18/06/2019 - 20ª - Comissão de Meio Ambiente

Horário

Texto com revisão

R
A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA) - Havendo número regimental, declaro aberta a 20ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Meio Ambiente.
Antes de iniciar os trabalhos, proponho a dispensa da leitura e a aprovação das Atas da 18ª Reunião, realizada em 5 de junho de 2019, e da 19ª Reunião, realizada em 11 de junho de 2019.
Aqueles que concordam permaneçam como estão. (Pausa.)
As atas estão aprovadas e serão publicadas no Diário do Senado Federal.
Dentro da programação do Junho Verde - O Meio Ambiente Une, realizaremos hoje audiência pública, objeto do Requerimento nº 20, de 2019, com o tema “Desertificação: balanço das políticas para melhor uso do solo brasileiro".
A reunião será interativa e transmitida ao vivo e está aberta à participação dos interessados por meio do portal e-Cidadania na internet, em www.senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone 0800-612211.
A Secretaria trará à Mesa algumas perguntas para enriquecer o debate.
O relatório completo, com todas as manifestações, está disponível no e-Cidadania, assim como as apresentações que foram utilizadas pelos expositores.
R
Nos termos da Instrução Normativa nº 9, de 2017, da Secretaria-Geral da Mesa, a secretaria solicitará a degravação da presente reunião, para que as notas taquigráficas sejam anexadas à respectiva ata, de modo a facilitar a análise em projetos e ações futuras sobre o tema.
Na exposição inicial, cada orador usará a palavra por até vinte minutos e, antes de encerrarmos, poderá apresentar suas considerações finais em cinco minutos. A palavra será concedida aos Senadores inscritos para fazerem suas perguntas ou comentários em cinco minutos após a exposição inicial.
Antes de convidar os membros da Mesa, vamos falar um pouquinho sobre a desertificação, que é o tema da presente audiência.
A desertificação é a degradação da terra em locais onde já ocorre uma escassez hídrica, como é o caso do Semiárido brasileiro. Esse processo é resultado de vários fatores, incluindo as variações climáticas e as atividades humanas. Essa degradação da terra provoca a redução ou perda da biodiversidade, da produtividade econômica, da fertilidade do solo de terras agrícolas, de pastagens naturais ou semeadas, e alterações nos ecossistemas. Esse processo é acentuado pelos sistemas de utilização da terra e de ocupação do território. Mudar esse cenário é nossa tarefa.
O combate à desertificação é obrigação resultante da Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação, de 1994. Esse combate deve dar-se por meio do aproveitamento integrado da terra, promovendo o desenvolvimento sustentável. Considerando as pressões sobre as populações impactadas pela seca, incluindo os efeitos migratórios associados à desertificação, é fundamental discutimos como viabilizar a recuperação das terras degradadas, o gerenciamento da escassez de água nas regiões afetadas e o desenvolvimento de novas economias adaptadas ao Semiárido. Nesse sentido, convocamos esta audiência pública com especialistas sobre o tema, para que possamos trazer esclarecimentos sobre a desertificação e a degradação do ambiente e, assim, orientar novas ações do Poder Legislativo. Espero que este evento seja de grande proveito para as discussões nesta Comissão de Meio Ambiente.
Nós vamos, então, convidar para compor a Mesa o Daniel Fernandes Costa, que é Coordenador Executivo da Associação Caatinga. (Pausa.)
Também convidamos para compor a Mesa o Sr. José Artur de Barros Padilha, Diretor da Ceralpa (Cooperativa de Energia e Desenvolvimento do Alto Pajeu) e da Base Zero da Ecologia. (Pausa.)
Também convidamos para compor a Mesa o Francisco Campelo, Analista Ambiental da Superintendência de Pernambuco do Ibama. (Pausa.)
Também foi convidado para estar conosco, mas, por motivo de saúde, não pôde estar presente, o Sr. Gertjan Beekman, do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura. (Pausa.)
R
Nesta primeira parte da audiência pública, nós estaremos aqui passando a palavra aos nossos convidados. Cada um terá o prazo de até 20 minutos para fazer a sua exposição inicial.
Com a palavra o Sr. Daniel Fernandes.
O SR. DANIEL FERNANDES COSTA (Para exposição de convidado.) - Bom dia a todos e a todas. Gostaria de cumprimentar e agradecer o convite da Comissão de Meio Ambiente do Senado na pessoa da Senadora Eliziane Gama. É muito honroso para mim, que represento a Associação Caatinga, estar do lado de pessoas tão gabaritadas como o José Padilha e o Chico Campello, que são referências no combate à desertificação no Semiárido brasileiro. Então, muito obrigado por poder partilhar este momento com vocês. A responsabilidade só aumenta, está bom, Chico?
Eu faço parte da Associação Caatinga. A Associação Caatinga é uma ONG ambientalista que há mais de 20 anos atua na proteção do bioma Caatinga. Nós temos uma atuação nos Estados do Ceará e Piauí de uma forma mais incisiva e a nossa missão é promover a conservação das terras, florestas e águas da Caatinga para garantir a permanência de todas as formas de vida, portanto, diretamente ligado ao combate à desertificação.
Aqui eu trago um pouco do mapa dos biomas brasileiros. A gente vê a Caatinga ocupando cerca de 11% do Território nacional. São 28 milhões de brasileiros vivendo no Semiárido e que precisam de uma atenção toda especial para que a gente possa promover a convivência com o Semiárido. A seca, como já é sabido de todos, é um fenômeno natural, que inclusive já foi retratada na literatura de José de Alencar e Rachel de Queiroz. Então, a gente tem que tirar condições de convivência e não de combate à seca.
Esse é o estereótipo da grande mídia, que a gente aprendeu nos livros sobre a Caatinga, que a Caatinga não tem biodiversidade, que não tem riqueza e isso é o que infelizmente é sempre retratado. Claro que esse lado existe, mas, comparado com outros biomas de regiões semiáridas do mundo todo, é a região mais biodiversa. Então, trouxe esse eslaide com algumas informações da fonte do Ministério do Meio Ambiente com o número de espécies tanto de fauna e de flora que nós temos no bioma.
E aí é uma transição das imagens na Caatinga no período seco e depois no período chuvoso.
Desertificação. Dentro da Lei da Política Nacional de combate à desertificação, eu trouxe esta definição: degradação da terra nas zonas áridas, semiáridas e subúmidas secas, resultantes de vários fatores e vetores, incluindo as variações climáticas e as ações antrópicas, as ações do homem.
Aqui é o mapa do Estado do Ceará.
O Estado do Ceará está 100% suscetível a um processo de desertificação. De todo o seu território, cerca de 12% já estão em acelerado processo de desertificação. Nós temos três núcleos de desertificação: que é a região de Irauçuba, a região dos Inhamuns e a região dos sertões de Canindé. Então, são núcleos em que a gente já encontra terras extremamente improdutivas, problemas sociais graves, econômicos e ambientais. As pessoas acabam não tendo oportunidade para prover seu próprio sustento e aí acabam migrando para os centros urbanos, no caso, para Fortaleza e região metropolitana, agravando os problemas sociais.
R
Aqui, um pouco das causas da desertificação. A principal delas, no meu modo de entender, é o desflorestamento, o desmatamento da Caatinga. Hoje, a gente já chegou a mais de 50% de perda da cobertura vegetal original do bioma, e esse desmatamento é muito acentuado em virtude uma matriz energética, no Nordeste, muito concentrada na lenha. As pessoas utilizam a lenha, algumas indústrias do polo de cerâmica e gesso também a utilizam abundantemente, e temos pouco planos de manejo florestal no bioma Caatinga.
As queimadas também são atividades que ajudam a acentuar o processo de desertificação, assim como o pastoreio excessivo e a densidade populacional - como eu disse anteriormente, são 28 milhões de brasileiros demandando recursos de hídricos, e recursos hídricos que são limitados naturalmente no Nordeste, como é a água -; a mineração; o uso intensivo do solo na agricultura; e a matriz energética, como eu disse anteriormente.
Aqui, algumas consequências: a gente tem uma queda na produção e na produtividade agrícola; nós temos um agravamento dos problemas sociais através de uma migração da zona rural para a zona urbana; o assoreamento de rios e reservatórios através do processo de erosão; a gente tem uma acentuada perda de biodiversidade, tanto da flora quanto da fauna; perda de solo pela erosão.
Esse dado da ONU que eu trouxe aponta que, até 2045, cerca de 135 milhões de pessoas poderão ser deslocadas, no mundo todo, em virtude do processo de desertificação, que causa mais mortes e desloca mais pessoas do que qualquer outro fenômeno ou desastre natural. Então, a gente está diante de um problema muito sério para o qual nós precisamos, realmente, implementar políticas públicas que façam frente à desertificação.
E, aqui, alguns exemplos que a gente pode implementar na prática para amenizar o processo de desertificação no Semiárido brasileiro: a gente tem a promoção de uma agricultura familiar em bases ambientalmente mais sustentáveis; nós temos a disseminação de tecnologias que possibilitam a convivência do sertanejo, do homem do campo com o bioma de uma forma sustentável; a criação de novas unidades de conservação - a gente precisa aumentar a quantidade de áreas preservadas na Caatinga; planos de manejo florestal e restauração florestal.
A ONU estabeleceu que a próxima década, de 2021 a 2030, é a década de recuperação dos ecossistemas. Então, a gente precisa implementar essa política pública e aderir a essa agenda ambiental global.
Ainda: o PSA. A gente precisa, no meu modo de entender, estimular a conservação da natureza através de incentivos econômicos, e o PSA é um exemplo concreto. E políticas públicas de proteção da Caatinga.
No que tange a políticas públicas, eu trouxe, nesta apresentação, dois exemplos. Na Constituição Federal, no art. 225, que trata dos biomas brasileiros, a Caatinga e o Cerrado, infelizmente, foram esquecidos e não foram reconhecidos como patrimônio nacional. Existe uma PEC - a PEC nº 504/2010 -, tramitando no Congresso Nacional, para reconhecer esses dois biomas como patrimônio nacional, e isso vai ajudar na implementação de uma série de políticas públicas. É como se esses dois biomas não tivessem certidão de nascimento. São biomas que ocupam mais de 30% do território nacional. Essa PEC está tramitando e, a partir da sua promulgação, certamente outras leis de proteção da Caatinga surgirão.
R
Outro exemplo que eu trago, concreto, de uma política pública que estava em andamento, mas que não temos uma atualização, não sabemos como está o andamento disso, é um decreto de conversão de multas ambientais estabelecidas pelo Ibama. Talvez o Chico Campello possa falar um pouco mais sobre isso. Foi lançado no ano passado o primeiro edital, o primeiro chamamento público. E foram duas chamadas. Uma chamada foi para o Rio São Francisco com ações de restauração florestal e proteção de nascentes no trecho em que mais chove no São Francisco, justamente para promover a segurança hídrica e fazer frente a esse processo de desertificação. E a chamada dois foi para a região do Rio Parnaíba que engloba tanto o Estado do Ceará como o Piauí para implementação de URADs (Unidades de Recuperação de Áreas Degradadas). São tecnologias sociais que harmonizam a convivência do sertanejo, do homem do campo com o bioma, fazendo com que ele explore o bioma de uma forma sustentável. Então, são políticas públicas que, no modo de entender da Associação Caatinga, sendo implementadas, ajudarão bastante nesse processo de combate à desertificação.
Falando um pouco sobre a nossa atuação no bioma Caatinga, atuamos através de conservação, estimulando a criação de unidades de conservação, de educação ambiental, de restauração florestal, de disseminação de tecnologias sociais, de estímulos a políticas públicas de proteção da Caatinga, de fomento à pesquisa - o bioma Caatinga, comparado com os outros biomas, é o bioma menos estudado, e, então, precisamos também fomentar a pesquisa científica para combater a desertificação - e de comunicação. A gente busca trazer uma informação, uma valorização do nosso bioma.
Este foi o nosso primeiro projeto que é Reserva Natural Serra das Almas, que é um modelo integrado de conservação da Caatinga. O Chico Campello conhece desde a origem. Ela está situada em Crateús, na divisa entre Ceará e Piauí. A gente atua com 40 comunidades rurais no entorno da Reserva Natural Serra das Almas, que é uma unidade de conservação na modalidade RPPN. Aqui está uma imagem aérea. A gente faz o monitoramento com armadilhas fotográficas da fauna, da biodiversidade. É uma imagem aérea da Caatinga cearense no período chuvoso. É uma área de 6.200 hectares na unidade de conservação. É outra imagem de outra estrutura da Reserva Natural Serra das Almas. Aqui mostra um pouco da nossa área de atuação. A gente atua em Crateús, que fica a 400km de Fortaleza. A reserva está a 50km de Crateús. Crateús está dentro de uma das áreas susceptíveis à desertificação no Estado do Ceará. Por isso, essa unidade de conservação foi implementada nessa região. Esses pontinhos pretos são 40 comunidades sinalizadas nas quais a gente atua diretamente, levando educação ambiental, tecnologias sociais de convivência com Semiárido.
Um pouco aí da transição. Caatinga significa, no tupi-guarani, mata branca por esse aspecto. Como uma forma de adaptação, as folhas caem para perder menos água ficando esse aspecto esbranquiçado.
Um pouco da biodiversidade da Caatinga.
Monitoramento de fauna que a gente realiza na Reserva Natural Serra das Almas. A gente só não tem ocorrência de onça-pintada, mas todos os outros felinos da Caatinga a gente encontra na reserva.
Um programa que a gente desenvolve é o programa de criação de unidades de conservação. O Estado do Ceará hoje tem 36 RPPNs, que são reservas privadas. Criadas com o apoio da Associação Caatinga, foram 24 dessas 36. Então, a gente mobiliza a sociedade para criação de novas unidades de conservação para fazer frente a esse processo de desertificação.
R
O tatu-bola é uma espécie de bandeira da instituição, foi o mascote da Copa do Mundo justamente para a gente trazer atenção na proteção do nosso bioma. (Pausa.)
Aqui é o cânion do Rio Poti, é uma área de beleza cênica incrível que a gente também ajuda a preservar. Nós, em parceria com o Governo do Estado do Piauí, criamos o Parque Estadual do Cânion do Poti, uma área de 24 mil hectares de Caatinga preservada, também nessa estratégia de diminuir o risco de desertificação na região.
E aqui é um pouco do contexto social que a gente aborda. A gente precisa criar alternativas de convivência com o Semiárido.
Aqui, é a Dona Elizabete recebendo um fogão ecoeficiente. É uma tecnologia que consegue reduzir o consumo de lenha em até 50% e que tem um aspecto interessante: uma chaminé que vai expelir toda a fumaça para fora de casa. Percebam que antes ela tinha um fogão tradicional, e olhem como está o estado do telhado. Naturalmente o pulmão dela deve estar na mesma forma.
Então, é uma tecnologia relativamente barata e muito bem aceita pelas comunidades. (Pausa.)
O antes e o depois.
A gente trabalha com comunidades abaixo na linha de pobreza, então a implementação de uma tecnologia dessa gera um impacto social e ambiental muito forte.
Cisterna de placa também é uma alternativa para captação de água de chuva. A gente consegue armazenar até 16 mil litros de água para que as pessoas possam ter uma água de qualidade durante o período de estiagem. (Pausa.)
Aqui é o Moacir com as suas abelhas. Essa é a abelha Jandaíra, uma abelha nativa da Caatinga que não tem ferrão, por isso ele está muito feliz aí com as abelhas circundando, e a gente estimula a criação dessa abelha nessas 40 comunidades em que a gente atua, com a perspectiva de gerar um ecodesenvolvimento. É um ciclo virtuoso: O Sr. João, para que ele possa ter um retorno financeiro maior com a venda do mel, precisa manter a vegetação em pé, precisa manter a floresta em pé, porque vai aumentar a área de alimentação na abelha e a abelha faz o seu papel de polinização, ela presta um serviço ambiental. Então, é um ciclo virtuoso: em vez de produzir carvão, desmatar a Caatinga, ele vai criar abelha e ter uma geração de renda.
Aqui são algumas imagens da abelha Jandaíra.
Aqui é o meliponário que nós temos na Serra das Almas, a gente capacita, treina as comunidades e depois entrega gratuitamente essas colmeias e faz todo um monitoramento... Nós não cortamos o cordão umbilical, a gente acompanha por no mínimo dois anos com a assessoria técnica.
Outra tecnologia que a gente leva para o Semiárido é o forno solar. As famílias conseguem preparar seus alimentos sem gerar impacto ambiental; a gente aproveita a luz solar para cozinhar os alimentos.
A gente fez alguns festivais gastronômicos com as donas de casa, é uma tecnologia também muito bem aceita, com impacto zero no meio ambiente. O tempo de cocção do alimento aumenta um pouco, mas, em compensação, a gente não desmatar a Caatinga.
Uma outra ação que a gente desenvolve também é a gestão participativa do resíduo sólido. O resíduo sólido, nas comunidades com as quais a gente trabalha, era enterrado, contaminando o solo e o lençol freático ou, então, queimado, potencializando os efeitos do aquecimento global.
Então, hoje eles conseguem separar o lixo, o que pode ser reciclado eles levam para uma usina de tratamento do lixo, e isso gera renda também. E o composto orgânico eles utilizam em composteiras coletivas para a agricultura familiar.
R
Outra tecnologia que a Associação Caatinga também leva para o Semiárido é o Sistema Bioágua, um sistema de reutilização de água cinza - a água do chuveiro das nossas casas, da torneira da pia da cozinha. Essa água passa por um processo de filtragem e pode ser utilizada para produção de alimentos. A gente instala um hidrômetro. Em média, cada família reutiliza, por dia, 400 litros de água, e eles acabam produzindo alimentos. Então, a gente promove, em uma ação só, segurança hídrica, reutilização de água, produção de alimentos e também geração de renda, porque o excedente eles comercializam entre si e nas feiras do Município.
As atividades de educação ambiental também precisam ser norteadoras para a gente fazer frente ao desmatamento na Caatinga, ao processo de desertificação. Eu acho que a gente precisa de esclarecimentos e levar isso para os educadores, para que eles possam ser agentes de disseminação. A gente tem capacitado uma série de professores na região e promovido alguns cursos - esse, no caso específico, foi sobre resíduos sólidos.
Aqui é uma exposição de banners e de animais que a gente leva para as escolas, para as universidades, para as empresas, nessa perspectiva de valorizar a Caatinga e de mostrar para as pessoas que a gente precisa conhecer a nossa riqueza para poder preservá-la.
Outra ferramenta de educação ambiental é uma exposição itinerante. A gente circula por várias cidades, por vários Estados com essa exposição, levando informações sobre a Caatinga.
Nós temos também um mascote do tatu-bola, que faz essa interação com as crianças.
Essa ação é bem interessante. Nós fazemos sessões de cinema. É o cine Tela Verde em comunidades rurais com filmes sobre a temática ambiental. Esses filmes que a gente leva também têm informações sobre desertificação, sobre uso correto do solo, sobre queimada controlada. E a gente promove depois de uma roda de conversa com essas comunidades para que a gente possa solucionar os problemas locais.
Produção de mudas é uma linha de atuação. A gente faz a restauração florestal de áreas degradadas também.
Aqui é uma comunidade fazendo plantio de algumas mudas.
Em 2014, por esse conjunto de ações, nós recebemos o prêmio Dryland Champions da Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação, que, inclusive, foi entregue pelo Chico Campelo.
A gente tem desenvolvido - meu tempo está acabando - uma série de ações, conforme eu pude passar para os senhores e as senhoras, em prol da preservação do bioma Caatinga. A Caatinga, como eu falei anteriormente, já teve mais de 50% da sua cobertura vegetal desmatada. Então, isso acentua o processo de desertificação. Estudos da ONU apontam que...
(Soa a campainha.)
O SR. DANIEL FERNANDES COSTA - ... em 20 anos, a gente pode ter cerca de um 1,8 bilhão de pessoas passando por severos problemas de acesso à água, e a floresta está diretamente ligada à produção hídrica.
Então, o meu recado é que a gente tenha ações concretas para a proteção da Caatinga, do meio ambiente, como um todo.
A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA) - Você quer ainda mais um tempo para concluir ou já terminou?
O SR. DANIEL FERNANDES COSTA - Se eu puder ter mais um minutinho...
A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA) - Tudo bem.
O SR. DANIEL FERNANDES COSTA - Obrigado, Senadora.
R
A Associação Caatinga nasceu em outubro de 1998. A gente atua no terceiro setor com esta perspectiva de mobilizar a sociedade em prol da conservação do bioma Caatinga. Existem outras tecnologias de convivência com o Semiárido, e acredito que os amigos palestrantes vão trazer também. A gente também atua no Semiárido nordestino, que promove essa convivência harmoniosa.
Eu acho que a gente tem que criar condições para que o homem do campo se fixe na sua região. Se a gente fizer uma enquete, as pessoas que habitam o Semiárido não querem ir para os grandes centros urbanos; elas querem ter dignidade e oportunidades no campo. Para isso, as ações de proteção do meio ambiente e de uso sustentável precisam ser amplamente disseminadas e levadas para essas comunidades rurais.
É só isso.
Muito obrigado a todos e a todas pela atenção.
A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA) - Muito obrigada Daniel. (Palmas.)
Vamos passar agora a palavra ao Sr. José Padilha.
O SR. JOSÉ ARTUR DE BARROS PADILHA - Bom dia a todos e a todas. É um grande privilégio, Senadora Eliziane Gama, demais presentes.
Acho da maior importância que a gente possa ter eventos como esse, em que haja uma semeadura, especialmente de uma questão que eu acho que está na base de qualquer tentativa de evolução positiva no interesse social, que é a evolução da consciência.
Eu tenho que dizer aos senhores que me considero um circunstancial nessa questão. Eu tenho como formação engenharia mecânica e dediquei boa parte da minha vida à refrigeração e à climatização artificial, portanto à produção de frigoríficos, a climatizações de hospitais, enfim. É uma atividade sofisticada essencialmente lidando com energia.
Então, nesse sentido, eu gostaria de pontuar que a minha forma de enfocar a questão semiárida, antes de mais nada, é muito otimista. Estou convencido de que o Semiárido brasileiro está definitivamente com a possibilidade aberta de se tornar uma potência produtiva e social. Isso, aparentemente, é um raciocínio que a gente pode desenvolver aqui com a maior simplicidade.
Precisamos nos lembrar que, antes, tudo era deserto na Terra. Portanto, se há 500 anos, quando chegaram aqui os colonizadores, encontraram ainda uma situação igualzinha à que estava no estágio de evolução, que, a cada ano, melhorava mais o bioma de qualquer bioma - o Amazônico, o Cerrado ou o da Caatinga -, nesse intervalo curto, a atuação antrópica é de nossa responsabilidade, pois nós fizemos grande parte disso.
Nós tivemos o papel de induzir. Esta que eu acho que é a grande animação: o ser humano não tem maior poder; o poder do ser humano é sempre ser simplesmente o indutor. O grande elemento de construção é a natureza. Energeticamente, isso já foi mensurado de maneira científica perfeitíssima. Existem livros maravilhosos sobre essa questão. Eu gostaria de destacar, de saída, os livros do Howard Odum, dos Estados Unidos, que fez aqui uma belíssima conferência no Brasil, em 1977, portanto, três anos depois do choque do petróleo. E fica muito evidente esse poder. O poder é simplesmente o seguinte: para cada uma unidade ação energética do ser humano, a natureza contrabalanceia com 10 mil unidades. Então, imagine o que é o ser humano poder recuperar hoje o bioma Caatinga ou qualquer outro, o Cerrado, quando a ação humana se resume a um e a natureza entra com 10 mil. Então, é a sociedade altamente vantajosa - nós temos um grande sócio.
R
Eu vou tentar seguir agora o que foi elencado. O Junho Verde, o Meio Ambiente Une, belíssima provocação; e desertificação, um tema da maior importância de ser eleito.
Passe ao seguinte. (Pausa.)
Eu vou pedindo, você vai passando?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. JOSÉ ARTUR DE BARROS PADILHA - Próximo.
Então, a nossa questão e problema geral em imagens: a desertificação. Vamos ver como ela está.
Seguinte.
No mundo...
Por favor.
Observem que este é o retrato de o que está acontecendo de desertificação e não é só de 500 anos para cá. Evidentemente, em outras partes do mundo, isso começou antes. Mas essa é uma ameaça, porque isso significa dois terços do Território continental mundial.
Seguindo.
Sintomas principais da questão e do problema: são as erosões. Como elas se apresentam, por exemplo, em qualquer lugar do mundo?
Pode passar.
No Brasil é terrível; no Semiárido, então... A identificação da questão erosão no Semiárido está longe de ser percebida, porque ela é simplesmente mortal, ela tira o elemento vital, que é a questão da água contínua no ano todo. O Semiárido tem quatro meses de chuva por ano em média e oito meses seco. E acontece que a vida não tem intervalo, a vida são 12 meses. Então, como a natureza resolveu a questão?
Pode passar para o seguinte.
Esse é o território.
Pode seguir.
Quais são os sintomas das erosões no Semiárido?
Seguindo.
Observem: este é o Rio Ipanema, entre Pernambuco e Alagoas.
Passando.
Outras questões no Moxotó, no Pajeú ou no Rio Paraíba, em Itabaiana.
Seguindo.
E aí 20 outras situações. Lamentavelmente, o tempo não permitiria que a gente fosse ver em detalhe. O que isso significa? Isso significa aquilo que eu acabei de falar: uma ação de 10 mil da natureza, induzida por uma ação única do ser humano que fez com que se tivesse uma super energia, tirando o elemento de vitalidade global, porque nós precisávamos ter a vida produzida como comida durante quatro meses - são os quatro meses da chuva -, mas a água de beber tem que durar doze meses.
R
E como foi que a natureza resolveu isso? Muito simples. O encontro que houve em 1974 nos Estados Unidos reuniu países do mundo inteiro. Em 1974, vocês lembram, o Brasil não estava sendo muito bem-visto, o ambiente acadêmico, e o Brasil não compareceu. Esse encontro teve o título "Mais água para as terras secas". Esse documento - e eu tive o privilégio de receber de presente de Vasconcelos Sobrinho uma cópia desse documento - mostra exatamente o "x" da questão. Qual é? É que, no ambiente semiárido ou em qualquer outro ambiente, só evapora do solo aquela água que estiver umidificada no solo até, muito discretamente, com 60cm profundidade. Então, se essa mesa fosse a superfície do solo, 60cm depois, água quase não consegue mais romper e evaporar. Se for a 1m, é zero, não evapora mais nada. Segundo detalhe é que, durante centenas de milhões de anos... E nós estamos referindo a 9 mil anos de existência da nossa civilização, o tempo que seria do ser humano aqui, aí centenas de milhões de ano, naturalmente, é um tempo muito maior. E o que foi que a natureza fez? Ela construiu todo um processo de organização hídrica - porque, sem água, não há vida - do Semiárido. Como? Criou na parte baixa... E a gravidade está permanente, tudo no mundo cai, a gente sabe disso, a gravidade está permanente o tempo todo. Então, o que acontece sistematicamente? Todo dia, o sol durante 12 horas aquece todo o território, 100% de qualquer unidade territorial, que são normalmente as bacias hidrográficas... E eu hoje estou propondo, como engenheiro e também hoje como membro da Academia Pernambucana de Engenharia, que a gente mude o nome para bacias energéticas... A mesma linha que define uma bacia hidrográfica é a mesma que recepcionou o raio solar, a insolação, portanto, e, à noite, é o mesmo território que esfria. Então, durante o dia, aqueceu e dilatou; esfriou, à noite, e contraiu; dilatou, contraiu, dilatou, contraiu; racha e quebra, portanto, fratura. Desse modo, existe um trabalho permanente, ininterrupto por séculos, milênios, fazendo a formação da lógica da vida. Então, quando acontecem as chuvas sazonais e os ventos, esse fraturamento é todo carreado, naturalmente por gravidade, porque a gravidade está presente, como a gente acabou de ver, em todas as situações. E, a partir daí, o que a natureza fez também? Antes, quando havia vulcões e não havia chuva, ela criou diques em forma de arcos romanos, igualzinho a uma lua em quarto crescente ou minguante, de tal maneira que o lombo da lua fica sempre voltado para as nascentes. E, com isso, ela formou todos os baixios do Planeta. E aí o que foi que esse estudo nos Estados Unidos em 1974 constatou? É que os grãos que formam os baixios são pó na superfície, mas, lá embaixo, a 10m, a 15m de profundidade, como é no Rio Jaguaribe ou no Rio Pajeú ou no Rio Moxotó ou em qualquer outro rio, são blocos enormes. Portanto, esse arranjo tem vazios. E de quanto é o volume desses vazios? É de um terço. Portanto, o Semiárido é uma grande caixa d'água a salvo da evaporação. Agora, ela está restrita a 4% do território aproximadamente. A um metro, é uma caixa d'água tampada. Ela não evapora nada, é zero. Isso está disponível ao ambiente acadêmico, científico. Na hora em que a gente compreender isso e compreender que essa energia toda está a serviço da vida, a serviço da recuperação geral, então eu acredito - não sei se vou ver, já estou com 77 anos, não sei dá tempo - que o Semiárido pode ser restaurado em dez anos, completamente, porque não é a ação puramente do Estado - Estado federal, estadual ou municipal. É principalmente a ação natural, a ação energética nessa relação de dez mil para um. Se nós tivermos a capacidade de nos mobilizarmos, como sociedade e Estado, em conjunto, e organizarmos isso de uma maneira simplíssima...
R
Eu lidei com coisas dificílimas, como fazer, por exemplo, a climatização do Senado, ou então de um grande hospital, o Hospital de Base, ou o Hospital Santa Joana em Pernambuco. Eu passei dois anos dentro do Hospital Santa Joana. E o que é a sofisticação de se fazer uma climatização artificial num hospital, onde uma infecção cruzada pode matar? A sala de cirurgia limpa é uma coisa, a de cirurgia suja é outra, a de terapia de queimados é outra, o lixo hospitalar é outro, o berçário é outro, o prematuro é outro. Ora, se a gente é capaz de fazer isso com alta tecnologia, e a gente tem tecnologia que faz o aeroporto de Brasília, essa maravilha, a gente não vai ter tecnologia de fazer essa coisa simples, de organizar a captura dessa energia natural? É claro que temos! Nós temos universidades maravilhosas, temos centros de ciência e tecnologia, de pesquisa, maravilhosos. Agora, lamentavelmente existe uma coisa chamada mudança de paradigmas. Thomas Kuhn nos disse que o nosso cérebro é tão malicioso que ele distorce aquilo que em que a gente não quer acreditar. Aquilo que não faz parte das nossas crenças, o cérebro dá um drible de Garrincha, e sem querer a gente fica cego, sem querer ver o novo, sem querer ver o diferente. Então, nessa essência, é isso aí.
Vamos, em seguida, prosseguir.
Efeito chamativo: o que foi que aconteceu? Então, eu vou pedir que acione ali embaixo, porque com a seca de 2012 - essa agora, que começou em 2012 e ainda está prosseguindo -, simplesmente quem saísse de Recife e fosse para Afogados da Ingazeira ia encontrar, na BR-232 até mais ou menos Cruzeiro do Nordeste, animais mortos de um lado e do outro, e os urubus voando. Por quê? Porque praticamente houve uma dizimação da pecuária por completo. Então, isso provocou uma matéria de jornal no Estado de S.Paulo e a Globo, o Globo Rural, captou. Então, foi um elemento chamativo.
Por favor, passe esse vídeo de quatro minutos.
Tem que voltar? Esse aí já é outro. Esse vídeo tem que voltar. Não pode ser com eslaide expandido não, tem que ser com o eslaide contraído. Você contrai o eslaide e clica em cima do vídeo, ali onde tem o amarelinho. Você contrai o eslaide e clica em cima do amarelinho. (Pausa.)
R
(Procede-se à exibição de vídeo.)
R
O SR. JOSÉ ARTUR DE BARROS PADILHA - Bom, ali nós vimos um efeito, digamos, provocativo, chamativo. Foi em consequência do desastre que estava acontecendo. Só que esse desastre tinha acontecido em 1997, 1998 e 1999, Governo Fernando Henrique Cardoso; Raul Jungmann, Ministro do Desenvolvimento Agrário. Nessa ocasião, houve uma iniciativa interessante, porque educacional - educação é a base de tudo, consciência é a base de tudo.
Então, vamos ver novamente um videozinho, que foi produzido também por uma instituição. No anterior, foi a Globo; neste, foi o Ministério do Desenvolvimento Agrário. É uma peça muito bem elaborada e que mostra um modo e, certamente, uma ferramenta a ser utilizada com certeza fazendo esse elemento de base, que é criar uma consciência do saber fazer. Essa é uma questão essencial.
Novamente, vamos mostrar esse vídeo.
(Procede-se à exibição de vídeo.)
R
(Procede-se à exibição de vídeo.)
R
(Procede-se à exibição de vídeo.)
R
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA) - Não, o senhor ainda pode fazer a finalização.
O SR. JOSÉ ARTUR DE BARROS PADILHA - Bem, eu acho que o que nós poderíamos mostrar de relevante, diante da disponibilidade do tempo, foi mostrado. Há, certamente, toda uma lógica operacional e que é fundamentalmente uma coisa educacional, mas simplíssima, que pode ser rapidamente disseminada por meio de um programa regional generalizado. Eu imagino que haja uma nucleação de cinco Municípios convergentes, de tal maneira que eles sejam todos vizinhos, e, em cada centro dessa convergência, escolher-se-ia uma unidade de demonstração.
Então, dos 1,2 mil Municípios, aproximadamente, do Semiárido, nós teríamos qualquer coisa como 600... Cerca de 1,2 mil divididos por cinco, seriam 600 aproximadamente... Não, desculpem, seriam 60... Não, também não são 60. Seriam 120 Municípios em cada conjunto e, portanto, distribuindo isso pelos Estados, conforme os Estados, naturalmente, tenham uma relação de nucleação, eu creio que é algo que pode ser feito, num primeiro momento de calibração, durante uns dois anos e, a partir da experiência recolhida nesses dois anos, eventualmente se faça uma ação mais abrangente e mais ousada.
O que eu acho importante considerar é o seguinte, e eu creio que ficou demonstrada uma coisa da maior importância: a ação principal não é feita com dinheiro; a ação principal é feita pela própria natureza, que se encarrega da grande restauração. Então, eu acho que termos a humildade de entender a dimensão humana e a dimensão natural é o ponto "x" da história. Um programa que tire da natureza tudo aquilo que ela, graciosamente, generosamente, nos dá: o sol de cada dia, o esfriamento de cada noite, as chuvas sazonais e os ventos. Então, esse é o milagre com o qual a gente poderia contar, e não vai faltar.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA) - Muito obrigada, Sr. José Padilha.
Nós vamos passar, agora, a palavra ao Sr. Francisco Campello.
O SR. FRANCISCO CAMPELLO - Bom dia a todas e a todos.
Primeiramente, eu queria parabenizar a iniciativa do Senado desse Junho Verde e, nessa iniciativa, a inserção do tema desertificação. E essa análise de políticas públicas para o solo, eu acho, é extremamente importante.
Queria saudar a mesa, na pessoa da Senadora Eliziane Gama, e parabenizar o Senador Fabiano e agradecer pelo convite. Muito obrigado.
Como os colegas que me antecederam aqui, eu acho que a gente vem passando por uma...
Eu vou olhar o meu tempo ali, porque, senão, eu me perco. (Risos.)
Na realidade, hoje, o que a gente tem aqui nesta Mesa é um reflexo de esforços que vêm sendo feitos há décadas por colegas e pelo que, hoje, vamos dizer assim, a gente tem o Brasil à frente, inclusive, nesse tema da desertificação, sendo um protagonista dentro da Convenção das Nações Unidas. A gente tem um histórico de pessoas que se comprometeram. Eu sou filho de um professor e papai, como professor - e ele foi meu professor -, exigia que a gente fizesse esse reconhecimento público. O colega falou aqui do Prof. Vasconcelos Sobrinho, mas a gente teve Guimarães Duque, que foi também uma pessoa que se dedicou muito e que já, nos anos 40, vinha chamando a atenção para o que hoje a gente fala, assim com tanta naturalidade, de uma revisão de não fazer o combate à seca, mas de estabelecer uma estratégia de convivência. Isso, na realidade, é fruto de um amadurecimento institucional e de compreensões que são extremamente desafiadores. Com o Prof. Vasconcelos Sobrinho tivemos a honra e o prazer de conviver e, de perto, aprender um pouco. Tivemos também dois colegas que eu acho que são extremamente importantes nesse contexto. Um é o Prof. João Ambrósio, que é um pesquisador da Embrapa, que faleceu há pouco. João Ambrósio fez uma inserção muito específica sobre o valor da Caatinga. Eu acho extremamente importante, já que a gente está falando de um ambiente onde essa vegetação é presente, a gente compreender o valor da Caatinga e o seu uso. Eu sou Engenheiro Florestal de formação - também o Prof. Padilha falou muito na abordagem do solo - e acho que a gente tem um componente importante que é também saber usar o que está em cima do solo.
R
Então, tanto o Prof. Vasconcelos Sobrinho como o Prof. João Ambrósio mostraram a importância de a gente saber usar essa biodiversidade. Eu acho que aí a gente tem um grande desafio na questão do combate à desertificação que é a gente romper com alguns paradigmas e superar alguns preconceitos. E o grande preconceito que a gente tem hoje nesse espaço Semiárido, onde os biomas Caatinga e Cerrado estão muito presentes, é justamente sobre o uso da biodiversidade.
Os colegas que me antecederam aqui chamaram a atenção sobre a questão energética no Nordeste. Mais na frente, vou fazer uma abordagem mais detalhada sobre isso. Mas a gente não consegue superar esta questão da participação da contribuição da biodiversidade no desenvolvimento regional se a gente não superar o preconceito do uso. E o preconceito do uso passa por um grande desafio, que é a gente ter um marco legal que, de fato, dialogue com a realidade socioambiental.
O Brasil tem um marco legal muito bom, mas que precisa - o Brasil é um País de dimensões continentais - atender a essas realidades específicas. Em algumas situações, a gente marginaliza o uso e aí, ao marginalizar o uso, a gente está promovendo o desmatamento. Então, a gente tem um desafio tremendo, porque, infelizmente, existem as pessoas que se aproveitam das fragilidades institucionais para se beneficiarem, mas a gente também precisa, de uma certa forma, ter coragem para enfrentar a questão do uso.
Eu vou pedir licença à Mesa e vou ficar em pé, pois fico inibido sentado. (Pausa.)
Bom, já de início, eu fiz questão de botar como um contraponto a esta questão da desertificação, o balanço das políticas para o melhor uso do solo brasileiro, a relação do homem com a natureza para uma melhor convivência sustentável com a nossa aridez. E aí eu vou fazer referência a dois colegas. A um, que está presente aqui, é o João Sávio, que é do Ministério do Meio Ambiente, e a outro, que é o Jaime, que são pessoas que vêm ajudando a gente a, de uma certa forma, consolidar esses conceitos. A gente precisa, de certa forma, aprender a trabalhar com o tema. Então, se a gente está falando de uma questão ambiental, a gente está falando da aridez. E essa relação do homem com a natureza, hoje, está muito presente em vários compromissos que nós temos para a questão da sustentabilidade.
R
Só fazendo uma referência ao Prof. Vasconcelos Sobrinho, ele já fazia uma observação muito pertinente sobre a questão da presença do recurso florestal como fonte de energia e, hoje, como várias outras formas. Porém, ele faz uma observação muito importante: mediante sábio manejo dos seus recursos naturais. Essa é sua provocação. O Dia da Caatinga no Brasil é 28 de abril, em homenagem ao Prof. Vasconcelos Sobrinho. Então, ele foi um homem que se dedicou a estudar a Caatinga. Foi a primeira pessoa a tratar o tema de desertificação. Ele reconhecia a importância do uso como estratégia de conservação.
Bom, só rapidamente, para a gente ver que existe, de fato, uma base legal que faz com que a gente possa dialogar sobre isso, começou na Rio-92, quando, vamos dizer assim, provocou a criação das três convenções: a do clima, a da biodiversidade e a da desertificação. Logo em seguida, há o Decreto Legislativo nº 28, de 1997, que aprova o texto da convenção. Depois, há um decreto do Executivo, em 1998, que promulga a convenção no País. E, mais recentemente, em 2015, a gente teve a Lei nº 13.153, que institui a Política Nacional de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos. Essa política traz na sua estrutura uma comissão que estabelece o processo de diálogo com a sociedade. Então, a gente tem uma base legal extremamente estruturada, que faz uma provocação de como a gente pode trabalhar as políticas públicas.
Bom, aqui é só para chamar a atenção de que nós não estamos isolados. Existem vários compromissos no mundo que provocam essa questão da busca pela sustentabilidade. A Caatinga é parte da reserva da biosfera. E as reservas da biosfera têm como estratégia estabelecer uma relação harmônica do homem com a natureza. É o que a gente aqui fala da convivência. E, hoje, mais recentemente, temos os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, que é uma provocação de como podemos nos desenvolver com uma base de sustentabilidade.
Bom, aqui é um contexto, um desafio à compreensão da sustentabilidade na convivência com a aridez. Até eu estou me corrigindo nesse sentido. Bom, como eu falei, a gente tem, de fato, que fazer uma superação. Nós temos uma base técnica - o Prof. Padilha fez referência a isso -, mas temos um problema seriíssimo de comunicação. Infelizmente, as iniciativas de uso direto da biodiversidade, às vezes, são percebidas de forma marginalizada por conta do medo que há sobre o uso. Então, às vezes, os agricultores familiares - estou falando de pequenos agricultores -, empresários, médios produtores que entram nesse ramo do uso sustentável passam por desafios monstruosos.
Eu sou do Ibama, sou Analista Ambiental, e a gente percebe que, na própria casa, a gente tem esse receio. Você aprovar um plano de manejo, que o colega fez menção... O que é o plano de manejo? É o instrumento técnico que estabelece a relação de uso sustentável em cima de 30 anos de estudos que a gente tem hoje na Caatinga. Mesmo assim, para você aprovar um plano de manejo dentro de um órgão ambiental, você leva, às vezes, três anos. Para você liberar um uso de uma área posterior, que já está licenciada, você leva dois anos. Então, como é que uma pessoa pode produzir num clima de tensão? E cada caminhão de lenha que sai para o mercado é alvo de 500 observações, e o instrumento do manejo florestal permite que a floresta seja usada sem destruir, sendo um dos grandes indicadores de combate à desertificação. Então, a gente tem nessa estrutura esses desafios. Temos a convenção que trata principalmente da questão da degradação da terra. A gente ainda não consegue entender. A gente, às vezes, ouve as pessoas falarem da seca como se fosse uma coisa que ocorreu por um acidente de percurso, às vezes, até culpando os santos, porque não deixam chover, mas a seca é parte integrante do espaço Semiárido, ela é um fenômeno natural e vai acontecer sempre. A gente vê nos países onde há inverno que existe toda uma estratégia já até milenar de convivência com aquela estação que não vai produzir e a gente, infelizmente, fica querendo que a seca seja uma coisa, assim, atípica e não é; a seca é natural do Semiárido, normalmente a gente vai ter oito meses sem chover. Às vezes, há uma seca mais prolongada. Ela é parte do sistema.
R
Pifou? Vamos ao plano "b" aqui. Vou ver se eu escapo. Vai ser uma pena, porque eu tinha colocado umas imagens para gente - como é que se diz? - poder entender um pouco. Eu venho até aqui. Parece que estão querendo...
Bom, então, uma coisa para que a gente estava chamando a atenção é essa questão de a gente ter que aceitar a seca como um fenômeno natural.
A questão do combate à desertificação passa, de fato, por uma mudança de paradigma. A gente tem que tratar de forma integrada, um processo de gestão ambiental. Então, não é só o quintal produtivo, não é só a cisterna, não é só o Base Zero, não é só o manejo da Caatinga, é um conjunto de esforços de uma gestão integrada dos recursos naturais. Então, isso é um desafio muito grande em termos de políticas públicas, porque normalmente as instituições trabalham cada uma com suas metas e com uma dificuldade de trabalharem de forma articulada.
O combate à seca, na realidade, passa por uma estratégia de convivência e isso hoje no espaço Semiárido está muito presente e já existe, de fato, uma consciência de que a gente precisa estabelecer estratégias de convivência.
O colega do Caatinga mostrou aqui uma série de iniciativas. Só para vocês terem uma ideia da importância dessas ações integradas e que, de fato, houve um esforço já nesse sentido de você ter ações de proteção socioambientais associadas a iniciativas produtivas, a gente passou um quadro de seca muito forte recentemente, e nós não tivemos nenhuma, vamos dizer assim, iniciativa de perturbação social como a gente viu em outros tempos: às vezes, pobre agredindo pobre - as feiras nas cidades, em época de seca, eram ameaçadas, porque o povo vinha e invadia a feira para comer. E quem é que está na feira? É um pobre, não é nenhuma multinacional. Então, a gente passou esse quadro de seca vendo iniciativas extremamente interessantes: eram agricultores levando o seu excedente do seu quintal produtivo para comercializar na feira. Então, isso foi muito positivo, porque a gente, com pequenas iniciativas, conseguiu estabelecer uma estratégia de convivência, e a população conseguiu, além de ter a sua sobrevivência, ainda incorporar renda por conta dessas pequenas ações. Era uma ação articulada entre a área social, a área da pequena produção, que era, no caso, o Ministério do Desenvolvimento Agrário, o Ministério do Desenvolvimento Social e o Ministério do Meio Ambiente, juntos, tentando, de foram articulada, fazer com que a gente pudesse passar por esse quadro de seca dentro de uma estratégia de convivência. Então, eu acho que isso foi muito interessante nesse momento. Infelizmente a gente está sem imagem, mas eu acho que um grande desafio que a gente tem é compreender aridez e Semiárido. Existe uma confusão muito grande nesse sentido, e normalmente parte das políticas que foram para o Semiárido não dialoga com a semiaridez, que é a questão ambiental, climática, e o que a gente tem são áreas degradadas, às vezes com uma boa intenção por trás, um esforço grande, inclusive de investimentos, mas o resultado que fica são áreas degradadas. Um exemplo disso é um processo de irrigação sem planejamento: 25% hoje dos perímetros irrigados estão salinizados, porque a gente entrou com uma estratégia de irrigação num ambiente onde faltava formação técnica e um modelo inadequado, e existem outras referências nesse sentido. Então, se a gente consegue começar a entender que a aridez dialoga com o clima e isso nos traz vantagens, a gente pode ter iniciativas interessantes.
R
Parece que a bruxa está solta, e até aqui não está querendo passar! (Risos.)
Um desafio que a gente tem, grande - e aí não vai dar para mostrar -, é um estudo que mostra que nós temos hoje trezentos e poucos milhões de hectares de cobertura florestal de áreas que não estão inseridas no conceito de áreas protegidas pelo Código Florestal. Dentro desses 325 milhões, 110 milhões são ainda de florestas, 242 são de agricultura e pecuária. Se a gente não tiver uma compreensão e instrumentos de política que facilitem ou que - não vou nem usar essa palavra - assegurem o uso sustentável, essas florestas vão perder o espaço de florestas para virarem qualquer coisa menos florestas, porque, ao se fazer uso da floresta, o constrangimento é tão grande que eu prefiro abrir mão da floresta.
E um dos indicadores de desertificação no Brasil é a cobertura florestal. O colega ali foi claro: nós temos hoje 52% de cobertura florestal na Caatinga. É o Semiárido mais populoso do mundo, como a gente disse aqui, e veja: a gente ainda tem 52% de cobertura vegetal. Então, cabe aí uma reflexão, ou seja, como é que uma matriz energética que usa a lenha como um terço de sua base - 40% do parque industrial do Nordeste usa lenha, é à base de lenha - ainda tem 52% de cobertura florestal? Significa que existe uma forma de uso que faz com que essa cobertura ainda se mantenha. E o desafio, como o professor observou na questão da Base Zero, cabe para a gente. A gente precisa fazer uma reflexão sobre isso e estabelecer estratégias de uso para esse recurso.
R
Recentemente, o Ministério do Meio Ambiente fez um estudo com o Pnud e esse estudo traz de volta estes números: a lenha representa hoje 52% da energia das famílias para preparar os alimentos e - como é que se diz? -, está voltando, e representa 40% da demanda do seu parque industrial. Isso pode ser ruim se a gente não trabalhar com critérios de sustentabilidade. Isso pode ser extremamente interessante do ponto de vista de uma economia verde, de geração de renda no campo e de conservação de paisagem através do uso sustentável.
Já está funcionando?
Pode passar.
Pode passar.
Bom, aqui é um pouco da questão desse estudo que o Ministério do Meio Ambiente fez e vejam como ele chama a atenção para a gente ter um olhar sobre o uso sustentável da biodiversidade.
(Soa a campainha.)
O SR. FRANCISCO CAMPELLO - Desculpe. Eu pedi mais cinco minutos, pode ser?
Não é só a questão energética. A lenha é extremamente importante para a pecuária, é o suporte forrageiro dessa pecuária extensiva que há no Semiárido. Às vezes, a gente não valoriza essa pecuária, mas com esse quadro de seca, para vocês verem a importância dessa pecuária extensiva, a Paraíba perdeu 40% do rebanho. As comunidades que usam a Caatinga como suporte forrageiro para a pecuária adaptada não tiveram perdas significativas do ponto de vista estatístico. Então, é uma situação que chama a atenção. Por quê? Porque a Caatinga tem um suporte forrageiro muito bom. E essas raças que, às vezes, a gente não valoriza estão extremamente adaptadas a essa realidade e conseguem, com água e havendo um ambiente de passagem, superar isso.
Pode passar.
Pode passar.
Bom, é aquilo que eu falei, ou seja, a questão da aridez e do Semiárido. Às vezes, as políticas que vêm para promover o desenvolvimento da região nos deixam situações como essa de degradação.
Pode passar, por favor.
Pode passar.
Aqui a questão dos números que eu falei, ou seja, dos desafios sobre o uso das nossas florestas e da Caatinga, está inserida nesse contexto.
Pode passar.
Está passando para outro?
Obrigado.
Aqui eu acho que a gente tem um grande desafio. A gente só combate a desertificação se trabalhar com o uso da biodiversidade, a conservação de solo, porque com isso garante produção; senão, não vai haver saída.
Eu vou passar para os exemplos, porque muitos colegas já falaram aqui sobre essas situações da questão da segurança hídrica, energética e alimentar.
R
Isto aqui já foi falado: o que a gente teve no Brasil em termos de uma estratégia para uma convivência com a aridez.
A gente tem, de fato, um papel importante com a cooperação técnica. E eu queria registrar aqui, lamentar, a ausência do colega do ICA que não pôde vir por questão de saúde, mas seria extremamente interessante a gente entender como a cooperação técnica está inserida nesse contexto de formação, preparação de quadro, ajudando o Estado brasileiro a buscar, inclusive, recursos externos para trabalhar com a questão do combate à desertificação.
O Ibama vem com um trabalho muito forte de combate ao desmatamento através de uma estratégia de monitoramento. E, hoje, a gente tem, na Bacia do São Francisco, em todos os Estados que fazem parte da bacia, uma ação integrada, de fato, de gestão ambiental coordenada pelo Ministério Público com esse programa de fiscalização preventiva integrada. É uma ação que provoca uma avaliação sobre o impacto das políticas públicas nas áreas nas quais a gente desenvolve a operação. Na Bahia, já se vão mais de 16 anos de experiência com esse programa; em Pernambuco, já está em seu segundo ano. Não é uma ação de fiscalização tradicional, é uma ação de análise das iniciativas para a gestão que vai desde o saneamento até o uso das florestas.
Pode passar, por favor.
Desculpe, sou eu quem passa.
Aqui é um exemplo. É um assentamento, são famílias que vivem hoje do uso da Caatinga. Eu vou só mostrar outra iniciativa na Bahia, vejam, às vezes a gente não sabe olhar para a nossa Catinga, a gente acha que ela não produz nada e, quando a gente vai ver, essa biodiversidade é capaz de gerar uma série de produtos que agregam renda, além de conservar a sua biodiversidade. É um pouco desse esforço que está posto.
Isso aqui é para a gente... Aquilo que falei, um desafio ao nosso comportamento. Isso muita gente acha que é um desmatamento, mas é um plano de manejo, é uma área que é licenciada para o uso sustentável. Diferente de um desmatamento, o solo está protegido, porque o professor sabe que esse é um dos grandes problemas de erosão que a gente tem. Isso aqui também garante a infiltração da água e essa área, logo em seguida, conserva a paisagem e, vejam, uma área de sobreuso e seis meses depois a regeneração. Então, o uso da Caatinga, de uma forma mais direta, mais agressiva, vamos dizer assim, está dentro de um escopo de um planejamento. Isso é um plano de manejo licenciado pelo órgão estadual.
Isso aqui são famílias. O fogão, o colega já falou com muita propriedade.
Eu vou adiantar um pouco, só o que eu quero mostrar... Isso é uma experiência muito interessante, é um assentamento na Paraíba, no qual as próprias famílias fizeram a opção de viver da Caatinga. Então, cada família tem dois hectares...
(Soa a campainha.)
O SR. FRANCISCO CAMPELLO - ... e vivem só criando gado dentro da Caatinga.
Só quero ir para o final, desculpem-me, para mostrar...
Pronto, vejam, isso aqui é uma iniciativa que está hoje em São Paulo, em um mercado em Pinheiros. É um box permanente de produtos da biodiversidade dos biomas Caatinga e Cerrado. Então, tudo o que nós estamos vendo aí fazem parte do beneficiamento dos produtos da biodiversidade. Então, aqui a gente tem azeite de licuri, granola de licuri, farinha de jatobá, doces, geleias de umbu e maracujá. E isso está sendo superinteressante. Por quê? O que a gente está vendo com isso? Que hoje existem várias comunidades, agricultores e cooperativas que estão vivendo da biodiversidade, vivendo do uso sustentável da biodiversidade. Esse é um dos elementos mais importantes para o combate à desertificação, porém, ressaltando, como o Prof. Padilha falou, de forma integrada, sabendo usar a cobertura florestal de forma correta e aproveitando também para produzir e conservar o solo de forma estratégica. Fazendo essa junção, do uso do solo com o uso da floresta, a gente consegue de uma certa forma frear o processo da desertificação.
R
Agora, em termos de política pública, a gente tem um grande desafio. A gente tem que fazer com que o marco legal seja trabalhado de forma a poder se adaptar a essas realidades, senão um agricultor, quando vai fazer o uso da biodiversidade, o tempo e o desgaste que ele tem com os órgãos estaduais é tão grande que ele parte para a ação clandestina. E aí vem o desmatamento e não o uso sustentável.
Desculpe por ter passado do tempo. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA) - Muito obrigada, Sr. Francisco Campello, pela sua exposição.
Nós temos aqui algumas perguntas que vieram do e-Cidadania e nós temos também aqui outras perguntas que foram encaminhadas à Mesa. Antes, porém, eu quero arguir os colegas. Senador Contarato, V. Exa., como Presidente da Comissão, quer fazer alguma intervenção inicial na sequência?
Pois não, Senador.
O SR. FABIANO CONTARATO (Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Bom dia a todos.
A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA) - O Senador Styvenson também, se quiser fazer.
O SR. STYVENSON VALENTIM (Bloco Parlamentar PSDB/PODE/PSL/PODEMOS - RN. Fora do microfone.) - Não, tudo bem, obrigado, Senadora.
O SR. FABIANO CONTARATO (Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) - Eu queria agradecer inicialmente à Comissão do Meio Ambiente, aos colaboradores, agradecer à Senadora Eliziane.
Senadora Eliziane, eu tenho muito orgulho de estar nesse mandato tendo a senhora como Senadora. Nós conseguimos aí, tenho fé em Deus, vamos instituir esse Junho Verde, que não vai ser só um dia, vai ser o mês de junho, mas, nesta Comissão, o compromisso é que, durante esse mandato em que eu estou aqui, em dois anos, vão ser dois anos de constante debate sobre todos os temas relacionados ao meio ambiente. Como dizia Platão, a sabedoria está na repetição. Eu acho que a gente tem que estar sempre falando, debatendo. Mas não é só audiência pública. Eu já demandei a minha equipe, eles sabem disso, que, ao término da audiência pública, nós temos que ter uma conduta proativa. O que nós podemos fazer?
Ontem, foi o Dia Mundial de Combate à Seca e à Desertificação. Nós temos o que comemorar? Nós temos aí a Lei 13.153, que é a lei de política nacional sobre o combate à desertificação. Ela tem que ser revista, atualizada, melhorada? Em quais pontos? Nós somos extremamente abertos a essas sugestões.
Então, eu queria que os palestrantes, desde já, eu agradeço imensamente o comparecimento, que vocês dessem esses argumentos para que nós possamos fazer, sim. É mandar para cá, para a nossa equipe, ao término de cada audiência pública, Senadora, eu estou tendo essa conduta proativa. Não é só vir aqui e falar, por exemplo, sobre desertificação, ou sobre mudanças climáticas, ou sobre proteção aos animais, mas o que nós podemos estar trazendo de concreto para a mudança? Nós vamos elaborar cartilhas? Nós vamos escrever artigos para publicar nos sites, nos jornais de circulação? Nós vamos fazer um projeto de lei? É isso que nós temos que ter.
Eu tive a grata surpresa, eu fui convidado essa semana, na quinta e na sexta-feira, Senadora, pelo Ministério Público Federal e pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, e fui pessoalmente em várias comunidades, aldeias indígenas. E é muito triste, porque eu acho, como político, é a primeira vez em que eu sou político, eu nunca fui, eu nunca exerci mandato, mas eu defendo que os políticos têm que sair dos muros do Senado. Eles têm que ir lá olhar, no local. Eles têm que ir lá ver o que está acontecendo efetivamente com esses Estados do Nordeste, por que isso está acontecendo, o que a população precisa. É olhar olho no olho, como eu fiz e ouvi de todas as comunidades e aldeias indígenas de que eu participei, eles se emocionaram e falaram assim: é a primeira vez em que um Senador veio ao Estado, veio aqui nos visitar. Mas aí a sensação é de total violência, de total desprezo e violência feita pelo próprio Poder Público. Por quê? Porque essas pessoas estão subjugadas. Pobres e índios que ainda estão, é um verdadeiro Apartheid... Há um muro que separa as rodovias das aldeias indígenas da comunidade, toda a comunidade levantou um muro de quase 4m de altura durante toda a extensão do perímetro. É um Apartheid, como se dissesse: "Aqui vocês não entram".
R
Há um problema dentro da aldeia, liga-se para o 190, e a Polícia Militar fala: "Não podemos ir". "Por quê?". "Porque é competência da União". Aí, você tem um funcionário da Funai. Quer dizer, não há saúde, não há educação, alto índice de suicídio em jovens indígenas. Nós temos esse problema de desertificação que está assolando. O meu Estado do Espírito Santo tem problema, mas o que nós podemos fazer?
E, se eu puder tocar e sensibilizar os Senadores, é para que eles sejam mais humanizadores, que eles tenham a sensibilidade de se colocar na dor do outro. E para isso nós temos que tirar o paletó e a gravata, e ir lá olhar nos olhos, reconhecer nossas falhas. Eu não tive a procuração de nenhum político, mas eu andei naquelas aldeias indígenas e pedi perdão, perdão, em meu nome e em nome dos políticos, por estar sendo conivente com essa total violação que essas populações estão sofrendo.
Eu não posso conceber que nós possamos fazer parte disso, ficar aqui nos nossos elevadores privativos. Eu não posso conceber que nós vivemos numa democracia em que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, sendo que o perfil socioeconômico de quem está preso é pobre, afrodescendente, semianalfabeto. Eu não posso admitir que todos têm direito à saúde e as pessoas estão morrendo nos hospitais públicos; que todos têm direito à segurança e o Governo quer armar a população; que todos têm direito à educação e a população, se não for o sistema de cotas, dificilmente entra num curso de Medicina numa universidade federal; que essas populações não têm direito a ter uma vida digna, essa dignidade da pessoa humana.
Desculpe o meu desabafo. Eu sei que vocês não têm nada a ver com isso diretamente, mas eu quero falar que eu estou muito feliz presidindo a Comissão do Meio Ambiente. Quero falar que a iniciativa de convidar uma Senadora para mim tem um simbolismo muito forte, é uma forma de prestigiar. Enquanto aqui nós presenciamos Senadores querendo tirar a participação da mulher nas eleições, eu fiz questão de falar: "Quero que neste mês de junho haja uma representatividade na Presidência da Comissão de Meio Ambiente". É nesse sentido.
Então, se eu puder fazer esse apelo, não só aqui, mas no Plenário, eu vou fazer. Que os Senadores tenham mais sensibilidade com o meio ambiente em todas as áreas e que saiam daqui dos muros do Senado Federal e interajam diretamente com aquele que é o principal destinatário, porque todo o poder emana do povo e é exercido pelos seus representantes. E eu quero muito, eu tenho fé em Deus de que eu não vou decepcionar a população do Estado do Espírito Santo nem a população brasileira.
Muito obrigado.
A minha pergunta é essa: o que a Lei de Política Nacional de Combate à Desertificação, o que precisa melhorar nela, o que a gente pode mudar nela? E como a erradicação da pobreza pode ser implementada com o combate à desertificação? Porque nós temos um problema social muito forte. No mais, eu quero, mais uma vez, agradecer aos palestrantes na pessoa do Daniel Fernandes Costa, do José Artur de Barros Padilha, do Sr. Francisco Campello.
R
Eu quero que você tenha essa plena convicção de que esta Comissão está de portas abertas. Enquanto nós estivermos aqui na Presidência, sempre o meio ambiente vai ter vez e voz. Nenhum retrocesso. Nenhuma violação. Chega do desmonte que já está ocorrendo no Ministério do Meio Ambiente!
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA) - Muito bem, Senador.
Muito obrigada.
O Senador Styvenson tem alguma intervenção?
O SR. STYVENSON VALENTIM (Bloco Parlamentar PSDB/PODE/PSL/PODEMOS - RN) - Não. Eu estava atento aqui ouvindo. Aliás, ele já tinha me dito antes, Senadora Eliziane, que tinha passado por esse, que foi até Mato Grosso do Sul e presenciou, e o fato de ele ter lembrado que a gente conviva, viva, sinta os problemas realmente da população é porque criou-se uma ideia, uma ficção de que nós aqui estamos superprotegidos, não vivemos a realidade das pessoas, não conhecemos e julgamos ou fazemos leis que desconhecemos.
Bom, eu estou, também, há pouco tempo aqui, Fabiano. Eu estou aqui há pouco tempo. Estou igual ao senhor. Cheguei ontem. Esse problema de desertificação atinge meu Estado, o Rio Grande do Norte, e eu percebo que, quanto mais distante da capital, quanto mais presente for a vegetação de Caatinga - parece que é uma regra -, quanto mais distante mais pobre; quanto mais pobre, precisa da lenha para ainda fazer fogão a lenha, manter as olarias, que são várias lá no meu Estado. Aí, criou-se um programa, um projeto para desviar, para se retirar o gás que passa por dutos e ainda alimentar aquilo, mas ainda continuam pilhas e mais pilhas de madeiras em frente àquelas olarias, com a justificativa de que vai movimentar a economia, de que está gerando emprego.
Os carvoeiros também são outro problema, porque estão lá trabalhando até em condições escravas. Acho que no Estado da senhora também deve ser assim. Nosso Estado, por ter uma característica, além de ser grande, além de estar ainda numa situação crítica de economia, as pessoas ainda precisam estar tirando da vegetação para o próprio sustento, o que causa esse problema. Não sei em que nível está em outros Estados, mas no meu é um problema bem presente a desertificação, não só na área de Caatinga, mas acho que na área de dunas, onde houve vegetação que está sendo retirada está havendo esse problema.
E quero agradecer por fazer parte desta Comissão. Às vezes, eu demoro, às vezes, eu atraso, mas é porque são várias comissões, e a gente tem que dar essa atenção. Se nós não tivermos essa atenção com a nossa natureza, com o nosso meio ambiente, não vai adiantar nada a gente discutir economia, segurança, a gente não vai ter nem o que beber, nem o que comer, nem o que produzir mais. Então, acho que a importância daqui, desta Comissão, é justamente essa. E hoje, ela sendo presidida pela Senadora Eliziane, uma mulher, claro que dá esse brilho todinho. Espero só ter essa relação se ainda... Pelo menos é o que eu percebo no meu Estado.
Pegando a sua fala, Fabiano, e andando ali em Açu, no interior, a 180km de Natal, andando justamente em lugares mais distantes, eu consigo ver ainda que o pessoal ainda consegue ir lá no mato pegar aquele feixe de lenha para cozinhar. Parece pouco, mas todo dia se tira aquilo. É pouquinho, mas todo dia você tira aquilo ali. Como uma sabedoria do interior diz: é um galão, uma lata grande de água, com um furinho, uma hora seca, uma hora vai acabar.
R
Então, se ainda existe, não sei se foi dito aqui, Fabiano, essa relação econômica.
A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA) - Muito obrigada, Senador.
Nós temos aqui algumas perguntas que vieram do e-Cidadania. Eu vou juntar para que a gente possa passar aos senhores novamente e a gente já seguir para as nossas considerações finais.
As intervenções que foram feitas pelos colegas, se os senhores puderem fazer algumas anotações seria importante. Uma pergunta da Rede Sustentabilidade coloca o seguinte: "Qual a estimativa de investimento público que vem sendo alocado para o combate à desertificação nos últimos anos no País e qual valor vocês consideram minimamente adequado?".
Outra pergunta: "Como o Congresso Nacional pode contribuir para o combate à desertificação no País?".
Pelo e-Cidadania, a Eliane Lima, do Acre, diz o seguinte: "A transposição do Rio São Francisco acabaria com a desertificação no Nordeste?".
O Leandro Souza, do Distrito Federal: "Qual seria a viabilidade e eficácia de um programa de fertilização e reflorestamento em massa para reverter a desertificação?".
Osman Torres, de Pernambuco, pergunta: "Quantas barragens seriam necessárias para cobrir toda a área do Semiárido nordestino?".
O André Spigariol, de São Paulo, pergunta para o representante do Ibama: "Os cortes do Governo Federal afetaram as políticas públicas para o Semiárido? O programa de construção de poços e cisternas continua?".
E a Deisy Cristyna, de Rondônia, pergunta o seguinte: "O Norte de alguma forma pode ser afetado? Caso a resposta seja sim, quais Estados?".
Essas são as perguntas que vieram pelo e-Cidadania.
Na verdade, eu tinha algumas perguntas, mas, durante a exposição, deu para ter uma compreensão melhor. Então, só quero fazer duas perguntas. Eu queria perguntar para o José Padilha acerca exatamente desse programa, dessa tecnologia que o senhor apresentou referente à questão do Semiárido. O senhor colocou que a gente poderia ter uma recuperação do Semiárido no prazo de dez anos.
Ao mesmo tempo, eu vi que a exposição que o senhor fez, inclusive alguns vídeos e alguns materiais que temos aqui, já tem um tempo significativo. Temos uma revista que data de 1994, aquele vídeo veio de 20 anos. Nós tivemos de lá para cá o programa, que data de 2015, voltado para a questão de alternativas referentes à desertificação, que é a Política Nacional de Combate à Desertificação, ou seja, temos uma política que data de 2015, temos uma apresentação de tecnologia pelo senhor que já vem de um tempo atrás e temos, infelizmente, ao longo dos últimos anos, uma ampliação e mais problemas referentes à desertificação no Semiárido. Por exemplo, no meu Estado do Maranhão, nós temos Semiárido e Amazônia, mas temos também Municípios também que já estão incluídos nesse nível de preocupação em relação à desertificação.
O que faltou de lá para cá? Faltou boa vontade do Poder Público, faltou orçamento para isso? Enfim, qual a alternativa que poderíamos ter para dar uma resposta mais efetiva e reduzirmos a desertificação nessas nossas regiões em todo o País. Vou me concentrar basicamente nessa pergunta e na outra referente à questão da contribuição da Embrapa contra a desertificação.
R
Eu estava vendo, por exemplo, alguns dados que mostram que até 2050 nós teremos uma população mundial de 10 bilhões de pessoas, ou seja, nós precisamos de alimentos - não é? - para essa população. Ao mesmo tempo, você vê, eu falava agora há pouco aqui com o Francisco acerca da questão do agronegócio... Porque, às vezes, as pessoas colocam: "Olha, o agronegócio traz, na verdade, um impacto muito grande em relação à questão ambiental". Mas, ao mesmo tempo, também, nós temos lá os pequenos produtores que acabam, às vezes, sem ter, digamos assim, um critério muito mais específico para essa conservação do solo. Não há uma política pública voltada para o acompanhamento desses pequenos produtores, o que acaba trazendo impacto também significativo nessa questão da desertificação, e a Embrapa acaba tendo um papel de contribuição importante nessa questão, em relação à tecnologia, em relação ao alimento. Como é que está a contribuição da Embrapa também neste sentido em relação à questão da desertificação?
Foram várias perguntas, e eu quero passar aqui uma rodada aos senhores, para que pudessem fazer um comentário sobre esses questionamentos.
Nós vamos começar com o Daniel, pode ser?
O SR. DANIEL FERNANDES COSTA - Pode ser, sim, Senadora.
Primeiro, quero cumprimentar os Senadores que estão aqui presentes, na pessoa do Senador Fabiano. Parabéns pela sensibilidade! Isso é muito importante. Como o Senador do Rio Grande do Norte mencionou, precisamos conhecer mais sobre a Caatinga, estar mais aberto para conhecer o sobre o nosso bioma, para que possamos valorizá-lo. E a sua sensibilidade é muito importante.
Eu represento uma instituição do terceiro setor, uma empresa ambientalista, a Associação Caatinga. A gente está há 20 anos lutando pela preservação e valorização do Bioma Caatinga. Na minha fala - eu fui o que fiz a abertura dos três palestrantes -, eu mencionei que algumas políticas públicas podem ser implementadas para valorização do nosso bioma. Nós temos uma política pública que eu considero essencial, Senador Fabiano: nós temos uma Proposta de Emenda à Constituição tramitando no Congresso que reconhece a Caatinga como patrimônio nacional. A Caatinga e o Cerrado são os únicos biomas que ainda não são reconhecidos na Constituição Federal como patrimônio nacional. Eu acho que, partindo dessa premissa, já há uma predisposição pela desvalorização dos dois biomas. O Cerrado é a caixa-d'água do Brasil, e a Caatinga é a região que concentra uma maior densidade demográfica comparada com outras regiões semiáridas do mundo: são 28 milhões de pessoas. Então, eu acho que a gente precisa dar esse status de importância e reconhecê-la como um patrimônio nacional, para que uma série de políticas públicas possam ser estabelecida.
E, como sugestão para uma possível revisão na Política Nacional de Combate à Desertificação, eu colocaria um gancho com uma política de pagamento de serviços ambientais. Eu acho que a gente tem que começar a estimular financeiramente e economicamente a conservação da natureza. Com esse tipo de política e estratégia, a gente vai ter uma série de pessoas, cidadãos comuns como nós, querendo criar as suas unidades de conservação na categoria RPPN, basta que tenhamos incentivos. Pequenos produtores que, por exemplo, possam aderir ao sistema Base Zero, que foi brilhantemente apresentado Prof. José Padilha, podem ter incentivos econômicos, através de um PSA para a implementação dessa ação.
R
Aqueles produtores que têm um plano de manejo, como o Chico Campello bem colocou, também podem ser remunerados pelos serviços ambientais que estão prestando para a sociedade.
Então, eu acho que essa seria a minha sugestão de criar um link com uma estratégia de pagamentos de serviços ambientais e também elevar o status da Caatinga e do Cerrado a patrimônio nacional, para a gente começar a valorizar esses dois importantes biomas, que representam mais de 30% do Território nacional.
A gente já pode responder alguma pergunta dessas?
Há uma pergunta do Leandro Souza, daqui no Distrito Federal, em que ele fala: "Qual seria a viabilidade e a eficácia de um programa de fertilização e reflorestamento em massa para reverter a desertificação?". Acho que a gente tem que fazer algumas ponderações. Quando uma área chega a um processo de desertificação... No Estado do Ceará, a gente tem três núcleos. O Estado do Ceará tem 100% do seu território susceptível a desertificação e 12% já estão em processo avançado de desertificação. Para a gente poder fazer uma restauração nessas áreas, pelo menos na nossa experiência, é uma dificuldade enorme e o investimento de recursos também é muito alto. Então, a gente tem que começar com uma estratégia. Eu acho que o primeiro passo é preservar os 52% que ainda restam de Caatinga, como o Chico mencionou, e naturalmente também, em paralelo, fazer ações de restauração florestal, que são importantes.
Nós temos ainda, voltado para política pública, em vigência, o chamamento público do Ibama, que é um programa de conversão de multas ambientais. A primeira chamada pública foi para duas bacias hidrográficas, quais sejam, a Bacia do São Francisco, com ações de restauração florestal... Em toda a área que concentra um índice maior de pluviosidade seria ou será - a gente não sabe como é que vai ser a implementação desse programa na atual gestão - feita a restauração florestal de mata ciliar, evitando o processo de erosão, como o Prof. José Padilha mencionou, e também a proteção de nascentes, que são extremamente importantes para que a gente possa ter disponibilidade hídrica para os pequenos produtores.
A outra bacia hidrográfica é a Bacia do Parnaíba, que engloba o Estado do Ceará e o do Piauí, com ações de tecnologias e convivência com o Semiárido: terraceamento, base zero, cisterna de placa, trabalho com abelha nativa da Caatinga. Então, é um conjunto de ações e estratégicas. E, nesse edital, há a previsão de atender 5 mil pessoas, 5 mil famílias, desculpa. Então, a gente espera que essa política pública, que já está em andamento, seja efetivada.
O que eu queria deixar para o Leandro é que a floresta em pé é uma matemática simples, ela é responsável pela segurança hídrica, pela regulação do clima. Então, se a gente pensa em disponibilidade hídrica no Nordeste brasileiro, não existe outra alternativa se a gente não preservar a nossa vegetação, a nossa floresta. Preservando a floresta, a gente consegue ter regulação do clima, a gente consegue ter chuvas com uma periodicidade maior.
R
Como o Chico falou, nós passamos agora recentemente pela pior seca da história do Estado do Ceará e não foi diferente em outros Estados do Nordeste, foram oito anos de chuvas abaixo da média, o que comprometeu a produção. Existe um estudo do Estado do Ceará, que posso deixar aqui com vocês, em que eles observaram, em três bacias hidrográficas, que representam cerca de 40% do Estado do Ceará, a avaliação do impacto econômico da degradação ambiental. Esse estudo estima que, só com a degradação do meio ambiente, poluição atmosférica, desmatamento, má gestão dos resíduos sólidos, o Estado do Ceará perde R$2,8 bilhões, por ano, com poluição da água, com o desmatamento da Caatinga. Esse estudo está disponível, inclusive, no site do Governo do Estado, é bem interessante. Isso mostra o quanto de recurso a gente está perdendo ao deixar de proteger o nosso meio ambiente.
Então, era esse o recado inicial, respondendo ao Leandro Souza. Espero que eu tenha atendido a expectativa dele.
A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA) - A palavra está com o Sr. José Padilha.
O SR. JOSÉ ARTUR DE BARROS PADILHA - Eu não sei se vou insistir num ponto que praticamente permeou toda a minha intenção de me comunicar com todos os senhores. Mas eu gostaria de pedir toda atenção para um ponto do qual eu acho que todos nós temos muita consciência mais recentemente: o momento em que o ser humano descobriu o DNA.
Existe um DNA de qualquer coisa. Então, imagine o milagre de se ter, na coisa mais pessoal que nós temos, o nosso DNA. Ele surgiu num momento mágico de amor, em que um espermatozoide e um óvulo se juntaram, e a partir dali ficou definido qual era aquele ser, como ele seria, em todos os aspectos que a gente pudesse colocar dentro da imensa dignidade da vida, em particular da dignidade da vida animal e da vida do ser humano.
Então, dentro disso aí, eu queria insistir nesse ponto. Eu, à medida em que fui percebendo, disse a vocês que realmente a grande coisa em que me aprofundei na vida foi energia termodinâmica. E, se nós todos entendermos que nós somos, cada um, um equipamento termodinâmico - estamos o tempo todo respirando, nos alimentando, pensando, com o coração batendo, circulando tudo isso -, e o DNA de uma região singular, absolutamente singular, singularíssima, como é a Caatinga, o Semiárido, é o único bioma do mundo superpovoado, ele está destinado pela natureza a ser... Consta que as Nações Unidas fizeram um estudo sobre os melhores ambientes habitados por seres humanos. No fim, selecionaram-se dez que eram especiais. Lamentavelmente eu vi isso, li e terminei não guardando na memória para ter esse documento, mas me lembro de que o melhor lugar que foi eleito é um certo lugar qualquer no Canadá. O segundo melhor lugar como habitat humano era um lugar qualquer no Chile. E o terceiro é o nosso Semiárido do Brasil.
Então, se isso - e eu acredito que pode ser pesquisado - é verdade e se, um grande dado, é o mais povoado do... Não há nada tão parecido. E é uma sociedade sobre a qual até escritores como Euclides da Cunha diziam "o sertanejo é um forte", mas não é o sertanejo que é um forte, a vida é um forte. Se Euclides da Cunha fosse ensinar, iria dizer que a Caatinga é forte, que os animais da Caatinga são fortes, etc.
R
Então, nesse sentido, eu queria dizer a vocês que - desde que eu tenho escrito algumas coisas e tentado produzir - eu cheguei à seguinte conclusão: a vida foi organizada através de um processo que, evidentemente, em algum momento, não havia vida no planeta, a gente sabe disso. E, em certo momento, começou a se organizar um DNA que criou uma auto - veja bem, eu vou frisar bem, auto!, no sentido de que é próprio, não é ninguém que está agindo, ela está acontecendo -, uma autorrevitalização e, no caso, agora, é autorrevitalização, tem o "re", mas anteriormente era autovitalização.
Então, houve no passado uma autovitalização ecológico-produtiva, que era natural e é expansiva. A natureza está sempre aumentando as possibilidades da vida, ela está enriquecendo sempre: os baixinhos estão sempre crescendo, a quantidade d'água semiárida que está a salvo da evaporação, que está lá embaixo - e um terço do segmento geológico que bate no contato e não entra mais, porque há um contato do cristalino, que é impermeável -, ela está sempre aumentando, está sempre se expandindo.
E aí o que foi que eu percebi? Que nós, seres humanos, inteligentes, chegamos ao ponto de ter hoje o quê? O avião, a internet, a estação espacial. Então, nós não vamos saber resolver o acréscimo, que é fazer com que isso ainda seja expansivo, acelerado? Nós podemos acelerar o processo.
Do mesmo jeito, com a Hidrelétrica do São Francisco foi o quê? O São Francisco é um belo rio, mas ele não colaborava em nada para a sociedade brasileira até 1950, aproximadamente, quando não havia nem Paulo Afonso I. Hoje há Paulo Afonso I, II, III, IV, Itaparica, Xingó, uma maravilha. Ai do Nordeste do Brasil, Maranhão, Piauí, etc. e todo mundo... E hoje, com a interligação da energia elétrica, que é essa grande maravilha, se não houvesse energia elétrica, nós não estaríamos aqui com todos esses recursos luxuosos, não haveria aviões, não haveria nada disso.
Então, vejam bem, se nós entrarmos em consenso, através de uma junção de todos esses saberes e organizações - a Embrapa, a Funai precisa, o Incra precisa, etc. - e esse conjunto for todo articulado, os três Poderes, o Parlamento, o próprio Judiciário tem um papel nisso, o Executivo, em todos os níveis, no nível federal, no nível estadual, no nível municipal, é que eu acho que nos dez anos, respondendo a sua pergunta, é perfeitamente possível para a gente chegar ao ponto em que o processo se torna irreversível. A partir daí a gente vai ter a autorrevitalização ecológica, produtiva, expansiva acelerada. Por quê? Porque nós nos organizamos para fazer a aceleração.
E, nesse sentido, numa discussão realmente já técnica, científica, de prolongamento disto aqui, porque eu concordo plenamente, Senador: não pode ter sentido uma coisa tão rica como esta ficar em um episódio isolado. Ela tem que ter uma continuidade.
Já dizia Heráclito, o obscuro, lá na Grécia, e recentemente um ministro disse: "Tudo é fluxo". Então, não pode parar. Isso que aconteceu agora tem que ter um fluxo que dê continuidade, prossiga e se organize conforme meios modestos. Não é preciso nada estrondoso, mas que não pare e que esse fluxo siga e permita que cada um de nós, enquanto estiver vivo, contribua e possa fazer...
Então, eu sou absolutamente otimista. O Semiárido está fadado a ser uma das regiões mais esplendorosas deste nosso País. Se for verdade o que as Nações Unidas viram, que é o melhor hábitat para os seres humanos, vai se encher de gente o Semiárido.
Obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA) - Muito obrigada, Sr. José Padilha.
Com a palavra o Sr. Francisco Campello.
R
O SR. FRANCISCO CAMPELLO - Tentando sintetizar a resposta, eu diria o seguinte, na linha do que o colega da Caatinga falou, eu acho que é importante a gente reforçar algumas iniciativas em curso. Essa questão de reconhecer os biomas Caatinga e Cerrado como patrimônios nacionais é fundamental, porque isso dá sustentação para outros desdobramentos. Eu acho que esta Casa tem nisso um papel importantíssimo.
Outra situação recente que eu acho que merece uma reflexão foi o esforço que o Ibama fez para o Programa de Conversão de Multas. Na realidade, a estratégia perseguida era transformar o infrator em um indutor do desenvolvimento local. Então, a pessoa sai da condição de comprometer o meio ambiente para ajudar, de fato, a recuperar o meio ambiente com uma visão econômica. Eu acho que isso é importante.
Acho que outra situação extremamente necessária é, de fato, a gente assegurar as ações de extensão rural. O Prof. Padilha foi muito enfático quando falou que os investimentos são poucos; é muito mais formação técnica e orientação. Então, não é investimento de infraestrutura; é investimento em acompanhamento. Existem várias iniciativas de extensão rural em curso que precisam ser qualificadas.
Dentro dessa mesma observação, eu acho que a gente precisa valorizar o papel que a biodiversidade tem na geração de renda da região e ter um olhar de uma economia verde para o Semiárido.
Veja, a gente tem que um terço da matriz energética do Nordeste depende de biomassa. Isso pode ser uma ameaça e isso pode ser uma grande oportunidade para a região, porque a gente está falando de uma fonte energética local, renovável, de baixo custo e de grande inclusão social; a ela só falta ser sustentável. Esse é o sonho de quem trabalha com planejamento energético. E a gente tem isso. Agora, ele precisa ser sustentável. Para ele ser sustentável, a gente precisa ter órgãos públicos estruturados, não só a União, o Ibama, mas os Estados, principalmente, e os Municípios.
Há iniciativas que o agricultor faz no seu dia a dia, por exemplo, o sistema de pousio do Semiárido, que é um sistema de descanso da terra e reaproveitamento, que, se não estiver bem entendido, a gente tira uma oportunidade de inserir no mercado o fruto desse descanso, que é o material lenhoso que sai do preparo da terra para plantar para comer, para subsistência; não é para uma produção em escala. E isso, às vezes, não consegue chegar à legalidade. Aí, a gente marginaliza o papel que o recurso florestal tem na conservação do solo, porque, se o sertanejo não consegue deixar a terra descansar, e a natureza não recompõe a força da terra, ele vai sempre procurar novas áreas. Então, a gente estará sempre aumentando o desmatamento. Essa compreensão para o uso sustentável é extremamente emblemática.
A gente viu aqui exemplos de comunidades que hoje vivem do beneficiamento da nossa biodiversidade, e isso precisa ser reconhecido pelo Estado, como o colega falou, como serviços ambientais.
A pecuária que nós temos no Semiárido é uma pecuária verde. A gente ouve o discurso de pecuária verde, de baixa emissão de carbono, e despreza uma pecuária que vive da biodiversidade, ou seja, o sertanejo não precisa desmatar para formar pasto, porque essas raças de gado - tanto bovina quanto caprina ou equina - que estão lá adaptadas vivem da Caatinga; elas usam o suporte forrageiro da Caatinga, que está extremamente adaptado. E a gente não consegue ter um marco legal que pegue o avanço do conhecimento da Embrapa, já que a senhora fez uma provocação sobre a Embrapa...
R
O Prof. João Ambrósio estabeleceu formas de manipulação da Caatinga com fins forrageiros. E o agricultor, se for seguir essa orientação do marco legal sobre o uso da floresta, cria impedimentos. Ele passa por um processo burocrático tão severo que ele desiste, e aí ele parte para o tradicional: formar pasto num lugar onde o pasto não é a vocação.
Então, a gente tem este desafio para o uso sustentável da Caatinga: olhar isso de forma mais emblemática, transformar isso dentro de uma leitura de uma economia verde. Se a matriz energética é a base de biomassa e gera emprego, renda e tudo mais, e é sustentável, a gente está dentro do que os ODSs estão pedindo, uma fonte energética renovável; mas a gente marginaliza essa fonte energética. A mesma coisa com a pecuária.
E, por último, eu acho que a gente tem um desafio grande, que é fugir de certos tabus. Reflorestar é importante - eu sou engenheiro florestal de formação, não tenho nada contra o reflorestamento -, agora, reflorestar em ambiente semiárido é extremamente desafiador. Então, a gente tem que ter, de fato, como prioridade buscar alternativas de conservação do que nós temos. Nós temos 52% de cobertura florestal, isso é extremamente emblemático. A gente tem seis vezes mais cobertura florestal do que a gente precisa para as demandas da região. Então, a gente tem que ter uma estratégia para fazer com que essa cobertura se mantenha; e ela só se mantém se a gente fizer uso dela, senão ela não serve.
Hoje a gente tem algumas iniciativas na região com a Embrapa, com o Ministério do Meio Ambiente, através da cooperação técnica com as Nações Unidas, para buscar alternativas para o uso correto dessa biodiversidade. Sem olhar de forma segmentada, eu acho que a gente encontra, nessa busca tanto a questão do solo como do uso do recurso florestal, as alternativas para o combate à desertificação.
A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar Senado Independente/CIDADANIA - MA) - Francisco Campello, eu quero lhe agradecer pela sua presença aqui conosco nesta audiência pública. Eu quero agradecer a todas as pessoas que participaram conosco pelo e-Cidadania, a todos que estão aqui em plenário ainda.
E nós temos aqui algumas cartilhas que eu quero deixar à disposição dos presentes, para que possam, na verdade, adquirir. Há informações importantes sobre arranjos produtivos locais, resíduos sólidos, vários implementos, cisternas de placas, enfim, é um importante instrumento de informação.
Eu quero agradecer a vocês de coração pela presença aqui nesta audiência pública. Como já foi colocado, esse mês de junho é o mês do Junho Verde, em que nós temos uma programação intensa durante todos os dias do mês, no sentido de fazer um debate mais aprofundado sobre a questão ambiental.
Algumas interferências acabaram inviabilizando um pouco. Eu acabei pegando uma gripe, Francisco, aqui, eu fiquei totalmente congestionada.
São as lutas que se tem em relação à política ambiental brasileira, mas nós somos firmes e fortes, vamos continuar firmes na luta a cada dia mais pela valorização ambiental.
Nós temos vivido aí momentos muito terríveis de retrocessos na política ambiental brasileira, infelizmente, como a falta de prioridade. Mas, ao mesmo tempo, nós temos ativistas, nós temos voluntários, nós temos várias pessoas no Brasil que se interessam e que se debruçam em relação à garantia da nossa proteção ambiental.
R
Antes de encerrar, quero lembrar que na próxima terça-feira, dia 25, faremos as duas audiências públicas para encerrar os debates desta primeira edição do Junho Verde. A primeira será às 10 horas da manhã, com o tema: "Proteção e o bem-estar dos animais". Às 14 horas, "Semear o futuro para o Brasil florescer: visão das novas gerações sobre desenvolvimento e meio ambiente".
Portanto, quero agradecer a todos vocês.
Nada mais havendo a tratar, está encerrada a nossa reunião.
Muito obrigada.
(Iniciada às 10 horas e 18 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 24 minutos.)