08/11/2016 - 38ª - Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, Comissão de Assuntos Econômicos

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - Bom dia.
Esta audiência pública será realizada em caráter interativo ...
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Não está dando para ouvir, não, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - Mas nossos companheiros e companheiras, no processo, vão se acomodando, e, daqui a pouco, estará tudo em bom ritmo.
Esta é uma audiência pública conjunta, da CAE com a CCJ. A nossa Presidente da CAE já está presente, nossa Senadora Gleisi Hoffmann; o nosso Presidente José Maranhão está a caminho. Portanto, vamos iniciando aqui o processo, e, quando o nosso Presidente da CCJ chegar, ele assumirá a Presidência.
Declaro aberta a 7ª Reunião Conjunta das Comissões permanentes, sendo a 36ª Reunião da Comissão de Assuntos Econômicos e a 38ª Reunião da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.
Esta é uma audiência pública interativa.
Objetivo: debater a Proposta de Emenda à Constituição nº 55, de 2016, que altera o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias para instituir o Novo Regime Fiscal, e dá outras providências. Requerimento de realização de audiência pública nº 30, de 2016, da nossa Senadora, Presidente da CAE, Gleisi Hoffmann. Esta reunião é destinada a instruir a seguinte matéria: PEC nº 55, de 2016, que, na Câmara dos Deputados, era a PEC nº 241, da Presidente da República.
Esta audiência pública será realizada em caráter interativo, ou seja, com a possibilidade de participação popular. Dessa forma, os cidadãos que que tenham interesse em participar com comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania, no endereço www.senado.leg.br/ecidadania, e do Alô Senado, através do número 0800-612211.
Os convidados já se encontram na Casa. Convido-os para a Mesa.
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Os nossos convidados são: o Sr. Samuel Pessôa, que convido para vir à Mesa juntamente com o Sr. Pedro Paulo Zahluth Bastos. (Pausa.)
Convido também o Sr. Guilherme Santos Mello e o Sr. Marcos José Mendes.
São estes os quatro convidados.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Pela ordem, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - Senadora, deixe-me apenas concluir essa parte formal.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Pois não.
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - De acordo com o art. 94, §§2º e 3º, do Regimento Interno, a Presidência adotará as seguintes normas: cada convidado fará a sua exposição por 15 minutos, o que eu acho que é um bom tempo - não é isso?
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Fora do microfone.) - Melhor seriam 20 minutos, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - V. Exª prefere 20 minutos para os expositores?
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Sim; 20 minutos.
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - Está bem.
O SR. JOSÉ ANÍBAL (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - Sr. Presidente, V. Exª poderia consultá-los sobre o tempo, se 15 ou 20 minutos?
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - Até 20 minutos...
O SR. JOSÉ ANÍBAL (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - Se forem 20 minutos para cada um dos quatro convidados, serão 80 minutos. Daqui a pouco não haverá mais ninguém se concentrando nisso.
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - Vamos administrando aqui. Até 20 minutos...
O SR. JOSÉ ANÍBAL (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - Sr. Presidente, menos proselitismo e mais foco. Em 15 minutos é possível perfeitamente que alguém exponha o seu posicionamento.
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - Em seguida, abriremos a fase de interpelação pelas Srªs e Srs. Senadores inscritos.
Eu tive uma conversa com o Líder do Governo e com o Líder da Oposição a respeito. A nossa tradição aqui é a de abrir as inscrições, as pessoas levantam a mão, nós anotamos e seguiremos essa ordem.
A CAE tem um procedimento diferente, que é pela ordem de presença registrada, mas a tradição, na CCJ, é essa de abrirmos... Já fizemos reuniões aqui de dois dias...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - Claro! Já chego lá.
Nós ficamos até dois dias aqui. Houve uma reunião muito tensa, que eu presidi, que começou às 9h e acabou às 23h; e as coisas, ao término, se deram todas sem atrito, sem dificuldades. Vamos, assim, ter a mesma condução hoje.
Eu tenho certeza de que o Senador José Maranhão, nosso companheiro Presidente, bem como a Senadora Gleisi, nossa companheira, irão ajudar.
Portanto, aqui, já veio à Mesa, enquanto eu abria os trabalhos...
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Sr. Presidente, a minha questão de ordem, se V. Exª me permite, é exatamente sobre as inscrições, que, imagino, é o que V. Exª falará a partir de agora.
Na Comissão de Assuntos Econômicos, nós temos como praxe adotar o método de presença, de ordem de chegada. Eu fui à Mesa, já por precaução, e me inscrevi em uma lista. Então, pergunto como será. Seria importante deixarmos clara essa definição.
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - V. Exªs vão pedindo e eu vou inscrevendo, conforme a nossa tradição aqui.
O SR. WALDEMIR MOKA (PMDB - MS) - Sr. Presidente, pela ordem.
Eu invoco o testemunho dos funcionários aqui para dizer que eu fui o primeiro a registrar presença no painel. Não sabia de livro nenhum.
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - Nós estamos começando ainda.
O SR. WALDEMIR MOKA (PMDB - MS) - Só estou dizendo que em relação a esse critério, se for adotado, por mim, não faço nenhuma objeção. Só quero registrar que, aqui, neste plenário, invoco o testemunho dos funcionários, eu...
O SR. AÉCIO NEVES (Bloco Social Democrata/PSDB - MG) - Sr. Presidente, apenas um segundo, para contribuir.
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O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - Em homenagem ao nosso Senador que sempre é o primeiro a chegar para a sessão do Senado, na CAE, na CCJ e na CI... O Moka é sempre o primeiro a registrar e, normalmente, eu sou o segundo. Por acordo, vou colocar o Senador Moka como o primeiro inscrito da lista e, aí...
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Você tem certeza de que a ordem da lista é essa?
O SR. AÉCIO NEVES (Bloco Social Democrata/PSDB - MG) - Presidente, me permita aqui.
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - É porque está em aberto aqui...
O SR. AÉCIO NEVES (Bloco Social Democrata/PSDB - MG) - Presidente, nós estamos indo pelo pior dos caminhos. Existem duas alternativas colocadas aqui por V. Exª: ou segue-se a praxe da CAE, pela ordem de chegada, ou V. Exª diz "estão abertas as inscrições" e os Senadores se manifestam e V. Exª os inscreve. O pior dos métodos é não adotar nem um nem outro. Alguns Senadores vão a V. Exª e se inscrevem; outros estão aqui aguardando que V. Exª defina qual o critério, para que não se forme uma fila de Senadores atrás de V. Exª. Acho que V. Exª tem, daí, uma visão clara e, a partir do momento em que os Senadores pedirem inscrição, V. Exª zeraria essa lista e faria essa inscrição ou, então, seguiria a praxe da CAE, mas não adote essa de que quem vai atrás de V. Exª se inscreve em primeiro lugar.
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - É verdade, aqui há duas listas: uma em branco e uma em que, quando eu iniciei os trabalhos, começaram a se inscrever. O pessoal aqui deixou em aberto a primeira, mas foi feito nesse processo quando eu me sentei à mesa, sem que a gente tivesse feito...
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) - Presidente.
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - Pois não.
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) - Qualquer que seja o método, eu solicito a minha inscrição.
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - Claro! Claro!
Portanto...
O SR. WALDEMIR MOKA (PMDB - MS) - Eu também, independentemente do critério que V. Exª for adotar, quero solicitar minha inscrição.
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - V. Exª será sempre o primeiro, em qualquer uma delas.
Senadora Gleisi.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Eu só queria propor, para que não fiquemos açodados aqui pelas inscrições, que possamos utilizar o método que utilizamos na CAE, pegar a lista de inscrição da CAE, e, se for preciso, fazer a intermediação de oposição e situação, não há problema nisso. Dessa forma, acho que não haveria açodamento. Agora, se forem abertas as inscrições, todo mundo vai levantar a mão ao mesmo tempo. Qual vai ser o critério para escolher o primeiro, o segundo ou o terceiro? Eu acho que o Senador Moka tem razão: quem chega aqui primeiro tem preferência para falar. Vamos fazer a relação e mediamos; se alguém quiser trocar de lugar, não há problema nenhum. Pode ser?
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - O.k.
O SR. AÉCIO NEVES (Bloco Social Democrata/PSDB - MG) - De acordo, Presidente. Vamos começar.
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - Vamos acompanhar a tradição da CAE desta vez porque os trabalhos estão atrasados em uma hora.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Presidente, ainda me permita: deixando clara não só a alternância, mas que possa haver cessão, um Senador trocar com o outro, sem problema algum. Então, claro, ordem de chegada.
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - É a lista, o procedimento que a CAE sempre utilizou, que é o registro de presença.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Certo, ordem de chegada.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Isso.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Seria bom, então, que fosse...
(Intervenção fora do microfone.)
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Exatamente, impresso.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (José Pimentel. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - CE) - Nós também acordamos que são quatro expositores.
Vamos iniciar nossos trabalhos.
Com a palavra, o Sr. Samuel Pessôa, também por acordo, Professor de Economia da Fundação Getúlio Vargas.
V. Sª dispõe de até 20 minutos.
Com a palavra, o Sr. Samuel Pessôa.
O SR. SAMUEL DE ABREU PESSÔA - Bom dia, Presidente. Muito obrigado pelo convite. É uma enorme honra, uma enorme satisfação poder participar de debate sobre tema tão importante para o futuro do nosso País.
Eu preparei uma apresentação. Por favor, poderia...
O que eu pensei em fazer aqui?
(Soa a campainha.)
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O SR. SAMUEL DE ABREU PESSÔA - Eu vou tratar do tema da PEC pela natureza da recessão econômica que o País está atravessando. O meu objetivo é apresentar para os senhores e para as senhoras qual é a interpretação que eu faço da desaceleração e da recessão brasileira e, a partir daí, argumentar sobre a importância dessa PEC como um primeiro de inúmeros passos que nós teremos que dar nos próximos anos para reconstruir a responsabilidade fiscal e a estabilidade fiscal de nossa sociedade.
Pode passar, por favor.
Dá para mudar? Mais um, por favor.
Eu acho que essa tabela sumariza o tema mais importante que sustenta, no meu entender, a importância da PEC. Na primeira e na segunda linhas, nós temos as taxas de crescimento da receita, a total e a recorrente - a recorrente é aquela receita que não tem os extraordinários, tipo Refis -, em dois períodos. O primeiro período vai de 1998 a 2010, e o segundo período vai de 2011 a 2014. Nas duas primeiras linhas temos a receita; na terceira linha, a despesa total; na quarta linha, a taxa de crescimento do PIB. O que sai dessa tabela é que, no primeiro período, nós tivemos um comportamento absolutamente extraordinário da receita. A receita recorrente cresceu 6,3%; a total, 6,8%, real, deflacionada pelo IPCA; e o PIB cresceu 3,2%.
Ora, o normal é receita crescer à mesma velocidade do PIB. Ocorreu na nossa história recente um episódio que, no meu entender, não irá se repetir, que é a receita crescer sistematicamente a uma velocidade que é o dobro da velocidade do crescimento da economia.
No segundo período, de 2011 a 2014, a receita passou a ter um comportamento normal. O que é um comportamento normal? A receita passou a crescer à mesma velocidade do PIB. Até um pouquinho mais. Tivemos receita recorrente real crescendo a 2,8%, e a receita total a 2,4%, num período em que a economia cresceu a 2,2%.
Na linda de baixo, nós temos o comportamento da despesa real. E o que a gente vê é que há, nos dois subperíodos que eu mencionei, uma enorme persistência da despesa real. Nós temos despesa real o tempo todo crescendo a uma velocidade que é o dobro da velocidade do PIB. Quando o PIB passou a crescer mais lentamente, a despesa continuou no mesmo ritmo. Ou seja, o que existe hoje de anormal no comportamento das finanças públicas brasileiras não é o comportamento da receita, que tem acompanhado muito em linha o crescimento da economia, como se espera. O que é anormal é um crescimento extraordinário da receita. Esse crescimento extraordinário da receita, durante muitos anos, não gerou muitos problemas porque, por motivos não recorrentes, que não voltarão, nós tivemos uma receita extraordinária compensando uma despesa que cresce sempre o dobro do PIB.
Então, a nossa patologia é termos uma necessidade de que a despesa sistematicamente cresça a uma velocidade que é o dobro da velocidade do crescimento da economia. E evidentemente isso não é um equilíbrio.
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Isso só foi um equilíbrio durante uns anos porque, por motivos que não se repetirão, nós tivemos da receita um comportamento extraordinário lá atrás. Hoje o comportamento da receita é normal
A recessão brasileira divide-se em duas etapas: uma etapa no primeiro mandato da Presidente Dilma, uma longa desaceleração da economia. A economia, na virada de Lula para Dilma crescia a 3,5%; no último ano da Presidente Dilma cresceu praticamente zero. Essa longa desaceleração de 3,5% para zero tem uma característica que eu gostaria de mencionar.
Primeira característica: a desaceleração da produção sempre foi muito mais rápida do que a desaceleração da demanda, soma de consumo com investimento.
Segunda característica: todo esse período, os juros reais foram elevados.
Terceira característica: em todo esse período, a inflação foi muito elevada. Em todo esse período, os aumentos dos salários foram acima da produtividade. Em todo esse período, a taxa de desemprego caiu continuamente. Ao longo de todo esse período, o déficit externo aumentou. Ao longo de todo esse período o déficit público aumentou.
Todas essas seis características que eu elenquei aqui sinalizam que a nossa desaceleração no primeiro mandato da Presidente Dilma é um fenômeno de produtividade, não foi um fenômeno de queda de demanda. A demanda não caiu, nós tivemos demanda em excesso. E é exatamente porque demanda em excesso ao longo de todo o primeiro mandato da Presidente Dilma que os juros reais foram muito pressionados e a inflação pressionada. O que aconteceu é que, por uma série de motivos a que nós podemos voltar aqui, houve uma enorme queda da taxa de crescimento da produtividade brasileira.
Esse é o primeiro período da nossa crise. Se nós olharmos essa tabela, a gente vê que essa é uma crise especificamente brasileira. Na primeira linha, nós temos a taxa de crescimento da economia, nós temos a taxa de crescimento da América Latina, excluindo o Brasil. Na terceira linha, nós temos a taxa de crescimento do Brasil.
No primeiro período, 1985/1994, o mundo crescia a 3,3%; a América Latina, exceto Brasil crescia a 3%, o Brasil crescia a 2,8%, 0,2% abaixo do mundo.
No segundo período, que coincide com o período FHC, o mundo crescia a 3,5%; a América Latina, exceto Brasil, crescia a 2,1%; o Brasil crescia a 2,4%, 0,3% acima da América Latina.
Em 2003/2010, o mundo crescia a 4,2%, a América Latina, exceto Brasil, crescia a 4,1%, o Brasil crescia a 4%, 0,1% a menos da América Latina.
No primeiro mandato da Presidenta Dilma, o mundo crescia a 3,6%; a América Latina, a 3,5%; o Brasil a 2,2%.
Essa desaceleração nossa é uma peculiaridade nossa, responsabilidade única e exclusiva nossa. Além disso, depois da desaceleração, nós entramos numa profunda recessão. Essa recessão, que começou no segundo trimestre de 2014, tem a característica de que o investimento despencou. Note lá, a partir do primeiro trimestre de 2014, as taxas de crescimento do investimento real, segundo as contas nacionais, são calculadas trimestre, contra o mesmo trimestre do ano anterior, elas despencam a partir do primeiro trimestre de 2014. E para entender o aprofundamento da crise brasileira, a gente tem que entender por que o investimento despencou.
Não só isso, mas esta é a pior crise dos últimos 120 anos brasileiros. E quando eu falo a pior crise dos últimos 120 anos, eu não estou usando nenhuma figura de linguagem.
Neste gráfico, cada barrinha é a taxa de crescimento do PIB per capita acumulado em quatro anos, terminando o período de quatro anos na data marcada no eixo da horizontal.
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O que a gente vê é que houve quatro episódios muito dramáticos. O primeiro é a Primeira Guerra Mundial, é o fim da Pax Britannica, o fim do longo século XIX, do Hobsbawn, em que tivemos um quadriênio em que crescemos -7,6% o PIB per capita.
Na década de 30, não há nada. Na Segunda Guerra, não há nada. Há a crise da dívida externa, uma queda forte no quadriênio 1980, 1981, 1982 e 1983 de -9,6% do PIB per capita.
No Plano Collor, há um período muito ruim, não tão profundo, mas muito ruim. E, agora, segundo as previsões do Instituto Brasileiro de Economia, instituição à qual eu me filio, no quadriênio terminado em 2017, a economia brasileira vai perder PIB per capita de 9,7%. Vai ser a maior perda de PIB per capita dos últimos 120 anos. E, se nós avançarmos alguns poucos anos, vamos ver que essa crise não só é a mais profunda, mas também é a mais extensa. Nós estamos falando de um fenômeno mais do que secular. Provavelmente, se nós tivéssemos bons dados do comportamento da economia brasileira no Império, para chegar a um período tão ruim quanto este, nós teríamos de retroagir até o período da Regência.
Por que motivo o investimento despencou? O investimento despencou por dois motivos. O primeiro motivo é que diversos programas de investimentos desenhados no bojo da Nova Matriz Econômica tinham como premissa que a capacidade financeira do Estado brasileiro no sentido amplo - Tesouro Nacional, empresas estatais e bancos públicos - era ilimitada. É uma premissa muito parecida com a premissa que houve no II PND do governo Geisel, que era a premissa de que a capacidade de captação de dívida externa era ilimitada. Da mesma forma que o II PND... E o governo militar terminou a sua capacidade de formular políticas quando essa premissa se fez errado, quando a gente descobriu que a capacidade de financiamento e de captação de dívida externa nos anos 70 era limitada. A Nova Matriz Econômica terminou quando a gente descobriu que a capacidade financeira do Estado brasileiro - Tesouro, estatais e bancos públicos - era limitada.
Dou exemplos. A empresa Petrobras, em sete anos, multiplicou sua dívida por quatro ou cinco vezes. Hoje, a relação dívida/geração de caixa é algum número entre quatro e cinco, e, há oito anos, era um. E a produção de petróleo aumentou um quarto. Uma empresa que multiplica sua dívida por quatro ou por cinco e em que a produção de petróleo aumenta um quarto, uma hora, tem de parar de investir, simplesmente porque ela não consegue mais captar recursos para continuar investindo, porque os investimentos deram errado. A indústria naval quebrou porque não é possível que eternamente o BNDES financie compra de navio pelo triplo ou pelo dobro do preço internacional. Então, a limitação da capacidade do BNDES em manter esse projeto quebrou a indústria naval toda, como ela já tinha quebrado nos anos 50 e como ela já tinha quebrado nos anos 70 no bojo do II PND. A mesma coisa ocorreu com o programa Minha Casa, Minha Vida, um programa muito importante com problemas de desenho, mas que também tinha como pressuposto a capacidade financeira ilimitada do Estado brasileiro.
A mesma coisa se deu, não ligada a Estado, mas ligada a políticas públicas que induziram o sobreinvestimento no setor automobilístico: com cinco milhões de unidades/ano de produção para o mercado interno, que mal começa a absorver 2,5 milhões de unidades, o investimento na indústria despencou, porque a gente tem uma capacidade ociosa imensa, e a nossa economia, a nossa indústria automobilística não tem competitividade para exportar nem para o Peru. O Peru prefere importar da Ásia.
Então, o primeiro motivo que explica aquele despencamento, aquela queda abrupta do investimento, é o esgotamento de uma série de programas da Nova Matriz Econômica que tinham como pressuposto a capacidade ilimitada de financiamento do Estado brasileiro, que é uma hipótese incorreta.
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O segundo motivo é que nós descobrimos, por volta de 2014, que o Tesouro brasileiro tinha um problema de solvência muito dramático; tinha uma dívida que crescia como bola de neve, e não tínhamos capacidade, na política, de resolver esse problema fiscal e construir uma forma civilizada de financiamento do Tesouro.
Essa percepção começou lentamente. A primeira vez em que o mercado financeiro percebeu isso foi em outubro de 2013, quando foi divulgado o resultado do Tesouro Nacional relativo a setembro de 2013. Ali as pessoas perceberam que a situação fiscal estava muito grave e começaram a fazer conta de trajetória de dívida pública. O setor real começou a absorver essa informação, e o que ocorre é que uma sociedade que tem um Tesouro Nacional cuja dívida pública cresce tal qual bola de neve e que não consegue, na política, resolver esse problema gera uma enorme incerteza. Você não consegue enxergar o futuro, porque uma dívida crescendo como bola de neve significa que algum ajustamento ocorrerá à frente. Ninguém sabe a forma como será feita esse ajustamento - se por aumento de despesa, se por redução de gastos ou por inflação -, e, ao não saber a forma pela qual esse desequilíbrio será endereçado, encaminhado, cria-se uma incerteza, e o investimento despenca por conta desse motivo, ou seja, reconhecer que somos de uma sociedade, que estamos no meio de um conflito distributivo e que não estamos conseguindo gerir esse conflito distributivo de forma civilizada. Já vou voltar a esse tema.
Uma tese que é muito defendida é de que o aprofundamento da crise seria culpa da política fiscal mais contracionista do Ministro Levy em 2015. Então, em 2015, nos números vermelhos, vemos na segunda coluna o número 7,3%, que é a Selic real, é a Selic deflacionada pela expectativa de inflação segundo o Focus. A Selic real foi 7,3%. Na terceira coluna, temos a medida de impulso fiscal produzida pela Secretaria da Fazenda, com o Ministro Nelson Barbosa. Vemos que, em 2015, houve uma contração fiscal de 1,1%, e o PIB caiu 3,8%.
Ora, se a tese do austericídio fizesse algum sentido - eu remeto os senhores para 2003 -, em 2003, o juro real foi 15%, e não os 7,3% de 2015. E o impulso fiscal foi -1,4%, e não o -1,1% de 2015. Não obstante, o PIB cresceu 1,1%. A tese do austericídio fiscal não sobrevive a uma análise dos dados; pior ainda, se os senhores olharem a linha referente a 2014, vão perceber que o impulso fiscal em 2014 não só foi positivo, mas foi o dobro do impulso contracionista de 2015. E sabemos que o impulso fiscal demora aproximadamente um ano e meio para agir sobre a economia, o que significa que o resultado líquido da política fiscal, 14 e 15 sobre 15 foi expansionista porque tínhamos um impulso fiscal de 2,2% de 14, que atuou sobre 15 no seu pico, e uma contração fiscal de 1,1% em 15, que atuou no seu pico no ano seguinte. Ou seja, não há nenhuma evidência de austericídio. Essa tese não sobrevive a 15 segundos de reflexão.
A crise brasileira segue do reconhecimento pelos agentes econômicos que têm um problema sério de solvência: dívida que cresce tal qual bola de neve impossibilita o cálculo empresarial e, portanto, produz forte queda do investimento. Se nada for feito, a inflação retornará e voltaremos aos anos 80 e 90. Vale lembrar que a inflação na Argentina roda na casa de 35% a 40%, e eles estão tendo a maior dificuldade de trazer essa inflação para baixo - maior dificuldade.
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Qual é o nosso problema, gente? O nosso problema é que estamos com uma economia política disfuncional. Cada grupo de pressão consegue colocar na legislação o seu privilégio, o seu gasto; cada grupo de pressão, analisando sob sua ótica, está cheio das suas razões, e entendo as razões de cada grupo de pressão. O problema é que o agregado disso está nos colocando próximo ao abismo inflacionário e ao retorno dos anos 80 e dos anos 90.
O que faz a PEC? Ela inverte a lógica e é uma muleta para disciplinar o nosso conflito distributivo. A PEC disciplina o conflito distributivo, no sentido de que até agudiza o conflito distributivo porque explicita a restrição, e, ao explicitar a restrição, vai fazer com que o Congresso Nacional trabalhe muito melhor. A Comissão de Orçamento vai passar a ter uma importância que nunca teve.
Uma pergunta muito relevante: por que não começamos o ajuste fiscal com uma nova rodada de aumento de carga tributária? Vejo dois motivos: primeiro, como mostrei na minha primeira tabela, o que é estranho, o que é anormal na política fiscal brasileira, nos últimos 20 anos, é uma taxa de crescimento do gasto público, que é sistematicamente o dobro da taxa de crescimento do PIB, e isso é claramente uma situação instável. Então, temos que resolver o problema. Se fizermos mais uma rodada de aumento de carga tributária, se a taxa de crescimento do gasto continuar a ser o dobro da taxa de crescimento do PIB, daqui a dois anos, estaremos na mesma situação em que estamos hoje, com os mesmos problemas. Dado o fato de que começar pela receita não encaminha o problema de fundo, isso tem um impacto muito menor sobre as expectativas.
O segundo motivo é que estamos com problemas seriíssimo inflacionário. Estamos na maior crise dos últimos 120 anos, as maiores taxas de desemprego da nossa história, e, mesmo assim, a inflação cai muito lentamente. Essa queda da inflação muito lenta é fruto dos erros de política monetária que foram cometidos lá atrás e que geraram uma "inercialização" dessa inflação em um nível muito alto, e estamos pagando um custo altíssimo para trazer essa inflação para a meta. Se começarmos a ter agora novas rodadas de aumento de carga tributária, antes que a inflação se estabilize na meta e as expectativas inflacionárias se estabilizem na meta, vamos dar choques negativos de oferta sobre a inflação e vamos prejudicar muito o trabalho do Banco Central para trazer essa inflação para a meta.
(Soa a campainha.)
O SR. SAMUEL DE ABREU PESSÔA - Uma questão importante: o custo da dívida pública é muito alto? O custo da dívida pública é extremamente alto! Os juros reais no Brasil são elevadíssimos. Por que os juros reais no Brasil são elevadíssimos? Porque a taxa de poupança é muito baixa e ela não se eleva em seguida a episódios de elevação do crescimento. No entanto, o custo de rolagem da dívida pública é muito menor do que as pessoas imaginam.
Uma conta simples: pegue uma dívida de R$4,9 trilhões, juros nominais de 15%. Juros pagos: 15% sobre R$4,9 trilhões, o que dá R$735 bilhões. Se a inflação for de 10%, mais ou menos a inflação do ano passado, R$490 bilhões dos R$735 bilhões da rolagem é só correção monetária. Então, na verdade, os juros reais pagos não são R$735 bilhões, são R$245 bilhões. Só que temos que lembrar que há o Imposto de Renda de 15% sobre a inflação. Não estou falando de Imposto de Renda de 15% sobre o juro real. Estou falando de Imposto de Renda de 15% sobre a inflação. Os juros reais pagos líquidos de Imposto de Renda sobre a inflação são de R$171 bilhões nessa conta segundo a qual inicialmente parto de um juro de R$735 bilhões.
Então, rolagem de dívida pública é cara? É cara porque os juros reais são muito altos no Brasil. Os juros reais são muito altos no Brasil porque a taxa de poupança é muito baixa, mas os juros pagos são muito menores do que os números que as pessoas alardeiam por aí.
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Para terminar, como considerações finais, eu gostaria de ficar totalmente aberto, o tempo que for necessário, para tirar quantas dúvidas forem trazidas e responder a quantas forem as perguntas que as Srªs e os Srs. Senadores me fizerem.
Gostaria, entretanto, de fazer quatro observações: primeira, é necessário lembrar que o primeiro resultado da Constituição de 1988 foi a hiperinflação brasileira. A hiperinflação brasileira é posterior à promulgação da Constituição de 1988. Segunda observação: a melhora social no nosso País só começou quando estabilizamos a economia em seguida ao Plano Real. Terceira observação: a PEC visa recuperar a capacidade fiscal do Estado brasileiro para que nós não percamos o que nós conseguimos construir até aqui. Quarta observação: muitas das pessoas que, hoje, são contra a PEC são as mesmas pessoas que foram contrárias à Lei de Responsabilidade Fiscal e foram contrárias ao Plano Real.
Muito obrigado pela atenção dos senhores.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Sr. Presidente, pela ordem.
Seria possível disponibilizar em via impressa a apresentação?
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Disponibilizar... Não entendi.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - A apresentação que acabou de ser feita poderia ser impressa e distribuída a todos nós?
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Sim; sem dúvida alguma.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Eu não sei se imediatamente, mas, tão logo seja possível, nós a disponibilizaremos.
Há uma questão aqui sobre a qual eu gostaria de consultar o Plenário: se devemos facultar a palavra aos interpelantes logo após a exposição do interpelado ou se depois, ao final.
(Intervenções fora do microfone.)
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Vamos ouvir a todos, Sr. Presidente. (Pausa.)
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Então, dando prosseguimento, concedo a palavra ao Sr. Pedro Paulo Zahluth Bastos.
O SR. PEDRO PAULO ZAHLUTH BASTOS - Eu agradeço muito o convite. Estou muito honrado em estar aqui. Acho muito importante que haja um debate público e aberto sobre a PEC.
Eu também fiz uma apresentação que contém alguns dados que eu não vou poder apresentar aqui, pelo menos não nessa primeira parte, mas que vão ficar como um anexo e serão distribuídos posteriormente. São alguns dados que, inclusive, se contrapõem aos dados que o Prof. Samuel Pessôa apresentou.
Na minha apresentação, o ponto central é o seguinte...
Eu gostaria que passasse, por favor.
O ponto central é o seguinte: a PEC é contraproducente, ou seja, ela não vai entregar o que está prometendo; segundo, ela é injusta; terceiro, ela é antidemocrática. E eu vou explicar o porquê de cada um desses pontos.
Esse é o primeiro ponto que eu quero levantar.
Segundo, a base da minha apresentação e os dados nela contidos estão nessa revista que os Srs. Senadores receberam - Austeridade e Retrocesso - que foi escrita por um conjunto de economistas, mais de cem economistas, e que pode ser avaliada e, inclusive, baixada digitalmente.
Primeiro ponto: alega-se que a PEC produzirá uma paralisia do gasto real do Governo no nível de 2016 ou, para saúde e educação, no nível de 2017. O gasto público apenas acompanhará a inflação medida pelo IPCA, mesmo que a inflação da saúde, dos serviços pessoais, dos salários de carreiras e planos de progressão aumente.
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Isso quer dizer o seguinte: que o mesmo montante de recursos paralisado em 2016, corrigido apenas pelo IPCA, não vai comprar o mesmo volume real de recursos e serviços, e pagará menos salários ao longo do tempo. Por quê? Porque sistematicamente a inflação do IPCA fica abaixo da inflação de serviços, do deflator implícito do PIB, da inflação da saúde e da inflação da educação. No mínimo, no mínimo, a PEC deveria utilizar o deflator implícito do PIB.
Olhem, aqui estão os dados, vocês podem avaliar depois: sempre o deflator implícito do PIB corre acima do IPCA. A mesma coisa vale para os serviços nos quais se materializa o gasto público. Então, a verdade é a seguinte: mesmo que se mantenha o nível de gastos pelo IPCA, o nível real vai cair, porque o gasto real vai ser corrigido, na verdade, por um índice que é muito maior do que o IPCA ao longo do tempo.
Portanto, a oferta real de serviços vai ser menor do que aquela que é paralisada em 2016, ainda mais pelo seguinte motivo: o gasto com a Previdência Social, mesmo que a reforma da Previdência apresentada pela situação seja aprovada, vai aumentar mais do que a inflação, porque as mudanças nas aposentadorias terão efeito de médio prazo. Em função dessas coisas - inflação de serviços, deflator implícito do PIB e gasto previdenciário -, os serviços e transferências outros terão, necessariamente, que diminuir em termos reais. E não é pouco, é muita coisa! Isso vai implicar, necessariamente, eliminar as vinculações constitucionais para saúde e educação. Sabe-se, inclusive, a regra real de reajuste do salário mínimo, que indexa todas as transferências sociais - isso está, inclusive, na exposição de motivos da PEC.
Olhem, o Cecon, da Unicamp, fez essa análise, que, na verdade, depois foi repetida pelo Bradesco, mostrando mais ou menos a mesma coisa: a despesa primária sobre o PIB - se o PIB crescer, a partir de 2021, a uma taxa de 2,5% - vai cair de 20% para 12% do PIB em 2036. Isso é menos do que a despesa primária sobre o PIB dos países africanos. Então, a proposta de país que a PEC oferece é um Estado que é do tamanho do Estado dos países africanos de mais baixa renda. Isso significa o seguinte: se você aumentar ali os gastos com Previdência e mantiver os gastos em educação e saúde, nada mais nada menos que todos os outros gastos do Governo vão ter que caber, em 2036, em menos do que 1% do PIB. Isso é absolutamente inviável. A mesma coisa é apresentada aqui pela projeção do Bradesco, só que eles fazem com uma taxa de crescimento do PIB de 3%.
Então, será que é possível, ao contrário de fazer o Congresso trabalhar - foi esse o comentário feito pelo outro expositor - em cima de uma restrição que é inviável... Na verdade, o Congresso Nacional, Câmara dos Deputados e Senado, vai entrar num processo de conflito permanente para fazer o encolhimento absolutamente irreal, que nunca aconteceu em nenhum lugar do mundo, de todas as despesas, fora Previdência, saúde e educação, para que elas, de 8% do PIB, caibam, daqui a 10 anos, conforme projeção do Bradesco, em 1,77% do PIB, as obrigatórias, e, em 0,2%, as discricionárias. Está certo?
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Segundo, não é verdade que os gastos em educação serão mantidos. Aqui, é uma tabela feita pela Esther Dweck, e mostra muito claramente que o investimento em educação pela receita líquida de impostos deve cair, também com a projeção de 2,5% para 13,7% em 2028, e o investimento em saúde sobre a Receita Corrente Líquida vai cair para 11% em 2028. Então, também não é verdade que você estaria preservando, em relação aos índices, o gasto em educação, muito menos per capita. Você terá, na verdade, uma redução muito forte do gasto per capita real, por aluno, ao longo do período contratado, e também investimento em saúde, por aluno, com a PEC.
Além disso, dos efeitos distributivos e produtores de conflito, a PEC é contracionista, muito contracionista. Por quê? Porque o aumento da arrecadação fiscal, quando ocorrer, se eventualmente a economia se recuperar, vai produzir automaticamente uma redução do déficit primário ou aumento do superávit primário. E isso pode ter o mesmo efeito de 2015. O mesmo efeito de 2015. Evidentemente, mais ainda porque vai conter gastos que tenham enorme efeito multiplicador, como eu vou mostrar aqui.
O multiplicador do investimento público e do gasto social, quer dizer, o impulso que R$1 de gasto público tem sobre a renda nacional, é muito maior para o investimento e o gasto social do que os juros nominais da dívida pública. Porque o a PEC, na verdade, está propondo é o seguinte: todo aumento futuro de arrecadação vai ser destinado para o pagamento de juros da dívida pública. Está certo?
Além disso, ela é muito pró-cíclica. Porque se eventualmente a economia desacelerar, por motivos cíclicos, como os que ocorreram entre 2011 e 2014, ajudada pelo incentivo fiscal de 2011 - temos os dados aí, depois eu mostro -, o Governo não vai ter condições de realizar uma política anticíclica. Então, vai ser forçado a realizar uma política passiva, como a que foi realizada em 2015, que vai aprofundar a desaceleração dos gastos privados e reduzir ainda mais a arrecadação tributária. Se o Governo correr atrás e eventualmente ainda cortar mais os gastos, isso volta a reduzir as receitas privadas, que cortam de novo e produzem uma espiral negativa, um círculo vicioso entre contração do gasto público e contração do gasto privado, que é o que nós vemos nos últimos dois anos.
Além disso, como será necessário realizar uma contração muito grande do gasto real, os conflitos políticos a respeito de onde os cortes vão acontecer devem provocar não apenas uma instabilidade política grande, acredito, mas eventualmente instabilidade no mercado financeiro, o que vai agravar os impactos contracionistas da PEC.
Aqui há os dados do Ipea sobre os multiplicadores do gasto social e outros gastos. É muito claro que o gasto social tem um multiplicador acima de 1,7. Vários estudos mostram isso no Brasil. Alguns com mais impacto, outros com menos impacto do que ocorre em outros países, mas os juros da dívida pública têm um multiplicador de 0,7. Então, na verdade, você vai estar esterilizando recursos da sociedade para destinar para os juros da dívida pública, o que implica, necessariamente, o impacto contracionista que posteriormente, se o PIB desacelerar em relação a sua trajetória de crescimento, implicará também uma queda prospectiva da arrecadação tributária, repondo o conflito. Está certo?
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Salários baixos também. De acordo com a última POF, até R$2.500, tudo que se paga em salários se transforma em lucro antes do fim do mês. Então, não dá para dizer que isso produz uma contração da poupança, que prejudicará o crescimento futuro, prejudicando a realização do investimento, não é verdade?
O investimento público, por exemplo, claramente estimula, produz o que os economistas chamam de crouwding in; ele estimula o investimento privado, ele não produz uma redução da poupança, que reduziria o investimento privado. Então, gasto social e investimento público são estimuladores do gasto privado e, portanto, geradores futuramente de arrecadação tributária.
Na verdade, nós temos duas visões sobre a dívida pública no Brasil. Há economistas que acham o seguinte: é preciso realizar uma política anticíclica no momento em que a economia desacelera. Isso implica necessariamente um aumento da dívida pública, ainda que esse aumento seja temporário. Por quê? Na medida em que o Governo gasta, a arrecadação do setor privado aumenta e o setor privado, depois de um determinado tempo, vai reverter a sua situação de desaceleração do gasto, principalmente numa situação como a atual, quando ele precisa poupar para pagar dívida.
Então, o gasto público é, a gente sabe, receita privada. Se o Governo reduz o gasto, a receita privada cai e fica mais difícil pagar impostos. E aí, eventualmente, as empresas vão cortar ainda mais os gastos, o que vai produzir uma queda futura da arrecadação. Os economistas sabem isso desde a década de 30. Vários economistas neoclássicos e neoliberais passaram a afirmar o contrário: que, no momento de desaceleração cíclica, teoricamente produzida por uma perda de confiança que ninguém pode provar, o Governo deve cortar o gasto porque isso vai produzir uma recuperação do gasto privado. Isso não é verdade. O FMI analisou todos os casos e já fez a mea-culpa. Vários economistas que propuseram o corte de gastos em 2015 alegaram explicitamente que a queda do gasto público ia produzir um aumento do gasto privado. Mas, meu Deus do céu! Isso não ocorreu e eu ainda não vi uma autocrítica por parte desses economistas. Na verdade, o que ocorreu é o efeito keynesiano: a queda do gasto público reduz a receita privada, que produz uma nova queda do gasto privado. E, vejam, isso quem diz hoje, fazendo a mea-culpa, é o próprio FMI.
Por outro lado, não há também uma tendência de longo prazo de aumento do gasto social e aumento da carga tributária vinculada à realização de investimento público e gasto social e redução do crescimento. Pelo contrário, a carga tributária, em todos os países do mundo, aumentou principalmente no pós-guerra, estagnou na década de 80 e o período de grande crescimento foi exatamente o período do pós-guerra.
O FMI também já fez também a mea-culpa mostrando que o aumento da desigualdade, que por conta da austeridade reduz o crescimento. E o maior historiador vivo provavelmente, que é o Peter Lindert, fez um estudo da relação entre crescimento do Estado e do gasto social desde o século XVIII, até hoje, até 2004.
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Ele mostrou o seguinte: o aumento do gasto social e das políticas redistributivas não teve nenhum custo em termos de crescimento do PIB, mas, pelo contrário, acelerou o crescimento do PIB. Esse estudo é considerado um dos maiores estudos de História Econômica feitos até hoje.
Então, na verdade, é esse um dos motivos por que a economia brasileira cresceu na década passada, exatamente no impacto da redução da concentração de renda, numa situação em que o multiplicador da renda dos pobres é muito grande. Isso, ao invés de reduz as poupanças, produz um aumento do investimento, que reduz, de fato, talvez, as poupanças financeiras. Mas isso aumenta o investimento real e aumenta o fluxo de poupança anual na contabilidade nacional.
Outra coisa que, às vezes, é confundida pelos economistas é a contabilidade do saldo comercial, que não se relaciona diretamente com isso. Depois, a gente pode explicar por quê.
O segundo ponto principal é que a PEC é muito injusta do ponto de vista social. Ela vai, certamente, impedir a recomposição do salário mínimo, porque o aumento dele é responsável pelo aumento das transferências sociais, como a gente sabe. Ela vai reduzir fortemente o gasto social, o embrião de welfare state, que nós temos. E, no fundo, ela vai abrir espaço para a mercantilização da saúde e da educação, reduzindo o salário indireto daqueles que precisam de serviços públicos para terem acesso à saúde e à educação.
Posso dizer, então, que, de certo modo, a PEC, tal como está, pune os inocentes, os dependentes do gasto social e da Previdência, e nada faz - não vou medir palavras - com os criminosos, com os sonegadores fiscais e com privilegiados pela estrutura tributária regressiva. Não dá para dizer que a gente tem de, necessariamente, punir os inocentes, para, eventualmente, depois, ir atrás dos criminosos, como se coloca às vezes por aí.
Vamos lembrar o seguinte: vários estudos mostram que a sonegação fiscal no Brasil gira em torno de R$500 bilhões/ano, cinco vezes o déficit de 2015, de pedaladas e "despedaladas", inclusive. A dívida ativa da União é de R$1,5 trilhão, sendo que R$252 bilhões já estão prontos para serem recolhidos.
Ainda por cima, há vários problemas - há vários dados que, depois, vocês podem consultar - na estrutura tributária brasileira. Por exemplo, essa tabela indica o grau de isenção dos rendimentos em função de múltiplos do salário mínimo. Em verde, estão os rendimentos isentos. Mostra-se um total absurdo, o fato de que, à medida que aumentam os múltiplos de salário mínimo, os rendimentos isentos também aumentam. E o Imposto de Renda devido em relação à renda total aumenta para a classe média e, depois, cai muito para os ricos. A base de cálculo sobre a renda real, evidentemente, taxa muito mais os pobres do que os ricos.
Então, não existe motivo nenhum para punirmos os inocentes e continuarmos poupando os criminosos e os privilegiados.
Há vários dados também a respeito de quem ganha com isenção fiscal no Brasil, com desonerações tributárias, com a estrutura tributária regressiva. Eu só queria apontar uma questão aqui.
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Segundo o Ipea, os trabalhadores com renda mensal de até 2 salários mínimos contribuem 54% da renda para o pagamento de impostos. É impressionante, porque a maioria dos impostos brasileiros é indireta. E os com renda superior a 30 salários mínimos contribuem com apenas 29%. Isso é o que temos que mudar. Não podemos mudar só a estrutura de gasto, sobretudo, aquele que vai punir os necessitados, e poupar inteiramente criminosos e privilegiados. Há vários dados aí, inclusive comparativos internacionais, mostrando que o Brasil é um ponto absolutamente fora da curva.
Por exemplo, se a reforma tributária proposta pelo Fernando Henrique Cardoso em 1989, com imposto sobre grandes fortunas, fosse aplicada, nos termos dele, com uma alíquota de 1%, em torno de 2% a 5% da população, em cima de rendas acima de 1 milhão, haveria R$100 bilhões por ano, o total do déficit do ano passado. Não precisaria nem ser isso - o Guilherme até vai apresentar outras estimativas depois. E assim vai.
Eu só queria...
(Soa a campainha.)
O SR. PEDRO PAULO ZAHLUTH BASTOS - ... concluir fazendo a leitura da justificativa da PEC. Por que ela não pode ser discutida com calma pela sociedade? Por que ela está sendo realizada em um processo acelerado? Não é pela urgência fiscal, porque os cortes só vão ocorrer, no fundo, depois da queda da inflação, dada a maneira como a PEC está construída. É porque, claramente - eu tenho como provar, eu vou ler -, se quer forçar reformas constitucionais, o termo usado, "na marra", com argumentos técnicos fajutos e pressão do mercado. Eles querem induzir escolhas com uma camisa de força que é antidemocrática e produtora de conflitos, não produtora de consensos democráticos.
O que eu vou ler aqui não é grampo da Lava Jato, isso aqui é uma entrevista do Roberto Brant, o responsável pelo documento "Uma ponte para o futuro", que inspira a PEC 55. Olhem o que ele diz:
O ajuste fiscal para valer precisa de horizonte de longo prazo. O desequilíbrio fiscal brasileiro está contratado nas leis, na Constituição, que precisam ser alteradas.
[...]
Esse documento não foi feito para enfrentar o voto popular. Com um programa desses não se vai para uma eleição.
[...]
O conjunto da sociedade não tem obrigação de compreender essas questões herméticas de orçamento, Previdência, de relações Banco Central e Tesouro Nacional. Não tem noção do que seja a trajetória da dívida. E as pessoas querem mais. Elas não querem menos.
[...]
Lula vai chorar em praça pública. Precisa desvincular benefício social do salário mínimo. Vai ser um Deus nos acuda. Agora, o sistema político brasileiro está preparado para fazer as mudanças? [Ou seja, o Congresso Nacional está preparado?]
[...]
Não. Nem sei se a sociedade está. Mas o Brasil chegou ao ponto tal que não há outro remédio do que dizer a verdade [para quem?].
[...]
Se não, as pessoas vão achar que, votado o impeachment, podem voltar para casa e começar a gastar por conta. Elas precisam saber que o Estado está arruinado.
[...]
Vai ser preciso ser rápido no Congresso. Dar um tranco. E veja bem: um governo breve, de 2 anos e meio, que não vai aspirar um futuro longo a não ser o reconhecimento da história.
[...]
Se não tiver uma energia sobrenatural, uma força para dialogar e convencer o Congresso, não sei se vamos muito longe. Vai ser preciso agir muito rápido. E sem mandato da sociedade. Vai ter de ser meio na marra.
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Eu queria contrapor basicamente com este discurso aqui, final da Constituição Federal, o último discurso realizado no processo constitucional em 1988 - Ulysses Guimarães, para concluir:
A Constituição mudou na sua elaboração, mudou na definição dos poderes, mudou restaurando a Federação, mudou quando quer mudar o homem em cidadão, e só é cidadão quem ganha justo e suficiente salário, lê e escreve, mora, tem hospital e remédio, lazer quando descansa [...]
O enorme esforço é dimensionado pelas 61.020 emendas, além de 122 emendas populares, algumas com mais de 1 milhão de assinaturas, que foram apresentadas, publicadas, distribuídas, relatadas e votadas, no longo trajeto das subcomissões à redação final [...]
A participação foi também pela presença, pois diariamente cerca de 10 mil postulantes franquearam, livremente, as 11 entradas do enorme complexo arquitetônico do Parlamento, na procura dos gabinetes, comissões, galeria e salões. Há, portanto, representativo e oxigenado sopro de gente, de rua, de praça, de favela, de fábrica, de trabalhadores, de cozinheiros, de menores carentes, de índios, de posseiros [...] atestando a contemporaneidade e autenticidade social do texto que ora passa a vigorar. Como o caramujo, a Constituição guardará para sempre o bramido das ondas de sofrimento, esperança e reivindicações de onde proveio [...]
Tem substância popular e cristã o título que a consagra: “a Constituição cidadã”.
Então, a PEC é, nada mais nada menos, do que o início do fim da Constituição cidadã, sem uma discussão séria com a sociedade brasileira para distribuir custos e benefícios com justiça, e com pouca discussão popular.
Então, ouçamos Ulysses Guimarães. Obrigado. (Palmas.)
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Meu voto é do Dr. Pedro.
A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - O interessante é a manifestação contra a fala.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Presidente, não estou entendendo o que está acontecendo aqui.
A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - Quando todos ficamos calados, alguns se pronunciam em contrário.
(Soa a campainha.)
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Conclua, Senadora Vanessa.
(Soa a campainha.)
A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - Desculpem, mas eu assinei. Não só assinei como defendo a Constituição, coisa que vocês estão rasgando!
(Tumulto no recinto.)
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Senadora Vanessa, a senhora está tumultuando o ambiente.
(Tumulto no recinto.)
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Senadora Vanessa, contenha-se.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - A Mesa pede aos presentes...
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Cercear a fala dos nossos convidados?
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Mantenham o silêncio, senão, vou ter que suspender a reunião.
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Respeito, pelo amor de Deus!
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Ei, Fátima, respeite.
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Vamos respeitar aqui o direito dos nossos convidados de expor suas ideias.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Com a palavra o terceiro depoente, Marcos Mendes.
Vamos ouvi-lo com atenção e silêncio.
O SR. MARCOS JOSÉ MENDES - Muito obrigado, Sr. Presidente. Bom dia.
Tenho uma apresentação, em que vou mostrar os sete mitos em torno da PEC.
A PEC tem sido muito debatida, e estão sendo criadas algumas teses...
O SR. AÉCIO NEVES (Bloco Social Democrata/PSDB - MG) - Marcos, dê licença.
Presidente, pede silêncio para ouvirmos.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Está pedindo agora. Antes, não pedia silêncio. Engraçado isso.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Faça silêncio aí.
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Exatamente, exatamente!
(Tumulto no recinto.)
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O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Está suspensa a reunião por cinco minutos...
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Respeite, Senadora Vanessa!
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - ... para restabelecer o silêncio.
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Ele não pode falar assim com a Senadora Vanessa! É preciso se restabelecer, Sr. Presidente, a condição de se falar no plenário.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Senadora Vanessa, por favor!
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - É preciso se restabelecer essa condição. Não podem o Senador Aníbal e os outros Senadores se pronunciarem dessa forma contra a Senadora Vanessa! Só ela pode ser contestada?!
(Interrupção do som.)
(Suspensa às 12 horas, a reunião é reaberta às 12 horas e 01 minuto.)
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Sr. Presidente, eu queria...
(Soa a campainha.)
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Sr. Presidente...
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Estão reabertos os trabalhos.
Com a palavra o terceiro depoente, o Sr. Marcos Mendes.
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Sr. Presidente, eu só queria fazer uma pergunta: por que a TV Senado não está transmitindo esta reunião?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Ah, voltou agora.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - A reunião foi suspensa, de modo que se suspende a transmissão.
(Intervenções fora do microfone.)
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Claro! É um debate público! Há muita gente acompanhando isso aqui!
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Isso é de interesse da sociedade sim!
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Eu peço ao pessoal da eletrônica que restabeleça o microfone do depoente. (Pausa.)
Agora sim.
O SR. MARCOS JOSÉ MENDES - Posso falar por este aqui?
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Sim; está funcionando.
O SR. MARCOS JOSÉ MENDES - Muito bom dia!
Podemos começar?
Muito obrigado, Sr. Presidente.
A PEC é um assunto realmente muito quente. A discussão que tem sido feita em torno dela tem trazido alguns mitos, e eu vou procurar analisar sete mitos que têm sido divulgados em torno da PEC, esclarecendo os reais objetivos e a importância dessa medida.
Para começar, antes de passar pelos sete mitos, nós temos três pontos fundamentais: em primeiro lugar, existem vários modelos de desenvolvimento econômico. Existe desenvolvimento econômico induzido pelo Estado, desenvolvimento econômico induzido pelo aumento da educação, pela expansão do mercado interno... Enfim, os países encontram os seus caminhos para fazer o desenvolvimento econômico. O que não existe na história econômica recente é um país que conseguiu se desenvolver com uma dívida pública crescendo assustadoramente, com um desequilíbrio estrutural nas suas contas. Então, ajuste fiscal é o passo número um. Ter estabilidade fiscal é a condição que nós temos para sair da situação em que nós nos encontramos. Ou nós encontramos uma forma de estabilizar a dívida pública, de estabilizar as contas públicas, ou nós não vamos sair do cenário deprimente em que nós nos encontramos, vamos, no máximo, ficar arrastando um crescimento de 1% ao ano.
O segundo ponto fundamental dessa PEC é que ela reconstrói o realismo orçamentário. Todos nós, aqui, já ouvimos falar que o orçamento brasileiro é uma peça de ficção. Por que se diz isso? Porque o que se precisa no orçamento, atualmente, é um equilíbrio entre receitas e despesas. Então, quando você quer colocar mais despesa no orçamento, o que você faz? Você superestima a receita. E, sistematicamente, nós temos superestimado as receitas, ao longo dos últimos anos, e colocado mais e mais despesas. Se, na hora de executar o orçamento, aquela receita que a gente previu não acontece, o que é que tem de ser feito? Um contingenciamento bilionário de despesas. E quem decide o contingenciamento é o Poder Executivo. Isso reduz absurdamente a transparência do nosso processo orçamentário. As pessoas param de acreditar nele, e os grupos de pressão mais organizados são os que conseguem fazer as suas despesas serem executadas.
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Com a PEC o que vai acontecer? O limite de despesa dado pela PEC terá que ser obedecido pelo Orçamento. Então, não vai adiantar mais superestimar a receita, para colocar mais despesa, porque a despesa está dada. Isso significa que o que for colocado no Orçamento poderá ser efetivamente executado, e nós não vamos ter mais esse festival de obras que param pelo meio do caminho, programas interrompidos e graves problemas de qualidade de gestão.
O Parlamento vai ser empoderado, porque o que este Parlamento decidir vai ser efetivamente executado. E o que que isso tem de repercussão sobre a qualidade e o desenho das políticas públicas? As grandes prioridades sociais, como saúde e educação, vão ganhar protagonismo e importância, vão ganhar força. Por quê? Por que eu quero ver quem vai ter coragem de dizer que vai tirar dinheiro da educação para construir estádio de futebol, quem vai tirar dinheiro da saúde para dar subsídio para empresa que não precisa? Porque, com um orçamento realista, para você botar dinheiro numa coisa, vai ter que dizer claramente de onde tirar. E isso empodera as grandes prioridades nacionais, o que não acontece hoje em dia.
E o terceiro ponto, muito relevante, que tem que ficar claro desde o início é que essa PEC é o início do ajuste. Ela não para de pé, ela não se concretiza, se nós não fizermos uma reforma da Previdência e uma melhoria muito forte da gestão da qualidade dos gastos públicos. Esses são três pontos fundamentais.
Vamos passar, então, para cada um dos mitos. O primeiro mito é o de que a saúde vai perder. E a grande realidade é que a saúde vai ser beneficiada.
Eu distribuí às senhoras e aos senhores um texto um pouco mais longo sobre a saúde em que eu detalho mais a argumentação por que eu vou passar mais rapidamente.
O que está acontecendo com a saúde? A saúde é a grande perdedora.
Como eu aponto aqui? É possível apontar?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. MARCOS JOSÉ MENDES - Sim.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. MARCOS JOSÉ MENDES - Não, não. Há outro texto, Senador; há outro texto que vai ser distribuído.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. MARCOS JOSÉ MENDES - Não, não, esta é a apresentação. Há um texto escrito sobre a saúde.
Mas vamos lá! No gráfico da direita, a gente vê que as despesas primárias totais, nos últimos anos, de 2004 a 2015, subiram 102%. E a saúde subiu só 65%. A saúde é perdedora no atual modelo de gestão fiscal orçamentária.
Por quê? O gráfico da esquerda explica. Porque a Previdência está crescendo mais e mais, e ocupando espaço, e já consome quase 50% do gasto. A Previdência vai espremer os outros gastos, inclusive com a saúde. Se nós não mudarmos o modelo de gestão fiscal e abrimos espaço, a saúde não tem chance.
Outro fato fundamental, é bom a gente olhar o que acontece com os nossos vizinhos, como o que acontece quando acaba o dinheiro. A Venezuela tinha um modelo padrão, incensado internacionalmente, em atenção à saúde. Quando a economia da Venezuela foi para o vinagre, desintegrou-se totalmente. Hoje, a Venezuela tem os piores indicadores de mortalidade infantil e mortalidade materna.
O gráfico de cima mostra o que aconteceu com a Argentina. Quando acabou o dinheiro - a Argentina corresponde àquela linha preta -, quando acabou o dinheiro na Argentina e a crise fiscal se estabeleceu, o gasto em saúde desabou.
E é muito bom comparar com o Chile, que é um país que tem tradição de estabilidade fiscal e de respeito à restrição orçamentária. O Chile tem sido capaz de manter o seu gasto numa trajetória crescente.
Bom, e o que o realismo orçamentário vai fazer a favor da saúde? Hoje, nós temos um gasto mínimo de saúde decretado pela Constituição, que, em 2014, era de 92 bilhões. Muito bem, o Governo empenhou 92 bilhões, mas, na hora de pagar, só tinha 85 para pagar, e deixou restos a pagar de sete. Em 2015, a mesma coisa, deixou restos a pagar de seis.
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E vem, desde pelo menos 2011, acumulando restos a pagar. Então, não adianta dizer que há gasto mínimo na saúde e, na hora em que falta o dinheiro, não tem com o que pagar.
Com a PEC, como eu falei, vamos ter realismo orçamentário, e a despesa empenhada vai ser muito próxima da despesa paga. E vai ser possível efetivamente cumprir o mínimo da saúde.
Há que se lembrar sempre que não temos um limite máximo para a saúde; o limite é mínimo. Portanto, é uma proteção. E a PEC antecipa uma progressão do cálculo dos recursos mínimos da saúde. Pela regra atual, ela chegaria a 15% da Receita Corrente Líquida em 2020. Isso foi antecipado para 2017, de modo que já dá uma injeção para o setor da saúde de R$10 bilhões, que serão carregados ao longo de todo o processo do novo regime fiscal. Portanto, de cara, a saúde já tem uma recuperação da sua verba mínima.
Se o gasto da saúde continuar atrelado à receita, ela vai continuar vulnerável ao que nós estamos vivendo agora, períodos de forte queda da receita. Se nós estivéssemos com a regra da PEC, de corrigir o mínimo da saúde pela inflação, desde 2014 o mínimo estaria sendo reajustado por taxas maiores do que a da receita. Por exemplo, em 2015, a receita cresceu 6,9%, e a inflação, quase 11%. Portanto, esse modelo atual não protege a saúde em períodos de recessão.
Por fim, há a questão realismo orçamentário, que eu já citei, em que os gastos sociais vão ganhar protagonismo e força no debate orçamentário.
O segundo mito, muito parecido com o primeiro, é de que a educação vai ser prejudicada. Qual é a realidade? Boa parte da educação está fora da PEC? Não é sequer incluída no limite da PEC. E há motivos para acreditar que a educação vai ser beneficiada. Mais de 70% da despesa pública com a educação não está sujeita ao limite da PEC. Por que isso? Porque a maior parte do gasto com educação é feita por Estados e Municípios, e o limite da PEC é para o gasto do Governo Federal.
Além disso, estão fora dos limites da PEC alguns gastos federais, como a fundamental complementação da União ao Fundeb. Essa é uma complementação que a União faz para os Estados e Municípios mais pobres para manter o gasto mínimo por aluno. Assim como o Fies e o Prouni também estão fora.
Agora o mais importante para a educação no que diz respeito à PEC é que o financiamento da educação por Estados e Municípios depende fundamentalmente da recuperação da economia. Cada Senador e cada Senadora aqui sabem a quantas anda a arrecadação dos seus Estados e dos seus Municípios. Desabou com a crise econômica. Nós precisamos recuperar a economia, porque, recuperando a economia, o Fundeb local vai ter mais receita para pagar as despesas com saúde e educação.
Mais uma vez o realismo orçamentário se impõe e protege o gasto social.
E também não é difícil a gente perceber que a crise econômica é devastadora para a educação, em especial para os jovens pobres que estão no ensino médio e que são levados a abandonar o estudo para substituir a renda do pai ou da mãe que ficou desempregado. Essa perda com evasão escolar não se recupera nem no médio nem no longo prazo. Nós precisamos recuperar a economia, estabilizar as nossas contas públicas para que esse tipo de problema deixe de acontecer.
O terceiro mito: a PEC vai tirar dinheiro dos pobres para pagar a dívida pública. Qual é a verdade? Qual é a realidade? A PEC vai beneficiar os mais pobres, e a despesa com os juros da dívida pública vai cair. Aliás, os juros já estão caindo.
Quando a gente fala que controlar gasto público vai tirar programas dos mais pobres, a gente está pressupondo que o Estado brasileiro tem uma grande capacidade de chegar nos mais pobres, de atender os mais pobres. Mas isso não é a realidade.
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O gasto federal tem um baixo impacto de distribuição de renda e, se conseguirmos focalizar e melhorar as políticas públicas, vamos melhorar o atendimento dos mais pobres.
Há alguns dados da literatura que são muito interessantes. O que são as fontes de renda provenientes do setor público? Pagamento de salário, benefício social, benefício previdenciário, Bolsa Família. Todas essas rendas que as pessoas recebem a partir do setor público são responsáveis por 30% da desigualdade de renda medida pelo índice de Gini, quer dizer, os pagamentos do Governo concentram renda, portanto controlar a expansão do gasto público não é atingir o mais pobre. Ao controlar a expansão do gasto público, estamos controlando um fator que gera concentração de renda.
Segundo, um exemplo disso: os aumentos de remuneração dos servidores públicos concedidos entre 2003 e 2009 concentraram renda a ponto de eliminar todo o efeito distributivo da expansão do Bolsa Família nesse mesmo período. O que demos em termos de redistribuição com o Bolsa Família tiramos aumentando salários no topo das carreiras públicas.
O outro dado muito interessante é a baixa capacidade do Estado brasileiro de reduzir o índice de Gini. Se pegarmos a distribuição de renda antes e depois da intervenção do Estado brasileiro, a distribuição de renda, pelo índice de Gini, melhora em quatro ponto sete percentuais apenas. Nos países da OCDE, ela cai catorze pontos e, nos países do Euro, ela cai quase vinte pontos.
Portanto, os nossos programas públicos, em sua maioria, têm baixa capacidade de distribuir renda e de chegar aos mais pobres. Precisamos racionalizar o gasto público. Estado inchado não significa Estado a favor dos mais pobres.
Este é um dado muito interessante com relação ao pagamento de aposentadorias. Em 2014, 77% dos aposentados que não acumulavam pensão situavam-se nos cinco últimos decis, nos cinco mais altos decis de renda domiciliar per capita, ou seja, os mais pobres não são os maiores privilegiados pelo pagamento de aposentadoria pública.
Outro aspecto muito importante para concluirmos que a PEC vai ser favorável aos mais pobres é termos a consciência de que ela é o caminho para recuperar a economia, para reduzir o desemprego e reduzir a inflação.
O desemprego pesa muito mais sobre os mais pobres. A pessoa mais pobre não tem uma poupança acumulada para financiar a sua perda de renda durante o desemprego, ela não tem patrimônio para vender, ela não tem gordura no seu orçamento doméstico para se ajustar enquanto está sem emprego, ela não tem acesso a crédito bancário, ela tem pouco acesso a crédito familiar, portanto é muito mais dura a realidade do desemprego para os mais pobres. Estamos com mais de 12 milhões de desempregados, a maioria na base da pirâmide social.
Também é muito claro que os pobres são os maiores prejudicados pela inflação, inflação essa que vai explodir se não mudarmos o nosso regime fiscal. Como disse aqui o Prof. Samuel, vamos para uma situação parecida com a da Argentina, ficar com inflação lá para 30, 40%. Todo mundo viu, com o Plano Real, o grande ganho de renda quando houve a súbita estabilização de preços, e as pessoas mais pobres tiveram forte melhoria na sua qualidade de vida.
Bom, eu já falei que os pobres não vão perder. Este mito fala: tirar dinheiro de pobres e pagar mais juros. Na verdade, os juros pagos pelo Governo vão cair com a aprovação da PEC. Na verdade, as taxas de juros já estão caindo. Aí, precisamos entender por que os juros são altos no Brasil. O Samuel já falou um pouco aqui sobre isso.
O Governo, quando tem um déficit, vai, todo mês, ao mercado pedir dinheiro emprestado. Quanto mais ele pressiona esse mercado, pedindo mais e mais crédito, o preço desse crédito sobe, o preço do crédito é justamente a taxa juros.
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Outro motivo pelo qual a taxa de juros sobre a dívida pública cresce é que o Governo, mais e mais endividado, vai se tornando um devedor de risco, a qualificação de risco dele pelas agências de avaliação vai caindo, e naturalmente quem vai emprestar para o Governo, que não é o grande especulador - sou eu, que tenho meu dinheiro no fundo de pensão, é a dona de casa que tem o dinheiro em uma aplicação financeira, somos nós, aqueles que compram Tesouro Direto, são essas pessoas que aplicam em títulos públicos -, vai querer uma rentabilidade maior para emprestar ao Governo, por isso o juro também sobe.
Vamos ver o que está acontecendo.
Esse gráfico à esquerda mostra a taxa de juros sobre os títulos de longo prazo do Tesouro Nacional. O Tesouro vai a mercado, faz um leilão, vende seus títulos. O que aconteceu com a taxa de juros ao longo de 2015, quando havia clara percepção no mercado de que a política fiscal estava à deriva, não havia um plano de estabilização fiscal, não havia um plano para controlar a dívida pública e não havia consenso político em torno disso? Ao longo de 2015, a taxa de juros subiu. A partir do momento em que houve uma mudança de política econômica e houve a perspectiva de que há uma política de estabilização fiscal, as taxas de juros de longo prazo começaram a cair. Despencaram de 7,38 para 5,79 e 5,68 nos dois tipos de títulos.
O gráfico ao lado mostra um quadro similar: a taxa de risco dos títulos brasileiros. No período de 2015, houve uma disparada desse risco pelo temor de descontrole fiscal e, a partir do momento em que se estabilizou uma possibilidade de reencontramento da política fiscal, de reestabilização fiscal, essa taxa de risco caiu abruptamente.
Vamos passar para o quarto mito, aquele que diz que não é preciso fazer ajuste: o Brasil está vivendo só uma crise passageira, decorrente da crise internacional, e, quando o mundo voltar a crescer, voltaremos a crescer junto com o resto do mundo e fica tudo muito bem. A realidade não é essa; a realidade é que nós estamos vivendo a maior crise desde o início do século XX. Essa crise é culpa de erro de política econômica nos últimos anos, e, sem o programa de ajuste fiscal, o nosso destino é a insolvência, o baixo crescimento e a inflação. É a mediocridade e a crise permanente.
Como nós vemos isso? O Samuel já mostrou um pouco esses números; eu vou passar rapidamente.
O quadrinho ali ao lado mostra a queda do PIB nas piores crises desde o início do século XX. Nem na crise de 1929, o PIB caiu tanto quanto caiu agora; caiu 5,3%. Agora, em dois anos, nós tivemos uma queda de 7% do PIB. A crise, portanto é grave, é muito grave. E que tal essa ideia de que essa crise é grave para todo mundo? Basta olhar a taxa de crescimento dos outros países no mundo que vamos ver que o Brasil só ganha da Venezuela, que é um país que está em uma situação que todo mundo sabe qual é. Todos os outros países estão se saindo muito melhor que o Brasil. Isso revela que nós temos um problema interno e que nós precisamos ajustar a nossa economia internamente.
O mito nº 5: o prazo da PEC, de 20 anos, é muito longo e vai estrangular as políticas públicas. Qual é a realidade? O prazo permite um ajuste gradual, e não haverá estrangulamento. Eu gostaria aqui, inclusive, de comentar a projeção que foi apresentada de estrangulamento, que faz uma projeção para 20 anos, e, na verdade, o prazo da PEC não é de 20 anos; é de dez anos mais dez. No décimo ano, o método de correção da despesa pode ser alterado a cada mandato presidencial, portanto a regra de correção da despesa vai durar por dez anos. No décimo ano e a partir de cada mandato presidencial, ela será repactuada. Isso significa o quê?
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Que lá no décimo ano, se nós estivermos com a economia ajustada, equilibrada, a taxa de crescimento da despesa poderá ser outra e poderá crescer mais rapidamente. Ou, então, o gestor pode escolher reduzir a carga tributária ou aumentar a transferência para Estados e Municípios, nós vamos estar em outra situação.
Por que dez anos mais dez anos? Nós estamos saindo de um déficit primário de 2,7 do PIB. Para estabilizarmos a dívida pública, precisamos chegar a um superávit de alguma coisa como 2,5 ou 3 do PIB. Então, nós temos um caminho de pelo menos cinco pontos do PIB de ajuste das contas públicas para não irmos para o vinagre, para termos alguma chance de sermos uma economia civilizada...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS JOSÉ MENDES - ... e voltarmos a crescer.
Por isso, precisamos de um período de dez anos, pois, com meio ponto do PIB de ajuste gradual, anual, nós conseguiríamos chegar, fazer essa travessia. Não é um ajuste excessivo e é suficiente para manter o controle da dívida pública.
Sem o gradualismo da PEC, iríamos precisar de medidas extremas. Seríamos hoje o que está sendo o Rio de Janeiro. Se não quiserem fazer nada, não faremos nada, esperaremos mais um pouco e adotaremos o modelo Rio de Janeiro. É uma opção, podemos discutir, está certo?
Com relação ao estrangulamento da despesa, as nossas projeções mostram que a adoção da PEC vai nos levar a uma despesa, em 2026, no final do período de dez anos, na faixa de 16% do PIB. O que é isso? É exatamente o que nós tínhamos lá por 2005/2006. Em 2005/2006, ninguém vivia em estado africano. Então, as projeções mostram que é plenamente factível o ajuste, e não é um ajuste excessivo.
O mito nº 6. O mito nº 6 diz o seguinte, para sair da crise é preciso que o Governo gaste mais ao invés de gastar menos, que é para estimular o crescimento econômico com políticas anticíclicas.
Qual é a realidade que estamos vivendo? A situação fiscal é muito grave e não há espaço para política anticíclica. Fazer política anticíclica hoje, aumentar gastos, é jogar querosene, gasolina, na fogueira. É querer aprofundar a crise fiscal.
Para aqueles que dizem que basta fazer o PIB crescer e que, com o PIB crescendo, a relação dívida/PIB vai se estabilizar, as nossas contas mostram o seguinte: sem ajuste fiscal nenhum, vamos precisar que o PIB cresça 8% ao ano, de hoje até 2025, para a dívida pública se estabilizar. Eu acredito que não seja factível.
Volto a repetir: esse é o ponto inicial, nós precisamos evitar a insolvência das contas públicas. Não há, na história econômica, caso de país que tenha conseguido crescer e se tornar um país desenvolvido com uma dívida pública em trajetória explosiva e sem consistência nas suas contas fiscais. É urgente reverter a deterioração fiscal.
O gráfico da esquerda mostra o desabamento do nosso déficit primário e o correspondente dele está no lado direito, que foi a decolagem da dívida pública de forma assustadoramente veloz e é essa dívida pública que nós precisamos conter.
Há gente que fala: “Não, ainda tem espaço para fazer política anticíclica. Vejam, as economias avançadas têm dívida de mais de 100% do PIB. A do Brasil é só de sessenta e poucos por centos do PIB, pelo critério do FMI.”
Eu gostaria de lembrar o seguinte: as economias avançadas têm uma riqueza privada muito maior do que a economia brasileira e, portanto, podem financiar esse nível de dívida. As economias avançadas têm um nível de taxa de juros muito mais baixo e, portanto, a dívida deles tem uma trajetória muito menos nociva. As economias avançadas têm moedas conversíveis e, portanto, mais facilidade em ter investidores estrangeiros comprando a dívida pública deles.
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A nossa realidade é a dos mercados emergentes. Os mercados emergentes têm uma dívida média de 44%, e nós somos o País emergente com a maior dívida do mundo e com dificuldades para financiar essa dívida.
Para terminar, o último mito: o ajuste fiscal tem que ser feito pela tributação dos ricos e pela auditoria da dívida pública, e não pelo controle de despesas.
Qual é a realidade? De fato, nós precisamos reformar o sistema tributário. Nosso sistema tributário é ineficiente e tem vários fatores de injustiça, mas isso não vai reequilibrar as contas públicas.
A auditoria da dívida pública é uma atividade que já é feita regularmente. Não existe esta fantasia de "vamos parar o Brasil para auditar a dívida pública". Então, os órgãos de controle, como o Congresso Nacional, devem permanentemente auditar as contas públicas.
O nosso problema é a despesa. Esta é a trajetória da despesa: se eu for fazer ajuste pelo lado da receita e estiver desequilibrado com a despesa mais alta, eu aumento o tributo, senão, no ano que vem, a despesa vai continuar, e eu vou ter que aumentar de novo. Nós vamos para uma corrida que vai chegar a 100% do PIB de gasto público e de tributação. É isso que nós queremos? Isso é inviável. Nós temos que atacar a fonte do problema e restringir a nossa propensão a expandir o gasto público.
Além disso, se nós não mudarmos o regime fiscal... No nosso regime fiscal atual, várias despesas são vinculadas à receita. Se nós formos para o ajuste fiscal pelo lado da receita, esse vai ser um ajuste ineficiente, porque, ao se aumentar a receita, obrigatoriamente é preciso gastar mais por conta das vinculações que existem à receita.
A reforma tributária é necessária, mas não resolve o problema fiscal. Se nós fizermos uma reforma tributária de boa qualidade, provavelmente ela vai derrubar a arrecadação. Por quê? Porque, nos últimos anos, a nossa prioridade foi aumentar a arrecadação. Então, foram feitas diversas distorções no sistema tributário para que ele arrecadasse mais, e essas distorções causaram injustiça fiscal e ineficiência fiscal. Se nós removermos isso e voltarmos para um sistema fiscal mais padrão, um sistema tributário mais padrão, provavelmente a nossa receita vai ser menor.
Bom, eu gostaria de encerrar aqui, reforçando que a PEC 55 é o primeiro passo de uma caminhada de ajuste fiscal que não tem alternativas. Se nós queremos voltar a crescer, se queremos ser um País civilizado e transitar para um País de renda alta, nós precisamos enfrentar o problema básico do desequilíbrio fiscal e da dívida em trajetória explosiva. Sem isso, não há qualquer modelo de crescimento que se sustente.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Com a palavra, o quarto e último palestrante, Sr. Guilherme Santos Mello, Professor de Economia da Unicamp.
O SR. GUILHERME SANTOS MELLO - Obrigado.
Boa tarde a todos e a todas.
Eu queria agradecer, obviamente, o convite da CCJ e da CAE para estar aqui discutindo esse tema tão importante com vários colegas já conhecidos de outros debates.
Por sorte, não só a sorte de eu ter ficado por último, mas também a sorte de eu ter escolhido o tema da minha apresentação, dialogando com o final da fala do Marcos, que coloca que não há alternativas à PEC e que, caso o Senado, o Congresso Nacional não aprove a PEC, não haverá saída para o País, digamos assim, a não ser a hiperinflação ou um aumento descontrolado da carga tributária, eu quero mostrar aqui que, na realidade, há alternativas.
Vou dialogar menos do que eu gostaria.
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Acho que, ao longo do tempo, as falas do Samuel e do Pedro foram mais, digamos assim, analíticas do processo todo, de como chegamos até aqui etc. Vou tentar apresentar o que considero que seria uma discussão frutífera para pensarmos uma reforma do regime fiscal que seria importante para o Brasil.
A apresentação está estruturada da seguinte forma: começo com o diagnóstico do atual regime fiscal brasileiro; apresento alguns princípios para o novo regime fiscal e como eles devem ser operacionalizados; avalio a PEC à luz desses princípios; traço um rapidíssimo diagnóstico da situação fiscal - infelizmente não vou poder detalhar muito sobre isso -, e aí já parto para o que considero uma proposta alternativa para novo regime fiscal e comparo, ao final, os resultados dessa proposta alternativa com algumas previsões, com os resultados da proposta atual, que é a PEC 55.
Vou começar com diagnóstico do atual regime fiscal brasileiro.
O atual regime fiscal brasileiro tem muitos problemas: é um regime "curto-prazista", ou seja, as metas são todas anuais. Se varia muito economia no curto prazo, ele tem que reagir de maneira pró-cíclica, então, ele é inadequado do ponto de vista cíclico. Quer dizer, quando a economia cresce muito, há muito espaço para aumentar o gasto; quando a economia cai muito, há que se cortar muita despesa, que é o que nós observamos nos últimos dois anos. Ele é muito pró-cíclico, porque tem uma meta fixa, e, na economia, um ano antes, não se sabe exatamente o que vai acontecer com a arrecadação no ano seguinte, não se tem controle sobre a arrecadação. Então, você vai tendo que ajustar pró-ciclicamente: quando cresce muito, você gasta muito e quando cresce pouco ou cai, você corta muito. Isso aprofunda a recessão.
Ele não dá apoio, suporte ao investimento. Isso é visível pelo baixo nível de investimento público e pelo fato de ser "curto-prazista" - o investimento é necessariamente algo de longo prazo -, e isso dificulta a execução no planejamento. Muitas vezes, a gente tem que abandonar as metas do PPA em detrimento das necessidades de curto prazo. Então, não se consegue planejar o País no longo prazo.
O nosso regime fiscal atual mistura muito efeitos da política monetária sobre a política fiscal, efeitos da política cambial sobre a política fiscal. Fica tudo misturado nas contas públicas. Não temos clareza sobre por que aumentou o déficit, por que aumentou a dívida. Isso é uma coisa que é melhor... Claro que é possível fazer uma análise, mas o regime fiscal não ajuda nesse sentido, e acho que o regime fiscal deveria ajudar.
Outro diagnóstico do atual regime fiscal é o sistema tributário brasileiro que, como já foi dito aqui, é injusto, é complexo, é ineficiente, gera distorções e precisa ser corrigido. Isso é fundamental! A nossa jabuticaba, digamos assim, está muito mais nos juros e no sistema tributário do que em outras coisas. O sistema tributário brasileiro é realmente um ponto fora da curva na comparação internacional, e isso precisa ser corrigido.
E a conclusão a que chego, portanto, é que um novo regime fiscal deve emergir para garantir capacidade financeira ao Estado brasileiro de viabilizar o crescimento de longo prazo, apoiar, sustentar o crescimento a longo prazo e distribuir renda e riqueza.
E quais são os princípios em que se deve basear esse novo regime fiscal brasileiro? Acho que aqui teremos poucas discordâncias, apesar das nossas diferenças políticas. Tem que ser um regime que garanta a transparência das contas públicas, ou seja, que você consiga analiticamente separar os impactos, os efeitos da política fiscal, parafiscal, cambial, monetária nos indicadores fiscais.
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Temos que ter clareza sobre isso. Ele tem que garantir saúde financeira para o Estado. Ninguém aqui está defendendo gastar tresloucadamente, aumentar a dívida sem controle, nada disso. Ao contrário, quem defende um Estado forte tem que defender que ele tenha saúde fiscal. Para quê? Para prover bens públicos de qualidade, com eficiência, cumprindo adequadamente sua função alocativa e prezando pela equidade social.
Outro princípio: ele tem que garantir capacidade de atuação anticíclica do Estado. Gente, eu não estou inventando nada. Isso está nos princípios de qualquer curso de economia do setor público para graduação. São os princípios do Estado. O que Estado deve garantir? Ele tem que ter o princípio da distribuição, distributivo, alocativo e o princípio da estabilização, estabilizador. O que mais? Ele precisa garantir recurso para o investimento público, ou seja, ele precisa priorizar os investimentos públicos, porque são eles que promovem a melhoria da eficiência e o crescimento no longo prazo.
O nosso regime fiscal atual não contempla esses princípios. Ele não é anticíclico. Ele é pouco transparente. Ele não beneficia o investimento público. Portanto, precisa ser reformado.
Como você operacionaliza essa reforma? Três questões centrais, três mudanças institucionais centrais. Precisamos discutir uma reforma do sistema tributário. Essa é uma mudança operacional, institucional e fundamental para que o Estado consiga cumprir a sua missão. O Marcos mostrou a pouca capacidade do Estado de melhorar a distribuição com gasto, mas aquele resultado lá da melhora do Gini implica o quê? O nosso gasto distribui muito. O problema é que a nossa receita concentra muito. Então, o Estado concentra com arrecadação o que distribui com gasto. Se você quer melhorar a capacidade distributiva do Estado, reforme o sistema tributário. E acho que há concordância nisso entre todos nós aqui, independente da linha política. Aperfeiçoar as regras fiscais brasileiras, aumentando a transparência, a eficiência dos controles e a previsibilidade e coadunar as regras fiscais com os instrumentos de planejamento. Ou a gente vai continuar no "curto-prazismo", vai abandonar de vez o PPA? Então, a gente tem que ter condições de montar algo articulado.
Eu passo para uma rapidíssima análise da PEC. A PEC, desse ponto de vista, institui um novo regime fiscal? Do meu ponto de vista, não, porque ela altera só um aspecto do regime fiscal vigente, que é o ritmo de crescimento de parte dos gastos primários. Todos os outros aspectos ela não muda em nada. Então, acho que chamar isso de novo regime fiscal é muito ambicioso. No final, vou falar o que acho que significa a PEC, mas, na minha opinião, não significa um novo regime fiscal. E não estou falando que ela não trata de um tema relevante no longo prazo, que é o ritmo de crescimento da despesa pública. Só estou colocando o seguinte: do ponto de vista do curto prazo, não foi o crescimento descontrolado dos gastos públicos que nos trouxe para a situação fiscal atual. Se você olhar os fatores determinantes do crescimento da dívida pública, vai ver que primário é muito pouquinho ali. A maioria... Aí a gente pode discutir as vinculações entre o primário, o monetário, etc., mas essa é... O que estou querendo ressaltar é o seguinte: esse é um tema estrutural de longo prazo. Não é um tema de curto prazo. E, ao não modificar a estrutura tributária, não discutir os gastos financeiros, porque a PEC não fala nada sobre juros, gasto financeiro. Ela não fala nada sobre gasto tributário, não fala nada sobre desonerações; ela só fala de gasto primário - gasto tributário são as desonerações.
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Não modifica o caráter pró-cíclico do regime fiscal atual e atuar contra o planejamento e ampliação dos investimentos - isso quem diz é o FMI. O FMI fala que país em desenvolvimento que adota esse tipo de regra tem queda no investimento público. Está lá no estudo do FMI.
A PEC não pode ser tratada como uma proposta de novo regime fiscal. Depois, podemos discutir o que ela é, mas me parece que ela não é uma proposta de novo regime fiscal.
Uma rapidíssima avaliação do quadro fiscal brasileiro atual. Temos que reconhecer que a atual situação das contas públicas, em particular a trajetória do endividamento, precisa ser enfrentada. Esse não é um tema em que estamos falando: "não, pode endividar, cresce a dívida o quanto quiser". Não! Precisamos enfrentar essa questão, revertendo a trajetória e retomando a capacidade de investimento do Estado.
E como podemos fazer isso? Há duas questões, tem que separar as coisas.
Uma coisa é conjuntural. Do ponto de vista conjuntural, o maior desafio é a retomada do crescimento econômico. Também acho que todos nós concordamos com isso. E das receitas públicas, permitindo que equilíbrio fiscal seja coerente com aumento do emprego e da renda.
Para isso, investimento público é fundamental. Você precisa, para o País crescer, de alguma fonte de demanda autônoma. Não vai ser uma demanda externa. Senão, vai ser o investimento do empresário. Porque eu nunca vi empresário investir porque o governo fez reforma. Ele investe em reforma da Previdência ou reforma fiscal. Ele investe porque tem demanda. Ele investe porque tem alguém querendo comprar o produto dele.
Então, quem tem capacidade de fazer política de demanda autônoma é o Estado. Investimento público é importante.
Agora, temos que reconhecer que, do ponto de vista estrutural, temos desafios. Reformular o regime fiscal é um deles. Olhar o crescimento da despesa em relação ao PIB é um deles, com certeza. Não estou falando que a PEC não trata de nenhuma questão importante. Ela trata, mas, a meu ver, de maneira inadequada.
Vou passar para as propostas para um novo regime fiscal. Eu separei em três eixos:
Transparência e racionalidade para o regime fiscal. Recomposição das receitas e mudanças tributárias. Controle e racionalização das despesas melhorando sua composição.
Começando por transparência, que acho que é onde todos temos acordos.
A primeira coisa é que me parece adequado você calcular o superávit primário ajustado ao ciclo econômico, para não ficar essa característica pró-cíclica do resultado primário que, quando cresce muito, o resultado primário se amplia muito, e, quando cresce pouco, ele fica negativo, sem considerar os impactos do crescimento da economia no resultado primário. E é óbvio que ele tem impacto.
Existem várias formas de calcular isso. Essa é uma das propostas. Se quisermos, podemos manter, além de uma regra de gasto, uma regra de superávit primário. Há país que não adota, só adota regra de gasto, mas podemos querer manter uma regra de superávit primário também. Que seja um sistema um pouco mais flexível, por quê? Porque o Estado decide o quanto gasta, ele não decide o quanto arrecada. Isso vai depender da variação da economia. Depende de uma série de fatores.
Então, se inspire no regime de metas de inflação. Nos inspiremos no regime de metas de inflação nesse ponto. Vamos dar alguma flexibilidade, criar bandas para o resultado primário. E vamos fazer a retirada dos investimentos públicos em infraestrutura do cálculo do resultado primário, por um motivo muito simples: isso é a prática internacional corriqueira. Por quê? Porque o investimento público possui um elevado multiplicador, como o Pedro Paulo mostrou, e gera receita futura, além de melhorar a eficiência da economia.
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Ao se restringir esse tipo de gasto, está-se condenando a economia a baixas taxas de crescimento e está-se condenando, na verdade, a que os investimentos sejam sempre engolidos, como são no regime fiscal atual, pelo aumento dos gastos correntes. Então, vamos priorizar o investimento público.
Outra coisa: explicitar os impactos das desonerações tributárias no orçamento da seguridade social. Muita gente fala do déficit da seguridade social etc. É verdade, só que não se fala que boa parte desse déficit é decorrente de desonerações. Eram receitas que eram para vir para a seguridade social e não vêm. São decorrentes de desvinculações. Eu não estou falando para acabar com todas as desonerações, mas vamos explicitar, vamos deixar claro o que era para ser a receita da seguridade social e que deixou de ser. Vamos deixar claro também quais são os impactos disso para os Estados e os Municípios. É importante do ponto de vista da transparência, para não fazermos um diálogo de surdos, para fazermos um diálogo embasado.
Outra coisa. Esta é uma proposta que está rolando por aí: substituir as operações compromissadas, que distorcem os indicadores de dívidas, pelos depósitos remunerados. A maioria dos países desenvolvidos já faz isso há muito tempo. Por quê? Porque boa parte da dívida pública brasileira, na verdade, não tem nada a ver com a questão fiscal, é operação do Banco Central para enxugar liquidez do mercado financeiro. Isso distorce o indicador de dívida pública - isso distorce muito, não é pouco. Então, achamos que há uma dívida de um tamanho, e, na verdade, do ponto de vista fiscal, a dívida é menor. Se você substitui isso, você deixa claro qual é o impacto fiscal dos juros, fica claro nos depósitos à vista, sem distorcer o indicador de dívida, garantindo mais transparência para os dados fiscais. Essas mudanças contribuem para a transparência e para a racionalidade.
Do ponto de vista das receitas públicas, há algumas propostas, muitas delas estão no documento "Austeridade e retrocesso", que estão também em um debate público. Nós vamos ter que enfrentar em algum momento. Se quisermos fazer um novo regime fiscal, não adianta só olhar para a despesa primária, tem que olhar para tudo, transparência, racionalidade, receita. Por exemplo, o Brasil é um dos dois países, um dos pouquíssimos países do mundo que não tributa lucro e dividendo. Não é à toa que estamos cheio de empresários. Por quê? Por que somos muito empreendedores? Não, é porque vale a pena abrir uma PJ e receber por lá, porque a distribuição de lucros e dividendos é isenta. O governo Fernando Henrique retirou isso em 1995. Será que não é hora de rever isso aí? Só a Estônia que retira isso. Todos os outros países da OCDE mantêm esse tipo de taxação. Por quê? Porque se criam distorções. Não vale a pena ser trabalhador CLT, vale a pena ser PJ.
Outra coisa: imposto sobre grandes fortunas. O Pedro já falou, não vou me alongar. Há a proposta do Senador Fernando Henrique, que respeito muito. Tenho grande consideração por essa proposta. Eu acho que ela é importante, mas essa proposta foi mudada. Há várias outras propostas, substitutivos diferentes sobre a regulamentação de um imposto que está na Constituição. Essas novas propostas têm uma capacidade menor de arrecadação, mas são importantes. Há exemplos muito bem-sucedidos no mundo de impostos de grandes fortunas, no Uruguai, na França. Por que não vamos copiar esses exemplos?
Grandes heranças. No Brasil, nós temos uma das taxas mais baixas de impostos sobre heranças, criando, na verdade, uma forma não meritocrática, porque o sujeito herda uma riqueza enorme, não paga taxa sobre isso e não precisa trabalhar, pois ele é rico por causa de herança.
Recriação das taxas adicionais do IRPF.
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O Brasil é um dos países que têm a taxa máxima mais baixa do mundo, criando aquele cenário que o Pedro mostrou, que é de regressividade do imposto de renda nas altas rendas. E rever algumas regras de abatimento na base de cálculo do IRPF. Por exemplo, no Brasil, você pode abater ilimitadamente despesa com saúde. Vamos criar um limite para isso? Porque, senão, o sujeito tem um plano de saúde com avião, helicóptero, e abate tudo no imposto de renda.
"Ah, mas isso vai aumentar a carga tributária". Pois então vamos reformar o sistema tributário, vamos compensar esse aumento com redução dos impostos em cascata sobre produção e consumo e com melhoria para o imposto de renda, isentando pessoas mais pobres. Vamos fazer uma troca. Essa troca tem que ser gradual, não pode ser imediata, porque estamos acostumado a cobrar um tipo de imposto e a desacostumado a cobrar outro. Mas gradualmente fazemos essa troca e melhoramos, ao final do período, o sistema tributário brasileiro.
Além de revisar as isenções tributárias, como já tenho dito aqui; combater a sonegação fiscal, que é outro tema; e agilizar os mecanismos de cobrança da dívida ativa. Todos os temas que o Pedro tocou em sua apresentação e que não vou me alongar sobre isso.
E do ponto de vista das despesas, você não vai propor nada? Não, vamos propor. Temos que discutir reforma da previdência? Vamos discutir a reforma da previdência. Esse é um tema importante, porque realmente o País está envelhecendo, vamos ter que tratar disso. Esse é um tema de longo prazo, não vai resolver o nosso problema atual, mas é um tema de longo prazo estrutural para o Brasil. Vamos tratar dele? Vamos, mas vamos levar em consideração que, em primeiro lugar, não é só olhar para o acesso aos benefícios, mas também os mecanismos de controle e fiscalização dos benefícios.
Segunda questão, vamos levar em consideração que o Brasil não é a Dinamarca. "Ah, mas, na França, a idade é 67". O Brasil não é a França. O Brasil tem o Rio Grande do Sul, São Paulo, que são Estados ricos e desenvolvidos, mas tem Estados extremamente pobres. Há pessoas que começam a trabalhar com 14, 15 anos de idade. Você vai criar uma regra que é uma regra que serve para a Dinamarca não vai servir para nós.
Então, vamos discutir democraticamente uma reforma da previdência que leve em consideração as particularidades brasileiras e leve em consideração que temos um orçamento na seguridade social que está sendo muito abatido pelas desonerações. Vamos ver a real situação fiscal da previdência.
E as despesas primárias precisam de alguma regra? Não necessariamente. Mas podemos criar regras? Podemos, só que a regra da PEC é muito restritiva. A proposta que estou colocando aqui está em linha com as experiências internacionais. Bom, a PEC constitucionaliza a política fiscal, que não acontece em quase país nenhum do mundo, ela dura 20 anos, renováveis, dez mais dez, coisa que em nenhum país do mundo existe. E ela atrela à inflação, coisa que quase nenhum país do mundo adota. Por quê? Quando se atrela à inflação, como já mostrou o Pedro, você diminui o tamanho do Estado na economia ao longo do tempo.
Então, vamos criar uma regra que limite o crescimento da despesa vinculado ao PIB. "Ah, mas isso não vai ser pró-cíclico? Quando cresce demais, cresce demais a despesa, e cai?" O.k., então, vamos criar as cláusulas escapes. Quando cresce mais de 2,5% a 3%, a despesa só cresce 3%. Quando cresce menos de 1%, a despesa só cresce 1%. Você cria um mecanismo mais anticíclico. É uma proposta. Não estou falando que é a única, mas é uma proposta possível, certo?
E o que você vai retirar desse limite? Quando você está em recessão, você tira o investimento limite, porque o investimento vai ser a peça fundamental para você voltar a crescer.
Aqui há também considerações sobre: temos que reduzir a taxa de juros e o custo de manutenção das reservas e do controle da taxa de câmbio.
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Mas como eu já estou estourando o meu tempo, quero passar para a parte final, que é a parte dos cenários. Certo? Vocês vão falar: "Guilherme, essa proposta para em pé? Ou seja, ela estabiliza a dívida? Ela resolve o nosso problema fiscal?" Vamos ver os cenários? Os pressupostos são os mesmos para a PEC 55 e para a proposta alternativa, certo?
Os dados iniciais foram tirados da proposta, de 2007, do Ministério do Planejamento, da PLOA; taxa de inflação 4,5%; taxa de crescimento real do PIB 3% ao ano, que, na verdade, é a média da taxa de crescimento do PIB de 2002 a 2015. Eu tirei a média, dá 2,9%, 3%. Vamos supor que a gente consiga crescer 3% ao ano; elasticidade PIB da receita pública de 1,2 para as duas propostas. Isso está dentro da literatura internacional, em particular, porque estamos num momento de recessão e juros implícitos da dívida bruta começando em 11% - o da dívida líquida é muito mais alto -, e se reduzindo até 7%, o que também não é nenhum absurdo uma taxa de juros real de 2,5%.
Quais são as diferenças do cenário? Isso é o que é igual. O que é diferente? Na PEC o crescimento da despesa é zero. Na alternativa o crescimento da despesa tem um teto hipotético, pode ser três, pode ser 2,5. Eu coloquei 2,5 e simulei, a de 3 não dá muita diferença, coloquei a de 3 e dá mais ou menos igual.
E do lado das receitas? A PEC não fala nada das receitas. Na minha proposta, há um aumento de R$83 bilhões decorrentes do fim de desoneração, fim de isenção, negociação de dívida ativa e algumas medidas tributárias. E esse efeito de aumento da receita vai aumentar a carga tributária? No momento Inicial, sim, e depois vai se diluir ao longo do tempo. E, ao final, a gente vai ver que a carga tributária vai ser basicamente a mesma, só que com uma composição tributária melhor na proposta alternativa. E aqui estão as previsões: do ponto de vista do resultado primário, a PEC é essa bege. Ela é muito explosiva. Isso só vai até 2026, porque eu considerei o argumento de que, em 2026, pode mudar a proposta. Então, fui só até 2026.
Você sai de -2% do PIB para 3% do PIB, mais de 3% do PIB. É uma coisa muito explosiva. Vamos suavizar esse movimento, e, vejam que a gente recupera o primário ao mesmo tempo. A proposta alternativa volta para o campo positivo ao mesmo tempo que a PEC, ao mesmo tempo, por causa das medidas tributárias.
Agora, e a dívida bruta? Pois é. A dívida bruta, no cenário da PEC, estabiliza e começa a cair um pouco antes. Todas as questões aqui podem ser ajustadas, podemos ajustar uma previsão um pouco diferente da outra, etc. Mas ela chega, mais ou menos a 86% do PIB, em 2022, e começa a cair. A proposta alternativa chega mais ou menos ao mesmo patamar só que dois anos depois e começa a cair.
Só que olha a diferença central, as despesas primárias, na PEC, saem de 19,5% do PIB para algo em torno de 15%, você tem uma redução enorme do Estado brasileiro para níveis de países subdesenvolvidos literalmente. Na outra, você tem uma estabilidade do tamanho do Estado brasileiro, o que dá espaço para atender às necessidades de investimento e de benefícios sociais.
E por fim: "Ah, mas, para isso, você vai ter que aumentar muito a receita pública". É verdade que a receita sobe no momento inicial - aqui adotei o critério da anualidade, só subiu em 2018. Sobe no momento inicial, mas depois você vai compensando isso com a retirada dos impostos em cascata, com isenções de imposto de renda para mais pobre, etc e, ao final de um período mais longo, você basicamente iguala as duas receitas.
Então, sumarizando, quais são as vantagens da PEC?
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Você recupera mais rapidamente o resultado primário, mas numa trajetória muito inclinada, muito explosiva. E você tem uma reversão mais veloz da dívida bruta, que reverte em 2022. Mas quais são as desvantagens? Primeiro, essa proposta, mantida até 2026 - que é a proposta dos vinte anos - vai chegar num primário de 6% do PIB. Isso não existe no mundo. Nem de 3% existe no mundo. Imagine 6%! Seria uma coisa completamente fora.
Redução drástica do tamanho do Estado e, portanto, dos serviços públicos, porque a previdência, como o Pedro mostrou, mesmo com a reforma, vai subir. Você não altera, na PEC, a estrutura tributária nem o regime fiscal. Ele continua pró-cíclico, a estrutura tributária continua ruim e você pressiona os investimentos públicos, por que de onde você acha que vão vir os cortes? É claro que vai ser em cima dos investimentos. Já está sendo e continuará sendo nos próximos anos.
Quais são as desvantagens da proposta alternativa? Ela retoma um pouco mais lentamente o primário, é verdade, mas isso não impacta, não quer dizer que a dívida pública sai de controle. Ao contrário, ela reverte a sua tendência de crescimento em 2024, com um patamar similar ao da PEC.
E quais são as vantagens? Você cria um ajuste mais suave e sustentado do primário e da dívida, você mantém o tamanho do Estado, não pressionando os serviços públicos e dando preferência ao investimento pelas cláusulas de escape, você melhora a estrutura tributária ao final do período e, aí sim, efetivamente reforma o regime fiscal garantindo o seu papel anticíclico.
As conclusões, portanto, são de que o regime fiscal brasileiro é inadequado, na minha opinião. O atual, é inadequado para as nossas necessidades, só que a PEC não constitui uma reforma do regime fiscal, ela é uma proposta de redução do Estado e dos bens públicos na economia. Ela não enfrenta temas centrais como as receitas primárias, os gastos financeiros, os gastos tributários, a estrutura da Receita, a pró-ciclicidade, a transparência. Ela não enfrenta nada disso.
Então, é plenamente viável a adoção de propostas alternativas à PEC. Essa é uma. Existem outras, que ataquem as questões centrais, tanto estruturais quanto conjunturais, com resultados similares da trajetória do endividamento, mas resultados muito melhores do ponto de vista da composição do gasto, da estrutura do Estado, da estrutura tributária. E as alternativas são menos custosas do ponto de vista social, político e preservam o investimento.
A pergunta que deixo para os senhores é: se há alternativas melhores, por que não considerá-las? Por que não debatê-las? Por que vamos ter que, no afã de aprovar por motivos, razões políticas, razões de conjuntura política, aprovar algo que vai nos engessar por vinte anos? Por quê?
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Encerrados os depoimentos, passamos agora à fase das interpelações.
Nós estamos seguindo, vamos seguir, a lista de oradores pela chegada dos Senadores ao plenário.
O Senador que primeiro se apresentou aqui, eu não estava presente na sessão, mas é a informação do Presidente que me substituiu, o José Pimentel, foi o Senador Moka, e ele permuta com o Senador Ferraço.
Então, com a palavra o Senador Ferraço.
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - Sr. Presidente, consulto a V. Exª qual o tempo que nós teremos?
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Três minutos.
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Sr. Presidente, vamos ampliar para cinco, Presidente?
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - Três minutos é um tempo muito exíguo.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Nós chegamos quase ao dobro do tempo.
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Vamos ver se vamos segurar a reunião.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Mas, Presidente, essa é a atividade mais importante hoje no Senado Federal.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Não estou dizendo que é "desimportante". Eu estou...
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Temos uma única audiência pública...
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - ...argumentando com um fator que é inexorável: o tempo.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Ficamos até a hora necessária, Presidente. Estamos à disposição desse, que é o principal tema de debate no Senado Federal.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Mas nem todo mundo tem a resistência e persistência de V. Exª.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Mas saem e voltam.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Vamos obedecer ao tempo.
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Não, Sr. Presidente, eu quero me associar à Senadora Vanessa também...
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Muito bem, V. Exª também se associa...
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - ...fazer um apelo para que pelo menos cinco minutos, Sr. Presidente. Por favor.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Eu quero só convidar V. Exªs para um raciocínio matemático aqui.
Nós temos aqui, não está contado, mas temos 37 oradores inscritos. Isso vezes três, são 101 minutos.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Sr. Presidente, permite-me um esclarecimento, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Isso significa...
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Permite-me só um esclarecimento.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - ...uma hora e quarenta minutos...
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Mas, olha, a relevância do tema justifica...
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Senadora Fátima.
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Pois não, Senadora.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Só um esclarecimento. Na realidade, a relação que temos aqui não é necessariamente de pessoas inscritas para falar, é a relação de presença que temos na audiência.
Então, eu gostaria, Presidente, de reforçar a solicitação da Senadora Fátima e da Senadora Vanessa, no sentido de que déssemos cinco minutos para os Senadores, porque nem todos vão falar, e obviamente alguns podem até desistir ou trocar, mas acho também de grande relevância esse debate, e essa é a única audiência pública que estamos tendo aqui da CCJ com a CAE, em que temos a presença de representantes do Governo e de quem está fazendo contraponto, crítica à proposta.
Eu queria fazer esse apelo a V. Exª.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Pois não. Por considerar essa relevância do debate, é que quero preservar a todos oportunidade de falar e gostaria que mantivéssemos o tempo previamente estabelecido de três minutos para cada orador, mas eu submeto a...
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Sr. Presidente, apelo pelos cinco minutos. É impossível se fazer uma intervenção sobre a PEC 241 em três minutos.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Pois não. Então, eu quero consultar o Plenário se nós devemos manter os três minutos ou podemos partir para os cinco minutos.
Os Srs. Senadores que aprovam a proposta de cinco minutos queiram permanecer como se encontram. (Pausa.)
Aprovada a proposta, com o voto contrário dos Senadores Tasso Jereissati, Randolfe Rodrigues e José Medeiros.
Então, com a palavra o Senador Ricardo Ferraço, por cinco minutos.
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - A outra consulta que faço a V. Exª, apenas para conhecer o procedimento, é se a cada questionamento, reflexão, nós seríamos respondidos ou se V. Exª vai fazer de três em três, de cinco em cinco. Como V. Exª pretende encaminhar?
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Seguida a mesma regra, igual tempo para a réplica.
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - Não, não. O que consulto a V. Exª é se, a cada intervenção, estaremos obtendo, por parte dos nossos convidados, a resposta com réplica, com tréplica. Qual é o procedimento que V. Exª vai orientar?
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Eu acho que, evidentemente, que se a interpelação não cabe em três minutos, a resposta também não caberá. Então...
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Então, são cinco minutos também para o interpelado.
A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - Sr. Presidente, pela ordem, para propor encaminhamento. Senadora Lídice da Mata. Uma proposta de encaminhamento que espero seja aprovada também pelo Senador Ricardo Ferraço.
Queria propor, Sr. Presidente, que não tivéssemos o método tradicional de tréplica e réplica. Que tivéssemos a fala de cinco Senadores e, a cada cinco Senadores, a Mesa responde por um tempo mais flexível, entre oito minutos, dez, para responder a todos os cinco, porque, senão, vai se estender muito. Acho que essa é uma prática de debate democrático que permite que todos falem e que sejam respondidos.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Se o Plenário não tem nenhuma objeção, a Mesa acata a sugestão da Senadora Lídice da Mata.
Com a palavra o Senador Ferraço.
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nossos convidados, por óbvio, o tempo é muito curto e vou direto ao ponto, com algumas poucas observações.
A primeira delas é que, a meu juízo, essa proposta de emenda constitucional não deveria se chamar PEC do teto do gasto público, ela deveria ser chamada de proposta de emenda constitucional da moralização do gasto público.
Os políticos e os gestores públicos não podem continuar tendo o livre arbítrio de fazerem, com o dinheiro da população, aquilo que bem entendem, como se o setor público fosse casa de mãe Joana, até porque os gestores públicos e os políticos não fazem com seus próprios recursos aquilo que fazem com os recursos públicos. Portanto, essa PEC é, a meu juízo, de moralização da despesa pública.
E não é a primeira tentativa que se faz na história brasileira de impor a disciplina como regra, como princípio básico, cristão, ético e moral, no exercício da atividade pública, até porque não somos donos do setor público, somos representantes da sociedade e, em nome dela, precisamos agir.
Todas as vezes que o Governo se mete a fazer PIB, o que o Governo faz é déficit e, mais do que isso, é roubalheira. É a isso que assistimos num passado recente do nosso País, porque essa crise, a mais complexa crise do Estado brasileiro, a crise mais complexa desde o Brasil Império, não é uma crise importada, essa crise é uma crise fabricada aqui, é uma crise made in Brazil, que foi feita com requinte de perversidade. E, por óbvio, produziu uma recessão sem precedentes, um desemprego sem igual; a inflação, que achávamos que já era um desafio dominado, volta à cena brasileira.
O País se endividou como nunca no tempo recente, e não foi para ampliar o seu investimento; foi para manutenção do custeio do Estado que, há 15 anos, custava 10% do Produto Interno Bruto e hoje custa 20% do Produto Interno Bruto, sem considerar Estados e Municípios, porque, considerando Estados e Municípios, custa, para o contribuinte brasileiro, aproximadamente 40% do Produto Interno Bruto para manutenção do Estado brasileiro.
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Então, para esse banquete o povo não está sendo convidado, tampouco o empreendedor e o trabalhador brasileiro, que geram as riquezas para que o Estado possa fazer uma gestão decente, adequada e competente, muito menos uma gestão voltada para as minorias organizadas que se apropriaram do Estado brasileiro, como se ele as pertencesse.
Faço essas breves observações para direcionar as seguintes questões aos nossos convidados: ao Dr. Marcos Mendes, nós temos a observação de que, durante o governo da Presidente afastada Dilma, pelos crimes que cometeu contra o povo brasileiro, ela ampliou a concessão de benefícios fiscais para o setor privado brasileiro. Não houve governo algum em tempo algum...
(Soa a campainha.)
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - ... que tenha operado uma transferência de dinheiro público do setor privado, como fez o governo agastado. Durante o governo Dilma, as desonerações chegaram a 6,2% do Produto Interno Bruto, ou seja R$420 bilhões foram drenados da arrecadação pública para o setor privado. Por certo, essa transferência de recurso público para o setor privado não produziu os resultados. Eu pergunto: como o Governo pretende tratar, para além desses esforços que precisam ser feitos para conter a ganância do setor público, essas desonerações que custam muito ao povo brasileiro porque foram desonerações anticíclicas, que não produziram resultado, mas que continuam representando esse tipo de transferência.
Ao Prof. Samuel, eu gostaria de perguntar sobre a experiência internacional de regimes fiscais comprometidos com a disciplina do gasto público, com a qualidade do gasto público dentro da nossa realidade.
E, a juízo dos senhores, por que o governo afastado e os seus aliados, ao longo dos 13 anos, não fez aquilo que os seus defensores falam. Por que não tributou as grandes fortunas? Por que não fez a reforma tributária? Por que não operou mais transparência e eficiência no sistema tributário brasileiro, que é um absurdo, porque tributa mais quem tem menos. Por que, após 13 anos governando o País, não transformou em prática o seu discurso?
Eu gostaria de merecer de V. Sªs uma avaliação porque não chegamos aqui por gravidade. Sejamos sinceros. Essa proposta de moralização do gasto público não é causa, é consequência, é efeito; não é pecado, é penitência para os pecados e crimes que foram praticados não contra o governo, mas contra o povo brasileiro. Se, em 2015, nós pagamos mais de R$500 bilhões de juros, eu acho uma graça muito grande quando falam assim: "Ah! O governo pagou R$500 bilhões de juros!" Que governo pagou, que nada! Quem pagou foi o povo brasileiro! Porque, quando o empreendedor brasileiro passa por dificuldades, ou ele reinventa o seu negócio, ou ele reduz as suas despesas, ou ele quebra! E os governos não! Os governos resolveram as suas deformações ampliando a carga tributária.
Portanto, se o caminho não é rever as contas públicas, incorporar equilíbrio nas contas públicas, qual é o outro caminho?
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É refinanciar as nossas dívidas nesses patamares estratosféricos? É aumentar a carga tributária?
São essas as questões que dirijo ao Dr. Marcos Mendes e ao Prof. Samuel Pessoa, agradecendo a condescendência de V. Exª, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Com a palavra o Senador Lindbergh Farias.
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Estou permutando com o Senador Roberto Requião, Presidente Maranhão.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Com a palavra o Senador Roberto Requião, em permuta com o Senador Lindbergh Farias.
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) - Depois da intervenção fundamentalista do meu amigo Ferraço, eu só posso dizer: aleluia!
Mas essa PEC não tem nada de moralista. Ela é quantitativa, ela é absolutamente imoral, porque ela corta tudo, menos os juros dos rentistas e dos credores da dívida. A imoralidade é absoluta!
Mas eu quero tratar, enquanto o tempo me permitir, de alguns mitos que apanhei neste debate e também em algumas declarações públicas do Meirelles, que é o autor, o patrocinador desse processo todo.
Primeiro mito: aumento da confiança do mercado, com esse raio de PEC 241. Nada mais falso, nada mais mentiroso. Não é o reequilíbrio das contas que ajudará na retomada do crescimento, mas a existência de demanda efetiva na economia, o fato de os consumidores terem renda, emprego e disposição para comprar. O investidor produtivo tem em vista o mercado; não as intenções do Meirelles nem a poesia mitológica proposta pela PEC - demagogia neoliberal absoluta!
Outro mito mais absurdo ainda, a PEC gerará confiança empresarial, tendo, como efeito, o crescimento econômico, retomada do investimento privado. Esse mito, além de tudo, é ridículo, Srs. Expositores, uma ficção absoluta. Como eu investidor vou investir se a economia está numa depressão de cerca de 8% acumulados em dois anos, a taxa de desemprego alcança quase 12% e a renda está em queda? Vou investir em produção para quem comprar?
Na verdade, a confiança que está se construindo é exclusivamente para especulação, para mamom, companheiro Ferraço. E não se pode servir a Deus e a mamom, diz a Bíblia. E mamom não é o diabo nem outro Deus; é uma palavra que, em hebraico, quer dizer dinheiro; é a escravização pelo dinheiro, pelo capital vadio da ciranda financeira.
Os especuladores se satisfarão com a PEC, porque eles não dependem de demandas de produtos e serviços, mas apenas da disposição estabelecida pela PEC de pagar os juros escorchantes sobre a dívida pública, que afinal é o objetivo fundamental dessa emenda constitucional: pagar juros, garantir os lucros dos investidores e da rolagem. Sobre o crescimento econômico, ao que os expositores se referiram, não há mais remota possibilidade de algum crescimento econômico resultado de um regime fiscal de congelamento de gasto corrente.
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Crescimento econômico, numa situação de depressão, como a que estamos, exige ampliação de gastos públicos, Marcos Mendes, ampliação de gastos fiscais, sejam gastos correntes, sejam investimentos. Essa é uma lição que aprendemos com o New Deal, com o esforço do Roosevelt, com as ideias do Keynes, com as propostas do Ford, que dizia que, naquela época, a própria automação iria forçar uma superprodução, levando a uma crise por falta de consumo, o que fez o Roosevelt criar o salário mínimo e diminuir a carga horária. Estamos numa linha absolutamente contrária às medidas do New Deal.
(Soa a campainha.)
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) - ... que se inspiraram também nas ideias iniciais do Schacht.
O efeito do déficit fiscal é imediato, como reconhece o próprio documento do Meirelles, só que, com um raciocínio falacioso, ele fala no aumento da dívida.
Do emprego e renda ouvi o meu amigo Marcos Mendes falar. Absoluta falácia! Emprego e renda são resultantes de uma economia em crescimento e só aparecem numa primeira fase de um processo de expansão quando fruto duma política deliberada de gastos públicos deficitários. Nunca congelamento de despesas fiscais.
Outro mito levantado: mais recursos disponíveis para investimento e consumo. Eu fiquei perplexo com essa declaração. Isso é inteiramente falso, absolutamente falacioso. Na medida em que o setor público congela gastos orçamentários, imediatamente é reduzida a demanda de bens e serviços do próprio setor público sobre a economia privada, congelando oportunidades de investimentos e consumos reais, não financeiros. O ganho financeiro fica preservado pelo raio da emenda, com absoluta segurança.
Sexto efeito, sexto mito: queda de juros estrutural. Li isto no texto do Meirelles: juro estrutural, Srs. economistas, que raio de conceito é esse? O que quer dizer juro estrutural? Essa é a mãe de todos os mitos. A taxa básica de juros, a Selic, nada deve às forças do mercado ou mesmo ao regime fiscal proposto pela PEC; obedece exclusivamente às determinações do Copom, que, por sua vez, condiciona as decisões do Banco Central. O Banco Central, em última instância, determina a taxa de juros e, na prática, obedece a determinações do mercado financeiro especulativo. Itaú e Bradesco mandam hoje no Banco Central. Está lá o Ilan Goldfajn, há mais um diretor do Bradesco e o nosso Meirelles, sempre preocupado com os lucros, depois de ter passado uma vida vendendo cartão de crédito e seguro bancário. Afirmar que a taxa de juros estrutural - e eu insisto: ninguém sabe o que é isso - vai cair por causa do regime fiscal proposto é enganar a sociedade brasileira.
A minha conclusão é que não existe nada de fundamentalista e moralista, como, com veemência, colocou o meu amigo Senador Ferraço, e que esta proposta não passa de uma proposta rigorosamente ideológica. Não tem nada a ver com economia. Não tem nenhuma sensibilidade com o povo trabalhador, nunca subiu numa favela. Essa proposta nunca passou fome. É uma proposta ideológica para montar o Estado neoliberal. Essa proposta vem se acumulando ao longo da financeirização da economia brasileira em décadas.
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Em 1980, a Coreia do Sul, a Tailândia, a Malásia e a China produziam menos que o Brasil. Hoje nós não produzimos entre 2% e 15% do que eles produzem, porque a financeirização levou à desestruturação da economia produtiva. Então, essa falácia tinha que ser bloqueada no Congresso Nacional. A consequência dela vai ser transformar o Brasil numa Colômbia, com as "maras" de 40 mil a 50 mil jovens desesperados, sem nenhuma proteção, montando quadrilhas e ritos iniciáticos, ou numa sociedade como a elogiada sociedade mexicana, com assassinatos e degradação absoluta do tecido social.
Eu tenho impressão de que essa proposta, Senador Jereissati, não foi feita sequer por uma mão; foi feita pelo próprio capeta. (Palmas.)
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) - Agora, eu confesso a vocês que estou entusiasmado com essa igreja que o Ferraço fundou hoje aqui, na reunião. (Risos.)
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - Para essa igreja, seguramente Senador Requião não será convidado, será barrado na porta. (Risos.)
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Com a palavra o Senador João Capiberibe.
Não está presente.
Pedro Chaves não está presente.
Omar Aziz também não está presente.
Com a palavra o Senador Aloysio Nunes.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Com a palavra a Senadora Gleisi Hoffmann.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Fora do microfone.) - Eu falo depois. Não, não abro mão não. Só estou mudando aqui a ordem.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Senadora Ana Amélia.
Não está presente.
Senador José Aníbal.
O SR. JOSÉ ANÍBAL (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - Sr. Presidente, convidados, eu gostei muito do que eu vi aqui hoje. O Samuel Pessoa e o Marcos Mendes procuraram e alcançaram um propósito crucial: deixar claras as motivações, as razões que levam à PEC do teto - que o meu companheiro Ferraço chama de moralização das contas públicas, não é isso, Ferraço? De outro lado, os que se opõem a isso e se opõem de uma forma que, aí sim, atende bem à conceituação ou à ideia do Senador Requião.
Ele saiu?
O SR. FERNANDO BEZERRA COELHO (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE. Fora do microfone.) - Saiu.
O SR. JOSÉ ANÍBAL (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - Pura ideologia - pura ideologia! Considerações que não aterrissam na realidade.
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O Pedro Paulo se referiu, inclusive, ao Peter Linder. Peter Linder não estudou a pilhagem do Estado, e o que aconteceu no Brasil foi uma pilhagem do Estado brasileiro. Aqui, isso foi muito bem caracterizado pelo Samuel. As empresas, o Tesouro, os bancos, e eu acrescentaria: os fundos de pensão. Para quem está nos ouvindo, o fundo de pensão dos Correios já decidiu, desde maio deste ano, por uma contribuição adicional para os 115 mil participantes de 17% ao mês durante 23 anos para compensar a pilhagem que foi feita no fundo. Os outros também, como os do Banco do Brasil e da Caixa, vão ter que fazer algo semelhante.
A grande verdade é que não se pode querer dar um ar de conceituação ao fato, que, definitivamente, nós temos visto ser reiterado todo tempo aqui, no Congresso Nacional, e nos espaços públicos, de que o governo que foi afastado levou o Brasil a uma crise profunda, a um desastre generalizado, a 12 milhões de desempregados, que nem foram mencionados aqui por aqueles que falaram contrariamente à PEC. São 12 milhões - chegam a 22 milhões, porque alguns já cansaram de procurar emprego, outros já desistiram de procurar emprego... Enfim, o País vive uma crise profunda que se agrava, apesar de tudo que já foi feito pelo Congresso nesse curto período, como ter votado DRU e a Câmara já ter votado a PEC, que agora está aqui, no Senado. E eu tenho toda a confiança de que ela vai ser votada. De fato, não têm nenhum compromisso com esclarecer, com propor algo alternativo, a não ser voltar àquilo que vitimou o País, a tal da nova política econômica. Não saem disso.
(Soa a campainha.)
O SR. JOSÉ ANÍBAL (Bloco Social Democrata/PSDB - SP) - As fabulações sobre o que vai acontecer na saúde e na educação foram claramente desmentidas tanto pelo Mauro como pelo Samuel, ali, com números. Quando se falou - acho que o Mauro falou - que, daqui a dez anos, a cada período de governo, a PEC poderá ser revista, houve risada aqui do público do quanto pior melhor.
Na realidade, é isto mesmo: o Brasil precisa, para sair da situação em que o País se encontra, dessa medida urgente que está aí formulada na PEC. O que é a PEC, para as pessoas entenderem definitivamente isso? É travar o crescimento irresponsável, até criminoso, do gasto público, que provoca essa situação de desemprego e de fragilização dos mais pobres no Brasil; é o contrário do que aquele governo dizia querer fazer. E as perspectivas, Senador Maranhão, continuam negativas, embora muita coisa já tenha acontecido para reverter isso no médio prazo. Por quê? Porque foi profundo, não sobreviveu nada, o tomateiro inteiro foi pisado.
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E aqui vi, inclusive, defesa da Constituição cidadã, sequer assinaram a Constituição cidadã! Sequer assinaram!
Aqui tenho até um texto do Dutra, não vou ler porque o Dutra morreu, mas é um texto dele contrário à Lei de Responsabilidade Fiscal, prevendo a mesma coisa que está se prevendo aqui hoje. E a Lei de Responsabilidade Fiscal ajudou a dar rumo ao Brasil. A transgressão à lei é que os levou, entre outras coisas, a essa situação em que nós estamos.
Então, o que eu vejo é que nós estamos aqui, de um lado, tentando esclarecer, posicionar, com números, com estatísticas, com séries históricas, a situação que temos hoje e o quanto esta emenda constitucional é a pedra de toque, é o início de um procedimento de saída da situação em que estamos hoje. E que vai levar, sim, a necessidade de outras votações.
Eu vivi isso no plano real. Nós tínhamos que fazer as reformas, não fizemos todas, mas conseguimos fazer a quebra dos monopólios, foi fundamental para o País, iniciar a reforma administrativa, iniciar uma reforma previdenciária.
Eu me lembro do Reinhold Stephanes correndo, mostrando para todo mundo: “Olha o que vai acontecer.” Está aí, já aconteceu.
E, sobretudo, eu achei muito relevante quem mencionou a situação do Rio, quando disse: “Olha, podemos chegar a uma situação de Grécia, o Rio já chegou na Grécia.”
O Governador do Rio, Pezão, eu estava trabalhando com uma ideia que me preocupava muito, que as receitas do Rio de Janeiro, ano que vem, vão cobrir oito meses de salários. Ele disse nos jornais hoje que serão só sete, Senador Tasso. Tem que pagar 15 meses, pelo menos. Doze, mais férias, mais décimo terceiro, o Rio de Janeiro tem menos da metade.
O Rio Grande do Sul parece que está em uma situação semelhante. O Rio Grande do Norte também. Outros Estados estão ali cheios de preocupações. As receitas públicas continuam declinantes. A capacidade de investimento está zerada e continuar com a nova política econômica... Deveria ser nova economia política.
De fato, é uma variante de uma nova economia política que nos levou a um desastre absoluto e setor por setor. Nós estamos, inclusive, no setor elétrico, tentando fazer a recomposição, na Petrobras. Quer dizer, já existem vários processos em curso, mas o dano foi terrível. A herança não foi maldita, foi desastrosa, e nós temos essa responsabilidade de assumir que o Brasil vai ter que encarar as suas desigualdades, encarar profundamente essa ação corporativa que se apropria do Estado, que foi muito estimulado e continua sendo estimulado aqui dentro pelos perdedores, pela turma do quanto pior, melhor. Continuam tentando fazer política sobre a aparência de beneficiar setores do Estado.
Agora mesmo, a Defensoria Pública, praticamente dobraram o salário, o Presidente vetou. Está certo o Presidente, não tem como. Aumentar gastos hoje no Brasil só se for para criar emprego, que é o que nós estamos tentando fazer.
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O Governo acaba de anunciar que vai retomar as mil e poucas obras, que algum nível de emprego vão criar. Estão descontando na casa dos 40, 45 mil. É um início, mas há muito coisa mais a fazer.
Nós temos, definitivamente, que flexibilizar a legislação trabalhista. O Governo francês aprovou, no dia 9 de agosto deste ano, que o negociado prevalece sobre o legislado, além da possibilidade ampla de negociações sobre jornada, desde que ela seja regulamentada, compensada, etc. Enfim, é preciso desamarrar o Brasil. O Brasil está amarrado para favorecer corporações; o Brasil está amarrado para criar essa situação de 12 milhões de desempregados, e nós vamos desamarrar.
Essa PEC do teto, essa PEC da responsabilidade fiscal é ponto de partida, é a pedra de toque para desamarmos o Brasil, a fim de que ele volte a crescer, volte a ter investimento, volte a ter credibilidade, que hoje está baixíssima.
Há uma percepção de que as coisas estão mudando, mas a ação de mudança do ponto de vista do investimento ainda é muito escassa. Mas, quando nós terminarmos de aprovar a PEC aqui, certamente ela se tornará mais efetiva.
Eu queria parabenizar os dois palestrantes, que, de forma muito objetiva, mostraram as condições que levaram à necessidade dessa emenda à Constituição e esclareceram, de forma muito pertinente, as consequências dessa emenda à Constituição, as consequências positivas para que o Brasil volte a ter credibilidade e emprego.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Com a palavra o Senador Lindbergh Farias.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Só para me programar, Presidente. Depois do Senador Lindbergh, serei eu? Depois do Senador Lindbergh?
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - O Senador Lindbergh Farias era o terceiro - ele teria permutado com V. Exª.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Não, permutou com o Senador Requião. Mas não há problema. Eu só queria saber se, depois dele, falarei eu, Presidente. É apenas isso.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Bem, a sua permuta...
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Não, eu não permutei, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Ah, não permutou?
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Não. Ele permutou, até onde entendi, com o Senador Requião. Eu só queria saber se eu poderia falar depois ele.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Sim, pode.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Com a palavra o Senador Lindbergh Farias.
O SR. ROBERTO MUNIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - BA) - Presidente, pela ordem.
Eu queria fazer a minha inscrição. Senador Roberto Muniz.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Eu gostaria de informar ao Senador Roberto Muniz que V. Exª já está inscrito.
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Posso começar, Presidente?
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Com a palavra V. Exª.
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) - Sr. Presidente, é inacreditável que o argumento central para essa PEC seja o argumento da gastança.
Eu peço só...
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Nós estamos falando de um ajuste fiscal de 2,3% do PIB, em 2015. O escândalo é que a grande discussão do País, hoje, tinha que ser sobre como retomarmos o crescimento econômico, a geração de empregos. O centro da discussão no País é isto: como retomarmos o crescimento econômico.
O caminho que nós estamos definindo, que é um plano de austeridade de longo prazo, vai colocar o Brasil patinando. O Brasil não vai conseguir retomar o caminho do crescimento. E aqui eu falo sobre 2015. Em 2015, volto a dizer, o ajuste foi de 2,3% do PIB. Eu vi vários artigos de Samuel Pessoa e de Marcos Mendes defendendo o ajuste do Levy naquele momento também. O que aconteceu com aquele ajuste de 2,3% do PIB? Nós aprofundamos a recessão. E o problema foi frustração de receitas, um círculo vicioso: recessão, frustração de receitas e aumento da dívida.
O que aconteceu ao final de 2015? A dívida aumentou. O resultado nominal, no final, foi de 10,38% do PIB. Aqui novamente ninguém está falando de juros. Oito e meio por cento de pagamento de juros.
Em 2014, no meio do ano de 2014, nós estávamos comprometendo 4,5% do PIB com pagamento de juros.
Então, qual foi o problema fiscal em 2015? Nós crescemos de 4,5% para 8,5% de pagamento de juros, com uma brutal frustração de receitas.
Aqui eu volto a falar do governo do Presidente Lula. O Lula pegou a dívida de Fernando Henrique Cardoso em 60% do PIB. Dívida líquida. Caiu para 36% do PIB. Por quê? Porque houve crescimento econômico.
Então, eu estou sentindo uma pobreza neste debate aqui com relação à discussão sobre crescimento econômico, porque eu quero entrar nas nossas despesas primárias. Nós estamos falando o seguinte: redução de 19,8% do PIB de despesa primárias para 14,8% do PIB, em 10 anos. Cinco pontos do PIB.
Há um estudo do FMI feito com 191 países eu demonstra que apenas 11 países gastam menos de 16% de despesas primárias. Onze países. Olhem o clube de que vamos fazer parte, se esta PEC for aprovada: Bangladesh, Guatemala, Nigéria, Madagascar, Sudão, Turcomenistão. É isso aqui. Apenas 11 países do mundo investem menos de 16% do PIB.
E é importante a pergunta que eu faço. Eu queria que os senhores entrassem nos gastos primários concretos, porque todo mundo fala aqui em abstrato. Vamos ver qual é a gastança a que o Senador Ricardo Ferraço se refere aqui. Sabem qual é a gastança? Foi ter aumentado o recurso em educação em 140% acima da inflação nos governos Lula e Dilma. (Palmas.)
Essa é que é a gastança. Sabem qual é a gastança? Ter aumentado o benefício de prestação continuada, sim. Isso aqui aumentou 0,8% do PIB.
Os senhores estão propondo cortar benefícios de prestação continuada, que são pagos para o idoso e para pessoa com deficiência, que recebem uma renda familiar inferior a um quarto de salário mínimo. Os 19,8% de gastos primários estão aqui definidos da seguinte forma: 8,1%, benefícios previdenciários - há vários estudos que mostram que, pelo efeito demográfico, isso aqui não vai cair; a tendência é aumentar para algo em torno de 9% do PIB -; 4,2%, pessoal e encargos sociais.
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Aqui é importante dizer, Senador Ferraço, que, de 1997 a 2006, houve, em despesa com pessoal, uma redução de menos 0,3% do PIB. Não foi aqui a gastança. Mas vamos lá. Despesas obrigatórias: 3,3% do PIB. Volto a dizer: o que é isso? BPC, abono, seguro-desemprego. Despesas discricionárias: 4% do PIB. O que houve de aumento aqui de despesa discricionária? Investimento, PAC, que, inclusive, voltou a cair novamente. Eu, inclusive, chamo a atenção do Senador Armando Monteiro, porque o investimento vai ser o primeiro prejudicado, vai ser o primeiro a ser cortado.
Eu citei aqui os 19,8% de gastos primários. Para cair para 14,8, não tem jeito. É uma ginástica perversa a que os senhores estão levando o País. Vamos ter que cortar, violentamente, recursos de saúde e de educação. Vai acabar o aumento de salário mínimo. Para servidor público, só tem um jeito: reajuste zero. Os senhores estão querendo fazer o que existia no Governo de Fernando Henrique Cardoso. Foram oito anos de reajuste zero para servidores públicos e maldades na Previdência: vinculação de salário mínimo com benefício previdenciário, BPC. É por aí que os senhores vão. Mesmo se a lógica dos senhores estivesse certa, é preciso um grande ajuste fiscal no País.
Eu pergunto: não há nenhuma conta a ser paga pelo andar de cima, pelos mais ricos? É um ajuste só em cima dos mais pobres. Nesse sentido, na lógica dos senhores, falta equilíbrio nisso aqui. Falta equilíbrio! Eu queria que os senhores falassem sobre isso, se não há nenhuma medida, neste momento, que taxasse os mais ricos, o andar de cima.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Agora eu vou facultar a palavra aos convidados nesta audiência pública.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Não; porque, se acumular demais, não dá.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Foram quatro.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Ficou certo que seriam cinco oradores. Os cinco já falaram.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Não; foram quatro, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Já falaram cinco.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Não. Quatro, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Falta V. Exª.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Perfeito.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Então, é justo que V. Exª fale, porque V. Exª está muito preparada.
Senadora Vanessa Grazziotin.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Sr. Presidente, V. Exª é, como sempre, muito gentil.
Eu quero iniciar aqui a minha fala, rapidamente, porque nosso tempo é muito curto, lamentando, mais uma vez, a falta de debate. Este é o único debate no âmbito da Comissão de Constituição e Justiça. Teríamos que discutir a matéria aqui, pelo menos, com profundidade, sobre a constitucionalidade da medida, mas não temos esse espaço. Não temos sequer o espaço para debater uma matéria controversa, que, segundo mais um estudo de consultores do Senado Federal, é inconstitucional por uma série de razões.
Segundo, alguém aqui disse que a PEC deveria ter outro nome. Eu também não acho esse nome muito apropriado, a PEC do teto do gasto. Essa é a PEC da retirada do direito dos trabalhadores e da população brasileira. Essa é a PEC do retrocesso. Essa é a PEC do Estado mínimo, Presidente.
Então, veja: é exatamente um colega meu que critica algumas das falas aqui, algumas das posições, considerando-as ideológicas, quem faz o debate, a intervenção mais ideológica de todas, absolutamente de todas. Por quê? Em toda a sua tese, o que nós ouvimos do Dr. Samuel e do Dr. Marcos foi a defesa do Estado mínimo.
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Vejam, aqui dizem que o Brasil vive a pior crise - olhem o absurdo -, a pior crise econômica dos 120 últimos anos.
Meu Deus, vamos olhar os números. Nós temos aqui muitas tabelas que todos os senhores têm. Mostram o nível de endividamento que o governo central na época de Fernando Henrique deixou o País com o nível de endividamento agora; a inflação da época com a inflação de agora. Mostra, principalmente, desemprego - Senadora Kátia me socorra -, mas mostra principalmente quanto eram as reservas cambiais naquele período e quanto são as reservas agora.
Vamos ignorar isso tudo? Não. E dizer o seguinte, que não há outra saída. Talvez por isso o Senador Requião tenha dito que aqui estão criando uma nova concorrente para a Universal, é uma outra seita, porque é o discurso fatalista. Ou é esse caminho ou é a falência do País, ou é o desemprego para o povo. Não é verdade.
Então, o Dr. Guilherme aqui colocou uma proposta clara e evidente - aliás, esta sim adotada por alguns países -, que limita o crescimento, não impede o crescimento. Porque essa PEC não é uma PEC que congela. Num primeiro momento, ela congela. Num segundo e imediato momento, ela reduz a aplicação de recursos para o povo.
E não querem debater por essa razão. Porque não adianta botar tabela bonita porque aqui só repetem os mesmos mantras, porque tem que ser, porque tem que ser, mas não explicam porque tem que ser.
Porque nenhuma palavra, nenhum artigo, nenhum parágrafo sobre os gastos financeiros na PEC. Por que nenhuma? Porque só em relação àquilo que serve ao povo brasileiro. Por que só isso? Agora uma régua rasa contra quem? Contra a nossa gente, contra os mais pobres.
Aí os senhores dizem o seguinte: "Não, precisamos dessa medida para diminuir a inflação e o mercado ficar estabilizado." Tudo bem. Então quando diminuir a inflação e o mercado ficar estabilizado, qual vai ser a regra? A mesma. Ou seja, para onde vai o dinheiro? Não é para a saúde, não é para a educação, não é para ciência e tecnologia, é para pagar serviços da dívida pública. São para os gastos financeiros. É para aí que vão os recursos.
E dizem mais. O Congresso vai ter poder como nunca teve antes. E eu quero é ver quem vai votar contra a saúde e a educação. Vai ser um poder fratricida que vai dizer: vamos tirar do menos pobre para dar para o mais pobre. É isso que vai fazer. Vai tirar da ciência e tecnologia, vai tirar da infraestrutura, Senadora Kátia, vai tirar da agricultura e, portanto, da produção de alimentos, se quiser manter o mínimo de atendimento.
E ainda ouço de alguns economistas o seguinte: "Não, não vai cair não. Nós vamos voltar o investimento público, senhoras e senhores, a 2005" - foi isso que eu ouvi. Vamos voltar a 2005, como se o resto das questões do País estivessem também congeladas, como se a população brasileira não crescesse.
A população brasileira, em 2005, era de 187 milhões; em 2016, 209 milhões; 22 milhões de pessoas a mais, e a tendência é crescer, crescer, crescer. Para esses, nasçam pobres e morram pobres. O Estado não ampara.
Então, tudo que estamos vendo aqui, e eles mesmos respondem dizendo que não vão tirar dinheiro, mas a fala mostra como vão tirar dinheiro. Essa é uma resposta. Nos investimentos públicos, no social, na infraestrutura, vai voltar a ser o que foi em 2006. Os financeiros não; para esses não há nenhum limite.
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Segundo, os senhores dizem o seguinte: que o problema, e aí explica o porquê dessa ser a PEC do Estado mínimo, é a base para o Estado neoliberal, dizendo o seguinte, está aqui o Dr. Pessoa falou no final, nas suas considerações finais, é necessário lembrar que o primeiro resultado da Constituição de 1988 foi a hiperinflação brasileira. Não foi o resultado da Constituição brasileira, não foi. Isso aí escrevem. E eles sabem disso. O que foi resultado da hiperinflação foi desarranjo do sistema fiscal brasileiro e não dos direitos dos trabalhadores.
Agora isso mostra claramente o que eles querem atingir, o que eles querem acabar: o Estado que protege o mais pobre, é o Estado que faz a distribuição. E dizem muito o seguinte: a inflação é que corrói o salário. O que corrói o salário muito mais até que a inflação é esse sistema tributário, injusto, que a maior parte da população imagina que não paga um centavo de imposto porque não recebe o suficiente para pagar imposto de renda. Não é verdade isso. A população brasileira é a que mais paga, o pobre, imposto de renda. Imposto sobre café, 20%. Quem paga? Não é quem produz o café, é quem compra o café, é o povo pobre. Por isso que mostra que a contribuição dos mais pobres, dos trabalhadores que ganham até dois salários mínimos para arrecadação da União é de 54%. Enquanto que, os mais ricos, é de 29%. É essa a sangria contra o povo. É aí que nós temos que mexer, e não tirar da educação, não tirar dinheiro da saúde. Para pagar o quê? Para pagar e manter essa estrutura como foi dita pelo Dr. Guilherme. Essa estrutura tributária muito mais do que arcaica, mais injusta que o Brasil tem.
Então, é isso que tem que ser mexido, não dessa forma. E o pior, isso tudo está acontecendo, veja Senador José Maranhão, um Presidente que sentou-se na cadeira ontem, sem ter recebido um voto da população brasileira, propor uma medida tão estruturante ...
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Recebeu sim.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - ....o cuco de novo, ele está com saudade da Comissão do Impeachment, de atrapalhar os outros. Não recebeu um voto, está sentado na cadeira, e está propondo uma medida para 20 anos.
Veja, propostas há. Então, pergunto dos senhores, das alternativas. Cometem a proposta do Dr. Guilherme, que, aliás, é que a maior parte do mundo, daqueles poucos países que aplicam limites colocam, não como a nossa, muito menos na Constituição, muito menos ainda por 20 anos. Mas isso tudo tem que ser com muita pressa, porque se for mais lentamente, dando tempo à população brasileira de se conscientizar a quem serve isso, essa proposta não passará.
Aqui ninguém é contrário a medidas de ajuste fiscal. Aqui ninguém é a favor da gastança. Ao que nós somos contrários é tirar do pobre, é tirar do trabalhador. O que somos a favor é que, neste momento de crise profunda, temos que tirar de quem mais tem. Eu concordo com o que todos dizem. A crise, Senador Maranhão, nos apresenta uma porta para a saída e para a evolução, mas temos que escolher qual a porta. Infelizmente esse Governo que aí está escolheu a sua porta. É a porta contra o Brasil, é a porta contra os trabalhadores brasileiros, e a favor daqueles que já são muito ricos e que têm muito neste País.
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Então, eu queria, para concluir, Senador Maranhão, que os dois senhores comentassem a respeito da proposta aqui apresentada para saída da crise e falassem também sobre a experiência internacional. Falam, falam, falam, mas só falam de Holanda! Só falam disso, não falam de um país como o nosso nem do que se faz na maioria dos países. E que os senhores pudessem falar sobre esse discurso fatalista, se, de fato, é verdade ou não e se vai tirar dinheiro ou não do povo.
É isso.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Tendo completado os cinco interpelantes, vamos ouvir agora as explicações formuladas pelo Sr. Samuel Pessôa.
O SR. SAMUEL DE ABREU PESSÔA - Sr. Presidente, muito obrigado pela oportunidade. Srªs e Srs. Senadores, muito obrigado pelas questões.
Eu vou organizar a minha resposta em três temas que, ao que me parece, nortearam as diversas falas. O primeiro tema da Senadora Vanessa, agora, foi o tema dos juros dos bancos, do capital financeiro, do mercado financeiro, ou ainda, por que a PEC e as estratégias de ajuste fiscal não se iniciam ou também não tocam nesse tema.
O Senador Roberto Requião, sempre com muita eloquência, tratou da questão da carência de demanda agregada e da importância da política fiscal ativa para gerar o crescimento.
E o Senador Lindbergh Farias também tocou no tema do crescimento e lamentou que a questão do crescimento não estivesse no centro da nossa discussão hoje. Pelo que eu entendi, a argumentação do Senador é de que a saída da crise tem que ter, como tema principal, o tema do crescimento.
Então vou tratar dessas três questões na minha resposta.
A questão dos juros da dívida interna. Por que juros e gasto primário têm tratamentos distintos? Isso é verdade, sim. Juros e gasto primário, na PEC e na vida, têm tratamentos distintos, e isso por uma natureza, gente: o gasto primário é aquele gasto que a sociedade decide por meio de deliberações do Congresso Nacional. Quando a sociedade decide por este ou aquele gasto primário, ela decide porque ela desejar decidir por um argumento de natureza em geral normativa e sem nenhum problema.
A questão é que os juros são decididos pelo mercado. O Governo não consegue decidir quanto ele vai gastar de juros. Ou seja, se eu quiser reduzir o gasto de juros... Eu tenho duas formas para reduzir o gasto de juros: uma é a forma que a PEC propõe, que é reduzir a trajetória de crescimento do gasto primário, para aumentar o superávit primário, para, com isso, fazer com que o gasto dos juros caia. E nós estávamos nessa trajetória ao longo do período até 2008/2009; depois, nós sairmos dessa trajetória. A outra forma de reduzir o gasto com juros é propor um calote da dívida interna. O problema é que essa saída nós já tentamos inúmeras vezes, nos anos 80 e 90. Naquele período de hiperinflação, nós demos diversos calotes, que geraram resultados muito ruins. A experiência brasileira é que...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. SAMUEL DE ABREU PESSÔA - Interna também. A gente, com planos de estabilização, com aquelas tablitas, com o Plano Collor etc., sempre dava um "totozinho" na dívida. A nossa experiência é a de que o resultado foi muito ruim.
Agora, evidentemente, os Senadores são soberanos. Se os Senadores e Deputados acharem que a melhor saída é um calote na dívida externa pode se dar...
(Intervenções fora do microfone.)
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Aqui ninguém propôs calote.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) - Respeitem! Deixem ele falar!
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Social Democrata/PSDB - ES) - Vamos garantir a palavra ao nosso convidado, Sr. Presidente.
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O SR. SAMUEL DE ABREU PESSÔA - O que eu estou dizendo é uma questão que, no meu entender, é lógica: tentar reduzir juros na marra é idêntico, é igual a calote da dívida externa. É isso que estou dizendo. Eu não conheço nenhuma outra forma de reduzir o pagamento de juros que não seja produzir superávits primários elevados por seguidos anos ou um calote da dívida externa. Não conheço outra.
Na verdade, há uma terceira forma, que é a que se tentou no primeiro mandato da Presidente Dilma: eu forço o Banco Central a baixar os juros. Ao forçá-lo a baixar os juros, evidentemente, o custo de rolagem da dívida pública cai, e, ao fazer isso, a inflação volta. Nós tivemos um retorno da inflação, apesar do controle dos preços administrados durante muitos anos no primeiro mandato da Presidente Dilma.
Então, há três formas: ou eu dou calote - e aí há uma questão jurídica que precisa ser avaliada; ou eu aceito inflação, porque lembremos que, no período da hiperinflação brasileira, o Tesouro rodava sua dívida pública pagando zero, pagando muito baixo. Quando a inflação é muito alta, o custo de rolagem da dívida pública, os juros reais são bem baixinhos. Ou, ainda, fazemos superávit primário. Há três jeitos: superávits primários, aceitar a inflação, ou calote. O que o Governo Temer está propondo é a primeira.
Eu só quero lembrar que, as outras duas, nós tentamos ao longo de décadas e décadas, e sempre deu errado. O Governo Temer propõe essa saída...
(Intervenção fora do microfone.)
A SRª KÁTIA ABREU (PMDB - TO. Fora do microfone.) - O Governo escolheu o primeiro? O senhor falou primeiro sobre o calote.
O SR. SAMUEL DE ABREU PESSÔA - Não, desculpe. O primeiro é superávits primários. Era o caminho em que nós estávamos, Senadora, até 2008-2009, e, naquele período, houve um desvio de rota.
Então, essa é a minha primeira resposta à questão dos juros.
(Soa a campainha.)
O SR. SAMUEL DE ABREU PESSÔA - A questão do crescimento e a questão da carência de demanda agregada mencionadas pelo Senador Roberto Requião. Aí há uma questão teórica, talvez, que me separa do Prof. Pedro Paulo. Eu vejo que as economias podem operar em dois regimes muito diferentes. Por exemplo: vamos pegar a economia americana e a brasileira hoje; ou a economia japonesa e a economia brasileira. Existe uma diferença dramática entre essas duas economias. A economia japonesa vive uma situação que o Keynes previu, lá na Teoria Geral, que se chamava carência de demanda agregada. Por uma série de motivos - e podemos voltar ao tema aqui -, existe menos demanda do que capacidade de produção da economia. Isso gera juros nominais nulos, uma tendência permanente à deflação e uma tendência de aumento de desemprego, que, estranhamente, não ocorreu no Japão. O desemprego não aumentou no Japão. Mas, quando você está num regime de armadilha de liquidez e de carência crônica de demanda agregada, temos juros nominais nulos e deflação. Nesse mundo, pode ocorrer austericídio; nesse mundo, uma política fiscal ativa pode gerar crescimento e, assim, sucessivamente.
O Brasil vive uma situação totalmente oposta. O Brasil tem carência de oferta, não tem carência de demanda. Nós vivemos permanentemente com juros reais muito elevados, e, não obstante os juros reais muito elevados, a inflação é sempre muito pressionada.
Na minha primeira fala, eu elenquei seis ou sete características que demonstram que a desaceleração brasileira, no período Dilma, foi produzida por uma queda de produtividade, por um problema de oferta. Não teve nada a ver com demanda. A nossa desaceleração não teve nada a ver com demanda. De fato, depois que nós tivemos, agora, o aprofundamento da crise com a queda do investimento, apareceu uma carência de demanda agregada, abriu-se um hiato de produto, e esse hiato de produto vai ser fechado naturalmente.
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Por quê? Porque o hiato de produto está fazendo com que a inflação convirja para a meta. Conforme a inflação vai convergindo para a meta, a gente tem uma taxa de juros de 14%, que a gente vai baixar muito, e essa queda da taxa de juros vai produzir elevação da demanda, que vai produzir a aceleração do crescimento econômico.
Então, a diferença é que os países que vivem em situação crônica de carência de demanda efetiva não têm um instrumento monetário para fazer a economia retomar o seu crescimento, que é exatamente o oposto da nossa situação. Nós temos juros muito elevados, a inflação ainda está alta, a inflação de víveres ainda está acima de 8%, mas tudo sugere que para 2018 ela vai estar na meta, e, por conta disso, o Banco Central vai acelerar, em algum momento, no trimestre do ano que vem, o ritmo de redução dos seus juros. E isso fará com que o crescimento volte de forma saudável, sem inflação.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Com a palavra o Sr. Pedro Paulo Bastos.
O SR. PEDRO PAULO ZALUTH BASTOS - Muito obrigado pela oportunidade.
Se fosse possível, eu gostaria de mostrar alguns dados aqui que vão ilustrar um pouco o que eu falei e também os argumentos que outros colocaram aqui na Mesa.
O primeiro ponto que eu queria levantar é em torno de determinadas, digamos, inverdades que foram colocados aqui, ao longo do debate.
Primeiro, não é verdade que a PEC nº 55 vai constranger a discricionariedade do Executivo apenas - foi um argumento que se levantou aqui. Por quê? Porque o gasto discricionário, no total do gasto público no Brasil, é muito pequeno. A maior parte do gasto é obrigatório; algo em torno de 90% do gasto. O que a PEC vai fazer, na verdade, é exatamente forçar uma mudança nas vinculações constitucionais que exatamente limitam a discricionariedade e autonomia do Executivo. É o primeiro ponto.
Segundo, não é verdade que, sempre que o Governo se mete a melhorar o PIB, ele faz errado - não é verdade! Vejam: se a gente for pegar a economia brasileira, tanto no período da década de 90, quanto no período do Governo Dilma, dos dois mandatos do Governo Dilma, sempre que o Governo Fernando Henrique elevou taxa de juros para controlar a especulação cambial e cortou o gasto público, a economia embicou. Quando fez o contrário, a economia se recuperou.
No Governo Lula, vamos lembrar que nós tivemos uma crise internacional enorme, em 2008, e a economia brasileira se recuperou muito fortemente por conta de uma política anticíclica realizada em 2008-2009. Em 2011, no primeiro ano do mandato do Governo Dilma, a Presidenta realizou um corte semelhante àquele que foi proposto em 2015, um corte de 1% do PIB, com elevação da taxa de juros e política monetária com controle quantitativo macroprudencial. E isso - eu tenho os dados aqui - derrubou, já em meados de 2011, o crescimento do PIB de semestre a semestre. Está claro?
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Depois, quando foi realizada a chamada nova matriz econômica, que foi iniciada, de fato, ao final de 2011, ocorreu uma recuperação do PIB de semestre em semestre. Não quer dizer isso que queremos voltar à nova matriz econômica. Nós - eu, Guilherme, Pedro Rossi - escrevemos vários artigos, conjuntos inclusive, ao longo do Governo Dilma, dizendo que era preciso concentrar a ampliação do gasto em investimento público e não em desonerações e subsídios, porque, no momento de desaceleração cíclica, isso pode aumentar a margem de lucro dos empresários, mas não lhes determina que ampliem a realização dos investimentos.
No final de 2014, a economia estava em desaceleração cíclica evidente por problemas de demanda sim, porque a economia capitalista sempre opera de modo cíclico. Um bum normalmente se verifica quando as empresas investem bastante, produzem capacidade ociosa e, ao mesmo tempo, os consumidores gastam inclusive mais do que as suas rendas correntes, porque eles contratam dívidas. Isso é claro. Nos dados que constam da minha apresentação, isto se mostra claramente: existia capacidade ociosa nas empresas brasileiras, então não existia uma restrição de oferta. A capacidade ociosa não estava sendo ocupada, mesmo antes de 2015. Então, não há por que as empresas investirem. Não há uma restrição de oferta; há uma restrição de demanda.
Não entendo como alguém pode dizer, por exemplo, que a queda das exportações e do preço das commodities, determinada pelo cenário internacional, e a mudança das exportações líquidas no Brasil tenham um impacto sobre as receitas fiscais e não tenham impacto sobre o crescimento. Isso não tem lógica! Se há impacto sobre as receitas fiscais é porque houve impacto sobre as receitas privadas, porque a receita fiscal, tributária, depende da receita privada. Então, não há nenhuma lógica dizer que a economia mundial não afetou também a economia brasileira.
Sobre a questão da taxa de juros estrutural, como foi colocada, a taxa de juros natural, o BIS (Bank for International Settlements) fez várias avaliações este ano e mostrou: não existe taxa natural de juros nem produto potencial natural, com várias séries econométricas históricas e cross-section, comparando diferentes países, e mostrando, por A mais B, que isso é um mito.
Agora, existe um cientista político que ganhou o prêmio de melhor pesquisa de ciência política em 2013, chamado Christopher Adolph, que escreveu um livro chamado Bancos, Burocratas e Política do Banco Central: o Mito da Neutralidade. Também com muito trabalho econométrico e comparativo, ele mostra o seguinte: nos bancos centrais onde há mais portas giratórias entre o banco central e os bancos comerciais, a taxa de juros é maior. Naqueles em que não há portas giratórias, a taxa de juros é menor. E, nos dois casos, não se produz nenhum impacto sobre a inflação. Porta giratória é quando o agente do banco central vem do banco comercial, depois sai do banco central e, passada a quarentena, volta ao banco comercial eventualmente como acionista do banco comercial inclusive. Mostra que isso não tem nenhum impacto sobre os juros.
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Finalmente, sobre 2015, vamos combinar o seguinte: não dá para dizer que os juros aumentaram porque o mercado achava que não havia nenhum plano de corte de despesas. Como assim? Exatamente os economistas que defendiam a política de corte de gastos no meio de uma desaceleração cíclica tiveram seu principal símbolo conduzindo a política fiscal brasileira: o Joaquim Levy. E, como o Senador Lindbergh já mostrou aqui, houve um tremendo corte de despesa - sim, senhor - em 2015. No Governo Temer, aí se diz que a taxa de juros caiu. Verdade, a taxa de juros caiu; mas houve um relaxamento das despesas. Então, não há lógica; não podem ser as duas coisas ao mesmo tempo.
E nós dizíamos... Aqueles que alegam que o austericídio teve um impacto sobre a recessão, que transformou uma desaceleração em uma recessão, diziam que, exatamente por um conjunto de questões, como, por exemplo, a desaceleração cíclica, a Lava Jato, a seca no Brasil, o cenário internacional, a queda do preço das commodities, não era o momento de realizar uma política pró-cíclica, como o Levy estava propondo. Isso que está no livro Austeridade para Quem?, que foi distribuído aí. Só que essa política foi realizada, e é inegável que ela produziu impactos, sim, sobre a desaceleração cíclica; ela tem impacto também sobre o gasto privado.
Então, me parece que, na verdade, propõe-se agora redobrar a aposta na política de austeridade num momento recessivo, considerando que eventualmente isso vai provocar um aumento de confiança, que vai reduzir os juros - quando os juros são determinados, com muita discricionariedade, pelo ocupante do Banco Central -, e isso vai melhorar a confiança privada, que vai voltar a gastar mesmo sem demanda. O.k? O problema: o FMI já fez o mea-culpa. O FMI propôs para todos os países... E eu acho que economistas neoclássicos brasileiros não leem as publicações internacionais, particularmente nem do FMI, porque o FMI fez um mea-culpa e disse: "Isso não dá certo em nenhuma experiência; está errado". O Alesina, que continua sendo citado, está desmoralizado. Inclusive, os estudos que buscaram fundamentar a contração fiscal expansionista tinham malandragens econométricas. Isso já foi demonstrado. Então, não dá para continuar citando Alesina. Meu Deus do céu, é muita desatualização!
E, finalmente, eu concordo plenamente: foi esse o significado da leitura da entrevista do Roberto Brant, defendida aqui. Não estou querendo ser Deputado, não vou disputar nenhuma eleição, como alguns Senadores brincaram, com muito bom humor, mas foi exatamente para mostrar o seguinte: não tem por que ter pressa! Não tem por que ter pressa, porque há muitas alternativas. Nós trabalhamos juntos aqui em muitas dessas propostas. O Guilherme tem grande mérito de sintetizar um debate grande que fazemos entre os economistas keynesianos no Brasil. Há alternativas, há outras questões que podem ser discutidas. A PEC tem problemas. Nós precisamos de tempo. E eu concordo plenamente com a Senadora quando alegou que a pressa existe, porque a população brasileira, o povo brasileiro não pode saber que há alternativas mais justas e que não repetem o desastre de 2015 e 2016.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Com a palavra o Dr. Marcos Mendes.
O SR. MARCOS JOSÉ MENDES - Obrigado, Presidente.
Acho que não está funcionando aqui.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Está, chegou.
O SR. MARCOS JOSÉ MENDES - Voltou.
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Obrigado, Sr. Presidente.
Vou fazer os comentários gerais, e a primeira coisa que quero falar aqui é o seguinte: não dá para pegar um paper de alguém que trabalha para o FMI e dizer que o FMI falou isso ou que o FMI falou aquilo. O FMI tem lá os seus working papers, em que cada economista expressa suas opiniões. A opinião do FMI oficial é feita pelo seu Diretor, no caso a Diretora-Gerente, que é a Christine Lagarde, que já expressou total apoio à proposta de ajuste fiscal do Governo brasileiro. Então não dá para dizer que o FMI já falou isso, o FMI falou aquilo.
No mesmo sentido, a Senadora Vanessa Grazziotin afirmou aqui que um estudo da Consultoria Legislativa disse que a PEC é inconstitucional. Eu sou Consultor Legislativo de carreira e sei que os estudos são de responsabilidade individual de quem os faz. Assim como um consultor apresentou argumentos pela inconstitucionalidade, outros consultores publicaram ontem um argumento pela constitucionalidade. Isso é opinião individual, rica, que vai para o debate. Não podemos mistificar, chegar aqui e dizer que é a opinião do Senado ou é a opinião do FMI ou é a opinião de quem quer que seja.
Com relação a esse debate de déficit, de dívida, e de juros, vejo uma coisa aqui que não consigo entender. Quem defende que precisa aumentar o déficit é quem não quer pagar juro, é quem diz que tem que parar de pagar juro. Então, isso é inconsistente. Se você faz déficit, você tem que se endividar para pagar o seu déficit, você aumenta a sua dívida e tem que pagar um juro em cima dela. Então, se você quer fazer déficit para estimular a economia, e não quer pagar juro, você quer fazer, infelizmente, o que o Samuel falou aqui: quer encontrar alguma fórmula de dar calote na dívida. Há uma inconsistência nisso aí.
Foi dito aqui também que a dívida pública cresceu não por fatores do gasto primário. De fato, porque muito da contabilidade criativa que foi feita nos últimos anos transformou gasto primário em gasto financeiro. Por exemplo, um gasto que deveria ser computado no Orçamento, que foi a transferência de recurso de 10% do PIB para o BNDES, para o BNDES dar crédito subsidiado para os campeões nacionais, não transitou no Orçamento como gasto primário. Por via da contabilidade criativa, ele impactou direto a dívida, aumentou a dívida em 10% do PIB.
As considerações...
Foram feitas algumas projeções - precisamos olhar os parâmetros das projeções -, mas me chamou a atenção uma projeção que foi feita aqui, no caso da não aprovação da PEC, de se aprovar um programa alternativo, que pressupõe 3% de crescimento do PIB ao longo de todo o período.
Volto à minha fala inicial aqui. Existem vários modelos de crescimento econômico que podem recorrer a vários mecanismos diferentes - investimento privado, investimento público -, mas não existe crescimento econômico em que você tem um quadro de instabilidade fiscal e de dívida pública fora de controle. Então, pressupor que você vai fazer um modelo que não vai estabilizar a dívida pública e que diz que o País vai crescer 3% é, no mínimo, questionável. E o modelo alternativo me parece que dá um choque tributário de mais de 2% do PIB na partida. Eu gostaria de ver o Congresso Nacional discutir e aprovar uma proposta que dá um choque tributário de 2% do PIB já na partida. Eu queria ver a viabilidade política disso.
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Foi dito aqui que a PEC vai chegar a gerar superávit primário absurdo de 6% do PIB. Não vai. Como eu falei na minha exposição, a PEC tem um período de 10 anos com limitação do gasto pela inflação e, depois disso, essa forma de correção do gasto pode ser rediscutida. Se, chegando lá, estivermos com o nível adequado e resultado primário, isso pode ser repensado. Não tem o menor cabimento projetar para 20 anos uma regra que é para 10 anos.
Com relação às colocações do Senador Requião, de que é uma falácia que os juros vão cair...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS JOSÉ MENDES - ... de que a confiança vai aumentar. Não é que os juros vão cair e a confiança vai aumentar, os juros já estão caindo, como mostrei aqui, e a confiança já está aumentando. Isso vai ser suficiente para recompor o crescimento econômico brasileiro? Sinceramente, não sei, porque o estrago que foi feito nos últimos anos foi muito grande. Está certo?
Houve o congelamento de preços administrados, que desequilibrou completamente o balanço das principais empresas estatais; houve as desonerações citadas pelo Senador Ferraço no momento inadequado, que derrubaram a arrecadação e estimularam distorções no sistema fiscal; enfim, houve uma série de medidas como, por exemplo, a mudança do marco regulatório do petróleo, que travou o investimento num dos principais setores da economia brasileira quando o petróleo estava US$120,00 o barril, parou o investimento, e, agora, o petróleo desabou e nós temos um modelo pouco funcional que precisa ser alterado porque não tem condições de parar em pé.
Então, precisamos fazer o ajuste fiscal como condição inicial, mas, infelizmente, precisamos reconstruir muito na economia brasileira, muito do que foi desmontado por uma política econômica equivocada.
Com relação à taxa Selic, ouvi dizer aqui que basta o Governo querer que ele baixa a taxa Selic e o problema dos juros no Brasil está resolvido. Se isso fosse verdade, já estaria resolvido, porque foi isso que o Banco Central fez entre 2011 e 2013. E o resultado disso: mais inflação e menos crescimento, mais desconfiança sobre a sustentabilidade da política econômica, mais desconfiança sobre o que seria do futuro da economia brasileira sem um controle adequado da inflação.
Volto ao ponto. Houve aqui muita acusação de que a PEC é para prejudicar os pobres. Não caiam nessa ilusão! O Estado brasileiro, o formato de gastos públicos do Estado brasileiro não é, nem de perto, pró-pobre. O impacto do gasto do setor público brasileiro na redução da pobreza e da desigualdade deixa muito a desejar. As reformas que nós precisamos fazer, nós precisamos focalizar as políticas públicas, nós precisamos melhorar a atenção aos mais pobres, conseguir chegar nos mais pobres. O nosso Sistema Previdenciário concentra a renda, nossa folha de pagamento do setor público concentra renda absurdamente, o nosso sistema de subsídios às empresas concentra a renda substancialmente, e tudo isso precisa ser revisto, mas, para que comece a ser revisto, nós precisamos ter o ponto inicial, que é uma coisa muito simples chamada restrição orçamentária.
Outro dia, publiquei um artigo dizendo que essa PEC vai fazer a revolução do dois mais dois é igual a quatro. Nós vamos saber exatamente quais são os recursos públicos que temos para gastar. Hoje, nós temos o "me engana que eu gosto", em que o dois mais dois é igual a seis, a oito, a quanto cada um quer. E, para financiar isso tudo, ou com inflação, ou com contingenciamento de gastos, ou com corte de investimento no meio do caminho. Está certo?
Foi dito aqui: "Onde vai cortar?" O Senador Lindbergh fez uma lista de que tantos por cento é benefício de prestação continuada, tantos por cento é Previdência... Vai ter que reduzir na Previdência, sim. A Previdência é insustentável. E é possível fazer uma reforma da Previdência tornando-a mais progressiva em termos de gasto público.
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Programas sociais são importantes? São; mas foram muito mal geridos nos últimos anos. Existe no Governo um comitê de monitoramento e avaliação de políticas públicas que descobriu, por exemplo, que consegue reduzir em R$1,5 bilhão a despesa com o seguro-defeso porque o cadastro de pescadores foi absurdamente inchado.
O cadastro do benefício de prestação continuada não tem revisão há oito anos e vai passar, pela primeira vez, por uma peneira. Não é para tirar benefício de quem precisa, mas para tirar do cadastro quem não precisa e está se aproveitando inadequadamente da política.
A revisão do auxílio-doença que começou a ser feita agora está com uma taxa de 80% de revogação de auxílio-doença indevido apenas por uma perícia adicional. Só essa melhoria na qualidade das políticas públicas básicas e a maior focalização para que elas sejam feitas para os mais pobres vai gerar, nos próximos anos, economia entre R$12 bilhões e R$15 bilhões.
Há muita racionalização a ser feita no serviço público. Há muito que se pensar na nossa política de remuneração e de contratação no serviço público.
Pobre de um país como o nosso em que todo jovem quer ser funcionário público. Isso não vai dar em lugar nenhum e é o que está acontecendo nos últimos anos. Nós precisamos reativar a nossa economia e precisamos fazer a nossa juventude acreditar que pode sobreviver e progredir no setor privado.
É importante haver servidores públicos, sim, mas é alguma coisa muito estranha quando todo mundo neste País quer ser servidor público. Eu tenho orgulho de ser servidor público, sou servidor público há mais de 20 anos, mas alguma coisa estranha está acontecendo. O Estado brasileiro precisa ganhar muita eficiência, e, repito, não sairemos do lugar se não dermos o primeiro passo, que é a estabilização fiscal.
Muito obrigado, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Em prosseguimento, com a palavra o Senador Fernando Bezerra.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Fora do microfone.) - Presidente, o Guilherme não falou ainda.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Ah, não falou ainda? Então com a palavra o Sr. Guilherme Mello.
O SR. GUILHERME SANTOS MELLO - A primeira coisa que me chama a atenção é que penso no cidadão que está nos assistindo, ou estava até agora, pela TV Senado ou pelo site do Senado. É muito confusa a discussão, porque você tem quatro economistas na Mesa. Não tenho a menor dúvida de que nenhum de nós tem intenções malévolas...
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - V. Sª não tenha esta preocupação porque, no momento, a TV Senado está transmitindo a sessão plenária.
O SR. GUILHERME SANTOS MELLO - Está transmitindo a sessão plenária. (Risos.)
Eu não reputo, obviamente, a nenhum dos meus colegas nenhum objetivo maligno. Essa disputa política, digamos assim, acerca dos rumos do País é uma disputa muito tradicional das Casas parlamentares etc. Mas nós temos que tentar, ao máximo, evitar que ela contamine as nossas reflexões. Por quê? Porque é evidente que... O Senador José Aníbal não está aqui, mas ele colocou uma questão: "Porque os seus posicionamentos são ideológicos. Os nossos são técnicos, os seus são ideológicos". E aí a mesma coisa eu poderia falar: não, o seu é ideológico, o meu é técnico, porque eu mostrei dados. "Eu também mostrei dados". Todo mundo mostrou dados. Pois é; os dados não falam por si mesmos; eles precisam ser interpretados.
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Aí, quando você vai interpretar o dado, entra a sua forma de ver o mundo, como você acha que deveria funcionar a economia, como você acha... E a cada um vai interpretar... Então, essa discussão em que alguém falou: "O pessoal do quanto pior melhor é esse povo aí..." Pois é; o governo anterior falava a mesma coisa: "O pessoal do quanto pior melhor é esse povo aí..." Só que, agora, o pessoal do quanto pior melhor era o governo anterior e, agora, é a oposição.
Quer dizer, obviamente que isso varia muito da sua forma de enxergar a economia, de compreender as relações econômicas. Por exemplo, aqui foi dito sobre a relação entre poupança e taxa de juros. Essa é uma leitura... É claro que, para quem não é economista, é uma discussão chatíssima - nível de poupança e taxa de juros. Essa é uma discussão antiga dos economistas, a gente pode remeter isso ao Keynes, à teoria dos fundos emprestáveis. Na minha opinião, Keynes já desmontou isso aí, mas há gente que acha que não desmontou. Há gente que acha que aumentar o déficit vai gerar inflação. Eu acho que isso é uma visão monetarista da economia, muito simplista. Por exemplo, os Estados Unidos aumentaram em US$5 trilhões a base monetária e não deu inflação. "Ah, mas Estados Unidos são Estados Unidos, a gente é diferente."
Não; quer dizer, na verdade essas discussões de fundo têm a ver com a forma diferente que cada economista e cada político enxerga. Há político que defende Estado mínimo, porque acredita que Estado mínimo é o melhor para a sociedade, é a solução para todos os problemas. E há gente que defende Estado máximo, socialismo etc., não porque é maldoso, mas, sim, porque acredita nisso. A única coisa que aprendi - aí, compartilho do Senador Ricardo Ferraço - é a fé cristã. Também sou cristão, tenho formação cristã, estudei em colégio católico, em universidade católica, só que eu aprendi, no meu cristianismo, que não só de fé vive o homem. Nesse ponto de vista, tenho dúvidas sobre a capacidade de um aumento da confiança...
O SR. MAGNO MALTA (Bloco Moderador/PR - ES. Fora do microfone.) - Citou errado.
O SR. GUILHERME SANTOS MELLO - Eu não citei, é uma forma que eu... É minha interpretação.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. GUILHERME SANTOS MELLO - Pois é, eu acho que nem só de pão, nem só de fé.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. GUILHERME SANTOS MELLO - Sim, eu disse: "Minha interpretação." Eu aprendi. Não estou citando a Bíblia, não sou pastor.
(Intervenções fora do microfone.)
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP) - Sr. Presidente, vamos garantir, Presidente, a palavra do expositor.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. GUILHERME SANTOS MELLO - Não, não. O que estou querendo dizer é o seguinte: eu acho que a questão da confiança é um fator importante na economia? É evidente que é.
(Soa a campainha.)
O SR. GUILHERME SANTOS MELLO - Só ele resolve? Não, certamente não. Estamos vendo isso agora. Houve uma recuperação rápida da confiança, o crescimento não veio. Era para o segundo trimestre, ficou para o terceiro trimestre, agora não é nem mais para o quarto trimestre, é para o primeiro trimestre do ano que vem, porque é muito difícil crescer com a capacidade ociosa que a gente tem, com o nível de desemprego que a gente tem sem fonte de demanda. Então, por mais confiante que você esteja... E havia um fenômeno do descolamento que a gente chama de índice de expectativa e o índice de situação atual. Agora, ele já começou a cair de novo. Porque você cria um estado de confiança que não se confirma na realidade e, com isso, você reverte esse estado de confiança.
O que estou colocando é o seguinte: é evidente que melhorar a confiança na economia é um fator fundamental, mas ele não é suficiente. Então, o apelo que estou fazendo aqui não é de falar sua proposta ideológica ou a minha proposta ideológica, até porque todos nós temos a nossa ideologia. Todos nós! Quem não tem? Ideologia não no sentido marxista negativo, mas no sentido da sua forma de ver o mundo.
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O que eu estou tentando colocar é que, mesmo dentro do arsenal teórico que orienta a visão mais tradicional, a visão que alguns chamam de mais neoliberal, mesmo dentro desse arsenal teórico, existem alternativas muito melhores do que a PEC. "Ah, mas não foi o FMI que disse; foi um consultor do FMI." Tudo bem, não foi um, foram vários. Mas, mesmo que não tenha sido o FMI como instituição, foi o economista-chefe do FMI, o Blanchard, um dos grandes economistas. Só porque não foi a instituição, a gente não vai considerar o argumento? Será que o argumento não tem validade só porque foi proferido por alguém que não compartilha da minha visão de mundo? Mesmo quando o argumento compartilha de todos os meus preceitos - o preceito da eficiência, o preceito da racionalidade etc. -, só porque ele foi feito por alguém que é mais simpático a outro partido, eu não vou considerar?
Então, eu queria fazer, na verdade, um chamamento a todos nós, até aos meus colegas que eu sei que estão envolvidos no debate, para fazermos esse debate um pouco fora da esfera da disputa político-partidária, olhando para questões reais. Será que essa PEC é realmente a única e melhor solução para ao Brasil?
E dialogo, finalmente, com a questão da Senadora Vanessa. Existe um discurso fatalista: a nossa outra opção é a insolvência do Estado. Eu nunca vi insolvência do Estado na própria moeda. Eu não quero discutir essa questão, porque isso é um outro tema econômico chato, mas eu nunca vi isso. Mas tudo bem; é a insolvência do Estado, é aumentar descontroladamente a carga tributária. Será que é? Ou será que esse é um discurso que está contaminado pela disputa política? Eu acho - minha opinião - que é um discurso que está contaminado pela disputa política.
Por fim, a última coisa que quero falar é debater um pouco com a questão do cenário. O Marcos dialogou um pouco com o cenário que eu construí aqui, e eu acho importante nós dialogarmos com os cenários que estão colocados; um dialogar com o outro.
O Marcos colocou que ele não vê crescimento econômico em um modelo que não estabiliza a dívida pública. Pois a minha tentativa foi exatamente mostrar que o cenário alternativo estabiliza a dívida pública. Portanto, esse problema não se coloca. Se eu estivesse aqui apresentando um modelo em que a dívida pública é explosiva, ele poderia usar o argumento de que "o seu modelo não estabiliza dívida pública, e eu não acredito em cenários que não estabilizam", mas o nosso modelo aqui estabiliza.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Eu queria pedir licença ao doutor para avisar a V. Sª que o seu tempo já se encerrou.
O SR. GUILHERME SANTOS MELLO - Desculpe. Posso só fechar e encerrar?
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Sim, sim.
O SR. MAGNO MALTA (Bloco Moderador/PR - ES. Fora do microfone.) - Dê mais 10 minutos para ele.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Aqui nós somos democratas...
O SR. GUILHERME SANTOS MELLO - A última coisa que eu queria falar...
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - ... diferentemente do que alguns possam pensar. Cada um tem o seu pensamento aqui.
O SR. GUILHERME SANTOS MELLO - Eu acredito. O Senado é o espaço da democracia. O Parlamento...
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Nós temos é que discutir essa questão - essa é a proposta do Senado - objetivamente. Quanto à ideologia, ninguém vai se livrar da sua formação ideológica.
O SR. GUILHERME SANTOS MELLO - É claro.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Mas é preciso ter objetividade.
O SR. GUILHERME SANTOS MELLO - É evidente.
Quanto ao crescimento econômico de 3%, é o crescimento médio da economia brasileira nos últimos 15 anos.
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Será que é tão impossível assim a gente alcançar um crescimento médio de 3% nos próximos dez anos? Aí alguém vai falar: com a PEC, sim; sem a PEC, sim. Eu acho que não é impossível a gente alcançar esse crescimento.
Por fim, o último tema é o da melhoria da eficiência, o de que o nosso Estado tem de ser mais eficiente. Pois é, toda a minha proposta está baseada nessa discussão. Toda a proposta alternativa estava baseada na discussão da melhoria, na progressividade da tributação, na eficiência do gasto público, na melhoria da composição do gasto público, na transparência das contas públicas. Por que essa proposta não pode ser considerada? Ela atende todos os critérios, ela é melhor do que a PEC em vários critérios, mas ela não pode ser considerada porque não há viabilidade política para promover um aumento na carga tributária para os mais ricos, diga-se de passagem, porque todas as medidas tributárias são para os mais ricos e são passageiras. O aumento da carga tributária depois converge de novo para o seu patamar normal. Mas aí eu me pergunto: se não há maioria, se não há ambiente político para aprovar um compartilhamento do ônus da crise com os mais ricos...
(Soa a campainha.)
O SR. GUILHERME SANTOS MELLO - ...por que há maioria para aprovar medidas que tiram investimentos, que diminuem o ritmo dos investimentos em saúde, em educação e cultura, em ciência e tecnologia? Por que há maioria para aprovar uma reforma da Previdência que dificulta para alguns o acesso ao benefício, mas não há maioria para aprovar um imposto sobre grandes fortunas?
Então, eu acho que ambiente político existe; se ele não existisse, nós deveríamos criá-lo, porque as medidas que são propostas dialogam completamente com todos os preceitos que são compartilhados por todos nós economistas.
É isso. Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Com a palavra o Senador Fernando Bezerra.
O SR. FERNANDO BEZERRA COELHO (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, primeiro, eu queria parabenizar pela fala os nossos convidados, citando Pedro Paulo, Guilherme Mello, Marcos Mendes e o Prof. Samuel Pessôa.
Acho que o debate foi muito rico, ficou muito claro que nós temos caminhos alternativos para chegar ao mesmo lugar, que é a recuperação da economia brasileira, que é a volta da geração de emprego, que é voltarmos a confiar no futuro. Mas é evidente que nós vamos ter de fazer uma opção. O debate é rico, o debate traz ideias, mas é evidente que o Congresso Nacional vai ter de deliberar. E é evidente, pelas minhas manifestações já na tribuna do Senado, que eu tenho colocado o meu apoio para que essa PEC mereça aprovação.
Durante esse debate da PEC, eu também, assim como o Prof. Guilherme e Pedro Paulo colocaram, coloquei aqui a necessidade de a gente mexer nesse sistema tributário brasileiro, que acho muito regressivo, como foi dito aqui. E apresentei uma proposta que está em discussão aqui na Comissão de Constituição e Justiça e na CAE, que é a taxação sobre herança e doação, para que a gente possa dar um pouco mais de justiça fiscal.
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O Ministério da Fazenda me informa que a PEC vai ter um resultado tão fantástico, que não vai ser necessário o aumento da carga fiscal. Espero que isso seja verdade.
Mas quero também trazer algo para a reflexão das Srªs e Srs. Senadores. Pedi à minha assessoria para ver quantas emendas constitucionais foram aprovadas de 1988 até aqui. É impressionante o número: 93. Então, acho que a gente não deve se apegar ao fato de que o instrumento da limitação do gasto público é uma PEC, porque, com a maioria política para se aprovar a emenda à Constituição, ela já se provou viável aqui quase três a quatro vezes ao ano.
Acho que nós estamos numa emergência econômica em que todos concordam: podemos dourar a pílula um pouco mais ou um pouco menos, mas nós estamos enfrentando uma das maiores recessões econômicas da história do Brasil. E talvez a PEC seja necessária para haver mesmo compromisso de que precisamos ter maior racionalidade, como foi colocado aqui, no gasto público. Deve haver limite à despesa pública para esse período de recuperação que a economia e a sociedade brasileira reclamam. Eu não tenho dúvida alguma de que o papel do Governo Michel Temer é preparar o Brasil para o grande debate de 2018.
As eleições gerais de 2018 é que vão confrontar esses caminhos, qual caminho a sociedade brasileira vai eleger. E é evidente que, se a PEC não tiver produzido até lá os efeitos que a gente espera de redução do pagamento do serviço da dívida, de amortização do serviço da dívida, de limitação a esse crescimento exponencial da dívida pública, as vozes que aqui foram colocadas irão merecer a atenção e a audiência da sociedade brasileira. Mas eu acho que é urgente...
(Soa a campainha.)
O SR. FERNANDO BEZERRA COELHO (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - PE) - ...a situação da economia brasileira e que a gente precisa, sim, de medidas duras, amargas, como é a votação da PEC 241. Mas não entro nesta de que nada poderá ser alterado durante dez anos; acho que poderá, sim, a começar pela mexida no sistema tributário nacional. Vou continuar defendendo aqui a necessidade de votarmos, sim, a nossa taxação sobre herança e doação. Precisamos colocar isso na ordem do dia do Senado Federal.
Também aqui foi dito que se está fazendo uma série de medidas de racionalidade, e eu queria propor ao Marcos Mendes mais uma: neste País, não se cumpre o limite do teto salarial. Não se cumpre no Poder Judiciário, no Ministério Público, no Governo Federal, nos Governos estaduais, nos diversos tribunais de Justiça do País afora. Como é que a gente vai aprovar um limite para o gasto público se a gente não faz valer o limite do pagamento do teto salarial nas três esferas de poder?
Então, se for necessária uma PEC, o Governo deveria mandar mais uma PEC, para limitar o pagamento do teto salarial no serviço público brasileiro, em todas as esferas.
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A gente abre o jornal O Globo, abre a Folha de S.Paulo, e, todo dia, vem um exemplo: secretárias que ganham R$100 mil reais, juízes que ganham R$90 mil, promotores públicos que ganham mais de R$40 mil, servidores do Poder Legislativo... E nós não vamos fazer nada? Nós vamos achar que isso não é conosco? Eu acho que, neste momento de emergência, em que o Brasil está exigindo medidas duras em todos os setores, em todas as áreas, nós não podemos só escolher algumas. É preciso completar o serviço.
Então, eu gostaria de dizer que gostei do debate. Procurei ficar aqui o tempo todo. Não pude ouvir as palavras de Guilherme, porque tive de fazer um atendimento no meu gabinete, mas acho que as informações foram importantes, para que nós estejamos prontos para votar e para deliberar.
Eu vou votar a favor da PEC 241, mas acho que ela, sozinha, não resolve o problema. Acho que nós precisamos dar uma ajustada no lado fiscal. É preciso que nós façamos alguma coisa pelo lado fiscal. E acho que as coisas não são excludentes: dá para fazer uma e outra.
Para encerrar, eu queria deixar uma pergunta para Samuel e para Marcos Mendes. Vamos supor que nós comecemos a produzir superávit. Vamos supor que a economia brasileira volte realmente a produzir superávit, volte a crescer, volte a gerar emprego. Não deveria haver alguma fórmula que permitisse que parte desse superávit pudesse ser alocada para investimento público? Essa é a pergunta que eu gostaria de deixar para os nossos debatedores.
Muito obrigado.
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ. Fora do microfone.) - Muito bem, Senador Fernando! Faça uma emenda, que eu a apoio.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Com a palavra a Senadora Fátima Bezerra.
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Sr. Presidente, quero, inicialmente, cumprimentar os nossos convidados: o Sr. Marcos José Mendes, o Sr. Samuel Pessôa, o Sr. Pedro e o Sr. Guilherme.
Em segundo lugar, Sr. Presidente, quero dizer que vou fazer aqui a nossa reflexão com foco, principalmente, na área de educação. A PEC 55 tem o escopo de congelar os gastos nas áreas sociais e de, portanto, reduzir drasticamente os recursos nas áreas sociais pelos próximos 20 anos, anulando também, por igual período, a vinculação constitucional para áreas como saúde, como educação, vinculação que garante os pisos mínimos de investimentos nessas áreas e que, no caso da educação, envolve exatamente a questão dos 18%.
Pois bem, estudos foram realizados e mostram que, se essa regra Temer/Meirelles de congelar o dinheiro para a área social tivesse sido aplicada no campo da educação de 2006 até 2015, teriam sido subtraídos da educação mais de R$325 bilhões.
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E, seguramente, se isso tivesse acontecido, nós não teríamos feito os investimentos que fizemos, nesse último período, do ponto de vista de expansão e fortalecimento da educação brasileira, com programas fundamentais como o Fundeb, com programas de expansão de acesso ao ensino superior. Passamos de 3,5 milhões de vagas, em 2003, para mais de 8 milhões, em 2015.
Na expansão da educação profissional tecnológica, houve uma verdadeira revolução: saímos de 144 escolas para quase 600 escolas, ou seja, levamos educação de boa qualidade para os filhos dos trabalhadores e trabalhadoras deste País, bem como uma série de outros programas que foram desenvolvidos na área de educação, tanto é que nós saímos de 3,2%, que era o investimento, versus PIB, em 2003, para 6,2% de investimento versus PIB, em 2015, nos governos Lula e Dilma. O governo da Presidenta Dilma, por exemplo, já estava investindo acima do limite mínimo, que é de 18%. Nós investimos 23%. Ou seja, isso justifica, repito, essa expansão extraordinária, fundamental, decisiva. Frente ao passivo que o Estado brasileiro tem no que diz respeito ao direito à educação do povo brasileiro, essa expansão se fazia por demais necessária e só foi realizada exatamente porque houve mais dinheiro. Ninguém faz milagre nem mágica, teve de haver mais orçamento.
Eu dialogo agora aqui com os senhores. Condizente com a realidade do País, que é a de enfrentar o déficit de escolarização que o Brasil tem ainda - por mais que tivéssemos avançado nesses últimos 12 ou 13 anos...
(Soa a campainha.)
A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - ...há um déficit enorme ainda -, foi que nós demos outro passo importante, fruto de um grande debate, que foi o novo Plano Nacional de Educação. Em quatro anos de debate com gestores, com a área econômica, com a sociedade, com a comunidade educacional, com os movimentos sociais, com Estados, com Municípios, finalmente essa carta, que é o novo Plano Nacional de Educação, foi referendada pelo Congresso Nacional.
O novo Plano Nacional de Educação coloca a necessidade de construirmos mais um ciclo, para expandir a oferta da educação desde o ensino superior, a educação profissional e tecnológica, o ensino médio, a creche, a educação em tempo integral e a agenda de valorização dos professores, dos profissionais em educação. Para se ter uma ideia da grandiosidade dessa agenda, por exemplo, no campo da creche, nós temos de garantir, nos próximos dez anos, acesso a 3,8 milhões de crianças à creche no Brasil. Nós temos de garantir o acesso a 1,6 milhão de jovens ao ensino médio. Nós temos de sair dos atuais 17%, que é a taxa de acesso dos jovens em idade escolarizável ao ensino superior, para 33%. No campo da educação profissional e tecnológica, idem. No campo da agenda de valorização...
(Soa a campainha.)
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A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) - Vou concluir, Senadora Gleisi.
No campo da agenda de valorização do magistério, nós temos de insistir em dar ao magistério brasileiro, aos profissionais da educação, um patamar de dignidade e valorização salarial, valorização profissional, não só com salário justo, mas com condições dignas de trabalho, passando pela política de formação.
Então, o que eu deixo aqui como reflexão é o seguinte: como garantir as metas do Plano Nacional de Educação com uma regra como essa, que vai congelar os gastos nas áreas sociais, que vai reduzi-los drasticamente? Os estudos mostram que, com a regra Temer-Meirelles - a chamada PEC da desigualdade, da injustiça, tanto é que ela está sendo chamada de PEC do fim do mundo -, o mínimo constitucional de 18% vai cair simplesmente para 14% nos próximos dez anos. Ou seja, nós vamos ter cada vez menos recursos, menos dinheiro e menos orçamento. Isso é crime. Como pensar num projeto de nação com geração de emprego, com distribuição de renda inclusiva, com justiça social sem ser pelo caminho de investir fortemente na educação?
Concluo, Senadora Gleisi, dizendo que, apesar de a PEC ter deixado de fora o salário educação, o Fundeb, o Prouni e obviamente as transferências dos Estados e dos Municípios, a PEC não tratou de outro item fundamental, que deveria ter incluído, que é exatamente a participação do Governo Federal na expansão e no fortalecimento do ensino superior, na educação profissional e tecnológica e no papel que o Governo Federal tem, que é o de fazer um regime de colaboração financeira e técnica junto aos Estados e Municípios para assegurar o direito do povo brasileiro de avançar na educação da creche até a graduação e a pós-graduação com qualidade.
Por isso, faço minhas as palavras da CNBB. Essa PEC é injusta, é seletiva, porque ela prejudica, repito, um dos pilares mais estratégicos, mais decisivos para um projeto de desenvolvimento de nação com inclusão social, que é a educação. Ao mesmo tempo, ela é seletiva, porque, como aqui já foi dito, ela escolheu exatamente os pobres e os trabalhadores para pagarem essa conta.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Com a palavra Roberto Muniz.
O SR. ROBERTO MUNIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - BA) - Senadores, primeiro, eu queria parabenizar aqui os economistas Samuel Pessôa, Marcos Mendes, Guilherme Mello e Pedro Paulo Bastos.
Eu queria, inicialmente, dizer que, quando um médico erra na cirurgia e o paciente morre, o pessoal entra no Cremeb, entra no Conselho Federal. Eu sou engenheiro. Se a casa cai, o pessoal entra no Crea querendo cassar meu registro. Acho que tínhamos de fazer isso também com os economistas, porque os economistas trabalham com uma coisa que é muito importante, que é a percepção. Então, tudo é percepção. Ninguém fica responsável por nada.
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A gente está debatendo aqui o futuro do Brasil, simplesmente. Há duas escolas aqui colocadas. Amanhã, se der certo, quem estava contrário faz um artigo, faz uma reformulação para o futuro e continua na disputa ideológica, política ou mesmo técnica. E, se der errado, eles somem de cena e só reaparecem lá na frente, quando o novo ciclo aparece. "Eles ouviram o que eu disse, que, há 20 anos, era para fazer isso?" É claro que a economia vai mudando e que a gente vai ter de aperfeiçoar esse processo.
Estou trazendo isso porque, como a gente está em uma situação bélica neste País, em que as pessoas não olham os fatos nem as propostas, e, sim, as origens, de onde vêm, a gente perdeu completamente a ideia de ter um país. A gente fez de um país uma padaria. Então, na verdade, na prateleira, ou você é mortadela ou você é coxinha. Essa é a realidade. A gente não consegue aperfeiçoar o debate, porque a gente fica muito preso no que a gente propõe. E aí fica muito difícil, porque um país que, nos últimos três anos... Somado com o que está posto para o déficit fiscal colocado para 2017, nós vamos ter R$450 bilhões de déficit. Essa é a nossa realidade. E aí há uma dívida pública que está aumentando. Aí vem uma proposta: "Vamos cortar? Vamos controlar os gastos? Vamos melhorar os gastos públicos?" "Ah, não pode. Sabe por quê? Porque isso é coisa de coxinha."
Agora, a gente parece que esqueceu que muitas conquistas que tiveram durante os últimos anos são fruto de uma rede de proteção social que este País nunca teve. Se lá no Nordeste a gente não está vendo saques, Senador José Maranhão, como já vivemos, saques em supermercados, saques nos caminhões e nas estradas, é porque essa rede de proteção está protegendo o mais pobre! "Agora, isso não pode ficar, porque isso foi feito pelo mortadela."
Então, a PEC não traz isso claro para a sociedade para dizer: "Benefícios como Previdência, que a gente precisa revisitar; seguro-desemprego; Benefício de Prestação Continuada; Bolsa Família; aposentadoria rural; programas de apoio à agricultura familiar fazem parte de uma rede social." Precisa fazer o quê? Precisa manter? Precisa. Agora, precisa aperfeiçoar? É claro que precisa! Precisa auditar permanentemente? É mais do que urgente, é mais do que urgente! Quem não tem direito não pode ter acesso!
E aí, quando a gente pega alguém metendo a mão na cumbuca de onde não deveria tirar, a manchete é: "Quatrocentas mil famílias têm os seus direitos suspensos."
(Soa a campainha.)
O SR. ROBERTO MUNIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - BA) - Esquecem de dizer que há mais de 12 milhões comendo desse direito! E aí a gente fica olhando o quê? A manchete ou a realidade do Brasil?
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Então, quem tem um olhar de equilíbrio dessas duas questões pergunta aos senhores: será que não há nada que aquela proposta, a PEC, possa melhorar? Será que a PEC não tem nada que não tenha sido feito nos últimos anos? Será que a gente realmente fez um gasto descontrolado em diversos setores? Será que a gente não consegue encontrar esse meio-termo?
É por isso que eu queria deixar algumas perguntas aos senhores.
O que vamos fazer com o superávit? O Fernando fez a pergunta que eu queria fazer. Por que a gente não deixa claro o que vai fazer se a gente conseguir arrecadar mais do que aquilo que estará contido nas despesas? Por que a gente não pode dizer à sociedade brasileira que uma parte vai para isso, que outra parte vai para aquilo, que uma parte vai para o investimento e que outra vai para manter o crescimento dos gastos sociais? Por que a gente não deixa isso muito claro?
Parece que há um jogo de interesse em dizer ao mercado que são 20 anos. A oposição quer dizer também que são 20 anos, para dizer que não vai haver direito social, e todo mundo sabe que são dez anos. Por que não se dá aos governantes que vêm por aí o mesmo direito que se está dando depois dos dez anos? Por que os próximos governantes não podem ter na PEC o mesmo direito que foi colocado para depois do décimo ano? Não é verdade que é só no décimo ano que vamos mexer. A PEC é clara: todos os governantes, após o décimo ano, poderão mexer nos números, mudar o conceito da PEC. Não será preciso uma nova PEC, pelo que eu entendi.
Há outra questão: será que a gente só pode fazer essas projeções sobre a parte da despesa orçamentária? Por que a gente não faz realmente o enfrentamento da dívida pública? O que a gente vai projetar para o futuro?
Nós temos uma cultura inflacionária. Isso me preocupa um pouco, Marcos. Eu não sou economista; sou engenheiro. Existe uma cultura inflacionária. O Brasil ainda tem essa cultura inflacionária. Quando a gente limita e coloca a inflação como esse gatilho, esse gatilho pode retornar à sociedade como uma realidade para os preços, para a busca do salário. Aí o Dr. Guilherme traz a proposta de trabalhar bandas, dando oportunidade...
(Soa a campainha.)
O SR. ROBERTO MUNIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - BA) - ...para que o governante tenha essa maleabilidade para poder trabalhar principalmente nesses próximos dez anos. Eu acho que isso...
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Eu queria lembrar que V. Exª já excedeu em muito o seu tempo.
O SR. ROBERTO MUNIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - BA) - Em muito? (Risos.)
Perdoe-me!
Então, para finalizar, eu só queria deixar...
A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA. Fora do microfone.) - Todos excederam.
O SR. ROBERTO MUNIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - BA) - Eu queria falar sobre a questão da retirada dos investimentos do cálculo do resultado primário, principalmente para a infraestrutura voltada para habitação e saneamento.
Dr. Guilherme, grande parte das propostas do senhor é sobre recomposição das receitas públicas, mas o que o senhor acha da qualidade dos gastos públicos no Brasil? Pode melhorar? O que o senhor acha da qualidade dos serviços públicos? Nós precisamos rever o Orçamento. Nós gastamos R$7 bilhões anualmente com a Justiça Eleitoral e R$20 bilhões com a Justiça Trabalhista. Certo?
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Nós temos aqui - e aí eu queria finalizar com o Dr. Pedro - algumas questões que o senhor colocou referentes aos investimentos. Eu queria saber como esses investimentos podem ser feitos se a gente tem muitas despesas obrigatórias através de alguns direitos que não acompanham a realidade? Se você pegar o ano 2009, o abono e o seguro-desemprego foram de R$27 bilhões. Para 2015, ele cresceu para R$47 milhões. Ou seja, a gente estava com abono e seguro-desemprego crescendo, com a taxa de desemprego caindo. E o que o Governo fez? "Ah, não! Não pode mexer, porque é direito." Então, a gente precisa ter uma nova saída para o País. A gente conseguiu construir uma coisa inédita: estávamos com o desemprego em queda e com a quantidade de seguro-desemprego crescente e não fazíamos esse enfrentamento, esse debate.
Então, eu queria perguntar, finalizando, o que vocês veem de benefícios na proposta um do outro. A provocação final é: o que tem de benefício no que o Dr. Guilherme trouxe? E o que de benefício tem a proposta do Dr. Marcos Mendes?
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Com a palavra a Senadora Lídice da Mata.
A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, eu quero registrar a importância deste debate para o Senado Federal e para a sociedade brasileira e quero lamentar que tantos Srs. Senadores se tenham ausentado deste debate. Nós estamos reivindicando que ele ocorra porque compreendemos que essa não é uma decisão que pode ser tomada, como disse aqui no início o Senador Ferraço, pelos governantes e gestores, pelos políticos e gestores. Eu entendi aqui, quando o Senador Ferraço disse que é preciso conter os políticos e gestores, que, então, é preciso que os políticos e gestores debatam as consequências de suas posições e não o façam em nome de uma procuração que não têm.
Por que eu quero dizer isso? Aqui, na pesquisa do e-Cidadania, feita pelo Senado, que é uma forma de pesquisar diversos projetos que chegam à Casa, a PEC 55 recebeu 20.455 posicionamentos a favor e 320.511 posicionamentos contrários, em 340.966 pessoas que se posicionaram. Então, esta é uma discussão central desse processo.
Por que é PEC e não são projetos de lei para serem debatidos no Senado? É uma PEC, porque vem de uma vez só, instituindo uma política, sem dúvida nenhuma, voltada para ser uma política restritiva e que não se coloca para o debate da população.
Infelizmente, o meu querido amigo Senador Fernando Bezerra disse aqui há pouco algo em que não acredito. Eu acredito em boa parte do que ele disse, mas, quando ele diz que essa PEC vai definir o debate de 2018, isso não é verdade isso. Essa PEC está definindo o futuro do Brasil para 20 anos. O próximo Presidente da República não poderá interferir no caminho decisivo da economia brasileira, porque essa PEC está lhe cassando a possibilidade de fazer isso. Ela está decidindo que só haverá mudanças daqui a dez anos. O próximo mandato será de quatro anos, já com dois vividos da PEC. Portanto, o próximo Presidente da República não interferirá no debate de quais os caminhos que nós vamos poder seguir.
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O povo brasileiro e os próximos candidatos estão cansados de decidir entre propostas diferentes daquela que está sendo colocada. Tudo que for feito daqui por diante, se parecer que melhorou um pouquinho a situação política, vão dizer que foi por causa da PEC.
Quero voltar a uma questão que o Dr. Samuel colocou com muita sinceridade. Respeito muito o posicionamento dele; aliás, respeito o dos quatro que estão à mesa. Quero, em defesa dos economistas, até dizer que os pobres dos economistas não podem ser cobrados por algo que não tenha uma precisão tão clara como o que a Medicina produz ou mesmo a construção de uma casa produz. Todos os cálculos feitos pelos senhores são respeitáveis, mas não dão conta de toda a realidade complexa social que uma experiência humana numa economia ou numa sociedade é desafiada a ter.
Não fosse isso, nós não teríamos a realidade, Sr. Presidente, em tantos anos vividos na humanidade, em que a União Europeia e toda a Europa vivem um profundo debate sobre os seus caminhos na economia. Nós não teríamos os Estados Unidos vivendo agora...
(Soa a campainha.)
A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - Presidente, peço a V. Exª um tempo para finalizar o meu pensamento.
Os Estados Unidos estão vivendo agora aquilo que se chamou o mais violento e crucial debate sobre os seus caminhos. O povo brasileiro não vai ter o direito de fazer isso nos próximos 20 anos, porque ele estará limitado à decisão que será tomada agora.
O Dr. Samuel disse algo muito importante, ele disse que, após a Constituição de 1988, houve uma hiperinflação no Brasil. Ora, ele, como muitos, acredita que uma das razões centrais das dificuldades que vivemos na economia brasileira se origina na Constituição de 1988, a chamada Constituição cidadã. Ali, após a ditadura militar, o povo brasileiro esboçou, através do Congresso Nacional, um pacto social para ser capaz de apresentar à nossa população um projeto de bem-estar social pequeno, tímido, mas que a elite brasileira não tem e não teve até então a capacidade de incorporar; nem a economia brasileira, com suas amarras, foi capaz de dar conta dele. Por isso, é preciso superar esta Constituição, é preciso fazer muitas mudanças. Eu fui Constituinte. Logo após a promulgação da Constituição, um ano depois, já havia diversos setores condenando-a, justamente porque ela tenta estabelecer certas garantias sociais para parcela significativa da população.
Não tenho dúvida de que essa PEC vem na direção de romper o pacto instituído pela Constituição de 1988. E o PMDB, que foi um dos grandes avalistas dessa Constituição - V. Exª, que preside esta Comissão, é desse Partido -, infelizmente, será o instrumento para o rompimento desse pacto. Isso se dará através de um governo do PMDB. O PMDB rompe sua história de ser o interlocutor do centro democrático para promover o pacto social no Brasil para aderir a um projeto que não é seu do ponto de vista econômico, que nasce dentro do PSDB, e para impor à população do Brasil, sem um processo democrático de debate, essas regras, que, através da Constituição, são regras da economia. V. Exªs, V. Sªs, seja lá o que estiverem propondo, estão colocando-as como regras impostas ao povo brasileiro.
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A democracia no Brasil está sendo comprometida com essa PEC, sim - está sendo comprometida. E não estou discutindo se Temer teve voto ou não. Certamente, nem Temer, nem Dilma tiveram voto propondo essas questões que os senhores estão propondo à sociedade brasileira. E essa é a questão central deste momento, porque todo o País, frente a uma crise econômica grave como a que nós estamos enfrentando... E eu posso até admitir que V. Exª tenha razão, que seja a maior crise econômica enfrentada. Por que o povo não pode debater o caminho que quer seguir? Por que os sábios são chamados a resolver a questão sem a participação e o debate democrático com a sociedade?
É isso que está acontecendo. Eu, sinceramente - perdoe-me o Dr. Paulo, o Marcos, com toda a sua experiência como Assessor Legislativo do Senado Federal ou mesmo com a sua participação no Poder Executivo -, desconheço, na história política brasileira, muito mais na circunstância do debate sobre a ciência política, qual governo forte e autoritário não teve a agregação total do Poder Legislativo. É essa a característica central. Quando o poder é bastante autoritário e forte, ele agrega imediatamente as maiorias dentro do Parlamento. Por isso, eu não acredito que será o Parlamento que vai estar valorizado a partir daquilo que vocês determinaram agora para definir sobre o Orçamento que vem. O Parlamento vai definir sobre parcos recursos, as esmolas que vão ter de negociar dentro do Parlamento para manter os programas sociais.
Eu quero fazer algumas perguntas. Primeiro, faço uma pergunta ao Dr. Marcos.
V. Sª falou mais de uma vez em foco, em focalizar, falou da necessidade da PEC para uma focalização. Que focalização é essa? Ela diz respeito a parcelas da população que podem ser incluídas ou não?
Ao Dr. Guilherme e ao Dr. Pedro, pergunto: qual o impacto da PEC sobre a capacidade de recuperação do crescimento econômico? Qual o impacto da PEC sobre a capacidade de distribuição de renda? Com essa PEC, vai se resolver a questão fiscal do País? Parece que essa questão, até em certa medida, foi abordada por Roberto e por Fernando, quando falaram por último.
Ou seja, a PEC não resolve todas essas questões, e nenhum dos senhores disse isso. No entanto, os representantes do Governo afirmam que a PEC é que é o instrumento essencial para começar toda a resolução da crise nacional, porque ela se sustenta em uma questão objetiva: ela substitui a decisão do povo pela decisão, hoje, deste Congresso Nacional, que se compôs para viabilizar o impeachment da Presidente e para estabelecer esse pacto por cima, feito na sociedade brasileira. Por isto é que precisa começar por ela: porque ela impõe uma regra de 20 anos.
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O Dr. Marco teve logo a preocupação de dizer que não são 20 anos, que são dez anos. Disse que são 20 anos, mas que, com dez anos, nós faremos a revisão. Então, por que não cortam os 20 anos, deixando somente os dez anos? Não cortam os 20 anos e deixam os dez anos porque é necessário impor essa ideia de cima para baixo, segurar numa camisa de força a economia nacional dentro dos ditames definidos hoje nesse mercado.
Por último, quero dizer uma coisa. Todos criticam os gastos feitos pelo Governo, pelos últimos governos, com os salários de funcionários. Todos foram votados por este Parlamento e aprovados, em geral, por unanimidade. Portanto, quando se apontam os crimes cometidos pelo Governo, o próprio Parlamento deveria se incluir nessa situação. Aliás, a Fiesp não saía deste Parlamento a pedir renúncia fiscal. Foi a primeira a passar para o lado oposto da cerca para dizer: "Condene-se um governo que está com gastança". É a gastança que eles estão pondo no bolso, que não serviu para implementar o desenvolvimento econômico do País ou garantir empregos, mas que serviu para aumentar os lucros da Fiesp em plena crise de industrialização do País, na desindustrialização que este País vive. Essa Fiesp é a representação do empresariado fabril no Brasil, absolutamente obsoleto, que só pensa nos seus próprios interesses.
Muito obrigada, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Com a palavra a Senadora Gleisi Hoffmann.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Obrigada, Sr. Presidente.
Eu queria, em primeiro lugar, agradecer a V. Exª por estarmos realizando esta audiência pública de forma conjunta, com a CCJ e com a CAE. Vou falar aqui da mesa mesmo, vou usar do meu direito à palavra como Senadora, não como Presidente da CAE.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - V. Exª é copresidente desta reunião.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Sim, mas agora não estou falando como Presidente da Comissão de Assuntos Econômicos, mas como Senadora. Obrigada.
Eu queria também agradecer aos convidados que estão aqui. Todos, de forma muito competente e capaz, expuseram seus pontos de vista. Como a economia não é uma ciência exata, logo, os pontos de vista estão de acordo com o posicionamento de cada um. Eu acho que isso é importante para o debate. Eu só sinto que não tenhamos conseguido fazer outras reuniões como esta. A gente fez algumas na Comissão de Assuntos Econômicos, mas, infelizmente, sem o contraponto. Acho que isso faltou. É importante para quem está nos ouvindo e assistindo escutar a versão de ambos os lados, saber por que se está propondo isso, como o Governo está enxergando essa medida como uma medida concreta para melhorar o desenvolvimento econômico, o crescimento econômico.
Antes de entrar nas questões relativas ao impacto, eu queria fazer alguns alertas. Eu começo fazendo um alerta sobre aquilo que a Senadora Lídice falou, sobre a soberania do voto popular. Ou seja, nós elegemos Presidentes da República a cada quatro anos neste País. Esses Presidentes da República são eleitos através de um programa que é submetido à avaliação popular. Depois da Constituição de 1988, nós não tivemos nenhum Presidente da República eleito que tivesse um plano de austeridade colocado nas urnas. Nem o Presidente Fernando Henrique Cardoso, com o PSDB, foi eleito com um plano de austeridade. Fez mediações, colocou programas e projetos sociais que eram importantes. Pode ser que não tenha sido a quantidade que Lula e a Presidente Dilma colocou, mas ele colocou programas.
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Então, eu não acredito que essa proposta que os senhores estão apresentando, se submetida ao crivo popular, passasse, até porque ela precisa ser complementada com uma reforma da Previdência, como vocês falam. E, dificilmente, esta Casa aqui terá coragem - desculpem, vou ser bem sincera - de fazer uma reforma da Previdência, aumentando a idade, diminuindo benefícios, restringindo salário de aposentados. A gente conhece um pouco como as coisas acontecem. Talvez, se a Casa o fizer, não o fará para quem nós deveríamos fazer, que são os servidores públicos mais bem-remunerados do Estado brasileiro. Vai fazê-lo para aqueles que não conseguem chegar com o seu lobby até o Congresso Nacional. Quem ganha salário mínimo não vem fazer lobby com Senador. Agora, quem está no Judiciário, quem está na Fazenda, quem está no Ministério Público faz lobby aqui e dificilmente vai ter um direito seu, uma prerrogativa sua desestabilizada.
Então, acho que isso tem de ficar claro. Nós estamos propondo, vocês estão propondo uma medida dura para 20 anos, ou seja, para 20 exercícios fiscais. Nós vamos ter, em 20 anos, cinco Presidentes da República eleitos. Quer dizer, se ele já vai entrar lá sem poder ter mobilidade alguma sobre a peça orçamentária, que é o que dá sentido ao seu discurso e ao seu convencimento junto à população, o que ele vai fazer? Eu gostaria de saber. Talvez, fosse mais fácil a gente fazer um concurso público para Presidente da República. Pode ser até de cinco anos. Faz-se um concurso público para quem melhor vai aplicar o receituário aqui colocado, ainda que os senhores digam: "Não, mas em dez anos nós vamos rever." Dez anos são dois mandatos e meio de Presidente da República.
Então, eu acho que a dimensão continental do nosso País, as diferenças regionais, as diferenças em termos de renda, isso tudo precisa ser considerado, e não pode ser na letra fria da lei, porque, se fosse assim, nós não precisaríamos da política. É fato que a técnica qualifica a política, mas a política dá sentido à técnica. Então, não é possível que a gente não tenha essa sensibilidade.
Além disso, há outros problemas, como a divisão dos Poderes, a questão da razoabilidade da proposta, o retrocesso social. Nós conquistamos em 1988 avanços importantes na Constituição em que nós estamos retrocedendo. A própria Constituição Federal previu que não podia haver retrocesso em termos de conquistas sociais. Então, nós temos de pensar sobre isso.
Em relação ao mérito, eu queria só colocar algumas questões que eu acho importantes, porque todo o foco da proposta de emenda constitucional é sobre o estouro da dívida pública. Ou seja, nós estamos com uma dívida estourada, e nós precisamos fazer com que essa dívida venha para determinado patamar. Isso vai trazer de novo a confiança do mercado, como se nós tivéssemos a fada da confiança, como se a confiança por si só bastasse para resolver os nossos problemas. A gente sabe que isso não basta. Havia um ditado que minha avó dizia: "Minha filha, amor é muito bom, mas, se não houver comida na panela, não adianta." Então, é isso. Quer dizer, nós podemos ter confiança, mas, se não houver praticamente gente querendo investir, produzir, consumir, a confiança vai ter determinado prazo. Enfim, a dívida pública está no centro disso.
Nós pegamos uns dados do Banco Central que eu acho que são muito importantes para nós sabermos a trajetória da nossa dívida pública, porque não é o estoque da dívida pública em si que tem de ser analisado, mas a trajetória dela em relação ao Produto Interno Bruto brasileiro, em relação ao crescimento.
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Na década de 90, no governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, nós tínhamos uma dívida bruta - eu vou começar pela bruta, porque agora ela virou referência - de 76% do PIB. Nós fechamos o ano de 2015 com uma dívida bruta de 72%. Mas, naquela época, na década de 90, nós não tínhamos as reservas que nós temos, tampouco nós tínhamos dinheiro nos bancos públicos, especificamente no BNDES, porque da dívida pública você tem de tirar o seu ativo. Então, se hoje nós temos 72%, que é menor do que aquele comprometimento que nós tínhamos na década de 90, nós ainda temos de tirar os nossos ativos, ou seja, a reserva que hoje nós temos, que é muito grande, e também os recursos que nós temos disponíveis ao BNDES, que são ativos.
Portanto, a nossa dívida bruta é bem menor do que isso. Por isso, a gente sempre utilizou a dívida líquida como referência, e a dívida líquida tem uma trajetória decrescente. Em 2003, ela estava em 50,6% do PIB; em 2008, 41,5%; em 2013, 33,6%. Ou seja, se nós pegarmos um histórico da dívida, ela tem um crescimento decrescente, se é que se pode dizer assim. Então, nós não temos uma dívida pública explosiva, nós não temos uma dívida pública descontrolada. O fato de nós termos tido um crescimento da dívida pública em 2014 e em 2015 é conjuntural, por uma crise que nós tivemos, com responsabilidades nossas, internas, mas com responsabilidades externas. O preço das commodities caiu, nós diminuímos a exportação. Quer dizer, a receita caiu, o PIB caiu. Obviamente, se eu não consigo pagar as minhas despesas com as receitas, porque caíram, eu aumento essa dívida.
E há um dado importante que o senhor colocou, Dr. Samuel, na sua apresentação: a despesa mantém-se, na realidade, estável, entre 5,7% e 6%. A receita varia. Agora, a variação da receita que o senhor colocou lá até 2010, pegando junto a década de 80, tem muito a ver com o aumento da carga tributária com as contribuições. Nós tivemos, até depois, na década de 90, vários tributos sendo colocados para aumentar a arrecadação. Nós saímos de uma carga tributária de 26% ou 27% do PIB e fomos para uma carga tributária de mais de 30%. Por isso, a receita cresceu ali. Não era um fato do crescimento da economia. Mas a despesa manteve-se no seu crescimento, que foi o crescimento ditado pela Constituição de 1988.
É importante dizer que o senhor traz um dado de 2015, que é de -0,8% a receita. Ou seja, nós não tivemos um crescimento da despesa, nós tivemos uma queda da despesa de -0,9%. Então, dizer que, em 2015, a gente teve um gasto grande não é verdade. Nós saímos de um gasto em 2014 de 6% de aumento da despesa para -0,9%. Olha a retração que nós fizemos! Foi essa retração que deu origem, inclusive, a uma crise maior que nós estamos vivendo hoje, que nós estamos vivendo em 2016.
Então, os senhores estão propondo um ajuste estrutural das contas públicas para resolver um problema conjuntural. É esta a situação: um problema de 2, 3 ou 4 anos que nós vamos ter. E isso vai acabar com os direitos mais elementares das pessoas. Não adianta dizer que não vão cair saúde e educação. Não somos nós que estamos dizendo. Há um estudo do Bradesco que eu acho que os senhores receberam - e o Bradesco apoia a PEC 55 -, que diz o seguinte: nós podemos deixar em zero o investimento, nós podemos deixar em zero as outras despesas correntes, podemos deixar em zero as outras obrigatórias, que não se conseguirá, com essa PEC, manter os gastos em saúde e educação. Não se conseguirá. Quer dizer, a população cresce, a demanda cresce. Como nós vamos reduzir? É contraproducente, não há como!
(Soa a campainha.)
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Então, a bem da população, nós tínhamos de ter algo que o Prof. Guilherme sugeriu: vamos fazer, sim, um teto de gastos, com um teto de crescimento, sem ser um teto de "não cresce mais nada, congela", e vamos mexer na outra ponta da política fiscal.
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Por que a gente não mexe em juro sobre capital próprio, que foi criado para repor a inflação na época do Plano Real para o setor empresarial, que perdeu o com o overnight, que perdeu com os investimentos? Por que a gente não trabalha com lucros e dividendos? Em 1996, nós deixamos de aplicar uma alíquota de 15% em lucros e dividendos, mas nós aplicamos nos assalariados 27,5%.
Quer dizer, eu não entendo isso. Por que a gente não trabalha com as isenções tributárias, com as desonerações e com os benefícios? São imensas as desonerações que nós temos. Nós não temos coragem de trabalhar. Sabe por que a gente não trabalha? Porque, cada vez que vem um projeto para esta Casa de uma proposta assim, há um lobby descomunal. É impressionante! Ninguém consegue votar. Aí, para você tirar direito do povão, dá, porque aí o lobby não é tão grande, não chega tanto perto dos Senadores. As pessoas não conseguem vir para Brasília. No máximo, chegam aqui os nossos sindicatos, as nossas associações, mas o povo mesmo não chega. Então, a gente vai pela via mais fácil, vamos fazer um retrocesso.
Nós vamos ter fome de novo neste País, fome. Eu acho que não tem coisa mais vergonhosa para um País que ter gente passando fome. Isso nós não podemos voltar. E nós vamos voltar se a gente passar uma proposta como essa.
Então, eu queria fazer um apelo para que vocês pudessem mediar. Hoje nós vamos apresentar uma proposta alternativa à PEC para trazer o equilíbrio e também para melhorar a gestão fiscal. Eu acho que a gente tem condições de fazer isso de outra forma, sem colocar em cima do povo pobre. Desculpem-me, mas, na hora em que a gente reduzir o aumento do salário mínimo, não é esta Mesa aqui que vai pagar a conta, não é o senhor, nem o Dr. Marcos, que é consultor do Senado e ganha bem, como eu, Senadora, que ganho bem, como os professores aqui. Nós ganhamos bem.
Então, sabe o que me parece? Que a gente fica sentado em uma sala com ar-condicionado ganhando bem, olhando os dados e dizendo como que os outros têm de se ferrar. Não dá para ser assim. Não dá para dizer para a população que eles não vão mais ter salário mínimo corrigido pelo valor real, porque eles ganham um salário ou dois salários, quando muito, para comprar arroz, feijão, o remédio que precisa. E nós ficamos aqui ditando essas regras.
Então, acho que o mínimo de sensibilidade nós temos de ter. Nós não podemos voltar atrás naquilo que nós conquistamos com tanta luta, com tanta vontade de melhorar este País. Desculpem-me, mas essa é a principal emenda constitucional que nós temos depois da Constituição promulgada. Ela mexe no coração dos direitos sociais que foram conquistados.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Com a palavra a Senadora Kátia Abreu.
A SRª KÁTIA ABREU (PMDB - TO) - Obrigada, Sr. Presidente. Eu gostaria de cumprimentar os nossos convidados, os nossos economistas de vários segmentos, de várias linhas ideológicas diferenciadas.
E eu já quero começar dizendo, Sr. Presidente, que não conheço bem Friedman nem Keynes. Não sei, do ponto de vista técnico e econômico, os pontos principais ou com profundidade o que cada um pensa. Eu só sei raciocinar como cidadã, como política que representa um dos Estados mais pobres do Brasil, que é o Tocantins, que tem uma renda per capita baixíssima. E é desse povo que eu sei falar. É do povo do campo também que eu sei falar, daqueles que produzem.
Sou uma mulher que acredita no mercado, que acredita na livre iniciativa, que acredita no direito de propriedade. Muita gente acha que direito de propriedade é para rico, para grandes fazendas, mas, na verdade, quando falamos de direito de propriedade, nós queremos defender aquele fusquinha ou uma motocicleta velhinha de alguém, porque aquilo é dele, ele ganhou com o suor do seu rosto, não interessa se pouco ou muito.
Então, essas são as premissas em que eu sempre baseei o meu trabalho. Cheguei até aqui como empresária rural que começou aos tropeços, aos trancos e barrancos, aprendendo com a necessidade. E é a vida que nos ensina.
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Como mãe, como avó, que sou hoje, tenho muito orgulho de tudo isso e acho que nós estamos num momento decisivo da vida nacional, da política nacional, muito mais do que da economia, porque, neste momento, Sr. Presidente José Maranhão, que foi Governador do seu Estado e que é um homem experiente - gostei muito da sua fala naquele dia da reunião do PMDB, dos Senadores -, nós estamos aqui tratando da inferiorização do Congresso Nacional, em primeiro lugar. E isso me entristece muito. Nós fomos eleitos exclusivamente para representar o povo de uma forma: fazendo leis, subindo à tribuna e fazendo as nossas denúncias. Mas, a partir desta PEC, nós estamos reduzindo, diminuindo enormemente o nosso trabalho e a nossa função.
Sem nenhuma brincadeira pejorativa, eu acho que nós deveríamos, a partir de hoje, reduzir até os nossos salários, porque nós vamos ter muito pouca coisa a fazer aqui. Nós estamos entregando para o Executivo o congelamento da lei mais importante que é elaborada e aprovada nesta Casa, que é a lei orçamentária. Ou nós vamos fazer um balanço aqui de quantas leis, durante um mandato, a Kátia Abreu, a Gleisi Hoffmann ou o senhor conseguiram aprovar aqui, que não seja a lei orçamentária? É quase um milagre aprovar aqui uma lei durante um mandato. E nós estamos entregando para o Dr. Henrique Meirelles... Digo isso com todo o respeito, pela carreira que ele construiu. Mas hoje ele é o todo-poderoso que exigiu 20 anos: "Eu não quero saber, ou eu peço as contas!" Imagino que isto é o que está no bastidor: "Ou é o que eu quero, ou eu peço as contas". E tem o apoio total e pleno do PSDB.
É uma opção. Agora, nós temos de questionar isso, o meu Partido, o PMDB. Nós não podemos ir a reboque de um capricho de 20 anos. E, quando eu digo, Senador José Maranhão, que é um capricho... Sou caprichosa para estudar e para aprender. Venho da roça, mas sou esforçada para aprender, sou humilde para aprender. Passei três dias em São Paulo, na semana retrasada, conversando com os economistas melhores deste País, conservadores, economistas da MCM, como Cláudio Adilson, que é meu professor preferencial. Não venha me dizer que ele é keynesiano!
(Soa a campainha.)
A SRª KÁTIA ABREU (PMDB - TO) - É um dos mais radicais, e ele não conseguiu me explicar o porquê dos 20 anos. Sentei na frente dele e falei: "O senhor tem três horas para me dizer por que 20 anos. Eu quero acreditar. Se o senhor me disser, eu acredito no senhor e vou defender a tese." Ele não conseguiu definir isso para mim e não tentou me convencer de que 20 anos eram necessários.
Então, nós estamos abrindo mão de uma prerrogativa nossa só pode ser por um capricho de um todo-poderoso que se acha o mago da economia nacional. Olha, Sr. Presidente, ele deve ser bom mesmo, e eu acho que ele é bom. Mas há outros bons iguais a ele. Ele não precisa nos obrigar, goela abaixo, a aguentar os 20 anos. Isso é um desaforo! Isso é um desaforo para o Congresso Nacional, não é para a oposição, não é para o Governo. É um desaforo para o Presidente da República, que está virando refém dessa história. Ele não acredita nos 20 anos, porque ele foi a uma entrevista na televisão e disse que, em quatro ou cinco anos, isso deveria ser revisado. Está gravada a entrevista dele. Então, o que há por trás desses 20 anos?
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Sr. Presidente, nós vamos agora nos limitar a participar das reuniões destas Comissões, sem aprovar projeto de lei nenhum, porque não se aprova finalmente. E a nossa principal função... O dinheiro que o senhor quer levar para a Paraíba, que eu quero levar para Tocantins, que ela quer levar para o Paraná não está em nossas mãos mais. Se essa PEC é aprovada, nós estamos delegando uma prerrogativa dada pelo povo brasileiro a nós, Senadores da República, porque a Câmara já entregou, sem nem discutir, nem tentar reduzir para dez anos, sem tentar abrir uma justificativa.
Mas vamos adiante, Sr. Presidente. Os economistas em quem confio, em São Paulo - nenhum deles é da esquerda -, fizeram-me alguns questionamentos que eu gostaria de trazer aqui para cada um dos quatro.
De fato, quando muitos colegas Senadores aqui, com muita justiça e com indignação, dizem que a PEC vai tirar dos mais pobres, é porque, na verdade, quando nós congelamos os gastos, nós estamos falando de saúde e de educação. Quem é que usa saúde e educação de graça neste País? É Senador da República? É economista consultor do Senado? É economista de banco? Ah, gente, pela nossa saúde nós não pagamos nada, ela é de graça! É do pobre que nós estamos tirando. Isso não é conversa de esquerda, isso não é prerrogativa da esquerda. Eu não sou da esquerda, mas eu sou humana, sou gente e conheço o povo do Tocantins. Estou falando de pobre de cadeira, porque lá a maioria do povo é pobre.
Então, eu quero saber o seguinte, é a primeira pergunta feita a vocês. As despesas tributárias do País correspondem a R$271 bilhões por ano. O que são despesas tributárias? Digo isto para aqueles que nos ouvem e, talvez, não estejam atentos ao debate. É desoneração, abrir mão de receita, todo tipo de incentivo fiscal. São R$271 bilhões por ano. Do governo Lula para o de Dilma, isso aumentou um ponto percentual. Não é 1%, não! É dinheiro toda a vida! É um ponto percentual. É um escândalo de desoneração que foi dada pelo lobby, como disse aqui a Senadora Lídice da Mata. O lobby pesado dá conta de subir a rampa do Palácio do Planalto há mais de 40 anos. Não é de governo de Dilma, de Lula e de Fernando Henrique, não! Há anos e anos, sobe e conhece a trilheira da rampa do Planalto e a nossa aqui e leva tudo, todos os setores.
Agora, Sr. Presidente, as desonerações, um ponto percentual que foi aumentado... Por que ninguém está falando em reduzir esse um ponto percentual para ajudar na conta? Por alto, são R$60 bilhões por ano. O déficit da Previdência é de R$180 bilhões. Por quê? Porque é mais difícil mexer com empresário, porque o lobby vem pesado. Então, é mais fácil, de fato, Sr. Presidente, mexer nos silenciosos. Não há nenhuma demagogia aqui, não! Nós estamos mexendo nos silenciosos, que não sobem nenhuma das duas rampas. E cabe a nós dizer "não" para isso ou dizer "sim" para um congelamento de teto mais reduzido, mas é preciso rachar essa conta, Sr. Presidente. Vamos desonerar!
A desoneração da folha de pagamento foi dada com a maior das boas intenções para aumentar o emprego. Prove-me um de vocês que a desoneração de R$20 bilhões a R$30 bilhões aumentou o emprego no País. É muito simples: o empresário é desonesto? Não, ele é sabido. Ele é sabido ou não é empresário. Por quê? Ele vai fazer a seguinte conta na cabeça dele: "Eu não sei até que dia esse povo doido vai dar isso aí. Vou empregar gente, e, depois, acaba essa desoneração, e eu estou com o queijo na mão sem a faca." E tem de demitir esse povo todo, e ele não vai ter recurso para isso.
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Então, você sabe o que ele fez com esses R$20 bilhões ou R$30 bilhões, Sr. Presidente? Ele, que é sabido e inteligente - eu faria a mesma coisa -, colocou dinheiro do lucro no bolso. É óbvio!
Então, essa é uma das despesas tributárias que nós cedemos aos empresários do Brasil em uma hora difícil e que agora eles têm de nos devolver, Sr. Presidente. Eles têm de nos devolver um ponto percentual, que são R$60 bilhões, porque quem está lá fora vai ficar mais consolado.
E essa jabuticaba preta, que só existe no Brasil, que é o crédito, o lucro presumido? Isso é uma aberração, Sr. Presidente. O lucro presumido é caso de prisão, de cadeia, de polícia. Trata-se de cobrar 32% de alíquota, de 25% sobre 32% do lucro, quando todos nós sabemos que todo mundo leva 90% de lucro. Permito que a diferença seja de dividendos. E pago o que de imposto? Zero. É só rico que dá nisso. Isso dá no mínimo de R$8 bilhões a R$10 bilhões. Mas vá mexer nesse vespeiro! São profissionais liberais que não gastam um centavo, que não têm despesa nenhuma. É só inteligência!
(Soa a campainha.)
A SRª KÁTIA ABREU (PMDB - TO) - Isso é prestação de serviço, gente. No mínimo, tinha de pagar 20% do patronal, porque não existem 32% de lucro presumido nessa área onde ele é beneficiado.
Vá conversar com o Rachid, da Receita, sobre o que ele acha disso. Ele também acha uma aberração. Não existe em lugar nenhum do mundo o crédito presumido. Agora, pergunte sobre o lobby aqui dentro.
Vamos propor isso. Eu topo, sou a relatora se precisar, porque eu acho que agora é hora de todo mundo dividir a conta. Eu voto, Sr. Presidente, eu sou responsável. Fiquei viúva com 25 anos de idade e sei o que é somar dinheiro para não perder, para não passar fome, para não perder o que tem. Ó luta! É como fazem todas as donas de casa e pais de família deste Brasil. Sabem fazer contabilidade bem feita. E ninguém pode gastar mais do que tem. Acho que isso está certo.
Agora, dizer, como disse o Dr. Marcos, que nunca se viu uma gastança absurda como se viu no governo da Presidente Dilma? Eu não estou aqui paga para defender a Presidente Dilma. Ela já sofreu o impeachment dela, gente. Agora, injustiça aqui na minha frente eu não vou deixar, porque o senhor está cansado de saber que podia ser Dilma, Josefa, Joana ou Maria, que as despesas da Previdência iriam ser exorbitadas como foram e como serão se não houver a reforma.
Essa PEC do teto sem a reforma da Previdência e nada é uma coisa só, Sr. Presidente. Na verdade, ela está tirando a prerrogativa nossa, retirando o nosso poder. Estamos dando de graça o poder para Henrique Meirelles e para o Executivo a troco de absolutamente nada, porque, se a reforma da Previdência não vier, de nada isso vai adiantar, a não ser a nossa desmoralização pública de Senadores. O povo pode apontar o dedo para nós, assim como a imprensa, os colunistas inteligentes todos que há por aí: "Vocês não dão conta, vocês não têm competência. O Presidente está passando um pito em vocês, porque vocês não dão conta de gastar menos do que arrecadam." Nós estamos atestando isso de forma humilhante. Isso é muito feio para nós. É muito feio para o Partido, nós não deveríamos aceitar.
Agora, temos de trabalhar, sim, pelo ajuste fiscal. Sou parceira. Mas fazer isso só pendendo para um lado, não, Sr. Presidente. Eu sei o que isso vai custar para nós. Eu sei o que vai custar na educação e, muito mais do que na educação, na saúde, gente. O povo está morrendo nas portas. No meu Estado de Tocantins, é decretado estado de calamidade pública. Os anestesistas não recebem há quase um ano, os médicos não recebem plantão há seis meses. Não há uma caixa de remédio, não há UTI neonatal. E nós vamos congelar gastos de saúde em detrimento de gastos tributários, de desonerações de empresas que poderiam abrir mão agora?
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Eu sou contra o imposto, eu acho o imposto triste. Excesso de carga tributária é péssimo para o pequeno, para o médio, para o grande. É horrível! Mas nós estamos falando de um momento de crise. Essa conta não pode fechar apenas para um lado. Isso nós não podemos permitir que aconteça.
Também quero dizer ao Sr. Marcos que nós deveríamos lembrar ainda, assim como o senhor fez aqui hoje, que muitos Senadores, vários, do PSDB, aprovaram todas as medidas que Dilma mandou para poder conter gastos. E agora estão aqui discursando, de bonitos, como se fossem o povo mais responsável do País.
Vamos nos lembrar aqui, agora, do fator previdenciário. O fator previdenciário, sobre o qual a Presidente teve de recuar e de fazer uma renegociação de 85/90, custou o aumento do valor da Previdência, o aumento de benefícios, em detrimento do fator previdenciário. Aumentou em 50% o custo e o rombo da Previdência. Esses que estavam aqui, agora mesmo, dizendo que a Presidente Dilma é irresponsável, assim como ele disse. Não usou a palavra irresponsável porque não está doido, mas foi mais ou menos isso, que ela...
(Manifestação da plateia.)
A SRª KÁTIA ABREU (PMDB - TO) - Que ela nunca gastou tanto.
Agora, eu queria lembrar também que o seguro-defeso, que o senhor citou aqui, quem assinou fui eu, como Ministra. Quem derrubou o seguro-defeso foi Dilma; e eu que assinei o decreto. Não foi esse Governo agora não, não foi o PSDB. Nós suspendemos o defeso, exatamente. Paguei esse preço alto, mas não sou covarde. Não sou Senadora só para agradar, sou Senadora responsável pelo País. Assinei. Quando a Presidente me perguntou e levou a questão à Casa Civil, não titubeei e assinei o decreto. Apanhei muito nas redes sociais, mas faria tudo de novo.
E aí, o que aconteceu com o seguro-defeso? Esses que estão aqui gritando por moralidade, contra a gastança, devolveram e derrubaram o seguro-defeso que eu fiz, que a Presidente Dilma fez. E ninguém se lembra disso! Agora, ainda quero lembrar que todas as medidas que ela mandou para o Congresso para desvincular do salário mínimo ela perdeu aqui. Quero ver com que cara vão vir agora pedir a reforma da Previdência e a desvinculação do salário mínimo. Eu não voto! Eu não voto. Já vou antecipar o meu voto. Eu não tiro salário mínimo de aposentado pobre e de deficiente pobre. É demais para a minha cabeça, eu não dou conta.
Agora, falar que se aumentou a gastança com o pobre aposentado... Vocês estão ficando doidos! Quem deu essa prerrogativa aos aposentados pobres foi a Constituição de 1988. A Presidente Dilma teve a competência de criar os CRAS e de criar todos os polos do INSS com o Ministro Garibaldi, do nosso Partido, do PMDB, que teve competência para fazê-lo. Espalharam-se pelo Brasil todo os postos do INSS, e o povo aprendeu a buscar seus direitos. Isso é gastança? Rasguem a Constituição! Foi Dilma que inventou isso? Não. Ela deu alcance ao direito. O direito já existia desde 1988. Isso não é aumentar gastança. Quem assiste lá de fora pensa que essa mulher, Dilma Rousseff, pegou o dinheiro, rasgou, pôs fogo, ateou álcool e queimou. O que é isso, gente? Vamos ser honestos. Isso, esse rombo, Brasil, aconteceria com qualquer um de nós porque a Previdência Social, hoje, está engolindo o Tesouro brasileiro. A Presidente Dilma não alterou a certidão de nascimento para o povo ficar velho não! O povo vai fazendo aniversário e está ficando mais velho do que no ano passado e, portanto, está se aposentando mais. Agora, ela está rasgando dinheiro? Ela rasgou dinheiro e deu dinheiro às pessoas? Quem deu direito às pessoas foi a Constituição de 1988. E ela deu acesso ao seu direito, a essas pessoas.
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Agora a Petrobras está melhorando, em seis meses. Que milagre foi esse? Digam-me vocês quatro. Que milagre foi esse de seis meses, que agora a Petrobras está começando a crescer? É porque o Bendine, que é o ex-Presidente da Petrobras, fez um trabalho de primeira. Tirou a catrevage que estava lá dentro e começou a levar a Petrobras com seriedade. O que está lá agora também é bom, muito bom.
E a Caixa Econômica, que era banco público, algazarra, gastação de dinheiro, usando a Caixa Econômica, é o segundo banco do País agora, foi eleito. É o segundo banco do País. Em cinco meses, a Caixa Econômica se transformou no segundo banco do País? Em cinco meses?
E nós participamos deste Governo, Sr. Presidente, nós, do PMDB, ajudamos nesses números positivos. Isso não foi feito sozinho. Nós ajudamos. Nós fomos ou coniventes ou parceiros, pode escolher o nome que quiser. Eu sou parceira. Eu me sinto parceira.
Agora, finalizando, eu gostaria que vocês pudessem me dizer o seguinte. Com relação à PEC dos 20 anos, o meu professor querido Cláudio Adilson - até devia ter ligado para ele para ele poder nos assistir agora, que ele ia ficar orgulhoso, e eu esqueci - fez algumas simulações, Sr. Presidente. É um cara seríssimo!
(Soa a campainha.)
A SRª KÁTIA ABREU (PMDB - TO) - Seríssimo! É economista dos grandes bancos do País, como esses aí. A previsão é a seguinte: se as reformas - se e somente se, que eu não posso desmoralizar meu professor -, se as reformas forem feitas, em 2021 nós já temos superávit, e, em 2024, a dívida, a relação de dívida/PIB de 60% já estará equilibrada. Isso dá oito anos, Sr. Presidente. E por que Henrique Meirelles quer 20? Mande-o vir aqui dizer para nós. Eu ia perguntar para ele na reunião do PMDB, já desmarcou três vezes. Vou perguntar com educação, não vou brigar com ele. Agora, eu quero que ele me diga.
Então, se nós estamos atrás de superávit e se nós estamos atrás de uma relação dívida/PIB com o máximo de 60%, qual é o problema? Por que precisamos de alcançar esses 20? E a relação está aqui, Sr. Presidente. De todo mundo que tem 271 bilhões, que nós podemos tirar um ponto percentual, dá R$60 bilhões tirando as desonerações, fora o lucro presumido, que é uma jabuticaba brasileira.
Então, essas as minhas considerações no que diz respeito a exatamente isso: por que 20 anos? Se nós fizermos as reformas, e eu sou parceira nas reformas, quero ser parceira, quero ser relatora se precisar, mas não venha com um trem sem lógica não! Política e a vida só servem com lógica. Sem lógica, estou fora.
Então, expliquem-me por que 20 anos. Expliquem-me, se pela simulação com as reformas nós alcançamos isso em oito, se vocês concordam que a relação dívida/PIB se equilibra com oito, e menos ainda, com menos tempo, nós teremos o superávit, se vocês concordam ou não com o meu querido professor. Imaginem se eu ia pedir que concordassem comigo, que sou só Senadora e não sou economista.
E, lembrando, como já disseram vários aqui, os cinco maiores países, os mais ricos do mundo, que fizeram a PEC do teto... Não é PEC. Pelo amor de Deus! Ninguém fez PEC, só nós. Todos fizeram acordo político, porque esta Casa é política, é a Casa do acordo político. Nós estamos abrindo mão disso.
Então, eu gostaria que vocês pudessem, se quiserem, claro, óbvio, comentar essas pouquíssimas palavras que eu disse aqui agora.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Eu agradeço as palavras e o trabalho da Senadora Kátia Abreu, que conseguiu resumir toda essa análise do Governo, da economia nacional em apenas 17 minutos. (Risos.)
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Essa é a vantagem de quem fica por último.
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O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - É, perfeitamente.
Com a palavra o Sr. Guilherme Mello.
O SR. GUILHERME SANTOS MELLO - Eu pedi para falar antes porque meu voo sai em breve. Então, peço desculpas.
Primeiro, obviamente, agradeço, mais uma vez, a presença de todos e todas e faço um elogio aqui à qualidade do debate, que acho que foi muito bom, não só na mesa, mas principalmente nas intervenções. E quero fazer uma homenagem aqui às Senadoras da República: todas as intervenções, sempre importantes. A mulher, que tem pouca participação na política brasileira... mas aqui, as Senadoras muito ativas, participativas, e muito qualificadas as intervenções. Então, queria fazer essa homenagem, que acho importante.
Rapidamente, quero colocar algumas questões. O Senador Fernando Bezerra disse que ele acha que, dado o número grande de PECs que já foram aprovadas na história democrática recente brasileira, seria razoavelmente fácil você mudar essa PEC no futuro. Eu não tenho essa visão política tão clara quanto vocês que estão aqui dentro, mas eu acredito que a dificuldade de alterar essa PEC, caso a gente acredite, ou o Brasil perceba que ela não é o melhor negócio, digamos assim, para nós, a melhor estratégia são as pressões do lobby mais forte que existe hoje, não só no Brasil, no mundo, que é do mercado financeiro.
E a pergunta é: por que 20 anos? Por que havia um lobby no mercado financeiro. É a exigência dos bancos. Então, sei que isso pode parecer uma coisa ideológica, mas, na minha opinião, é a única explicação plausível. Ah, mas não são 20 anos, são 10, e depois muda e a cada mandato pode mudar. Mas, você não precisaria fazer isso, nem por PEC, e se são 10, não precisaria fazer 20, coloca lá 10, em 10, e acabou. E aí depois a gente vê o que faz. A gente faz um acordo político, não precisaria ser PEC, poderia ser acordo político, como é feito na maioria dos países, poderia ser até por lei. Algumas coisas constitucionais a gente teria que mudar, mas não uma PEC.
Agora, eu acho, então, que, uma vez aprovada, voltar atrás, a gente achar "olha, realmente, estava errado, vamos voltar atrás" vai ser muito difícil. Imagino a capa das principais revistas e jornais do Brasil se a gente quiser voltar atrás disso: "O governo é irresponsável, quer se liberar para gastar", aquele ataque. E o governo vai fazer o quê? Vai recuar, é óbvio, vai recuar.
Bom, essa é a minha interpretação.
O Senador Roberto Muniz perguntou se é possível encontrar um meio-termo. Eu acredito que é possível encontrar um meio-termo, e esse é o trabalho da política, é conseguir encontrar os acordos possíveis.
A proposta que eu fiz já incorpora um elemento muito importante da PEC. O que é a PEC? É uma regra de gasto. O Brasil hoje tem regras de gastos na LRF, mas não uma regra que limita o gasto do Governo Federal. Fiz uma proposta, que pode ser discutida, que também é uma regra de gasto, só que é uma regra de gasto diferente da PEC que, na minha opinião, garante mais flexibilidade, é mais anticíclica, garante o financiamento do Estado de bem-estar social e garante a prioridade para o investimento público.
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Então, é um diálogo com a PEC, porque a PEC já é uma proposta de regra de gasto. Eu não acho que propor regras de gasto, principalmente no momento atual da economia brasileira, seja necessariamente ruim. Nós podemos discutir uma regra de gasto. É possível uma regra com cláusulas de escape, que priorize investimento público, que siga os exemplos bem-sucedidos internacionais, que sejam ajustáveis pelo ciclo político, etc.
(Soa a campainha.)
O SR. GUILHERME SANTOS MELLO - E ela discute - tenta discutir - a qualidade do gasto público, porque a qualidade tem a ver com a eficiência, claro, corrupção, etc., tem a ver com todas essas questões, mas tem a ver com a composição. E a proposta que eu tentei trazer é uma tentativa de priorizar os gastos com maior multiplicador, maior impacto social, maior impacto de geração de emprego e, portanto, melhorar a qualidade do gasto. Eu sempre brinco assim: eu sou um defensor do Estado. Eu acho que o Estado tem um papel muito importante no desenvolvimento econômico no mundo inteiro, e não só no Brasil, no mundo inteiro. Não conheço caso de desenvolvimento econômico em que o Estado não tenha tido um papel central. O problema é que o nosso Estado é muito ineficiente. O nosso Estado tem muito... Vamos melhorar a qualidade do nosso Estado? É óbvio. É óbvio. E como isso pode aparecer do lado fiscal? Com uma melhoria da qualidade do gasto e da composição do gasto, certo?
Assim, vamos olhar onde estão os gastos regressivos. Qual o gasto mais regressivo? São os juros ou o quê? Vamos tentar reduzi-los. Outro gasto regressivo: uma desoneração é regressiva? Então vamos tentar diminuí-la. E qual é o gasto progressivo? Saúde pública? Ótimo. Então vamos tentar reforçá-lo.
Eu acho que nesse ponto a PEC falha, porque a PEC pressiona os gastos mais progressivos, os gastos que distribuem mais renda e os gastos que promovem mais o crescimento, e libera os gastos mais regressivos.
Última duas questões. A Senadora Lídice colocou a questão de quais os impactos da PEC sobre a questão fiscal, o crescimento e a distribuição de renda. Bem, aí vai depender muito da interpretação de cada um sobre como funciona a economia. Eu acredito que a PEC, ao pressionar, reduzir o tamanho do Estado e reduzir, na minha visão, o investimento público e o investimento social, contribui para limitar a capacidade de crescimento da economia brasileira, e não aumentá-la.
(Soa a campainha.)
O SR. GUILHERME SANTOS MELLO - Essa ideia de que nós vamos melhorar o gasto público, ele vai ser menor em relação ao PIB, mas vai ser melhor na sua composição, repito, estudo de pesquisadores do FMI mostra exatamente isto: os países em desenvolvimento que adotaram regras de gasto, a grande maioria não melhorou, diminuiu o investimento público...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. GUILHERME SANTOS MELLO - Todos. Diminui investimento público, e não melhora a composição. "Ah, mas a gente vai fazer diferente." Vamos ver. Eu não acredito nisso, até porque o teto é um teto que vai descendo sobre as nossas cabeças, é 19% do PIB, vai virar 18%, vai virar 14%, até... Em 2016 vai estar 14%. Só que o piso está subindo. E qual é o piso? É a Previdência. São os gastos previdenciários. Hoje é 8,5%, amanhã vai ser 9,5% - mesmo com reforma da Previdência -, depois vai ser 10%. Ou seja, quem está no meio, que é educação, saúde, cultura e segurança pública, estes estão em maus lençóis, porque é um teto que desce e um piso que sobe. Não sei como vai ser resolvido isso do ponto de vista político.
E a última questão que eu queria colocar é sobre o que a Senadora Gleisi colocou, ou seja, que a PEC é a mais grave emenda constitucional, com o qual vou concordar. Não tenho estudos sobre todas as 93 emendas constitucionais aprovadas, mas, das que eu me lembro, ela realmente é muito grave. Por quê?
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Porque, ao limitar o gasto público e reduzir o tamanho do Estado ao longo do tempo, ela vai na contramão da Constituição, que é de ampliação dos serviços públicos e ampliação da cobertura social. Na minha opinião, ela vai na contramão da Constituição. Portanto, ela é gravíssima, porque é uma emenda à Constituição que limita o projeto de país inscrito na Constituição, e isso é muito grave.
Desse ponto de vista, eu queria colocar uma última questão que é a ideia de "austericídio". O Samuel colocou aqui: "Ah esse negócio de 'austericídio' é uma balela, não resiste a cinco minutos de análise." Não vou, obviamente, discutir o que está escrito em centenas de páginas aqui. O Pedro Paulo tem todas as condições de... Mas o que a gente está colocando aqui é o seguinte. Quando a gente está falando, por exemplo, em 2015, que houve "austericídio", a gente não está falando só que houve contração fiscal; está falando que houve contração fiscal, aumento de juros, desvalorização cambial e aumento dos preços administrados, que elevaram enormemente a inflação. A desvalorização cambial mais o aumento dos preços administrados levaram a inflação lá para cima.
Aí você vai falar assim: "É, agora já estão caindo os juros." Mas é evidente, está caindo a inflação. Por quê? Porque o câmbio voltou a valorizar e o efeito dos preços administrados caiu. Então, não é que estão caindo os juros porque o Governo é muito bonito e o mercado olha para ele e fala: "Gosto do Temer, não vou exigir tanto dele, vou cobrar menos juros." Não. É porque a inflação está caindo e, portanto... Mas está caindo por evidentes motivos, está passando aquele choque inicial.
O "austericídio", então, não é só fiscal. O "austericídio" foi o choque dado na economia em 2015, em uma economia que já estava entrando em recessão. Se você dá um choque desses, joga a economia em depressão. E aí o que você faz? Cria uma regra de 20 anos para que essa realidade se prolongue até não sei quando.
Eu peço desculpas porque vou ter que sair para pegar o meu voo. Agradeço mais uma vez e estou aberto para o debate sempre que for convidado. Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Com a palavra o Dr. Marcos Mendes.
O SR. MARCOS JOSÉ MENDES - Muito obrigado, Senador. A essa altura, já está todo mundo bastante cansado. Vou tentar responder com a maior brevidade possível.
Foi citado aqui que o economista-chefe do FMI tem um artigo que fala que austeridade fiscal não funciona. Depois eu vou passar o meu e-mail para os outros debatedores. Eu queria ver esse paper porque provavelmente ele se refere aos países desenvolvidos, que, como o Samuel falou, estão vivendo uma realidade completamente diferente da nossa. São países com uma capacidade produtiva muito maior, com muito maior produtividade, com taxa de juros muito baixa e em processo de desinflação, ao contrário de nós, porque precisamos melhorar a nossa produtividade, a nossa capacidade produtiva. Temos um processo inflacionário muito forte e juros muito altos. Então, não acredito - posso estar errado - que o Blanchard tenha feito esse tipo de avaliação com relação à economia brasileira.
Foi dito aqui que Estado que emite a própria moeda não fica insolvente. Então, quem fala isso está apostando que temos a última saída, que é a hiperinflação. Infelizmente, acho que isso não é uma saída, é o fundo do poço.
Pena que o Dr. Guilherme está saindo. Eu gostaria de dizer que gosto muito da proposta dele de progressividade tributária, atendendo ao que o Senador Muniz pergunta: não tem sobreposição de ideias? Gosto muito. Acho que precisamos melhorar muito a progressividade tributária no Brasil.
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Querem um exemplo de um absurdo? As isenções e os descontos no Imposto de Renda. Por quê? Porque quem paga Imposto de Renda no Brasil são os 10% mais ricos da população brasileira, e existe uma lista de isenções de Imposto de Renda para n situações: doentes da doença tal, profissionais de tal área; e essa lista só aumenta. Eu me lembro de que, como Consultor do Senado, eu estava sentado aí atrás, e houve um projeto para dar mais uma dessas isenções cujo relatório era contrário, o parecer era contrário. Mas a Bancada do PT se levantou contra e disse: "Temos que dar essa isenção." E o projeto foi aprovado; mais uma isenção no âmbito do Imposto de Renda que é altamente concentradora de renda foi aprovada. Então, esse debate da progressividade tributária já está atrasado. Agora, ele é muito duro, e temos que ver quem vai defender na hora de efetivamente tirar os benefícios tributários.
O SR. ROBERTO MUNIZ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - BA. Fora do microfone.) - E sobre as bandas? A possibilidade de juntar as bandas?
O SR. MARCOS JOSÉ MENDES - Bandas de quê? De resultado primário? De...?
A questão aqui é que precisamos ter uma regra clara. Estamos saindo de um período de cinco anos de profunda contabilidade criativa em que foi feito todo tipo de ginástica para esconder despesa, para esconder déficit, para transformar despesa primária em superávit primário. Então, nós temos que ter uma regra clara, simples, fácil de ser seguida e fácil de ser observada por todo mundo.
Por exemplo, poderíamos propor que, quando a relação...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS JOSÉ MENDES - ... dívida/PIB chegasse a um determinado nível e começasse a cair, se mudasse a regra. Aí, poderia começar a haver o seguinte: se o Banco Central, por exemplo, resolve fazer algum tipo de política que muda a relação dívida/PIB, como, por exemplo, vender reservas internacionais ou mudar compulsório, já viria "ah, está mudando para mudar o limite da dívida". Então, qualquer regra dessa torna o cumprimento e o acompanhamento da regra mais complexo. O que estamos propondo é uma regra simples, fácil de acompanhar e que não esteja sujeita à manipulação e à contabilidade criativa, que fez muito mal ao País, nos últimos anos, em relação à confiança na política pública.
A Senadora Fátima Bezerra falou aqui muito de educação. Eu enfatizei na minha apresentação que mais de 70% - para ser preciso, 77% - da despesa de educação está fora da PEC. Então, informações que ela deu aqui como as de que vai prejudicar a expansão do ensino médio, vai prejudicar a expansão das creches não cabem. O que vai prejudicar a expansão no ensino médio e a expansão das creches é a crise econômica, que está tirando receita de Estados e Municípios porque são esses que pagam por isso. Então, isso não cabe como crítica à PEC.
Eu já tive esse debate com a Senadora Fátima Bezerra, na outra vez em que eu estive aqui falando sobre a PEC...
(Soa a campainha.)
... e ela falou: "Vocês não sabem que foi aprovado o Plano Nacional de Educação, que diz que se tem de gastar 10% do PIB em educação?" Esse plano foi aprovado porque as pessoas não acreditam no realismo orçamentário. Ao votarem isso, não acreditavam que iriam efetivamente colocar 10% do PIB na educação, porque, se houvesse essa convicção, e o projeto é de aplicação opcional, o pessoal da saúde jamais teria aceitado aprovar esse tipo de projeto.
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Com relação à Senadora Lídice da Mata, que falou que existe uma pesquisa do e-Cidadania em que a grande maioria votou contra a PEC. Nós temos que ver que há pesquisas e pesquisas, pesquisas de consulta. Tem que ver qual é a metodologia dessa pesquisa. Eu tenho aqui...
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB. Fazendo soar a campainha.) - Peço permissão ao orador para interrompê-lo, a fim de registrar a presença de S. Exª o Governador da Bahia, acompanhado de um secretário muito simpático, que foi nosso companheiro na Comissão de Orçamento na legislatura anterior e que fez um trabalho exemplar.
A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - Só peço ao Dr. Marcos para não desconstruir o e-Cidadania, pelo amor de Deus. Não o desqualifique, porque tem sido...
O SR. MARCOS JOSÉ MENDES - Não vou desqualificar. O que estou dizendo é que existem metodologias de pesquisas que têm que ser avaliadas. Eu acabo de receber uma pesquisa divulgada hoje da CNT/Sensus, uma empresa de pesquisa respeitada, que aponta 64% de apoio à aprovação da PEC.
A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - Desculpe-me, eu vou interrompê-lo só para dizer que essa pesquisa, além de tudo, não foi submetida a propaganda do Governo, porque o Governo fez propaganda e campanha para ganhar a sua aprovação. (Palmas.)
Nós não. O e-Senado tem acompanhado.
O SR. MARCOS JOSÉ MENDES - Existe um debate amplo sobre a PEC nas redes sociais, na sociedade. Esse é o assunto mais falado hoje em dia.
Com relação ao argumento muito dito aqui a respeito de ser democrático ou não apresentar uma PEC para controlar os gastos públicos. Bom, eu não sou advogado, não sou jurista, não posso ter uma opinião técnica sobre isso, mas vou me valer aqui da opinião do Ministro Barroso, quando ele se pronunciou rejeitando uma ação que foi impetrada no Supremo para suspender a tramitação da PEC. A ação diz o seguinte:
O Congresso Nacional, funcionando como poder constituinte reformador, é a instância própria para os debates públicos acerca das escolhas políticas a serem feitas pelo Estado e pela sociedade brasileira, e que envolvam mudanças do texto constitucional. Salvo hipóteses extremas, não deve o Judiciário coibir a discussão de qualquer matéria de interesse nacional.
Continua ele:
Não há, na hipótese aqui apreciada [a PEC], evidência suficiente de vulneração aos mandamentos constitucionais da separação de Poderes, do voto direto, secreto, universal e periódico e dos direitos e garantias individuais.
A responsabilidade fiscal é fundamento das economias saudáveis, e não tem ideologia. Desrespeitá-la significa predeterminar o futuro com déficits, inflação, juros altos, desemprego e todas as consequências negativas que dessas disfunções advêm.
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS JOSÉ MENDES -
A democracia, a separação de Poderes e a proteção dos direitos fundamentais decorrem de escolhas orçamentárias transparentes e adequadamente justificadas, e não da realização de gastos superiores às possibilidades do Erário, que comprometem o futuro e cujos ônus recaem sobre as novas gerações.
Esse é um grande ponto que precisa ser destacado aqui. Tem-se dito muito que estão tirando dos pobres. Eu já mostrei na minha apresentação que não se está tirando dos pobres. Se nós não continuarmos com o Novo Regime Fiscal nós estamos tirando das gerações futuras. Os nossos filhos e os nossos netos é que vão pagar a conta de uma dívida crescente, instável e impagável.
A Senadora Lídice da Mata, que já se retirou, me perguntou qual é o foco, o que é focalização do gasto. É a focalização nos mais pobres, é desenhar as políticas para que elas cheguem aos mais pobres...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS JOSÉ MENDES - ... políticas que tenham uma característica como, por exemplo, a do Bolsa Família, que é uma boa política, que consegue chegar aos mais pobres. Há outras que não conseguem chegar, e nós precisamos melhorar a eficácia do gasto público.
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A Senadora Kátia Abreu... Antes disso, alguém, eu acho que a Senadora Gleisi, citou um estudo do Bradesco. Segundo esse estudo do Bradesco, a despesa seria toda comprimida. O estudo do Bradesco, que eu li e analisei, primeiro, apoia plenamente a aprovação da PEC e, segundo, mostra esse cenário em caso de não se fazer reforma da Previdência e não se fazer reforma nenhuma, que obviamente é um cenário em que todos nós sabemos que não vai haver eficácia no controle dos gastos.
A Senadora Gleisi também afirmou que o salário mínimo não vai ser corrigido pelo valor real e isso seria um desrespeito à Constituição. A Constituição brasileira diz que o salário mínimo tem que ser corrigido, tem que ter o seu valor real mantido, e a PEC não altera esse dispositivo.
A Senadora Kátia Abreu perguntou por que o prazo de 20 anos. Ela diz aqui que, pelas contas que foram feitas para ela, a estabilização da dívida dar-se-ia em, no máximo, oito anos. Não é essa a conta que nós temos. Como eu coloquei aqui, na minha exposição, nós prevemos um ajuste de 0,5 ponto percentual do PIB por ano, o que vai exigir, pelo menos, os primeiros 10 anos para termos um superávit primário minimamente razoável.
Por que 20 anos? Porque nós precisamos fazer reformas graduais para reformatar o setor público, para que ele efetivamente atenda à maioria da população brasileira, e não apenas um, ou dois, ou três grupos de interesse. Portanto, nós precisamos de um longo prazo. Essas reformas não são fáceis de fazer.
A Senadora Kátia Abreu mostrou uma lista de gastos tributários que, segundo ela, devem ser revogados para que a receita aumente.
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS JOSÉ MENDES - Eu acho um excelente debate discutirmos os gastos tributários. O Ministério da Fazenda está avaliando todas as categorias de gastos tributários, está avaliando a reoneração, as medidas de desoneração da folha que foram feitas e as desonerações tributárias, está avaliando ponto a ponto... Agora eu gostaria de lembrar que, daquela lista que ela mostrou, o primeiro colocado da lista é a Zona Franca de Manaus, que este Congresso aqui renovou, se não me engano, por 50 anos, com grande apoio, determinação e batalha política da Senadora Vanessa Grazziotin, que estava nos acompanhando aqui até há pouco.
Para concluir, a questão da qualidade do gasto. Só vai existir qualidade do gasto quando houver uma clara restrição a gastar. Quando não houver uma clara restrição e o gestor puder sempre pedir mais verba, ninguém vai se esforçar para controlar gasto público. Aconteceu assim nos Estados brasileiros. A gestão dos Estados brasileiros era calamitosa nos anos 70, 80 e até meados de 90. Em meados de 90, a dívida deles foi renegociada em troca de um programa de ajuste fiscal, e quem não cumprisse o programa de ajuste fiscal teria o seu refinanciamento de dívida cancelado. Isso forçou uma busca por gestão pública de melhor qualidade, e os Estados evoluíram muito na qualidade da sua gestão e na qualidade das suas políticas públicas.
Infelizmente, isso, nos últimos anos, foi perdido, porque houve um relaxamento das regras da Lei de Responsabilidade Fiscal, e os Estados voltaram, portanto, por exemplo, a contratar e conceder reajustes salariais acima da sua capacidade. É por isso que, por exemplo, o Rio de Janeiro e outros Estados estão na situação que estão. Então, a restrição do gasto ajuda também na melhoria da qualidade. Eu já tenho um exemplo: o Ministério da Saúde, neste ano, com apenas algumas renegociações de contratos e mudanças em procedimentos operacionais, economizou R$1 bilhão, apenas com mudanças gerenciais. E o que força a isso é uma restrição efetiva.
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Foi dito aqui que a PEC é falha, que a PEC não contempla isso, não contempla aquilo. A PEC não é um programa fiscal completo. Como eu falei desde a minha primeira fala, a PEC é o primeiro passo de um programa fiscal que vai precisar de muitos anos para ser implementado, porque ele requer muitas reformulações na forma como é planejado e executado o gasto público no Brasil.
O gasto na educação aumentou muito nos últimos anos? Aumentou muito. Apesar disso, o nível de qualidade do ensino médio continua parado, está no mesmo lugar. Então, nós temos que ver o que está acontecendo. Há algo errado. Se está gastando mais, e o nível, a qualidade, a nota dos alunos não está subindo, então nós temos que analisar isso pelo ângulo da qualidade e da eficácia.
Muito obrigado. Creio que esta é a minha última participação, então agradeço a atenção de todos e a paciência até agora, até esta hora. Acho este debate muito importante e creio que foi possível esclarecer os principais motivos que tornam essa PEC muito importante. Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Com a palavra o Dr. Samuel Pessôa.
O SR. SAMUEL DE ABREU PESSÔA - Muito obrigado, Presidente.
Vou tentar, rapidamente, sumarizar as minhas principais respostas. Acho que Marcos respondeu um monte de coisas; impossível responder melhor do que ele.
Eu queria tocar três pontos. Primeiro ponto, a questão de por que é por uma PEC - esse foi um tema que voltou várias vezes. Segundo ponto, um questionamento que me parece o mais importante, que a Senadora Gleisi fez, que é se a questão é estrutural ou conjuntural. Debater esse tema eu acho que é importante. E terceiro ponto, comparar um pouco, a Senadora também trouxe diversos números do período FHC: será que a situação não é tão grave assim? O que havia de diferente? Vou concentrar meus comentários nesses três pontos.
Primeiro. A sociedade brasileira em 1988 tomou uma decisão: ela fez uma Constituição imensa, gigantesca, muito detalhada. Essa foi uma decisão que nós tomamos. Então, tem que ser por PEC, porque a Constituição assim requer. Quase tudo neste País nós temos que fazer por PEC. Essa foi uma decisão que nós tomamos lá. Se nós não tivéssemos uma Constituição tão detalhada, não precisaríamos de tanta PEC, não teríamos feito 90 PECs.
Evidentemente, o Congresso Constituinte teve sabedoria e, quando percebeu esse ponto, desceu o sarrafo da PEC. Para PEC, em qualquer país do mundo, são dois terços - como é aqui o impeachment -, e nós temos um critério mais frouxo para PEC, que é o de três quintos (60%, e não 66%). Evidentemente, o Congresso Constituinte, também com a sua sabedoria, percebendo que desceu um pouco o sarrafo para a PEC, pegou algumas questões que achava muito importantes e colocou-as como não passíveis de serem alteradas por meio de PECs, que são as cláusulas pétreas, no art. 60.
Parece-me que esse é o ordenamento nosso. Então, a PEC está absolutamente consistente com a forma como a sociedade brasileira escolheu fazer a sua governança. Portanto, faz-se uma PEC hoje, são várias por ano, e, no ano que vem, para mudar faz-se PEC também. É assim que é.
Evidentemente, isso tem implicações dramáticas. Por que tem implicações dramáticas? Eu espero que o grupo político que esteve há pouco no Palácio do Planalto tenha aprendido isso. A nossa democracia é uma democracia que os cientistas políticos classificam de democracia consensual.
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Grosso modo, nós podemos dividir a democracia em dois tipos extremos: você tem as democracias consensuais e você tem as democracias majoritárias, tipo Inglaterra. Na Inglaterra há uma democracia majoritária, onde há uma construção de regras para que pequenas maiorias se transformem em grandes maiorias no Congresso Nacional. Visa à governabilidade e a fazer uma espécie de, entre aspas, "ditadura da maioria".
A democracia consensual é o oposto disso. Trata-se de criar uma série de regras, para que você tenha instituições com poder de veto, que faça com que qualquer alteração, no ordenamento jurídico e institucional, tenha que passar por várias instâncias e tudo tenha que ser feito de maneira muito consensual. Essa é a opção que nós temos. E a característica, em particular, de nós termos uma Constituição muito detalhada faz parte... É um dos elementos. Não é o único. Nós temos divisão de Poderes, voto proporcional, lista aberta e vários elementos que caracterizam essa propriedade de o nosso sistema político ser uma democracia extremamente consensualista, mas uma democracia extremamente consensualista significa que a pessoa que está sentada na cadeira do Palácio do Planalto tem que ser capaz de construir maiorias e gerir, com eficiência, maiorias parlamentares.
(Soa a campainha.)
O SR. SAMUEL DE ABREU PESSÔA - Significa saber construir coalizões que tenham pequena heterogeneidade ideológica, saber compartilhar poder - para não precisar usar demais o "varejão" -, e assim sucessivamente. Então, essa é a característica da nossa sociedade, do nosso sistema político, é uma escolha da sociedade, e a PEC é por causa disso. Se no ano que vem tiver que mudar, vai ser mais uma PEC, muda-se a PEC.
Vamos para a segunda questão: é estrutural ou é conjuntural? A minha avaliação é que é estrutural, e eu acho isso - que é estrutural - desde 1905. Desde 2005. Desculpem-me. (Risos.)
(Intervenção fora do microfone.)
Faz um tempão, não é? É porque essa é a pior crise. Eu falei quadriênios. Essa é a pior crise do PIB per capita. Essa é pior queda de PIB per capita. Na verdade, como são quadriênios...
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Fora do microfone.) - Com menos efeito colateral, eu diria. A maior crise de PIB, com menos efeito colateral.
O SR. SAMUEL DE ABREU PESSÔA - Sim. Não há a menor dúvida, Senadora. Tem menos efeito colateral, porque nós construímos um Estado de bem-estar social, e ele está mantendo. Eu estou perfeitamente ciente dessa característica.
Mas em 2005 havia uma chance. Nessa época, eu era assessor do Senador Tasso Jereissati. O então Ministro do Planejamento Paulo Bernardo, em associação com o Ministro da Fazenda Antonio Palocci, tentou fazer um ajustamento estrutural. Tasso Jereissati apoiou, toda a Assessoria do Tasso estava junto com aquele programa. O ex-Ministro Delfim também teve apoio. Houve uma coalizão e parecia que nós iríamos fazer um ajustamento estrutural lá em 2005. Era uma chance que nós tínhamos. E, infelizmente, Mercadante e Dilma Rousseff bombardearam essa possibilidade e nos colocaram nessa situação de hoje, porque, se nós tivéssemos feito o ajuste do Paulo Bernardo e do Antonio Palocci, muito mais suave, lá atrás, nós estaríamos numa situação muito melhor. Só para dizer que, muitas vezes, as divergências não são nem partidárias; são mais de visão de mundo, de como funciona a economia. Naquela oportunidade, o Ministro Paulo Bernardo e o Ministro Antonio Palocci tinham uma leitura do funcionamento da economia, das restrições e da necessidade do Brasil muito parecida com a minha. E penso que diferente dos meus colegas Pedro Paulo e Guilherme. Imagino. Então, nós perdemos essa oportunidade.
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Por que não deu problema rápido? Não deu problema rápido - como eu expliquei na minha fala -, porque a receita teve um comportamento extraordinário, cresceu a uma velocidade que é o dobro do crescimento do PIB durante 12 anos, 13 anos.
(Soa a campainha.)
O SR. SAMUEL DE ABREU PESSÔA - E esse comportamento extraordinário no comecinho, de 1998 para 1999, foi aumento de carga tributária legal, novos impostos. Mas, a partir de 1999, foi associado a outros fenômenos, muito provavelmente ao longo processo de formalização da força de trabalho, que, num primeiro momento, gera um impacto imenso sobre a carga tributária, sobre a receita, e depois, lá na frente, gera impacto sobre o gasto. Portanto, a questão estrutural está colocada desde lá atrás. Uma trajetória insustentável do gasto público nós temos lá atrás. Essa trajetória foi apagada. Eu costumo dizer que um comportamento extraordinário da receita entorpeceu todos nós. Parecia que não havia problema. E esse foi um dos motivos por que o ajuste fiscal estrutural do Paulo Bernardo foi torpedeado. E, aí, uma hora a receita passou a ter um comportamento normal; a partir de 2010, a receita passou a ter o comportamento normal, e o comportamento normal da receita é que produziu esse buraco.
Eu acho que a situação é gravíssima. Eu acho que dez anos talvez nem sejam suficientes, por isso que é dez mais dez. E deixem-me terminar: eu acho que nós estamos à beira do abismo inflacionário sim. Eu não estou aqui chantageando ninguém, nem dizendo... Acho que é uma escolha. Nós vivemos 50 anos sob inflação acelerada - entre 1945 e 1995, nós tivemos inflação muito alta. Nós podemos escolher voltar para a inflação; é uma maneira de pagar a dívida pública.
Com relação à comparação entre período FHC e período PT, eu faço duas observações. Primeiro, sempre me incomodou esse tipo de comparação, Senadora, e eu vou dizer exatamente por que me incomodou. Eu acho que o Brasil melhora.
(Soa a campainha.)
O SR. SAMUEL DE ABREU PESSÔA - Pegar uma estatística de uma data, pegar uma estatística de uma data anterior, fazer a média das duas datas e comparar, eu acho injusto, porque há uma melhora natural do País. Ora, antes de FHC, havia hiperinflação e uma miséria altíssima. Então, se for para comparar governos, eu acho que o justo é ver o País que o governo pegou e o País que ele legou e fazer esse tipo de diagnóstico.
Fazendo esse tipo de diagnóstico, para mim fica muito claro que estávamos melhorando muito até 2008, 2009. Inclusive, no primeiro mandato do governo Lula, houve uma cooperação enorme com a oposição, e muitas medidas importantes foram mandadas. E o País melhorava significativamente, inclusive a dívida pública caía, as taxas de juros caíam, e os indicadores de pobreza e desigualdade melhoraram. A partir de 2010, 2011, a gente perdeu um certo caminho, uma certa qualidade da política econômica. No primeiro mandato do governo Lula, ela era de muito alto nível, mas começou a se deteriorar paulatinamente. Esta é uma questão muito interessante: tentar entender por que a qualidade da política econômica de um grupo político que chegou ao Planalto e começou fazendo tudo certo começou a desandar. Essa é uma questão para a ciência política investigar.
Os dados de dívida dependem de olharmos a quantidade de dívida. Eu entendo que a senhora trouxe números aqui de dívida como proporção do PIB. Eu prefiro olhar o custo da dívida, quanto o Tesouro paga para rolá-la. Se nós olharmos o custo da dívida, no período FHC era menos. E por que era menos? Porque a taxa implícita de juros... Como a gente calcula a taxa implícita de juros? A gente pega tudo que o Governo paga de juros, divide pela quantidade de dívida, e essa razão dá o juro médio que o Governo paga na dívida. A taxa implícita de juros naquela época era muito menor, por isso o custo de rolagem era muito menor.
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Evidentemente, o custo de rolagem era muito menor, a taxa de juros implícita era menor porque você tinha títulos vinculados ao câmbio, o que é um problema, porque os títulos vinculados ao câmbio trazem uma fragilidade nas contas públicas. E você teve que resolver isso. Isso foi resolvido no primeiro mandato no governo Lula. Nós eliminamos os títulos atrelados ao câmbio. Agora, aquele número referente a dezembro de 2002 da dívida pública, eu acho um número pouco informativo, porque houve um pico no câmbio naquele período. E houve o pico no câmbio naquele período porque havia uma razoável suspeição do mercado quanto à qualidade da política econômica do governo Lula que viria, e esse pico de câmbio artificialmente subiu a dívida. Então, se a gente pegar os dados de dívida bruta do governo FHC num período com câmbio normal, são números muito menores do que os números que nós temos hoje. Então, não me parece que dá para a gente achar que a dívida não é grave.
É muito comum as pessoas falarem: o Japão tem uma dívida de 240% do PIB! Mas o Japão paga zero por aquela dívida. E por que o Japão paga zero por aquela dívida? O Japão paga zero porque tem uma taxa de poupança que é três pontos percentuais do PIB acima da taxa de investimento, apesar de a taxa de investimento do Japão - que é um país pronto, construído, cheio de trem-bala e de coisas - ser maior do que a nossa. Eles investem mais do que nós, mas eles poupam mais do que três pontos percentuais do PIB do que nós, e isso faz com que os juros lá sejam praticamente zero. E, evidentemente, com juros praticamente zero, o Governo pode ter uma dívida muito menor.
Mas esse dado que circula por aí, de 240% do PIB de juros, não é o dado correto, porque o banco central japonês está fazendo um monte de política de comprar ativos. E, se nós medirmos a dívida pública japonesa segundo a nossa metodologia, que retira da dívida pública os títulos livres do Tesouro na carteira do Banco Central, a dívida japonesa é bem menor, é uns 140% do PIB, apesar de ainda ser uma dívida alta. E ele pode ter essa dívida alta porque os juros lá são nulos. E os juros lá são nulos porque é um povo que poupa muito, apesar de já estar envelhecido e ter uma taxa de investimento relativamente elevada.
Obrigado, gente.
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) - Se me permite, Presidente, eu precisava fazer duas colocações.
Eu só falei e fiz comparação com o governo do Fernando Henrique, e concordo com o senhor que nós estamos melhorando, porque o senhor falou da maior crise econômica dos últimos 120 anos. Parecia que nós estávamos numa cena de guerra, terra arrasada, e eu queria mostrar que os efeitos colaterais dessa crise são muito inferiores ao que nós tivemos de outras crises em que poderia até ter havido uma queda menor do PIB. Ou seja, nós conseguimos construir um colchão de proteção social para que a nossa população não sentisse isso. Então, ela não pode ser a pior.
E só para esclarecer, eu não estava acompanhando o debate quando o Paulo Bernardo sugeriu, junto com o Palocci, medidas restritivas. Não sei o contexto, a conjuntura daquilo, mas, em relação a esse, eu sou terminantemente contra. Eu acho que nós vamos piorar a situação.
(Manifestação da plateia.)
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Eu queria, antes de dar a palavra ao próximo orador, para aliviar um pouco as tensões, lembrar aqui uma frase de Delfim Netto sobre dívida pública. Ele costumava dizer, no regime autoritário - naturalmente, ele talvez tenha até se esquecido disso, mas eu não -, que dívida pública não se paga, se administra.
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O SR. SAMUEL DE ABREU PESSÔA (Fora do microfone.) - Se rola.
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Se rola. Bem, infelizmente, hoje essa regra não está em vigor.
Com a palavra, o Sr. Pedro Paulo Bastos. Tem um nome aqui: Zaluth. Como eu não sei se a pronúncia certa é essa, eu pulei o nome. (Risos.)
A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR. Fora do microfone.) - Eu faço isso também.
O SR. PEDRO PAULO ZALUTH BASTOS - Está bem. Obrigado, Senador. Bom, eu vou tentar responder aqui as perguntas que foram feitas pelos Senadores todos, embora não estejam aqui.
Primeiro, o Senador Fernando Bezerra perguntou a respeito daquilo que pode ser feito no que tange à qualidade de gastos, não é? Eu diria o seguinte, sendo muito claro. Primeiro, é preciso apontar que o custo, o custeio da máquina e o gasto de pessoal da Administração Federal caíram durante todo o período do governo Lula até o governo Dilma.
Inclusive, o Samuel Pessôa, a despeito dos embates ideológicos, escreveu artigos dizendo isso, não é, Samuel? Várias vezes. E é uma coisa tem que ser valorizada e é verdade. É verdade o que ele dizia. Agora, o problema não é o mesmo, não aconteceu a mesma coisa particularmente para Estados e, sobretudo, nos últimos quatro anos.
Então, eu acho que tem que ser feita uma avaliação de por que o custeio da máquina e do gasto de pessoal nos Estados aumentou. Agora, a PEC ataca diretamente o problema do Governo Federal. Ela não está fazendo nada com a evolução do gasto de Estados e Municípios, embora já tenha havido uma sinalização da Secretária do Tesouro de que há a ideia de, daqui a dois anos, depois de passar esse tempo aí de renegociação da dívida, que a regra da PEC também sirva para Estados e Municípios, ou pelo menos para Estados.
Além disso, é fundamental cortar subsídios. É algo que a gente propunha já lá de 2012, 2013. Nós criticamos a expansão exagerada dos subsídios, os gastos tributários, inclusive aqueles que já existiam antes do crescimento dos subsídios aí no governo Dilma.
O que o governo Dilma I fez? O governo Dilma I usou o espaço fiscal dado pela regra de superávit e pela evolução da arrecadação basicamente para expandir subsídios e desonerações. Isso é muito claro nos dados.
Nesse sentido, é diferente da política fiscal que foi executada pelo governo Lula depois de 2005, depois exatamente daquele debate entre, digamos, as duas alas do governo Lula. Naquele momento, o que se ampliou muito no final do primeiro governo Lula e ao longo de todo o segundo governo Lula foram os investimentos públicos. Basicamente, o espaço fiscal foi utilizado para investimento público e o fato de que as receitas aumentaram não é independente desse tipo de escolha do uso do espaço fiscal, porque o investimento público tem um multiplicador fiscal muito grande.
Em 2011, aí sim, ocorreu uma reversão, porque o investimento público caiu 12%, o investimento das estatais em 2011 caiu 9%. Depois, o investimento público, até 2014, praticamente não se recuperou.
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Recuperou no finalzinho, basicamente, do período, mas, no período todo, o crescimento é quase zero. Não quer dizer que ele caiu, mas ficou estagnado naquele patamar, e o espaço fiscal, aí sim, foi utilizado para expansão dos subsídios.
É por isso que eu acho que tem que se fazer uma definição mais fina de como o gasto público tem que se expandir para atender necessidades sociais e sempre buscar expandir o multiplicador fiscal. Concordo inteiramente com o que colocou...
(Soa a campainha.)
O SR. PEDRO PAULO ZALUTH BASTOS - ... a Senadora Kátia Abreu, que, no momento de desaceleração, o empresário pode até melhorar a sua margem de lucro, mas ele não vai investir. Então, o multiplicador fiscal desse tipo de gasto tributário, digamos assim, é muito menor do que a expansão na veia da economia, provocada pelo aumento do investimento público que depois vai rebater no próprio aumento da arrecadação.
O aumento da arrecadação, de que falou o Samuel, não ocorreu do nada. Claro que também as exportações de commodities ajudaram muito, inclusive para explicar por que, em 2003, o ajuste fiscal que foi realizado, que foi de 0,35 do PIB, muito menor do que o de 2011 e o de 2015, não provocou uma recessão tão forte. As exportações brasileiras para os países desenvolvidos praticamente triplicaram entre 2001 e 2003, e depois, a partir de 2003, houve um crescimento muito forte das exportações para a China e para a América do Sul.
Não é sempre... Exatamente, não dá para imaginar que, em 2015, havia o mesmo cenário e a mesma condição de realizar a mesma mágica de 2003. Em outras condições, a contração é muito mais contracionista do que em condições em que eventualmente as exportações estejam aumentando por causa da economia mundial. Não é porque o investimento privado aumenta que a economia sai da crise, é porque as exportações aumentam.
Agora, além disso, eu concordo plenamente com o Senador Fernando Bezerra: seria fundamental discutir o atendimento do teto salarial, por quê? O meu colega Marcos Mendes já disse aqui que a PEC vai forçar a realização de reformas de longo prazo, e por isso que ela tem que ser de 20 anos, e só haverá uma melhoria da qualidade do gasto quando houver essa restrição para gastar.
(Soa a campainha.)
O SR. PEDRO PAULO ZALUTH BASTOS - Agora, não é isso que a gente viu neste ano. Não é isso que a gente viu neste ano. Na verdade, neste ano, ocorreu um corte do gasto em educação, um corte do gasto em saúde, um corte do gasto em habitação e ocorreu uma ampliação daquilo que a gente pode chamar de keynesianismo fisiológico: um aumento do gasto exatamente para categorias, inclusive do funcionalismo público, que têm muita força e para grupos sociais que têm capacidade de pressão; por exemplo, renúncia de receita relacionada a concessões de ativos públicos. Isso aumentou evidentemente porque alguém fez lobby para que isso aumentasse.
Não sei por que a gente tem que imaginar que, definida a PEC por este governo, algo diferente acontecerá daqui para frente. O mais provável, na verdade, é que, como a própria PEC alega e como "Uma Ponte para o Futuro" definia, você vai ter que atacar as vinculações constitucionais. Ora, mas as vinculações constitucionais existem exatamente porque, como colocou a Senadora Gleisi Hoffmann aqui, aqueles que dependem de gasto social, que está vinculado na Constituição, não têm capacidade de realizar lobby.
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Então, exatamente por isso os gastos são vinculados. Essa é a justificativa da vinculação de gastos, veja, desde a Constituição de 1934. Era esse o argumento colocado pelos Constitucionais de 1934. Está certo?
Então, essa PEC é muito importante porque é uma emenda que muda a natureza da própria Constituição. E não diria apenas, digamos, como alguém já disse, que é uma "desconstituinte", sem muita discussão, na verdade. Mas ela muda também determinados princípios da Constituição de 1934, muda, vai mudar, propõe lá no documento "Uma Ponte para o Futuro", a CLT. A gente sabe muito bem que isso está colocado ali, que é preciso que o contratado, o negociado valha mais do que aquilo que é definido legalmente, e isso está no "Uma Ponte para o Futuro" também.
Então, na verdade, o conjunto de reformas está atacando uma herança constitucional de 1934, de 1937 e de 1988. Não quero nem falar da Constituinte da ditadura militar, evidentemente.
(Soa a campainha.)
O SR. PEDRO PAULO ZALUTH BASTOS - Avançando aqui.
Os benefícios da proposta, o Senador Roberto Muniz perguntou isso, da PEC. Bom, ela está levando à discussão, digamos assim, mas a discussão é muito curta. A meu ver, o único benefício que essa PEC tem é introduzir a discussão, mas ela é muito ruim, muito negativa, a PEC 55. Como eu já disse, ela é contraproducente do ponto de vista do crescimento econômico, ela diminui o multiplicador fiscal crescentemente ao longo do tempo. Certo? Segundo, ela é injusta.
Vamos lembrar o que colocou aqui o Senador Fernando Bezerra. O Senador Fernando Bezerra disse que não tem que parar por aí, a gente tem que mexer não apenas com gasto, sobretudo com esse gasto vinculado, para quem precisa de vinculação porque não tem capacidade de lobby, mas também tem que atacar a estrutura tributária regressiva brasileira. Mas o Senador disse também logo depois, nas palavras dele: "Eu conversei com a Fazenda e eles falaram que o resultado da PEC será tão positivo que não será necessário aumentar os impostos e a carga tributária." Está certo?
Então, vamos combinar que, se o que o Senador Fernando Bezerra falou é verdade, a proposta do Ministério da Fazenda, a PEC envolve concentrar, sim, todos os ônus naqueles que dependem de gasto público, de gasto social e de investimento público, e, como falei antes, poupar os criminosos, porque não houve nenhuma alteração na estrutura de fiscalização, e poupar os privilegiados. A gente vai ficar observando muito isso, se a PEC for aprovada, porque a gente vai cobrar muito isso, depois, de quem disse que seria o contrário.
(Soa a campainha.)
O SR. PEDRO PAULO ZALUTH BASTOS - E ela é antidemocrática, volto a repetir, porque, vamos dizer o seguinte: muitos dos que foram favoráveis ao impeachment da Presidente Dilma escreveram artigos, fizeram discursos dizendo que ela tinha cometido estelionato eleitoral. Não vou entrar no mérito disso. Agora, muitos que falaram exatamente isso não comentam também que o Temer é da mesma chapa e nem chegou perto... Uma coisa é realizar um ajuste fiscal considerado temporário.
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Acabou não sendo por causa do contexto da economia. Uma coisa completamente diferente é mudar completamente a Constituição. Isso não foi discutido por ninguém, nesses termos, nas eleições de 2014. O Presidente Temer tem que falar claramente isso. É verdade, está nos autos.
(Soa a campainha.)
O SR. PEDRO PAULO ZALUTH BASTOS - Gravou-se, numa reunião, com investidores em Nova York, e ele sugeriu que a Presidenta Dilma recebesse "Uma Ponte para o Futuro". Não aceitou "Uma Ponte para o Futuro" e, a partir daí, foram desencadeados, digamos, os movimentos que levaram ao impeachment da Presidente.
Você me desculpe, então. Isso não é democrático. E não é democrático também, como colocou aqui a Senadora Kátia Abreu, porque o ponto fundamental da democracia é buscar os consensos e buscar o equilíbrio, e a PEC já parte de um enorme desequilíbrio e vai produzir necessariamente mais conflito e instabilidade política, exatamente por quê? É aquele gráfico que eu mostrei: o teto vai diminuir, ao longo do tempo, em relação ao PIB, e o piso, por causa da contratação dos gastos previdenciários, vai aumentar. Então, você vai espremer gastos obrigatórios e discricionários em até, eventualmente, vamos falar, então, só daqui a 10 anos. Vamos falar em 10 anos, não vamos falar em 20 anos. É difícil explicar por que a PEC é de 20 anos, continuo achando difícil. Mas, só em 20 anos, a gente está falando de um corte, nas projeções do Bradesco e nas nossas, de mais da metade da participação do PIB de tudo que não seja gasto de Previdência, saúde e educação. Está claro? E saúde e educação vão cair também, tanto do ponto de vista real, por causa da inflação vinculada ao gasto público, quanto principalmente per capita, porque a população brasileira, em 20 anos, vai aumentar em 21 milhões.
Para concluir mesmo, é por isso que eu considero que... Vamos lembrar aqui. Vou ler para não dizerem que eu estou inventando. "Uma Ponte para o Futuro" diz que a solução fiscal "será muito dura para o conjunto da população", mas propõe evitar aumento de impostos e fazer desonerações de exportações e investimentos. Bem, então, dura para todo mundo? Não sei se vai ser. Acabar com as vinculações constitucionais, como nos casos de saúde e educação. Então, vamos discutir tudo junto, vamos discutir também o lado da receita.
Então, parece-me que ela é antidemocrática, porque, numa emenda constitucional que está tendo muito pouco tempo de ser discutida e avaliada pelo povo brasileiro, propõe-se uma visão de Estado de longo prazo...
(Soa a campainha.)
O SR. PEDRO PAULO ZALUTH BASTOS - ... para resolver, sim, um problema de desaceleração cíclica, que foi aprofundado pela política equivocada realizada pelo Sr. Joaquim Levy, em 2015; infelizmente pelo Sr. Nelson Barbosa, também em 2015; e por este Governo agora, em 2016.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (José Maranhão. PMDB - PB) - Antes de encerrar, eu quero agradecer a presença de todos, especialmente do Dr. Samuel Pessôa; do Dr. Pedro Paulo Zaluth Bastos, que acabou de falar; de Guilherme Santos Mello; e finalmente de Marcos Mendes.
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O objetivo fundamental desta audiência pública eu tenho certeza de que foi atingido, porque o objetivo desta reunião era trazer as luzes de outros técnicos, de outros pensadores, de outros economistas que não apenas os membros da Comissão e do Senado Federal, já que a essa reunião qualquer Senador poderia comparecer, como ocorreu, embora em pequena escala. Acho que isso faz parte do debate democrático. Eu ouvi muitas coisas com as quais eu, pessoalmente, concordo e outras com as quais eu não concordo, mas tenho impressão de que, mesmo no discurso daqueles que divergem do meu pensamento, eu encontrei sugestões aplicáveis à votação.
É bom lembrar que essa votação não se encerra aqui nesta audiência pública. Aliás, esta audiência pública é informativa, mas não é deliberativa, no sentido parlamentar da palavra. Por isso, eu quero aqui também louvar o esforço que a Senadora Gleisi Hoffmann fez para que esta reunião se realizasse hoje. Inclusive, quando ela me trouxe a ideia de fazer a reunião conjunta, eu reagi um pouco, porque foi algo que fugiu à nossa prática, aos nossos padrões regimentais, mas agora sou obrigado a reconhecer que foi útil inclusive a realização conjunta, porque trouxe um público maior e, sobretudo, debatedores tanto da nossa Comissão, a Comissão de Constituição e Justiça, como da Comissão de Economia, uma Comissão que tem muito a ver com a matéria desta PEC.
Eu não concordo com a ideia que foi exposta agora pelo último debatedor a falar, o Dr. Pedro Paulo, porque um instrumento de projeto, a Constituição, é neutro, não pode ser chamado de autoritário ou democrático. Ele é um projeto de lei, e admitir que o fato de ele ser, por hipótese, autoritário, que ele vai render, que ele vai avassalar a maioria dos Parlamentares não me parece uma coisa também razoável.
Eu fui Senador em outra legislatura e, à época do fato de que vou falar, que foi a queda da CPMF no Senado da República, ninguém dizia que a CPMF ia cair. Todo mundo apostava no contrário. Por isso, achei pessimistas, por exemplo, as opiniões da minha querida Senadora Kátia Abreu, que admiro muito pela combatividade, pela coragem cívica de assumir posições com as quais nem sempre eu concordo, mas tenho de respeitar a sua coragem cívica. Naquela época, ninguém acreditava que a CPMF ia cair, e caiu fragorosamente.
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Eu lembro que, inclusive, o Orçamento Geral da União, na Comissão que eu presidia, que era a Comissão de Orçamento, já estava aprovado. E, no dia seguinte, foi um deus nos acuda, todo mundo surpreso com o resultado e sem uma orientação segura.
O Ministro da Fazenda era o Ministro Mantega e me telefonou logo, pedindo a devolução do Orçamento. Eu disse: "Não, não vou devolver o Orçamento." Compete à Comissão de Orçamento, ao Congresso Nacional, decidir sobre o novo Orçamento, que perdia, nada mais, nada menos, do que R$40 bilhões da CPMF.
E nós conseguimos aprovar o Orçamento, por sinal em tempo recorde, todo mundo achava impossível, porque ninguém queria abrir mão das receitas, todos queriam abrir mão da despesa, mas, da receita ninguém queria abrir mão. E nós conseguimos, com critérios imparciais, equilibrados, fazer o novo Orçamento, mesmo sem contar com aquela receita de R$4 bilhões.
Então, o que acho? Ouvi algumas opiniões aqui, naturalmente todas tecnicamente muito abalizadas, mas politicamente algumas opiniões aqui, tanto dos Parlamentares, como das pessoas que se pronunciaram aqui, achei pessimistas. O processo não está encerrado, ele mal começou. Naturalmente deverá ainda ser discutido. Aí sim, nesta Comissão, na reunião de amanhã, pode sair daqui aprovado ou não aprovado. Mas ninguém vai garantir que uma ou outra decisão vá impor uma decisão igual do Plenário do Senado da República.
De maneira que, em resumo, quero dizer que esta reunião atingiu seus objetivos e, mais uma vez, quero louvar o trabalho, a iniciativa desta Senadora guerreira, que não abre mão. Nestes três últimos dias estivemos sempre discutindo muito sobre essa reunião pelo telefone e chegamos a um consenso vitorioso, que foi a realização desta reunião.
Então, quero agradecer aos Senadores. É pena que, a essa altura, alguns já tenham se cansado e o plenário esteja meio esvaziado, mas fica registrado o meu reconhecimento ao esforço que tanto a Comissão de Constituição e Justiça, que eu tenho a honra de presidir, como a Comissão de Assuntos Econômicos, presidida por Gleisi Hoffmann, fizeram. Foi o máximo que lhes era possível de ser exigido, no intuito de contribuir para que nós tenhamos uma solução boa para o País, boa para a democracia.
Muito obrigado.
Está encerrada a presente reunião. (Palmas.)
(Iniciada às 11 horas e 02 minutos, a reunião é encerrada às 16 horas e 47 minutos.)