25/09/2017 - 5ª - Subcomissão Temporária do Estatuto do Trabalho

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fazendo soar a campainha.) - Declaro aberta a 5ª Reunião da Subcomissão Temporário do Estatuto do Trabalho, aqui na Comissão Permanente de Direito Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura.
A audiência pública será realizada nos termos do Requerimento nº 106, de 2017, de nossa autoria, para debater princípios basilares para um Estatuto do Trabalho e debater princípios da CLT.
Esta audiência pública será realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. As pessoas que têm interesse em participar com comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania, link www.senado.leg.br/ecidadania, e do Alô Senado, através do número 0800-612211.
Temos como convidados, no dia de hoje, Francimary Oliveira Michiles, Diretora do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait); Cristiano Paixão, Procurador Regional do Trabalho da 10ª Região - já ia convidar para a Mesa; nossas palmas. (Palmas.)
A Drª Francimary atrasou, mas... Já está aqui? Então, seja bem-vinda. (Palmas.)
Convido o Ministro Augusto César Leite de Carvalho, do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Seja bem-vindo também, Ministro. (Palmas.)
Convido Graça Costa, Secretária de Relações do Trabalho do Central Única dos Trabalhadores. Como a Graça estava de aniversário no fim de semana, a gente entende que ela pode atrasar um minuto. Ficam aqui as nossas palmas. (Palmas.)
Convido o Sr. Paulo da Cunha Boal, Diretor da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra). (Palmas.)
Então, rapidamente, vejo aqui com alegria também a presença do Urbano, representando a Contag - sempre presente -, e das assessorias de todos os nossos convidados. Sejam todos bem-vindos.
Urbano, sente aqui mais na frente, faça o favor.
O Urbano é um eterno dirigente da Contag. Tive o histórico, tive a alegria de participar na semana passada - não é, Urbano? -, por um convite, de um evento lá na Contag. Muito bom o evento. Acho que havia em torno de 300 lideranças do Brasil. Foi muito bom o evento e gostei muito. Eram em torno de 300 lideranças do Brasil todo para discutir temas como estes - há uma preocupação enorme -: tanto a reforma trabalhista quanto a reforma previdenciária. Quanto à trabalhista, a preocupação é de que ela entra em vigor a partir de novembro, e as preocupações aumentam a cada dia que passa, por aquilo que já está sinalizando o empresariado, tanto na área pública como na área privada.
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Tanto o setor ligado mais aos bancos como também ao empresariado da linha mais de ponta. Eu não diria de ponta, podemos dizer tanto setor primário e secundário como terceiro setor. A preocupação é enorme, de todos, com o que vem acontecendo. E esta nossa subcomissão é uma luz que surge, como falamos sempre, no fundo do túnel.
Com tanta desgraça, há uma expectativa muito grande na sociedade brasileira, principalmente daqueles que são empregados na área rural, na área urbana, na área pública, enfim, em todos os setores, pelo que significa a dita reforma trabalhista, que até hoje continuam vendendo a imagem de que ela é moderna. Nós achamos que é um atraso total e já começamos a sentir os efeitos. Em inúmeras áreas, estão sendo prejudicados já, com demissão, e contratando diretamente ou terceirizados, ou trabalho intermitente, ou aquele chamado contrato autônomo exclusivo, inclusive a Caixa Econômica Federal, já anunciando que não tem mais concurso tão cedo, pelo menos. E prefeituras já também dizendo que não vão fazer concurso. Tivemos aqui denúncias já gravíssimas dos professores, por exemplo.
Então, essa nossa audiência de hoje vem em uma série de audiências que estamos fazendo, e pretendemos apresentar ao País um verdadeiro Estatuto do Trabalho, e não o estatuto do empregador, como eles transformaram a nossa CLT, revogando praticamente tudo o que foi construído da Era Vargas até hoje.
Então, esse é o objetivo. Hoje, com ilustres convidados, vamos aprofundar mais uma vez o debate e aí vamos construindo. Só para situar todos, é nossa intenção, no dia 1º de maio, soltar já a primeira versão.
Quem preside esta Comissão é o Senador Telmário Mota; eu sou o Relator. Na falta dele, eu fico na Presidência. Lá na CPI da Previdência, que alguns confundem, eu sou o Presidente; o Relator é o Hélio José. Vamos também no máximo até outubro, no máximo até o fim de outubro, divulgar já o trabalho da CPI, comprovando a roubalheira, o desvio de dinheiro da previdência, que é algo que nem eu imaginava que era tão grave como está havendo agora.
E ainda querem fazer reforma da previdência, não mexendo, nem um minuto, na questão da gestão, da estrutura, na arrecadação, nada, é só retirando direitos. E aí continua como sempre: quem paga, paga muito, e quem não paga, não paga nada. Não paga nada, e, claro, vai chegar o momento em que a previdência vai ter déficit, porque só se retira e não se ajusta a arrecadação, não se ajusta a gestão, não se criam instrumentos para que esses 500 bilhões... Estou falando direto, mas dizem que é muito mais já, chegam quase a um trilhão os chamados devedores que dizem: "Devo, não nego, não pago." E daí tudo bem, e continua assim. Só mesmo aqui, no Brasil, para isso acontecer. E querem que o trabalhador seja mais uma vez punido.
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E querem que o trabalhador seja mais uma vez punido.
Nós temos muita esperança de soltar a primeira versão da reforma trabalhista no dia 1º de maio e de concluir os trabalhos ainda no ano que vem, para que o Congresso eleito em 2018... Tenho muita esperança no Congresso que vai ser eleito e no novo Presidente, porque, na verdade, não basta o Congresso aprovar; depende da sanção. Então, espero que tenhamos um Presidente comprometido com o povo brasileiro e um Congresso também comprometido, para que eles possam analisar, votar e, oxalá, sancionar uma carta decente, ou seja, um estatuto, uma CLT decente.
Então, vamos começar pela ordem aqui, se não houver nenhum problema.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem. Não há problema. É comigo mesmo, não é?
Vamos começar com a Diretora do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), Drª Francimary Oliveira Michiles.
A SRª FRANCIMARY OLIVEIRA MICHILES - Bom dia. Bom dia a todos.
Quero saudar o Senador Paulo Paim, agradecer-lhe o convite para participar deste evento importante em defesa dos direitos dos trabalhadores e parabenizá-lo, porque o senhor tem sido um dos únicos homens que tem nos apoiado, apoiado a Auditoria Fiscal do Trabalho, apoiado o trabalhador. E, na pessoa do Senador, quero saudar os demais componentes da Mesa.
Nós viemos tratar dos princípios basilares para o Estatuto do Trabalho e dos princípios da CLT.
Eu vou ter que acompanhar por aqui, porque eu tenho problema de visão.
Vai passando.
Então, dentre os vários princípios constitucionais da proteção ao trabalhador, como nós estamos vendo, eu estou me fixando no princípio da dignidade da pessoa humana.
O direito do trabalho, como direito social fundamental, pode ser compreendido sob dois aspectos. Há o direito individual subjetivo do homem de acesso ao mercado de trabalho e à capacidade de prover a si e a sua família, através de seu trabalho, que deve ser digno.
O direito do trabalho como direito social coletivo, inerente a um grupo de trabalho merecedor de proteção especial, fixa o patamar mínimo civilizatório, sem o qual não se aceita viver, derivado da igualdade substancial e que tem a dignidade da pessoa humana como essência da dignidade individual, que diz respeito à integridade física e psíquica do homem.
A dignidade social é a afirmação do homem como ser pertencente a uma sociedade e funda-se no parâmetro do mínimo existencial a ser assegurado a todas as pessoas.
Portanto, a concretização do princípio da dignidade da pessoa humana só é possível pela conjugação de duas dimensões: a individual e a social.
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O direito do trabalho consolida-se como principal instrumento da concretização da dignidade da pessoa humana ao possibilitar a inclusão efetiva do trabalhador na sociedade capitalista. Dessa forma a atividade estatal deve ser pautada pelo princípio da dignidade da pessoa humana, por ser o homem o centro de convergência de direitos de todo o ordenamento jurídico, e a dignidade constitui o substrato mínimo a ser assegurado a todos igualmente. E essa garantia mínima, a ser assegurada pelo Estado, é o direito do trabalho. E é por meio do trabalho digno que o homem se afirma e se insere na sociedade capitalista, além de se possibilitar ao indivíduo o acesso às condições de uma vida digna para ele e sua família.
O princípio basilar da ordem social e econômica é o princípio da dignidade da pessoa humana. Diante disso, temos que o sentido maior do direito do trabalho é assegurar a melhoria de vida do trabalhador e a determinação do mínimo existencial. Daí o princípio da dignidade da pessoa humana constituir-se na base de qualquer Estado democrático de direito. O princípio da dignidade da pessoa humana é universal e já consta da Declaração dos Direitos do Homem, que pode ser compatível com a dignidade da pessoa humana. A Convenção Americana dos Direitos Humanos, pacto de San José da Costa Rica, já reafirma a importância do princípio da dignidade da pessoa humana, em que os direitos essenciais do homem vêm do fato de ter como fundamento os atributos da pessoa humana.
A Convenção Americana de Direitos Humanos também afirma que ninguém deve ser constrangido a executar trabalho forçado ou obrigatório.
No ordenamento interno, as Constituições brasileiras de 1946 e 1967 já relacionavam a dignidade da pessoa humana ao direito do trabalho e prescreveram a todos a garantia do trabalho e a possibilidade da existência digna. Também a Constituição Federal de 1988 reafirmou o princípio da dignidade da pessoa humana, já trazendo no seu preâmbulo que cabe ao Estado instituir e assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais. A Constituição cidadã trouxe como fundamentos a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa. Também destacou como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil a erradicação da pobreza e da marginalização e a educação das desigualdades sociais e regionais.
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Portanto, senhores, a proteção do trabalhador do desequilíbrio jurídico e econômico na relação laboral é pautada em vastos princípios de direito do trabalho constitucionais, dentre os quais nós destacamos o princípio da proteção, o princípio da primazia da realidade sobre a norma - e, aqui, com base nesse princípio é que a auditoria fiscal do trabalho constata diariamente a dura realidade que o trabalhador enfrenta -, o princípio da norma mais favorável, o princípio da imperatividade das normas trabalhistas, o princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas, o princípio da condição mais benéfica, o princípio da inalterabilidade contratual lesiva, o princípio da intangibilidade salarial e o princípio da continuidade.
A Organização Internacional do Trabalho deu destaque ao significado de trabalho decente, ao aduzir que é aquele adequadamente remunerado, exercido em condições de liberdade, equidade, segurança, capaz de garantir uma vida digna. A OIT apoia-se em quatro pilares estratégicos: o respeito às normas internacionais do trabalho, em especial os princípios do direito fundamentais do trabalho, a liberdade sindical, o reconhecimento efetivo dos direitos de negociação coletiva, eliminação de formas de trabalho forçado, abolição efetiva do trabalho infantil, eliminação de todas as formas de discriminação em matéria de emprego e ocupação, também a promoção do emprego e a qualidade, a extensão da proteção social e o diálogo social.
O trabalho digno ou decente pode-se conceituar como um conjunto mínimo de direitos do trabalhador, que corresponde à existência de trabalho, à liberdade de trabalho, à igualdade de trabalho, ao trabalho em condições justas, incluindo a remuneração e que preserve a sua saúde e segurança, a proibição do trabalho infantil, a liberdade sindical e a proteção contra os riscos sociais.
O princípio da proteção, consagrado na Constituição Federal da República do Brasil, determina que são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria da sua condição social.
Não obstante todo esse arcabouço jurídico, os auditores-fiscais do trabalho têm constatado diariamente inúmeras afrontas ao direito do trabalhador, onde se apuram inúmeras irregularidades, as quais são levadas ao trabalhador. Temos aqui o combate ao trabalho escravo, em que, somente no período de 2016 até março de 2017, foram resgatados 885 trabalhadores encontrados em condições análogas à de escravo. No período de 2007 a 2016, foram resgatados 28.409 trabalhadores em situação análoga à de descravo.
Também um dos grandes direitos do trabalhador, que tem sido inclusive desviado e com alto índice de sonegação, tem sido constatado pela auditoria fiscal do trabalho, em que foram levantados 18,65 bi, só pela Auditoria Fiscal do Trabalho, e existem inúmeras empresas ainda com grande índice de sonegação fiscal.
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Quanto ao combate ao trabalho infantil, das 60.860 ações fiscais, foram afastados 92.749 trabalhadores da condição de trabalho infantil. Mesmo sofrendo várias autuações, muitas empresas permanecem na irregularidade, porque preferem manter as autuações a conceder o direito dos trabalhadores. Daí a importância de um Estado firme para combater as mazelas sociais.
A inspeção do trabalho também autuou por segmento. Os maiores índices de irregularidades estão na indústria, na construção e no comércio. E é justamente na indústria da construção onde se tem o maior índice de acidentes de trabalho derivado das contratações, de terceirizações que ocorrem de forma muito alta.
Os acidentes do trabalho no Brasil. Foram registrados 700 mil acidentes de trabalho por ano, o que coloca o País em quarto lugar no mundo nesse aspecto, segundo a Organização Internacional do Trabalho. O Brasil fica atrás apenas da China, da Índia e da Indonésia e, com esses altos índices de acidentes do trabalho, o País gasta cerca de R$70 bilhões por ano.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Se diminuíssem esses acidentes de trabalho, já teriam resolvido o problema da reforma, porque ganha o empregado e ganha o empregador.
A SRª FRANCIMARY OLIVEIRA MICHILES - Exatamente.
Através das análises de acidentes de trabalho, de 19.958 análises de acidentes do trabalho foram constatados, no período de 1988 a 2014, 82.171 acidentes fatais.
(Soa a campainha.)
A SRª FRANCIMARY OLIVEIRA MICHILES - Isso significa que 2.800 trabalhadores morrem, por ano, em decorrência de acidente do trabalho.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Para ajudar a Drª Francimary. E ainda aqui no Congresso - para terem uma ideia - eles querem acabar com a NR-11, que é aquela que garante a proteção das máquinas, principalmente importadas, mas tem que ser para todas, é claro, e todo aquele sistema de proteção.
Por isso, está coberta de razão a sua análise sobre esse tema, e nós temos é que evoluir no combate ao acidente de trabalho e não essa forma cruel e truculenta como veio na reforma que aprovaram, infelizmente, e ainda querem acabar com a NR-11.
A SRª FRANCIMARY OLIVEIRA MICHILES - É a 12, na verdade.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - É a 12.
Ainda bem, Doutora, que corrigiu. Aproveito agora que estamos falando para todo o Brasil. A senhora olha o plenário, e no plenário estão as pessoas que mais acompanham este debate aqui.
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Mas, no mínimo, dois a três milhões de pessoas, na segunda-feira pela manhã, ficam na TV Senado assistindo a esses debates.
Então, a nossa responsabilidade é muito grande. Eu já agradeço aí a correção. É a NR-12; não é a NR-11.
Acho que estou lendo o número do grupo onze aqui e que estão bravos com essa situação.
A SRª FRANCIMARY OLIVEIRA MICHILES - E entre as causas desses acidentes do trabalho obviamente está a questão do maquinário inadequado, desprotegido. Mas chamo a atenção para o ritmo acelerado, excesso de jornada de trabalho, o assédio moral, a cobrança exagerada e o desrespeito de diversos direitos dos trabalhadores.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Assédio moral, assédio sexual, enfim...
A SRª FRANCIMARY OLIVEIRA MICHILES - Isso.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - É uma vergonha.
Mas vá lá. Está indo bem.
A SRª FRANCIMARY OLIVEIRA MICHILES - Espere. Está passando.
Além de outros acidentes, também muito atuais agora são os transtornos mentais e comportamentais, como episódios depressivos, estresse e ansiedade, e Síndrome de Burnout.
Além de todas essas mazelas aqui apontadas pela Auditoria Fiscal do Trabalho, ainda temos a imposição do Governo da desregulamentação do direito do trabalho, coisificando o trabalhador, através da dita reforma, chamada reforma trabalhista.
Vários problemas nós levantamos, já detectamos, que causará esse tipo de contratação.
Trabalho intermitente - a subordinação do trabalhador ao empregador. O empregador poderá convocá-lo ao seu bel prazer. O trabalhador não saberá o quanto a receber pela prestação do serviço, posto a carga horária certa a ser contratada podendo ser inferior ao salário mínimo;
Trabalho temporário - também os trabalhadores serão desigualados dos demais trabalhadores que laboram na mesma função;
A terceirização desenfreada, que permite a terceirização na atividade, inclusive na atividade principal. Nesse caso, os empregados poderão ser contratados por cooperativas, por pessoa jurídica (PJ), por microempreendedor, ou por empreendedor individual;
A flexibilização da jornada é outro problema, pois aumentará inclusive os acidentes do trabalho. A nova lei não permitirá o controle da jornada pelos empregados e amplia a compensação das horas extraordinárias, permitindo jornada de 12 horas seguidas no período de até 36 horas de descanso, elevando o risco de acidentes de trabalho e doenças ocupacionais.
O teletrabalho também é outro grande problema, pois responsabiliza diretamente o trabalhador às condições exclusivas de insalubridade e qualquer outro dano que ele venha a ter.
E as limitações do trabalhador ao acesso à Justiça, onde o trabalhador não poderá reivindicar seus direitos, porque terá que custear as despesas judiciais e periciais, inviabilizando, dessa forma, o recurso de demandar. Outra lesão que a desregulamentação traz é o negociado sobre o legislado. Prevalecerá o constante da convenção coletiva, mesmo em conflito com a norma superior; a diminuição salarial, sem consequente redução de jornada em negociações coletivas; as negociações coletivas livres, sem participação sindical; a diminuição da remuneração e consequente arrecadação de FGTS e contribuições sociais.
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Ora, se não haverá mais vínculo empregatício, consequentemente haverá uma redução drástica de arrecadação de todos os impostos incidentes sobre a folha de pagamento, inclusive o FGTS e a contribuição social.
(Soa a campainha.)
A SRª FRANCIMARY OLIVEIRA MICHILES - A supressão de direito de segurança e saúde do trabalho também foi admitida pela nova reforma, em que se admite a negociação coletiva sobre lugares insalubres e jornadas em ambientes insalubres, com a alteração de graus máximo e mínimo, previstos na norma legal; lesão ao direito das mulheres grávidas e lactantes, que poderão laborar em ambiente insalubre; intervalos não serão considerados norma de saúde, higiene e segurança de trabalho.
Senhores, diante de todas as imposições dessa regulamentação, que será imposta a partir de novembro, nós temos que o importante Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais - que determina o direito ao trabalho e à justa remuneração; o direito à forma de associar-se a sindicato; o direito a um nível de vida adequado; o direito à educação; o direito das crianças de não serem exploradas e o direito à participação na vida cultural da comunidade - deve ser imposto pelo Estado.
Importante decisão nós trazemos do Tribunal Constitucional Espanhol, que, precisando justamente o significado da primazia da dignidade da pessoa humana, sublinhou que a dignidade há de permanecer inalterável, qualquer que seja a atuação, e que a pessoa se encontre constituindo, em consequência, um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar.
Nesse sentido, a dignidade da pessoa humana é um princípio absoluto, posto que, ainda que se opte, em determinada situação, pelo valor coletivo, esta opção não pode nunca sacrificar ou ferir o valor da pessoa.
E os ensinamentos de Kant, que se apresentam nessa parte, devem ser aplicados nesse caso concreto: o homem, de uma maneira, todo ser racional existe como em si mesmo, e não apenas como meio para uso arbitrário daquela vontade - desta ou daquela vontade.
Diante de todo o exposto, é forçoso concluir que o Brasil possui arcabouço legal de Constituição o bastante para se rechaçar e revogar a desregulamentação trabalhista ora imposta, por se tratar de afronta aos princípios constitucionais consagrados na Constituição da República Federativa do Brasil, mormente o princípio da dignidade da pessoa humana, sem o qual o Estado democrático de direito não se perfaz.
Obrigada.
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Drª Francimary Oliveira Michiles, Diretora do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait). Parabéns pela palestra que abriu o debate no dia de hoje, demonstrando o retrocesso que pode ser essa reforma, considerando os direitos assegurados por todos nós ao longo das nossas vidas, inclusive em nível internacional.
Passamos a palavra neste momento ao Dr. Cristiano Paixão, Procurador Regional do Trabalho da 10ª Região.
Estou dando dez minutos com mais cinco, mas, se necessário, mais cinco, chegando ao limite de vinte.
Vamos ter uma segunda Mesa. Eu sei que chegou a Graça, que está com muita graça, porque fez aniversário nesta semana. Vamos dar uma salva de palmas para a aniversariante. (Palmas.)
Dr. Cristiano Paixão, Procurador Regional do Trabalho.
O SR. CRISTIANO PAIXÃO - Bom dia, Senador Paim, em nome de quem eu cumprimento todos os integrantes da Mesa, Ministro Augusto César, Francimary, Dr. Paulo Boal.
Quero registrar, em primeiro lugar, que estou aqui não só em nome do Ministério Público do Trabalho mas também da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho, que é uma participante ativa neste fórum. A nossa Vice-Presidente, Drª Ana Cláudia Bandeira, está presente aqui inclusive. Então, eu tenho, digamos, essa dupla representação, Ministério Público do Trabalho e também ANPT.
Eu gostaria de ser bastante objetivo, Sr. Presidente, porque temos várias falas que se sucederão aqui. Eu gostaria de apresentar duas ou três ideias que considero fundamentais.
Em primeiro lugar, quero saudar de forma expressiva essa iniciativa de se estabelecer essa discussão sobre o futuro do Estatuto do Trabalho. Nós vivemos um momento realmente crítico em relação à proteção ao trabalhador, é um momento inédito, em quase 30 anos de história constitucional, em que vivemos um ataque tão frontalmente dirigido contra o trabalhador e contra o sistema de Justiça que opera em torno da proteção do trabalho. Então, a minha ideia aqui é tentar resgatar um pouco dessa história de 30 anos, para tentar estabelecer algumas ideias.
O ponto chave da minha exposição é que qualquer estatuto do trabalhador, qualquer forma de produção legislativa que envolva o trabalhador tem que resgatar e reafirmar o projeto da Constituição da República de 1988. Ou seja, a Francimary falou sobre a dignidade da pessoa humana; esse princípio tem de ser resgatado, assim como o objetivo de criar uma sociedade livre, justa e solidária, como o objetivo de reduzir desigualdades sociais e regionais.
Se nós analisarmos o processo constituinte, estamos aqui numa Casa que hospedou o processo constituinte, o Senador Paulo Paim foi Constituinte. Foi um processo em que o mundo do trabalho, a categoria trabalho foi central em todo o processo constituinte. Foram as forças sociais ligadas ao trabalho, lideranças sindicais que surgiam, lideranças empresariais modernas, lideranças que envolviam uma nova concepção das relações de trabalho, elas ocuparam um papel central no processo constituinte. As discussões sobre os direitos sociais, estabilidade no emprego ou proteção contra despedida imotivada, a questão do modelo de organização sindical, os turnos ininterruptos de revezamento, a questão da jornada de trabalho...
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - O turno de seis horas. Calcule querer discutir o turno de seis horas nos dias de hoje. Eles nos matam aqui dentro. Na época, eu rebolei.
O SR. CRISTIANO PAIXÃO - Uma discussão profunda, intensa, mobilizou a sociedade como um todo. Ou seja, o trabalho era uma categoria central no processo constituinte porque as forças que envolviam uma proteção do trabalho estavam na vanguarda de quem desencadeou o processo constituinte. Então, isso trouxe uma dimensão, digamos, nacional e social para o debate sobre o trabalho.
E isso não foi uma história que acabou em 1988. Nós temos sucessivas leis que combatem a discriminação, que protegem a questão da mulher na relação de trabalho. Nós temos, digamos, o arco final dessa história é a Emenda Constitucional 72, que protege o trabalhador doméstico. Se nós pensarmos, ela é promulgada em abril de 2013. A CLT é de maio de 1943. Então, nós temos um arco de setenta anos de inclusão e proteção do trabalhador. Inclusive, inclusão gradativa.
A Constituição de 1984, mesmo 1946, elas não abrangiam os rurais. Os rurais foram sendo incluídos. A de 1988 restringiu o direito dos domésticos. Os domésticos foram, digamos, integrados com a Emenda 72. É uma história de inclusão ligada ao trabalho.
Aí, nós nos deparamos com essas leis promulgadas em 2016, que são flagrantemente inconstitucionais, porque elas reformam a Constituição por uma via transversa, por uma via sub-reptícia, por uma via que desconsidera todo esse elemento de proteção ao trabalho, que está na essência da Constituição de 1988.
Então, para sintetizar, digamos, esse primeiro momento da minha fala, qualquer estatuto do trabalhador tem que resgatar, respeitar, reafirmar e reiterar o compromisso da Constituição de 1988 com o valor social do trabalho, com a dignidade da pessoa humana e com a redução das desigualdades sociais e regionais.
E daí, eu já coloco uma segunda questão que envolve isso também. É fundamental que, em um futuro estatuto do trabalhador, estatuto do trabalho, esteja protegido e íntegro o sistema de justiça ligado ao mundo do trabalho. Porque a Constituição não apenas reafirmou a Justiça do Trabalho como órgão institucional crucial na arquitetura do Judiciário brasileiro, ela criou um sistema de Justiça. Nós temos na Constituição de 1988 Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, advocacia, advocacia pública. Existe todo um complexo de instituições que estão na Constituição para fazer reiterar e valer os princípios constitucionais.
Quando a gente fala no mundo do trabalho, são os princípios constitucionais que informam o Direito do Trabalho. Então, nós temos uma Justiça do Trabalho, um Ministério Público do Trabalho, a advocacia trabalhista, tão ativa, tão atuante no processo constituinte, como a Abrat, as associações de advogados trabalhistas foram tão atuantes nesse processo. Nós temos a Defensoria Pública, que hoje na União está se abrindo para o mundo do trabalho. Ou seja, essa estrutura precisa ser preservada, como existe na maior parte dos países democráticos do mundo, e precisa ser prestigiada.
O que nós vemos na Lei 13.467, a chamada reforma trabalhista, é uma diminuição da importância da Justiça do Trabalho.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Exatamente.
O SR. CRISTIANO PAIXÃO - É o tratamento do trabalhador como se tivesse menos direitos do que um litigante na Justiça Comum. É a Justiça do Trabalho com as mãos amarradas para aprovar súmulas, para estabelecer indenizações por dano extrapatrimonial. Restrições essas que não se aplicam à Justiça Comum.
Então, por que a Justiça Comum, que envolve questões contratuais, cíveis importantes, comerciais, não tem os limites que a Justiça do Trabalho tem?
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Muito bem. (Palmas.)
O SR. CRISTIANO PAIXÃO - Inclusive em relação ao seu acesso, inclusive em relação às condições de se ajuizar uma reclamação trabalhista.
Eu me recordo do Prof. Celso Antônio Bandeira de Mello, em um congresso em Porto Alegre, da Anamatra, o Conamat, em que ele dizia: “a justiça do trabalho é a justiça mais perto da população”.
Eu não ouço um trabalhador dizendo assim: “eu vou impetrar um mandado de segurança”. Eu ouço o trabalhador dizendo: “eu vou buscar os meus direitos”. E quando ele fala que vai buscar os seus direitos, normalmente ele vai ajuizar uma reclamação trabalhista.
Então, é um lugar em que há essa proximidade, essa consciência; e essa capacidade da justiça do trabalho de estar disseminada, de estar próxima da população, junto com o sistema de justiça, foi afetada pela Lei nº 13.467. Isso é um equívoco histórico que precisa ser imediatamente corrigido.
Então, estabelecido esse primeiro critério. Uma segunda questão que eu gostaria de colocar, que é uma questão muito importante para os órgãos que eu estou aqui temporariamente representando, é a universalidade da proteção a todas as formas de trabalho. Se nós vivemos em um mundo em que o mundo do trabalho está fragmentado e aquela estrutura hierárquica, hierarquizante da relação trabalhador e empregador vai encontrando várias brechas que vão, digamos, disseminando, e vão, de certo modo, fragmentando a relação do trabalhador a quem ele presta serviços, é fundamental que a proteção se estenda a todas essas novas formas de prestação de trabalho. Ou seja, que sejam protegidos os trabalhadores informais, que sejam protegidos os trabalhadores terceirizados - esses estão sempre na ponta da precarização do mundo do trabalho -, que sejam protegidos os trabalhadores estrangeiros, refugiados ou não, que encontram o seu sustento, muitas vezes explorados, no território brasileiro. Ou seja, não é possível mais pensar a proteção de apenas um tipo de trabalhador ou alguma forma ou alguma modalidade de contrato de trabalho. O mundo do trabalho exige que se proteja toda e qualquer forma de prestação do trabalho humano. A fragmentação do mundo do trabalho não pode se seguir à fragmentação da proteção do trabalho.
Então, é crucial, se nós temos hoje trabalhadores que prestam serviços por meio de aplicativos no celular, trabalhadores que se colocam como autônomos, mas efetivamente estão a serviço de algum conglomerado, algum grupo econômico, ainda que seja de mais de um empregador, é evidente que o trabalho subordinado continua a existir,...
(Soa a campainha.)
O SR. CRISTIANO PAIXÃO - ...e essa subordinação tem que ser compreendida modernamente.
A doutrina e a jurisprudência, tenho um acórdão aqui do TST, do Tribunal e da Turma, da qual sempre fez parte o Ministro Augusto César, um acórdão da 6ª Turma, que fala da subordinação estrutural. Ou seja, eu posso não ter uma subordinação subjetiva, o trabalhador não ser diretamente ligado por uma anotação nos seus registros funcionais ao empregador, mas ele pode ser estruturalmente subordinado a um determinado integrante, ator, do mundo do trabalho. Exemplo: as indústrias têxteis.
O Ministério Público do Trabalho firmou um Termo de Ajustamento de Conduta com uma marca de roupas, que é uma das maiores do mundo, tem sede na Espanha, mas tem penetração global. Essa marca tinha cerca de onze mil trabalhadores ligados a sua, digamos, cadeia produtiva, pouquíssimos deles eram trabalhadores da própria marca.
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Havia ali a contratação de intermediários que contratavam pequenas oficinas de costura normalmente conduzidas por trabalhadores bolivianos em situação de extrema exploração, que eram arregimentados por exploradores na própria Bolívia, chegavam ao Brasil já devendo seus custos de passagens, de moradia, ou seja, descontos ilícitos se faziam a todo momento. Um número de 2011 calcula que existiam 300 mil bolivianos nessa situação apenas em São Paulo. Devemos falar ainda que temos trabalhadores peruanos, paraguaios, nessa situação similar.
Foi feito um termo de ajuste de conduta com essa grife, que aproveitava o serviço desses trabalhadores, em que ela se compromete a assumir as consequências de toda a cadeia produtiva. Essa é uma questão muito importante para nós, porque ela envolve a ideia de que o Direito do Trabalho não pode ser um instrumento fácil de manipulação. Ou seja, eu me fixo num conceito de empregado e empregador não para incluir, mas para excluir, dizendo que não há uma ligação direta. E é evidente que o nosso mundo mudou, mas a nossa necessidade de proteção não mudou. A exploração do trabalhador não mudou. Os casos de resgate de trabalhadores em condições análogas às de escravo, trazidos pelo Sinait, só nos mostram isso: têm aumentado, na verdade, os casos de trabalho escravo urbano nessas condições precárias na construção civil, na indústria têxtil. Esse caso a que eu faço referência é um caso em que foram constatadas condições de trabalho análogas às de escravo.
Então, nós precisamos ter instrumentos modernos para lidar com essa situação - essa situação de fragmentação, de disseminação, de dissipação da responsabilidade na cadeia de produção. E as respostas que o Direito sempre nos dá para isso são respostas criativas, respostas que vêm da própria Constituição. A Constituição, quando fala em dignidade da pessoa humana, quando fala em valor social do trabalho, é a dignidade de qualquer pessoa, é a valorização social de qualquer trabalho; não é apenas do trabalho assalariado, registrado, com determinadas condições, é todo e qualquer trabalhador.
Então, é crucial - eu estou já concluindo, Sr. Presidente, para que ouçamos aqui os outros -, nós deixarmos claro que o Direito do Trabalho, ao longo de todos esses anos, seja pelo Tribunal Superior do Trabalho, que vem tendo uma atuação, digamos, primorosa em construir conceitos que estabeleçam essa proteção, seja por meio dos próprios atores sociais, que procuram o Ministério Público, batem às portas da Justiça do Trabalho sempre com essas novas demandas... É crucial que nós saibamos incorporar essas experiências num futuro Estatuto do Trabalho.
Nós vemos o mundo do trabalho em constante transformação, em constante processo de adaptação, e o Direito do Trabalho deve seguir essa tendência. Ou seja, o fato de se transformar o mundo do trabalho não pode ser um fator de precarização do Direito do Trabalho. Essa decisão que eu cito é um acórdão do TST, 528100, de 2006, da lavra do Ministro Maurício Godinho Delgado; ele deixa muito claro na ementa:
"[...] o Direito do Trabalho não absorve fórmulas diversas de precarização do labor, como a parassubordinação e a informalidade". Ou seja, ele interpreta o art. 2º e o art. 3º da CLT numa perspectiva ampla: quem recebe os frutos da prestação do trabalho? Quem é o beneficiário daquela força de trabalho que é cedida, que é, digamos, concedida, e se transforma em um grande fator de obtenção de lucro para o empregador? Alguém vai ser beneficiado.
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As nossas investigações mostram que os atores andam, de certo modo, cada vez mais sofisticados a encontrar formas de driblar a presença dessa subordinação. Mas ela aparecerá em algum momento, porque nós estamos em uma sociedade capitalista, vivemos numa sociedade capitalista e essa sociedade faz com que uma parte do mundo do trabalho seja mobilizado para produzir riqueza, e essa produção de riqueza se reverte em benefício de alguém. Não há nada de ilícito nisso. Temos uma sociedade, uma Constituição que prega também a livre iniciativa, mas essa livre iniciativa deve estar, digamos, de forma harmonizada com o valor social do trabalho.
A Lei 13.467, chamada reforma trabalhista, é uma tentativa de evitar esses casos de subordinação. E devemos lutar contra esse fato consumado. O fato de uma lei dizer que essa hipótese pode terceirizar, não há vínculo ou não há responsabilidade, não permite que a gente não aplique a Constituição da República. A Constituição está acima da lei, a Constituição é quem forma a lei. Uma lei só existe porque há uma Constituição que fornece princípios estruturantes para essa lei.
Então, eu tenho certeza de que atores do mundo do trabalho saberão interpretar e usar essa lei numa perspectiva constitucional, voltada para a proteção dos direitos do trabalhador, voltada para a proteção dos princípios constitucionais associados ao mundo do trabalho. E tenho mais certeza ainda de que o Estatuto do Trabalho, o Estatuto do Trabalhador erigirá esses princípios à condição de princípios estruturantes do mundo do trabalho, daqui para frente.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, esse foi o Dr. Cristiano Paixão, Procurador Regional do Trabalho, da 10ª Região.
Vamos de imediato para o Dr. Paulo da Cunha Boal, Diretor Legislativo da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra)
Depois teremos uma segunda Mesa. São três nesta Mesa e três numa segunda Mesa.
O SR. PAULO DA CUNHA BOAL - Bom dia.
Eu estava na reunião desta Comissão, da subcomissão que pensou essa reforma ou a criação do Estatuto do Trabalho, e me lembro de quando a Drª Magda Biavaschi fez uma observação que para mim foi uma das mais importantes, dizendo que nós deveríamos iniciar todo e qualquer trabalho relacionado a esse Estatuto do Trabalho com base nos princípios que tomariam conta, que formariam todo o conceito do estatuto. E comecei a pensar em uma forma de mostrar quais são os princípios e em que nos baseamos durante toda a história do Direito do Trabalho fazendo uma lógica inversa, mostrando tudo que a reforma trabalhista trouxe ou abandonou em relação aos princípios.
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Nós temos os princípios básicos. Eu não vou me ater a todos eles nem dar mil explicações, imaginando que boa parte da plateia tenha conhecimento - às vezes, o próprio nome dos princípios já traz em si o seu objetivo.
Os oito mais listados, são vários princípios - cada autor, às vezes, cita um ou cria outro -, mas, em base, nós temos o princípio da proteção ao trabalhador, o princípio da norma mais favorável, o princípio da irrenunciabilidade dos direitos, o princípio da intangibilidade salarial e o princípio da primazia da realidade. Esses são os que deram forma a todo o conceito que temos hoje do Direito do Trabalho e serviram como parâmetro para as interpretações da CLT.
E nós já começamos com a ideia clara do que se tentou ou do que acabou sendo feito com a reforma trabalhista no art. 8º - agora art. 8º - da lei, que diz textualmente: "No exame de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, a Justiça do Trabalho analisará exclusivamente a conformidade dos elementos essenciais do negócio jurídico, respeitado o disposto no art. 104 da Lei nº 10.406 [o Código Civil de 2002]". O Código Civil, no seu art. 104, diz:
Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:
I - agente capaz;
II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável;
III - forma prescrita ou não defesa em lei.
Fica nítido o caráter civilista que se tenta ou que se implantou na reforma.
Nós tratamos direitos disponíveis, basicamente os que mantêm a nossa vida civil, quando a regra do Direito do Trabalho é o princípio da irrenunciabilidade de direitos. Compara-se a relação comercial da compra de um colchão a uma relação de trabalho. É isso que pretendeu o legislador da reforma, que é justamente esta Casa aqui.
Então, eu acho que partimos inicialmente desse contexto civilista e da desgraça que isso pode importar na vida do trabalhador.
A leitura, a mera leitura da lei nos dá a certeza dos objetivos. Um, reformar ou anular as decisões do TST que não interessam ao mercado, essa figura fictícia, que não enxergamos, mas existe nos pressionando - reformaram ou anularam vários enunciados do TST mediante a inclusão de uma cláusula ou de um artigo: não se considera tempo à disposição troca de roupa ou uniforme, uma decisão já implantada, uma jurisprudência fixada há pelo menos 30 anos. Simplesmente se insere um artigo e elimina toda a interpretação jurisdicional que se fez sobre a troca de uniforme. Pior: inverte a ideia do que nós conhecemos como tempo à disposição do empregador. Isso abre brecha para o contrato McDonald's, para o tempo parcial, em que a lei expressamente diz que o tempo em que o cidadão, em que o coitado do empregado ficar sentado aguardando a chegada de um cliente, não se computa como tempo de trabalho. Essa quebra da lógica, essa quebra dos princípios, aqueles que eu citei rapidamente, vai ser encontrada, de forma absurda, em todo o corpo da lei. E aí eu peço a paciência de vocês porque eu vou alterando aqui e encontrando.
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De uma canetada também se anula o entendimento do TST, e depois convertido em lei, a respeito da jornada in itinere. Simplesmente isso. O tempo despendido pelo empregado desde a sua residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno, caminhando ou por qualquer meio de transporte, inclusive o fornecido pelo empregador, não será computado na jornada de trabalho, por não ser tempo à disposição do empregador.
Em um único ato se retira, novamente, uma interpretação consolidada, que depois se transformou em lei e que atinge basicamente a população mais carente.
Eu sou magistrado há 23 anos, basicamente só vi acontecer isso com o trabalho rural. Nós não temos mais a figura da jornada in itinere para trabalhador urbano, por uma série de fatores, mas atinge e fere, principalmente, aquele coitado do trabalhador rural. Eu trabalho em uma região que há muitos cortadores de cana... Na realidade de sair de sua residência às 5h da manhã para começar a trabalhar às 7h; terminar por volta das 5h e chegar em casa às 8h da noite. É esse indivíduo que está sendo aviltado em seu direito mínimo, como se a permanência no veículo não importasse em qualquer possibilidade até de sanção do empregador.
Ele está num espaço físico que é uma extensão da atividade produtiva e pode ser punido, pode ser dispensado por qualquer fato que aconteça dentro daquele veículo. Uma briga dentro do ônibus ou dentro do caminhão, onde se faça, implicará, necessariamente, uma sanção do empregador em relação ao empregado. Ele deve ser visto como uma extensão da atividade, como uma extensão da sua empresa apenas como algo que possa se movimentar. Seria a figura do - até esqueci a expressão - do semovente, seria quase que uma empresa semovente que pode alterar o seu local efetivo de trabalho.
Então, afeta-se diretamente a vida aqui, novamente, da figura mais frágil de toda a relação que são os trabalhadores rurais e fere, basicamente, o princípio da proteção.
Cria figuras tão estranhas em relação - não pelo nome que se dá, mas pela interpretação que se pretende dar, ferindo, aqui, neste caso, o princípio da primazia da realidade.
O art. 62 incluiu a figura dos empregados em regime de teletrabalho, excluindo-os da obrigatoriedade de controle de jornada. Esquecem ou esqueceram que o art. 62 nunca foi óbice para reconhecimento de jornada de trabalho. Basta que o motorista comprove que detinha algum tipo de controle, a ele eram asseguradas horas extras.
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Bastava o gerente bancário ou de qualquer estabelecimento comercial demonstrar que não detinha poder de gestão e também lhe eram asseguradas as horas extras.
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO DA CUNHA BOAL - Tenta-se, de uma forma legislativa, simplesmente ocultar a realidade. O trabalhador em regime de teletrabalho, este, sim, com os mecanismos atuais, é muito mais sujeito a controle de jornada. Qualquer computador diz: ficou logado das tantas às tantas. O indivíduo poderia até estar dormindo, mas estava logado no sistema. Há como se saber exatamente o que se produziu naquele período.
Então, a inclusão disso aqui, que foi tida como: "Ah, não; a sociedade melhorou, a sociedade evoluiu; nós temos que evoluir junto...", essa possibilidade já estava prevista desde 1943, que é o trabalho em domicílio. Não há diferença nenhuma naquela figura que se imaginou inicialmente, que era artesania - trabalhos de artesanato -, com o teletrabalho. E, desde então, a Justiça do Trabalho diz que mesmo o trabalhador em domicílio tem direito às horas extras desde que comprovado que o volume de produção a ele destinado é muito superior à capacidade de produção nas oito horas de trabalho.
Então, cria-se figura... E aí eu acho que está o maior dilema, o maior problema dessa reforma: eles estão vendendo algo que não podem entregar. Entregaram ao empresariado um projeto que se transformou em lei, dizendo: "Resolvemos todos os problemas que vocês tinham. A troca de roupa, a troca de uniforme não é mais problema; a jornada in itinere não é mais problema; o trabalhador a distância também não é mais problema..." E tudo isso é falso, porque os princípios que dão base à Justiça do Trabalho ou ao Direito do Trabalho dizem que tudo isso é uma falácia. E seguimos.
Eu tenho tempo ainda, não é, Senador?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Tem dez minutos.
O SR. PAULO DA CUNHA BOAL - Ainda sobre o teletrabalho, aquelas incoerências da lei.
O art. 75-E diz:
Art. 75-E. O empregador deverá instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho.
Parágrafo único. O empregado deverá assinar termo de responsabilidade comprometendo-se a seguir as instruções fornecidas pelo empregador.
Alguns artigos atrás, ele diz: eu não tenho - o legislador diz assim -, você não tem como controlar a jornada de trabalho do seu trabalhador em sistema de teletrabalho. Mas ele próprio vai autogerir não só o horário de trabalho, mas como todas as condições de saúde e segurança do trabalho.
Então, o trabalhador chega à Justiça do Trabalho apresentando - a gente imagina que sejam basicamente serviços hoje relacionados à informática - LER, síndromes de todos os tipos, e, segundo a norma, dá-se a impressão de que ele quer eximir o empregador de qualquer responsabilidade. O empregado sabia que tinha que cumprir uma carga mínima, que deveria haver intervalo a cada 15 minutos e tal.
A legislação toda me lembra uma frase que eu acho que é coisa do Rio Grande do Sul, Senador, um ditado: "... como Deus fez a mandioca". Tudo que dá errado... A sensação é essa.
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Não houve qualquer preocupação com a forma, e o ditado é muito claro: a mandioca nasce toda torta, para cima, para baixo, não tem. Essa legislação, a sensação que eu tenho é que foi isso, como Deus fez a mandioca. Artigos se contrapõem a todo momento, e vou dar alguns exemplos aqui.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PAULO DA CUNHA BOAL - Sim.
O tabelamento do dano moral é um assassinato explícito ao princípio da dignidade humana e ao princípio da igualdade, dois princípios constitucionais. Não estamos sequer falando de princípios típicos da Justiça do Trabalho. Como bem dito, são princípios universais, e aqui está-se simplesmente os desmantelando quando, em algum momento da lei... Aqui:
Art. 11. Ao apreciar o pedido, o juiz considerará [...].
§1º Se julgar procedente o pedido, o juiz fixará a indenização a ser paga a cada um dos ofendidos, em um dos seguintes parâmetros:
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO DA CUNHA BOAL - É o 223-G.
A natureza do bem jurídico tutelado - essa seria uma das regras, ou um dos elementos que o juiz deveria considerar. Mas desdiz completamente isso quando separa a natureza do bem tutelado, dizendo que a natureza do bem tutelado de A vale mais do que a natureza do bem tutelado de B.
Voltamos ao início. O projeto, hoje lei, não tem sequer nexo intelectual. Ele não observa uma lógica racional de princípios, e mesmo de técnica legislativa. E aqui faço uma crítica direta ao Congresso Nacional pelas incongruências que apresenta também na prática legislativa. A proteção, a restrição ao trabalho das mulheres gestantes e lactantes em ambiente insalubre foi criada através da Lei 13.287, de 2016, e sancionada em maio de 2016! Um ano depois, a reforma simplesmente diz: tudo aquilo que nós pensamos o ano passado era besteira; a lactante e a gestante podem trabalhar em locais insalubres. Então não é só esse legislador, não foram só as pessoas que pensaram a reforma que não têm coerência: esta Casa legislativa, assim como o Senado, também não tem coerência legislativa. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem. Foi culpa dos Senadores que assinaram, votaram sem ler. (Fora do microfone.)
Eles não leram. Eles não leram o que veio da Câmara.
O SR. PAULO DA CUNHA BOAL (Fora do microfone.) - É muito provável.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Se leram, é má-fé.
O SR. PAULO DA CUNHA BOAL - Não se imagina... (Fora do microfone.)
... que a sociedade possa evoluir tão rápido que, em um ano, aquilo que era defensável deixa de ser defensável. O trabalho, o simples trabalho, a permissão de trabalho de gestantes e lactantes ofende pelo menos três ou quatro princípios: ofende o princípio de proteção ao trabalhador, ofende o princípio de proteção ao nascituro - ele também é objeto -, e nós ficamos subordinados ao interesse da mãe.
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Isso, em vários momentos da história, já nos comprovou que não dá certo.
A talidomida, que gerou, na década de 70, uma série de crianças com problemas, se destinava a eliminar o enjoo da mãe e afetou diretamente as crianças. O trabalho em atividades como carvoaria, curtume, já demonstrou que as crianças nascem com problemas respiratórios ou nascem já contaminadas por algum tipo de elemento químico.
Aqui estamos atribuindo a saúde do filho à mera expectativa financeira da mãe ou do médico que atestar lá: "Olha, esse trabalho em si não traz prejuízo ao bebê."
Uma das comprovações de que a reforma atendeu àquele conceito divino da mandioca é o art. 443. Ele traz: "O contrato individual de trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito, por prazo determinado ou indeterminado, ou para prestação de trabalho intermitente."
Então, o art. 443 diz claramente: eu posso ter um trabalhador intermitente contratado de forma tácita. Até tenho dificuldade de saber como o trabalhador intermitente poderá saber, de forma tácita, quais os dias que ele deve ir. Não sei que tipo de bola de cristal se pode estabelecer sobre isso aqui.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - O Brasil todo que está assistindo deve estar dizendo: "Explica melhor, porque ninguém entendeu nada." Mas, não é para entender mesmo.
O SR. PAULO DA CUNHA BOAL - Não é para entender. E aí, Senador, continua.
O art. 452-A diz: "O contrato de trabalho intermitente deve ser celebrado por escrito e deve conter especificamente o valor [...]"
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO DA CUNHA BOAL - Ele desdiz o que o art. 443 antes havia pronunciado. Não é apenas um problema de equívoco de técnica legislativa. O problema aqui é de ruindade efetiva. (Palmas.)
Senador, em função do tempo, vou restringir um pouquinho.
Outro princípio, que é o da intangibilidade salarial, também é afetado diretamente pelo art. 457:
§2º As importâncias, ainda que habituais, pagas a título de ajuda de custo, auxílio-alimentação, vedado seu pagamento em dinheiro, diárias para viagem, prêmios e abonos não integram a remuneração do empregado, não se incorporam ao contrato de trabalho e não constituem base de incidência de qualquer encargo trabalhista e previdenciário.
A intangibilidade salarial não é simplesmente efetuar descontos no salário do empregado, tanto que se discutiu: "Ah, a contribuição sindical está sujeita ou não à intangibilidade salarial?" É retirar os efeitos do salário em relação a outras parcelas. No momento em que o empregador - e todos eles, ou a grande maioria deles - vai dizer: "Olha, o teu salário é um salário mínimo, o resto é tudo prêmio ou abono." Tudo que você receber além disso vai ser prêmio. Vou fixar uma meta e cada vez que você atingir essa meta, receberá um prêmio, que é basicamente o seu salário.
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Qual é a consequência direta disso com base no restante? E não constituem base de incidência de qualquer encargo trabalhista e previdenciário. Não vai gerar qualquer reflexo na vida do indivíduo, não vai pesar a ele...
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO DA CUNHA BOAL - ... não vai acarretar a ele uma melhora na sua condição previdenciária lá no futuro, porque será atribuído a ele o valor contratual de um salário mínimo e o restante fica tudo por ora veja.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - E, consequentemente, eles não estão pagando a previdência, a parte empregado/empregador, e aí, sim, é que eles vão construir o déficit.
O SR. PAULO DA CUNHA BOAL - Sim, isso inclusive foi objeto de ponderações. Esse artigo importa em renúncia fiscal e previdenciária. Isso foi trazido à baila e o Congresso simplesmente fez que não viu, aí a coisa tramitou e seguiu.
Senador, eu só quero fazer uma última observação aqui sobre um dos nossos princípios basilares, que é o princípio da norma mais favorável ao empregado, e que foi simplesmente chutado para fora da legislação ao dizer: "A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre: [...]" E aí cita uma série de situações.
Toda lógica da Justiça do Trabalho foi construída sobre esse princípio da norma mais favorável. Toda e qualquer legislação que apresente um elemento mais favorável ao trabalhador tem prevalência sobre a outra. Uma convenção coletiva de trabalho sempre valeu mais do que a Constituição brasileira, desde que se fixasse, por exemplo, um adicional de hora extra de 60%. A Constituição fala em 50%, a convenção fala em 60%; prevalece esta norma mais favorável. E outra maldade estampada: você pode negociar inclusive o enquadramento do grau de insalubridade.
Então, eu digo: "Olha, todos os meus empregados vão receber 10% de insalubridade." Imagina-se com isso que se vai evitar que o trabalhador vá a Justiça de Trabalho e diga: "Olha, ontem eu ganhei 10, mas eu mexia com sangue, mexia com carne contaminada, mexia com... E eu quero ganhar 40!" Eu acho que há de ser assim. É ser um sonhador muito utópico imaginar que o empregado vai se satisfazer com isso e que a Justiça do Trabalho vai dizer a ele: "OIha, meu amigo, o senhor foi lá, o seu sindicato negociou, reconheceu que a insalubridade é de 10%, e o senhor não tem direito a nada." Fere o princípio da primazia da realidade, fere o princípio da norma mais favorável e fere o bom senso. É basicamente isso.
E só para, agora, sim, encerrar mesmo. O art. 620 da antiga CLT dizia: "As condições estabelecidas em Convenção [coletiva], quando mais favoráveis, prevalecerão sobre as estipuladas em acordo." O art. 620 atual, que entra em vigor agora, diz: "As condições estabelecidas em acordo coletivo de trabalho sempre prevalecerão sobre as estipuladas em convenção coletiva de trabalho [...]" Isso aqui diz, basicamente: as federações não têm qualquer utilidade - as federações sindicais. O que vale é o acordo feito com o "sindicato dos trabalhadores em confecção de roupa branca", com seus dez associados. É esse que vai prevalecer sobre toda a federação de sindicatos de trabalhadores relacionados à indústria da confecção, como relacionados a qualquer outro setor da economia.
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Senador Paim, peço desculpas por ter me alongado um pouquinho mais. Infelizmente, isso aqui é tão ruim que dá para a gente ficar falando horas aqui.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Infelizmente.
O SR. PAULO DA CUNHA BOAL - Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito obrigado. Eu agradeço o Dr. Paulo da Cunha Boal, Diretor da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra).
Parabéns aos três convidados. Eles terão um espaço, no final, para as suas considerações, e algum questionamento que ainda surgir.
Eu convidaria esses três senhores que já usaram a palavra que voltassem ao plenário, de preferência na primeira fila.
Nós vamos agora para a segunda Mesa.
O Ministro Augusto César Leite de Carvalho já está aqui na mesa.
Chamo agora a Ministra Kátia Magalhães Arruda, também do Tribunal Superior do Trabalho. Por favor, Ministra, seja bem-vinda. (Pausa.)
Não chegou?
Graça Costa, Secretária de Relações de Trabalho da Central Única dos Trabalhadores (CUT), seja bem-vinda.
E Anjuli Tostes, representante da Intersindical - Central da Classe Trabalhadora.
Registro a presença da Vice-Presidente da ANPT, Drª Ana Cláudia Rodrigues Monteiro.
Eu teria um pequeno videozinho de dois minutos, se V. Exª permitir, sobre a questão do mundo do trabalho. (Pausa.)
O.k.? Se não, a gente passa no final das duas Mesas. Vamos deixar para o final das duas Mesas.
De imediato, passo a palavra ao Sr. Ministro Augusto César Leite de Carvalho, que é Ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
Com a palavra, por favor, doutor.
O SR. AUGUSTO CÉSAR LEITE DE CARVALHO - Agradeço o convite.
Eu penso que nosso momento é um momento delicado, é um momento de transição, é um momento muito difícil para a atividade jurisdicional e para todos aqueles que acreditam no poder de o Direito do Trabalho transformar para melhor o mundo, pacificar as relações sociais, com base em princípios reitores que se sedimentaram não apenas na jurisprudência, mas que, tradicionalmente, puderam ser auridos, puderam ser extraídos da norma que sempre tivemos, da norma trabalhista que sempre tivemos; um exercício intelectual que passou a ser extremamente dificultoso a partir da Lei 13.467. Eu quero saudar os integrantes daqui da Mesa, Drª Graça, Dr. Anjuli; quero também saudar aqueles que já estiveram aqui conosco na primeira Mesa que aqui se formou.
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Mas, Senador Paim, a minha preocupação foi a de tentar me conter naquilo que seria a crítica à Lei 13.467 e ser propositivo, na medida das minhas possibilidades, na indicação de princípios basilares que haveriam de ser considerados no Estatuto do Trabalho. É evidente que se torna inevitável que, ao me referir a esses princípios, aqui e ali eu me reporte à Lei 13.467 para dizer sobre terem sido eles considerados ou, simplesmente, desprezados, desconsiderados, desdenhados em certa medida. Mas o meu propósito é tentar estabelecer aquilo que é principiologia do Direito do Trabalho e que pode ser extraído das normas do Direito Internacional, da nossa Constituição, que é uma Constituição muito rica, muito densa em princípios, inclusive aqueles que têm a ver com Direito do Trabalho, e que precisam, necessariamente, estar em um Estatuto do Trabalho.
Eu penso que eu posso sistematizar esses princípios me referindo a quatro deles, porque os outros princípios, inclusive os princípios especiais do Direito do Trabalho, desses quatro seriam derivados. Esses quatro princípios, a meu ver, seriam: dignidade da pessoa humana, aqui já tão bem e tão brilhantemente referido; o princípio da igualdade material; o princípio da sustentabilidade e o princípio da operabilidade.
Eu extraio esses quatro princípios das narrativas de direitos humanos, das narrativas de direitos das normas que veiculam os direitos fundamentais nas constituições ocidentais, inclusive a nossa, e eu penso que não é possível construir um sistema jurídico, uma ordem jurídica trabalhista, que não leve em consideração esses quatro princípios.
O primeiro princípio, o princípio da dignidade da pessoa humana, aqui já foi referido, e referido com absoluta pertinência, como algo que estaria associado à impossibilidade de nós instrumentalizarmos o trabalhador, em especial, naquilo que diz respeito à tentativa de estabelecer regras que vão nortear a relação entre o capital e o trabalho.
O princípio da dignidade da pessoa humana migrou de lá da Constituição de 67/69, migrou da ordem econômica, do capítulo que tratava da ordem econômica, para se converter em fundamento da República. É um princípio hoje referido por tratados internacionais; indiscutivelmente é um compromisso da sociedade brasileira, registrado no nosso Texto Constitucional, que não pode, evidentemente, ser esquecido, não pode ser olvidado.
Deriva, talvez, do princípio da dignidade da pessoa humana, certamente derivam do princípio da dignidade da pessoa humana todos os princípios a que eu vou me reportar aqui na sequência.
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Mas é interessante a gente olhar, ver na nossa Constituição que o art. 5º dela, da Constituição, ao versar sobre o princípio da igualdade, na sua parte final, diz sobre a inviolabilidade dos direitos da personalidade. Este é um princípio muito caro e um princípio que foi observado não apenas pelas constituições nacionais, mas também pelas leis trabalhistas que surgiram nos últimos anos, inclusive leis trabalhistas que surgiram sob a influência de movimentos flexibilizadores do Direito do Trabalho. Se nós pegarmos a legislação europeia, sobretudo a legislação ibérica, tão próxima a nós, são leis... O Estatuto do Trabalhador foi reformado na Espanha na década passada. O Código do Trabalho de Portugal, de 2009, um código recente, também foi reformado recentemente. E há uma preocupação grande de tratar dos direitos da personalidade, porque isso, sim, significa tratar de algo novo na relação laboral. Quando a gente trata de teletrabalho, talvez seja, certamente, provavelmente será fantasioso em boa parte dos casos dizer, como o Dr. Paulo Boal já antecipou, que o teletrabalho está imune a qualquer controle de jornada. Mas talvez fosse interessante constar num estatuto do trabalho o que já consta, por exemplo, na legislação portuguesa no sentido de que o trabalhador e sua família não podem ter o seu domicílio, o seu lar invadido por interesses patronais que digam respeito ao controle do tempo de trabalho dele, desse teletrabalho dele, que não pode se confundir com o tempo de trabalho dedicado ao empregador, uma limitação para que esse trabalhador não tenha a sua casa invadida por meio de webcams ou por meio de conexão on-line em vista de ele ser um teletrabalhador. Isso tem a ver com as novidades que aconteceram na relação laboral.
Parece-me que, além da inviolabilidade dos direitos da personalidade, quando a gente trata da dignidade da pessoa humana, e os autores civilistas e o Direito Civil exploram bem esse aspecto, nós estamos tratando de eticidade, nós estamos tratando de um comportamento leal entre empregado e empregador. Não parece que preconiza um comportamento leal aquele dispositivo da CLT, da nova CLT, que diz que o trabalho que é contratado formalmente como autônomo, que atende às exigências legais, ainda que seja contínuo, ainda que seja exclusivo, estará fora da regência do art. 3º da CLT.
É evidente que essa matéria vai chegar à apreciação da Justiça do Trabalho porque o empregador está sendo estimulado, respeitosamente, a cometer uma fraude a partir do dia 11 de novembro de 2017. Isso é muito sério. (Palmas.)
Então, o que nós vamos aplicar, provavelmente, é aquilo que tradicionalmente se aplica no processo do trabalho, o princípio da primazia da realidade. E onde está o princípio da primazia da realidade? Onde está a regência do princípio da primazia da realidade? Agora, está no Direito Civil, no art. 167, que diz que, quando há simulação de contrato, o que vale é o contrato dissimulado, e não o contrato simulado. Este é nulo. Nós vamos ter que aplicar o Código Civil, porque tiraram a nossa base legal e, ao contrário disso, estimularam o empregador a cometer a fraude. É evidente que o legislador não disse ainda que seja fraudulenta essa contratação, nem poderia.
A lei também não parece deixar de ter, de ostentar, e eu digo isto a V. Exª com pureza d'alma - sei que V. Exª converge nesse sentido -, a lei não pode deixar de ser referência da ética. A nossa base é a lei. (Palmas.)
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A lei, por exemplo, não deve consentir, textualmente, que parcelas que tenham conteúdo retributivo, que remunerem um serviço, que incrementem a remuneração do serviço, algo que tem a ver com a meta que foi alcançada, uma assiduidade que foi observada, como o prêmio, na verdade não sejam propriamente remuneratórias. A lei não pode mudar a realidade. A lei não deve consentir textualmente que a igualdade salarial, por exemplo, seja uma prerrogativa do empregador, do tomador do serviço. E a Lei 3.467, data vênia, está a fazê-lo quando diz que o tomador do serviço e a empresa contratada, a empresa terceira, podem dizer se vão ou não observar a igualdade salarial preconiza pela OJ 383, do TST, da SDI-1 do TST.
A lei, data venia, está a dizê-lo quando disse que as progressões a partir de agora, com o art. 461, §3º, poderão ser apenas progressões por mérito, progressões funcionais, promoções apenas por mérito. Isso significa dizer que há de se adotar a jurisprudência atual, a Justiça do Trabalho diz: "Nós não podemos nos imiscuir nessa análise de merecimento que é feita exclusivamente pelo empregador." A se adotar a jurisprudência atual com esse novo dispositivo, o que nós vamos ter é a prerrogativa de o empregador observar ou não se quiser a igualdade salarial, a igualdade entre os trabalhadores que estão exercendo a mesma função.
Se nós formos observar o que dizem as nossas normas de Direito Internacional - e aí eu me refiro especialmente ao Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos Sociais e Culturais -, nós vamos dizer que há um dispositivo lá, o art. 7º do Pacto Internacional, que estabelece aquela alternância, aquela observância dos critérios de antiguidade e merecimento exatamente como salvaguarda a esse princípio da igualdade salarial.
Enfim, o princípio da dignidade da pessoa humana tem toda essa riqueza que permite que todos esses discursos que foram feitos até agora aqui sejam extremamente apropriados. E ele está no nosso sistema e ele não pode ser desprezado.
Mas eu quero me referir também, como disse, ao princípio da igualdade material, aí envolvida a não discriminação, a implementação de ações afirmativas, enfim. Eu penso, Senador, que o princípio da...
(Soa a campainha.)
O SR. AUGUSTO CÉSAR LEITE DE CARVALHO - ... igualdade material está bem retratado numa passagem do Boaventura de Sousa Santos, quando diz que nós temos o direito de sermos iguais naquilo que a diferença nos inferioriza, mas precisamos, temos, sim, o direito de ser diferentes naquilo que a igualdade nos descaracteriza. A igualdade, em meio à diferença, é absolutamente fundamental. E esse sistema precisa ser refinado. (Palmas.)
Não é uma lei que muda a realidade que vai fazer com que esse princípio passe a não ser mais observado.
Quando falamos de igualdade, estamo-nos referindo a essa dimensão dos direitos humanos, dos direitos fundamentais, que têm a ver com a inserção dos direitos sociais entre os direitos fundamentais. Isso está na nossa Constituição e está em todas as constituições que sucederam a Segunda Guerra Mundial.
Então, quando falamos de direitos sociais inseridos na pauta de direitos humanos, o que nós estamos dizendo é que a ONU tem razão quando diz que os direitos humanos são universais, indivisíveis, inter-relacionados, interdependentes. Não há como imaginar a irrenunciabilidade dos direitos, da liberdade que todos nós prezamos, por que todos nós prezamos tanto, sem entender também que são irrenunciáveis os direitos sociais, os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais. Isso, evidentemente, deriva também do princípio da dignidade.
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A igualdade jurídica implica o princípio da proteção. A gente tem o princípio da proteção não apenas na ideia que está traduzida no art. 7º, caput, da Constituição, a dizer que ali estão enumerados os direitos dos trabalhadores urbanos ou rurais, além de outros que visem à melhoria da condição social. Ali é uma centelha. A partir dali, todos os direitos que podem acrescer benefícios, vantagens ao trabalhador estão assegurados. Mas isso é constitucional. Não pode haver o retrocesso.
Então, a igualdade jurídica, o princípio da proteção, com essa sua derivação que é a norma mais favorável, é constitucional. A progressividade está no art. 7º, sim, da Constituição, mas também no art. 26 da Convenção Americana de Direitos Humanos. A lei não deve, a meu ver, textualizar a precarização. A lei não pode dizer, não deve sugerir que haja contrato intermitente... Se o contrato intermitente fosse regido pelo Direito Civil, por ter objeto indeterminado não seria válido. Agora é válido, no âmbito do Direito do Trabalho, em detrimento de todas essas máximas que estariam a sinalizar um patamar civilizatório condizente com o nosso estágio na defesa dos direitos humanos.
O princípio da autonomia coletiva aparece na nossa Constituição, art. 7º, XXVI, também como uma tentativa de equalizar a relação laboral, mas é direito fundamental do trabalhador urbano ou rural. Isso é textual, isso é gramatical, isso é extraído da literalidade do art. 7º, inciso XXVI, da Constituição. Então a autonomia coletiva não pode ser um artifício para que se possa reduzir ou estabelecer retrocesso em relação aos direitos dos trabalhadores.
Parece-me que um Estatuto do Trabalho deve perceber que precisamos compreender o direito de greve e a ultra-atividade como mecanismos instrumentais para a autonomia coletiva e não o inverso. Proibir a ultra-atividade significa proibir a progressividade. É grave, no sistema legal, que não se observe essa máxima do Direito Internacional e do Direito Constitucional que prevê a progressividade dos direitos sociais.
A ideia de proporcionalidade também precisa estar presente, porque o nosso mundo é multifalho, é multifacetado. A relação laboral se modifica a cada momento, não apenas porque há inventos tecnológicos, mas porque há novas formas de gerir o trabalho: o trabalho a distância, o trabalho remoto. Enfim, precisamos nos adaptar mesmo, mas evidentemente há uma ideia de proporcionalidade, daquilo que pode ser igual na relação entre trabalhadores, no trato do trabalhador. O tratamento igualitário é uma ideia de proporcionalidade que precisa ser verificada caso a caso.
Então, parece-me que pode ser observado por autodeterminação coletiva? Sim. Eu acho até que aquela ideia inicial de haver uma cláusula compensatória que estaria validando alguma redução aparente de direito e que seria interdependente pode ser explorada, tem a ver com o princípio da proporcionalidade. Mas aquilo foi retirado na parte que favorecia o trabalhador.
Também a proporcionalidade pode ser observada por discricionariedade judicial? Eu penso que sim. O que foi que a Justiça do Trabalho fez quando estabeleceu que por norma coletiva de trabalho poderia ser delimitada a hora in itinere?
(Soa a campainha.)
O SR. AUGUSTO CÉSAR LEITE DE CARVALHO - Estou tentando correr aqui para atender essa demanda.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Pode ir tranquilo porque você ainda tem no mínimo mais dez minutos.
O SR. AUGUSTO CÉSAR LEITE DE CARVALHO - Não. Não usarei...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - É porque de cinco em cinco ela toca.
O SR. AUGUSTO CÉSAR LEITE DE CARVALHO - Eu agradeço a tolerância de V. Exª e dos nossos interlocutores.
Veja, eu dizia que essa ideia de proporcionalidade está atrelada ao princípio da igualdade material.
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É preciso que em cada caso nós verifiquemos se há ou não essa igualdade, atendida a condição de cada qual numa relação laboral. Isso exige uma certa sofisticação de raciocínio, um certo refinamento. Não dá para tabelar, como propõe o art. 611-A, tabelar, estabelecer previamente, preordenar que tudo aquilo que está na norma coletiva de trabalho necessariamente será benéfico para a relação laboral.
Então, o que a Justiça do Trabalho fez em relação à hora in itinere. Num primeiro momento, decidiu que empregados e empregadores deveriam livremente estabelecer qual o tempo médio de deslocamento neste país continental, país rodoviário, país em que, diferentemente de outros tantos países, o deslocamento casa-trabalho é muito significativo no cotidiano, na vida, na rotina do trabalhador.
Então, nós estabelecemos uma jurisprudência e, na sequência, uma ordem legal que contemplava esse tempo de deslocamento como tempo de jornada sempre que ele fosse absolutamente indispensável para que aquela atividade do empregador pudesse ser desenvolvida, somente nesse caso. A jurisprudência se sedimentou no sentido de que empregados e empregadores - empregados por meio do seu sindicato - poderiam estabelecer o tempo médio. Nós vimos situações absurdas de tempo confessado de 5 horas, de 6 horas nos grotões deste País que eram estabelecidos como tempo de 15 minutos, de novo, como se a norma coletiva pudesse mudar realidade. Não pode! Nós não queremos desconsiderar a força relevantíssima que os sindicatos precisam ter na regulação do trabalho, mas não dá para incompreender que todos os sindicatos tenham essa mesma força, essa mesma combatividade.
Então, o que foi que nós estabelecemos? Estabelecemos um parâmetro, um critério de proporcionalidade dizendo que aquilo que significasse até a metade do tempo efetivamente de deslocamento deveria ser considerado.
E há também a possibilidade de a própria lei predefinir alguns discrimines, isso é razoável, está no art. 461 da CLT, quando trata da equiparação salarial. É possível estabelecer critérios de proporcionalidade até para facilitar as decisões judiciais.
Eu falo muito superficialmente sobre esse princípio da sustentabilidade. Eu penso que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é hoje um preceito constitucional, está no art. 225 da Constituição. É uma visão diferente de mundo, em que todos nós nos sentimos solidários. É preciso perceber que aquilo que significa a expressão pecuniária do Direito - então assegurar direito à remuneração de horas extras, adicional noturno, adicionais vários, prestações salariais que se acrescem ao salário normal -, tudo isso é relevante, tem a ver com o dia a dia, com aquilo que é fundamental na percepção do trabalhador. Mas, muito mais importante do que isso é deixar-se ungir pelo Direito Ambiental, pelos princípios do Direito Ambiental. A prevenção, a precaução naqueles casos de incerteza científica, tudo isso precisa interferir para evitar que essa hora extra aconteça, para evitar que esse trabalho noturno aconteça abusivamente, para evitar que esse trabalhador se submeta a uma condição insalubre ou perigosa de trabalho, que, não obstante, lhe assegure os adicionais correspondentes. Na verdade, vão fazê-lo morrer precocemente, vão fazê-lo adoecer, vão fazê-lo mutilado, enfim, vão fazê-lo acometido de doença relacionada ao trabalho.
Então, me parece que essa perspectiva ambiental é absolutamente fundamental. É preciso que o legislador avance nesse sentido, porque a perspectiva ambiental não traz atração, ela não é atrativa para os nossos interlocutores processuais.
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Estou me referindo a algo que... E não é uma crítica à advocacia, mas é natural que quando um advogado recebe uma causa, e essa causa corresponde a um valor que vai ser assegurado ao seu cliente, há uma atração muito maior do que naqueles outros casos em que apenas um interesse de prevenção contra o ilícito vá ocorrer. Porque essa prevenção não tem expressão com o pecuniário.
É importante que o sistema viabilize, prestigie e estimule as ações fiscais, coletivas, atuação dos sindicatos, do Ministério Público do Trabalho, com essa finalidade de evitar que o ilícito trabalhista ocorra. E o sistema não está aparelhado para isso. Nós não temos rigorosamente nada na nossa legislação, na nossa ordem jurídica que caminhe nesse sentido.
Finalmente, Senador Paim, eu gostaria de me referir à operabilidade, porque vai de encontro a toda uma crítica que se faz ao chamado ativismo judicial. Quando o Miguel Reale anunciou o Código Civil - e a sociedade aceitou o Código Civil de 2002 como algo que poderia melhorar as relações jurídicas, as relações sociais, pacificar conflitos, etc. -, ele se referiu a três características do novo Código Civil que seriam a eticidade, a socialidade e, por fim, a operabilidade. E ele dizia: "O Código Civil não pode ser uma lei que não vai pegar. O Código Civil não pode ser uma lei que cause tantas dúvidas, tantas incertezas, essa sensação ingente de insegurança jurídica como está causando a Lei 13.467."
E aí, o mecanismo que se construiu para que o Código Civil pegasse foi, na verdade, estabelecer cláusulas abertas, normas de textura aberta, boa-fé objetiva, função social da propriedade, função social do contrato, enfim, algo que não significa a descrição de condutas, de regras propriamente, mas significa valores, significa princípios a partir dos quais o juiz, em cada situação concreta, e a sociedade cada vez em que tem que estabelecer relações jurídicas interpessoais ou coletivas, vai verificar se estão ou não presentes.
Essa possibilidade de se decidir com base em normas abertas, normas que não descrevem condutas, evidentemente que permite ao Poder Judiciário aplicar esses princípios que têm força normativa em todos os casos, porque ele não precisa de regras descritivas de condutas.
E aí me parece que, quando se critica o Poder Judiciário porque haveria ativismo judicial, o que se quer é que o Judiciário, como está agora no art. 8º, §2º, e no §3º da CLT, por força da Lei 13.467, esqueça que existem princípios constitucionais, esqueça que existem princípios previstos, consagrados em normas de direito internacional, esqueça todo o restante do ordenamento jurídico, porque o que vale agora é a lei stricto sensu que o nosso legislador, por meio da Lei 13.467, estabeleceu.
Essa operabilidade que vem consagrada, vem bem retratada no conjunto normativo que nos foi oferecido em 2002, o novo Código Civil, está no caminho contrário daquilo que se diz ser a modernização da regulação do trabalho.
Eu penso que o novo Estatuto do Trabalho tem que caminhar no sentido inverso, no sentido da operabilidade, de permitir que esses princípios, essas normas abertas, essas normas que veiculam valores, veiculam princípios possam ser, sim, fundamento de decisões judiciais ou fundamento das práticas sociais, porque elas têm força normativa e não precisam de regras que minudentemente estariam a descrever a conduta certa ou errada.
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Eu agradeço muito. Tentei abreviar ao máximo aquilo que me pareceu importante como princípios basilares a serem considerados no Estatuto do Trabalho, princípios que estariam, sim, afinados com uma realidade nova, uma realidade diferenciada que nós realmente estamos vivendo, que exige, que reclama um direito do trabalho em sintonia com essa nova realidade. E isso não significa que é simplesmente a precarização das relações de trabalho.
Agradeço a possibilidade da minha participação.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, meus cumprimentos! Parabéns, Ministro Augusto César Leite de Carvalho, do Tribunal Superior do Trabalho (TST)!
Pelo tal WhatsApp, as pessoas estão perguntando como fazer para ter acesso a essas palestras. É só fazer contato aqui com a Comissão de Direitos Humanos. Peçam para falar com o Cleriston, e ele providenciará para que vocês possam ter um vídeo com todas as palestras desse tema. Inclusive, podem escolher de qual dia. Estou recebendo muitas no dia de hoje, pedindo acesso às falas que aqui estão acontecendo.
Passamos... O vídeo está pronto? Então, passe o videozinho agora.
(Procede-se à execução de vídeo.) (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Parabéns aos artistas que o gravaram. Nós temos recebido inúmeros vídeos como este de artistas que, livremente - principalmente de humanos direitos, não é? Estão demonstrando que virou piada, de tanta maldade que há aqui, como já foi dito pelos nossos convidados. A coisa é tão ruim e há tanta deficiência intelectual, de técnica legislativa, que virou piada nas redes de comunicação, e eles estão remetendo isso para nós.
É lamentável a gente ter de tratar de uma questão tão importante como esta assistindo a vídeos como este, que estamos recebendo praticamente toda semana.
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Vamos em frente.
Graça Costa, Secretária de Relações do Trabalho da Central Única dos Trabalhadores (CUT).
A SRª GRAÇA COSTA - Bom dia!
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - O aniversário já passou.
A SRª GRAÇA COSTA - Foi.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Então, agora, vamos ao trabalho. (Risos.)
A SRª GRAÇA COSTA - Desta vez, foi no sábado, foi tudo de bom! (Risos.)
Bom dia a todos e todas!
Quero cumprimentar a todos que já falaram. E eu acho que fica difícil a gente falar depois de um Ministro do TST, depois de tanta gente boa, mas é importante também, porque a gente se aproveita do que já foi dito. E vamos alinhar nossa fala mais do ponto de vista de fazer algumas reflexões, mas também de jogar quais são os desafios para nós nesse próximo período com esta crise toda que nós estamos vivendo.
Eu, Paim, fiz umas anotações aqui acerca do que nós conseguimos fazer, de como é que foi a movimentação na época da Constituição, porque nós temos uma história, a classe trabalhadora, do que nós construímos até aqui. Saímos de um processo de escravidão, e a gente, ao longo, pelo menos, desses últimos cem anos, foi evoluindo.
Através da luta, a legislação foi sendo acrescida de ganhos, de vitórias, de coisas importantes para nós. E uma das questões principais que ajudou bastante a classe trabalhadora foi a Constituição de 1988, porque, além do que a gente já tinha conquistado, em 1988 houve uma movimentação muito grande. Então, uma das questões principais para nós, neste momento agora de construir uma nova legislação, de ter energia suficiente para revogar essa que foi aprovada e construir algo melhor... Porque o que nós queremos não é só revogar aquilo que está colocado aí, que é uma realidade que vai começar a valer a partir do dia 11 de novembro, mas principalmente avançar naquilo que a gente ainda não tinha conseguido.
Mas em 1988, foram feitas 122 proposições populares, que foram apresentadas aqui na Comissão de Sistematização, com 12 milhões de assinaturas. Quer dizer, foi um movimento naquele momento muito amplo, porque 12 milhões de assinaturas de pessoas, pedindo para que fossem incluídas naquela lei questões que são cruciais para nós hoje, que fizeram evoluir bastante a relação de trabalho a partir de 1988 e naquilo que foi dito aqui pelo Ministro, a história de que a gente precisa do principal e do primeiro princípio para uma legislação, que é a dignidade da pessoa humana...
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E a Constituição trouxe para nós o fato de deixamos de ser só trabalhadores e trabalhadoras comuns, para passarmos a ser considerados cidadãos. O trabalhador passou a ser considerado como um cidadão, uma cidadã, a partir de 1988. Em todo canto a que vou participar de seminários, de debates com os sindicatos, com federações, eu gosto muito de relembrar isto, que nós passamos a ser considerados como cidadãos e cidadãs, que nós não temos só direito ao salário e à jornada de trabalho, mas temos direito à cultura, a ter um olhar muito especial para a saúde e segurança do trabalho, que obtivemos, e agora tudo isso está sendo não só ameaçado, mas vai ser destruído.
No ano passado e neste período todo em que nós fizemos essa jornada contra o projeto da terceirização, contra o 4.330, quantas vezes nós falamos aqui, nesta Casa, sobre a diferença que havia entre um trabalhador permanente e suas condições e um trabalhador terceirizado e suas condições? Nós trouxemos para cá uma pesquisa, um trabalho feito pelo Dieese que mostra este dado dos trabalhadores terceirizados: de cada dez mortes no trabalho, oito são terceirizados. E isso é tanto na questão das mortes quanto no adoecimento e nas condições de trabalho.
Nós estávamos falando de um número x de pessoas que hoje são terceirizadas, que é em torno de 12 milhões de trabalhadores e trabalhadoras, comparado com 34 ou 35 milhões de trabalhadores com vínculo permanente. Nós já achávamos um absurdo aquilo, imagine agora, com uma legislação que vai ampliar em 100% essas condições? Esse é o caminho que vai seguir o empresariado brasileiro, porque, como sempre tem sido dito aqui pelo próprio Senador Paim, agora ele tem uma cesta de tipos de contratos que ele pode usar de acordo com sua preferência. E qual vai ser a preferência? Vai ser por esses sem essa proteção, sem esses princípios que tínhamos até agora.
Então, trouxe essa história da Constituição e da movimentação popular que foi feita porque, neste momento, Senador, nós estamos precisando, necessitando voltar para esse momento de nos mobilizarmos de forma ampla e massiva, para nos contrapormos a essa avalanche de ataques contra nós.
E quero dizer muito claramente: a lei passa a valer a partir de 11 de novembro. Já há muito empresário, inclusive prefeitos, querendo implantar a lei, que não é para o serviço público. Querem implantar tudo, transformar tudo numa feira, um negócio que não tem dimensão. Enfim, da mesma forma que o conteúdo...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - A informação precisa é de que os prefeitos querem, no mínimo, terceirizar tudo. Inúmeros prefeitos, não todos.
A SRª GRAÇA COSTA - Isso. Pelo menos esse item da terceirização já é uma realidade. Então, nós temos que... Este espaço aqui é muito importante, porque não é só um espaço de informação, de conteúdo, de esclarecimento. Quem tem acesso a essas palestras, a essas falas que estão sendo feitas aqui, tem um conteúdo muito bacana, muito profundo. O que não conseguiram fazer durante o processo, nós vamos poder fazer.
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Agora...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Não fizeram porque não foram convidados, não é? A gente até tentou, mas eles não deixaram.
A SRª GRAÇA COSTA - Eles não querem, não é? Eles não querem nada, não querem debate. Mas digo que, para a população, para o nosso povo que está nos acompanhando...
Mas isto aqui, Paim, é um instrumento de esperança para nós. O que está acontecendo aqui é, assim... É terra arrasada lá fora e aqui, neste espaço, nesta sala, neste ambiente, nós temos um grupo de palestrantes, de convidados, de pessoas de bem, de pessoas que são técnicos ou políticos, enfim, e vêm aqui e nos dizem... As pessoas precisam compreender isto: a lei não está valendo. Então, não pode ser implementada nas negociações que estão acontecendo neste momento. Não podem, ponto, acabou. Vamos para a resistência.
Agora, a partir do momento em que ela passar a valer, nós vamos também resistir. Nós vamos, no processo de negociação, na mesa de negociação, nos debates, fazer as nossas greves, vamos impor a nossa mobilização também nesse processo. É verdade que, num momento como este, em que levamos paulada na cabeça todos os dias, o mínimo que vai acontecer é ficarmos deitados sem condição de nos levantarmos. É por isto que este espaço é importante, é para nos energizarmos também.
Agora, nós vamos também resistir nesse aspecto jurídico. Estamos nos preparando para isso, estamos fazendo discussões com os advogados dos sindicatos, das federações e das confederações. Estamos nos organizando para olhar cada item da lei. O que puder ser questionado nós vamos questionar. Vai haver um processo de resistência também no âmbito judicial.
Mas a mais importante é essa questão da democracia, que foi rompida. Nós temos que voltar, porque ela está lá na Constituição Federal e nós precisamos recuperá-la. E um estatuto, uma lei trabalhista que está sendo gestada aqui, construída aqui... Além de derrotar aquilo que foi aprovado, o que já é um grande desafio para nós, nós precisamos avançar.
Há 20 anos, Senador, está aqui uma proposta de lei tramitando para que nós tenhamos o direito a 40 horas semanais...
(Intervenção fora do microfone.)
A SRª GRAÇA COSTA - Ah, caducou, não vamos nem falar disso. No meio de um processo desse, de destruição e de retirada de direitos, nós não vamos nem falar das questões positivas.
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Eu digo que é o contrário, nós temos é que colocar na mesa neste momento todas as questões que temos para avançar, para alimentar esse processo e avançar. O que está sendo construído tem que estar à luz daquilo que são os compromissos internacionais que o Brasil já adotou e de alguns que ele não adotou e precisa adotar, porque nós temos algumas convenções que já foram assinadas pelo Brasil que estão sendo violadas agora. Mas nós temos algumas que sequer implementamos, como é o caso da negociação coletiva no serviço público. Tudo isso está acontecendo aqui, essa reviravolta nas relações de trabalho, nos nossos direitos. Nós que somos servidores públicos, servidoras públicas, sequer temos direito de negociação. Ainda está tramitando um processo de regulamentação da negociação coletiva no serviço público. Então, nós ainda temos muito que avançar para implementar tudo que está na Constituição e nos acordos, nas convenções internacionais de trabalho. Estamos nesse caminho.
Agora, é importante a gente entender - sempre a gente fala disso, Senador - que a elite brasileira é uma elite muito atrasada, de cabeça muito curta, de pensamento muito retrógrado, tudo muito baseado na história da escravidão. O que está acontecendo aqui é a gente voltar para 1888. Porque, com essa regulamentação dessa lei da forma como está, nós vamos colocar o trabalhador brasileiro e a trabalhadora brasileira numa situação de escravidão, de muita submissão. E isso já era passado para nós. Isso já é de mais de séculos. Não é só de uma década atrás. A gente pensava assim há mais de 100 anos.
Agora, toda essa pauta que está nessa lei, na lei da terceirização e nessa lei da reforma trabalhista já estava aqui, pessoal, já estava tramitando aqui. Sobre todos esses itens já havia projetos de lei tramitando aqui no Congresso Nacional. O grande desejo do empresariado brasileiro era fazer o que eles estão fazendo, e não tinham tido a oportunidade. E essa oportunidade para eles chegou.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Você tem toda a razão. Eles estavam tramitando de forma individual. Nós, com o apoio do movimento social, enfim, daqueles que compõem os trabalhos de hoje e de outros tantos, estávamos resistindo. Eles não estavam conseguindo aprovar. O que fizeram? Reuniram tudo em uma peça só e enfiaram goela abaixo, como a gente fala, do povo brasileiro.
A SRª GRAÇA COSTA - De forma bastante rápida. Não deu tempo nem de respirar, e tudo aconteceu. A gente viu aqui já o histórico de projetos de lei, de reforma que passaram 15 anos, 10 anos tramitando, com debate caloroso, até chegar a uma conclusão. Aqui não durou três meses e já estava tudo aprovado. Enfim, uma situação muito delicada. Por isso o desafio é muito maior neste momento para nós da classe trabalhadora.
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E o ataque principal... Atacaram o contrato, as relações, mas eles atacaram a Justiça do Trabalho, e aí a propaganda que foi feita é igual à propaganda que é feita com o serviço público. Você vai dizendo que aquilo não presta, não presta, até ficar numa situação de privatização. Servidor e, enfim, aquilo que está colocado... A propaganda que foi feita, a campanha que foi feita contra a Justiça do Trabalho foi muito forte. Muito forte e eu estive no dia 7 de setembro, em Buenos Aires, falando da reforma trabalhista do Brasil. E, lá, está uma campanha muito forte também com as mesmas expressões, gente.
O que está acontecendo aqui é dizer que tem que fazer a reforma trabalhista para gerar emprego, dizendo que a Justiça do Trabalho tem que realmente diminuir a sua intervenção no movimento, na legislação trabalhista e tem que ter liberdade. Quer dizer, usam um discurso falso. Então, tem...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Liberdade de explorar livremente.
A SRª GRAÇA COSTA - É, para poder ser explorado.
E do discurso que foi feito aqui até agora nada se concretizou porque não vai criar emprego. Se criar, os empregos que forem criados vão ser de submundo; empregos muito precarizantes e precarizados. Nós vamos aumentar o número de pessoas com problema de saúde, sem falar no estresse, sem falar nessas doenças da modernidade hoje que o trabalhador sofre, tem muito assédio.
O que eu acho mais grave de tudo é se começar a considerar que o trabalhador deixa de ser um cidadão para ser uma coisa, para ser um objeto. Isso a gente já dizia no momento de discutir a terceirização, mas agora piora muito essa situação porque...
(Soa a campainha.)
A SRª GRAÇA COSTA - ... vai ser uma grande troca mesmo, já concluindo, de trabalhadores que têm esse contrato por tempo indeterminado por trabalhador com contrato parcial, com contrato intermitente, com contrato terceirizado. A luta vai ser muito árdua, vai ser muito grande nesse próximo período e nós precisamos descer às bases.
Acho, Senador, que tudo que está sendo discutido aqui nós precisamos fazer uma escuta para fora também. Nós precisamos fazer a mesma coisa que nós fizemos no momento do projeto da terceirização. Nós precisamos rodar este País...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - E eles não conseguirão aprovar. Desistiram pela pressão, eles arquivaram um de - sei lá - dez, quinze anos atrás - e enfiaram goela abaixo.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - De 1998.
A SRª GRAÇA COSTA - Isso. E a resistência foi muito forte, bacana. Nós conseguimos segurar.
O projeto continua tramitando e há esperança para gente. O 4.330 continua aqui. Nós podemos reverter essa situação mais cedo ou mais tarde. Vai depender muito da nossa organização, da nossa mobilização em romper esse ciclo. É verdade que há, nesse próximo período, num curto espaço de tempo, essa resistência à implantação da lei.
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Nós temos um processo eleitoral no próximo ano. E nós precisamos deixá-lo direto na nossa fala, no nosso dia a dia, no nosso cotidiano, porque tudo que está acontecendo aqui, tudo que está sendo retirado de nós, e de forma veloz, é porque o empresariado brasileiro tem uma maioria absoluta aqui. E tem uma maioria, quero dizer com muita sinceridade, desqualificada - desqualificada -, porque nós já tivemos embates muito fortes aqui no Parlamento, e nunca fomos maioria.
Nós classe trabalhadora nunca fomos maioria aqui, mas nós tínhamos um certo nível de debate, de coerência, tínhamos um certo nível de discussão e de recuo quando nos mobilizávamos. Muitas vezes só uma categoria vinha aqui, fazia uma mobilização; e os Parlamentares recuavam em algumas questões, porque era dar muito na vista, era muito imoral aquele tipo de coisa. E eles recuavam. Agora perderam a vergonha também; perderam a vergonha... Perdemos esse equilíbrio de forças, porque nunca fomos maioria, mas conquistamos muitas coisas aqui.
Esse é o momento muito difícil - muito difícil -, porque não é só uma questão de ter 30 votos a mais ou 100 votos a mais aqui dentro. É uma questão muito mais séria, e nós precisamos passar por uma transformação.
Uma delas é modificar essa composição do Parlamento brasileiro no próximo ano, na eleição de 2018. As pessoas ficam, principalmente a imprensa... A grande imprensa vai usando algumas notícias bombásticas, para esconder a realidade. E as pessoas já não falam mais sobre isso. Nós precisamos falar, sim; porque são os políticos que estão aqui, que levaram o nosso voto, que estão fazendo essa toda essa maldade com a gente. E nós precisamos continuar trabalhando nisso.
Os avanços que nós tivemos foram poucos para o que nós necessitamos; mas há muita maldade nessa proposta, como já foi dito aqui, que vai arrebentar com a vida da gente. Precisamos da construção de uma nova proposta. Nós da CUT estamos fazendo uma campanha pela anulação da reforma. Lançamos no dia 7 de setembro, no Grito dos Excluídos; estamos na fase de coletar as assinaturas.
Nós queremos movimentar cada vez mais as pessoas, os trabalhadores, a classe; não só quem é sindicalizado, mas principalmente quem é da população e que não compreendeu ainda, que não está acompanhando a dureza que vai ser nossa vida com essa nova legislação que está aí em curso.
Agradeço. Nós da CUT estamos à disposição.
Estamos fazendo essa campanha; acho que vai reforçar muito esse trabalho que o Senador Paim está fazendo aqui nesta Subcomissão, porque é de construir um novo paradigma. Nós precisamos romper com tudo isso que está sendo conosco.
Obrigada, Paim, e conte com a gente. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Graça Costa, Secretária de Relações de Trabalho da Central Única dos Trabalhadores, que fala muito da mobilização, da pressão e da expectativa de eleger um Congresso com compromisso com o povo brasileiro nas próximas eleições de 2018, e um Presidente também, não é?
Mas vamos lá. Representante da Intersindical - Central da Classe Trabalhadora, Anjuli Tostes.
A SRª ANJULI TOSTES - Bom dia a todos e todas que estão presentes aqui. Bom dia a quem está nos ouvindo, também, nos vendo.
Eu queria agradecer, em nome da Central da Classe Trabalhadora Intersindical, ao Senador Paim pelo convite e por esta importante iniciativa, também, que é o estatuto do trabalho. Quero saudar também os membros da Mesa; o Sr. Ministro Augusto César de Carvalho; Graça Costa também, companheira de luta. Enfim, agradecer também a todos que estão aqui.
Eu começo saudando esta iniciativa do Senador Paim, de a gente pensar e construir um novo estatuto, um novo regramento para o trabalho, porque o que nós sofremos como trabalhadoras e trabalhadores brasileiros foi inaceitável. E a gente precisa lutar para desfazer isso, e desfazer os efeitos dessa traição ao povo trabalhador, da traição ao povo que representou essa reforma trabalhista que passou aqui no Congresso Nacional, uma reforma que passou à revelia de toda participação que aconteceu nessas audiências públicas - e foram várias, eu estive presente em várias, nós da Intersindical estivemos presentes em várias. E era uníssono para quem participava da assembleia a opinião de que essa reforma era um absurdo, era uma vergonha, um descalabro; mas mesmo assim a reforma passou.
Então - eu vou falar aqui desta Casa do Senado também -, os 50 que votaram a favor dessa reforma são traidores do povo brasileiro; são traidores do povo brasileiro e a conta deles vai chegar. Essa conta vai chegar, e é por isso que nós estamos aqui também preparando o caminho, abrindo caminho para um novo estatuto do trabalhador, que refaça aqueles direitos que foram retirados, que os reponha, e, mais ainda, que vá mais longe, porque o que a gente tinha também não estava bom, não é, Senador? O que a gente tinha também estava insuficiente em termos de proteção do trabalhador, de proteção ao trabalho. E eu digo que estava insuficiente porque a desigualdade social no Brasil é uma das maiores do mundo. Então, se a gente não tem condições para que esse produto do crescimento, que o produto do trabalho seja repartido adequadamente entre a população, então tem alguma coisa muito errada nesse pacto social que vigora hoje no Brasil. E a gente vê uma situação de piora no que a gente já tinha, que não era bom, que era ruim.
Eu começo falando... Eu vou falar sobre duas falácias, duas grandes falácias. A primeira delas, a primeira falácia que se colocou aí para aprovar essa reforma, foi a de que modernizar as leis vai gerar mais empregos porque vai melhorar as condições de proteção para as empresas. Ora, vamos melhorar as condições de proteção para as empresas? Então são as empresas que precisam de proteção no mercado de trabalho? Isso aí é uma inversão - e eu vou falar aqui porque a gente está discutindo princípios para um estatuto do trabalho -, isso é uma inversão máxima do princípio da proteção, que prevê a proteção para a parte hipossuficiente da relação de trabalho. Quer dizer, na verdade quem precisa de proteção é quem está por baixo, e se a gente tem uma relação de subordinação - e a relação de trabalho, o que a define, é uma relação de subordinação - beira o absurdo se falar, por exemplo, na hipersuficiência. Então, não existe trabalhador hipersuficiente; se há subordinação, ele é hipossuficiente. Então, ele está numa situação inferior, existe um desequilíbrio de forças aí. Por isso mesmo, o Direito do Trabalho é um ramo aparte. É um ramo aparte para que essa situação contratual de desequilíbrio seja tratada de maneira especial. Então, há vários ataques ao princípio da proteção: terceirização, agora, também, com a reforma trabalhista, pode ser inclusive na atividade fim; restrições ao acesso à Justiça do Trabalho e também à justiça gratuita; jornada intermitente; contratação por tempo parcial, piorada. Então, são diversas situações que prejudicaram o princípio da proteção, e o primeiro ponto que eu coloco é a gente reforçar a importância desse princípio, porque se há algo certo neste País é que o trabalhador e a trabalhadora estão em uma condição muito inferior. Se a gente pega os grandes conglomerados financeiros, aí é que a exploração se dá de maneira mais forte ainda. É só você olhar para os bancos, para a condição - Graça sabe disso também - de trabalho que os bancários têm, por exemplo. Então, gostaria, em primeiro lugar, de reforçar o princípio da proteção para esse novo estatuto.
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Em segundo lugar, a gente tem aí também o princípio da irrenunciabilidade de direitos. Esse princípio define que é vedado ao trabalhador renunciar a qualquer direito disposto em lei. E aí vem a reforma trabalhista e estabelece o negociado sobre o legislado. Isso é uma clara afronta a um princípio histórico do Direito do Trabalho, a uma construção doutrinária e jurisprudencial do Direito do Trabalho, que foi atacada por essa reforma trabalhista - essa deforma trabalhista, na verdade. É um princípio importante, Senador Paim, - já que a gente está falando de princípios -, para a gente reforçar, porque os direitos são inegociáveis, são irrenunciáveis e nós não aceitamos nenhum passo atrás. Os direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras neste País e no mundo foram conquistados com muito suor, com muita luta, e é por isso que nós, enquanto trabalhadores, não aceitamos nenhum passo atrás. Então, o princípio da irrenunciabilidade de direitos é fundamental e muito importante. É óbvio que, se você tem uma relação de emprego, uma relação contratual de trabalho e de emprego, se você pode, livremente, ou por convenção, renunciar aos direitos que estão previstos nas leis e até na Constituição, o que sobra? O que sobra? Porque o interesse do trabalhador é garantir seus direitos, mas também garantir ali a sua subsistência.
A gente viu aquele videozinho ali, que pode ser uma piada, é uma comédia que foi apresentada aqui, mas é a grande verdade. É como um leilão. Agora, o que vale é quem dá menos. Quem dá menos para o empregador topar? Então, o trabalhador que abre mão dos seus direitos é o que vai ficar. Essa condição de fragilidade para o trabalhador e para a trabalhadora brasileira nós também não podemos aceitar, e deve ser pilar desse novo estatuto, Senador, na nossa visão da Intersindical, o princípio da irrenunciabilidade de direitos.
Vou comentar aqui também sobre o princípio da intangibilidade salarial. Esse princípio, inclusive, está previsto na Convenção nº 117 da OIT, que prevê que todos os salários ganhos devem ser devidamente pagos a empregados e também a servidores públicos. Isso também está sendo fragilizado no Brasil inteiro.
Eu também vou falar sobre os servidores públicos, porque está acontecendo aqui no Distrito Federal uma ameaça de parcelamento dos salários dos servidores e das servidoras públicas.
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Na verdade, é uma arma na cabeça. Olha o que está acontecendo aqui e o que está acontecendo em outros Estados também. Eu falei aqui porque já aconteceu no Rio de Janeiro, já aconteceu em muitos outros lugares.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - No Rio Grande do Sul, os professores e servidores estão recebendo R$350,00.
A SRª ANJULI TOSTES - É uma vergonha. É uma vergonha.
Então, o que está acontecendo aqui no DF, por exemplo, é que os servidores estão com uma arma na cabeça, que é assim: ou vocês aceitam esse novo regime de previdência, que põe em risco a previdência de milhares de servidores no Distrito Federal, ou vocês vão ter o salário parcelado. É, se correr, o bicho pega; se ficar, o bicho come. Não há nenhuma proposta boa. Então, o Governo também no DF está muito alinhado com o Governo de Michel Temer nesse sentido.
Para que servem os princípios? Os princípios existem justamente para servir de balizadores tanto para o legislador, que é esta Casa que vai fazer as leis, quanto para a jurisprudência, para os nossos juízes, enfim, para os aplicadores do Direito em geral. Mas infelizmente os princípios que já existiam - a gente está falando aqui de reforçar e de garantir de maneira mais clara ainda - não foram respeitados por esta Casa.
Como eu falei, essas pessoas que votaram, esses 50 que votaram de costas para a população brasileira... Esse tipo de democracia precisa ser repensada também porque como podem 50 pessoas definir o futuro dos direitos dos trabalhadores, de costas para mais de 90% da população que se dizia contra a reforma trabalhista? Então, esse tipo de democracia que está aí também não nos serve. Ela não nos serve. Que esses traidores também tenham a sua resposta nas ruas, nas urnas.
Eu quero dizer aqui e saudar, mais uma vez, essa iniciativa porque, de fato, nós não podemos nos conformar, nós precisamos lutar para recuperar o que perdemos e para avançar ainda mais, porque isso é o interesse do povo brasileiro. É esse o interesse real. Numa democracia real, esse é o interesse do povo.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem.
A SRª ANJULI TOSTES - Eu queria abordar aqui a segunda falácia. Eu falei que iria falar de duas. A segunda falácia, que também foi muito ventilada na época da reforma e continua a toda, é de que precarizar os direitos trabalhistas - modernizar, flexibilizar, no fundo, na verdade, é precarizar os direitos trabalhistas - gera mais empregos. Então, são esses argumentos econômicos que não são novidades. A história mostra isto: esses argumentos econômicos são utilizados historicamente como cortina de fumaça para implementar uma determinada ideologia. Então, você usa argumentos tecnocratas e econômicos para justificar a implementação de uma ideologia no País, sendo que não há qualquer evidência empírica de que a flexibilização ou a precarização dos direitos dos trabalhadores gera efeitos positivos sobre a economia agregada. Na verdade, o que nós temos em termos de estudos - e aí temos estudos com base nos países da OCDE, no Brasil mesmo, como a minirreforma que foi feita em 1998 por FHC - mostra que o que acontece é exatamente o contrário.
Vou citar aqui o Relatório Anual da Comissão de Direitos Humanos da ONU, em que consta que a desregulamentação do mercado de trabalho não favoreceu o crescimento econômico - e foi analisada uma base de dados de 20 países da OCDE.
(Soa a campainha.)
A SRª ANJULI TOSTES - Então, não favoreceu o crescimento econômico, não gerou emprego. Pelo contrário, o que aconteceu, na verdade, foi um aumento da desigualdade social e a precarização e a informalização do emprego. Então, o que está em jogo aqui, amigos, companheiros, companheiras, colegas, meus colegas de trabalho também, na verdade é uma visão de mundo. Não é uma questão meramente econômica - não é uma questão econômica. Porque o que gera emprego no País é crescimento, e crescimento econômico acontece com investimentos em pesquisa e desenvolvimento, que é investimento em educação. Esse é o crescimento econômico sustentável que nós queremos, um crescimento que promova a inserção das pessoas no mercado de trabalho, um crescimento que promova a divisão do bolo também. Porque de nada adianta crescimento econômico com aumento da desigualdade social. De que nos serve isso? Crescimento para quem?
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Por isso é que eu enfatizo aqui, também, essa questão, essa falácia de que geraria mais empregos. Não vai gerar e não gera, isso é demonstrado. Não gera: está no relatório do perito independente Juan Pablo Bohoslavsky, da ONU; está nos relatórios da OCDE. A OCDE fez agora, em março, uma recomendação para todos os países-membros da OCDE para terem muito cuidado com essas reformas trabalhistas em andamento, porque não há evidência empírica nenhuma de redução... de aumento de emprego, da empregabilidade.
Eu queria dizer também que, ainda sobre a questão dos efeitos macroeconômicos, a precarização da condição do trabalhador gera, na verdade, uma redução do consumo das famílias, o que é óbvio. A gente tem a equação do PIB (Produto Interno Bruto) com dois elementos muito importantes que são formação bruta de capital fixo e consumo das famílias - e gasto do Governo também, mas vou me ater aqui ao consumo das famílias. O consumo das famílias tem o potencial de alavancar o crescimento, de alavancar o PIB. E aí o que se faz? Na verdade, em uma situação de crise em que se deveria implementar políticas anticíclicas, faz-se justamente o contrário, o Governo faz o contrário. O que ele faz? Ele retira os direitos da classe trabalhadora, diminui o poder de compra dessas pessoas e, portanto, reduz o consumo das famílias. Então, essa é uma receita que aprofunda a crise econômica. Isso foi demonstrado na Argentina, gente, com a política neoliberal que foi implementada lá. Foi mostrado na Grécia, foi mostrado na Itália. Isso aprofunda a desigualdade econômica.
Vamos olhar aqui para a América Latina: o que aconteceu? O Governo desenvolve esse processo de uma grande mentira, uma grande campanha mentirosa para a população - rasa, mentirosa, sem base, sem respaldo, sem nenhum estudo técnico -, para vender ideologia barata. É isso que nós estamos aqui, também, desconstituindo, mais uma vez, porque é importante que nós também demonstremos que isso tudo não passa de uma grande mentira.
Além de reduzir o consumo das famílias, isso ainda provoca o quê? Uma contração da demanda - é óbvio. O proletariado sem dinheiro para comprar contrai a demanda e reduz, portanto - com a contração da demanda -, a arrecadação de impostos.
E eu vou falar do outro elemento do PIB também que são os gastos do Governo. Porque, se o trabalhador ganha menos dinheiro, ele vai pagar menos imposto. Se ele consome menos, ele vai pagar menos imposto indireto também. E aí o Governo também não consegue contrapor as crises investindo dinheiro na economia. Então, é um ciclo vicioso que se gera em cima de mentira.
Enfim, eu quero finalizar também, porque não quero tomar tanto tempo, mas quero dizer aqui que nós vamos lutar. Nós vamos lutar por um estatuto. Nós estamos juntos, Senador Paim.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem.
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A SRª ANJULI TOSTES - Nós vamos lutar para um estatuto que vai ainda mais longe nas garantias e na melhoria da condição do povo trabalhador do que havia antes.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem. (Palmas.)
A SRª ANJULI TOSTES - Vamos lutar, estamos juntos, porque é preciso que o povo trabalhador esteja junto, sim. E é preciso acreditar que é possível, porque, se nós somos os detentores do poder no País - e a Constituição prevê, no art. 1º, que todo o poder emana do povo -, então temos que fazer isso valer de verdade.
E vamos usar todos os mecanismos e todas as ferramentas à disposição da classe trabalhadora, para fazer isso acontecer. Então, vamos nos engajar nesse processo e lutar.
O último ponto é para dizer que saiu um estudo recente também, que é do Instituto do Piketty, que é um grande economista. Acho que O Capital no Século XXI hoje é um grande marco, o livro dele. Mas o Instituto do Piketty, com base em dados...
(Soa a campainha.)
A SRª ANJULI TOSTES - ... brasileiros concluiu que a desigualdade social no Brasil, nos últimos anos, aumentou, quando você considera a base e o topo da pirâmide, que é ali o 1% mais rico da população. Então, essa desigualdade aumentou. Os ricos ficaram ainda mais ricos.
A nossa desigualdade, no Brasil e na América Latina, só é maior, só é menor, perdão, do que a da África subsaariana.
Agora, vejam só, a resposta para isso, numa situação... Aliás, numa ação completamente alheia a essa realidade, a resposta dada pelos nossos representantes eleitos ou pela grande maioria deles, com honrosas exceções, é a de piorar a distribuição de renda entre trabalhadores e empresas...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Exatamente.
A SRª ANJULI TOSTES - ... porque o que há aí, na verdade, é uma transferência de renda. Não existe política pública neutra, não existe medida neutra. Em toda política pública, existem os que ganham e os que perdem.
E é muito interessante que, em contexto de crise, a proposta seja sempre arrebentar a corda para o lado do mais fraco. Então, há crise, e você propõe reforma da previdência, porque "Nossa, é insustentável o modelo que há". Esse é o mote.
Agora, você propõe uma reforma da previdência que só olha para o lado da despesa, só olha para cortar direitos. E o lado da receita, que eles não estão olhando, em que não mexeram? E a cobrança dos bilhões que são sonegados todos os anos?
E há aqui pessoas que sonegam, temos representantes aqui, Deputados e Senadores, que estão entre os campeões de sonegação da previdência, de contribuições previdenciárias. E a cobrança dessas verbas sonegadas como está sendo? E a cobrança da dívida ativa, que recupera um valor ridículo? Não há cobrança extrajudicial da dívida ativa.
Então, é muito interessante, porque as respostas para as crises - e muitas crises fabricadas também -, as respostas para as crises são sempre que a corda arrebente para o lado do mais fraco.
Então, agora, há uma crise, e a resposta é "Vamos tirar os direitos dos trabalhadores para gerar mais emprego", sendo que essas mesmas regras que estão vigentes hoje estavam vigentes em 2014, e se falava, inclusive, em pleno emprego, com essas mesmas regras aí.
E houve, como já comentei aqui, uma minirreforma em 1998, que criou o contrato por tempo determinado, banco de horas, jornada parcial, e qual efeito prático isso teve na geração de empregos? Nenhum. Nenhum efeito prático. Nenhum efeito prático.
Então, o que quero dizer, por fim, é que é importante, sim, que a gente não trabalhe em cima de falsas respostas...
(Soa a campainha.)
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A SRª ANJULI TOSTES - ... que a gente trabalhe em cima de respostas verdadeiras para as crises, e essa é uma resposta verdadeira, a criação do estatuto do trabalhador é uma resposta verdadeira, porque ela responde a uma necessidade óbvia num país como o Brasil, tão desigual quanto o Brasil, de que é necessário melhorar o fruto, de que é necessário dividir melhor o fruto do trabalho, o fruto do crescimento econômico. É necessário dividir esses valores, é necessário dividir esse produto do trabalho e, nesse contexto, uma proteção maior aos trabalhadores e às trabalhadoras se faz extremamente necessária.
Vamos recuperar, sim, os direitos que esses bandidos, porque bandido para mim não é o que está na periferia não, que é esse que é mostrado na televisão em programas aí, como Cidade Alerta, enfim, bandido não é quem está na periferia. Bandidos são esses, que roubam os direitos do povo trabalhador.
Então, nós vamos, sim, cobrar e retomar os direitos que esses bandidos nos retiraram enquanto povo. Vamos fazer tudo que for necessário para retomar e para desmentir essas falácias. Eu citei duas aqui, mas são tantas que são despejadas diariamente nos nossos meios de comunicação, também todos capturados. Vamos continuar e seguir na luta, porque a luta é preciso.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Anjuli Tostes, representante da Intersindical, Central da Classe Trabalhadora.
Eu recebi aqui, da assessoria, um documento que diz: nova escravidão é mais vantajosa para o patrão que na época colonial. Aqui explica detalhadamente que a escravidão hoje é pior da forma que está sendo feita a partir dessa reforma do que era no passado.
Você tem razão. Nós lá, na CPI da Previdência, mostramos que os grandes devedores são os grandes banqueiros, os grandes empresários, que devem para a Previdência. E nós também fizemos uma pergunta lá, os convocamos para que explicassem por que que não pagam. A resposta, parece que há um padrão combinado entre eles: devo, não nego, não pago, estou discutindo na Justiça, estou esperando o novo Refis. Refis que esse Congresso aprova. Negocia, renegocia, não paga de novo.
Quer dizer, a CPI vai concluir os trabalhos em outubro e vai propor mexer na legislação penal para criar instrumentos mais fortes, inclusive, de cobrança. A Anamatra, o Ministério Público do Trabalho, enfim, diversos setores, juízes, promotores, procuradores estão nos ajudando muito na formulação total. É inexplicável.
Eu, quando cheguei lá, na CPI, eu falava de um superávit, em média - em média, porque eu não vou trabalhar só com aquele ano que deu um saldo menor -, em média eram R$50 bi por ano. Nós vamos terminar o trabalho mostrando onde é que estão os trilhões que sumiram da Previdência, trilhões, nessa linha do que simplesmente os malandros não pagam e vira uma concorrência desleal.
Aqueles empresários sérios, eles mesmos falam: por que que eu vou pagar em dia se os picaretas, malandros - aí, são ladrões mesmo, como você fala; o teu linguajar eu uso lá também, por isso que eu tenho liberdade de usar aqui -,esses não pagam? E acabou e fica por isso mesmo.
Por isso que tem que haver uma mudança de rumo nesse País.
Bom, nesse momento, eu vou ver se há alguém no Plenário...
Doutora, por favor. Drª Ana Cláudia Bandeira Monteiro, Vice-Presidente da ANPT.
A SRª ANA CLÁUDIA BANDEIRA MONTEIRO - Bom dia a todos e todas.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRª ANA CLÁUDIA BANDEIRA MONTEIRO - Ah, claro, Ministro.
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O senhor, então, é um parceiro constante do Ministério Público do Trabalho e que nos brindou aqui com uma verdadeira aula. Fique à vontade.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Uma palestra brilhante.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - A gente agradece muito ao Ministro Augusto César Leite de Carvalho, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que, num gesto, como sempre corajoso, firme, vem aqui e coloca o que pensa sobre a maldade que veio embutida nessa reforma que traz prejuízos para todo o povo.
Uma salva de palmas para o nosso Ministro. (Palmas.)
Por favor, a Drª Ana.
A SRª ANA CLÁUDIA BANDEIRA MONTEIRO - Retomando aqui, bom dia a todos e todas!
Primeiro, quero parabenizar a todos que participaram da Mesa anterior, o meu colega e amigo Cristiano Paixão, colega e amigo Paulo Boal, companheiro das atividades associativas, parabenizar o Ministro Augusto César, como já disse, grande parceiro do MPT, a Anjuli, a Graça, companheiras de lutas diárias, de resistência a todo o retrocesso que está sendo anunciando, ou melhor, que está se consolidando.
Quero dizer que fiquei muito satisfeita de ouvir em todas as falas a importância dos princípios e que esses princípios, sim, serão a salvaguarda dos direitos já consolidados na Constituição Federal e já assimilados pela classe trabalhadora, sobretudo no que diz respeito à dignidade da pessoa humana, à proteção; enfim, todos os direitos que foram falados já. Eu nem vou repetir, porque todos vocês falaram com muita propriedade a respeito e eu certamente não conseguiria fazê-lo melhor.
Quero também registrar aqui a excelência da fala da Francimary, que é também do Sinait, outro grande parceiro de luta.
Senador, quero também registrar a satisfação de estar participando da Comissão do Estatuto do Trabalho. Nós, da ANPT, de alguma forma estamos aqui tentando contribuir com esse Estatuto do Trabalho, como já se disse tantas vezes, mas é importante repetir, que é um importante marco de resistência a essa reforma trabalhista e a tudo que venha para realmente retirar direitos dos trabalhadores.
Faço também, de novo, o registro da brilhante e competente atuação dos assessores daqui, o Leandro, a Tânia, que vêm capitaneando os trabalhos com bastante efetividade.
Mas eu quero aproveitar este momento, esta fala, Senador, para trazer ao conhecimento de V. Exª e desta Comissão um fato que aconteceu no Rio Grande do Norte e vem acontecendo nos últimos dias. Houve o ajuizamento de uma ação civil pública contra o Grupo Guararapes - leia-se Lojas Riachuelo, que integram esse grupo -, em que uma Procuradora do Trabalho, Drª Ileana Neiva Mousinho, colega nossa, lotada no Rio Grande do Sul, séria, comprometida com os ideais do Ministério Público, com a defesa dos direitos sociais desde sempre, toda a sua trajetória comprova isso, vem sendo ofendida pessoalmente por representantes desse grupo e vem sofrendo, enfim, uma situação muito constrangedora lá no seu Estado.
O Ministério Público do Trabalho interveio na semana passada lá, por intermédio do nosso Procurador-Geral, Dr. Ronaldo Fleury. O nosso Presidente da ANPT, Dr. Angelo Fabiano Costa, também esteve lá, e ambos falaram com as autoridades locais, fizeram uma entrevista coletiva em que se esclareceu que essa ação foi produzida por um grupo de procuradores - quer dizer, não só por essa Procuradora, uma pessoa e profissional de muito valor, que também estava nesse grupo - e serviu, teve como finalidade, como pedido regularizar questões trabalhistas gravíssimas lá, como a das facções, que são pequenas empresas cuja criação é fomentada pelo grupo Guararapes. Essas empresas são criadas e vivem exclusivamente para produzir para esse grupo - para alguns outros também, mas, fundamentalmente, para esse grupo. Essas empresas são pequenas e não raro não conseguem se manter, porque até o preço dos produtos, tudo o que envolve a questão remuneratória e retributiva dessas empresas passa pela empresa, é decidido pelo grupo empresarial. E essas empresas não raro quebram e deixam muitos trabalhadores lá do sertão do Rio Grande do Norte em situação precária, em que não conseguem receber, minimamente, as verbas rescisórias, enfim, salários e tudo mais que o trabalhador tem que receber.
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Então, visando regularizar essa situação, foi ajuizada essa ação, mas, em razão disso, essa Procuradora e os colegas do Rio Grande do Norte vêm sofrendo uma retaliação muito forte.
Eu quero destacar ainda, porque acho que essa informação é muito importante, que essa ação já foi pensada com base na Lei 13.467. Então, nessa ação não se pede, por exemplo, que a empresa deixe de terceirizar, porque, nesse contexto, a terceirização está prevista. Mas a empresa pede, simplesmente, que esse grupo empresarial, que, como já disse, fomenta a criação de empresas para que elas contratem esses trabalhadores, se responsabilize, minimamente, por esses trabalhadores. Quantas vezes empresas menores quebram? Que se reconheça o vínculo empregatício com ele, porque, de fato, essas pessoas trabalham para esse grupo...
(Intervenção fora do microfone.)
A SRª ANA CLÁUDIA BANDEIRA MONTEIRO - Isso. É a subordinação estrutural, bem lembrada aqui pelo meu colega Cristiano, que foi tão bem falada aí. Ou, então, que, no mínimo, ela se responsabilize solidariamente pelos encargos trabalhistas relativos a esses trabalhadores.
Então, eu faço esse registro aqui, Senador, para mostrar que, dentro da fala de todos os que passaram por aqui - da Graça e da Júlia também -, é preciso resistir. A resistência do Ministério Público é no campo jurídico. E nós estamos fazendo dessa forma, da forma mais inteligente e criativa possível que os colegas fizeram lá no Rio Grande do Norte, mas a represália é forte. O setor empresarial está articulado para todas as fases, desde o começo aqui, desde antes do processo legislativo que resultou na Lei 13.467, durante o processo legislativo, que nem preciso repetir aqui porque todos sabemos como foi. E agora já, em vias de aplicação e de realmente fazer prevalecer o que foi falado aqui hoje,...
(Soa a campainha.)
A SRª ANA CLÁUDIA BANDEIRA MONTEIRO - ... que são os princípios maiores, nós não teremos facilidades. A represália continuará.
Mas, dentro do que foi falado aqui e na linha do que nós estamos trabalhando para construir um novo estatuto do trabalho que venha, realmente, sanar essa situação precarizante, eu deixo aqui essa experiência do Ministério Público do Trabalho como um parâmetro para que a gente, a partir daí, construa soluções efetivas que tragam realmente a necessária proteção para o trabalhador.
Então, é isso.
Obrigada. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem.
Essa foi a Srª Ana Cláudia Rodrigues Monteiro, Vice-Presidente da ANPT.
O Urbano tinha pedido a palavra. São cinco minutos para cada um.
O SR. FRANCISCO URBANO - Espero não usar todo o tempo.
Quero só aproveitar para, de novo, reafirmar a nossa gratidão, como trabalhador, pelo trabalho que você faz neste Senado, por mais uma trincheira que você organiza aqui dentro para unir forças, combater toda essa maldade que há neste País.
Mas eu queria dizer mais aqui o seguinte: de tudo que foi falado aqui, imagine no meio rural o quanto vai ser muitas vezes pior. Imagine as maldades que já existiam e agora, com o reforço ainda mais articulado com a legislação que permite tudo.
Mas eu não queria só dizer isso, eu queria dizer para os nossos Procuradores do Trabalho, para o Juiz, V. Exªs, com certeza, já ouviram falar no projeto Nilson Leitão. Isso tudo que está acontecendo é brincadeira. O que vem, o que está proposto é muito pior, muito pior.
Ele começa no primeiro artigo dizendo: "Revoga-se a legislação trabalhista rural". No segundo: "Não se aplica a CLT aos rurais". Num terceiro ou quarto diz: "Remuneração não significa necessariamente pagamento em dinheiro; pode ser alimento ou moradia".
O que faltou nesse projeto dele? Um desenho da corrente. Era o que acontecia no passado. O escravo tinha o lugar para dormir - amarrado - e uma cesta, uma marmita para comer. Só faltou desenhar isso. Imagine a previdência social que vai ter esse pessoal; qual o Direito Trabalhista que vai ter o setor rural com esse projeto.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Urbano, permita-me fazer um aparte, mas depois eu te dou o tempo de volta. É só um aparte.
O SR. FRANCISCO URBANO - Sim.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Por isso é importante que a gente tenha aqui um dia um debate somente sobre a questão do trabalhador rural. Acho que o seu alerta é importante para isso.
O SR. FRANCISCO URBANO - Era a parte final que eu queria sugerir.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - E já vou te dar mais um minuto, porque eu me meti no seu tempo.
O SR. FRANCISCO URBANO - Eu vou dizer uma coisa que vocês, do Judiciário, podem não gostar muito: eu não acredito em justiça feita pelo Judiciário. O sistema judiciário brasileiro é o pessoal mais repressor do Estado contra o povo, porque ele é a máquina repressora. Decisão dele você não discute, você cumpre.
Mas o que me deixa muito alegre aqui é que o eu tenho visto e ouvido dos procuradores do Trabalho e da maioria dos juízes do Trabalho que vêm aqui e nos deixam um alento muito grande, porque são cidadãos imbuídos de tentar ajudar a diminuir a maldade, a perversidade que esse projeto fez, dessa reforma que está sendo feita.
É como disse o nosso companheiro: não é porque são conservadores ou reacionários, e sempre foram a maioria, que sejam muito desqualificados do ponto de vista de formulação. O companheiro - e desculpe chamá-lo de companheiro, eu errei - disse que na legislação parece que não há lógica de intelectualidade. Não há mesmo.
O Presidente da Comissão... Imagine a postura do Presidente da Comissão. O Relator, infelizmente, é do Rio Grande do Norte. O avô dele, que já morreu e foi um excelente Parlamentar aqui, se estivesse vivo, estaria tremendo de ódio, pois era um homem conservador, mas um intelectual decente. A postura dele não merece nenhuma lógica de alguém que tenha alguma capacidade mental e intelectual, aquele relator. Não poderia sair nada pior do que isso aí. Só poderia sair daí...
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Só queria aproveitar e fazer este registro porque a gente finda esquecendo. Até mesmo na Contag, de vez em quando, a gente esquece de falar do tal Nísio Leitão. Esse projeto é muito draconiano. A gente tem de impedir isso e está lá quietinho, parado, porque o PSDB, pensando na eleição no ano que vem, disse: "Deixem isso aí. Parem. Não joguem para frente". Mas ele está pronto para ser colocado qualquer dia em votação.
Aqui há uma nova medida provisória, a MP 793, para aumentar a dificuldade do campo. Não só está dispensando 95% de todas as dívidas dos latifundiários, que as pessoas estão chamando de empresários. Não! São latifundiários excludentes, aqueles do agronegócio. Agronegócio é uma fantasia para não se falar mais do latifundiário criminoso que temos neste País.
(Soa a campainha.)
O SR. FRANCISCO URBANO - Bom, eu não poderia deixar de registrar isso, porque é muito... Eu sou camponês nordestino, daquele que aprendeu a viver, não teve escola, nem dava para ir à escola, mas a vida faz a gente aprender a viver. E é isso que eu tento fazer aqui, representando a nossa confederação, que, com muitas batalhas, com muitas lutas, conseguiu trazer legislação trabalhista, direito previdenciário...
Na Constituinte, nós conseguimos transcrever para a Constituição os princípios e os direitos dos trabalhadores rurais, que não existiam. Hoje, a gente vê isso tudo indo por água abaixo. Eu acredito que o povo brasileiro, a sociedade brasileira vai reagir não apenas em um processo eleitoral. Essa chamada democracia formal e burguesa faz isso mesmo. Nós acreditamos numa revolta mais forte da população para fazer valer e não deixar que se destrua nesse processo a Justiça do Trabalho, que é uma aliada fundamental nessa batalha. E nós temos mostrado aqui o posicionamento de V. Exªs.
Eu peço sempre que a Contag grave tudo isso para fazer debates, transmitindo o pronunciamento de V. Exªs para que os nossos sindicalistas, nossos advogados, nossa juventude rural consiga ouvir como vocês têm se posicionado em favor da classe trabalhadora. E esperamos que consigamos reverter esse retrocesso o mais rápido possível.
Desculpe pelo tempo. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Urbano. Parabéns pela contribuição.
Agora passamos a palavra ao Carlos Damarindo, que é representante do Sindicado dos Bancários de São Paulo. Aí, vamos às considerações finais dos nossos convidados, quando cada um terá mais cinco minutos.
O SR. CARLOS DAMARINDO - Bom dia, Senador Paim, a todos e a todas. É um prazer estar aqui novamente. O Sindicato dos Bancários é muito ativo. Nós temos uma demanda muito grande junto aos movimentos sociais, nas ruas, enfim.
Eu quero fazer duas colocações que considero importantes. A primeira é um repúdio ao Banco Santander, que vem com uma publicidade nefasta sobre a vermelhinha, que substitui a carteira de trabalho, que vem carimbada na propaganda a demissão com um novo modelo colocado, que é o próprio dono do golpe, a Fenaban, a Fiesp, as indústrias. Enfim, é um golpe premeditado, mandado, e já estão se antecipando. Uma categoria que sofreu... Infelizmente, todas as categorias aparecem com adoecimentos e tudo o mais.
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Com os bancários não é diferente. O adoecimento mental é gigantesco. Fizemos uma pesquisa recente, que ainda estamos concluindo. Não é uma pesquisa científica, mas é uma pesquisa que mostra que, infelizmente, homologam-se na base de São Paulo uma média de 11 mil a 13 mil trabalhadores por ano na categoria. Boa parte desses trabalhadores se tornam terceirizados, com condições precárias, que todo mundo sabe disso, e de um número de seis mil entrevistados aproximadamente, todos conhecem, reconhecem que há assédio moral, adoecimento, ou já trabalharam doentes e não podem se afastar pela opressão e pelo medo de perderem o emprego.
Queria registar essas duas coisas.
Outra coisa: um outro fato que vai atingir a categoria bancária, e acho que muitas outras categorias, é a questão da atividade de home office, de que se fala muito. Aí eu faço a pergunta e deixo o questionamento, porque há as NRs, há uma série de regulamentações que tratam da questão, a gente até falou muito da questão da violação do lar, do domicílio.
Imagine esse trabalhador... Alguns bancos já tem um laboratório - estou falando da categoria, que é uma das maiores - em que as pessoas trabalham dentro da sua casa. E se houver um acidente ali? E é muito do cotidiano, na categoria bancária, acidente no local de trabalho e tudo o mais. Como fica essa situação? Então, a legislação, esse golpe na reforma, na verdade, é uma deformação do Direito do Trabalho. Não é uma reforma; é retirada, sucateamento da relação de trabalho e da dignidade humana, como bem já explanaram aqui os palestrantes.
Eu queria deixar esse registro e reforçar a questão da publicidade, se há ou não alguma forma, porque existe um monte de Conar de qualquer publicidade que se faça... Se o movimento sindical hoje chegar na televisão, na rua, e fizer qualquer atividade de protesto contra banco, qualquer instituição, ele é reprimido pelos órgãos que regulam. Agora, fazer uma publicidade dessas contra o Estado, contra o cidadão, contra o trabalhador, tinha de haver uma forma... E aí eu deixo esse recado aqui para a audiência para que registremos. Temos de ser firmes contra esse tipo de ataque midiático que está sendo feito contra os trabalhadores.
Mais uma vez saúdo a todos e a todas. As explanações são fantásticas, da companheira da Inter, da Graça, grande amiga. Estamos juntos e vamos juntos, nos movimentos sociais, para as ruas, que é o único caminho que há. Precisamos de que este Congresso seja mudado completamente para o próximo ano. A resposta vai ser nas urnas e vai ser nas ruas, como está sendo feito.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Carlos Damarindo, do Sindicato dos Bancários de São Paulo, que deixa esse alerta à chamada propaganda enganosa, mentirosa para destruir a própria CLT na visão dos trabalhadores.
A reforma da previdência, então, vai na mesma linha.
(Soa a campainha.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Todas as TVs, eu diria, ou a maioria, pelo menos, propaganda paga direto, querendo enganar o trabalhador para que ele entenda que não ter direito à aposentadoria é bom; é mais ou menos isso. Que vai pagar, vai pagar, e não vai ter direito de se aposentar. A reforma trabalhista é abrir mão de seus direitos e achar que é bom.
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A assessoria da Mesa lembra que as notas taquigráficas das audiências públicas da Subcomissão, já que há muitos pedidos, ficam disponíveis na página da CDH no site do Senado Federal. O vídeo da audiência, na íntegra, fica disponível no YouTube e no canal do Senado, ok?
Então, vamos aqui.
Francimary Oliveira Michiles, Diretora do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho, Sinait, para suas considerações finais. São cinco minutos para cada convidado.
A SRª FRANCIMARY OLIVEIRA MICHILES - Senador, primeiramente, o Sinait se solidariza com os membros do Ministério Público do Trabalho nesse ataque que vêm sofrendo os procuradores. Esse ataque vem de forma imposta pelo próprio Governo Federal, porque está atacando o tripé da proteção do direito do trabalhador, que é a Justiça do Trabalho, o Ministério do Trabalho e a Auditoria Fiscal do Trabalho.
Justamente em função disso que nós, os Auditores Fiscais do Trabalho, gostaríamos de pedir o apoio de todos os trabalhadores brasileiros, para que nós possamos enfrentar essa luta tão difícil. Temos esperança de que o Estatuto, Senador, traga o resgate da implementação dos princípios constitucionais, principalmente o princípio da dignidade da pessoa humana. É isso. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem.
Agradecemos à Francimary Oliveira Michiles, Diretora do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho, pela contribuição belíssima que deu a este debate.
Desliguei isso aqui, porque me atrapalha muito. Chega de receber pedido de cópia desta audiência. O mérito é dos convidados. Todo mundo pedindo cópia.
Então, Francimay Oliveira Michiles, parabéns! (Palmas.)
Por favor, Dr. Cristiano Paixão, Procurador Regional do Trabalho da 10ª Região.
O SR. CRISTIANO PAIXÃO - Senador Paulo Paim, apenas para também reiterar o que já foi dito aqui, da grande oportunidade que é esse espaço de discussão.
O Brasil hoje enfrenta uma situação de termos poucos espaços livres para discussão, debate de pontos de vista, discussão sobre temas polêmicos. Nós temos uma mídia que tem um discurso único, e isso compromete a democracia.
A democracia é um lugar de conflito, no sentido do conflito organizado, do conflito regulado; ou seja, é um lugar em que visões conflitantes de mundo entram, digamos, em operação. O Brasil democrático se construiu assim, se construiu dessa forma. Quando temos um pensamento único, quando temos um pensamento, digamos, repetitivo, isso vai-se transformando numa espécie de verdade absoluta, de verdade que não é questionada.
E, nesse evento que a nossa Vice-Presidente lembrou, Drª Ana Cláudia, um evento que está ocorrendo no Rio Grande do Norte, uma situação gravíssima de violação inclusive de direitos dos trabalhadores profundamente precarizados, do interior do Rio Grande do Norte, o que nós vemos nesse caso? Nós vemos uma batalha midiática. O proprietário das lojas do grupo empresarial faz uma extensa entrevista na Folha de S.Paulo. Hoje há um enorme artigo na Folha de S.Paulo defendendo as suas ações.
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O setor está muito organizado de uma forma muito capilarizada: nas redes sociais, nos grupos de discussão no WhatsApp. Esses dados vão circulando de forma distorcida, de forma, digamos, a criar um certo pânico numa população, e isso vai se transformando numa espécie de verdade nesse mundo virtual.
Isso é algo que nós não podemos aceitar, porque o que nós estamos fazendo, o que os procuradores estão fazendo é a defesa do trabalho digno, é a defesa do trabalho, digamos assim, em condições mínimas de saúde, segurança e autonomia. Justamente os exemplos que eu utilizei aqui da indústria têxtil, esses exemplos que aconteceram tanto em São Paulo estão se repetindo no Rio Grande do Norte, com o apoio, com o estímulo explícito do grupo empresarial que é, digamos, o beneficiário desse trabalho.
E essa disputa não se dá apenas no mundo trabalhista; ela se dá nas redes sociais, ela se dá, digamos, nas formas, numa relação às vezes promíscua entre alguns políticos que apoiam a reforma e esses líderes empresariais. Então, esse discurso começa a dominar, de certo modo, a esfera pública. Nós temos de defender a esfera pública livre, temos de defender uma esfera pública democrática, uma esfera pública que possa repercutir todos os pontos de vista e todas as manifestações da população que constrói a sociedade brasileira.
Portanto, um estatuto do trabalho é também o estatuto da sociedade civil, é também o estatuto do Estado de direito. Então, que esse Estatuto do Trabalho reflita, na sua formulação futura, todas essas preocupações e todos esses compromissos do Brasil, inclusive internacionalmente, com os princípios da proteção do trabalho humano.
Obrigado, Senador. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dr. Cristiano Paixão, Procurador Regional do Trabalho da 10ª Região, parabéns pela sua contribuição!
Dr. Paulo da Cunha Boal, Diretor Legislativo da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra).
O SR. PAULO DA CUNHA BOAL - Agora há pouco, eu fui indagado ali fora, numa pequena entrevista, sobre o que significava quando eu disse que venderam algo que não podem entregar. Vou aproveitar esse tempinho para tentar esclarecer um pouco isso.
Boa parte da discussão se deu lastreada em aspectos práticos, e era até difícil de contradizer: "Ah, porque - sei lá - 60% dos empregos residem nas microempresas". Dava essa sensação, vendeu-se essa sensação de que a reforma ajudaria esses pequenos empregadores, quando é nítido, a leitura da legislação deixa claro que os grandes beneficiados serão os grandes conglomerados, principalmente as instituições financeiras, que, cada vez mais, se valem de trabalhos ou terceirizados, ou delegados, uma série de situações.
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Eu tenho citado, com certa frequência, uma forma de terceirização utilizada pelos bancos de uma engenhosidade impressionante, que é a transferência de boa parte da sua atividade para as agências lotéricas. Eles fazem praticamente tudo: você paga a conta, você saca e você é assaltado - é basicamente isso. Como o ladrão, eu presumo, não é desprovido de inteligência, ele opta: "Eu posso assaltar o banco ou eu posso assaltar a agência lotérica." Ele vai e assalta a agência lotérica. Então, o banco não apenas terceiriza a atividade, ele terceiriza o risco efetivo que envolve todo o seu trabalho.
Toda essa legislação, em algum momento... Alguns amigos empresários me perguntam e acreditam que essa legislação os privará de todas as dificuldades que enfrentavam: que não terão mais ações trabalhistas, que não precisarão mais pagar horas extras para o entregador ou mototaxista. Então, para eles, isso se transformou numa panaceia, e não vai acontecer. A tal da segurança jurídica, também tão propalada, vai demorar de cinco a dez anos para que a jurisprudência tenha uma noção mínima de como dar voz a essa legislação.
Eu acho que, mais desapontados do que os trabalhadores, nós vamos encontrar um grupo, uma gama de empresários, de pequenos empresários que foram ludibriados, tratados como boi de manada, para acompanhar o movimento, lastreado em informações completamente falsificadas, em resultados falsificados.
Eu brinco que eu não acredito em Papai Noel. Torço para que ele exista, torço para que, no final do ano, ele me dê uma Ferrari, mas isso não acontece. E me parece que a mesma coisa vai acontecer com essa legislação: todo mundo vai torcer para dar certo, os pequenos empresários vão torcer para dar certo, e, ao final, ela vai se transformar no que sempre têm se transformado as legislações brasileiras, uma forma de concentração de renda na mão de um pequeno grupo de empresários.
Agradeço novamente, Senador Paim, essa possibilidade que o senhor sempre abre para a Anamatra participar das audiências e poder ter um pouco de voz aqui no Congresso. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dr. Paulo da Cunha Boal, Diretor da Anamatra. Meus cumprimentos pela sua contribuição.
O Ministro Augusto César Leite de Carvalho teve de se retirar. E a Ministra Kátia Magalhães Arruda, do Tribunal Superior do Trabalho, também mandou justificar. Ela havia ligado para cá dizendo: "Olha, estou indo. Quero fazer parte, porque acho importante.", mas houve um problema na última hora, quando ela estava quase entrando no carro, e ela nos comunicou que fica para outro momento, mas que voltará. Então, vamos dar uma salva de palmas para a Ministra Kátia Magalhães Arruda, do Tribunal Superior do Trabalho. (Palmas.)
Vamos a Anjuli Tostes, representante da Intersindical - Central da Classe Trabalhadora.
Você foi a última da Mesa anterior. Agora inverte, e a Graça será a última.
A SRª ANJULI TOSTES - Senador Paim, queria encerrar também esse momento - pelo menos a nossa oportunidade de fala...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Deixa eu te atrapalhar agora, mas vou descontar seu tempo. Vou receber um livro aqui, só que quero receber com a foto aqui - livro de autoria dela.
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A SRª ANJULI TOSTES - Agradecendo mesmo essa iniciativa, eu acho que é o momento, sim, de nós pensarmos alto, porque nós vamos retomar o poder neste País, o poder é nosso - o poder é nosso. Nós somos a maioria, e é importante, sim, que nós tenhamos um projeto de país em mente e lutemos por ele, façamos o que for necessário para que ele se concretize.
Eu quero trazer aqui uma visão, na verdade, de um jurista, doutrinador, enfim, que é o Ronald Dworkin - que aliás é um liberal -, que enxerga os direitos como trunfos que a população tem. São trunfos que não podem ser retirados meramente por argumentos econômicos.
Ele fala também da força normativa dos princípios, e os princípios aqui, os princípios do Direito do Trabalho foram extremamente desrespeitados, foram violados. Não foi reconhecida nenhuma validade desses princípios por esses que aprovaram essa reforma. Se mesmo um liberal defende que esses direitos sejam respeitados, quanto mais nós que temos um projeto mais inclusivo, voltado para a inclusão daquelas pessoas que estão hoje na marginalidade. Essa marginalidade se agrava com essa reforma trabalhista que aconteceu.
É importante recuperar a força normativa desses princípios. A gente falou de alguns aqui: do princípio da dignidade da pessoa humana, falado várias vezes; do princípio da proteção; do princípio da irrenunciabilidade de direitos; do princípio da intangibilidade salarial; todos ameaçados por essa reforma e que nós precisamos reforçar nesse novo Estatuto.
Eu queria dizer também que, se em toda crise, a resposta for retirar direitos, daqui a pouco não nos resta mais nada. Precisamos lutar contra esse processo e lutar com todas as forças que nós tivermos. Isso passa também por repensar a nossa democracia, essa democracia de que eu falei aqui, em que, nesta Casa, 50 decidiram à revelia da opinião da quase totalidade da população, da quase totalidade daqueles que vieram participar das audiências públicas, Senador Paim, que o senhor convocou - era uníssono. Então, com essa participação fake nós não concordamos. Com essa democracia falsa, nós não concordamos.
Nós precisamos, sim... A resposta não vai ser só nas urnas. As urnas não estão dando tanto resultado - estamos vendo aí. Essa resposta precisa ser no aprofundamento da nossa democracia, dos instrumentos de democracia direta, rumo a uma democracia real e que, de fato, passe pelo empoderamento do povo. Porque aqui, infelizmente, o que nós temos hoje são prepostos dos superpoderosos, prepostos que agem no interesse de 0,1% da população - boa parte, Senador, com louváveis exceções. Quando não estão agindo como prepostos, como representantes desses interesses, estão agindo como representantes dos próprios interesses. Vários aqui são grandes empresários que ganharam com essa reforma trabalhista e que deveriam ter se declarados impedidos; assim como esses grandes devedores da Previdência que estão aqui votando, que vão votar, e que até agora não se declararam impedidos, que devem milhões em contribuições previdenciárias, que sonegam. Então, precisamos repensar esse modelo de democracia, sim, rumo a mais instrumentos de democracia direta, rumo ao empoderamento real do povo. É disso que nós precisamos.
Por fim, queria deixar também uma reflexão de que é necessário nós pensarmos também qual é o país que nós queremos. Toda essa discussão sobre reforma trabalhista, reforma da previdência, enfim, é a respeito de qual o país que nós queremos. Nós queremos um país que aumente a desigualdade social ainda mais?
(Soa a campainha.)
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A SRª ANJULI TOSTES - Nós vimos que esse movimento está acontecendo. A desigualdade desse 1% está aumentando cada vez mais. Então, é esse o País que nós queremos, em que essas pessoas e o resto da população também tenham que ficar encarcerados em suas próprias casas? As populações carentes não estão tendo direito a um mínimo de dignidade. Esse é o País que nós queremos? Esse não é o País que eu quero! Esse não é o País que eu quero para mim, não é o País que eu quero para os meus filhos, não é o País que eu quero para a nova geração.
É preciso lutar. É preciso que esse povo... Ele acaba sendo separado por tantas falsas respostas que são dadas, e a reforma trabalhista foi uma delas. Não colou, porque nós fizemos um movimento também de resistência e de disputa pela opinião pública. Não colou, assim como a reforma da previdência não colou para a população.
Mas é preciso que este País se una por um projeto que seja, de fato, de um país onde caibam todos e todas. Não podemos deixar ninguém para trás; não podemos deixar nenhum trabalhador, nenhuma trabalhadora para trás.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Drª Anjuli Tostes, representante aqui da Intersindical - Central da Classe Trabalhadora, que falou muito na linha de que precisamos de um projeto de Nação, mas de Nação mesmo. Há um revolucionário gaúcho que sempre dizia que Pátria somos todos, e não uma minoria, como hoje há neste País.
A SRª ANJULI TOSTES - E eu vou acrescentar aqui uma... Há Pátria livre, mas a gente fala também Mátria livre. É importante que esta Pátria também seja das mulheres. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, muito bem.
Se Pátria somos todos, somos todos: homens e mulheres, sem exclusão das mulheres ou das minorias, sejam elas quais forem. As ditas minorias da Mátria são maioria também.
A SRª ANJULI TOSTES - São maioria.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Passamos a palavra, agora, à Graça Costa, Secretária de Relações do Trabalho da Central Única dos Trabalhadores.
A SRª GRAÇA COSTA - Não vou cumprimentar ou nominar as pessoas, mas acho que todos os palestrantes aqui deram uma grande contribuição.
Eu estava cochichando com o Paim: se repetir aqui, toda segunda-feira, neste horário, de 9h às 13h, vai haver...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Uma tribuna livre dos movimentos sociais.
A SRª GRAÇA COSTA - ... essa construção. Eu acho que isso é muito importante.
Eu achei muito bacana a metodologia que está sendo utilizada aqui, porque é uma escuta, e é uma escuta longa, porque, pelo que o Senador me disse, só no próximo ano vai se começar a pensar em escrever esse projeto, esse Estatuto. Então, até lá, toda segunda-feira...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Começar a escrever nós já começamos...
A SRª GRAÇA COSTA - Eu sei, mas para dar...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - ... pelas audiências. Só para ajudar, no dia 1º de maio, a intenção é apresentar - há um grupo enorme que está trabalhando, em torno de 30 pessoas - a primeira versão, e ainda vamos deixar a sociedade debater. Para votar, só no novo Congresso eleito, em 2018, porque, com este aqui, não temos a mínima chance de aprovar nada decente - só questões indecentes. (Risos.)
A SRª GRAÇA COSTA - Então, confirmo que este é um espaço de esperança, é um espaço longo e um espaço democrático. Fazer audiência pública toda segunda-feira, durante vários meses, até formular uma proposta que contemple os nossos anseios é muito bacana, muito importante.
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Então, muita gente que está assistindo... Eu estava aqui dizendo para o Paim que as minhas irmãs aqui no grupo da família do WhatsApp estão dizendo: "Eu estou te vendo aqui. A gente está assistindo, a gente está participando." É tão bacana isso, gente, porque vai dando a dimensão que é necessária para esse processo, bem diferente do que aconteceu de janeiro ou de fevereiro até julho, quando foi feita a aprovação dessa lei aqui.
O ataque é muito forte. O que nós ouvimos do Carlos é que a categoria de bancários, que é uma categoria muito forte - uma das categorias mais bem conceituadas em termos não só de conquistas, mas de tratamento, de emprego, de condição de vida, melhor do que outras categorias -, tem um ataque tão frontal agora, porque essa questão da terceirização vem com tudo nessa categoria. Então, já há uma redução, e agora abriu PDV em tudo quanto é coisa, e mais toda essa ameaça de privatização de tudo o que é estatal, tudo o que é público.
É um desastre para nós, mas é um ataque muito grande à organização sindical, porque uma das categorias mais fortes que há no nosso Brasil, que tem negociação nacional, negociação coletiva nacional, essa lei ataca no coração dessa organização. Isso é muito forte.
Agora, o alerta que faz Urbano é muito propício aqui para nós, para todo o Brasil imaginar para onde nós estamos andando. E não é uma coisa de discurso, não é, Paim? Não é porque eu sou da CUT, estou falando... Não é. Está aí, o projeto está tramitando, tem nome, tem endereço e tem apoio, que a gente sabe que essa maioria que há aqui, se botar isso em votação, um projeto desse, vai voltar para a senzala. Vai voltar para a senzala, você trocar o seu trabalho por comida. Hoje, o Ministério Público e o Ministério do Trabalho vão lá nas propriedades e resgatam as pessoas que estão sendo tratadas dessa forma...
(Soa a campainha.)
A SRª GRAÇA COSTA - ... porque isso é trabalho escravo. É legalizar, é voltar mesmo para a escravidão. É muito sério o que nós estamos passando aqui.
Mas, Ana Cláudia, eu quero dizer que nós vamos trabalhar juntos na CUT. Os nossos sindicatos são muito fortes, a CUT é muito forte no Rio Grande do Norte. Nós vamos contribuir para fazer uma grande manifestação de apoio e de combate a essas ações que estão vindo contra nós.
E lembrar que, independentemente das coisas que nós temos de embate nosso com a Justiça, o Ministério Público etc., nessa nós estamos juntos. Nós estamos juntos, porque é necessário para nós, é necessário para o País que todas as forças positivas se juntem agora nesse período.
Por fim, Paim, quero dizer que a pobreza já voltou - aquela, das pessoas que a gente tinha tirado. É o único país do mundo que, nesse último período, saiu do mapa da fome e está de volta. E a ONU já declarou que, em cinco anos, nós, se continuarmos da forma que está, o Brasil vai ter um estado de miséria e de pobreza maior daquele em que estávamos em 2003.
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Então, é um alerta muito sério que está para nós. Precisamos de um país - rico do jeito que ele é - que produza e tenha distribuição de renda, para que o nosso povo, a nossa gente não precise passar por aquilo por que estamos passando neste momento.
Um abraço no coração. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem. Essa foi a Graça Costa, Secretária de Relações do Trabalho da Central Única dos Trabalhadores, uma das nossas centrais. Quantas centrais são mesmo? Você lembra?
A SRª GRAÇA COSTA - Já são nove.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - São nove centrais sindicais.
A SRª GRAÇA COSTA (Fora do microfone.) - São seis centralizadas.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Seis centralizadas.
Mas seguramente todas elas estão participando aqui de forma mais unitária possível contra a reforma da previdência e contra a reforma trabalhista.
Eu tinha recebido aqui, estava até procurando, um material, que eu achei interessante, que dizia: Presidente Temer, em um ano, o retrocesso de cem anos. Juscelino Kubitschek passou à história como o Presidente que, em cinco anos, fez o País progredir cinquenta. O atual Presidente consegue, em um ano, o retrocesso de quase cem anos. É por isso que temos de avançar na reforma trabalhista e também combater a reforma da previdência.
Eu nem vou falar de tudo que foi dito. Eu achei interessante, porque entraram temas aqui como o meio ambiente, que é o caso da Amazônia. Se não fosse um grande movimento mundial, ele não teria recuado. O caso da Amazônia foi um movimento em todo o mundo e no Brasil. Ele acabou recuando, agora parece que definitivamente.
É uma situação gravíssima pela qual estamos passando. Essa iniciativa de privatizar 57 setores - não, 54; 54, eu acho -, 57 ou 54 setores... A forma como está a saúde hoje, como está a segurança, como está a educação... É um terror.
A SRª GRAÇA COSTA (Fora do microfone.) - Os cortes do orçamento.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Os cortes do orçamento agora nas universidades, nos IFs...
A SRª GRAÇA COSTA (Fora do microfone.) - IFs.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - ... que são os centros de formação.
A SRª GRAÇA COSTA (Fora do microfone.) - Institutos federais.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Institutos federais, exatamente. Os institutos federais estiveram aqui. Estão todos apavorados com o que vai acontecer com os institutos federais neste País, tão importantes para a formação técnica da nossa gente.
Então, é um momento de muita reflexão, mas também, como aqui foi dito muito bem, de muita luta, de muita mobilização. Por isso, Graça, aquela sua ideia. A Graça trouxe como sugestão - e é claro que vamos debater - que não dá para visitar os Estados novamente, mas pelo, como ela disse, fazer encontros nas cinco regiões com palestrantes qualificados como vocês, que estão participando aqui ativamente, para debater reforma trabalhista e reforma previdenciária, pelo menos esses dois temas.
Vamos pegar as cinco regiões do País, fazer grandes eventos, debater e passar essas informações que estamos conseguindo aqui passar, mas ir ao Estado, à região, pelo menos, mobiliza. E que os Estados possam voltar daquele encontro regional para dizer o que está acontecendo, porque viram de viva voz e contato direto a opinião de pessoas preparadas, qualificadas, como foi a audiência de hoje e como estão sendo todas as audiências que aqui estamos está fazendo.
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Muito obrigado.
Segunda-feira de manhã tem mais.
Um abraço a todos. (Palmas.)
A Comissão deve dizer para mim, porque eles trabalham com a gente. Na segunda é sobre esse tema, mas há audiência quase todo dia aqui.
Está encerrada a audiência pública.
Vou chamar todos para uma foto coletiva.
(Iniciada às 9 horas e 10 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 32 minutos.)