06/11/2018 - 12ª - Subcomissão Temporária do Estatuto do Trabalho

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Declaro aberta a 12ª reunião da Subcomissão Temporária do Estatuto do Trabalho, da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal, 4ª Sessão Legislativa Ordinária, 55ª Legislatura.
A audiência pública de hoje será realizada, como todas as outras, nos termos do Requerimento nº 70, de 2018-CDH, de nossa autoria, para debater um ano da Lei nº 13.467, de 2017, reforma trabalhista e o Estatuto do Trabalho, a nova CLT.
Esta audiência pública será realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. Por isso, as pessoas que têm interesse em participar com comentários ou perguntas, podem fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania, link www.senado.leg.br/ecidadania, e do Alô Senado, através do número 0800612211.
Antes de iniciar os trabalhos, quero informar a todos que, em função da relevância e qualidade dos debates realizados nas audiências públicas desta Subcomissão, as palestras serão organizadas para publicação ao final de cada semestre, com base nas notas produzidas pelo serviço de taquigrafia da Casa, que, a partir de já, ficam solicitadas, conforme encaminhamento aprovado em reuniões anteriores.
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Convidados para hoje, para este debate tão importante:
Paulo Joarês Vieira, Procurador Regional do Trabalho e Coordenador Nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho (Conafret), do Ministério Público do Trabalho, e representante da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT).
Seja bem-vindo.
Marilane Oliveira Teixeira, Pesquisadora do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho - Cesit/Unicamp;
Bem-vinda.
Guilherme Guimarães Feliciano. Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra);
Bem-vindo.
Alex Myller, representante do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait);
Por fim, Moacyr Roberto Tesch Auersvald, representante da Nova Central Sindical dos Trabalhadores e também com certeza de outras centrais e confederações que fazem parte do fórum das confederações.
Queria, neste momento, permitam-me todos, fazer uma pequena homenagem de improviso.
O Moacyr, pessoal, durante toda a última campanha ao Senado, acampou no Rio Grande do Sul, ele e mais outros companheiros que foram com ele. Dedicou-se e muitos se dedicaram à distância ou presentes.
O Moacyr viajou todo o Estado visitando cidades e falando do nosso trabalho aqui. Ele é testemunha, como vocês são, do nosso trabalho no Senado.
É uma homenagem a você, Moacyr, sincera e muito simples, muito distante daquilo que mereceria. Você, sem sombra de dúvida, representou o movimento social organizado do País. Você dava relatos, por onde passava, do nosso trabalho aqui no Senado da República.
Ele teve um filho que sofreu uma operação, deslocou-se do Estado, foi ao hospital no Paraná para vê-lo, e o filho estava bem. Eu lembro que ele me disse que havia falado com o filho, e ele disse: "Volta, volta". E ele voltou para o Rio Grande do Sul para fazer o trabalho.
É por isso, Moacyr, que quero lhe dar um abraço, quero que me dê um abraço, e dar uma grande salva de palmas por todos os lutadores como você, que aqui os representa. (Palmas.)
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Vamos ao nosso tema.
Eu vou de imediato... Eu me atrasei, mas, depois, eu vou comentando, juntamente com os próprios convidados, esse debate tão importante sobre esse um ano da dita reforma trabalhista encaminhada pelo Presidente Temer, debate este que as senhoras e os senhores, durante todo esse ano, fizeram, construindo, eu diria, o novo Estatuto do Trabalho.
Preocupa-nos muito - e espero que não seja verdade - essa história de outra CLT ainda, que pode ser pior do que essa. Fala-se de uma CLT verde e amarela onde estaria contemplado somente o tema salário por hora, ou seja, praticamente nós estaríamos, então, se isso se consolidar, abrindo mão de todos os direitos.
Eu cheguei a dar uma entrevista hoje pela manhã, quando perguntaram sobre esta audiência, e disse que o nosso trabalho aqui continuará o mesmo, que não vamos jogar a toalha, que queremos a nova CLT, que queremos o novo Estatuto do Trabalho que estamos construindo juntos. Depois, a correlação de forças do ano que vem é que vai dizer para onde vamos. Porém, a preocupação, claro, é grande sobre essa realidade e sobre a situação por que passa o País em matéria de direitos, seja no mundo do trabalho, seja nos direitos humanos, seja nas liberdades.
Este debate é fundamental, porque nós já dizíamos que, se ficasse como está, baseado na lei que foi aprovada contra a vontade de todos nós, estaríamos vivendo momentos muito difíceis e que não se iria gerar emprego coisa nenhuma, que só haveria precarização. E, de fato, depois de um ano, é isso que a gente nota. Mas é claro que serão vocês, aqui, a aprofundar, mas a preocupação aumenta quando se diz que pode piorar. Eu até me lembro daquela frase do Ulysses Guimarães - é dele, não é minha: "Quando tu pensares que está ruim, prepara-te, porque no ano que vem pode ser pior".
Estou, de fato, muito, muito preocupado. O resultado eleitoral do próprio Congresso também mostra que teremos um Congresso mais conservador do que este cujo mandato se encerra agora no final de ano. Mas, enfim, nós faremos aqui uma análise da situação. Os senhores, naturalmente, terão toda a liberdade para falar.
A pedido até do sistema de comunicação da Casa, nesses debates, pela importância deste espaço, que é um espaço democrático, um espaço onde se fala de tudo que a gente imagina de bom para o nosso povo, nós temos estabelecido aqui, digamos - e não vou usar o termo que outros usam -, não partidarizar o debate. Não partidarizar é uma coisa; agora, defender politicamente as causas nós o faremos com a maior tranquilidade.
Ninguém vai fazer, claro, de qualquer comissão a comissão do seu partido, até porque nós temos uma visão republicana. Entendemos que nós pensamos sempre em governar para todos, seja aqui nesta Comissão, seja na Presidência da Câmara, na Presidência do Senado e na Presidência da República, pensando assim nos três Poderes. Nós devemos ter um olhar para todos, independentemente das divergências ideológicas, enfim, e da posição que cada um tenha. Uma pequena abertura e vamos lá.
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Paulo Joarês Vieira é Procurador Regional do Trabalho, Coordenador Nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho (Conafret) do Ministério Público do Trabalho, representante da Associação Nacional do Trabalhadores. Nós fizemos um sorteio democrático, e você vai ser o primeiro - sorteio democrático. Essa é boa! (Risos.)
Até eu olhei para mim.
O SR. ALEX MYLLER - Começamos com sorte.
O SR. PAULO JOARÊS VIEIRA - Bom dia a todos. Quero inicialmente agradecer o convite para participar desta audiência pública; cumprimentar os colegas de Mesa na pessoa do Senador Paim, a quem também cumprimento pela reeleição ao cargo de Senador pelo nosso Estado do Rio Grande do Sul. Faço votos que o próximo mandato seja tão produtivo e tão combativo quanto foi o atual na defesa do direito dos trabalhadores.
O tema que nos foi proposto aqui hoje para discutir é o primeiro ano da reforma trabalhista e o Estatuto do Trabalho. Naturalmente, um ano não é um período tão longo para que se possa ter todos os efeitos da reforma já medidos e já constatados, mas, ao mesmo tempo - embora, claro, muitas definições virão com o passar dos próximos anos -, já é possível perceber os primeiros efeitos e verificar se aquelas questões que foram anunciadas como os objetivos da reforma trabalhista vêm se realizando de alguma maneira, em alguma medida.
Um dos itens que mais foi anunciado como sendo o objetivo da reforma trabalhista foi assegurar segurança jurídica nas relações de trabalho, e agora a gente frequentemente escuta, principalmente na imprensa, que se alcançou a segurança jurídica através da redução do número de processos trabalhistas. Mas será que essa conclusão é correta? Será que essa relação entre segurança jurídica e redução do número de processos é verdadeira? Será que é isso mesmo?
Quando a gente fala em segurança jurídica, o primeiro conceito que vem, a primeira abordagem que se faz é pela garantia constitucional de que a lei não prejudicará o ato jurídico perfeito, a coisa julgada e o direito adquirido. Bom, essa é uma garantia constitucional que tem por objetivo, obviamente, evitar efeitos retroativos da lei, assegurar a estabilidade jurídica do cidadão naqueles pontos em que ela está consolidada.
Obviamente não é desse aspecto que se fala, não é desse sentido de segurança jurídica que se fala e que se falou em relação à reforma. Essa expressão é abordada com vários sentidos. O sentido que nos parece que a reforma prometia e que se busca hoje avaliar é o sentido da certeza do direito, aquele sentido em que o cidadão, a empresa, o trabalhador esteja seguro de qual é o sentido da norma jurídica, de que ele está fazendo a coisa certa, do que é lícito e do que é ilícito nas relações de trabalho, nas relações mantidas entre o patrão e o empregador.
Quanto a esse sentido, eu não tenho dúvida de que a reforma trabalhista é um fracasso rotundo. E digo isso por quê? Porque nós temos uma grande insegurança quanto à aplicação de várias normas da reforma trabalhista.
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Não é uma ou outra: em grande parte das normas editadas, reina a insegurança quanto ao seu alcance e seu sentido.
Isso é claramente marcado, por exemplo, pelo número de ações de inconstitucionalidade que tramitam no Supremo. O próprio Governo, em verdade, reconheceu a insegurança jurídica gerada pela reforma ao editar a Medida Provisória 808, que pretendia, em alguns pontos, definir algumas dúvidas. Essa medida provisória, como todos sabemos, caducou, não chegou a ser votada, portanto não sanou nada.
Vejam que, no sentido da segurança jurídica, a nossa CLT antiga oferecia mais segurança jurídica. Por quê? Pela simples razão de que é uma norma que está há bastante tempo sendo analisada, sendo interpretada e já com a sua interpretação consolidada nos tribunais. Então, contraditoriamente a reforma, nesse sentido, traz mais insegurança do que segurança.
E essa relação com a redução do número de ações trabalhistas? Qual é o sentido que ela faz? Na verdade, não faz sentido algum, se nós formos pensar em termos lógicos, porque essa redução das ações não decorre de uma compreensão, de uma segurança que as partes têm quanto ao direito, de um cumprimento mais exato da lei. Não, pelo contrário, ela não é fruto do cumprimento da lei; ela é fruto, sim, do obstáculo do acesso à Justiça. Essa redução dos processos decorre exclusivamente das limitações que foram impostas pela reforma trabalhista para o acesso à Justiça, especialmente dos trabalhadores mais pobres. Esse é um ponto que é importante a gente destacar, porque cerca de 70% dos trabalhadores brasileiros recebem menos de dois salários mínimos e estão abrangidos naquela situação de gratuidade da Justiça, que ficou extremamente limitada.
O que aconteceu com a redução do número de processos? Não é que aumentou a segurança jurídica do empregador, ela apenas reduziu o risco oferecido ao empregador que descumprir a lei. Essa é uma coisa muito diferente. Ele não está mais seguro quanto ao objeto da lei, mas está mais seguro de que, se ele descumprir a lei, intencionalmente ou não, é menor o risco de que ele venha a responder na Justiça pela irregularidade cometida.
Isso beneficia quem? Basicamente os maus empregadores, porque nós temos também que reconhecer que grande parte, a maioria dos empregadores cumprem a lei e buscam cumprir a lei, mas nós temos um número, que não é pequeno, de empregadores que, deliberadamente ou não, descumprem a lei sistematicamente.
Então, um dos grandes sucessos apontados na reforma trabalhista na abordagem que se costuma fazer de que há redução do número de processos, na verdade, é falacioso, de um lado, porque ele decorre de uma restrição ao exercício do direito do cidadão e, de outro, porque não é fruto da segurança jurídica, como se diz.
Cabe lembrar que o Supremo iniciou o julgamento da ação de inconstitucionalidade sobre o acesso à Justiça que foi suspenso por um pedido de vista. E resta-nos ficar na esperança de que o Supremo tenha a sensibilidade de considerar inconstitucionais aquelas normas.
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Outro ponto que foi colocado como objetivo da reforma foi a geração de empregos e a redução da informalidade.
Bom, nessa semana mesmo, o IBGE divulgou dados da pesquisa, da chamada PNAD Contínua, apontando que o Brasil, no último ano, exatamente no período de vigência da reforma, perdeu 327 mil vagas com carteira assinada no setor privado - e isso faz uma diferenciação em relação aos dados do Caged. E, no mesmo período, o setor privado teve um aumento de 5,5% de emprego sem carteira, ou seja, 601 mil empregados a mais sem registro.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Sem registro?
O SR. PAULO JOARÊS VIEIRA - Sem registro. Exato.
E também os dados do IBGE apontam que a informalidade bateu recorde no País. Nunca foi tão elevado o número de trabalhadores informais no Brasil quanto neste momento.
Isso tem um peso e uma gravidade...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eu fiz esse comentário aqui porque se dizia que, com a reforma, não haveria todos os direitos, seriam alguns direitos a menos, mas todos com carteira e documentação formal, mas, na verdade, é informalidade total.
O SR. PAULO JOARÊS VIEIRA - Ampliação não só da informalidade direta, como também de fenômenos como o da pejotização. Também os dados apontam uma ampliação da pejotização, em todo esse período.
Esse é um dado importante, é um dado grave para o mercado de trabalho, porque a relação de emprego é a chave de acesso a todo o sistema de proteção social. Todos os benefícios sociais concedidos ao trabalhador estão vinculados à relação de emprego.
Então, quando você leva esse contingente todo de trabalhadores para a informalidade, você está também retirando deles a possibilidade de acesso aos direitos sociais garantidos.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Inclusive o de se aposentar.
O SR. PAULO JOARÊS VIEIRA - Inclusive o de se aposentar. E não apenas esse, o vale-transporte inclusive, por exemplo, que só é concedido aos empregados.
Uma pesquisa que foi feita recentemente, comparando os custos de transporte entre cidades do mundo, apontou que, no Rio de Janeiro - apenas por exemplo -, o transporte representa cerca de 10% da renda média do trabalhador na cidade do Rio de Janeiro.
Então, o trabalhador informal, só nesse detalhe do transporte, já perde 10% da sua renda, por não ter acesso ao vale-transporte.
E isso também repercute não apenas para o trabalhador, o que já seria grave por si; isso repercute no próprio crescimento econômico. São vários os estudos de economistas que mostram que o número de registros formais dá sustentação para o crescimento econômico, porque a pessoa tem previsibilidade de renda, tem acesso ao crédito, enfim, todas essas circunstâncias.
Então, a gente vê que a pequena redução nos índices de desemprego que é anunciada vem alimentada pelo aumento do trabalho informal e pelo aumento de vagas precarizadas, como as de intermitentes, que são lá trinta e poucos mil, nesse período, e não pelo crescimento das vagas de trabalho protegidas, não pelo crescimento do empregado registrado.
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Rapidamente, alguns outros pontos, Senador, porque eu já vi que o tempo já está...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Não, não. São dez minutos, com mais cinco, para cada um, com uma tolerância que a gente vai adequando.
O SR. PAULO JOARÊS VIEIRA - Beleza.
Na questão da terceirização, por exemplo: anunciou-se que geraria empregos, modernização da economia, crescimento econômico...
A gente já viu aqui, pelos dados, que não houve essa geração de empregos. Pelo contrário, a gente presenciou notícias, as maiores, como a da empresa Latam, que demitiu mais de mil empregados, para terceirizar; um hospital em Porto Alegre demitiu cerca de 400 trabalhadores, para terceirizar as atividades...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Escolas, no Rio de Janeiro...
O SR. PAULO JOARÊS VIEIRA - Escolas, no Rio de Janeiro, com pejotização...
Então, esse aumento de emprego previsto decididamente não se realizou.
E, durante a tramitação da reforma, também sempre se disse uma coisa que é quase difícil de acreditar, que a terceirização é boa para o trabalhador. Isso era dito já há muitos anos e muitos anos numas cartilhas da Fiesp - constava, inclusive, no site deles. Foi repetido. O Supremo, no julgamento da terceirização, repetiu essa afirmação de que a terceirização é boa para o trabalhador.
Com todo o respeito a todos que afirmam isso, isso é totalmente fora da realidade, por todos os dados que a gente conhece dos prejuízos gerados ao trabalhador.
Um tema que eu gostaria de mencionar rapidamente também é sobre a questão do trabalho por aplicativos, que não se resume só às atividades de transporte, embora sejam a face mais visível desse fenômeno.
Isso é algo que está se espalhando no mercado de trabalho, em várias atividades, e são trabalhadores que estão totalmente excluídos do regime de proteção social. E, aí, é previdência, é saúde, é renda com previsibilidade, o próprio acesso ao crédito, e a gente não vê uma discussão, no nosso cenário trabalhista, no Congresso Nacional, para regulamentar essas atividades, para trazê-las para o sistema de proteção.
Esse é um espaço que eu acho que é bastante interessante para se trabalhar no Estatuto: a inclusão dos trabalhadores que estão hoje na informalidade nessas novas modalidades. E, no nosso entendimento, inclusive, eles são realmente empregados, na maioria das vezes, porque eles têm uma subordinação eletrônica que é muito acentuada.
O trabalho intermitente atraiu cerca de 35 mil vagas, pelos dados que eu vi, mas vejam que, em termos de mercado de trabalho, não é um volume grande. Por quê? Porque é um modelo tão ruim, tão confuso, tão inseguro, que eu acho que ele, de um lado, não atraiu as empresas e, de outro, nem mesmo o trabalhador que está desempregado. Vejam: um posto de trabalho que não oferece renda... Qualquer pessoa que busca um emprego, busca um trabalho, busca renda. Se para o intermitente não é segura renda nenhuma, é renda zero assegurada, obviamente não é atraente para ninguém.
Essas 35 mil vagas já são substituição de vagas protegidas por vagas precárias. Isso a gente também não pode ignorar. É um número que não é elevado no mercado de trabalho, mas é um impacto já de desproteção.
Sobre a questão dos sindicatos e do negociado sobre o legislado, um rápido comentário também, Senador: a promessa era a de que...
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO JOARÊS VIEIRA - ... as alterações proporcionariam a ampliação da negociação coletiva, um entendimento direto entre patrões e empregados.
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Dentre todas as normas que se foram, retirou-se parte do financiamento sindical sem criar uma via alternativa. Enfraqueceu-se a representação sindical dos trabalhadores, praticamente inviabilizando a manutenção de grande parte dos serviços prestados pelos sindicatos e gerando um desequilíbrio imenso na relação com as entidades patronais. Porque uma coisa que a gente tem que deixar clara é a seguinte: as fontes de financiamentos das entidades patronais em grande parte foram mantidas, boa parte das entidades patronais são financiadas por parcelas do Sistema S, arrecadação do Sistema S; e, trinta dias depois da reforma trabalhista, o Governo inclusive editou um decreto para repassar, fazer o repasse, formalizar o repasse para as entidades patronais da agricultura e pecuária também do Sistema S.
Então, esse tratamento desequilibrado prejudica muito o funcionamento do sistema. Com isso, gerou-se, na verdade, uma redução de 45% no número de convenções coletivas e de 35% nos acordos coletivos, ou seja, ao invés de ampliar a negociação coletiva, ela foi reduzida através da reforma.
O que a gente entende que se deveria fazer nessa questão é uma reforma ampla do sistema sindical, não apenas restringindo o financiamento das entidades dos trabalhadores, mas reformar o sistema constitucional que é incongruente, inconsistente e realmente não observa as recomendações da OIT. Deveria haver uma discussão ampla nesse sentido.
Bom, encerrando então aqui, Senador, eu diria que, nesse um ano de reforma, a gente verifica que a reforma trabalhista não alcançou os resultados que justificavam a sua aprovação, segundo seus defensores; não promoveu o crescimento econômico ou a geração de emprego e se limitou a retirar direitos dos trabalhadores e desestruturar o movimento sindical, na verdade.
Nesse cenário de aumento da informalidade, é importante o ambiente proporcionado pelo Estatuto do Trabalho para que se discutam propostas que viabilizem a inclusão dos trabalhadores no sistema de proteção - todos os que estão na informalidade, os trabalhadores por aplicativos, nessas novas formas de contratação - e que também se discutam meios de proteção ao trabalho diante do avanço da inteligência artificial. Esse é um aspecto que impacta fortemente o mercado de trabalho e cada vez mais vai impactá-lo. Enfim, que se pensem as relações de trabalho também sob o viés de proteção aos trabalhadores, não apenas sob o viés da redução dos custos da mão de obra.
Vejam que, por exemplo, segurança jurídica não é um desejo ou um direito apenas dos empregadores, é também dos trabalhadores. Os trabalhadores devem ter a segurança jurídica de que aquilo que a lei lhes dá como direito e as obrigações que são definidas para serem cumpridas em seu favor o sejam e que, se não o forem, ele possa buscar a sua reparação judicial.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Procurador Paulo Joarês Vieira, Procurador Regional do Trabalho e Coordenador Nacional de Combate às Fraudes na Relação de Trabalho (Conafret) do Ministério Público do Trabalho e representante da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT).
Só um dado que eu acabei recebendo hoje de que a estrutura sindical, a força dos sindicatos com essa reforma caiu 80%, porque eles não têm como se manter; estão vendendo o prédio, vendendo os carros, demitindo os funcionários.
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Aí falam em livre negociação; como é que você vai ter livre negociação? Eu falo isso com a maior tranquilidade. Eu dizia hoje para os dirigentes, ao Moacyr que aqui está, que eu nunca entrei - e digo aqui de coração - com essa bobagem de acabar com o imposto sindical. Eu digo isso porque eu defendo essa tese - o Moacyr também defende - há mais de quarenta anos. "Ah, tem que acabar, tem que acabar." Eu digo, pessoal, parem de falar nisso, vamos falar nas causas do povo, dos trabalhadores. Ficar nessa de...
Como é que os empresários não falam em abrir mão do Sistema S? Parece que só nós queremos abrir mão da única contribuição que nós temos, que garante de fato a estrutura sindical. Mas, infelizmente, está aí o resultado agora, não é? Muita gente está mordendo a língua, e todos arrependidos com essa tese de acabar com a contribuição sindical.
Qual é o empresário que abre mão de um direito de ter uma estrutura mínima para tocar a sua organização política? As Fiergs, Fiesp, CNI da vida, enfim... Eu nunca ouvi dizer. E nunca vi ninguém também agindo para eles perderem esse direito.
Eu falo quase como um desabafo. Eu estava no Sindicato dos Metalúrgicos de Canoas e nunca deixei que esse debate começasse lá. Isso 36 anos atrás, mas já havia essa ideia de acabar, de acabar, de acabar. Agora está aí o resultado.
Vamos lá.
Passo a palavra para a pesquisadora do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit/Unicamp), Dra. Marilane Oliveira Teixeira.
A SRª MARILANE OLIVEIRA TEIXEIRA - Bom dia a todas, bom dia a todos. Cumprimento especialmente o Senador, também pela reeleição. Recebemos a notícia da sua reeleição com muita alegria e com muita esperança, porque é nossa voz no Senado, para continuar, mesmo num período de tantos retrocessos e de uma conjuntura complexa e difícil para o futuro. Mas saber que podemos contar com o Senador aqui é uma grande esperança, não é? E também nos fortalece na luta e no enfrentamento que vamos precisar fazer dentro desta Casa, mas também nas ruas, como sempre fizemos e fizemos muito bem.
Eu vou apresentar aqui alguns resultados a partir de um balanço desse primeiro ano da implementação da reforma. Concordo com essa avaliação de que de fato ainda é muito cedo para, vamos dizer, se consolidar um balanço da reforma, porque, em vários aspectos, não só em relação às controvérsias jurídicas, nos parece que o pacote da reforma trabalhista foi um pouco maior do que de fato os empresários estavam preparados para recebê-lo. Então, alguns não sabem muito bem como lidar com vários aspectos dela; outros, de fato, não implementam, porque não têm nenhuma segurança jurídica em relação principalmente às novas formas de contratação, e, em parte também, talvez pelo discurso de que a reforma viria justamente para flexibilizar e, portanto, para facilitar a retomada do emprego e da atividade econômica, mas muito pelo contrário; e pode ser que, talvez, num contexto de crescimento econômico, a reforma de fato se viabilize. Então, esse também é um processo que nós estamos estudando e acompanhando o comportamento. Embora a gente lá no Cesit, no âmbito da rede da Remir, esteja fazendo um esforço grande de tentar avaliar a reforma sob todos os aspectos, aqui eu vou me concentrar mais nessa área econômica do trabalho.
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Uma das primeiras sinalizações era a de que a reforma iria permitir que se retomasse a atividade econômica, os investimentos retornariam - os investimentos produtivos não só do setor nacional dos setores privados, mas também os investimentos externos, estrangeiros -, e com isso a retomada dos empregos, principalmente dos empregos formais, dos empregos de proteção social. De fato - a gente ainda está fechando o ano de 2018 -, as sinalizações são bem pessimistas. Nós tivemos, no ano passado, ainda em 2017, uma leve recuperação da atividade econômica, depois de dois anos seguidos de queda, mas uma recuperação que foi em torno de 1%, o que neste ano deve se repetir, talvez um pouco mais. E a recuperação do ano passado foi basicamente sustentada pelo agronegócio. Neste ano, ela também tem se sustentado basicamente por conta do agronegócio - porque a indústria continua patinando - e, do ponto de vista da dinâmica interna, pelo consumo interno das famílias. Isso eu quero retomar depois, no final, para se ver como isso é uma questão importante.
Os investimentos continuam nos mesmos patamares de 2014, não se recuperaram mais. E, evidentemente, o pouco de crescimento que pode ocorrer ainda em 2018 vai se dar exatamente pelo consumo das famílias, na medida em que os investimentos públicos estão completamente congelados, estão em queda por conta justamente da Emenda Constitucional 95.
Então, a nossa tese é a de que não existe nenhuma possibilidade de se recuperar o nível de atividade econômica do emprego se não houver políticas públicas, se não houver um processo de indução do desenvolvimento econômico partindo de iniciativas do Estado. E, portanto, o cenário, nesse sentido, é um cenário bastante sombrio, não só para o período que passa, mas também para o período que se avizinha.
Aqui são os dados gerais. Nós estamos hoje com um recorde da população não economicamente ativa, que é o que chamamos da população fora da força de trabalho: quase 65 milhões; ou seja, nós temos 65 milhões de pessoas no Brasil, hoje, que poderiam estar no mercado de trabalho e não estão - e dois terços disso são mulheres.
Parte da redução do desemprego nesse último ano, nesse último período, se deve porque uma parcela se incorpora na informalidade ou no trabalho precário, mas também porque uma parcela simplesmente desiste de procurar emprego, que é o caso da população não economicamente ativa.
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Nós temos uma população ocupada no Brasil, hoje, em torno de 90 milhões. Desses 90 milhões, 36% estão concentrados no emprego com registro, e 37,4% estão justamente entre os por conta própria e os sem registro, que é aquilo que nós também já estávamos comentando na Mesa anterior.
Esse é o comportamento da população desocupada. Então, é uma série histórica, de 2012 para cá. E ela analisa... O que é importante identificar no comportamento gráfico? É que há uma linha ascendente, ou seja, de 2012 até a metade de 2018... Esses são os dados da PNAD trimestral, os últimos dados da PNAD trimestral são para o segundo trimestre de 2018. A que saiu recentemente foi a PNAD mensal móvel. É um comportamento mesmo... Ela teve uma pequena inflexão lá no final de 2017, mas justamente em 2018 ela volta ao pico ali no começo de 2018. Então, a população desocupada hoje está em torno de quase 13 milhões. Ela deu uma pequena reduzida nos últimos três meses, mas foi por conta de que uma parte saiu da população economicamente ativa e foi compor aquela população fora da força de trabalho, de 65 milhões, e uma parte porque encontrou emprego. Mas onde? No emprego informal e no trabalho por conta própria.
Esse é o dado da população que a gente chama de subutilizada, é a taxa de subutilização. Ela é a soma de todas as pessoas que trabalham menos de 40 horas por semana, mas gostariam de trabalhar mais - então, aí é possível identificar já a presença dessas contratações atípicas, como trabalho intermitente, parcial etc. -, com uma força de trabalho que a gente chama de potencial, porque são as pessoas que gostariam de trabalhar, mas, na semana da pesquisa, responderam que não estavam disponíveis para trabalhar ou não tinham condições, muitas vezes por problema de deslocamento, de transporte, não têm recurso sequer para buscar emprego, e soma o desemprego aberto. Isso totaliza 27 milhões de pessoas. Esse é um dado recorde, sempre considerando que a maior parte dessas condições estão mais presentes entre as mulheres. No caso das mulheres negras, dois terços das mulheres negras compõem a população que a gente chama de subutilizada.
A taxa de informalidade. A taxa de informalidade, de fato, é recorde. Este é o comportamento da taxa de informalidade: nos últimos cinco anos, de 2012 a 2018, ela cresce. Aqui ela está expressa por sexo e por raça: os dois primeiros lá de cima são justamente onde está concentrada a população que está em condições mais precárias, que são os homens negros e as mulheres negras, em que a taxa de informalidade é maior. E a taxa também é ascendente. Ela teve uma pequena queda no início de 2018, mas logo em seguida já se recupera e, no segundo trimestre de 2018, volta a crescer. É justamente isto: o emprego que se gerou neste ano é um emprego sem carteira e é um emprego de trabalho por conta própria, exatamente isso. Esse é um dado mais geral.
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E aqui nos interessa olhar a distribuição dos ocupados, o que são os 90 milhões de pessoas ocupadas. Então, os assalariados com registro são 36 milhões, mas os sem registro são 12%; desculpe, o outro é 36%, são 12%. Na verdade, dá um pouco mais de 30 milhões. O conta própria é 25,3%; o empregador, em torno de 4,7%; depois, vem funcionário público; o emprego doméstico corresponde a quase 7%; e o trabalhador familiar auxiliar, um pouco mais de 2%.
Essa é a condição da contribuição para a previdência. Se nós pegarmos, por exemplo, o conta própria, apenas 31% do conta própria contribuem para a previdência, ou seja, 70% daqueles que estão na condição de conta própria, o que corresponde a 25% da população ocupada, não contribuem para a previdência. Trabalhadora doméstica sem carteira: apenas 15% contribuem para a previdência, ou seja, 85% não contribuem para a previdência. Até o empregador que está em torno de 71%... Claro que, em empregador, a gente também tem o MEI, tem o PJ, mas 30% não contribuem para a previdência; e o empregado do setor privado sem registro, também 85% não contribuem com a previdência.
Olhando agora só o mercado formal, o que aconteceu no mercado formal, dados do Caged de novembro, quando entrou em vigor a reforma trabalhista, até setembro, que é o último dado divulgado pelo Caged. Aquela ideia de que a reforma ajudaria com as novas formas de contratação a estabilizar o emprego é tudo uma falácia. A rotatividade segue gigantesca. Quer dizer, num período de oito, nove, dez meses, nós tivemos uma movimentação do mercado de trabalho de 27 milhões de pessoas, ou seja, foram admitidos 13 milhões e desligados mais 13 milhões para gerar um saldo de 298 mil postos de trabalho. Então, a reforma nesse sentido não veio trazer nenhum tipo de segurança para o mercado de trabalho.
Em relação à evolução do trabalho intermitente, é aquilo que a gente já comentava. No trabalho intermitente, na coluna azul estão os contratados, em torno de 4 mil, 5 mil por mês. A série vai de abril até setembro, porque até abril o Ministério do Trabalho não divulgava, pelos dados disseminados do Caged, o total de trabalho intermitente. Embora essa condição já vinha ocorrendo desde novembro, eles tiveram um tempo para poder compatibilizar a disponibilização desses dados. Na cinza, é a dispensa, ou seja, mesmo com essa forma de contratação, também não traz absolutamente nenhuma segurança. Embora não tenha nenhuma proteção, ela também tem dispensa e representa, sobre o saldo dos empregos gerados com registro para esse período de abril a setembro, 5%. Então, o trabalho intermitente corresponde a 5% do saldo de empregos gerados nesse período.
Quando você compara com...
(Soa a campainha.)
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A SRA. MARILANE OLIVEIRA TEIXEIRA - ... com os admitidos, que é aquela linha vermelha, ela corresponde a em torno de 0,5%. Ou seja, do total de admitidos no mês de setembro, 0,5% era contrato intermitente, o que, de certa forma, indica que é uma modalidade que não, vamos dizer, pegou, não colocou. Por quê? Porque as empresas continuam contratando como autônomos. Então, as pessoas continuam trabalhando no sábado, mas não recebem nenhum direito, apenas o número de horas trabalhadas, ou eventualmente durante a semana. Quer dizer, essa condição não foi substituída por um contrato intermitente. Não, as empresas continuam fazendo exatamente as mesmas coisas que elas vinham fazendo.
E o que mais chama atenção também é o salário mensal. O salário mensal, por exemplo, de uma trabalhadora é R$763 - é muito abaixo do salário mínimo. Mesmo para os homens, é praticamente em torno de um salário mínimo.
São profissionais, pessoas que, em média, 70% têm ensino médio: aquelas ocupações, como vendedores e demonstradores de lojas e mercados, técnicos de venda, garçons, barmans, trabalhadores de serviço, ajudantes de obras civis, vigilantes etc. São as principais.
E, em relação ao trabalho em tempo parcial, também foi outra modalidade que teve pouco impacto. Nesse período também analisado, de abril a setembro, foram gerados 33 mil postos de trabalho e foram desligados 21 mil, também uma proporção muito grande. As colunas representam: em azul, os admitidos; os desligados, na outra.
(Soa a campainha.)
A SRA. MARILANE OLIVEIRA TEIXEIRA - E a outra linha corresponde ao que isso representa em relação ao total dos empregos gerados no período. A mesma coisa em relação ao intermitente: é em torno de 0,4%, 0,5%.
Da mesma forma que o trabalho intermitente, aqui estão as jornadas praticadas. O salário mensal de um contrato em tempo parcial, tanto para homens quanto para mulheres, é inferior ao salário mínimo. E as principais ocupações, inclusive, são muito semelhantes ao trabalho intermitente. Uma diferença importante aí, que tem um viés de gênero, é que no trabalho intermitente dois terços são homens e um terço são mulheres. Nos contratos em tempo parcial, dois terços são mulheres e um terço é composto por homens.
Para finalizar, é importante entender que o Brasil é um país que depende fundamentalmente do mercado de consumo interno. Nós não somos grandes exportadores. As nossas exportações têm um peso muito pequeno na nossa riqueza interna, o Produto Interno Bruto. Portanto, é uma economia que depende fundamentalmente de renda, de consumo. Então, dois terços da riqueza gerada são consumidos no próprio mercado interno, que depende de renda e, portanto, depende de emprego.
A reforma trabalhista nesse sentido, quando ela tira a renda, reduz proteção e segurança, é um tiro no pé, porque se desaquece a galinha dos ovos de ouro, que é o mercado interno, que é o mercado de consumo. Nós não somos grandes exportadores. Exportamos 12%, 13% do que nós produzimos internamente. O resto consumimos internamente.
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Então, quando se reduz o mercado de trabalho e se geram precariedade, redução de rendimentos e insegurança, reduz-se também o mercado de consumo; ao se reduzir o mercado de consumo, reduz-se o investimento; reduzindo o investimento, reduz-se capacidade produtiva; se não há capacidade produtiva, não há investimento, não há mercado, esse negócio fecha ou vai para outro lugar, porque não há mercado interno.
Esta é a última tabela que mostra que a despesa do consumo das famílias corresponde a 62% dos componentes das contas nacionais - é o último dado, de 2015. Se não há despesa do consumo das famílias, nós vamos produzir para quem? Quem vai consumir os bens e os produtos que são gerados pela economia? Não há quem para produzir e, portanto, não há para quem vender.
Encerro isso com esta constatação: a reforma trabalhista, do ponto de vista do mercado do trabalho, não conseguiu entregar nada do que prometeu, muito pelo contrário; e ela, de alguma forma, vem consolidando condições de trabalho que já são historicamente e estruturalmente muito precárias, que é o trabalho por conta própria e o trabalho sem registro, que não arrefeceram; muito pelo contrário, eles se acentuaram neste período de crise.
Obrigada, Senador. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, muito bem, Marilane Oliveira Teixeira, pesquisadora do Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho (Cesit/Unicamp), que deixa claro que a reforma trabalhista para o trabalhador foi uma falácia. Venderam, não entregaram... Diminuíram a massa salarial, e os donos do mercado só aumentaram seu lucro - os que comandam o mercado.
A SRA. MARILANE OLIVEIRA TEIXEIRA (Fora do microfone.) - Exatamente.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Vamos em frente.
Convidamos o Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), o Juiz Guilherme Guimarães Feliciano.
O SR. GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO - Senador Paulo Paim, muito obrigado, mais uma vez, pelo convite, em nome da magistratura do trabalho.
Este é um tema que nos é muito caro e que interferiu diretamente na realidade dos trabalhadores de todo o País e também na realidade da Justiça do Trabalho, como os números estão demonstrando.
Como o tempo é curto, eu decidi me concentrar no que foram talvez as três principais promessas da reforma trabalhista. Desde que o PL 6.787 tramitava, basicamente se apontavam três objetivos maiores para a reforma trabalhista ou para aquilo que os próceres do projeto chamavam de modernização das leis trabalhistas.
Primeiro, o aumento da empregabilidade, especialmente dos empregos formais. Então, a introdução de figuras como a do trabalho intermitente, a do trabalho em tempo parcial com possibilidade de horas extras e mesmo a de possibilidade de terceirização de atividades fim eram alternativas ali apontadas como formas de trazer para a formalidade uma porção da população economicamente ativa que estava na informalidade e que, portanto, não tinha direitos.
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Eu me lembro, inclusive, de um diálogo que tive aqui com um Senador do Distrito Federal, Senador Cristovam Buarque, em que ele próprio dizia assim: "A CLT tem direitos. Existe, porém, o mundo ideal, mas nós temos de olhar para essa imensa realidade de trabalhadores que não têm direitos quaisquer. Então, para chegar até eles, é preciso, digamos, reduzir o custo do trabalho formal para a empresa". Essa era a lógica.
O segundo eixo era o da segurança jurídica, e aí há um ataque claro à Justiça do Trabalho, a uma jurisprudência que se julgou progressista demais ou ainda a uma jurisprudência que se entendia, inclusive em algumas passagens dos debates, seletiva demais. A ideia, portanto, foi, de alguma maneira, cercear, de alguma maneira, tolher a capacidade de interpretação dos juízes do trabalho. Isso fica muito claro, por exemplo, nos parágrafos que foram introduzidos no art. 8º da CLT, ao dizer, por exemplo, que súmulas e orientações jurisprudenciais não poderiam criar direito novo ou gerar obrigação nova. Este é um texto que, do ponto de vista da Teoria Geral do Direito, ou diz o óbvio ou não diz nada, porque há duas perspectivas para a compreensão do papel de um juiz. Uma perspectiva que é muito cara aos tribunais anglo-saxônicos é que, na verdade, quem constrói o Direito é o juiz, a partir da interpretação dos precedentes naquele caso. A expressão é conhecida: judge made law.
Então, na verdade, se assim for a realidade do Direito, esse parágrafo, que é o §2º do art. 8º da CLT, simplesmente contraria a realidade. Ao contrariar a realidade, não tem, portanto, função alguma. Ou, então, podemos dizer, como outros tantos compreendem, que há simplesmente a interpretação daquilo que o legislador coloca no mundo jurídico, a partir de uma série de mecanismos, como a interpretação sistemática, interpretação teleológica, interpretação lógica, gramatical, histórica. Aí se parte da mens legislatoris, que foi a vontade do legislador ou do relator, quando construiu o texto, para a mens legis, produto da interpretação.
Nesse caso, mesmo quando uma súmula do TST colmata uma lacuna da lei por analogia, como aconteceu, por exemplo, com o caso do sobreaviso de quem fica à disposição por meio de um pager, não se está criando direito ou obrigação nova, se está simplesmente descobrindo o que já estava no sistema jurídico. De tal maneira que esse parágrafo, de uma maneira ou de outra, não tem serventia alguma. E ainda há um §3º dizendo que, em relação aos acordos e convenções coletivos do trabalho, a função do juiz seria observar apenas os requisitos de validade do negócio jurídico e nada mais do que isso, cercear, portanto, o papel da Justiça do Trabalho.
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E o terceiro eixo: reduzir os processos. Dentro de uma série de falácias que circularam largamente, inclusive esta, que é uma retumbante mentira, de que 98% das reclamações trabalhistas do mundo estão no Brasil. Isso é nada mais do que isto: uma mentira! Isso não é verdade. Os dados do Conselho Nacional de Justiça, do "Justiça em Números", revelam que no Brasil o volume de processos da Justiça do Trabalho corresponde historicamente a algo entre 15% e 16% do total de processos do País. A maior demanda processual é das Justiças estaduais somadas, e, aí sim, na União, o maior volume de processos é da Justiça do Trabalho, o que não poderia ser diferente; é uma Justiça maior, muito mais capilarizada.
E, como dizia o meu saudoso mestre Wagner Giglio, na verdade, a Justiça do Trabalho é verdadeiramente a Justiça Comum, porque quem vai ao cível, às varas cíveis discutir patrimônio, discutir propriedade, discutir herança, discutir contratos é aquele que, efetivamente, tem, primeiro, riquezas para isso e, segundo, tem condições de arcar com o custo de um advogado para discutir esse tipo de coisa. Não são todos os cidadãos. Da mesma maneira, quem vai à Justiça Criminal ou é réu ou é vítima de um ilícito penal. Agora, na Justiça do Trabalho nós temos basicamente quem produz e quem empreende. Estes vão à Justiça do Trabalho: quem trabalha e quem empreende.
Basicamente aqui nós temos o que toda pessoa faz se não estiver fora da idade apropriada ou se não tiver um impedimento de qualquer ordem: ou trabalha ou empreende. Desse modo, é normal que a Justiça do Trabalho tenha, evidentemente, muito mais processos do que a Justiça Federal comum, em que se vão discutir tributos e outras questões, crimes federais etc., e não questões mais comezinhas, como as ligadas ao trabalho. De todo modo, criou-se essa imagem de que havia um excesso de ações, e o terceiro eixo da reforma era reduzir processos.
Pois bem, um ano depois, o que nós temos? Com relação ao primeiro eixo, o da empregabilidade ou do aumento dos empregos formais, os colegas que me precederam já deram a informação clara de que esse objetivo não foi atingido. Então, neste primeiro ano, dados do Caged - e esses dados são questionáveis, como o Dr. Paulo Joarês referiu aqui - apontavam 372.748 vagas formais criadas. O Ministro Ronaldo Nogueira, quando acompanhou a sanção do que seria então a Lei 13.467 e referiu as suas expectativas, falava em 2 milhões de empregos formais nos primeiros dois anos. Nós não estamos fazendo uma divisão aritmética simples, sequer na metade do que se esperava disso no primeiro ano. Estamos muito abaixo mesmo pelos dados do Caged.
Da mesma maneira, nós vimos - e isso já era esperado: a Anamatra disse isso aqui, o Procurador-Geral do Trabalho disse isso aqui, outros que aqui falaram anteciparam - que o que aconteceria seria muito semelhante ao que houve no México, por exemplo: uma criação...
(Soa a campainha.)
O SR. GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO - ... de postos de trabalho menos protegidos. E, de fato, nós temos visto isso. O trabalho intermitente - esse que deveria, sobretudo, tirar o trabalhador da informalidade -, esse sequer vingou muito retumbantemente. Nós temos aí algo como 35.930 intermitentes. São os dados que eu levantei, considerando os que entraram e os que saíram. Portanto, nada muito relevante em termos de economia.
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No que diz respeito à terceirização de atividade fim, que o Supremo Tribunal Federal terminou por sufragar, nós ainda não temos neste momento um dado claro de como isso impactará no mercado de trabalho, mas nós temos alguns indícios. Uma pesquisa da Confederação Nacional da Indústria em 2016 já indicava que 63% das indústrias contavam com serviços terceirizados e que 84% dessas empresas queriam ampliá-los. Então, certamente teremos uma ampliação - e os casos mencionados aqui pelo Procurador revelam isto - desses quadros terceirizados em atividade fim. E as estatísticas demonstram que ganho médio de um terceirizado em relação ao efetivo no mesmo posto é inferior em algo entre 20% e 25%; 23% é a média mais referida.
E, finalmente, a questão da informalidade. Essa, mais grave, foi apontada aqui pela colega Marilane. Vejam só: no segundo trimestre de 2018, neste ano, a economia cresce 0,2%; o desemprego recua para 12,4%. Nada obstante o número de trabalhadores com carteira assinada, representou o menor nível da série histórica do IBGE. O desemprego cai, a economia, embora em um nível pífio, se recupera - volto a dizer, um índice pífio, mas, enfim, caminha para cima - e, no entanto, o número de empregos formais é o menor da história. Por quê? Pelo mercado informal. Nesse período nós passamos de 36,4 milhões para 37,3 milhões de trabalhadores na informalidade.
E começa a haver outro fenômeno. Já havia, mas começa a se agravar: são os empregadores informais. Então, você já não tem... Isso é muito característico dessa chamada gig economy, em que basicamente se pensa em uma economia à base de tarefas que são acometidas a trabalhadores autônomos por períodos determinados. A uberização é o epicentro dessa gig economy. Você já não consegue identificar claramente se aquilo é um trabalhador ou um empreendedor, porque ele não tem direito algum e, por outro lado, ele também não é propriamente um proprietário de meios de produção no conceito clássico da expressão. Exatamente essa é a massa que tem se expandido nessa nova realidade.
Então, empregadores informais sem CNPJ crescem nesse período em 10,5%. O que eu tenho, portanto? Um crescimento, como disse, pífio na economia, mas uma queda de produtividade. A produtividade no trabalho informal é quatro vezes menor do que a produtividade no trabalho formal. Os trabalhadores informais ganham, em média, 40% menos que os trabalhadores formais, e isso impacta no mercado de consumo. Esse é um círculo recessivo, se nós projetarmos para o médio e longo prazos, e é isso que estamos vivendo. Portanto, esse primeiro eixo seguramente não foi atendido. Basicamente, o que nós temos visto é: aumento de informalidade, migração para postos menos protegidos e, em termos de empregos formais protegidos - a carteira azul -, nós temos algo muito inferior ao que se prometera. Sobre a questão da segurança jurídica, eu não preciso dizer muito, já foi referido aqui também: tivemos uma medida provisória, a MP 808, ela durou alguns meses, depois não houve força ou interesse político em fazê-la se transformar em lei. A confusão aumenta, especialmente para os juristas, ou seja, como é que se resolve o direito intertemporal diante desta confusão toda de diplomas que perdem vigência, de regras que não tinham...
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(Soa a campainha.)
O SR. GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO - ... um tratamento claro sobre aplicação intertemporal para processos antigos e novos e para contratos antigos e novos? Enfim, uma grande confusão. No Supremo Tribunal Federal, nada menos que 25 ações diretas de inconstitucionalidade em torno de uma mesma lei. Deve ser um recorde. Dessas, 19 sobre as contribuições sindicais, sobre a perda da obrigatoriedade das contribuições sindicais, mas outros vários temas ainda estão lá e vão ter de ser definidos: atualização dos depósitos recursais - ADI da Anamatra -, fixação dos valores de indenização por danos extrapatrimoniais - ADI da Anamatra -, atividades insalubres de gestantes e lactantes, trabalho intermitente, a difícil questão do acesso à Justiça, que já está aí mais ou menos no meio do julgamento e que vai realmente definir o impacto da reforma na Justiça do Trabalho, tudo isso está lá por decidir.
(Soa a campainha.)
O SR. GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO - Mais ainda, neste meio tempo... Aí já caminho para o final aqui, Senador. Neste meio tempo, o TST é obrigado a editar uma instrução normativa, Instrução Normativa nº 41, para dizer como os juízes devem aplicar as novas regras processuais no tempo - processos novos, processos antigos. Mas como é uma instrução normativa, isso, a rigor, não vincula os juízes, é apenas uma orientação. E, alguns meses depois, a própria Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho tem de editar uma recomendação sobre como os juízes devem interpretar a questão da prescrição intercorrente no novo Direito do Trabalho.
Enquanto isto, várias dessas ADIs - na verdade, em termos de temas, a maioria delas - seguem sem uma definição pelo Supremo. Mais ainda: o próprio TST já não pode...
(Soa a campainha.)
O SR. GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO - ... conformar a sua jurisprudência, por quê? Porque as regras para alteração de súmulas conheceram, com a reforma, uma complexificação imensa. A ideia era mesmo dificultar que a jurisprudência fosse muito dinâmica, só que não perceberam que, com isso, impediam até mesmo que a jurisprudência anterior à reforma pudesse ser adaptada à reforma.
Então, hoje o TST está tendo que discutir se o art. 770 é constitucional, na medida em que o TST passa a ser o único tribunal superior que tem a sua jurisprudência regulada, ou a formação da sua jurisprudência regulada não por regimento, mas por uma lei. E somente depois disso é que se vai ver se há ou não como adaptar a súmula, ou as súmulas, à nova lei.
Por fim, redução de processos, e aí eu encerro. Segurança jurídica também não se alcançou, pelo contrário. Eu, como Juiz do Trabalho há 22 anos, digo: eu nunca vivi um período de insegurança jurídica tão grande. Agora, redução do número de processos, isso efetivamente houve.
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Do primeiro trimestre deste ano em relação ao primeiro trimestre do ano passado houve uma queda de 45%. Isso é muito visível. O TST agora publicou exatamente o seu balanço do primeiro ano da reforma. Em 2017, foram, em todo o País, 2.013.241 reclamações novas, ações novas, na verdade; em 2018, até agora, 1.287.208. Isso é claro. Agora, aqui há duas discussões. Primeiro, se isso é virtuoso. Eu não vou me prender muito a isso, mas, na medida em que boa parte dessa redução se deve ao temor do cidadão de reclamar o seu direito perante a Justiça do Trabalho, a meu ver, eu tenho aqui uma clara agressão a uma garantia constitucional, que é o acesso à Justiça. Mas isso quem dirá é o Supremo Tribunal Federal. Em segundo lugar, se isso é perene. Os números, Senador Paim, parecem indicar que não. Se os senhores observarem na aba da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho, no site do TST, vão ver - e isso eu já havia indicado em uma outra audiência pública, a partir dos dados da minha unidade, que é a 1ª Vara do Trabalho de Taubaté, agora já há isso em relação a todas as unidades do País - que está havendo uma elevação. Esse gráfico mesmo que foi apresentado agora já mostra essa elevação. Então, o número de ações volta a subir, porque é natural. Você cria impedimentos, mas o litígio continua lá. É como se você varresse para debaixo do tapete. Em algum momento, o tapete começa a ficar volumoso. Isso vai ter de ter alguma solução. E o pior, se isso não for resolvido na Justiça do Trabalho, ou vai se resolver por resignação, por soluções extrajudiciais, ou vai se resolver com conflito coletivo, porque essa é a história do Direito do Trabalho. E a Justiça do Trabalho tem um grande papel cumprido a esse respeito.
Os senhores não viram greve dos Correios este ano. Mérito da Justiça do Trabalho, resolveu-se isso no TST. Isso é de interesse de toda a população. Atendeu-se ao interesse econômico, atendeu-se ao interesse da categoria profissional. Sem Justiça do Trabalho, o que há é conflito coletivo, tensão. A história nos demonstrou isso. Às vezes, nós estamos pensando que estamos olhando para o para-brisa, estamos olhando é para o retrovisor e temos de ter cuidado com isso.
Se olham, por fim, essas manchas de processos nos gráficos da Corregedoria vão ver que está havendo especialmente um crescimento alentado dos chamados processos de produção antecipada de prova. Por quê? Porque a reforma passou a exigir pedido certo quanto ao valor. O que estão fazendo os advogados? Estão ingressando com uma ação prévia para ter elementos para quantificar o pedido. Então, aqui, na verdade, a reforma não estimulou redução de ação; estimulou duplicação de ações. Eu preciso pedir horas extraordinárias. Os horários que havia nos cartões de ponto são os horários corretos, mas eu não tenho os cartões de ponto, estão na empresa. Porém, agora, o art. 840 da CLT exige que eu indique pedido certo, no valor. O que meu advogado faz? Ele entra com uma ação pedindo a exibição dos cartões de ponto. Depois disso, ele faz os cálculos e entra com a reclamação trabalhista. O que antes era uma ação virou duas.
E também, segunda mancha que está crescendo: as homologações de acordos extrajudiciais. Muitos acordos extrajudiciais levados à Justiça do Trabalho. E isso me preocupa, porque nós que já atuávamos antes da reforma sabíamos que, muitas vezes, esses acordos que chegavam logo depois da petição inicial estavam apenas travestindo renúncias. Tenha a convicção de que os juízes do trabalho...
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(Soa a campainha.)
O SR. GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO - ... construirão uma jurisprudência que impedirá homologações de renúncias, mas de todo modo é preciso ter atenção a isso.
Portanto, termino aqui. Olhamos para isso e vemos que, destas três finalidades, duas certamente não foram atingidas. Uma foi atingida, mas talvez não da maneira como se quer ler esse objetivo atingido. Pelo contrário. Talvez, de tudo, seja o pior resultado do ponto de vista da condição social dos trabalhadores no Brasil ou da própria preservação dos direitos sociais no Brasil.
E é o que nós estamos vendo. Falei do retrovisor. Lembro aqui do final de uma letra de uma música de que eu gosto muito, se chama Índios, da Legião Urbana, Renato Russo, cidadão desta cidade. Ele termina dizendo o seguinte: "Nos deram espelhos e vimos um mundo doente. Tentei chorar e não consegui". Cada vez mais eu me identifico com isso quando eu penso nos caminhos que estão sendo construídos a partir de uma legislação pouco debatida, pouco refletida e, mais do que isso, em vários aspectos, contrária ao que deveria ser a genética do Direito do Trabalho.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dr. Guilherme Guimarães Feliciano, Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra).
Eu só queria lembrar que recentemente eu participei, Dr. Guilherme, de um ato em frente ao TRT do Rio Grande do Sul. E foi unânime lá - juízes participaram, advogados participaram - que há um movimento muito forte para acabar com a Justiça do Trabalho.
Foi um evento forte. Eu participei já como Senador reeleito e percebo que desse movimento nós vamos ter que cuidar com muito carinho agora nos próximos tempos.
O SR. GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO (Fora do microfone.) - Contamos com o senhor.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Estaremos juntos.
Passo a palavra, com satisfação, como a todos os outros convidados, ao líder sindical Moacyr Roberto Tesch, que fala pela Nova Central Sindical dos Trabalhadores e também pela Contratuh, sua entidade.
O SR. MOACYR ROBERTO TESCH AUERSVALD - Primeiramente, eu gostaria de agradecer, Senador, por suas palavras. Mas na verdade quem merece... (Pausa.)
Conforme eu estava dizendo, primeiramente eu gostaria de agradecer as suas palavras, mas realmente quem merece a nossa gratidão e ser parabenizado é V. Exa. E também agradecer ao povo gaúcho, de modo muito especial, a cada gaúcho, a cada gaúcha que participou dessa campanha muito difícil. Campanha que me emociona, campanha que de repente quase a gente viu saindo pelos vãos dos dedos. E, para uma pessoa que tanto trabalhou por esse Brasil, tanto trabalhou pelas questões sociais, que é a nossa trincheira aqui dentro do Congresso. Quase, vamos dizer assim, tivemos ceifada essa grande liderança de V. Exa. dentro desta Casa.
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E digo isso pela visão republicana que o senhor tem colocado tanto e pelo respeito que todos os Senadores - todos, não posso excluir nenhum desta Casa - têm por V. Exa. Graças a esse respeito e a essa firmeza que V. Exa. tem. V. Exa., que nos defende, é respeitado. Prova disso - não precisa mais muita fala, pois, conforme estava falando nosso magistrado aqui, nós temos que olhar pelo refletor, olhar pelo espelho -, nesse respeito que eu digo, é só verificar os estatutos que V. Exa. aprovou, as leis que V. Exa. aprovou e a sua voz quando vai à tribuna, pois a Casa fica em silêncio. O Senado o escuta e o respeita. E nós, os trabalhadores, nós, o movimento social, nós, que estamos mais junto à população que mais necessita do apoio temos em V. Exa. o nosso guardião. Então, os meus parabéns pela vitória!
Queríamos efetivamente que V. Exa. fosse o primeiro dentro da votação, mas não foi possível. Mas estar aqui já é uma grande vitória, principalmente nas condições em que ocorreram essas eleições, em que foi desigual a situação. E, lamentavelmente, aí vai um choro meu de dirigente sindical: o movimento sindical perdeu, e muito, nessas eleições. Nós, não sei o porquê, perdemos grandes Parlamentares aqui dentro desta Casa. Nós perdemos 50% dos nossos Parlamentares: nós tínhamos 91, 92 e de vez em quando eram 100, e agora nós temos 51, que não é uma "boa ideia", não. E esse pessoal vai ser muito difícil a gente segurar, principalmente pela essa onda que nós estamos apreciando, lamentavelmente.
Senador, nós, da Nova Central e também participando do Fórum Sindical, temos visto essa reforma com muito pesar. Não se avançou, os empregos que disseram que iria haver não houve. Houve um turnover muito grande. Quem estava empregado com a nossa carteirinha azul acabou desempregado e hoje em dia está com trabalhos intermitentes.
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Não temos nada a comemorar a não ser a sabedoria do povo, do trabalhador, que foi efetivamente a de riscar do mundo político o Ministro Nogueira, Rogério Marinho e Ricardo Ferraço, que foram os três articulares dessa lei, dessa maldita lei da revogação da nossa CLT, praticamente, e outros e outros Parlamentares que não retornaram à Casa em função da reforma trabalhista.
Conforme eu estava dizendo, o movimento sindical tem uma dificuldade enorme no movimento social de eleger Parlamentares e fazer com que as coisas andem, mas, em compensação, para trabalhar, para informar lá embaixo quem não deve ser eleito, temos facilidade. Para ajudar é difícil, mas para atrapalhar temos uma capacidade muito forte.
Então, Senador, eu digo que nós, trabalhadores, principalmente da rede hoteleira, da rede de refeições fora de casa, da área de turismo e hospitalidade, que tivemos até a famigerada lei McDonald's, que é a do trabalho intermitente, em que V. Exa. foi para nós de suma importância no processo de defesa, para assegurar os horários intermitentes...
Chegamos a fazer dentro desta Casa um congresso internacional com mais de 35 países, dentro desta sala, discutindo os trabalhos intermitentes, junto com o Ministério Público, junto com a Anamatra. Até então essa lei nós tínhamos segurado. E só para V. Exa. ter uma ideia da importância do seu trabalho - e temos de fazer essa reflexão e o agradecimento -, como resultado daquela audiência, o resultado do Ministério Público do Trabalho, da ação que foi feita, foi feito um acordo com o McDonald's de que, nos próximos cinco anos, ele não mais usará o trabalho de contrato intermitente. Então a lei McDonald's, a emenda McDonald's do trabalho intermitente, através da Procuradoria, digo, do Ministério Público, do próprio Ministério do Trabalho, da nossa confederação, da Contratuh, da Sinthoresp, dos magistrados, conseguimos barrar pelos próximos cinco anos. Essa é uma grande vitória sua também, que começou nesta Casa. (Palmas.)
Nós temos, lamentavelmente, Senador, também desse processo da lei, que o desespero do Governo era tão grande de fazer a publicação e de fazer essa reforma andar que um sonho nosso, dos trabalhadores em hotelaria de mais de 40 anos e que V. Exa. tornou realidade, que era a famigerada distribuição da Lei da Gorjeta, que há ações de todo tamanho no Brasil e que, através de V. Exa., nós materializamos, fizemos uma divisão adequada, inclusive para os trabalhadores, no futuro, se aposentarem e terem aposentadoria decente - porque era tudo pago por fora - e, na ansiedade de publicar a lei simplesmente eles mudaram o artigo e colocaram a questão do trabalho intermitente. Eles pegaram a CLT mais antiga do que a atualizada, que tinha sido a lei e, com nova redação, jogaram fora o que nós construímos.
(Soa a campainha.)
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Posteriormente viram a aberração que havia sido feita e emitiram aquela medida provisória, retratando novamente todo o projeto que V. Exa. relatou, defendeu e aprovou. No entanto, junto com aquela medida provisória, a nossa expectativa era fazer as alterações necessárias dessa legislação. Foi a medida provisória com maior número emendas à época. Chegamos a quase mil emendas nessa medida provisória, e o medo do Governo foi tão grande que ele deixou as coisas acontecerem.
Senador, nós, trabalhadores, estamos vendo dias muito nublados pela frente. Nós não temos muita expectativa. Os pronunciamentos das pessoas que foram eleitas colocam o movimento sindical como desnecessário, como algo que fosse atrapalhar o Brasil e - chega até a chocar - como uma coisa nojenta.
Conseguiram eliminar o nosso poder de fogo através do nosso custeio. Eliminaram o custeio de uma forma tão violenta, tão cruel, que há diversas entidades - não uma só, Senador -, inclusive centrais sindicais, que colocaram seu patrimônio à venda; o que era alugado já foi entregue; milhares, posso dizer, de funcionários já foram dispensados; patrimônio de carro, imóvel, tudo já está sendo dispensado. Nós tínhamos uma estrutura que era para o trabalhador e, lamentavelmente, não está acontecendo.
As negociações coletivas, Senador, estão sendo, lamentavelmente, das piores possíveis, porque não há mais a obrigação, os empresários se acham acima de Deus e do mal. As rescisões de contrato nos sindicatos estão menos de 10%; o movimento desapareceu. No Ministério do Trabalho, desapareceram as homologações e, quando se tira a homologação de dentro das sindicais e, muitas vezes, de dentro do Ministério do Trabalho, se tira o direito do trabalhador de ter explicado o seu direito. Com isso, fica aquela interrogação enorme: será que está certo ou está errado? E, no mesmo momento, isso inviabiliza que ele recorra à Justiça do Trabalho, porque a forma está desencontrada. E já temos, na grande imprensa, ações em que o trabalhador, porque perdeu parte da ação, foi prejudicado em mais do que ele iria receber.
Então, Senador, estamos vivendo dias muito difíceis, muito difíceis mesmo. E as propostas de quem está chegando ao poder não são nada animadoras para o movimento sindical, não são nada animadoras para os movimentos sociais, não são nada animadoras para quem conhece a sociedade no pé da fábrica, no pé da estrada, nas indicações.
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Estão cantando vitória porque chegaram ao poder. Chegar ao poder não significa destruir o que foi construído a duras penas, feito em décadas. Parece um murmúrio de desespero, de desconsolo, mas lamentavelmente o processo é esse. Estão fortalecendo o Sistema S, conforme já foi colocado aqui. O patronal não necessita, de forma nenhuma, desse procedimento de custeio, porque ele já tem um grande custeio. O que o Sistema S recolhe num mês é o que o movimento sindical recolhia no ano. Nós recolhíamos 3,3%, o Sistema S recolhe 2,5% para o sistema, para o Senac, para o Sesi, ou Senac e...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. MOACYR ROBERTO TESCH AUERSVALD - ... Sesc. Obrigado. Então, são coisas que são muito difíceis, Senador. E nós não estamos desanimando não, mas as barreiras são grandes.
A rede hoteleira Othon, que era tradicional na Bahia, em Minas, em diversos Estados brasileiros, está fechando na área de turismo e hospitalidade. Fechou. Quer dizer isso que, mesmo com toda a flexibilização, os empresários não estão atingindo os objetivos deles. Isso que é pior. Isso que a gente fala não é fala de sindicalista, mas é só ver a imprensa: a reforma trabalhista não melhorou a contratação para 61% das pequenas empresas. E, se a gente procurar na imprensa, toda a imprensa, a Folha de S.Paulo, UOL etc., traz que o objetivo da reforma não aconteceu, muito pelo contrário: trouxe desestabilização, insegurança jurídica, desemprego formal - e aí vem o grande desespero, a geração de desemprego que nós temos. Essa geração de emprego não é como o Governo tem falado. O Governo fala: são 12 milhões. Não são 12 milhões, o número ultrapassa 25 milhões. Por causa do jeito que é feita a entrevista do IBGE, quem não procura emprego já de três a quatro meses não entra mais na estatística dos desempregados porque se considera que essa pessoa já conseguiu um jeito de sobreviver.
E nós não podemos esquecer também, Senador, da nossa juventude. São mais de 5 milhões de jovens...
(Soa a campainha.)
O SR. MOACYR ROBERTO TESCH AUERSVALD - ... que estão chegando ao mercado de trabalho, e nós não estamos conseguindo empregá-los. Então, se nós juntarmos os 12 milhões mais os 5 milhões que não constam mais nessa estatística e mais ou menos 5 milhões, por baixo, Senador, da nossa juventude, nós já estamos em cerca de 22 milhões de desempregados no Brasil. Não há país, não há economia, não há situação que segure isso. Nós precisamos que o Brasil retome a linha de produção, precisamos que o Brasil torne a produzir efetivamente, porque a partir daí teremos uma engrenagem de produção, geração econômica e, consequentemente, geração de emprego.
Muito obrigado, Senador. Desculpe-me ter ultrapassado nosso tempo. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Dentro do tempo. Esse foi Moacyr Roberto Tesch, que falou pela Nova Central e também falou pela sua entidade, a Contratuh.
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Para mim, Moacyr, você está com toda a razão. Só não vê quem não quer o número de pessoas que estão morando na rua. Eu, no Rio Grande do Sul, não estava vendo isso. Mas nessa campanha, como eu andei por todos os cantos, o número de moradores de rua... Eu moro longe daqui, até as fake news colocaram que eu morava aqui pertinho, mas eu moro longe daqui, eu moro mais ou menos a uma hora de carro. O número de pessoas vendendo coisas nesse caminho até chegar onde eu moro, que é pertencente a Santa Maria, é impressionante como está aumentando, e fazendo isso pela vida, não é? E por isso que concordo com os dados do IBGE: entre aqueles que estão vivendo de bico, aqueles que desistiram de procurar emprego, o número de desempregados e aqueles que estão pegando qualquer coisa, um trabalho precário, o número ultrapassa 30 milhões de pessoas. Trinta milhões de pessoas, esse dado eu peguei com o IBGE, e vem na linha do que V. Exa. levantou aí. Disseram que ia resolver o problema do desemprego, mas está aí o resultado.
Por favor, o representante do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), o líder Alex Myller.
O SR. ALEX MYLLER - Bom dia! Bom dia aos presentes, bom dia aos companheiros da Mesa, amigos e amigas. Ao Senador Paulo Paim, um agradecimento especial pelo convite. O Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho sempre tem se manifestado nas audiências públicas da Subcomissão Temporária do Estatuto do Trabalho.
Há mais de um ano, a gente vem debatendo sobre o tema da reforma trabalhista; ou mais, antes de a reforma ter sido aprovada - então, já faz mais de um ano - nós discutimos essa pauta.
Eu queria, em primeiro lugar... O Moacyr falou algo ali - eu estava brincando, dizendo isto para a Marilane - que roubou a minha fala. Que bom! E também quero agradecer que o povo do Rio Grande do Sul tenha, mais uma vez, oportunizado um mandato, Senador, para que V. Exa. possa novamente estar aqui, nesta Casa, na Alta Casa do Congresso brasileiro, e em especial a auditoria fiscal do trabalho lhe parabeniza. O povo brasileiro mais uma vez tem um estadista aqui no Senado do seu expoente. A Rosa Jorge, que é a Vice-Presidente, mandou um abraço especial: "Diga para o Senador que eu mando um abraço e o felicito por mais uma vez a gente poder contar com essa voz", que sempre teve, pela sua história de vida - o Moacyr já fez esse histórico -, de luta pelos direitos, pela afirmação das promessas da Constituição de 1988. Muitas vezes parece que nós temos esquecido o que está lá na Constituição e o que foi dito, o que nós projetamos de sociedade.
Então, eu queria, em primeiro lugar... Já todo mundo, hoje, meio que fez um retrospecto a partir dos objetivos da reforma trabalhista, com quase um ano de vigência, e tudo que foi dito, as narrativas que foram utilizadas para implementá-la. E nós vivemos, na verdade - não vivíamos, mas vivemos -, um momento de dificuldades no Brasil sob todas as ordens, mas eu queria destacar aqueles três pontos de que falávamos, e vou me concentrar na questão da segurança jurídica, que já até foi abordada, mas sob outros aspectos.
Uma primeira questão que foi muito defendida nas narrativas de implementação, nos debates acerca da reforma trabalhista, aqueles debates rápidos, que começaram com aquele projeto de lei de dezembro de 2016, encaminhado para cá no apagar das luzes do ano, era que um dos objetivos era aumentar a competitividade empresarial. E aí a Marilane, já antecipadamente, rapidamente, falou que isso não aconteceu. De fato, não houve nenhum avanço, uma agregação tecnológica nas nossas empresas, nem uma elevação da capacitação dos trabalhadores que permitisse essa elevação da competitividade. Então, se não houve uma política nesse sentido, não há possibilidade de isso acontecer unicamente alterando a legislação.
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Uma outra coisa seria a elevação do nível de emprego, o que fartamente já foi aqui demonstrado, não é? Mais de uma vez foi dito que não houve aumento do emprego. Pelo contrário, como os estudiosos do tema já tinham apontado em artigos encomendados pela própria Organização Internacional do Trabalho, nos lugares em que houve uma reforma trabalhista na direção da do Brasil, da desproteção, o que houve foi, de imediato, uma redução do nível de emprego formal. Então, no Brasil também aconteceu isso, e nós continuamos nessas idas e vindas, mas estamos ainda num momento de redução desse emprego e de elevação, portanto, da informalidade, há uma expansão da informalidade que, obviamente, vai ter como consequências uma diminuição do consumo interno e, obviamente, uma diminuição da arrecadação previdenciária e do número de pessoas protegidas. É isso o que está acontecendo no Brasil. Então, essas promessas aí, realmente, não se esperaria que pudessem vir de uma modernização das relações em que o mote era mais próximo da medievalização das relações de trabalho.
Quanto à segurança jurídica, eu queria dar um enforque particular, até porque os atores do mundo do trabalho nesse campo institucional - estão aqui Procuradores do Trabalho, Juízes do Trabalho e nós, Auditores Fiscais do Trabalho, que estamos ali na pragmática, no cotidiano do mundo do trabalho - lidamos principalmente com essa questão da segurança jurídica. As outras dimensões não são nossa... Como gerar emprego, como aumentar a competitividade das empresas, isso não é o nosso mote, mas, de segurança jurídica, nós entendemos bem porque é a nossa matéria-prima de trabalho.
E o que aconteceu? Eu penso que Marilane foi muito clara nisso: a prática empresarial não incorporou muitas das mudanças da reforma, grande parte eu diria, primeiro porque há problemas de operacionalização mesmo, administrativos. Algumas delas exigem uma complexificação administrativa, uma estrutura que a maior parte das empresas do Brasil não têm, já que a esmagadora maioria das empresas brasileiras são microempresas e empresas de pequeno porte. Então, não conseguiriam... Eu diria que o grosso da reforma, aqueles grandes temas, sequer poderiam ser operacionalizados por uma microempresa ou por uma empresa de pequeno porte.
Outra questão é que, para além das dificuldades de operacionalização... Eu poderia citar o contrato de trabalho intermitente. Vocês vejam a dificuldade que era... Como se deu essa questão do trabalho intermitente? Há uma previsão na Lei 13.467, a MP fazia outras previsões e, no final das contas, ninguém sabe como ficaria. O Ministério do Trabalho editou uma portaria também ressuscitando a MP que o Parlamento sequer analisou. Então, vocês veem que essa história é conturbada.
Além dessa questão da operacionalização, há uma questão que é da própria norma mesmo: a quantidade de antinomias, externas e internas, da norma é muito grande. Há muita contradição entre a literalidade daquela norma e...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Estava lembrando que eles criaram uma comissão especial e, depois, a desmontaram, virou pó, porque não conseguiram se entender.
O SR. ALEX MYLLER - É, em função da complexidade da situação, não é?
Outra questão: essas antinomias externas de que estou falando, com outras normas, com a Constituição... A literalidade muitas vezes desrespeita o que está escrito na Constituição, ou a literalidade contraria acordos e convenções, tratados internacionais, convenções da OIT, muitas vezes a própria jurisprudência. Há dispositivos de lei que só fazem pegar a súmula do TST e desdizê-la. Eu poderia até dar um exemplo das antinomias internas também da própria norma, para a gente ter uma dimensão da dificuldade de se implementar uma norma. Por um lado, ela diz que prevalece sobre a legislação heterônoma, sobre a norma, o que for negociado em vários pontos. Um dos pontos é: o enquadramento na insalubridade e, em outro, por exemplo, a questão da prorrogação da jornada em ambientes insalubres. Diz isso no art. 611-A e, no 611-B, diz que são objeto ilícito para negociação coletiva as normas de segurança e saúde do trabalho previstas em lei ou em normas regulamentadoras. Isso já mostra a dificuldade. Como se estabelecer acordo ou convenção sobre o tema se a própria norma não deixa claro se é ou não é ilícito negociar? E há muitas outras antinomias dessa ordem que dificultam a operacionalização da norma.
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Sobre o momento da gênese da norma, o que a gente poderia dizer é o seguinte: essa insegurança é fruto, primeiro, da falta de debate amplo sobre o conteúdo da mudança, porque nós debatemos - houve 17 audiências públicas, se não me engano, na Câmara sobre o tema da reforma trabalhista - no momento em que o Projeto de Lei 16.786 e alguma coisa, que foi enviado pelo Executivo, estava aqui, mas em nenhum momento foi debatido o projeto final. O projeto final foi apresentado em abril e aprovado em maio. Então, aquele projeto que trazia 11 modificações, ou 7 artigos com 11 modificações, transformou-se em 200 modificações e mais de 100 dispositivos, e ninguém conhecia o projeto. Então, não se pôde amadurecer um debate sobre as consequências daquilo. Obviamente que isso geraria alguma dificuldade. Os atores não foram... E mesmo naquele momento os atores não foram ouvidos. As falas do Judiciário e dos estudiosos não foram ouvidas quanto aos problemas que existiam naquele microprojeto, e esse macroprojeto sequer foi debatido.
É lógico que isso iria dar algum problema. Mesmo com a vacatio legis de alguns meses, era impossível que aquele volume de modificações fosse devidamente debatido entre os atores e os estudiosos. Diante dessa dificuldade, a Anamatra se propôs a realizar a 2ª Jornada de Direito Material e Processual - o Guilherme não está mais aqui -, uma jornada que foi apoiada pelo MPT, pela ANPT, pela Abrat e pelo Sinait para que os trabalhadores do Direito - a gente usa às vezes essa expressão -, os operadores do Direito do Trabalho, pudessem debater como posicionar aquela norma no ambiente jurídico amplo do Brasil.
Eu falei que existem antinomias com a Constituição e com os acordos internacionais e antinomias internas
(Soa a campainha.)
O SR. ALEX MYLLER - Então, era necessário esse debate para posicionar essa norma. Esse debate foi feito e há consequências disso, há um produto disso, que são os enunciados da Anamatra, são 125 enunciados que tentam interpretar essa norma posicionando-a dentro do sistema jurídico em geral.
Eu estava comentando que, além dessa questão da falta de debate, a própria existência de uma medida provisória que depois não foi avaliada pelo Congresso, pelo Parlamento, mostra a insegurança da norma. Então, a norma tem problemas técnicos internos, tem um problema que é fruto dessa falta de discussão e tem esse problema ainda de ter sido atravessada por uma medida provisória que durou um período, o tempo dela, e depois não foi avaliada. E, como foi dito aqui pelo Moacyr sabiamente - eu tinha até me esquecido -, foi a recordista de propostas, ou seja, o nível de insegurança é tão profundo que até a medida provisória que, em tese, viria corrigir alguma coisa foi objeto de quase mil propostas de emenda. Então, a insegurança é muito grande, na verdade.
Um último elemento sobre essa insegurança, que imagino ser evidente, são essas 26 - o Guilherme falou em 25, mas já são 26 - ações diretas de inconstitucionalidade e mais algumas ações declaratórias de constitucionalidade de alguns dispositivos. Há pelos menos duas ou três.
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Há duas que eu já vi realmente e que foram propostas sobre o acesso à Justiça, sobre a questão da correção do depósito recursal, sobre o limite de indenização por danos morais. Então, há muitos temas ainda em debate. As da contribuição sindical foram logo resolvidas de uma tacada! Decidiram que realmente poderia ser facultativo e pronto. E não foram propostas... Para vocês terem uma ideia, não é para se dizer: "Ah não, é porque os trabalhadores estão..." Não! Existiram ações diretas de inconstitucionalidade propostas por entidades patronais, pela Procuradoria-Geral da República. Então, não é uma questão do trabalhador ou do empregador. Não! É inseguro porque é uma questão jurídica. É técnico-jurídica a insegurança. Não é só uma questão de achar que a norma é assim ou assado.
A ênfase a essa questão da insegurança se dá justamente no sentido de mostrar que, na prática fiscal, nós realmente não temos flagrado... Vejam que o volume de contratos é muito pequeno. Por exemplo, o intermitente tem parcial depois, e a gente não flagra sequer, às vezes, na auditoria fiscal essas situações, para poder dizer: "Não! Na auditoria, nós estamos vendo que houve uma mudança." Nem isso se pode dizer, porque é mínimo mesmo. Somando tudo ali, como a Marilane mostrou, não chega a 8% do total de contratos que se formalizaram a mais do que foi dispensado nesse período de um ano.
Eu queria lembrar que, pelo fato de a gente estar aqui... O Sinait tem a iniciativa de tentar posicionar também essa norma para permitir uma interpretação fiscal, que é a produção de um manual técnico para a Inspeção do Trabalho a partir dos enunciados da 2ª Jornada. É, como eu expliquei, uma tentativa coletiva de posicionar a norma no ordenamento jurídico brasileiro. Ele vai ser lançado em breve, provavelmente até a metade deste mês.
Por fim, para eu encaminhar para o final, eu queria só fazer uma pequena comparação de alguns pontos que podem mostrar para a gente o que pode ser segurança jurídica ao revés do que aconteceu na lei da reforma trabalhista.
O Estatuto do Trabalho propõe outra feição para o mercado de trabalho, para a regulação das relações de trabalho, que pretende conceder essa segurança de uma parte, porque, se eu reduzo a proteção, eu amplio o conflito muitas vezes. Então, esta é a primeira coisa: a reforma mantém a desproteção para os trabalhadores que não são subordinados e, de algum modo, reduz a proteção dos que estão subordinados. Se o Estatuto vem para alargar essa proteção, há uma minimização desses conflitos e, portanto, mais pacificação social.
Há outro lado do Estatuto do Trabalho. A reforma disponibiliza um cardápio de contratações, que vai, como eu dizia ontem, desde o autônomo exclusivo e contínuo até o empregado descontínuo e não exclusivo. Então, há uma confusão muito grande. Por isso, a gente estava comentando... A própria Marilane disse que não pegou o contrato intermitente, porque realmente o conjunto de contratações é tão confuso, que você não sabe nem a opção que você vai utilizar. Isso não agregou nada do ponto de vista da proteção e, portanto, gera mais conflito. Por outro lado, no Estatuto, há essa centralidade ainda por um contrato de prazo indeterminado, com uma duração maior, com poucas exceções, o que facilita até a previsão de custos.
Por fim, a reforma trabalhista gerou, de alguma forma, como já foi dito pelo próprio Moacyr, nas palavras dele, um enfraquecimento da organização sindical, já que cortou abruptamente o financiamento e retirou várias competências dos sindicatos. E estas, sim, poderiam, talvez, diminuir a demanda na Justiça do Trabalho...
(Soa a campainha.)
O SR. ALEX MYLLER - ... como a questão da homologação e das rescisões. E o Estatuto, de outra forma, da sua parte, propõe o fortalecimento dessas organizações por meio de formas democráticas de financiamento que estimulem, sim, a autocomposição, mas, desta feita, com os atores com condições de fazer esse debate.
Há essa negativa de acesso à Justiça, que a lei da reforma trabalhista, de algum modo, engendrou. Portanto, houve esta redução tão rápida: em um ano, reduziram em 40% os processos trabalhistas. Afinal de contas, se eu, mesmo como beneficiário da Justiça gratuita, tenho de pagar custas e honorários periciais, dificilmente eu vou enfrentar muitas questões que foram desrespeitadas quanto aos meus direitos ao longo do meu contrato de trabalho.
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Ora, se você pensa, como o Estatuto propõe, em uma segurança maior para o trabalhador, em uma estabilidade até, e se isso permite uma autonomia maior para o debate, você incentiva uma negociação anterior a esse conflito judicial. Aí sim, pode-se diminuir a ação trabalhista não por tirar da pessoa...
(Soa a campainha.)
O SR. ALEX MYLLER - ... o direito de debater aquilo que foi violado, mas porque, na verdade, ela tem autonomia para discutir isso. E, só num caso extremo, ela poderia partir para o judicial.
Então, eu queria só lembrar que é possível ultrapassar essas antinomias.
O Estatuto do Trabalho, proposto na forma da Sugestão Legislativa nº 12, de 2018, está no site do Senado e deve ser debatido amplamente pela sociedade. Ele permite, muito mais do que essa legislação que está hoje em vigor, que sejam ultrapassadas essas dificuldades sob a perspectiva da segurança jurídica que nós temos enfrentado.
É isso aí.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Alex Myller, líder representante do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait)! Parabéns pela exposição! Na linha do que você mesmo falou e que quero reafirmar, dizem que é uma regra de transição. Foi uma transição? Abruptamente, disseram: "É isso, e acabou, gostando ou não, e pronto!" Inclusive, há a questão da manutenção dos sindicatos.
Vocês tentaram - não é, Moacyr? - fazer uma negociação quanto a uma regra de transição, mas não houve nenhum espaço.
O SR. MOACYR ROBERTO TESCH AUERSVALD (Fora do microfone.) - De quatro a cinco anos ou até de três anos...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Isso! Que fosse de até três anos!
Como é de praxe, tenho aberto ao Plenário algo em torno de três ou quatro participações. Então, fica aberta a palavra, se alguém do Plenário quiser - serão cinco minutos para cada um - fazer algum questionamento ou expor seu ponto de vista. Caso contrário, nós vamos concluir os trabalhos.
Alguém do Plenário quer se manifestar? (Pausa.)
Fale, meu amigo! Diga o seu nome e a entidade à qual pertence. O senhor dispõe de cinco minutos.
O SR. FRANCISCO LUIZ SARAIVA COSTA - Meu nome é Luiz Saraiva, da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio e Serviços da CUT, a Contracs.
Tudo que foi falado aqui é a realidade mais óbvia, que é a busca pela desproteção dos trabalhadores e das trabalhadoras.
Está bem difícil, principalmente, Senador Paim...
Aqui, de antemão, quero agradecer a todo o povo que votou no Senador, porque nós vamos continuar tendo este espaço importante e um defensor da classe trabalhadora no Senado Federal. É muito importante a gente contar com esse Senador. Graças a Deus, contamos com vários outros Senadores combativos, que vão continuar na luta, defendendo os trabalhadores. Mas, em nome dos comerciários aqui, eu queria só pedir uma salva de palmas para o Senador Paulo Paim, que vai continuar na luta com a gente. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito obrigado.
O SR. FRANCISCO LUIZ SARAIVA COSTA - Quero dizer que uma das grandes dificuldades que a gente está enfrentando nos sindicatos no País inteiro diz respeito aos acordos e às negociações coletivas de trabalho. Está sendo bem difícil chegar a finalizar um acordo, porque eles estão vindo com o projeto todo debaixo do braço. Antes, a nossa pauta já era muito grande, a que chegava à mesa do patrão, e ele ia discutir as nossas demandas, recusando como sempre, mas a proposta inicial maior era a nossa. Agora, ele chega com mais do que esses 101 pontos aí que foram modificados na nossa CLT para tentar tirar direitos do trabalhador. Portanto, o objetivo é nítido, é claro: simplesmente lucrar no caixa da empresa. Ele não está interessado se vai prejudicar, se vai criar uma categoria de trabalhadores sem nenhum tipo de estímulo.
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Chega a ser um tipo de coação com os sindicatos...
(Soa a campainha.)
O SR. FRANCISCO LUIZ SARAIVA COSTA - ... porque eles estão ali com toda a tal da lei e querendo impor de qualquer forma. Então, está sendo muito demorado o prazo.
Aqui no Distrito Federal mesmo, o Sindicato dos Comerciários e vários outros tiveram que assinar uma convenção pela metade ou com várias outras cláusulas, levando à Justiça. E a gente está aí aguardando o que a Justiça vai determinar sobre várias cláusulas que eram simplesmente para retirar conquistas históricas, de muitos e muitos anos, que os trabalhadores tinham, conquistas essas... É só exatamente para homologar que eles burlem o direito do trabalhador.
Na nossa convenção coletiva de trabalho, no País inteiro, a grande parte que se está realmente querendo retirar é de o sindicato conferir a rescisão de contrato. Então, a homologação de contrato de trabalho é um ponto que...
(Soa a campainha.)
O SR. FRANCISCO LUIZ SARAIVA COSTA - Há convenções que estão indo, simplesmente por essa cláusula, para discutir na Justiça, porque eles não querem aceitar que o sindicato verifique se está sendo correta ou não a homologação da rescisão de contrato. E o objetivo disso todo mundo já sabe: se o empresário está querendo fugir de deixar que o sindicato participe, junto com a empresa, do momento da rescisão do contrato, o objetivo é único, o objetivo é lesar o trabalhador. Não tem outro. Então, a gente está aí nessa perspectiva quanto ao que vai sair da Justiça do Trabalho com relação a essas cláusulas.
Este é o ponto principal: a homologação, ou seja, o momento em que o sindicato faz uma parte importantíssima, que é vistoriar se o trabalhador está sendo respeitado na hora de sair. A gente já conseguiu reverter algumas questões, o que a gente só sabe muito tempo depois, porque o trabalhador está sendo coagido também...
(Soa a campainha.)
O SR. FRANCISCO LUIZ SARAIVA COSTA - ... no acesso à Justiça, então...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Concluindo.
O SR. FRANCISCO LUIZ SARAIVA COSTA - ... até a gente saber que o trabalhador já foi lesado em vários pontos... Muitos deles dizem simplesmente assim: "Ou você assina aqui ou você vai procurar os seus direitos". E deixam o trabalhador ainda mais desprotegido.
Então, nós precisamos reafirmar que os direitos e as garantias conquistados em convenção coletiva de trabalho não podem ser dizimados dessa forma.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - É lamentável. Você tem toda a razão. (Palmas.)
Eu recebi um telefonema de uma senhora, uma moça de Rio Grande, em que ela disse: "Pelos meus cálculos, que eu tinha feito com o meu advogado, eram R$7 mil. Eles me ofereceram 50%. Era pegar ou largar". Desempregada, foi posta para a rua, disse que pegou. Aí, claro, eu recomendei que ela entrasse na Justiça assim mesmo, mas é um problema enorme, quer dizer, vai receber não sei quando. Era pegar ou largar. Eu disse: "Pega aí o próprio representante da empresa... Se eu fosse você, pegava a orientação que ele deu". Porque era o chefe de pessoal, não era o dono, não é? Eu disse: "Olha, pega isso e procura teus direitos. Eu te recomendaria fazer isso". Porque não foi acompanhada do sindicato, foi na própria empresa. Veja... Isso está acontecendo em todo o País. Essa, casualmente, me ligou.
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Alguém mais pediu a palavra?
O SR. VALMIR RIBEIRO - Bom dia a todos!
Eu sou Valmir Ribeiro, jornalista da Confederação dos Servidores Públicos do Brasil (CSPB) e da Nova Central Sindical de Trabalhadores.
Na verdade, eu não quero fazer uma intervenção, quero fazer uma pergunta.
Muito se ventilou, ao longo da campanha eleitoral, a respeito da carteira de trabalho verde e amarela do candidato eleito Jair Bolsonaro. Eu queria perguntar ao Procurador Regional do Trabalho, Paulo Joarês Vieira, como é que o Ministério Público do Trabalho observa essas questões relacionadas à chamada carteira de trabalho verde e amarela e qual seria o remédio jurídico para a gente impedir mais esse retrocesso na legislação trabalhista do Brasil.
O SR. PAULO JOARÊS VIEIRA - Respondendo rapidamente, na verdade essa é uma ideia que foi lançada de maneira ainda muito precária. A gente não conhece detalhes do que seria exatamente esse projeto. Então, a gente comenta muito em tese porque não conhece o conteúdo realmente.
O que cabe é chamar a atenção para o seguinte: grande parte dos direitos dos trabalhadores hoje está prevista na Constituição Federal. Então, qualquer modalidade contratual e de emprego que procure excluir esses direitos é inconstitucional, a menos que a proposta seja de alguma emenda à Constituição, cujo cabimento seria bastante discutível. Por lei ordinária, hoje, qualquer modalidade teria que observar, necessariamente, os direitos mínimos assegurados no art. 7º da Constituição.
E também seria bastante discutível, do ponto de vista da isonomia, que também é um direito assegurado na Constituição, por exemplo, haver dois trabalhadores desempenhando a mesma função, na mesma empresa, lado a lado, um com um regime contratual pleno e outro com um regime reduzido. Muito provavelmente, isso vai ferir o princípio da isonomia.
Então, por ora, nós do Ministério Público acompanhamos a discussão com alguma preocupação, pelo rumo que parece indicar, mas aguardamos, é claro, uma proposta concreta que possamos analisar em sentido mais objetivo.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem!
O SR. MARIO ALBERTO AVELINO - Bom dia!
Sou Mario Avelino, da ONG Instituto Fundo Devido ao Trabalhador, que cuida de Fundo de Garantia.
Eu considero que, na reforma trabalhista, talvez, na minha opinião, uma das piores coisas foi tornar opcional a homologação - reforço o que o colega falou aqui. E a pergunta é: quais são as saídas? Pelo menos, na minha opinião, para que a gente ponha a obrigatoriedade... Eu sei que houve uma reforma, mas, de repente, poderíamos entrar com um projeto de lei - não sei se está havendo alguma ação de inconstitucionalidade -, porque esse ponto tira toda a defesa do trabalhador. Um dos papéis mais importantes do sindicato é o de, na hora de a pessoa sair, verificar não só os direitos trabalhistas como os direitos conquistados em convenção, porque há muitos direitos. Uma coisa é o direito trabalhista, mas as convenções conquistam direitos, e muitos não são, de repente, respeitados.
Então, essa questão da opcionalidade da homologação, para mim, foi uma das piores situações da reforma, sem contar outras. E a pergunta é: como podemos fazer? Já há alguma ação direta de inconstitucionalidade? Poderíamos entrar com um projeto de lei e tentar fazer um movimento pelo menos para tornar isso obrigatório, para voltar ao que era? A pergunta é essa.
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Eu pergunto ao Senador: quais são as alternativas? Talvez, mudar toda a reforma não vai ser possível, mas vamos começar pontualmente, por blocos. "Opa! Qual é o pior bloco? Vamos atacar esse, vamos atacar aquele." Então, na minha avaliação, pelo todo isso vai ser difícil, mas por bloquinhos a gente consegue evoluir.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Se perguntou para mim, vou responder.
Primeiro, já foi dito pela Mesa que existem em torno de 25 ações na Justiça em relação a esse mundo do trabalho. A segunda questão, que é triste - e eu vou ter de dizer aquilo que eu vou dizer -, é que nós tínhamos uma esperança muito grande de que nós não iríamos dar uma guinada - e não quero usar os termos "direita", "esquerda" e "centro" - para um setor mais conservador do que esse que está no Congresso atualmente, mas o povo votou. É triste dizer isso, mas o povo votou, o povo escolheu, pelo que estou vendo aqui no Congresso - Câmara e Senado -, um perfil mais conservador do que esse que está saindo. E agora?
Eu me lembro que muitos diziam nos palanques: "Olha, pessoal, se essa gente que está aí se reeleger, isso significa convalidar tudo que eles fizeram desde o momento que afastaram a Dilma". O pior é que não foi essa gente que está aí que se reelegeu, elegeu-se um Congresso mais conservador do que este que está aqui hoje.
Então, achar que nós vamos conseguir, aqui dentro, aprovar algo que seja um avanço para os trabalhadores, eu diria... Eu gostava muito de dizer - eu gostava e continuarei dizendo - que eu nunca fui pessimista. Eu sempre sou um otimista que entende que vale a pena fazer o bom combate, enfim, na expectativa de vitória, mas - e não vou usar o termo "pessimista" - eu estou triste com o quadro que estou vendo e que nos será apresentado aqui a partir do ano que vem.
Nesses dias, eu fui convidado para um jantar com os servidores públicos. Eles, animados, diziam: "Ainda bem que tu voltaste, Paim!" E eu disse: "É, mas só que não foi o projeto que eu defendo" - e não estou nem partidarizando -, "que são as políticas humanitárias, que é o social, que são os direitos dos trabalhadores, que é combater preconceitos, que ganhou. Esse projeto foi derrotado". E digo mais: quem ganhou não mentiu. Quem ganhou não mentiu! Quem ganhou disse que iria fazer isso. E era até mais radical no discurso, porque está atenuando um pouco agora. E a maioria votou!
Muita gente liga para o meu gabinete e manda mensagens, dizendo: "Eu me arrependi, pois é e tal..." Agora, meu filho, não dá para achar...
Estou aproveitando a sua pergunta para falar um pouquinho mais sobre isso, porque eu não tenho falado sobre isso. Eu tenho preferido não falar. Quando eu falo, eu defendo a democracia. A democracia é isto: entre vencidos e vencedores, que prevaleça a democracia! Foi o povo que optou assim. Só vamos torcer para que a gente não vá perder mais do que já perdeu até o momento.
Agora teremos muita dificuldade para aprovar algum projeto que signifique avanços mediante o quadro que está aí. É um sistema, na minha avaliação, global. A vitória de Trump lá fora se repetiu aqui, e todo mundo sabe como ele age lá. O projeto via "redes sociais" foi a grande vitória que esse lado obteve.
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Mas eu estou apenas refletindo. Eu sou um democrata, respeito a decisão das urnas, mas o povo tem que saber que ele escolheu esse projeto. O povo o escolheu. E eu sei muito bem que estou falando aqui para todo o Brasil. O povo o escolheu, e agora nós vamos ter que, neste momento da história, ver o que nós poderemos fazer aqui para perder menos. Infelizmente, essa é a vida.
Mas eu vou ler aqui, como é comum nesta Comissão... Esta nossa audiência de hoje teve em torno de 700 participações, e de algumas eu vou aqui fazer a leitura rapidamente.
Angélica Jesien, do Rio Grande do Sul, disse: "Retrocesso total. Representa um atraso nas conquistas dos trabalhadores como indivíduos que exercem a sua cidadania através do trabalho. Agora, só nos resta penar nas mãos dos grandes grupos". Não tem nada a ver com a minha fala; isso estava aqui na mesa já. Eu falei de improviso.
Sérgio Capozzi, de São Paulo, afirma: "Sou a favor da reforma. Precisamos de um compromisso entre flexibilidade, que gera mais empregos, e melhora de salários e segurança, que assegure direitos básicos ao trabalhador". É outra opinião.
Diz Welington Luiz, de São Paulo: "A reforma trabalhista retirou direitos e, pior, dificultou o acesso à Justiça do Trabalho, tornou o processo caro para o trabalhador". É aquele princípio de que, se entrar com uma ação e se perder, tem que pagar. "A reforma beneficiou transnacionais. Faltou ponderação. Revogar já."
Até a assessoria me informou que chegou uma SUG aqui, com mais de 20 mil assinaturas, propondo a revogação dessa reforma, que virá, é claro, para esta Subcomissão, em que eu estou na relatoria.
Marlon Tadeu, da Bahia, diz: "A reforma tem que ser feita realmente, mas não dessa forma. A terceirização total, por exemplo, reduz direitos, muitas vezes os encargos não são recolhidos, e favorece o trabalho escravo".
Thais do Nascimento, do DF, afirma: "Se for para ter uma reforma trabalhista em que todos os setores sejam afetados, não é admissível que se suprimam direitos adquiridos após tantas lutas e desvalorização do povo brasileiro".
Carlos Eduardo, de Mato Grosso do Sul, diz: "O Brasil está na contramão do mundo, com uma lei arcaica, muitos direitos e poucos deveres ao trabalhador, o empresário que fica com toda a carga tributária, e isso dificulta as contratações".
Eu leio todas, pessoal, a favor ou contra.
Michel Borsatti, do Pará: "Devemos fazer essa reforma trabalhista urgente. Diminuir os encargos significa menos pessoas na informalidade". Aqui se provou o contrário, só para lembrar a ele. "Mais condições de o empregador contratar novos funcionários, aumentando as vagas de emprego."
Sílvio Roberto... Não, primeiro é a Aline.
Diz Aline Palla, do Paraná: "Não compactuo com a retirada de direitos dos trabalhadores, pois isso não aumentou contratações, apenas explorou mais ainda a mão de obra. Direitos conquistados não devem ser perdidos!".
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Sílvio Roberto, que é o último, do Rio Grande do Norte, diz: "A reforma trabalhista ainda não deu os resultados esperados em decorrência da [...] crise econômica, mas foi uma ação positiva do Governo [Temer, nesse caso]".
É como eu faço sempre, e aqui há manifestação para todo gosto. Há gente que defende uma reforma trabalhista, alguns dizendo que, com a reforma, teríamos mais empregos formais, o que não aconteceu - só aumentou, por todos que falaram -, e outros estão na expectativa de que, no futuro, tenhamos algumas melhoras nesse campo do mundo do trabalho.
Eu já abri a palavra para os três que havíamos combinado e, consequentemente, vou encerrar. Mas em respeito... Eu tinha que dar o gancho, mas, em respeito ao nosso líder, que também é da Anamatra, que tem sido sempre aqui um defensor das causas dos direitos do trabalhador, eu concedo a ele a palavra.
O SR. PAULO DA CUNHA BOAL - Serei muito breve, Senador.
Entre os tópicos abordados - vários foram apontados -, acho importante até desmistificar a ideia de que a Justiça do Trabalho tinha um volume muito grande de ações. Nós temos uma competência muito ampla hoje na Justiça do Trabalho e recebemos, no ano de 2015, três milhões de processos, algo em torno de três milhões de processos. No mesmo ano - isso se deu em 2016, perdão -, houve 344 mil ações de divórcio no Brasil, ou seja, 10% do volume. Consideradas as modalidades de relações e a facilidade de se romper um contrato de trabalho, o que é diferente de um casamento, percebemos que o volume de ações não é assim tão exagerado. No mesmo período, nós tivemos 4,8 milhões de ações nos juizados especiais, estaduais apenas, sem contar quase três milhões no Juizado Especial Federal. Todas elas, ou a grande maioria, tratavam de ações de consumo, em que temos dez maiores litigantes, sendo eles bancos e empresas de telefonia. Nesse paralelo, a ausência de fiscalização efetiva dos prestadores de serviços, sejam bancos ou sejam empresas de comunicações, é o que permite esse número assombroso de ações, quase cinco milhões de ações no juizado especial.
Na Justiça do Trabalho, eles optaram simplesmente, em vez de fiscalizar o empregador, por dificultar o acesso do trabalhador. Se nós formos pensar isso em direito do consumidor, em breve nós teremos restrições também no Código de Defesa do Consumidor ou no acesso desse consumidor aos juizados especiais. No juizado especial, não há custas e não há honorários em primeiro grau, o que foi inserido na reforma trabalhista para os nossos trabalhadores, tratando-os de forma muito diferente. Aqui, no Brasil, se o Bill Gates, hoje o segundo homem mais rico do mundo, quiser entrar com uma ação no juizado especial, ele não vai pagar custas nem honorários. Em compensação, um trabalhador intermitente que recebe R$4,26 por hora corre o risco de pagar honorários e custas.
É esse tratamento desigual, esse tratamento desumano que eu acho que a matemática e os números nos fornecem. O objetivo efetivo da reforma trabalhista foi negar o acesso do trabalhador à Justiça do Trabalho. Não se fala em controle dos empregadores, inclusive diminuindo muito a capacidade fiscalizatória dos auditores fiscais, seja através da diminuição do número de auditores, da não contratação para o preenchimento de cargos, seja simplesmente pela morte por inanição, não fornecendo equipamentos, não fornecendo carros, não fornecendo diárias.
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O Brasil que se pretende através da reforma é este: um País em que não se fiscaliza, em que não se punem os efetivos litigantes ou os que causam a litigiosidade e em que simplesmente se nega acesso. Imagino que, em breve, nós teremos também essa limitação ao Código do Consumidor, já que atende basicamente dez grandes empresas do Brasil.
Muito obrigado, Senador. Peço perdão por ter me estendido um pouquinho.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Não, não, ficou no tempo.
Antes de terminar, pessoal, eu só queria convidar todos os que puderem para, hoje, às 15 horas, apesar dessa minha tristeza... Eu continuo dizendo que não sou pessimista, que entendo que sempre se deve mostrar que é possível que as mudanças aconteçam não para o mal, mas para o bem. Hoje, às 15 horas, na Câmara - coordeno a Frente Parlamentar em Defesa da Previdência Pública -, nós teremos uma reunião para analisar o quadro que se apresenta aí, com essas ponderações que alguns fazem, de querer aprovar parte da reforma neste ano. Com certeza, ela virá o ano que vem. Isso vai atingir todos os trabalhadores, com certeza absoluta.
Eu, ontem, recebi um documento sobre como foi a reforma no Chile e como é a situação atualmente: há um desespero total lá. Fiz a leitura desse documento e o comentei na tribuna. O número de suicídios entre os idosos entre 70 e 80 anos é alarmante. Depois que falei, depois que fui embora, uma pessoa do Chile me ligou se colocando, inclusive, à disposição para vir ao Brasil para falar sobre o que foi essa reforma e como é que está a vida deles agora. Passaram-se já 21 anos, e há um desespero total. Eles sonham com o retorno à situação anterior à reforma, a como era antes. Lá a previdência foi privatizada, funciona o sistema de capitalização.
Não vou falar mais sobre isso, senão vira uma palestra sobre previdência. Hoje à tarde, teremos essa reunião, e seria importante que todos pudessem participar, porque... Será assustador se quiserem, de fato, implantar a reforma da previdência nos moldes da reforma do Chile. O Chile, eu dou como exemplo, porque foi o documento que eu recebi.
Enfim, amigos, muito obrigado por tudo. Não esqueçam: o pessimista é derrotado por antecipação. A minha fala aqui foi um alerta.
Vida longa à democracia! Com a democracia, tudo; sem ela, nada!
Está encerrada a audiência pública.
Obrigado a todos vocês. (Palmas.)
(Iniciada às 9 horas e 18 minutos, a reunião é encerrada às 11 horas e 35 minutos.)