates que têm sido feitos Brasil afora, também pela Câmara, a gente pôde verificar o que o Dr. Alexandre Camanho - e eu tinha uma curiosidade grande em conhecê-lo pessoalmente. É um prazer conhecê-lo! - bem disse, traz-nos sempre, nessas discussões, um resquício muito grande da Ditadura Militar, que não foi só militar, como bem sabemos.
Eu posso dizer que ingressei nas Forças Armadas como fuzileiro naval em 1988 e não vi esse resquício da Ditadura Militar. Permaneci lá por dezessete anos. Cheguei a fazer a carreira de praça, cheguei a suboficial, e não vi esse resquício, não havia esse resquício. Evoluiu, sim, em várias facetas, mas eu não vi esse resquício. Da mesma forma, conversando com os colegas das Polícias Militares, a gente verifica também que isso já não existe na Polícia Militar há muitos anos. Então, não é um argumento que se sustenta.
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Não tem como hoje traçar esse paralelo da Polícia Militar como se fosse uma polícia autoritária. Peço até licença para tratar desse tema, mas é um tema que impacta a todos, como operadores da segurança pública. A PM é uma grande parcela deles, uma parcela importante. Se não me engano, salvo melhor juízo, são 430 mil profissionais em todo o País. Então, isso nos impacta diretamente.
Acho que a proposta aqui, Presidente, é justamente termos um debate amplo. Então, peço até licença dos colegas da Polícia Militar para falar nesse sentido. Diversos países, no mundo, convivem bem com polícias civis e militares, cada uma no seu mister e principalmente com o ciclo completo. E esse é um ponto importante. Está apensada também a PEC 102 à 51, que é bem abrangente nesse sentido, tratando de remuneração, como trata a 102, como também do ciclo completo, de carreira única.
Então, há um primeiro passo, antes de se falar em unificação. Nós vivemos um momento emergencial no Brasil. Foram 58,5 mil homicídios no ano de 2014. É um modelo que precisa urgentemente ser mudado. Não há mais tempo para desdobrarmos isso em debates e mais debates. Nós precisamos disso. Há um consenso, pelo que já levantamos com todas as entidades, com a grande maioria, pelo ciclo completo. É uma mudança necessária. Os modelos mais eficientes do mundo, como o Chile, aqui, ao nosso lado, tem o ciclo completo de polícia. É um modelo eficiente. Precisamos largar de vez... Na segurança pública não temos mais tempo para tratar do modelo burocrático, patrimonialista, com interesses classistas. Nós não temos mais tempo para isso. O sangue da sociedade e a sociedade somos nós. Nós vemos nossos vizinhos, vemos nossos parentes, vemos nossos colegas tombarem.
Há um tempo, eu estava fazendo uma conta, a que chegamos mais ou menos, porque os dados oficiais são muitos difíceis nesse sentido, mas cheguei a uma conta, outro dia, de 552 mil policiais, de operadores da segurança pública, juntando todas as polícias civis, militares e Federal. E o número que nós temos são 490 homicídios de policiais no Brasil, em 2013, com uma taxa de 88 por 100 mil mortes de policiais no País. Isso é um absurdo! Vinte e oito por 100 mil é a da população como um todo, o que já é um absurdo. Acima de 10, para a ONU, já é endêmico.
Então, nós vivemos um momento extremo, terrível no País. O sangue corre pelas calçadas. O sangue lava as nossas ruas. Nós precisamos sair desse momento dos debates e mais debates, de se prolongar e de se falar em unificação, o que vai levar dez, quinze, vinte anos, para que possamos cessar um pouco desse sangue. É o nosso sangue.
Ciclo completo é necessário. Carreira única - e também pegando um gancho na fala do Dr. Alexandre Camanho - e a experiência. A experiência não deve ser entendida como tempo de serviço. Não é isso. Tempo de serviço lembra aquela máxima - e aí, sim, do período da ditadura, em 1980, para trás ainda - que dizia que antiguidade é posto. Não é isso. A nossa Constituição hoje não tem espaço para isso. A máxima é a eficiência, é a meritocracia.
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Então, a experiência deve se traduzir por aquela experiência necessária no cargo, nos ossos do ofício, no dia a dia, da experiência de como se opera uma investigação, qual é o modus operandi das diversas modalidades de quadrilhas, de crimes. Isso é uma expertise que não se aprende em livros, uma parte talvez, mas a grande maioria se aprende no dia a dia, no trabalho, na labuta, no suor.
A liderança é muito importante. Como militar, como ex-militar, eu posso dizer bem, eu posso dizer que sempre aquele mais antigo, o mais graduado e que tinha uma conduta que condizia também, não tinha só tempo de serviço, mas experiência, enfim, isso era reconhecido por todos, se transformava em um exemplo a ser seguido, era um verdadeiro líder. Então, essa liderança também está ligada ao ingresso único à carreira única. Não é só carreira única e dividido em vários cargos. O cargo de policial com ciclo completo necessita de uma entrada única, uma carreira única.
Por fim, Presidente, gostaria de abordar a experiência da PRF como polícia de ciclo completo nos crimes de menor potencial ofensivo, na lavratura de TCO, a qual fazemos em 19 Estados e cuja eficiência é inegável. Há uma dinâmica no dia a dia, principalmente trabalhando com o trânsito, acidentes de trânsito, lesões corporais. É muito simplificada a lavratura do TCO. Em geral, o indivíduo, o cidadão envolvido naquele ilícito, naquele acidente de trânsito já sai com a data da audiência.
Santa Catarina... Eu estava conversando agora com nosso amigo Elisandro Lotin, Presidente da Anaspra, e ele estava nos falando algo que já é notório, porque a própria mídia tem transmitido bastante, ou seja, a evolução que a PM de Santa Catarina tem feito na lavratura de TCOs. Eu acho que é um passo necessário, a eficiência... nós temos histórias verdadeiras de um flagrante, por exemplo, no Rio de Janeiro, com 28 horas. Um caminhão roubado carregado de drogas. A droga é da Polícia Judiciária da União. Mas o caminhão roubado não, é da Polícia Civil. Então, vai para lá e vem para cá e 28 horas se passaram e uma equipe ficou fora do seu trecho de atuação. Naquele período como fica guarnecido aquele trecho de rodovia? Como fica guarnecido? Como fica a população? Desde um auxílio ao usuário, que é atribuição da Polícia Rodoviária Federal, até coibir uma atuação criminosa. Como fica então? Então, precisamos dar esse passo necessário.
O primeiro passo é o ciclo completo. Acho que não tem que se falar em unificação neste momento, até porque temos exemplos do mundo e não precisamos viajar in loco para ver o que acontece no outro país. Nós sabemos. Hoje a informação é o que nós temos. Então, sabemos que diversos países trabalham com polícias militares, polícias civis e nós precisamos avançar: ciclo completo e carreira única.
Eu acho que essa é a nossa máxima. Essa é a minha contribuição. Gostaria de agradecer a oportunidade e que Deus nos abençoe a todos e ao País. Que possamos romper e fazer essa mudança necessária.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - Sr. Jesus Castro Caamano, quero agradecer a sua exposição em nome da Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais.
Faço questão de registrar e agradecer a presença dos Deputado Federal Major Olímpio, Deputado Federal pelo Estado de São Paulo.
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Esteja à vontade e seja bem-vindo. No momento que quiser, a palavra estará facultada para questionamento aos presentes.
Passo então, em seguida, ao Sr. Alexandre Cavalcanti Barretto Ferreira, Diretor de Relações do Trabalho da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), representando aqui o Sr. Jones Borges Leal, Presidente da Federação.
Dr. Alexandre, por favor.
O SR. ALEXANDRE CAVALCANTI BARRETTO FERREIRA - Bom dia. Quero cumprimentar o Senador Randolfe Rodrigues em nome de todos os presentes, Presidente da Mesa.
Discutir segurança pública nunca é fácil. Estamos participando de várias atividades e vemos a dificuldade que é tentar conseguir um consenso dentro de tantos interesses díspares que acontecem em todas as discussões.
Esta audiência pública, hoje, para tratar da unificação das polícias, principalmente das estaduais, hoje se trata das estaduais, parece um pano de fundo, na verdade, para o ciclo completo e a desmilitarização das polícias. O próprio texto do projeto torna irrelevante a unificação em si, a partir do momento em que ele deixa para os Estados a resolução, a aplicação verdadeira da unificação. Cada Estado vai resolver se aceita a unificação ou não.
Mas temos em mente em nossas lutas que existem outros temas que são muito mais importantes para se discutir, como já foi comentado aqui, por exemplo, o próprio fim do inquérito policial. Há mais de 30 anos, o Senador, à época Deputado Federal, Pedro Simon já discursava em plenário pelo fim do inquérito. Então, isso não é uma discussão nova, mas uma coisa que estamos tentando há muito tempo atacar, qual seja, a questão dessa burocratização da atividade policial, essa ineficiência, essa lentidão da investigação e essa centralização que hoje é feita de todos os procedimentos investigativos. Então, é uma pauta que temos que trazer para discussão também, como a carreira única nas polícias, a importância de se ter um policial completo e não só uma polícia de ciclo completo, mas um policial que se sinta verdadeiramente policial.
A desmilitarização também é um tema interessante para se discutir e para que possamos avançar. Mas não a desmilitarização no sentido da não uniformização de polícia, porque a toda a polícia completa tem o seu lado uniformizado, tem o seu lado descaracterizado, mas sempre atendendo a todo momento da investigação e do pré-crime e do pós-crime.
Eu participei da audiência pública da Câmara dos Deputados, promovida pelo Deputado Raul Jungmann, em Pernambuco, e expliquei que o ciclo completo tinha um marco que era o crime e existia um vácuo dentro da falta do ciclo completo, que se chama os atos preparatórios para o crime, que nem a PM nem a Polícia Civil investigam. Quer dizer, hoje eles investigam um atravessando a competência do outro. Então, o ato preparatório não é teoricamente um crime, mas um ato, uma preparação para o crime. E como não aconteceu o crime, não é responsabilidade da Polícia Civil ainda, porque ela é uma polícia que trabalha no pós-crime. E a Polícia Militar está no pré-crime, mas de forma preventiva. Ela quer evitar o crime. Mas se não tem a configuração da aplicação do crime, eles não podem agir, têm que esperar, na verdade, o crime acontecer para encaminhar para Polícia Civil. Então, fica esse vácuo sem que se saiba para onde ir.
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Em relação à PEC 102, especificamente, eu elenquei aqui que essa PEC acerta em algumas coisas, mas no geral ela não traz nenhuma condição boa para a segurança pública. Ela acerta na tentativa de construção de um ciclo completo, evitando assim o retrabalho. Ela acerta também quando deixa para os Estados resolverem a unificação ou não, porque aí você entra na questão da peculiaridade de cada Estado, de cada um trabalhar de acordo com as suas condições. Mas ela se equivoca ao não permitir que os guardas municipais, por exemplo, tenham o ciclo completo. Então, volta-se ao problema que hoje já existe, que é o das PMs terem que levar para a Polícia Civil, que vai levar um problema para a Guarda Municipal.
A PEC se equivoca também quando mantém um modelo cartorizado de polícia, criando o cargo de Analista de Polícia da Área Cartorária. É um nome comprido, mas de pouca eficiência para a segurança pública. Nós temos que acabar com a cartorização das polícias no Brasil.
A PEC também mantém essa situação de dois meios policiais, porque ela tenta transformar os oficiais em delegados, e os outros praças, os agentes e os escrivães ficam no limbo. Não se sabe, pela PEC, o que é que vai ser feito desses servidores. Há os três cargos previstos, que são o cartorário, o operacional e o investigativo, mas fica em aberto, sem se saber o que é que vai acontecer.
Então, a gente acha que essa questão da valorização da carreira policial é muito importante, para que a gente tenha, efetivamente, uma melhora na qualidade do serviço prestado para a população, e para isso se passa realmente por um ciclo, por uma composição de uma polícia completa - não só de ciclo completo, mas de policial completo.
A PEC também faz uma breve passagem por um tema que é bem equivocado, pois eu acho que, no texto constitucional, você não precisa dar nenhuma orientação à polícia em relação à hierarquia e disciplina. Talvez seja uma forma maldosa de querer remeter à organização militar, mas hierarquia e disciplina existem em toda organização. Em toda organização, seja ela pública ou privada, existe hierarquia e disciplina. Você não precisa trazer isso para um texto de um projeto de lei, ou projeto de emenda constitucional, para determinar que uma organização tenha hierarquia e/ou disciplina.
E uma coisa boa que a PEC traz também é a garantia do direito, para a aposentadoria do policial, à paridade e integralidade com os ativos e pensionistas.
A Fenapef tem certeza de que a proposta que mais atende aos anseios não só da categoria, mas de toda a população, no geral, é a Proposta de Emenda Constitucional nº 51, de 2013, pois ela foi pensada de forma a atender a todos esses anseios das categorias de polícia, pois nela se prevê o ciclo completo, a desmilitarização e a carreira única, bem como atende a algumas demandas das guardas municipais. Então, ela tem esse grande diferencial, porque ela trata da carreira única, em que a gente poderá ter um policial de verdade, completo, do início ao fim da carreira policial, e não um policial pela metade.
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Nós estamos lutando na Fenapef pela prerrogativa de sermos policiais. Essas prerrogativas que são de outras categorias, de outras carreiras não são de nosso interesse. Nós temos interesses em que policial seja policial.
Eu encerro agradecendo a oportunidade, informando que o Presidente hoje não pôde comparecer, porque hoje a Federação encontra-se em processo eleitoral, e vários diretores são candidatos à reeleição. Eu vim representando aqui o Presidente, Jones Borges Leal.
Uma boa audiência para todos.
O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - Muito obrigado, Sr. Alexandre Cavalcanti, Diretor de Relações de Trabalho da Fenapef. Agradeço a Fenapef pela atenção a esta audiência.
Dr. Alexandre Camanho tem audiência no tribunal neste momento; justifica, então, a sua saída aqui. Foi uma honra para nós contar com sua presença, representando a ANPR nesta audiência pública.
O SR. ALEXANDRE CAMANHO DE ASSIS - Obrigado.
Bom dia a todos.
O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - Quero registrar aqui e agradecer a presença do meu caríssimo Senador Davi Alcolumbre, Senador da República também pelo meu Estado do Amapá, que prestigia esta audiência pública.
Registro também a presença da Srª Denise Brasil Menezes, Assessora Parlamentar da Associação Nacional de Entidades Representativas de Militares e Bombeiros.
Ato contínuo, passo a palavra, então, para o Sr. Elisandro Lotin de Souza, Presidente da Associação Nacional de Praças.
O SR. ELISANDRO LOTIN DE SOUZA - Obrigado, Sr. Presidente.
Quero, primeiro, agradecer o convite do Senado Federal, nossas congratulações ao Presidente, Randolfe Rodrigues, extensivo aos Senadores, aos representantes de classe das entidades de policiais e bombeiros militares e também de todos os policiais do Brasil.
Sr. Presidente, antes de falar especificamente sobre o objeto da audiência pública, eu queria fazer um registro da nossa decepção, do nosso repúdio ao veto de que tivemos conhecimento hoje da Presidente do Governo Federal ao Projeto de Lei de Anistia, que foi aprovado por este Senado, foi aprovado pela Câmara, que anistia todos os policiais e bombeiros militares do Brasil, eram 11 Estados, se não me falha a memória. Tivemos a informação hoje, pela manhã, de que a Presidente Dilma vetou o nosso projeto de lei.
Esse projeto de lei, que, enfim, passou por todas as comissões da Casa, anistiava policiais e bombeiros militares que lutavam por salário, por respeito, por dignidade, por condições de trabalho. A despeito de terem feito, nos seus Estados, debates com os governadores, com as autoridades políticas, com todas as autoridades, levando esta questão da necessidade de se respeitar o profissional de segurança pública, para que ele tenha condições de trabalho, para que ele tenha salário justo, para que ele tenha dignidade, lamentavelmente as autoridades políticas estaduais não compreenderam, o que acabou gerando manifestações e mobilizações que, por sua vez, redundaram em punições, inclusive prisões. Então, policiais e bombeiros militares estavam sendo presos, e foram presos, porque reivindicaram condições de trabalho, porque reivindicaram salário. Somos a única categoria subcidadã no Brasil. A nós não são dados os direitos garantidos na Constituição da República Federativa do Brasil. Policial e bombeiro militares ainda são subcidadãos.
O que mais me entristece, Sr. Presidente - e aí eu evito fazer um debate político-partidário, mas inevitavelmente eu tenho que fazê-lo numa situação dessas -, é que esse veto veio de um Governo Federal que, na sua gênese, ensinou aos trabalhadores do Brasil a se manifestar. Esse veto veio de um Governo Federal que nos ensinou a fazer mobilização, que, no passado, inclusive, incentivou mobilização. Especificamente no caso da Bahia, em 2001, o atual Ministro da Casa Civil ajudou na mobilização da Bahia que foi feita em 2001; em 2012, quando ele era o governador, ele repeliu o mesmo movimento que ele ajudou a fazer.
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O desrespeito para com os praças para com os praças da Polícia e do Bombeiro Militar, que são 75% dos trabalhadores da segurança pública, precisa acabar nesse País.
É preciso que nos tratem como profissionais, trabalhadores e cidadãos. Enquanto as autoridades não fizerem isso e, independentemente de questões político-partidárias, discutir qualquer tipo de mudança na segurança pública é utopia, porque, com todo respeito às outras categorias que estão aqui, quem está na ponta, lá na rua, atendendo à ocorrência todo dia, 24 horas por dia, é o cabo, é o soldado, é o sargento e é o subtenente. Quem tem que enfrentar a marginalidade de peito aberto, todos os dias, e tem que decidir pela sua vida e pela vida de um cidadão em três, quatro, segundos, é uma praça da Polícia ou do Bombeiro Militar. E, lamentavelmente, desde 1988, não se respeita a nossa categoria, aliás, se humilha e se utiliza dessa categoria, dos votos dessa categoria, para se eleger e, depois que se elege, simplesmente esquece, ignora inclusive legislações.
Portanto, qualquer mudança a ser discutida aqui, qualquer mudança a ser discutida na questão da segurança pública passa, inevitavelmente, pelo respeito ao praça da Polícia e do Bombeiro Militar, que, repito, são 75% dos trabalhadores da segurança pública. De nada adianta, e tenho a preocupação - entrando no debate agora, só para registrar o nosso repúdio ao veto -, termos inúmeras PECs, inúmeros projetos de lei, se continua se tratando um praça da Polícia e do Bombeiro Militar como um subcidadão, como um acéfalo. Nós que estamos na ponta, que temos que enfrentar de peito aberto a criminalidade, a marginalidade, sem nenhum demérito a outra categoria em absoluto, e quero crer que os senhores entendem o que estou falando.
Sr. Presidente, me preocupa muito uma lógica em que, quando querem mudar tudo, não se muda nada, me preocupa muito isso. Estava contando aqui só de PEC temos umas quatro, cinco; se falarmos em projetos de lei, deve ter mais um monte, não consigo nem mensurar o número. E me preocupa muito essa quantidade de debate feito quando, na prática, efetivamente, não encaminhamos absolutamente nada. Deve ser a décima audiência pública no último ano; se formos analisar nos últimos dez, doze anos, perdi a conta de quantos debates vim para tratar sobre segurança pública. Enquanto isso, enquanto debatemos, discutimos, cada qual defendendo o seu interesse - o que é um erro, porque é preciso crescer nisso também em todas as categorias, de pensar a segurança pública na ponta, para a sociedade, que é ela que nos paga -, temos 58 mil mortes; enquanto isso, há policiais e bombeiros sendo assassinados todos os dias - e, especificamente, permitam-me de novo, com todo respeito às outras categorias, mas tratando da minha -; no Rio de Janeiro, no Brasil todo, são 400, 500 mortes de policiais por ano. Não temos colete, o equipamento é velho, salário... Estamos discutindo todo um debate macro. Há lugar no Brasil em que o salário de soldado da PM é R$1 mil. Como vai discutir segurança pública, com qualquer tipo de mudança, se não discutir a base?
Não estou dizendo que não devam ser discutidas as outras coisas, é óbvio que têm, mas há prioridades. Há policial preso porque ousou questionar o comandante. É uma coisa absurda, por exemplo, o policial militar ser preso porque estava sem o chapéu na cabeça. Mas ele pega um cidadão, um traficante, com o dez, 15, 20 gramas de cocaína, responde um TC, dependendo, e o cara está solto; e o policial, preso, porque estava sem o boné na cabeça.
Como é que vai se falar em direitos humanos para a Polícia Militar, pelo amor de Deus? Que utopia é essa? Quando nem jornada de trabalho temos. Há policiais trabalhando 300, 400, horas por mês, e, se não trabalhar, se recusar, em preso em flagrante por desobediência, porque ainda estamos sob a égide do regime militar, respondendo ao Código Penal Militar, a regulamentos arcaicos da década de 60, 70, da época da ditadura, em que academias de polícia infelizmente ainda torturam fisicamente policiais militares na formação e tenho exemplos claros disso. Já mudou, está mudando, mas é muito lentamente ainda. Santa Catarina, que é um Estado que se falou que tem evoluído, mas ainda se perpetua isso.
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Então, a discussão do ciclo completo, da carreira única e de outras coisas é necessária, sim, faz parte, mas é preciso também discutir um pouco a base, e, se não houver respeito aos 75% dos trabalhadores de segurança pública do Brasil, policiais e bombeiros militares, é utopia qualquer outro tipo de coisa. E me perdoem, inclusive, o desabafo. Não esperava esse veto a essa legislação de anistia. Não esperava. Fui pego de surpresa, inclusive, até porque trabalhamos muito para isso, e a própria Presidente Dilma foi a pessoa que assinou a primeira Lei de Anistia, em 2010, contra alguns membros do Governo Federal.
Todas as PECs que estão aqui trazem situações de mudança pontuais na questão de segurança pública. Agora, há questões que são muito mais pragmáticas e necessárias para uma mudança efetiva.
A questão do ciclo completo que a Anaspra defende...
(Soa a campainha.)
O SR. ELISANDRO LOTIN DE SOUZA - ...perpassa necessariamente pela carreira única, perpassa necessariamente por jornada de trabalho. É inadmissível ter trabalhador de segurança pública, hoje, com 300, 400 horas por mês sem receber hora extra. Ela perpassa pela desvinculação do Exército para que tenhamos numa polícia cidadã efetiva e não só no nome, porque não adianta falar em polícia cidadã, se, lá na base, ainda existe tudo aquilo que eu falei.
Defendemos, sim, a carreira única; defendemos o ingresso único; defendemos a desvinculação das polícias militares de bombeiros e militares do Exército, e o ciclo completo. Mas defendemos também que se faça, junto a este debate, um debate para nós, hoje, mais necessário, mais urgente, que é o de respeitar o praça da Polícia e do Bombeiro Militar, como trabalhador, como cidadão, e como ser humano. Se nada for feito nessa questão, qualquer outro debate é utópico e ilógico, inclusive. Não adianta dizer para nós, policiais e bombeiros militares do Brasil: respeitem os direitos humanos, se ainda continuam humilhando e vilipendiando os trabalhadores em seus direitos mais básicos, que são garantidos a qualquer trabalhador do Brasil, como, por exemplo, jornada de trabalho e respeito a todos os outros direitos inerentes a qualquer trabalhador.
Agradeço, Sr. Presidente, pelo espaço e nos colocamos à disposição para o debate, que, com certeza, faremos de forma muito mais franca, muito mais aberta, criticando a quem for e elogiando quando necessário.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - Obrigado, Sr. Elisandro, representando aqui a Associação Nacional de Praças.
Tenho o prazer, ato seguinte, de passar a palavra para o Dr. Marcos Leôncio Sousa Ribeiro, Presidente da Associação dos Delegados da Polícia Federal.
Dr. Marcos Leôncio, fique à vontade.
O SR. MARCOS LEÔNCIO SOUSA RIBEIRO - Senador Randolfe, quero agradecer a oportunidade da Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal, também cumprimentar o Senador José Medeiros, os Senadores José Maranhão e Davi Alcolumbre, que também já estiveram aqui na audiência; o Deputado Major Olímpio, que nos prestigia com a sua presença, aqui, hoje, e colocar a posição dos delegados federais.
Basicamente, nós elegemos três PECs, aqui, como matrizes desta discussão: a PEC nº 102, de 2001, do Senador Blairo Maggi, foca a questão da unificação das polícias. É importante que se diga que, em vários países que compõem o Olimpo, como dito pelo nosso amigo, Dr. Camanho, também têm essas polícias unificadas. Existem polícias unificadas em vários países da Europa e até mesmo aqui no continente americano; a PEC nº 51 enfoca mais essa questão do ciclo completo; e a PEC nº 73, que fala da carreira única.
Como representante da Polícia Federal, permitam-me começar pela parte que me diz mais respeito, que é a carreira única na Polícia Federal. A PEC nº 73, do então Senador Anibal Diniz, propõe a criação de uma carreira única exclusivamente na Polícia Federal.
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Eu vou passar às mãos do Senador Randolfe um material que trata dessa questão e também um pen drive com todas essas informações em que constam basicamente o quê? Um parecer da Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados, um da Consultoria Legislativa do Senado Federal, pareceres do jurista Ives Gandra e do ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal Carlos Velloso e uma série de precedentes do Supremo que enfrentam essa questão da carreira única na Polícia Federal.
Pois bem. A carreira única na Polícia Federal é uma mudança, é uma reforma estrutural na organização e funcionamento da Polícia Federal. Ela muda significativamente o modo de funcionar a Polícia Federal do Brasil. E a primeira pergunta que eu gostaria de compartilhar com os Senadores é: qual a razão de se fazer uma mudança tão profunda e radical na organização e funcionamento da Polícia Federal do Brasil?
Eu indago: é por acaso uma instituição que goza de confiança e de credibilidade da sociedade brasileira? Goza dessa confiança e credibilidade produto do quê? Do reconhecimento do seu trabalho. Seu trabalho eficiente. Essa instituição é uma instituição que tem reconhecimento tanto da sociedade brasileira como da comunidade internacional, uma instituição que é marcada pela baixa letalidade em suas operações, baixa mortalidade policial, também nas suas operações, dificilmente nós temos um caso de morte em operações da Polícia Federal. Então ela tem baixa letalidade e baixa mortalidade em suas operações e mesmo assim se propõe uma grande mudança na carreira da Polícia Federal.
A primeira indagação que também nos leva a fazer é: a Polícia Federal é um órgão do Poder Executivo. E como é que se inicia uma discussão que provoca uma profunda modificação na Polícia Federal sem se perguntar qual é a opinião do Poder Executivo? Pois bem, senhores, a opinião do Poder Executivo, da Presidência da República, da Casa Civil, do Ministério do Planejamento e do Ministério da Justiça é que carreira na Polícia Federal é um assunto interna corporis que diz respeito à direção da Polícia Federal.
Você imaginar... E até eu me solidarizo com a preocupação que a Associação Nacional dos Procuradores da República tem com a organização e funcionamento da Polícia Federal: de realizar eventos lá na Procuradoria-Geral da República com entidades de classe para, de lá, partirem diretrizes de como deve funcionar a Polícia Federal do Brasil, como se ela não tivesse uma direção geral que comandasse essa instituição. Ou seja, estão decidindo como funciona a Polícia Federal do Brasil lá na PGR, ANPR e algumas entidades de classe ligadas à Polícia Federal.
É o mesmo que a gente imaginar que um Ministro da Justiça fosse dizer como é que funciona a Polícia Legislativa do Senado: como é que deve fazer o concurso, como é que deve se fazer a carreira da Polícia Legislativa do Senado. Guardadas as devidas proporções, é mais ou menos isso que, de certa forma, está ocorrendo. Um assunto que surge não se sabe de onde e com que interesse.
A carreira única na Polícia Federal, imaginemos a seguinte situação: se houver o trabalho de se perguntar à direção geral como a Polícia Federal funciona nas suas unidades centrais, aqui próximo, aqui em Brasília, na sua sede, ou no setor policial, vai-se verificar que a carreira única na Polícia Federal é simplesmente inexequível. O que é que nós vamos fazer com a carreira dos administrativos? A Polícia Federal não pode ser um órgão de carreira única. Nós temos a carreira policial no mínimo e a carreira dos administrativos. Só por aí a gente já descartaria.
O segundo fator que a gente tem que indagar é: carreira de cargo único? Nós precisamos parar de ser seletivos. Procurem no mundo também, no Olimpo, carreiras policiais de cargo único. Vamos falar do FBI. Em qualquer pesquisa no Google, de cinco minutos, você vai verificar que o FBI tem uma dezena de cargos. E não poderia ser diferente, porque, se nós formos até a Polícia Federal, pela complexidade das atribuições dela, constitucionais e legais, vamos perceber que não é possível que um único cargo desempenhe todas as atividades dela: de identificação, de perícia, atividade de gestão, atividade administrativa, questão dos psicólogos, questão do atendimento médico, de professor, de gestor. É inadmissível! Ou seja, propõe-se algo por ouvir dizer, sem conhecer a realidade da Polícia Federal brasileira.
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Outra questão que me preocupa é essa régua linear. A Polícia Federal do Brasil é de um jeito; a realidade da Polícia Rodoviária Federal é outra; a realidade da Polícia Militar é outra; a realidade das Polícias Civis é outra, e nós imaginamos que uma única fórmula serve para todas essas polícias. Não serve!
Repito: a proposta de carreira única na Polícia Federal interessa a quem? Vai melhorar a Polícia Federal em quê?
Então, fica esse nosso questionamento sobre a oportunidade de conveniência de mudar aquilo que está dando certo.
Só nesta semana, a Polícia Federal deu exemplos de que, com seus 14 mil servidores, policiais e administrativos, num país continental, está cumprindo com seu papel, com seu dever, e a sociedade reconhece isso. Mas nós estamos discutindo aqui uma profunda mudança na estrutura da Polícia Federal, sem participação - repito - do Poder Executivo, sem ouvir o Poder Executivo e sem ouvir a direção da Polícia Federal.
Alguns podem dizer: "Essa carreira única vai melhorar a relação entre delegados e agentes da Polícia Federal." Com todo o respeito a este Parlamento - este é o momento de se fazer a discussão -, a relação funcional entre agentes e delegados é um assunto interno da Polícia Federal que nós vamos resolver e estamos resolvendo no dia a dia. Não vai ser uma PEC... Eu tenho certeza de que uma proposta de emenda à Constituição não foi concebida para tentar resolver discordâncias eventuais e pontuais de classes. Esse é um assunto que a Polícia Federal vai enfrentar no devido momento.
Avançando para as outras PECs e saindo um pouquinho da questão da Polícia Federal, preocupa-me...
Acho que o Senador Blairo Maggi foi feliz com a PEC 102 quando fala da facultatividade.
Senador Randolfe, o senhor será Relator de todas essas PECs e vai enfrentar a questão da constitucionalidade. Nós não podemos dizer a um governador de Estado ou à Presidência da República...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS LEÔNCIO SOUSA RIBEIRO - ... que o modelo constitucional da polícia é único. É preciso dar uma faculdade para que os governadores dos Estados possam optar pelos modelos de polícia possíveis: o modelo unificado, se for o caso, ou talvez o modelo de ciclo completo, ou a manutenção do modelo que aí está. Nós não podemos imaginar um mandamento constitucional que, do Oiapoque ao Chuí, estabeleça um único modelo linear de polícias, sendo todas elas iguais, idênticas. Isso fere o princípio do Pacto Federativo e também a separação dos Poderes.
Confesso, Senador Randolfe, que tenho dificuldade de entender o que é uma polícia de ciclo completo, que está na PEC 51. Por quê? Porque nem na legislação brasileira nem na estrangeira o senhor vai encontrar uma lei que fale em polícia de ciclo completo. Não existe. Na doutrina estrangeira, também não. Nós vamos encontrar uma dezena de sociólogos e estudiosos da segurança pública no Brasil que fazem sua definição do que é ciclo completo.
Nesta audiência mesmo, se nós pudermos fazer essa discussão, cada um tem o seu conceito de ciclo completo. Para alguns, ciclo completo é fazer TCO; para outros, ciclo completo é fazer o auto de prisão em flagrante. Então, como nós vamos constitucionalizar o conceito "polícia de ciclo completo" se não chegamos ao consenso sequer do que é uma polícia de ciclo completo? Polícia unificada eu sei o que é - está muito claro; não há dúvida. Carreira única de cargo único está correto. Agora, o que é uma polícia de ciclo completo para colocarmos no texto constitucional? Estão aqui as minhas dúvidas.
Outra grande preocupação que eu tenho é trazermos uma gênese que ocorre nos Estados para a seara federal. Essa discussão toda - vamos ser muito francos - decorre de um problema de organização das forças policiais estaduais.
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O Senador José Medeiros pode confirmar, mas a relação que a Polícia Federal do Brasil tem com a Polícia Rodoviária Federal, com a Força Nacional de Segurança Pública é, de longe, o que a acontece entre as forças policiais estaduais. Ou seja, eu temo - e quero deixar aqui um alerta - nós trazermos para a esfera federal um problema e uma discussão que não existe. E digo mais: a relação da Polícia Federal com as forças estaduais também é perfeita - o Miler pode confirmar aqui -, a relação com as polícias militares.
Então, o que estamos trazendo para discussão? A discussão, no âmbito federal, em que não há esse problema, essa problemática, de que vamos unificar a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal? Vamos trazer essa discussão que nunca foi posta? Esse debate levanta isto: se vamos discutir a unificação estadual, por que não discutir a unificação das polícias federais?
Ciclo completo. Vamos estimular uma disputa, ou seja, parte de atribuições da Polícia Federal serão repartidas com a Polícia Federal, com as polícias legislativas? Uma problemática que não existe no âmbito da União poderá ser suscitada por uma discussão que, repito, tem que ser enfrentada no âmbito dos Estados. É um alerta para o qual eu gostaria que se atentasse.
Com relação às propostas, no Texto Constitucional, nós não vamos encontrar, em nenhum dispositivo constitucional ou capítulo, as minúcias e os detalhes que as três PECs, principalmente a 51 e a 102, fazem, porque não é matéria constitucional. Não pode um Texto Constitucional chegar ao ponto de dizer ao governador, ao Presidente da República o nome dos cargos; dizer como essa carreira vai começar, do início ao fim. Isso é uma atribuição do Poder Executivo. O que tem de estar no Texto Constitucional são as atribuições das forças policiais. O que tem de estar no Texto Constitucional são questões macro. Ele não pode chegar a essa riqueza de detalhes. Por quê? Está-se engessando... E o que a Constituição proíbe? Isso.
Então, nós temos um fenômeno: existem alguns que defendem a desconstitucionalização, tirar as polícias da Constituição, para dar mais liberdade aos chefes do Poder Executivo de organizar suas forças; e o extremo, que é engessar no Texto Constitucional de tal forma as forças policiais, que o chefe do Executivo não é mais o chefe da polícia, porque ele recebe, pronto e acabado, nos textos das PECs, como vai funcionar a polícia no Estado dele.
Vamos ser muito francos: o federalismo, que é o modelo brasileiro, tende a ser um modelo que respeita as diferenças. O país que adota o modelo federal, o federalismo, respeita, sabe que a realidade de um Estado - como o do Senador, o Amapá - é diferente da realidade de outros Estados e quer dar a esse Estado a possibilidade de organizar sua força policial conforme a realidade do seu Estado, dando o quê? O que o Texto Constitucional tem que trazer? Balizas e parâmetros macro.
E como nós podemos enfrentar essa questão de forma muito técnica? Com o Ipea, Senador. O Ipea, recentemente, realizou um trabalho extraordinário: "Cenários da Política de Segurança Pública até 2030". Ali eu vejo um trabalho técnico, em que se analisa a segurança pública sem os corporativismos, sem esta questão, por exemplo: eu não posso dizer que a polícia judiciária é culpada de 50 mil homicídios, porque seria o mesmo que dizer que as polícias que fazem a área de segurança viária são culpadas pelos homicídios de trânsito, que também são 50 mil no Brasil. Então, não podemos fazer esse tipo de relação e vínculo direto.
Nesse trabalho, o Ipea faz um prognóstico de vários cenários até 2030, avaliando o Estatuto do Desarmamento, avaliando a questão das organizações das forças policiais, avaliando a questão da letalidade policial, o auto de resistência. Então, é um trabalho técnico muito interessante.
E o que mais me chamou a atenção no cenário do Ipea? Nós precisamos avançar para, no Brasil, respeitando as peculiaridades do federalismo, criar grades curriculares, uniformes; os primeiros passos. É ingenuidade imaginar que vamos migrar, da noite para o dia, para o ciclo completo ou para uma polícia unificada. Esse é um processo que requer uma série de condições anteriores. Como? As nossas academias têm uma grade curricular única? Cada uma tem uma grade curricular de um jeito. Nós tivemos os grandes eventos. Como a polícia de São Paulo lidou com os distúrbios civis? Ela lida de um jeito; a do Paraná, de outro; a da Bahia, de outro.
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Então, nós primeiro temos que pensar em uniformizar grades curriculares, temos que pensar na questão do piso salarial, de dar um mínimo, de uma política de capacitação mínima, respeitadas as realidades de cada polícia, para, aí sim, nós avaliarmos ou a unificação ou a adoção de ciclo completo.
Preocupa-me, e os grandes eventos também mostraram que a Constituição de 1988 estimula a integração das forças. Senador, muito francamente, o meu medo, o meu receio do ciclo completo é nós irmos exatamente ao oposto do caminho da integração, mas estimularmos, no Brasil, a cultura da disputa entre instituições. Isso realmente me preocupa, é algo que hoje existe muito fortemente nos Estados entre Polícia Militar e Polícia Civil, e pode começar também a haver essa disputa entre outras polícias. Imaginemos, Senador, que, com o ciclo completo, a Polícia Legislativa do Senado passe a interpretar que a apuração de crimes envolvendo os membros do Poder Legislativo é dela, e não mais da Polícia Federal. Ou talvez uma disputa das competências da Polícia Rodoviária conosco.
Então, isso me preocupa no sentido de nós, em vez de construirmos um sistema integrado, um sistema único de segurança, caminhemos para várias ilhas de disputas pela competência para um determinado crime. E, então, falo da importância talvez de um conselho nacional. Eu só consigo ver, vislumbrar polícias de ciclo completo no Brasil com um conselho nacional de polícia, e, ao contrário do Dr. Camanho, eu...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS LEÔNCIO SOUSA RIBEIRO - ...vejo o Conselho Nacional de Polícia como controle social.
As conferências nacionais de segurança pública têm cobrado muito o controle social da atividade policial. Não podemos imaginar que o Ministério Público seja o único órgão constitucional que exerça controle sobre a atividade policial. Ele exerce controle externo, o Judiciário exerce controle jurisdicional, e nós temos que avançar no controle social, que é um reclame da sociedade.
O que é o Conselho Nacional de Polícia na minha visão? É a participação da sociedade civil, da OAB, de representantes da sociedade civil, a organização das ouvidorias nacionais, é permitir que o cidadão faça parte desse processo, representantes do Legislativo, Senado e Câmara, representantes do Judiciário, trazer para esse Conselho Nacional de Polícia uma discussão que não se faz. O Judiciário, por exemplo, é magistratura. Ele está aqui discutindo reforma da polícia? Não. A única magistratura que só existe no Brasil, que é a magistratura de pé de ouvido de magistrado, que é o Ministério Público, está. Por quê? Porque ele tem a pretensão de ser o coordenador dessas polícias, de ele exercer...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS LEÔNCIO SOUSA RIBEIRO - ...o controle dessas polícias. É muito temerário nós termos uma única instituição fazendo isso.
Então, o Conselho Nacional de Polícia é plural, ele reúne o maior número de pessoas, e acho que isso é muito mais democrático que a gente pense. E o Conselho Nacional de Polícia vai ajudar na uniformização, na padronização de polícias no mínimo, no básico, em todo o nosso País.
Então, são essas as considerações, Senador, que a gente gostaria de dizer. Quero convidar o Senador e todos os Senadores que se assim acharem conveniente para a gente ir à direção geral da Polícia Federal, fazer esse debate, que represente qualquer mudança estrutural na Polícia Federal, com seu diretor-geral, com a sua direção geral, que é, ao nosso ver, o caminho adequado para uma discussão de algo extremamente institucional e interna corporis.
Muito obrigado, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - Obrigado Dr. Marcos Leôncio, Presidente da Associação dos Delegados de Policia Federal.
E só acho pertinente um esclarecimento. Como se tratam de três propostas de emenda constitucional, que, como V. Exª disse, apresentam propostas de mudanças profundas na estruturação das polícias no Brasil, é óbvio que nós pretendemos, eu assim pretendo, como Relator, e acredito que é assim que deve ser o procedimento, exaurir ao máximo o debate sobre essas propostas de emenda constitucional.
Essa, na verdade, é uma das primeiras audiências públicas que estamos realizando sobre o tema. Sabemos que, de igual forma, Major Olimpio, tramitam propostas semelhantes na Câmara dos Deputados, e pretendemos também estabelecer contato com os relatores lá para realizarmos audiências seguintes sobre esse tema.
É de nosso interesse chamar o Executivo para esse debate. Há autoridades que não estiveram presentes, lamentavelmente, hoje aqui, mas justificaram a ausência, a Drª Norma Cavalcanti, Presidente da Associação Nacional dos Promotores e Procuradores de Justiça, assim como outras autoridades doutoras desse tema serão bem-vindos para este debate.
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Portanto, só quero reiterar e destacar que pretendemos estar abertos para realizar outros debates e agradeço, inclusive, as sugestões da associação, assim como de quaisquer uma das associações que aqui estão de nomes para esses debates.
Ato contínuo, então, passo a palavra ao Sr. Sílvio Benedito Alves, representado pelo Sr. Alessandri da Rocha Almeida, que representa o Conselho Nacional de Comandantes Gerais das Polícias Militares e Corpo de Bombeiros Militares.
Sr. Alessandri, por favor.
O SR. ALESSANDRI DA ROCHA ALMEIDA - Tema: discutir a reestruturação do Sistema de Segurança Pública, instruir a PEC 102, de 2011 e demais proposições que tramitam em conjunto, PEC 102, do Senador Blairo Maggi, PEC 40, do Senador Armando Monteiro e outros, PEC 19, do Senador Vital do Rêgo e outros, PEC 51, do Senador Lindbergh Farias e outros, e PEC 73, de 2013, do Senador Anibal Diniz e outros.
A PEC 102, do Senador Blairo Maggi, fala sobre piso nacional a ser fixado em lei federal, vinculação de percentuais do orçamento, faculta à União e Estados a unificação das suas polícias, cria o Conselho Nacional de Polícia.
A PEC 40, de 2012, do Senador Armando Monteiro e outros, coloca a guarda municipal no exercício de atividade de polícia ostensiva.
A PEC 19, do Senador Vital do Rêgo, criação de brigadas de incêndio pelos Municípios, que não têm contingente de corpo de bombeiro.
PEC 51, do Senador Lindbergh, cria polícias estaduais civis, carreira única, ouvidoria externa.
A PEC 73, do Senador Anibal Diniz, a Polícia Federal, carreira única.
O Conselho Nacional dos Comandantes Gerais da PM e dos Bombeiros Militares não se opõem a nenhum debate sobre unificação, desmilitarização, mas queremos, hoje, o que for melhor para a sociedade.
O exemplo da unificação. Como fazer uma polícia unificada se, em São Paulo, hoje, há 130 mil homens, que resolvem parar ou fazer greve? Aí, vêm os freios e contrapesos de mais de uma polícia. Se é polícia unificada, como faria, hoje, um Estado paralisado em sua segurança pública? Como ficaria o aspecto salarial? O soldado, como o Lotin falou, ganha R$ 4 mil de início, aquele que está ganhando bem, enquanto o agente da Polícia Civil, hoje, não ganha menos de R$7 mil? Temos que trabalhar, hoje, com o que é melhor, o que é mais palpável.
Neste ano de 2015, está fazendo 20 anos que foi criada a Lei 9.099, que é o TCO, que, hoje, contempla a sociedade. Podemos ver que os Estados em que a polícia militar faz o TCO, temos uma diferença grande no índice de criminalidade. Vamos pôr o exemplo de Santa Catarina, vamos comparar com Goiás. Em Goiás, hoje, temos uma dificuldade muito grande de implantar o TCO, mesmo com o governador assinando dia 21 de julho e mandando seu gabinete fazer um decreto para a PM fazer o TCO. Temos lá, no Estado, dois Deputados que são delegados da Polícia Civil que trabalham 24 horas contra isso. No meu ponto de vista, para atrapalhar mais um benefício que a sociedade podia ter.
Debates com argumentos, e não com vagas ofensivas e acusações. Esse foi, em São Paulo, sobre o Seminário do Ciclo Completo, que o Deputado Gonzaga, o Deputado Olímpio tentou, que participaram de todos os seminários, trazer uma mudança para a sociedade, porque isso não é para a polícia militar não, mas para a sociedade, fazemos parte da sociedade.
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O Ciclo Completo de Polícia hoje... Vamos começar, o TCO, para mim, hoje, é o pontapé inicial para o ciclo completo de polícia. Nós precisamos avançar nesse sistema falido que é a segurança pública do Brasil hoje. O texto comum em todas as PECs é o ciclo completo de polícia, até porque esse é o padrão mundial de polícia.
A mentira é o que se tem feito, falando as inverdades sobre militarização, que o militar vai levar o cidadão para dentro de um quartel. São as inverdades que estão sendo ditas do Oiapoque ao Chuí. Mentira: militar é feito para matar. Uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade (Joseph Goebbels). "PM não pode fazer policiamento, porque é uma função civil. Temos que desmilitarizar a PM". Esse é o ministro da propaganda nazista.
Mais de 50 países hoje no mundo têm polícias militarizadas. Vamos dar um exemplo: a guarda nacional republicana de Portugal, militar; a gendarmeria francesa, militar - país da liberdade, igualdade e fraternidade; carabineiros do Chile tem o segmento militar; a gendarme na própria Argentina. Nós pegamos exemplos de dois países da América do Sul, que estão perto do Brasil, onde está dando certo o policiamento com o militarismo. A experiência do ciclo completo no Rio Grande do Sul pelo TCO, no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina. PM do Rio Grande do Sul lavra TCO há 18 anos. Em média, 140 mil por ano, chegando a um número atual de 2 milhões; 4 milhões de pessoas que não foram a delegacia, que não tiveram o direito de liberdade limitado.
Polícia Militar de Santa Catarina, 127.116 TCOs, 250 mil pessoas que não foram conduzidas a delegacia, que não tiveram o direito de liberdade limitado.
Ciclo completo de polícias, sinônimo de Direitos Humanos. Evita condução desnecessária, evita o uso da força, constrangimento, há eficiência. Continuidade de ação pela polícia que atende e soluciona ocorrências, sem jogo de empurra-empurra entre as instituições.
Vou dar um exemplo novamente. No Estado de Santa Catarina a PM faz um TCO entre 7 a 10 minutos. Em Goiás, que é minha cidade, onde a PM não faz o TCO, em que uma lesão corporal leve tem que ser conduzida para a delegacia, a viatura fica parada de duas a três horas na delegacia, sendo que podia estar fazendo patrulhamento em benefício da população.
Apoio pelo ciclo completo de polícia. Temos o Conselho Nacional do Ministério Público, a Federação Nacional da Polícia Rodoviária Federal, os agentes da Fenapef, o CNCG, a Associação Nacional dos Procuradores da República, a Anaspra (Associação Nacional dos Praças), a Associação dos Peritos Criminais federais, estaduais, a Ligabom.
A posição do CNCG. O ciclo completo para as polícias do Brasil em nível federal e estadual, criação do fundo de apoio União, Estados, DF e Municípios, criação de Conselho Nacional de Polícia descentralizado e fiscalização, piso nacional para os policiais.
Antes de encerrar, eu queria dizer mais uma vez que não defendamos nossas instituições, como há várias pessoas que trabalham no sentido só de defender a sua instituição. Vamos ver primeiro a sociedade. Uma simples lavratura de TCO, se estivesse sendo feita em todos os Estados brasileiros, como em Santa Catarina, Rio Grande do Sul, e somente seis Estados estão fazendo TCO hoje, tendo em vista que essa Lei 9.099 nos faculta fazer o TCO há 20 anos, que estão sendo completados este ano agora... Somente seis Estados. Por quê? Porque não se pode falar que há integração, que há unificação, porque não há.
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O Estado de Goiás tenta unificar academia, tenta unificar o boletim único, mas não vai para a frente, não unifica. A PM e a Polícia Civil têm uma rixa que eu não sei o que vai ser feito para poder solucionar isso.
Eu acho que nós devíamos olhar para o lado do cidadão, da população primeiro, para depois vir discutir qualquer melhoria para as nossas instituições.
Obrigado, Senhores.
O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - Nós agradecemos ao Sr. Alessandri, que representou aqui o Conselho Nacional de Comandantes-Gerais das Polícias Militares e Corpo de Bombeiros Militares.
Em seguida passo, então, para o Sr. Elias Miler da Silva, Diretor de Assuntos Legislativos da Federação Nacional de Entidades de Oficiais Militares.
Antes, Sr. Elias, só registrar e agradecer a presença aqui, nessa nossa audiência pública, do meu caríssimo e querido amigo José Medeiros, do PPS de Mato Grosso.
Sr. Elias, por favor.
O SR. ELIAS MILER DA SILVA - Senador Randolfe, presidindo neste ato esta Comissão, desta Casa do Povo, Casa do Estado, a Federação Nacional de Entidades de Oficiais Militares Estaduais, na sua pessoa, saúda a toda esta Casa e agradece por esta oportunidade. Federação que congrega mais de 40.000 oficiais, entre PMs e Bombeiros do Brasil, que tem como Presidente o Coronel Marlon, de Santa Catarina.
Saúdo, também, o Senador Medeiros que tem a sua história justamente nesta área da segurança pública e da defesa da sociedade.
Saúdo o meu amigo, colega de academia, Deputado Major Olimpio, que teve a sua passagem pela corporação na luta pela defesa do povo paulista, exercendo dois mandatos como Deputado Estadual e, agora, aqui nesta Casa, na Câmara dos Deputados, na defesa do povo paulista e do povo brasileiro, que nós ombreamos neste trabalho.
A Mesa composta por Leôncio, Alessandri, Jesus e os demais membros, o Gandra, de longo tempo também, juntos aqui, o Lotin, Dr. Reale, que tinha os cabelos brancos e agora já está até sem cabelo, na luta. E nós temos que ser coerentes, entender quando a pessoa defende uma causa por tanto tempo, e está presente, nós temos que ter um respeito profundo pela pessoa que está há tanto tempo. A Fenapef na luta que ela tem.
Eu inicio, realmente, fazendo coro à fala do Lotin, pela Anaspra, e nós tivemos lá, Senador Randolfe, V. Exª que é um defensor dos Direitos Humanos, nós estivemos na greve da PM da Bahia, justamente para que não fosse feita a greve e nós vimos o absurdo praticado pelo Governo, à época. A greve ocorreu por causa de R$200,00, aprovado em lei, que o Governo não quis pagar. E a sociedade baiana ficou refém, ou seja, os policiais militares foram jogados em uma situação que gerou essa greve.
E o mesmo Governo, que antes estimulou uma greve, usou toda a força do Estado, mais de mil militares do Exército para impedir a greve da PM, pois nós, pela Federação dos Oficiais, não apoiamos nenhum movimento paredista daqueles que a Constituição proíbe, mas nós reconhecemos que as praças são vitimadas, porque muitos Governos insensíveis usam o estamento militar justamente para não dar o devido direito e jogam em um quadro, instigando inclusive oficiais contra praças. E ficam assistindo de longe.
Então, fazendo essas preliminares, a Federação vem a esta Casa para discutir essas propostas, que são cinco e já foram expostas pela Presidência do Conselho de Comandantes Gerais, na figura do Tenente-Coronel Alessandri. E a Feneme tem debatido no Brasil inteiro essas propostas. Agora, uma coisa é fática, a ineficiência do modelo.
Eu quero, aqui, prestar honra a todos os policiais que estão aqui representados, e aqui não há que se demonizar, não é o cargo de delegado, não é do oficial, não estamos aqui para isso, não é o escrivão. Os nossos policiais brasileiros, rodoviários, são heróis no quadro que existe no Brasil. São heróis e fazem muito pela defesa do Brasil.
Então, nós não estamos aqui para dizer que é o cargo A, cargo B ou cargo C, nós estamos aqui para falar que o sistema que nós herdamos, com todo o nosso sacrifício, com todo o nosso esforço, é ineficiente. Nós temos que pôr o dedo na ferida.Onde eu vejo essa ineficiência? Vai fazer uma pesquisa com o povo, como fez o Ibope, e a pesquisa demonstra de forma clara que a preocupação do povo é: 71% com a segurança pública.
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O povo tem medo, o povo não trabalha, não estuda, porque o Brasil virou um estado de guerra - isso é realidade! Isso é comprovado! Nós mesmos, policiais, em nossa hora de folga, também ficamos reféns - juntamente com nossas famílias - desse quadro.
Mas vejam a avaliação das instituições. Quando este mesmo Ibope vai avaliar, a Polícia Civil e a PM estão abraçadas - 34% e 35% - em uma avaliação péssima. Mas pior do que a Polícia Civil e do que a PM nós temos o Poder Judiciário. O Judiciário está pior avaliado e o povo não confia no Judiciário. Então, essa discussão que passa pelo sistema de segurança pública tem que chegar ao sistema de justiça também. Por isso que nós estamos primeiro discutindo o nosso, dando a nossa contribuição, para depois chegarmos também ao sistema de justiça.
E como foi colocado pelo Coronel Alessandri, está aqui o Gabinete Integrado, todos os profissionais estão no Gabinete Integrado, mas faltam duas categorias: uma dos agentes (dos EPAs) da Polícia Civil - e o Gandra sempre esteve ombreado, mas ele também defende o ciclo completo, porém de maneira diferenciada do Gabinete, contudo é uma pessoa democrática e que atua nesta Casa -, faltam os agentes da Polícia Civil e faltam os delegados de polícia, tanto Federal como Civil, para que nós possamos discutir. Ou todos esses estão errados ou quem não está participando está errado, não há meio termo. Então nós temos que, democraticamente, vir discutir. Então por isso - esses apoiadores já foi falado, eu vou só passar, para que a gente fique bem marcado - todos estão apoiando. Portanto, não é uma proposta da Polícia Militar.
E acrescento, Senador Randolfe, nós tivemos a 1ª Conferência Nacional de Segurança Pública, o Brasil inteiro discutiu segurança pública - do Município, do Estado e Federal -, e a Conferência terminou, como uma das diretrizes mais votadas, o ciclo completo de polícia. Então, quem está obrigando este debate não são as instituições, quem está obrigando é a própria sociedade brasileira que, na Conferência, assim deliberou.
E, por último, lá na Câmara, a CPI da Violência contra os Jovens, Negros e Pobres - na qual o Deputado Major Olímpio teve uma participação efetiva - começou da seguinte maneira: quem extermina o jovem, negro e pobre é a Polícia! Quer dizer, a culpada de todas as mazelas sociais acabou sendo a Polícia. E, no final, a CPI concluiu que uma das grandes medidas para nós evitarmos a morte do jovem negro e pobre, é justamente a reformulação do sistema policial brasileiro - com a participação do Deputado Major Olímpio, inclusive na redação final.
Mas nós temos que ter consciência - e aqui eu tenho profissionais renomados e a sociedade que aqui se encontra, no Brasil, nós sabemos aqui são brilhantes profissionais - que as causas da violência não são causas policiais. O Brasil é um país de uma dívida social milenar. Nós tínhamos seis milhões de índios em 1.500, Senador Medeiros, hoje não temos nem 700 mil índios. Os índios foram exterminados neste País! O Brasil foi um dos últimos países a ter a abolição da escravatura. O negro não continua escravo na senzala, mas continua escravo social. Ele é jogado nas periferias do Brasil - porque não tem oportunidade - e ali o crime se utiliza desse quadro de miséria. Enquanto o Estado não vier com políticas públicas, nós estaremos - e os policiais são vitimadíssimos, do agente ao delegado, do soldado ao coronel, nós somos vítimas dessas mazelas sociais, porque jogam em nossas costas: "A Polícia que resolva as mazelas sociais". Nós, que temos que atuar nas consequências, somos culpados pelas causas. Essa é a realidade.
Vejam a violência no Brasil, causa um prejuízo de 10% a 15% do PIB. O Brasil perde R$407 bilhões com a violência. O País está em déficit no orçamento, se investisse em segurança pública nós estaríamos com superávit, porque o Brasil é recordista em assassinatos. A Organização Mundial de Saúde falou: "O Brasil está em um quadro epidêmico!". E em um quadro epidêmico nós temos que tomar medidas imediatas! Sessenta mil mortes - e o Deputado Major Olímpio coloca que esse dado é oficial, oficioso passa de cem mil mortos! Nós estamos vendo o quadro crítico lá na França. Morreram, infelizmente, menos de 200 pessoas. O país está em crise. O país declarou guerra, porque morreram 200 pessoas.
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(Soa a campainha.)
O SR. ELIAS MILER DA SILVA - No Brasil morre isso por dia, só pela violência. E o País não está em crise, não está em crise.
Vejam que morte de policiais, que foi falado pelo Jesus, foi falado aqui, o Brasil é o primeiro do mundo em morte de policiais. Essa cena aqui, olha, todos nós, o Deputado Major Olimpio, toda semana ia ao enterro de um policial. Ia só, porque os outros não vão. Aqui está a situação, olha. Desse quadro aqui, nós estamos cansados. Senador Medeiros, São Paulo tem um cemitério de PMs que morrem em serviço. E se V. Exª, como policial que é, estiver de folga, atuar como policial que é e vier a morrer, não tem direito de ser enterrado lá como herói; só quem está em serviço. E não cabe mais. E não há uma reportagem sobre isso.
O Brasil é um dos países com maior encarceramento. Chega a 700 mil encarcerados, 300 mil mandados de prisão. A polícia trabalha. Mas o que acontece - e o Dr. Leôncio colocou isso -, o que acontece é isso aqui. O cidadão chega para o policial, acontece um crime, ele vai à Polícia Civil ou à Polícia Militar? Ele vai à Polícia Militar. E o que ela fala? "Bom, eu vou prevenir, mas manda o delegado investigar." Ele vai ao delegado. "Eu vou investigar, mas manda a PM prevenir." Aí vem aquela velha tese: quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha
O Dr. Leôncio e o Dr. Reale viajam pelo mundo afora e sabem que no mundo há duas máximas para qualquer polícia do mundo. E a Polícia Federal não tem uniforme, deveria ter; a Polícia Civil não tem uniforme, deveria ter. Porque na hora em que o Dr. Reale vai ao mundo, a um seminário internacional, chega para um policial, ele fala assim: "Olha, qualquer polícia do mundo tem uniforme e investigação." O que quer dizer uniforme? Qualquer polícia do mundo previne e investiga. Qualquer polícia do mundo. E no Brasil eles falam: "Vocês não são polícias; vocês são meias polícias."
(Soa a campainha.)
O SR. ELIAS MILER DA SILVA - O modelo de polícia no Brasil - isso tem que estar bem em mente, inclusive para o nosso Relator e para os membros desta Comissão -: nós herdamos esse modelo do governo militar. O governo militar unificou as polícias ostensivas na Polícia Militar. Em São Paulo, nós tínhamos sete polícias; foram todas unificadas na Polícia Militar. E a Polícia Civil ficou à parte, e o SNI/Dops comandava a polícia, exercendo um ciclo completo. Acabou o governo militar, ficou o modelo que havia antes, e sem resolverem aquilo que era fundamental. Aí nós ficamos... Antes eu punha, Dr. Leôncio, um joguinho de futebol, mas eu punha o Flamengo, aí eu tive que tirar devido à reação, porque eu colocava um flamenguista hipoteticamente, então eu tive que mudar. Aí mudei o joguinho de futebol para o iter criminis: cogitação, preparação, execução, consumação, exaurimento. Aí, lá vem o bandido sem time. Ele exerce o ciclo completo. A organização criminosa cogita, prepara, executa, consuma, e em alguns casos, exaurimento. Aí vem a polícia, em primeiro lugar a PM. "Olha, já aconteceu; para, senão é usurpação de função pública". Aí lá vem a Polícia Civil. Em tese, ela só pode agir depois que aconteceu. Ou nós somos o País mais inteligente do mundo, ou nós estamos falidos, porque só existe esse modelo no Brasil. O crime faz tudo, e o Estado, que reprime o crime, que previne o crime, age fracionado e pela metade.
Essa é a razão de nos Estados nós termos esse conflito, porque esse modelo é anacrônico e não funciona. Funciona por amizades pessoais. Se eu estou numa delegacia, em que o Dr. Reale foi meu amigo, por questão pessoal funciona, ou o Leôncio; mas senão, formalmente não funciona.
E aí vamos desfazer as mentiras que acontecem. "Não devemos copiar nenhum modelo do mundo; temos a nossa realidade." A nossa língua não é nossa, então voltemos ao tupi-guarani. O nosso Direito não é nosso, voltemos para o Direito costumeiro tribal, porque o nosso Direito é romano e americano. O nosso Judiciário é copiado do americano. O nosso sistema policial nós copiamos de Portugal, e Portugal abandonou, mas nós continuamos colônia. Portugal não tem meias polícias. E nós ficamos no passado e defendendo aquilo que é indefensável. Então o Brasil é um País miscigenado no mundo, múltiplas culturas, e o idioma também.
E aí, para a gente finalizar, aprenda com o erro dos outros. Você não consegue viver. Eu tenho que pegar a experiência do mundo e adaptar aqui. Vamos adaptar. É óbvio que eu não vou pegar montado e colocar aqui, mas vou adaptar à minha realidade e à realidade do Brasil, que é continental.
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O ciclo completo só é possível se for desmilitarizada. Há 41 anos que acabou o governo militar e ainda ficam com um discurso, como bem falou o Jesus, ele entrou como fuzileiro, não viu nada de ditadura, mas até hoje carrega. Se souberem que ele é fuzileiro, falam: "Ih, isso é um policial rodoviário ditador porque foi fuzileiro".
Vamos acabar com esse discurso. Viremos a página. Nós que aqui estamos, o Olímpio e eu, nossa geração, nós não participamos do governo militar. Acabou, mas ficam com um discursinho ideológico, rancoroso, que nada tem a ver.
Na América do Sul, do Norte e na Europa têm polícias militares. Vamos pegar agora, e os que estão aqui nesta audiência acompanharam o seminário da Rede Globo. A Rede Globo fez seis meses de seminário sobre impunidade no Brasil e no mundo. E terminou o seminário falando: "O Chile, um país semelhante ao Brasil, conseguiu resolver a questão da segurança pública". E como é que resolveu? Com um carabineiro do Chile, que é extremamente militar. Ué, como é que o Chile resolveu? Resolveu. É simples, porque o Chile soluciona 98% dos homicídios. Como é que resolve isso? Porque a polícia trabalha em harmonia com o Ministério Público e a polícia leva direto para um juiz de plantão. Aqui não tem juiz de plantão e a eterna briga entre delegado e Ministério Público por espaço.
Por que está funcionando a Operação Lava Jato, Dr. Leôncio? A Lava Jato está funcionando por quê? As equipes estão trabalhando integradas: Polícia Federal, Ministério Público e o juiz à frente. Desmonte isso! O Chile funciona! Se nós não tocarmos nisto: integração da polícia com o Ministério Público, Poder Judiciário, se nós não trabalharmos nisso, nós continuamos ainda com isso aqui. Por mais que questionem. Eu sei que os delegados, por quem eu tenho respeito, Dr. Reale e Leôncio, disserem: "Esse número é mentiroso, porque o Brasil não elucida de 5% a 8%". Bom, se o número é mentiroso, eu estou ofendendo instituições sagradas deste País.
Eu estou dizendo que o Conselho Nacional de Justiça é mentiroso! Eu estou falando que o Ministério da Justiça é mentiroso! E eu estou falando que o Conselho Nacional do Ministério Público é mentiroso, porque eles fizeram um anuário e colocaram que só se elucida de 5 a 8. Mas não é culpa do delegado, não é culpa da Polícia Civil, não é culpa da Polícia Federal; o sistema é que é burocrático e o sistema é arcaico.
O ciclo completo é volta da ditadura e para as torturas. Estão usando isso. Isso não parte do Dr. Leôncio nem do Dr. Reale, mas eu já vi delegados dizerem: "Olha, vai voltar a tortura e a ditadura". Eu não quero ir para esse debate baixo. É debate de quem não tem argumento, é debate de quem não tem compromisso com a sociedade. Querer colocar essa pecha nas Polícias Militares, como bem colocou o Jesus.
Mas vejam, o relatório da Comissão Nacional da Verdade apontou que as torturas foram nos quartéis do Exército, onde nós tínhamos o DOI-Codi, e foi nos DOPs, nas delegacias. Então, se voltar à delegacia... Veja uma colocação, Dr. Leôncio, que não podia ser feita: quem foi criada pelo governo militar foi a Polícia Federal. Aí, eu vou dizer o seguinte: "Olha, que a Polícia Federal, criada pelo governo militar, e a Justiça Federal são filhotes da ditadura". Mas que colocação, que despropósito! Então, o debate tem que ser debate de outro nível, de um outro padrão.
Na Comissão da Verdade de São Paulo e na Nacional, delegados envolvidos: 77; PMs: 18. Na Nacional, 41 delegados; oficiais da PM, somente 11. Conclusão da Comissão Nacional da Verdade: extingue a Polícia Militar.
Relatório da ONU deste ano, se fosse levar o debate para outro lado. Relatório da ONU deste ano, olha o que falou Juan Méndez: "Existe um alto grau de atos de tortura no interrogatório de suspeitos detidos nas delegacias brasileiras". Eu vou usar isso como regra? Ou, então... está aqui um Delegado de Polícia, Marcelo Barros, Delegado de Polícia de Pernambuco.
(Soa a campainha.)
O SR. ELIAS MILER DA SILVA - O que ele falou? Na tese de doutorado dele, ele ficou oito anos pesquisando as delegacias onde ele trabalhou. Olha a conclusão dele: "A prática perdura porque torturar é mais fácil do que gastar tempo com recurso na investigação". Eu vou dizer que isso é a regra?
Segundo a Ouvidoria de Polícia de São Paulo, 121 denúncias de tortura: 67 da Polícia Civil, 54 da PM. E a PM tem o dobro do efetivo. A condição de Militar impede o exercício da Polícia Judiciária, investigativa. A PM já faz a investigação nos crimes militares e a faz bem-feita. Exército, Marinha e Aeronáutica também fazem.
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Situação atual - fechando, Sr. Presidente, agradecendo a tolerância, Senador Medeiros -: o modelo é ineficiente. Ponto. Nós temos que apresentar sugestões. Existe uma luta de classe nas polícias. Eu estou aqui com Lotin ao meu lado.
(Soa a campainha.)
O SR. ELIAS MILER DA SILVA - Se eu disser que não teve e que não tem luta de classe entre Praça e Oficiais, eu estou mentindo. Hoje é possível nos sentarmos juntos porque a luta de classe nos levou a sentarmos juntos. E hoje ele pode falar coisa que ele não podia falar antes porque saía daqui preso. Luta de classe existe entre Agente e Delegado, entre Praça e Oficiais. E tem que pôr o dedo na ferida. Existe luta de classe entre as Polícias. Não tem entre a Polícia Federa e a Civil, entre a Polícia Federal e a PM, porque não disputam o mesmo espaço. A competência está bem definida. A Polícia Federal não luta com a Polícia Civil porque a competência é material. Estão no mesmo território, mas é material. Eu sei que aquele crime é de competência da Federal. A Civil encaminha para ela e vice-versa. Luta entre delegados e Ministério Público, isso é comprovado. Essa luta também é comprovada.
Morosidade da Justiça. Outra comprovação.
Nós apresentamos, então, como sugestão, Senador Medeiros, Presidente, ciclo completo imediato, é possível fazer sem investimentos e sem provocar conflitos. É possível, começando pelo termo circunstanciado, que é um ciclo completo no menor potencial ofensivo.
Ascensão para as carreiras operacionais. O Agente tem que ascender, o Escrivão tem que ascender e os Praças têm que ascender. Como será essa ascensão? Vai ser ingresso único ou cota? Esta Comissão tem que pôr o dedo na ferida. Vai ser ingresso único ou vai ser cota? Vai ter que discutir.
Um sistema integrado nacional. A Polícia Federal não tem um sistema integrado com a Polícia Civil, que não integra com a Polícia Militar. Cada um tem seu feudo. Ninguém tem os dados neste País.
Investigação destinada ao MP. Eu não sei por que essa resistência. Direciona essa investigação ao Ministério Público, que é o titular da ação penal pública.
Perícia autônoma, Guarda Municipal. E aqui colocando para todos. A PM resiste? Não. Nós entendemos que a Guarda Municipal tem que ingressar no policiamento, porque nós não damos conta. Isso já é realidade.
Uma polícia penal, investigação destinada ao Ministério Público. E aqui eu coloco para os delegados, isso aqui não é consenso na Feneme - Federação Nacional de Entidades de Militares Estaduais -, não é consenso, é uma sugestão minha, porque eu acho que nós podemos, temos que ter também uma opção para os delegados, que, historicamente, vem, desde o juiz de paz, exercendo funções quase que judiciais.
Eu quero iniciar esse debate aqui. Sei que é polêmico. Sei que o Ministério Público é contra. O Judiciário é contra. Mas estou trabalhando isso na Feneme. Uma saída para os delegados: criar o juiz de garantia. Juiz de garantia, de que maneira? A competência do Juizado Especial criminal para o juiz de garantia. Medidas cautelares, para o juiz de garantia. E a composição dele: Ministério Público, se quiser, como opção, policiais e bacharéis em Direito, a composição inicial. "Ah, é inconstitucional. Não pode". O advogado pode ser juiz sem concurso para os tribunais e tribunais superiores. O promotor pode mudar de carreira e ser juiz sem concurso. Por que eu não posso transformar os cargos de delegados em juiz de garantia e, a partir daí, começar uma nova discussão?
Muito obrigado, Presidente, pela tolerância.
E a Feneme agradece esta oportunidade.
O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Agora com a palavra, Carlos Eduardo Benites Jorge, Presidente a Associação de Delegados de Polícia do Brasil, representado por Wladimir Sérgio Reale, aqui presente.
O SR. WLADIMIR SÉRGIO REALE - Nobre Senador José Medeiros, através de quem cumprimento todas as demais autoridades, os demais Parlamentares, é uma alegria muito grande estar aqui mais uma vez mais. Digo mais uma vez, porque, desde 1987 acompanhando todas essas discussões, já perdi a conta de quantas vezes nós já discutimos essas matérias.
Na nossa visão, antes de tudo, sob o ponto de vista de política pública, está se discutindo aqui inicialmente a questão central de ciclo completo. Antes qualquer outra, eu observei que tudo girou em termos basicamente do ciclo completo.
O que se sucede em relação ao ciclo completo? Com todo respeito a todos que pensam de forma diferente. Eu começaria inicialmente pelo próprio TCO. Por que o TCO?
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Porque o próprio Supremo Tribunal Federal, em passado recente, já decidiu que a atribuição de Polícia Judiciária, sob pena de usurpação da função pela Polícia Militar, esse exercício. Está na Ação Direta de Inconstitucionalidade. Houve uma discussão também, com relação àquela questão de São Paulo, salvo erro de memória, a Ação Direta nº 2.862, em que não houve o exame de mérito, houve apenas uma questão preliminar.
Falo assim, não só como advogado participante nessas causas, no Supremo Tribunal Federal. Recentemente, o Ministro Fux, no Recurso Extraordinário nº 702.617, do Amazonas, reafirmou, e por quê? Não é essa questão de falar apenas no TCO, uma questão meramente simplificada. Quando se pega, por exemplo, o Código Penal e as leis extravagantes, nós temos mais de cento e tantos tipos penais que são afetos aos juizados de competência da Lei nº 9.099. A título exemplificativo, eu diria: rixa qualificada; fraude no comércio; incêndio culposo; atentado ao pudor mediante fraude; exercício ilegal de Medicina ou dentária; moeda falsa; figura privilegiada; e vais assim por diante.
Então, não se pode falar apenas em questão de tempo circunstanciado nessas ocorrências de menor relevância, quando acontecem, por exemplo, nas estradas federais, quando há uma colisão de veículos, com alguém que foi... Ou, então, uma questão de contrabando, que também surpreende, nas estradas federais; ou com relação a outras ocorrências.
O que sucede? Discute-se, sempre como base, a questão do Rio Grande do Sul e a questão de Santa Catarina. É certo que tudo começou no Rio Grande do Sul. Lá estava um ex-Senador, que foi Secretário de Segurança, que começou exatamente naquele Estado esse tipo de processo. Em Santa Catarina, a mesma coisa. Só que também não se diz quantas ocorrências, segundo informações que recebemos, que são devolvidas depois para as respectivas delegacias, porque é também uma função de natureza técnica, técnico jurídica, não é só uma questão mais simples. O patrulheiro, no exercício da Polícia Militar, tenha condições de resolver todos os casos; lavrar ali, na hora; mandar direto para... Essa não é a questão. Realmente é uma questão técnica, e, como tal, ela está na esfera da Polícia Judiciária. Não sou eu que digo isso. Quem diz isso é o Supremo Tribunal Federal, em decisões já pacificadas, como falou agora, e disse-o bem, o Supremo Tribunal Federal.
Então, o que quero dizer, respeitando as posições divergentes, é que se fala do tempo circunstanciado e ocorrido de forma muito simplificada, porque há leis extravagantes e há mais de cem tipos penais. Não se pode, digamos, analisar a possibilidade apenas de conferir à Polícia Militar, a quem eu sempre respeitei muito, muito. E digo mais: a Polícia Militar, pela sua estrutura, pela sua história, é indispensável para o País, inclusive faz parte até da defesa territorial do País! Eles são militares, embora com comparação com outros Estados, são militares no sentido estrito. Eu costumo dizer: toda vez que vai se mexer nas policiais militares, ou das Polícias Militares - o nosso companheiro Miler, a quem respeito, estamos juntos aqui, muitas vezes, discutindo tudo isso -, mas toda vez que se mexe na Constituição, no que diz respeito às polícias militares, elas ficam ainda mais militares.
Vejamos, por exemplo, o art. 42 que, antigamente, era restrito às Forças Armadas, as Forças Armadas foram para o 142, e ela ficou com os militares dos Estados e do Distrito Federal, exatamente pelas Emendas nºs 3, de 1993; 18, de 1998; 20, de 1998; 41, de 2003. A Emenda nº 18, de 1998, foi a grande reforma administrativa, antes da 19, que manteve as polícias militares como militares, no sentido estrito. Quando se vai adiante, há a Justiça Militar Estadual. Então, há também uma questão diferenciada, quando se fala dos militares de outros países, que não são militares no sentido estrito, como aqui no Brasil, regulados pelo Código Penal Militar, pelo Código de Processo Militar.
É certo que também está a cargo dos militares a presidência dos inquéritos policiais militares. No Estado do Rio de Janeiro, por exemplo, temos as Delegacias de Polícia Judiciária Militar, algo corretíssimo, porque cuidam exatamente dos crimes militares assim praticados. Portanto, não está em discussão isso. O que está em discussão é se, efetivamente - chegou agora o nosso nobre Deputado, Subtenente Gonzaga, que, em última análise, estimulou toda essa discussão, no País, a quem aproveito para cumprimentar, já que tive a honra de participar, também, de seis seminários, na Câmara dos Deputados, sobre essa discussão por este País afora -, então, o que se verifica é um ponto que estava na sombra.
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O papel do Ministério Público. Eu já disse, em Fortaleza e em Recife, mostrando ali a questão do Ministério Público, que, na realidade, qual o interesse do Ministério Público nisso? Qual o interesse do Ministério Público nisso? Na realidade, o Ministério Público tem lá suas funções constitucionais - e que, cá entre nós, o Constituinte de 1988 colocou uma série de matérias dessa natureza que nem tem índole constitucional. Colocar notificação de procedimento administrativo em sua competência é matéria infraconstitucional. Não tinha nada que estar na Constituição, mas está. Mas eles sustentam aquilo a ferro e fogo.
Eu diria mais: além do controle externo da atividade policial - e aí eu estou com o Dr. Leôncio, porque eu acho que essa ideia, na 102 do Conselho é muito melhor para o País - está aqui, com todas as letras, que a coordenação seria do Ministério Público e tudo a ele encaminhado. E, com isso, qual é a consequência lógica disso? Já dissemos isso em alto e bom-tom - é pena que o Dr. Camanho aqui não esteja -: na realidade, eles querem exatamente fazer não só o controle, mas a grande coordenação, neutralizando evidentemente os secretários de segurança e obviamente os delegados gerais, as chefias da Polícia Federal, o diretor-geral da Polícia Federal, porque eles passam a coordenar.
Mas isso não é de agora, isso vem de 1962.
Já que falamos no Chile, tudo começou no Chile, quando o MP da América do Sul se reuniu e dali surgiram as primeiras diretrizes dentro desse objetivo de querer transformar as polícias como seus órgãos de execução, para ter o poder e a força a seu cargo, a seu nome, e praticando os excessos que ocorrem no cotidiano. E, pior ainda: sem qualquer responsabilização.
Disse também lá e repito aqui que nós tivemos uma reforma do Judiciário que começou pós-Constituição, como também começou na segurança pública com o Deputado Hélio Bicudo, como também, a reforma do Ministério Público, que está na Câmara dos Deputados, em geral, com o passar desses anos, desde 1995, engavetada. E conseguimos agora, pelo menos, iniciar a sua tramitação, porque a responsabilização é necessária em relação aos membros do Ministério Público, que partem para quê? Judicialização da política; eles provocam isso tudo.
Então é preciso haver muita cautela com essa preocupação de contribuição por parte dos membros do Ministério Público, que, em última análise, eles querem transformar todos em seus agentes de execução. E isso não é bom para o País - com os poderes que eles tiveram. E não existe nenhum MP que tenha tido esse poder no Brasil e, agora, querem as polícias sob a sua coordenação. E não é o controle externo - que nunca funcionou -, mas, sim, sob sua coordenação, não é?
(Soa a campainha.)
O SR. WLADIMIR SÉRGIO REALE - Então, é difícil, realmente, num prazo tão exíguo, a gente fazer uma abordagem mais ampla dessa questão. Mas eu pediria vênia para o nosso eminente Senador Randolfe Rodrigues para trazer, também, alguns aspectos adicionais.
Porque, na realidade, essa discussão começou em 1991 e foi até 1996. Eu tive a honra de participar de uma audiência pública, na década de 90, discutindo aquela PEC primitiva, que também falava na desmilitarização das polícias. Mas não funcionou, e depois vieram outras, outras, outras, e estamos até hoje discutindo.
O que me parece muito importante é - e eu vejo aqui na 102 alguns dados extremamente relevantes - quando se coloca, evidentemente, a questão da verba carimbada: a necessidade de o art. 67 estabelecer também vinculação da receitas de impostos, como existe na saúde, como existe na educação. E eu vou mais longe: quer dizer, na realidade, desde o nosso saudoso Senador Romeu Tuma, com quem tivemos a oportunidade até de elaborar um texto que ele acolheu e passou a tramitar nesta Casa, como também do atual Presidente da Casa, Senador Renan Calheiros, com quem tivemos também uma reunião lá trás, há uns 15 anos ou mais, e ele também acolheu, mas a verdade é que, em momento algum, se conseguiu avançar com essa questão, que é central, porque o problema básico é de recursos. Independentemente de outros argumentos, eu acho que esse inciso da vinculação da receita de impostos pode ser extremamente relevante, como existe nas outras áreas - saúde, educação. É o mínimo que se possa ter no sentido de avançar exatamente nessas questões policiais. E até menos nesse embate de - entre aspas, no bom sentido - de "instituições contra instituições", etc. Porque o problema maior versa sobre questões de recursos.
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Nós achamos que as polícias militares têm uma função relevante no País, quer pela própria ordem pública, aliás, isso foi discutido em 1988, e nós estávamos lá também, ajudando a discutir com as assessorias parlamentares. Quer dizer, quando se fez essa regra - e eu já falei muito nisso, e o nosso Coronel Mira vai lembrar -, quando se falou em relação à questão das polícias militares, e se disse, em alto e bom-tom, que, no que cabe à polícia ostensiva, houve uma evolução da regra primitiva do Decreto-Lei nº 667/1969, quando foi estabelecido o policiamento ostensivo fardado. E naquela discussão, lá atrás, o Coronel Terra, do Estado de São Paulo, conseguiu aumentar o posicionamento das polícias militares nisso, através da chamada polícia ostensiva. Não era só exercer o policiamento ostensivo, fardado, de forma restrita. Então, isso tudo ocorreu dentro de um longo processo. E está aqui o que é fundamental para as polícias militares: "Como execução do Ministério de Defesa Civil, etc., e a preservação da ordem pública". Como é possível se fazer a manutenção da ordem pública sem as polícias militares? Então, elas têm um papel relevante.
Eu penso que essa ideia de passar a ter o exercício também das funções de polícia judiciária, da função de poder lavrar certos termos ali mesmo na rua, com o pretexto de que o cidadão não vai lá... Não pode. Isso tem uma sequência. E qualquer que seja o modelo no sistema da administração da Justiça criminal... Eu recebi com perplexidade, quando o então Procurador, o respeitável Dr. Camanho, mencionou como magistrados constituintes, o Judiciário e o MP. O MP é órgão. É um órgão do Poder Executivo com algumas prerrogativas. Ele não é Magistratura do Ministério Público, como se dá na Itália. Lá é Magistratura do Ministério Público. Não é assim aqui. Aqui é um órgão que tem certas autonomias e, pior do que isso, sem responsabilização pelos excessos praticados. Então, o que é que isso significa? Ele falou, mas isso é em Portugal - quando se fala que os membros do Ministério Público são magistrados. E lá eles presidem o inquérito. O inquérito, hoje, em Portugal, é presidido pelo procurador da República.
E eu diria mais ainda: aqui no Brasil, recentemente, o Supremo Tribunal Federal, num caso com repercussão geral, de Minas Gerais - é o Recurso Extraordinário nº 593.727, eu o conheço bem, porque sou o patrono da causa -, decidiu que os procedimentos investigatórios criminais feitos pelo Ministério Público devem observar estritamente as regras do inquérito policial. E, com perplexidade, eu assisti a ele satanizando o inquérito policial, quando o Supremo decidiu que agora tem que ter controle, segundo as regras do Código de Processo Penal e do inquérito policial. Foi colocado agora, nesse caso. Eu até recorri, porque na parte da competência do Ministério Público pode ser em qualquer coisa. Não. Pode ser de forma subsidiária, em casos excepcionais.
Por que nós estamos falando e ampliando um pouco essa discussão dentro do sistema de administração da Justiça criminal? Eu gostaria de ressaltar bem que, no Brasil, o nosso modelo do sistema de administração da Justiça criminal tem a parte, obviamente, preventiva; começa com a repressão imediata - que está exatamente a cargo da Polícia Militar -, e nada impede que ela inicie ali, na repressão imediata, as investigações iniciais, arrolando testemunhas, fazendo acontecer. Não há nenhum impedimento quanto a isso. Essa é a repressão imediata, que todos nós já discutimos na tramitação do §7º do art. 144, e não se conseguiu até hoje, desde 1988, regulamentar esse sistema, em que a parte imediata está a cargo da Polícia Militar. Nada a impede de arrolar testemunhas. Ela não tem uma posição estática. Ela pode fazer as investigações iniciais sim. Nunca houve nenhuma vedação. Ela não vai, depois, fazer o inquérito policial, a investigação, mas a parte inicial não. Ela está lá, chegou ao local. Se eu cheguei ao local, não vou ficar só parado no local, e sim procurar saber quem foi, como é que foi. As investigações iniciais podem ser feitas. É exatamente a repressão imediata. E no art. 144, §7º, de um dos projetos que tramitam na Câmara, está lá a repressão. Então, isso é fundamental.
Senador Randolfe, com toda honestidade - conceitualmente falando -, desde a Constituição de 1988, nenhuma regra infraconstitucional se conseguiu, por falta de acordo, por falta de entendimento, quer em relação ao sistema previsto no §7º, quer na disciplina, organização, funcionamento desses órgãos todos, para garantir a eficiência de suas atividades, o que é perfeitamente possível. Mas não se conseguiu.
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A Lei Orgânica da Polícia Federal também não conseguiu avançar, existe a Lei Orgânica das Polícias Civis, das Polícias Militares, por que não? Ainda é o Decreto-Lei nº 667/1969, com a alteração do Decreto-Lei nº 1.072.
Então, eu fico me perguntando, talvez, como, permita-me dizer, o decano dos decanos que aqui esteja, nesta discussão, ao vivo, não lendo nos livros, e, sim, participando integralmente disso desde a década de 60, em 1967, inclusive, eu acompanhei isso tudo.
O fato é que é extremamente difícil, quer dizer, não se conseguiram, até hoje, os acordos para a regulamentação do sistema, que eram importantes, nem as leis orgânicas, então as dificuldades também nas emendas constitucionais são muito mais naturais. Nós temos mais de dez na Câmara dos Deputados, aqui também temos algumas. Então, esse debate é altamente oportuno, mais uma vez, para a discussão, mas para que, de forma pragmática, nós pensemos que se há a ideia, se assim entender o Congresso Nacional, de que a fusão, a unificação da polícia, como unificada, que aqui está, seria o modelo melhor para o País, todos nós, evidentemente, vamos concordar. Quem decide é o Congresso Nacional. Mas, o que sucede? Nessa questão das propostas, em que prevalece a maioria, seja na PEC 430, na Câmara dos Deputados - as outras estão apensadas a ela -, sejam as daqui, fala-se sempre em unificação, com desmilitarização das polícias militares. Eu não sei se realmente seria desmilitarização, porque acaba sendo uma consequência para essa ideia de querer fazer o ciclo completo.
Então, com todo o respeito, evidentemente nós temos que entender que, nessa contribuição - porque, mais uma vez, aqui estamos para trocar essas ideias -, é importante que se consiga a vinculação permanente. Isso é fundamental. Das demais, em termos de hipótese de unificação, também discordo, com todo o respeito ao que eu ouvi aqui, Dr. Leandro, a questão da faculdade.
(Soa a campainha.)
O SR. WLADIMIR SÉRGIO REALE - Essa questão do Pacto Federativo também pode ter um sentido maior, que possa abranger tudo, e não necessariamente a questão de forma facultativa para o Estado. Aí é que nós teremos o grande problema, porque nós não temos mais... O Código de Processo Penal nosso é nacional e vai continuar sendo nacional. Então, amanhã, quando colocar cada instituição de uma forma diferente - nós tivemos antes, na década de 30, nós tínhamos o Código de Processo Estadual até 1932 -, e cada Estado amanhã, como quer São Paulo, com aquela proposta do atual secretário de segurança pública, delegar aos Estados as regras desse procedimento, aí sim as divergências provavelmente serão ainda muito maiores. Então, eu penso que isso deve ser visto com muito amadurecimento.
Eu até, cá entre nós, acharia melhor mesmo regulamentar essas coisas que estão ao alcance da mão do que buscar toda agora essa alteração tão profunda.
Na Polícia Federal, digo sempre que tive a honra de participar também daquela Casa por um certo tempo e daqui também, ajudando nesse embate.
Nós, fazendo a conclusão, entendemos que a PEC 102 tem alguns aspectos interessantes, sobretudo em relação à vinculação.
O Conselho Nacional de Polícia, também, de caráter social, dará uma amplitude muito maior, porque está demonstrado que o controle externo da atividade policial nunca funcionou, porque uma entidade, um órgão não vai conseguir comandar ou controlar outro órgão, porque eles não são poderes. Ele é um órgão, e, como órgão, fica acontecendo o que está aí até hoje. Dentro da linha deles, o que eles querem - repito e finalizando - transformar as polícias como seus órgãos de execução, para que eles tenham maior "poder" - entre aspas -, aqui, controlando os demais Poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário. Vejam, no dia a dia, o que está acontecendo, sobretudo praticando a judicialização da política.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - Dr. Wladimir Sérgio Reale, Vice-Presidente Jurídico da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil, quero agradecer sua exposição aqui.
Nosso último conferencista, expositor desta manhã tarde, Sr. Janio Bosco Gandra, Presidente da Confederação Brasileira dos Trabalhadores Policiais Civis.
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O SR. JANIO BOSCO GANDRA - Queremos agradecer o convite formulado pelo Presidente e Relator das matérias, Senador Randolfe Rodrigues - amazônida, assim como eu e outros que estão aqui.
Quero saudar a todos os representantes que aqui estiveram durante essa manhã, a partir das 10 horas. Sou o último orador e, geralmente, o que fica por último tem duas opções: ou comenta e faz uma síntese e emite sua opinião pessoal de todas as falas dos que o precederam, ou faz uma fala totalmente diferente, aborda, até porque temos um tempo limitado para fazer essa abordagem.
Como representante da categoria Polícia Civil, tenho a obrigação de estar presente e emitir o posicionamento da entidade. É claro que nem sempre é o posicionamento pessoal, mas o que interessa, nesse momento da audiência pública, é o posicionamento da entidade, até porque não foi convidada a pessoa que representa a entidade e, sim, a entidade; claro que, como representante da entidade, me faço presente na qualidade de Presidente da Confederação Brasileira de Trabalhadores Policiais Civis.
Viemos aqui tratar da PEC 102 e das demais que estão a ela apensadas, que o Relator é o Senador Randolfe e que já se pronunciou que irá realizar outros encontros, outros debates como esse.
Como representantes sindicais, não podemos nos omitir diante dos debates, não vamos nunca desistir de debater, até porque entendemos que todo processo de mudança no País que quer exercitar a democracia tem que passar pelo debate, até, às vezes, debates calorosos e mesmo oportunistas e irresponsáveis que estamos vendo desses "policiólogos" que se dizem conhecedores da segurança pública do nosso País e que tratam de impor fórmulas de mudanças, porque o que é fato todos nós conhecemos e o povo brasileiro conhece.
Desde 1500, quando aportaram lá na Bahia, não temos uma política nacional de segurança pública. Nunca nenhum Governo Federal teve a oportunidade ou quis fazer ter a oportunidade de enfrentar esse problema. E o problema, pessoal, é mais embaixo. Não é questão de ciclo completo apenas não, porque ciclo completo não vai mudar a insegurança com que vivemos. Portanto, é balela afirmar e dizer que só o ciclo, por si só, vamos mudar da água para o vinho. Isso é falácia. Sabíamos disso!
Participamos de todos os debates. Todos eles têm o condão do ciclo completo. Aí eu fiz uma pesquisa na nossa base e perguntei: "O que é o ciclo completo?" Houve uma grande interrogação. O que é ciclo completo? Começa, termina, quem faz, quem não faz, o que é? E vimos que ainda essa expressão "ciclo completo" é muito boa para chamar para um debate e, talvez, a forma e a metodologia que estamos fazendo para chamar para o debate de uma grande mudança na segurança pública, talvez o ciclo completo tem sido o carro-chefe para dizer: "A segurança pública não vai bem, há muitas mortes no País, mais de 50 mil mortes etc".
Ora, todos sabemos que a segurança pública vai mal. A Polícia Civil, que é a instituição a que pertencemos e temos vasta autoridade para falar sobre ela, não como representante da instituição, mas representante dos membros que estão labutando no cotidiano, nós entendemos que temos mazelas, Sr. Presidente. Elas existem e são muitas.
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Uma delas, que nós poderemos encontrar, é a falta de uma estrutura, de uma padronização das nomenclaturas. Lá em São Paulo, são mais de 15 nomenclaturas para o policial civil. Há o telemático e tantos e tantos outros. No Norte, já há uma outra nomenclatura; no Sul, há o inspetor. Então, é uma balbúrdia que existe no nosso País, apesar de que o Código de Processo Penal é uno para os brasileiros.
Então, se nós vamos tentar fazer uma mudança profunda na segurança pública, a confederação entende que tem que passar pela valorização dos membros da instituição. Sem isso, nós não podemos dar nenhum passo, sob pena de estarmos tentando copiar modelos de outros países mais avançados do que o nosso, mas onde a valorização existe, enquanto aqui não existe.
Os colegas que representam a Polícia Militar... Aproveito o colega que aqui está para nos solidarizar com essa falta de coerência por parte da nossa Presidente da República, que vetou o projeto de lei que foi trabalhado aqui nas duas Casas, anistiando os policiais militares que reivindicavam salário. Por essa incoerência, fica, então, a nossa solidariedade a todos aqueles pais de família que trabalham no dia a dia. Se eles revindicam é porque utilizam o salário para bancar as suas despesas e as de sua família. Aquele que não reivindica, para mim, nós temos que ficar de olho, porque, se ele não reivindica é porque ele não precisa e tem uma outra fonte de renda. Portanto, nós somos defensores, sim, de que toda a categoria tem direito de reivindicar, e, para tanto, não deve haver punição alguma.
Voltando ao tema, nós entendemos que a PEC 102 é eivada de inconstitucionalidade. A Cobrapol não pode e não aceita ainda se tratar de unificação das polícias quando ambas vão mal das pernas. Como nós vamos poder unificar duas instituições que possuem mazelas - e muitas mazelas -, não só a Polícia Civil, mas também a Polícia Militar? Quais as mazelas que poderíamos extirpar logo de pronto? A primeira é que ambas as polícias são divididas. Há a Polícia Militar, que tem o ingresso como soldado, por analogia às Forças Armadas. Eu nem sei se o nome deveria ser soldado. Particularmente, discordo. Acho que não deveria nem ter major, nem ter capitão, nem ter cabo, nem ter tenente-coronel nessa estrutura militar. Esse é um posicionamento meu. Acho que deveria ter o policial militar e o corpo superior, como acontece com todos os outros países. Lá na Gendarmerie, por exemplo, não há tenente-coronel, não há capelão, não há capitão, como, no Chile, também não há. Então, tem que ver essas diferenças todas. A nossa Polícia Militar é, sim, diferente das demais polícias do país.
A Polícia Civil, da mesma forma, totalmente diferente. Por quê? Porque o ingresso na polícia não é na base. O ingresso é nas carreiras. Então, se você vai ser, por exemplo, no meu Estado, investigador, você ingressa como investigador e termina como investigador. Como escrivão: ingressa como escrivão e termina como escrivão. Não há expectativa nenhuma de crescimento profissional.
Os cargos superiores são ocupados pelos delegados, cujo ingresso também é lá no topo da carreira. Ele faz uma faculdade muito bem-feita, passa no concurso para delegado e vai chefiar equipes de policiais experientes, com mais de 25 anos de Polícia.
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Isso está errado. Esse é um cancro que a Polícia Civil carrega e que traz essas confusões todas e esses problemas interclasse.
E na Polícia Militar? Da mesma forma. Por sinal, são três polícias dentro de uma só: tem a polícia dos praças, que vai até subtenente; depois tem a dos aspirantes, que é dos tenentes; e depois tem até dos superiores, que são os tenentes-coronéis. Os superiores: major, tenente-coronel e coronel.
Ora, se o ingresso não possibilita para o policial, que vai ter que ser avaliado pela sua conduta, pela sua disciplina, pelo seu caráter laboral, como então nós vamos poder aferir, para que possa haver promoções? Diferentemente da Polícia Rodoviária, que também já está tendo os seus problemas, as suas mazelas, vocês estão buscando reestruturação, então se estão buscando reestruturação é porque alguma coisa também não vai bem, alguma coisa não vai bem.
Então, a gente pode concluir dizendo o seguinte: nosso sistema de segurança pública não vai bem. A questão do ciclo completo, que nós até entendemos que vamos ter que passar por essa discussão sim, nós vamos ter que passar por essa discussão, mas lá na frente. Antes, é necessário que a gente corrija a verba carimbada para a segurança pública, como já tem aqui no Senado a PEC 24, aprovada aqui na CCJ, e nós temos que também, antes de tudo, criar o cargo único de ingresso.
Eu não sei também por que bacharel em Direito para delegado; é exigido curso de bacharel em Direito para policial eu também não sei por quê. Nós não entendemos como confederação, e nem sabemos onde que está na Constituição que, para ser delegado, tem que se exigir o curso de bacharel em Direito. Para ser coronel ou para fazer concurso para oficialato da Polícia Militar, em alguns Estados, também se exige curso de Direito. Ora, se a Polícia vai mal por conta do delegado, desse sistema, por que é que a Polícia Militar também está buscando esse sistema anacrônico e falido?
Então, tem algumas incoerências nas propostas. É preciso que a gente abra o peito e diga: o Governo sabe que o policial militar faz bico para poder sustentar a sua família? O Brasil sabe quanto que o policial militar recebe e o policial civil? Não seria melhor, então, nós corrigirmos essas distorções salariais, colocarmos ao molde do Ministério Público, que ganha muito bem? Também um plano de cargos, para que a gente possa, o policial, ser bem remunerado, não seria melhor a gente tratar de um plano de cargos federalizado, que seria aplicado a todas as polícias, a todos os membros das polícias Brasil afora, como é também a mesma legislação penal, que serve aqui no Acre, serve no Rio Grande do Sul e no Rio Grande do Norte, se a mesma legislação de persecução penal, onde está trazendo o Código de Processo Penal, é una, será que não poderíamos também ter um salário unificado? Eu acho que sim.
Quanto à questão da 102, e já para concluir, eu quero dizer que, infelizmente, o membro da Associação dos Procuradores da República teve que se ausentar, então eu vou fazer apenas, vou tecer um comentário, não na sua fala, mas dizer que eles já, em relação à PEC 102, Senador Randolfe, disseram o seguinte: "PEC que unifica polícias é inconstitucional, defende a ANPR". Então, eles dizem aqui, na nota deles, pública, que eles não defendem essa Emenda nº 102, apesar de estar contidas nela algumas mudanças no intuito de acertar.
É preciso, então, que a gente faça um pacto se quisermos mudar. Se quisermos mudar a segurança pública, se quisermos colocar uma política nacional de segurança pública, é necessário que a gente comece a enfrentar logo, de cara, a questão do ingresso de polícia, do ingresso na carreira da polícia.
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Por que as academias de polícia não se unificam? Por que não se prepararem, então, para que possamos adequar à polícia, não à polícia única, pois a confederação rechaça essa ideia de polícia única, até porque ambas têm a sua gênese totalmente diferente. É necessário que haja mudanças estruturais muito profundas - e eu, particularmente, acredito que não vão acontecer -, até porque já se questiona se o Governo Federal vai permitir, como já foi dito aqui, que haja greve na polícia una? "Ah, eu acho que não". Então, é utopia tentarmos buscar isso. Mas não podemos fugir do debate.
Agradecemos poder contar pelo menos com os Senadores, com os Parlamentares que nos convidam. Nós já estivemos aqui. É a nossa segunda participação, nesta mesma Casa, tratando de segurança pública. Vimos que havia aqui o Senador Pedro Taques, com quem debatemos. Eu fui muito cético na época e disse que não acreditava muito nessas propostas mirabolantes e complexas de uma mudança estrutural profunda que vai acontecer ao estanque. Eu acho que mudanças têm de acontecer sim, porque segurança pública tem as suas deficiências, em todos os órgãos, mas elas devem ser sim de maneira responsável, prevalecendo, acima de tudo, a mudança no tratamento que os Governos, tanto Estaduais como o Governo Federal, dispensam a seus membros.
É necessário, sim, que possamos discutir o ciclo completo, pois vamos passar por isso, mas antes temos de adotar outras mudanças. Como já foi dito aqui, por exemplo, desde 1988, Senador, para concluir, que vimos a Carta Cidadã, que possui um comando, no art. 144, para regulamentar, através do seu §7º, que poderia delimitar as atribuições de cada uma das forças. Eu acho que esse é um papel preponderante para começarmos a mudança. Depois, nós vamos tirando as mazelas - mazelas da Polícia Civil, mazelas da Polícia Militar, as mazelas, se existem, da Polícia Federal, pois parece que existem algumas; na Polícia Rodoviária também - de maneira que possamos, paulatinamente, com muito debate, aí sim enfrentar essa mudança pelo que o povo tanto anseia e, mais ainda, os profissionais da segurança pública.
Nós queremos um cargo único. Depois, nós vamos discutir o ciclo completo, a forma como se dará esse ciclo completo, se mitigado, se por território ou por tipificação penal.
(Soa a campainha.)
O SR. JANIO BOSCO GANDRA - Então, é essa a nossa contribuição. Nós temos uma proposta. Vamos encaminhá-la ao nobre Senador, que é justamente a unificação das academias, a criação de um curso de polícia com nível 3º Grau, abrigado, por meio de convênios, com as universidades e as academias. Aí sim nós poderemos mudar e, quem sabe um dia, nós vamos comemorar os índices de solucionabilidade que nós vamos mostrar para o nosso País.
Além do que nós sabemos que, se hoje, nós também não mudarmos, juntamente com o sistema carcerário, com o sistema prisional, que é falido da mesma forma que a segurança pública, nós também vamos ter um grande problema.
(Soa a campainha.)
O SR. JANIO BOSCO GANDRA - Onde vamos colocar os presos? São quinhentos e poucos mil presos, encarcerados. E quem encarcera o preso não é ninguém senão as polícias.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - Obrigado, Sr. Janio Bosco, Presidente da Confederação Brasileira dos Trabalhadores Policiais Civis.
Por força do Regimento, faço um questionamento a outro colega Senador aqui presente, o Senador José Medeiros, pois nós temos dois Deputados Federais, e gostaríamos de ouvir as posições deles. Refiro-me ao Deputado Federal Major Olímpio e o Deputado Subtenente Gonzaga, do PDT, de Minas Gerais.Consulto o Senador Medeiros se há alguma objeção em facultar a palavra a ambos.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Nenhuma.
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O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - De acordo.
Sendo assim, vamos ouvir as intervenções do Plenário, antes de passarmos à fase seguinte de conclusão desta audiência pública.
Pela ordem, passo inicialmente a palavra ao Senador José Medeiros.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Sr. Presidente, senhores convidados, todos que nos assistem aqui na CCJ, todos que nos acompanham pela TV Senado e pelas redes sociais, queria parabenizar o Senador Randolfe pela forma democrática com que está conduzindo esse assunto.
O assunto é extremamente polêmico e importante. Só pelas falas que ouvimos aqui, percebemos que há pontos controvertidos de toda sorte e visões diferentes. Mas, ao mesmo tempo, o tema aborda a vida da população, a vida da sociedade.
Alguém falou aqui - perdoem-me a falta de memória, pois não lembro qual dos debatedores - justamente sobre as listas de prioridades do ser humano. Lá em casa é assim: nós nos preocupamos muito com a saúde - lista de prioridade - e, logo em seguida, com a segurança. Mas, sem querer repisar o chavão, essa lista está invertida no País hoje. A segurança tem sido o patinho feio no que diz respeito às verbas, à lista de prioridade e à importância.
Quando vemos um Senador tratar de várias matérias, como o Senador Randolfe - este é um assunto que não dá voto, um assunto complicado -, ele tem que ser parabenizado. Parabenizo também todos vocês que estão aqui para discutir esse tema relevante.
Nós temos falado aqui sobre várias teses, sobre saídas, e eu trago o tema um pouco para a realidade ao me referir a uma delegacia de polícia por esses rincões agora. Falo do Estado de Mato Grosso, principalmente, onde há realidades interessantes. Às vezes, a distância entre um Município e outro é de 300km, 400km, e há um escrivão, um ou outro policial militar e um delegado para tomar conta de várias cidades. Em certas ocasiões, brincávamos ao dizer que ficava no Município só um "escravão" tomando conta da situação. Então, essa é a realidade.
Nós estamos falando sobre um assunto muito importante, muito sofisticado, e às vezes discutimos - nós temos que fazer isso. Mas, do ponto de vista do cidadão que recebe o serviço, faz-se aquela caricatura: geralmente é um prédio velho, sujo, com um policial mal-humorado para receber, e uma cela fedorenta, que, em finais de semana, se sobrecarrega, com uma fila imensa. Esse é o retrato da segurança pública que a sociedade recebe. Estou falando da realidade que eu conheço. Pode ser que, em algum Estado, a coisa funcione no estilo dos filmes de Hollywood que vemos, mas esse é o retrato que temos.
Além disso, há conflitos de toda sorte, como já foram citados aqui - não vou repisar. A grande discussão é: nós estamos contentes com esse modelo, com o que está aí? Temos que mudar o modelo? O que temos que fazer? Nesses debates aqui, com certeza vamos encontrar uma saída - e temos que encontrar. Não dá mais para continuar da forma como está, porque, no frigir dos ovos, quem está sendo prejudicado está pagando a conta, e a conta é cara. A conta da segurança brasileira não é barata.
Agora, algumas cadeias, por exemplo, são bem remuneradas, e em outras, como foi falado aqui, o sujeito ganha R$800 mil, com um agravante: a nossa sociedade - não sei se é uma questão cultural - não gosta de polícia - não gosta! E quem geralmente leva no lombo essas sapatadas é a Política Militar mesmo. Sempre digo que, quando acontece qualquer tragédia, o sujeito se lembra, primeiro, de Deus e, logo em seguida, do 190, mas a relação para por aí com os dois; só na próxima.
Então, o que acontece?
(Soa a campainha.)
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Já encerro, Sr. Presidente.
Foi falado aqui sobre os regulamentos - agora estou falando especificamente da Polícia Militar - que regem as relações lá dentro. Eles são realmente draconianos. No regulamento de Mato Grosso, por exemplo - eu estive dando uma olhada -, há um fato interessante.
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Se um soldado e um oficial cometerem uma falha, a mesma falha, dependendo, um vai para casa, fica em prisão domiciliar, e o policial, o praça vai para a grade. Nós precisamos evoluir nessa discussão. Isso parece uma coisa pequena - que o tema é amplo, e estamos discutindo questiúnculas aqui -, mas, não; essas coisinhas, essas raposinhas é que contaminam todo o sistema.
Quando digo que a relação da sociedade precisa mudar com esse policial, ela precisa, desde o salário até a relação de ser bem vista. Como eu digo, qualquer pai tem um orgulho danado de dizer: "Minha filha está se casando com o tenente fulano, ou com o delegado fulano". Mas ninguém fala: "Minha filha está se casando com o soldado fulano". Não! Sinceramente, nós temos essa percepção das pessoas, o que impacta, sim.
(Soa a campainha.)
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Nós tratamos mal a polícia e queremos um tratamento de primeira. Essa é a grande realidade. E isso é um problema grave. Como vamos mudar isso? Falando.
Então, Senador Randolfe, agradeço-lhe a tolerância e quero sempre estar neste debate, porque ele com certeza vai fazer com que nós possamos evoluir.
Aqui se falou - acho que foi o Dr. Leôncio - sobre a questão de não se fazer mudança alguma sem debater. É lógico; não tenho dúvidas. O Senador Randolfe é um democrata, já mostrou isso, e nós temos que ouvir muito e ficar roucos de falar sobre o tema, mas a algum lugar nós temos que ir. Não podemos é ficar parados.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - Eu que lhe agradeço, Senador Medeiros. V. Exª, junto comigo, relata matérias que confluem para tratar da estruturação do sistema de segurança pública e da polícia no Brasil. Tenho certeza de que esta audiência e as próximas, inclusive as faremos juntos, porque temos relatórios em conjunto, relatórios sobre temas similares para apresentar a esta Comissão de Constituição e Justiça.
Tenho o prazer de ouvir o Deputado Federal Major Olimpio.
O SR. MAJOR OLIMPIO (PDT - SP) - Senador Randolfe, Senador José Medeiros, quero cumprimentar esta Casa, cumprimentar a condução dos trabalhos por V. Exªs, dizer que compareço, e compareci, humildemente, para aprender, e saio com esse sentimento do aprendizado.
Ingressei na Polícia Militar em 1978, portanto, há mais de 37 anos, e desde o primeiro dia estou ouvindo que temos que fazer mudanças urgentes. Confesso que não desanimo, mas a grande verdade é que a segurança pública está podre, está falida há muitos anos, na sua estrutura, na forma arraigada de lutas corporativistas e classistas. E o fato - e aí falo mais como um velho policial - é que os policiais de verdade, que são a grande maioria, na corporação em que estejam, não aguentam mais. Aparecem os "ólogos", "policiólogos", exatamente porque vai passando o tempo - o Dr. Reale falava, até citou um grande professor meu, o Coronel Terra, e, na Constituinte, acho que só o senhor e o Miler já estavam aqui na luta naquele momento - e não há expectativa de mudança.
Nós estamos falando, por exemplo, em unificação, Senador, e eu faço uma sugestão a V. Exª. Estou com o Gonzaga discutindo o ciclo completo, e nós temos essa preocupação. A sugestão minha a V. Exª e ao Senado é procurarmos os órgãos técnicos, a academia, os "ólogos" para saber quanto custaria, de fato, um processo de unificação de polícias no País? Quantos anos, quantas gerações custaria fazer isso?
Vejo a PEC do Senador Blairo. Facultar para o Estado é o mesmo que tentar revogar a lei da gravidade. Nenhum governador vai ter nem o recurso, Gandra. Você fala no fundo, e vamos lutar pelo fundo, mas ele não é uma realidade ainda, e só com boa vontade não se chega à Lua, não. É preciso amadurecer a luta por valorização profissional é uma verdade. As meias verdades que são colocadas hoje para a opinião pública. O fato de ter o estatuto militar significa que é violento.
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E até o Leôncio falava da baixa letalidade da Polícia Federal, mas quem trabalha com polícia ostensiva, meu caro, que tem o elemento surpresa contra, é diferente. Respeito o papel constitucional, mas, por exemplo, a Polícia Federal raríssimas vezes está em enfrentamentos com criminosos, há colarinho branco, há Senador ladrão, há desembargador que é preso, há de tudo, mas, possivelmente, um Senador não vai reagir à prisão dando tiro contra o policial. Eu até vi o currículo de V. Exª, ingressou na Polícia Federal em 2013, depois me conta se já teve alguma ação armada em que atiraram em V. Exª. E depois conta, Alessandro, você, oficial de polícia em Goiás, em quantas vezes já tiraram em você e quantos companheiros você já enterrou no cumprimento da missão.
Então, falar simplesmente, jogar o fato de estar regido por um estatuto militar significa que eu seja violento; começaram a me treinar para ser violento e matador em 1º de fevereiro de 1978.
(Soa a campainha.)
O SR. MAJOR OLIMPIO (PDT - SP) - Isso são coisas que não dá para aceitar.
O ciclo completo de polícia, o Gonzaga realmente tem uma grandeza nisso e tem impulsionado a discussão em todo o País, e nós também temos essa preocupação: quanto custa isso, como é que vai se fazer de fato isso? Realmente nós não temos legislação em outros países falando com a terminologia "ciclo completo", que é tão óbvio, que todo mundo pratica com tanta intensidade, que parece uma idiotice nós termos meias polícias como nós temos no Brasil.
Mas, Senador, eu estou aqui para cumprimentá-lo, já me coloquei, antes da minha manifestação, à disposição de V. Exª. Tenho certeza que o Gonzaga, as comissões estão discutindo na Câmara dos Deputados, nós temos todo o interesse do mundo de fazemos audiências públicas conjuntas, é um processo de aprendizado. Nós vamos ter que ouvir, sim, nós temos que evoluir, sim, falar em carreira única - talvez haja impropriedade constitucional -, mas o acesso único. As próprias Polícias Militares têm que enfrentar isso, sim, tem que discutir, sim, que o soldado de polícia possa ingressar hoje com o sonho de ser comandante da força policial; que possa se ingressar na Polícia Rodoviária Federal, na Polícia Civil, na Polícia Federal com o sonho de dirigi-la. Para ser gestor público, para ser dirigente, para ser capaz na Administração Pública, isso é um outro assunto que nós temos que debater com profundidade, se é necessário o curso de Direito, ou curso de Administração, a formação superior, a formação específica para gestor de polícia. Por enquanto, muitas vezes, nas nossas lutas, nós estamos tentando dar cotovelada e disputando o torneio de maior anão do mundo, e não estamos chegando a absolutamente nada.
Então, eu quero deixar aqui o meu posicionamento, dizer que o debate mais do que aberto há de ser feito, dizer exatamente, Dr. Reale, quando se fala no termo circunstanciado é uma forma de dizer: "Pelo amor de Deus, gente, vamos fazer alguma coisa, nós estamos fazendo fila de uma polícia para apresentar para a outra, uma travando a outra, a outra dizendo que é autoridade, além de autoridade para tratá-la de excelência, que, além de autoridade, é também excelência", e não acontece absolutamente nada.
Quando se dá o dado oficial, Senador, de 8% dos homicídios esclarecidos, o Governo de todas as áreas e as polícias pulam e dizem: "Não, nós esclarecemos 40%". Sabe por que, Senador? Porque quando o senhor vai pesquisar no registro de um homicídio, se já está lavrado no encaminhamento pelas polícias militares, pelas guardas civis, pela Polícia Rodoviária Federal, dizendo da autoria ali que está conhecida, nós colocamos na estatística que nós esclarecemos, quando, de verdade mesmo, de cada 100 pessoas assassinadas neste País, só oito nós esclarecemos a autoria. Se nós formos para crimes outros, nós só esclarecemos 2%.
E exatamente o que nós estamos dizendo é o seguinte: nós precisamos empoderar, dar condição a todas as forças policiais para fazerem melhor e com maior intensidade.
(Soa a campainha.)
O SR. MAJOR OLIMPIO (PDT - SP) - Só para concluir, Senador, quando nós falamos ainda de modelos inexistentes de Polícias Militares, depois eu vou encaminhar a V. Exª, 66 países que têm Polícias Militares hoje na sua estrutura, quando nós falamos, e exatamente porque, para demonstrar, que fala: "Não, isso é um braço autoritário, resquício de governo autoritário, de forma nenhuma.
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E nós queremos participar. Dentro desse processo nós temos uma obrigação. Comungo do que foi manifestado por alguns dos senhores aqui. Não será uma coisa que será feita em um mês, em um ano. Talvez uma geração faça, mas nós temos que impulsionar.
Parabéns a V. Exªs aqui no Senado. Nós também acompanharemos e vamos fazer a nossa mobilização na Câmara dos Deputados.
Parabéns, Senador!
O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - Major Olímpio, nós que agradecemos e antecipo a nossa disposição de que as próximas audiências sejam inclusive em conjunto com a Câmara dos Deputados, com a comissão que está tratando de temas similares, de PECs similares também na Câmara dos Deputados.
Tenho o prazer então de passar a palavra ao Deputado Subtenente Gonzaga.
Temos a satisfação de receber agora o Sr. Oséias Francisco da Silva, Presidente da Confederação Nacional dos Guardas Municipais. Parece-me que houve problema no voo para chegar aqui, mas lhe concederei, Oséias, os cinco minutos finais e a honra de concluir essa nossa audiência pública. Após a fala do Deputado Subtenente Gonzaga, o senhor será o último orador, com os seus minutos para conclusão desta audiência.
Agradeço ao Dr. Leôncio, que tem que sair.
Queria só registrar, o que já falei para o Dr. Leôncio também, Presidente da Associação dos Delegadas, e aqui me comprometo que a próxima audiência seja em conjunto com a Câmara, e vamos fazer as tratativas para isso, que também assumo aqui o compromisso de convidar o Ministério da Justiça para a audiência seguinte.
Deputado Subtenente Gonzaga, nosso penúltimo orador desta audiência pública como a palavra.
O SR. SUBTENENTE GONZAGA (PDT - MG) - ExSenador Randolfe, primeiro quero cumprimentá-lo pela iniciativa da audiência, pela deferência de nos permitir aqui a palavra.
Não estive presente desde o início porque estava presidindo uma audiência pública na Comissão de Agricultura da Câmara, onde eu era o requerente.
Antes de mais nada, eu queria, aqui, expor a nossa indignação com a decisão da Presidente Dilma que, somente nos últimos 20 dias, vetou dois projetos de interesse dos policiais, do segmento de segurança pública.
Primeiro, ela vetou a nossa proposta de criar um programa nacional de habitação para os profissionais de segurança pública, que era uma proposta sem nenhum custo financeiro, que apenas criava uma política pública, criava um laço jurídico, que houve aprovação, por unanimidade, tanto na Câmara quanto no Senado, e ela vetou. E agora vetou também o projeto de anistia, agora sim específico dos policiais, bombeiros e militares.
Quero manifestar aqui a nossa indignação porque o Governo, com a oportunidade que tem de dar um sinal pelo menos de respeito, de interesse, de reconhecimento com os profissionais de segurança pública com relação a habitação e para os policiais e bombeiros em relação a anistia, prefere o caminho do desprezo, do menosprezo. Eu gostaria muito de entender essas razões, porque, para mim, até agora, são incompreensíveis.
Eu pedi também para poder me manifestar, Senador, porque na Câmara federal também tramitam várias PECs, são sete PECs, seis apensadas à PEC 430, sobre esse mesmo tema, e inclusive uma das PECs, a 431, de 2014, de minha autoria.
A Câmara realizou, pela CCJ, nos meses de setembro, outubro e novembro, nada menos que 12 audiências públicas, sendo duas no Distrito Federal, aqui na Câmara, e as demais em vários Estados do Brasil, debatendo esse tema com esses segmentos, e muitos deles estão aqui presentes nessa audiência. E aproveito para cumprimentar a todos, porque nós temos feito esse debate em outros espaços, praticamente as mesmas representações.
O Gandra encerrou a fala dele fazendo muitos questionamentos. Será que é isso? Será que é aquilo?
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Na nossa convicção, tanto a proposta da PEC 102 quantos as propostas que estão na Câmara, que vão na linha da unificação das polícias, visam resolver um problema diagnosticado, que é o problema da solução de continuidade que os modelos de polícia no Brasil impõem. Então, as propostas que defendem a descentralização estão buscando resolver o problema da eficácia na investigação, da eficácia no processo, que o modelo partido de polícia impõe.
Portanto, o ciclo completo está presente em todas estas PECs, na PEC 102, na PEC 51. E ainda que a 102 não traga a expressão ciclo completo como princípio, mas a 51 traz o ciclo completo como uma proposta concreta.
Na Câmara a PEC 423, a PEC 431, a PEC 127, a PEC 89, todas propõem e tratam da questão da ineficácia da atuação das polícias do Brasil sob a perspectiva de ter que termos polícia de ciclo completo.
Portanto, todas as PECs, na minha convicção, tratam de um mesmo problema que é a ineficiência. E nós temos um princípio constitucional imposto à Administração Pública no Brasil que é o princípio da eficiência.
Então, o ciclo completo se impõe como premissa de eficiência para a Administração Pública e diz respeito à atuação das polícias do Brasil.
Eu quero apenas somar-me, aqui, às manifestações do Deputado Major Olimpio, dizendo que nós criamos e instalamos na Câmara Federal uma Frente Parlamentar de Apoio à Adoção, no Brasil, da Polícia de Ciclo Completo, e que me coube a coordenação, a Presidência, e ao Major Olimpio a Vice-Presidência.
Quero fazer tratativas para que nós possamos transformar em uma frente mista da Câmara e do Senado para esse assunto, porque eu entendo que a unificação ou o ciclo completo, uma medida dessa não virá por vontade de um ou de outro de nós, por pressão de um do outro de nós, ela se impõe, mas se impõe também como uma decisão de Estado. Fazer uma mudança na forma de atuação de organização das polícias no Brasil é uma decisão do Estado brasileiro.
Então, por mais que nós tenhamos boa vontade, tenhamos nossas convicções, a minha convicção é que nós precisamos envolver o Estado e envolver o Estado a partir da Câmara e do Senado, mas, também, a partir do Executivo.
Por isso, acho importante nós transformamos a Frente, inclusive, em uma Frente mista da Câmara e do Senado.
Mas eu queria insistir na defesa da alteração, porque nós, inclusive, nos apropriamos de uma expressão trazida, pelo menos do que eu tive conhecimento a partir do Dr. Luis Eduardo Soares, quando ele diz que nós precisamos de uma nova arquitetura para a segurança pública. E, nessa nova arquitetura, nós precisamos efetivamente pensar a eficiência, e a eficiência passa pela adoção do Brasil pela polícia de ciclo completo.
Na minha convicção, quando nós propomos a solução desse problema, a partir da unificação, nós reduzimos os problemas em duas polícias e, por consequência, apontamos as soluções em duas polícias. Mas o Brasil já possui sete agências que compõem o sistema de segurança pública, ainda que nem todas estejam no 144, como é o caso dos Agentes Penitenciários, mas nós temos a Polícias Civil, nós temos as Polícias Militares, nós temos a Polícia Rodoviária Federal, temos os Guardas Municipais, temos os Agentes de Trânsito, temos os Agentes Penitenciários e temos o Corpo de Bombeiros, fazem parte de um mesmo sistema; há a Força Nacional, que podemos chamar de uma outra agência.
Então, quando nós apresentamos como solução de um mesmo diagnóstico, que é baixa a eficácia na investigação policial no Brasil, que é excessiva a perda de recursos financeiros e humanos quando nós temos que fazer esse retrabalho pela Polícia Civil daquilo que as Polícia Militar, Rodoviária e a Guarda já fizeram, que é excessiva a perda de tempo e dinheiro jogado fora nos deslocamentos que os policiais têm que fazer para ir a uma delegacia para um simples registro de TCO, que é o absurdo que se joga no lixo de informações concretas, precisas, de identificação de autoria e materialidade de crimes feito pela Polícia Rodoviária Federal, feito pelas polícias militares, feito pelos Guardas Municipais, feito pelos Agentes Penitenciários dentro das penitenciárias, que, por falta do empoderamento legal de fazer o ciclo completo e, portanto, de poder investigar, é jogado na lata de lixo.
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Eu sou de Minas Gerais e afirmo, com muita convicção, que pelo menos 80% dos crimes em Minas Gerais estão apurados pela Polícia Militar, que atua. E em 504 Municípios de Minas Gerais, não há sequer uma delegacia da Polícia Civil. E aos sábados, domingos e feriados e à noite, de 19 às 7 da manhã, apenas em 59 Municípios nós temos delegacia aberta.
Portanto, os policiais militares, os policiais rodoviários federais nas estradas, os guardas municipais no território hoje a eles destinado estão apurando, têm identificação de autoria e materialidade de crimes, que têm que jogar na lata de lixo, porque eles, se levarem para a delegacia, se levarem para a Polícia Civil, vão ser processados por usurpação de função.
Não se admite no Brasil, com os números - pelo menos é o que as estatísticas e as pesquisas apontaram, e o Deputado Major Olimpio reproduziu aqui de forma muito apropriada -, com esse baixo índice de elucidação, que nós joguemos na lata de lixo informações preciosas colhidas no dia a dia por todos os agentes de polícia. Portanto, o ciclo completo se impõe pela realidade da segurança pública no Brasil. Não é mais resultado ou objeto da vontade de ninguém ou de uma corporação.
Precisamos desconstruir o raciocínio que se tentou implementar, que se tentou convencer, de que é o ciclo completo da Polícia Militar. Não. Eu posso falar com muita tranquilidade, porque estou debatendo esse assunto todos os dias. Portanto, o que eu estou falando aqui, eu estou repetindo todos os dias. Nós não estamos apontando o ciclo completo para a Polícia Militar; nós estamos apontando o ciclo completo para todas as agências de segurança pública do Brasil. Nós estamos apontando o ciclo completo para os guardas municipais. O território que eles ocupam hoje, se vão expandir esse território, se vão expandir o tipo de crime em que eles vão atuar é uma discussão a ser feita; mas nós não podemos admitir que no território em que eles estão hoje definidos, pelo menos se considerarmos sua origem, que eles não façam no mínimo o TCO. Nós não podemos admitir que os agentes penitenciários, únicos agentes do Estado num território específico, que é o interior das penitenciárias, que eles não possam fazer das informações diárias de prática de crimes que acontecem dentro das penitenciárias, que eles tenham que jogar tudo na lata de lixo pela falta de empoderamento legal de transformar aquela informação e dizer que foi investigado. "Está aqui".
(Soa a campainha.)
O SR. SUBTENENTE GONZAGA (PDT - MG) - Qualquer um que for transformar essas informações, que for transformar isso num processo formal e legal de investigação tem que assinar embaixo, tem que se responsabilizar. Nós não tratamos de menino e nem de irresponsável, nós estamos falando de Estado. E nós temos competências, delegações diferentes, mas nós temos um conjunto de servidores com competência técnica, de formação, de treinamento. E ainda que não tenhamos, há espaço e necessidade de se formar.
Nós não estamos falando que de um dia para o outro serão mil maravilhas. Nós estamos falando de uma mudança necessária na estrutura, na arquitetura. Mas para isso, Senador Randolfe, nós precisamos pensar. Eu tenho insistido que o ciclo completo é uma condicionante para a eficácia, é uma condicionante para a eficiência. Mas obviamente não é esse o único problema.
Nós precisamos ter coragem, sim, de defender e aprovar a autonomia das perícias. A perícia não pode, os peritos e a perícia não podem estar presos apenas a um delegado orientando o inquérito. A perícia tem que atender todas as outras agências. Nós temos agentes de controle interno que investigam. Os auditores fiscais, AGU, CGU, TCU, todos trabalham num processo de investigação, e a perícia tem que atender a todos.
Nós precisamos pensar e consolidar um sistema. O fato de nós estarmos defendendo que todas as polícias e todas as agências tenham a competência legal, o empoderamento legal de fazer o ciclo completo, que elas atuem a seu bel-prazer.
(Soa a campainha.)
O SR. SUBTENENTE GONZAGA (PDT - MG) - Nós precisamos consolidar um sistema. Temos o Susp - Sistema Único de Segurança Pública - aí colocado, e eu acho que o Susp é a referência. Mas é um absurdo que, no Brasil, nós não tenhamos um ministério da segurança pública. E se não for possível um ministério da segurança, deve haver uma agência capaz de fazer a interlocução, o diálogo, e transformar tudo isso num sistema, transformar a política numa política sistêmica, envolvendo União, Estado e Município.
É um absurdo que a União, para dialogar com os Municípios, com os Estados, dialogue por meio de entidades de classe, porque não pode ter uma orientação direta para o governador, não pode ter orientação direta para um chefe de polícia ou comandante das polícias! Tem que dialogar por meio do CNCG, do colegiado de conselhos, do colégio de secretários, do conselho de chefes de polícia.
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Então, é fundamental que tenhamos todos a autonomia do ciclo completo, mas que tenhamos um sistema que funcione e coordene todo esse processo.
Nós precisamos e temos que admitir, e aí somos nós, policiais, que temos que ter a coragem de falar do controle externo. E eu não falo do controle externo do Ministério Público. Para mim, todos os agentes de Estado que fazem controle externo estão fazendo controle externo para o Governo.
Nós precisamos empoderar a sociedade. E aí defendemos, sim, um conselho de segurança pública, mas que não enxergue apenas o soldado, que enxergue o Ministério Público, que enxergue o Poder Judiciário, que enxergue o sistema prisional e que tenha o empoderamento da sociedade civil e dos trabalhadores, dos gestores. Temos vários conselhos funcionando com esse formato. Precisamos empoderar para, de fato, fazer o controle externo.
Da mesma forma, defendemos, e aí eu trago um posicionamento que é fruto do debate com relação ao acesso único à carreira.
(Soa a campainha.)
O SR. SUBTENENTE GONZAGA (PDT - MG) - Essa é uma reivindicação histórica da base da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros. É uma reivindicação histórica dos agentes da Polícia Civil e dos agentes da Polícia Federal.
Institucionalmente, nem os delegados nem os oficiais admitiam isso. Mas, nas polícias militares, nos corpos de bombeiros, começa um passo, que é pequeno em relação a tudo que nós temos que caminhar, mas gigante do ponto de vista de uma mudança de postura pelo menos de parte dos policiais, de parte do comandantes, que assumem. E Minas Gerais é um dos Estados que eu posso falar. O comando da Polícia Militar, portanto a Polícia Militar de Minas Gerais passa a defender o acesso único como uma premissa de valorização não condicionante do ciclo completo, mas como uma premissa de valorização necessária e importante nesse momento.
(Soa a campainha.)
O SR. SUBTENENTE GONZAGA (PDT - MG) - E defendemos que as guardas municipais tenham, sim, o seu ciclo completo também. É discutível e vamos discutir a sua área de atuação. E defendemos um modelo, que nós não estamos inventando nada, mas que possamos, por exemplo, adotar - é o modelo que eu defendo, tem outros - o modelo de uma divisão por territórios nesse ciclo completo para todas as agências...
(Soa a campainha.)
O SR. SUBTENENTE GONZAGA (PDT - MG) - ...um modelo de divisão por territórios por estado de flagrância, em que o que é flagrante já está definido. Quem atender leva direto para a Justiça. O que não for, que a Polícia Civil, a Polícia Federal, que deve ser uma agência de excelência em investigação, assuma. E que no território que não tenha a Polícia Civil ou a Polícia Federal que aquela polícia presente faça, de fato, o ciclo completo.
É preciso que tenhamos a responsabilidade de oferecer segurança pública à sociedade. E o ciclo completo se impõe como uma medida de eficácia, de eficiência, que é um fundamento, que é um princípio da Administração Pública.
Obrigado. Desculpe por ter ultrapassado um pouco o tempo.
O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - Obrigado, Subtenente Gonzaga, Deputado Federal.
Agora, passarei a palavra ao Oséias, Presidente da Conferência Nacional das Guardas Municipais, para encerrar - eu juro - encerrar esta audiência pública. Nós já estamos com quatro horas de audiência pública. Iniciamos às 10h15, quase quatro horas, portanto, peço a compreensão do Oséias ao direito humano da alimentação dos que aqui estão presentes desde às 10 horas.
Então, muito obrigado, Oséias, pela sua vinda, de qualquer forma, sabemos do impertinente que foi a perda do voo, mas, de qualquer forma, lhe concedo cinco minutos e também para concluir esta audiência.
Por favor.
O SR. OSÉIAS FRANCISCO DA SILVA - Muito obrigado, Senador Randolfe Rodrigues, pela deferência, pelo respeito pelas guardas municipais do País. De fato houve esse imprevisto, mas fiz um grande esforço aqui para participar deste momento tão importante aqui desta Casa.
Eu quero parabenizar pela iniciativa. O tema é urgente e oportuno. E as guardas civis municipais no País hoje nós somos, segundo a última pesquisa do IBGE, nós estamos presentes em 1.100 Municípios no Brasil, com efetivo já chegando a 140 mil, entre homens e mulheres, se constituindo na segunda força de segurança pública neste País.
Então é importante que as guardas civis municipais sejam chamadas para protagonizar um debate tão importante como esse, tanto que a única instância concreta e efetiva que existe na Federação é o Município. O Estado e a União são abstrações jurídicas. As pessoas vivem e convivem nos Municípios, os crimes acontecem nos Municípios. E as guardas civis municipais agradecem ao Senador esta participação.
Eu quero falar rapidamente que o debate é muito importante. Nós tivemos alguns momentos históricos em que o País iniciou a tentativa de se construir um novo modelo de segurança pública. Eu quero fazer referência rapidamente à chegada da Família Real aqui no País, em 1808, quando se estabelece esse modelo que temos hoje, baseado na cultura francesa, no modelo francês no País, que perdura até os dias de hoje.
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Com o golpe militar de 1964, iniciou-se também a construção de um novo modelo de polícia no País de segurança pública que correspondesse e sustentasse o regime que ali estava iniciando. Com a Constituição Cidadã, de 1988, também reivindica um novo modelo de segurança para o País.
Senador, nós temos uma avaliação de que o nosso País e a nossa sociedade brasileira perderam uma grande oportunidade de, no ato de construção da nova Constituição Cidadã, iniciar, sim, um grande empreendimento e construir um modelo de segurança pública que correspondesse à expectativa do Estado de direito, um modelo de segurança pública focado e orientado para a cidadania, um modelo de segurança pública cujo objetivo maior seria garantir e promover direitos.
Infelizmente, o art. 144 da Constituição Federal reservou e atualizou, na presente Constituição, no Texto Constitucional, elementos anacrônicos. Decorrem, a partir dele, todos os problemas que nós temos na segurança pública. Todas essas PECs que aqui estão sendo colocadas têm aspectos importantes. Eu não queria ver, Senador, este debate sendo reduzido apenas ao aspecto do ciclo completo de polícia, como se fosse a solução para o debate, porque esse é um discurso que, a meu ver, é falacioso, é um falso discurso, porque nós temos uma arquitetura que precisa ser mexida. Nós temos um modelo que tem que ser construído. Eu compreendo que o ciclo completo é um tema grandioso, que precisa ser debatido, sim, porém, não é a resposta para a segurança pública no País. Não é. Isso é fato. Isso é fato.
Também esse debate não pode ser polarizado entre a Polícia Civil e a Polícia Militar, como tem sido feito até hoje. Participei do debate em São Paulo e parece que o debate está polarizado. Não pode ser. A sociedade civil tem que participar desse debate, porque a segurança pública não é feita apenas com ação de polícia. A segurança pública é uma questão de Estado e questão da sociedade também.
Fiquei bastante triste ao ouvir duas notícias semana passada, uma, que, no Estado de São Paulo, 60% da população têm medo das polícias militares. Foi divulgado isso na semana passada. A outra, que o Estado de São Paulo fez uma manobra para esconder os homicídios, para publicar que estava havendo redução de homicídios no Estado de São Paulo. Então, nós temos problemas seriíssimos em transparência de dados, problemas políticos de ingerências políticas na questão da coleta e divulgação dos dados que comprometem e manifestam questões muito mais profundas do que simplesmente debater o ciclo completo de polícia.
(Soa a campainha.)
O SR. OSÉIAS FRANCISCO DA SILVA - Quero fazer referência rapidamente à Lei nº 13.022, que foi aprovada nesta Casa no ano passado, que é o Estatuto Geral das Guardas Municipais é uma lei que, de fato, sinaliza para um novo modelo de segurança pública, um novo modelo de polícia, uma polícia de proximidade, uma polícia comunitária, uma polícia que preserva os direitos do cidadão, uma polícia que pauta sua atuação pela preservação intransigente da vida, prioritariamente, uma polícia comunitária. Essa lei já é um desenho, é uma iniciativa muito positiva, que alinha o País ao que há de mais moderno no mundo, ao que há de mais importante, e que a ONU recomendou inclusive para o nosso País.
Então, é urgente sim esses aspectos todos.
Eu queria citar a questão de que nós precisamos, sim, pagar uma dívida com Estado brasileiro e iniciar um processo de transformar as polícias em civis. No Estado democrático de direito, nós temos que ter polícias civis. Não cabem polícias militares para cuidar da segurança pública. Polícia Militar tem de ter sua atuação muito bem definida: a defesa da Pátria, a defesa das fronteiras, a defesa do Estado brasileiro. Mas, para a questão de conflitos urbanos, é necessário, sim, ter uma polícia que tenha orientação para a cidadania, não para o combate; para a defesa de direitos, não para o abate de ditos criminosos ou bandidos. Então, superar a questão do militarismo no País é uma dívida que o País paga consigo mesmo, porque isso era para ter sido feito no ato da Constituição de 1988. E não foi feito. Era para ter-se sepultado definitivamente esse modelo de gestão, esse modelo de segurança pública.
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A questão das guardas civis municipais é fundamental. Hoje é a realidade muito concreta, irreversível; cresce a cada dia. Nós temos um parâmetro legal. Nós temos que pautar a nossa atuação, pela transparência, pelo controle social, pelo controle interno, mas, sobretudo, a partir de ações integradas.
Eu quero fazer uma referência, um destaque especial à fala do Deputado Subtenente Gonzaga sobre a necessidade de um sistema de segurança pública no País. Precisamos consolidar o Susp - senão reinventá-lo -, porque hoje nós temos problemas de dados seriíssimos na coleta e no compartilhamento de dados, pois cada instituição quer ter a sua informação como se fosse segredo de justiça, não a compartilha.
As guardas civis municipais são as que mais sofrem, porque nós não temos um sistema de dados, de informação. Nós precisamos do Infoseg, do Governo Federal, ou do sistema do Estado, mas dependemos sempre da conivência, porque nós não temos um pacto federativo que permita essa troca de informação, até para qualificar a gestão das secretarias municipais de segurança pública.
Então, é importante, sim, que essas PECs consigam ser unificadas em uma única PEC que contemple todos esses aspectos: a desmilitarização; o debate sobre uma polícia única, é importante pautar isso; o debate sobre a criação de um conselho de polícia no País, é importante que esse novo modelo o contemple; a questão da transparência, nós não podemos abrir mão da transparência, que está ligada à confiabilidade. Se, no Estado de São Paulo, a população tem medo e não confia, é porque não há transparência, há um distanciamento da população, e a polícia tem que estar ao lado do povo, a polícia tem que proteger o povo; o controle externo autônomo e independente, a população tem que participar; o controle interno também.
É importante, Senador, encarar a questão dos autos de resistência ou a chamada resistência seguida de morte. Esse é um debate que não pode ficar escondido, esse debate tem que ser colocado, e temos que construir e descobrir como nós vamos resolver esse problema. O Brasil é um País muito violento: são quase 60 mil mortes, fruto da violência urbana, por ano; é um País que tem a cultura da violência muito arraigada, mas o auto de resistência - o número de homicídios que as polícias cometem -, no Brasil, é assustador também. É muito assustador!
Isso tem que ser encarado, tem que ser encarado, porque, no Estado democrático de direito, nós não temos uma guerra civil. No Estado democrático de direito, bandido bom não é bandido morto; não há bandido, há cidadão! Mesmo que tenha cometido um crime, ele tem direito e tem que ser preservado. As instituições de Estado têm que se pautar pela legalidade. Nós existimos e vamos continuar existindo enquanto nos pautarmos pela legalidade das nossas ações. Então, a defesa de direitos tem que ser algo prioritário na atuação das organizações de segurança pública.
Quero finalizar e agradecer. Esse é um debate que demanda bastante tempo, como o Deputado Major Olimpio falou. A sociedade tem que ser chamada. Em 2009, participamos da Conseg. A sociedade já aprovou a desmilitarização e a unificação. Temos que chamar a sociedade, não sei se por intermédio de uma grande conferência novamente, pois esse é um tema grandioso e não pode ser reduzido a apenas ao aspecto do círculo completo, que é relevante e tem que ser debatido. Reconheço toda a importância do argumento do Deputado Gonzaga. De fato, isso tem que ser debatido, mas não pode ser debatido como se fosse a solução para a segurança pública. Eu disse, recentemente, que, se nós reconhecemos que a segurança pública está falida ou está em processo de falência, é importante discutirmos as causas dessa falência, antes de querermos acrescentar algo mais a essa falência. Seria irracional detectarmos a falência do sistema e querer acrescentar algo mais, fazer esticadinho, sem discutir suas causas estruturais, o porquê dessa falência. Então, é importante, sim.
Parabéns pela audiência pública! Muito obrigado pelo convite, Senador. Muito obrigado pela deferência de garantir a nossa fala. As guardas civis municipais do País estão à disposição, para contribuir com esse debate. Esperamos que esse debate se prolongue.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Randolfe Rodrigues. Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - Eu que agradeço, Oséias.
Com a sua exposição, nós ouvimos todos os conferencistas, todos os expositores convidados - o Deputado Gonzaga, o Deputado Major Olimpio -, todos que participaram desta audiência pública.
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Quero reiterar que esta é uma de outras audiências públicas que pretendemos fazer. E antecipo, Tenente Gonzaga, o nosso interesse em fazer as próximas agora também em conjunto com os relatores que tratam do mesmo tema na Câmara dos Deputados.
Como foi possível perceber, há controvérsias no tema, há a ausência de unanimidade entre os expositores sobre os diferentes temas, além de sua complexidade. Portanto, modificar a estrutura da segurança pública brasileira é um tema que não pode ser mexido abruptamente. A apresentação do relatório dessas PECs não pode ocorrer de forma abrupta sem que todos os envolvidos sejam ouvidos para esse debate. E é essa a pretensão que este Relator tem, e, em especial, fazer - repito, Tenente Gonzaga - em conjunto com a Câmara dos Deputados.
Não havendo mais oradores, declaro encerrada esta audiência pública.
(Iniciada às 11 horas, a reunião é encerrada às 14 horas e 21 minutos.)