25/09/2019 - 4ª - Comissão Mista da Medida Provisória n° 893, de 2019

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Reinhold Stephanes Junior. PSD - PR) - Havendo número regimental, declaro aberta a 4ª Reunião da Comissão Mista destinada a emitir parecer sobre a Medida Provisória 893, de 2019. A presente reunião destina-se à realização de audiência pública para debater a matéria.
Convido, para assento à mesa, os seguintes convidados: Maílson da Nóbrega, ex-Ministro da Fazenda, por favor; Paulo Lino Gonçalves, Presidente do Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central; e Henrique Seganfredo, Presidente da Associação Nacional dos Analistas do Banco Central.
Eu peço desculpas pela demora; há outras reuniões paralelas, onde o Senador José Serra está, mas eu, se me permitem, vou começar ouvindo o nosso Ministro Maílson da Nóbrega. Eu vou estipular um tempo, mas esse tempo é flexível, Ministro. Não há nenhum problema em você passar dele. Eu vou colocar dez minutos para cada um, mas se forem necessários 20 minutos, não há problema nenhum.
Então, com a palavra o Ministro Maílson Nóbrega.
O SR. MAÍLSON DA NÓBREGA (Para exposição de convidado.) - Boa tarde, Exmo. Sr. Deputado Reinhold Stephanes, Relator desta Comissão. Primeiro, digo da honra pelo convite para estar presente aqui e trazer a minha contribuição para a percepção, pela Comissão, do que está em jogo.
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Eu começaria dizendo que não discuto as razões políticas pelas quais se fez a transferência do Coaf para o Banco Central. Do ponto de vista administrativo, é uma aberração. Eu acho que não tem paralelo na história do País. Talvez não tenha no mundo, qual seja, órgãos de mesmo nível hierárquico um subordinado ao outro. O Banco Central e o Coaf são órgãos de segundo escalão do Governo, e um órgão de segundo escalão do Governo costuma estar vinculado ou à Presidência da República ou a um Ministro de Estado. Nesse sentido, a vinculação do Coaf ao Banco Central significa, para usar uma palavra em inglês, um downgrading, uma redução da importância do Coaf do ponto de vista administrativo. Portanto, é uma medida esquisita e surpreendente.
Só para fazer um pouquinho de história aqui, o Coaf é resultado do acordo de Viena, de 1988, que foi coordenado pela ONU. O Brasil é signatário desse acordo, e todos os signatários se comprometeram a criar suas unidades de inteligência financeira. Então, órgãos iguais ao Coaf foram criados no mundo inteiro. O objetivo inicial era combater a lavagem de dinheiro associada ao tráfico de entorpecentes. Essa era a preocupação que permeava as discussões nos países associados à ONU na década de 80 e, por acordos posteriores, essas unidades de inteligência financeira estenderam seu objetivo de combater a lavagem de dinheiro também para alcançar a corrupção e o terrorismo.
Uma pergunta que eu acho que deve ser feita já de saída: por que nos Estados Unidos a unidade de inteligência financeira não é vinculada ao Federal Reserve, o banco central americano? A resposta é fácil: porque não faz o menor sentido - não faz o menor sentido.
O Banco Central é um órgão regulador do sistema financeiro que tem a responsabilidade de assegurar a estabilidade da moeda e a estabilidade do sistema financeiro. O Coaf é parte de um sistema internacional, que troca informações e se relaciona com o objetivo de aperfeiçoar a tarefa de combate à lavagem de dinheiro. É uma rede - o Banco Central não faz parte de nenhuma rede - que inclui o Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo, Gafi, na sigla em francês. E o Gafi, por seu turno, é um órgão da OCDE. O Gafi promove a classificação dos órgãos de inteligência financeira e de combate à lavagem de dinheiro. O Coaf é um órgão muito bem classificado pelo Gafi.
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Outro destaque que precisa ser feito é o papel que o Coaf teve na disseminação, na criação de outros órgãos similares aqui na América Latina. O Banco do Brasil teve uma liderança inequívoca na disseminação da ideia.
O Coaf, pela qualidade do seu pessoal, pela qualidade do serviço que presta à sociedade, tem sua qualidade, repetindo, atestada por instituições que tratam do mesmo assunto nos Estados Unidos.
Eu acho que, desde que esse ato aconteceu, todos devem continuar a se perguntar por que essa transferência. É uma transferência totalmente impensada. Não se discutiu, não se viu a conveniência. A pressa foi tanta que eles não se deram ao trabalho de verificar que Unidade de Inteligência Financeira é a denominação genérica desses órgãos. Se formos ao site do Coaf, está lá: "Coaf" e embaixo "Unidade de Inteligência Financeira". Então, aqui fazendo homenagem à Adriene, que é autora dessa frase, é como mudar o nome de Brahma para cerveja. Brahma é cerveja; Coaf é Unidade de Inteligência Financeira.
Atividade do Coaf é estranha às funções do Banco Central. Como eu disse aqui, o Banco Central nada tem a ver com inteligência financeira. O fato de regular o sistema financeiro não significa que o Banco Central tenha uma atividade semelhante à da inteligência financeira. A inteligência financeira é outra coisa, a inteligência financeira consiste em reunir, processar e analisar informações, e essas informações são base para a abertura de processo pelo Ministério Público, são base para a geração de informação ao governo. O Banco Central não é nada disso. O Banco Central é órgão regulador, deixe-me repetir, do sistema financeiro. E as responsabilidades do Banco Central são cumpridas por meio da política monetária, da regulação e da fiscalização, repetindo, nada a ver com inteligência financeira. Quem falou que parece o Coaf com o Banco Central, com todo o respeito, disse uma bobagem. O Coaf não se parece com o Banco Central.
E essa vinculação é um enorme retrocesso. O Banco Central no passado exercia atividades que não lhe eram próprias, por exemplo, o Banco Central tinha uma área de crédito rural e agroindustrial. Essa área gerenciava repasses e refinanciamentos determinados pelo Conselho Monetário Nacional ou recursos obtidos em agências multilaterais de crédito para o agronegócio, através dos agentes financeiros do Banco Central.
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Isso era um desvio de função do Banco Central que foi eliminado numa reforma de 1987, por um decreto do Presidente Sarney, proposta do Ministro Bresser-Pereira.
O Banco Central tinha uma função que também lhe era estranha, que era o de gestor da dívida pública. Era o Banco Central que fazia o lançamento dos papéis no mercado, que dava liquidez aos papéis, e tudo mais. E, no caso do crédito rural e agroindustrial, a distorção era de tal magnitude que o Banco Central chegou a ter equipes de análise de processo, como se fosse o BNDES. O que isso significava?
(Soa a campainha.)
O SR. MAÍLSON DA NÓBREGA - O Banco Central não exercia a contento a sua missão precípua. Não é à toa que, depois que o Banco Central foi - vou chamar uma palavra forte - desinfetado dessas atividades que não lhe diziam respeito, o Banco Central evoluiu e se tornou crescentemente o órgão promotor da estabilidade financeira, tem credibilidade internacional e cuida do que lhe é próprio, repetindo, estabilidade da moeda e estabilidade do sistema financeiro. Então, esse papel foi reforçado com a criação do Comitê de Política Monetária em 1996, e o Banco Central ganhou prestígio internacional, passou a fazer parte do Banco de Compensações Internacionais, que é uma espécie de banco central dos bancos centrais, e, pela primeira vez, o Presidente de um banco central de um país emergente, isso aconteceu em 2017, foi eleito o banqueiro do ano pela prestigiosa revista The Banker.
Portanto, repetindo, a vinculação do Coaf ao Banco Central é um claro, inequívoco e insofismável desvio de funções, significa consumir energia da diretoria, dos funcionários do Banco Central, em vez de aplicá-la no que é mais nobre.
O Banco Central pode sair chamuscado disso aí, porque questões políticas envolvendo a divulgação de dados coletados e analisados pelo Coaf podem repercutir negativamente na gestão e na imagem do Banco Central. E isso afeta o papel que ele deve ter de regulador eficiente.
Em resumo e repetindo, a transferência do Coaf para o Banco Central é uma aberração administrativa sem paralelo no País, por isso não tem o menor sentido.
Isso posto, Sr. Presidente, eu acho que a melhor atitude desta Comissão é propor a rejeição dessa extemporânea, equivocada - não vou dizer mais outro adjetivo, senão não fica bem - Medida Provisória 883.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Reinhold Stephanes Junior. PSD - PR) - Obrigado, Ministro.
Eu vou passar a palavra ao Presidente do Sindicato dos Funcionários do Banco Central, Paulo Lino Gonçalves.
O SR. PAULO LINO GONÇALVES (Para exposição de convidado.) - Boa tarde a todos.
Eu queria cumprimentar o Presidente da Mesa, Deputado Reinhold Stephanes Junior, a quem agradeço o convite para participação nesta audiência pública.
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Cumprimento o ex-Ministro Maílson da Nóbrega; o colega do Banco Central, Henrique Seganfredo; o Deputado Arlindo e todos os presentes.
Eu gostaria de iniciar contextualizando o Sinal, que é o Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central, e a instituição Banco Central do Brasil, em que trabalho e que represento.
O Sinal foi fundado em outubro 1988, tão logo a Constituição permitiu a sindicalização de servidores públicos, contando, então, com quase 31 anos de história em defesa dos servidores do Banco Central e da instituição Banco Central, pois ambos elementos se completam. Contamos hoje com aproximadamente 5,4 mil filiados e somos o representante legal de todos os servidores do Banco Central, das carreiras de especialistas, com os cargos de analista e técnico e da carreira de procuradores.
A confirmação de que servidores e instituição se completam pode ser vista muito bem dentro do Banco Central. O banco goza hoje de uma reputação nacional e internacional de excelência na qualidade dos serviços prestados, tendo seus últimos presidentes, sem distinção, recebido vários prêmios pela atuação do Banco Central, que, sem qualquer demérito aos líderes do momento, sem nenhuma dúvida foram concedidos graças ao esmero e dedicação dos servidores que, de geração em geração, ao longo dos seus mais de 50 anos de existência da instituição, vêm construindo e fortalecendo os pilares em que ela se sustenta.
O Banco Central é regido pela lei... As carreiras do Banco Central são regidas pela Lei nº 9.650, de 1998, e têm características próprias que ajudam a explicar a razão do seu sucesso. Uma delas é a de estar blindado contra indicações externas. O ingresso no quadro de pessoal do banco se dá unicamente mediante concurso público específico, suas funções comissionadas são de exercício privativo de seus servidores, não se permitindo nem o instituto da redistribuição, que é o deslocamento de servidores de um órgão para outro. Os únicos cargos de natureza especial no Banco Central são o do Presidente e de seus diretores, encontrando-se aí também, dentro dos diretores, funcionários de carreira do Banco Central.
É na segurança desse Banco Central que o Governo quer, por meio da Medida Provisória nº 893, vincular administrativamente a Unidade de Inteligência Financeira (UIF) que venha ser a continuação remodelada do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), criado em 1998, no âmbito do Ministério da Economia.
Com relação à Medida Provisória nº 893, nós concordamos plenamente com as palavras do Senador José Serra, ditas na Comissão de Assuntos Econômicos deste Senado ao Sr. Roberto Campos Neto, atual Presidente do Banco Central, que o ideal seria recusá-la integralmente, já que ela é inconveniente, mal feita e trará problema nos próximos anos. Nós não temos dúvida e concordamos plenamente com essas palavras. Mas dentro desta Comissão, temos o dever de analisá-la e tentar melhorá-la no que for possível. Alguns pontos são realmente preocupantes e merecem uma maior discussão. Segundo a MP 893, a escolha dos membros do conselho deliberativo que terá a função de definir e aprovar as orientações e as diretrizes de atuação da UIF e também a de julgar os processos administrativos sancionadores - vejam a relevância dessas duas competências - será feita pelo Presidente do Banco Central entre cidadãos brasileiros com reputação ilibada e conhecimentos em matéria de prevenção e combate à lavagem de dinheiro, ao financiamento do terrorismo ou ao financiamento da proliferação de armas de destruição em massa. E é importante ressaltar: o trabalho desses conselheiros não terá remuneração.
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Felizmente parece que já se constrói - e isso foi dito na audiência pública de ontem - nesta Comissão um consenso de que isso já é uma porta aberta para todo tipo de ingerências e que é fundamental que esses cargos sejam ocupados por servidores públicos pertencentes às carreiras que já compõem o Coaf, ficando a indicação a cargo dos Ministros de Estado responsáveis pela área de cada uma das carreiras.
Defendemos ainda que o quadro técnico-administrativo seja composto obedecendo esta mesma orientação: servidores públicos pertencentes às carreiras que já compõem o Coaf, ficando também indicação a cargo dos Ministros de Estado responsáveis pela área de cada uma das carreiras.
Outro ponto que merece atenção é que a UIF lida com dados protegidos pelo sigilo. A vida fiscal, financeira, tributária e judicial das pessoas físicas ou jurídicas sob averiguação são elementos de pesquisa e análise. Ninguém melhor do que os servidores públicos de carreiras especializadas em cada uma dessas áreas para lidar com esses dados. São protegidos das pressões pelas suas prerrogativas, principalmente a estabilidade, e sujeitos às penalidades previstas na Lei nº 8.112. Em caso de infrações, podem sofrer desde uma simples advertência até mesmo a demissão ou a cassação de sua aposentadoria, independentemente de outras penas na esfera judicial.
Muitas outras questões pontuam da leitura da MP nº 893 e não foram devidamente esclarecidas na audiência pública de ontem, que contou com a presença dos colegas do BC, o Procurador-Geral, Sr. Cristiano Cozer, que representou a instituição, e o servidor aposentado, Sr. Ricardo Liáo, na condição de Presidente da Unidade de Inteligência Financeira.
Qual foi a motivação para se transferir a UIF, criada com autonomia técnica e operacional, da jurisdição do Ministério da Economia para a do Banco Central, que sequer ainda teve sua autonomia formalizada? Caso se mantenha a indicação do Presidente do Banco de membros de fora do serviço público para o conselho deliberativo, como se dará a escolha? Haverá inscrições? O Congresso Nacional sabatinará os indicados? Qual o tempo de mandato? É aplicável algum tipo de quarentena quando de sua saída?
Segundo orientações do Gafi (Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo), entidade internacional criada pelos países membros da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), as unidades de inteligência financeira devem ser capazes de obter recursos necessários e mobilizá-los para realizar suas funções, de forma individual ou rotineira, livre de qualquer influência ou interferência governamental ou setorial que possa comprometer sua independência operacional.
De onde virá o orçamento da UIF? Dividirá o orçamento com o Banco Central? Por que não ter, já que tem autonomia operacional, autonomia orçamentária?
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O Banco Central tem um dos maiores bancos de dados financeiros, voltado especificamente para a sua área de atuação, com regras de sigilo próprias. A UIF, por outro lado, trabalha com dados coletados pelas diversas instituições: Banco Central, Susep, CVM, Receita Federal, que fomentam a UIF com informações necessárias para os processos investigativos.
Qual o perigo de contaminação entre os bancos de dados da UIF e o do Banco Central? Como se dará a separação de acesso? Como trabalharemos com bancos de dados conflitantes dentro de uma mesma organização? E, finalmente, o Banco Central tem uma reputação conquistada ao longo de seus mais de 50 anos de atividade, muito por ser blindado contra indicações externas, como já dissemos no início da nossa fala.
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO LINO GONÇALVES - Como será evitada a contaminação dos quadros da UIF e do Banco Central? Qual será a participação dos servidores do Banco Central nos trabalhos da UIF? Que órgão fará a requisição dos servidores que, porventura, venham a trabalhar na UIF? A que órgão ficarão vinculados?
Finalizando, Presidente, dirijo-me aos Srs. e Sras. Parlamentares. Se for inevitável que a UIF fique vinculada administrativamente ao Banco Central, que tenhamos o cuidado de melhorar em muito o texto da Medida Provisória 893 antes de transformá-lo em lei. Essa medida se perde ao não se aprofundar no encaminhamento das questões levantadas, deixando tudo solto, como se o tempo e a natureza tivessem o condão de acomodar todos os problemas futuros que, inevitavelmente, vão surgir.
Temos a certeza da capacidade técnica dos servidores do Banco Central, tantas vezes colocada à prova, e temos a certeza da história da excelência nos trabalhos desenvolvidos pelo Banco Central, e não podemos deixar que uma Medida Provisória como a 893, sob o pretexto de dar maior segurança à UIF, coloque toda essa estrutura vitoriosa em risco.
Se não podemos rejeitar a medida provisória, que se construa um novo texto, consultando os envolvidos nas questões, que garanta a soberania da UIF, sim, em suas decisões, mas que, principalmente, garanta ao Banco Central da forma como hoje se encontra, blindado contra indicações externas, mantendo a qualidade e a competência de seu privilegiado quadro funcional apto para desenvolver as funções tão importantes para a Nação brasileira.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (José Serra. Bloco/PSDB - SP) - Passo a palavra ao Henrique Seganfredo, que é Presidente da Associação Nacional dos Analistas do Banco Central.
O SR. HENRIQUE SEGANFREDO (Para exposição de convidado.) - Boa tarde a todos.
O SR. PRESIDENTE (José Serra. PSDB - SP) - São dez minutos. Se quiser falar menos, ninguém reclamará.
O SR. HENRIQUE SEGANFREDO - Serei rápido.
Boa tarde a todos. Estou muito honrado aqui com a Mesa que se apresenta: Deputado Reinhold, Presidente José Serra, aqui, na Mesa, Dr. Maílson, colega Paulo Lino.
Eu gostaria de, brevemente, introduzir uma apresentação um pouquinho mais técnica, muito rápida, falando da história da nossa associação. É uma associação jovem, com muito menos tempo de história e estrada que o sindicato do meu colega Paulo Lino, mas que converge muito nos vários temas que abordamos.
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O que nós procuramos defender, no foco da associação, são temas de interesse dos analistas do Banco Central, cujo corpo técnico é altamente capacitado e que possuem um grau de especialização muito alto. Nós temos um número próximo a 73% de analistas com especialização, seja em mestrado, em doutorado, inclusive em pós-doutorado, atuando em áreas como economia, finanças e também tecnologia da informação.
Quanto ao escopo da nossa apresentação, eu acho que é válido a gente citar algumas ponderações que o Gafi fez recentemente, certo? E o que é o Gafi? Eu acho que isso já foi aberto na audiência de ontem sobre esse instituto intergovernamental, criado em 1989, com a função de combater a lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo.
Num histórico muito recente, o Gafi realizou avaliações sobre as atividades do Coaf aqui, no Brasil, para fornecer uma espécie de um benchmark do que poderia ainda ser melhorado. Na sua avaliação, ficou evidente uma falta de poderes de supervisão e, especialmente, de recursos, porque, para que as funções de supervisão fossem levadas a cabo... Há uma falta premente de recursos humanos do próprio Coaf e, coincidentemente, no mesmo relatório, também é tratado sobre o Banco Central, especialmente sobre a supervisão das instituições não bancárias, sendo um alvo também de mais recursos, sejam materiais, humanos e assim por diante.
Quando contrastado isso com a redação vigente da lei de lavagem de dinheiro, que já foi sensibilizada, assim diríamos, pela MP 886, pretérita, tínhamos um quadro muito claro dos componentes, dos possíveis indicados a ocuparem posições no Coaf. Nesse rol, tínhamos servidores do Banco Central, da Superintendência de Seguros Privados, da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, da Agência Brasileira de Inteligência, do Ministério das Relações Exteriores, da Polícia Federal, da Superintendência Nacional de Previdência Complementar e da Controladoria-Geral da União. Desculpem se talvez passei por algum outro. O que se nota aqui é um quadro altamente eclético, variado, de especialistas na área financeiras, em suas várias subespecificações e que realmente agregam muito valor e conhecimento ao Coaf.
Contrastando isso com o texto novo da MP 893, nós temos uma bipartição num conselho deliberativo, e já se encontrava delineada no Decreto 9.663, a existência desse conselho - agora ele foi colocado em lei -, e também a especificação de um quadro técnico administrativo em que, numa leitura mais atenciosa, nos chama muita atenção a indicação praticamente aberta de cidadãos brasileiros com reputação ilibada e também de ocupantes de cargo em comissão.
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Nesse cenário, a Associação de Analistas realmente ficou apreensiva sobre uma possível vinda de agentes que não tenham a devida experiência, que não tenham o devido conhecimento. Há uma prática conhecida por todos como uma espécie de livre nomeação, certo? Disso, vem a pergunta: qual será a autonomia técnica dessa UIF, sendo ela ocupada por pessoas que vieram por mecanismos de livre nomeação, e ainda - essa UIF -, vinculada a um Banco Central, que hoje não goza de uma independência no direito, na lei, ainda que na prática e de fato ela possa ser considerada?
O Banco Central nessa mesma toada também sofreu algumas recomendações de um comitê que é formado pelo Fundo Monetário Internacional sobre essas necessidades de confirmação da independência legal do Banco Central do Brasil e também da proteção dos membros, quando obviamente estão agindo de boa-fé. Então, nas palavras do Dr. Maílson, eu concordo plenamente com que, vamos dizer assim, a casa não está bem arrumada para esse tipo de movimentação, para esse tipo de rearranjo. Hoje nós temos mais perguntas do que respostas; é isso que fica muito aparente para nós.
Em esteira, hoje todos sabemos que há um contingenciamento significativo do Orçamento Federal. Vários órgãos - com os quais eu me solidarizo - estão hoje passando por dificuldades. Aquelas mesmas recomendações do Coaf de necessidade de mais recursos, seja humanos, seja materiais, hoje, são foco de preocupação. O Banco Central também: ele teve contingenciamentos este ano da ordem de 50%, 40% para conseguir fazer a sustentação dos seus principais sistemas tecnológicos. Neste cenário, surgem novas perguntas: de onde viriam tais recursos de que o Coaf tanto necessita? Qual seria o relacionamento administrativo entre Coaf e Banco Central?
Como o colega Paulo Lino mencionou antes, além obviamente da decisão dos Parlamentares em considerar uma possível rejeição, nós temos a possibilidade de sugerir emendas, isso no âmbito da associação. Conseguimos o apoio de alguns Parlamentares para que se sensibilizassem a pelo menos colocar algumas condicionantes no texto legal para que nossos principais motivos de preocupação fossem sanados.
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Com isso, sugerimos que o Conselho Deliberativo da UIF, no caso, volte à sua redação original, de resgatar realmente...
(Soa a campainha.)
O SR. HENRIQUE SEGANFREDO - ... especialistas na matéria e que o quadro técnico-administrativo também não permita a livre nomeação de pessoas estranhas ao setor público, especialmente porque eu acredito que, no setor público, nós temos uma relação tanto de poder quanto de dever e, em relação ao dever, nós temos um peso sobre as nossas costas, que é a responsabilização. Você pode ter um servidor de casa, 20 anos de história, e, se ele cometer o que seja um ilícito e for sujeito a um processo administrativo, ele no dia seguinte pode estar à procura de um novo emprego e, principalmente, a sua contribuição previdenciária no regime atual completamente desaparece. Então, o compromisso do servidor público, seja como mitigação de riscos ainda, é muito forte porque sobre ele existe a espada da lei responsabilizando-o.
Muito obrigado pela oportunidade de fala. Temos aqui o nosso e-mail para contato, e novamente agradeço o convite da Comissão para a oportunidade de hoje.
O SR. PRESIDENTE (José Serra. PSDB - SP) - Muito obrigado.
Concedo a palavra agora ao Relator da matéria, Deputado Reinhold Stephanes Junior.
O SR. REINHOLD STEPHANES JUNIOR (PSD - PR. Como Relator.) - Obrigado, Presidente.
Bom, eu entendi que os três têm a visão de que o ideal seria ficar no Ministério da Economia.
Há a preocupação também com relação à composição do conselho - e já posso até adiantar, porque já conversei com os Parlamentares, com o Presidente da Comissão, que nós vamos resgatar no parecer essa questão de o conselho voltar a ser só de funcionários públicos de carreira e com a formação anterior. Essa é uma preocupação, um assunto que, por consenso também, conversando com o Governo, ele entendeu que está superado.
Com relação a alguns questionamentos que ouvi, o Coaf, desde que existe, 1998, sempre teve cargos de confiança - sempre. Os cargos de confiança são cedidos pelo Ministério da Economia ou pelo Ministério da Justiça ou por outros ministérios e lotados lá. No conselho, não, mas, na parte de baixo, antigamente havia 35 funcionários e agora há mais, agora eles estão com perto de 80 funcionários - há pelo menos uns 30 cargos de confiança de ministérios cedidos para lá, com pessoas de fora e de dentro da casa. Isso, desde 1998, é assim. Então, não há nenhuma mudança no sentido de haver cargo de confiança lá. Isso aí existe, passou pelo Governo do Lula, da Dilma, do Sarney, de todo mundo. Sarney, não... Mas todo mundo trabalhou com eles lá dentro.
E, sobre a questão orçamentária, eu vou tentar achar uma solução junto com os colegas, porque a preocupação que se tem é de que atualmente eles têm o orçamento do Ministério da Economia e agora vão ter alguma atuação do Banco Central pagando despesas.
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Mas eles não têm hoje uma autonomia própria financeira, desde que eles existem.
Obrigado. Era só isso, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (José Serra. PSDB - SP) - Eu vou aqui encaminhar algumas perguntas, que naturalmente já contêm parte da minha visão a respeito do assunto.
Primeira. Há justificativa técnica para a proposta de transferência do Coaf do Ministério da Economia para o Banco Central? Isso é uma pergunta aos nossos convidados. Segundo. Como o senhor analisa a incorporação e o funcionamento de um órgão estranho às funções de supervisão e fiscalização das instituições financeiras na estrutura do Banco Central? Como seria a coexistência dos quadros de funcionários de diferentes naturezas?
Terceiro. Anteriormente, apenas servidores públicos do quadro de pessoal efetivo de determinadas carreiras correlacionadas ao objeto do Coaf podiam integrar o Coaf. Agora, a MP 893 transforma Coaf em UIF, levando-a para o Banco Central e dispondo que a UIF será integrada por servidores ocupantes de cargo em comissão. Não seria isso um retrocesso?
Por último. Esses servidores terão competência para julgar processos administrativos sancionadores, até então atividade típica e privativa dos servidores públicos das carreiras de Estado? Além de ter acesso a informações protegidas por sigilo? Seria uma medida temerária? Poderemos ficar tranquilos com tal comando legislativo?
O SR. MAÍLSON DA NÓBREGA - Posso começar?
O SR. PRESIDENTE (José Serra. PSDB - SP) - Com a palavra o ex-Ministro Maílson.
O SR. MAÍLSON DA NÓBREGA - Muito obrigado.
Exmo. Sr. Senador José Serra, Presidente desta Comissão, em relação às suas questões, em primeiro lugar, não há nenhuma razão técnica para essa transferência. Nenhuma. Eu deveria ter mencionado, na minha apresentação, o órgão semelhante ao Coaf nos Estados Unidos, lembrando que os Estados Unidos são um dos líderes provocadores do Convênio de Viena. Lá o Coaf americano é subordinado à Secretaria do Tesouro, que é o Ministério da Fazenda ou das Finanças dos Estados Unidos.
A incorporação ao Banco Central, ainda que sob o título de vinculação, significa levar para o Banco Central, para a sua supervisão, um elemento estranho às funções do Banco Central. E, como eu disse na minha apresentação, pode significar dispersão, desperdício de energias do Banco Central, que devem ser aplicadas nas suas funções precípuas.
O fato de poder trazer pessoas de fora do setor público em cargos de comissão é um retrocesso.
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E quanto à competência para julgar processos administrativos, eu acho que, pelo que eu entendo, não altera muito isso, porque a unidade de inteligência financeira continuaria exercendo as funções anteriormente consignadas ao Coaf. Ele continuará a ter acesso a informações protegidas pelo sigilo. Tem uma enorme discussão se essa unidade pode disponibilizar essas informações para o Ministério Público, por exemplo. Na minha avaliação, pode.
Na medida em que você submete a comunicação aos órgãos de investigação, como a Polícia Federal e o Ministério Público, dependendo de autorização judicial prévia, na minha avaliação, isso pode interferir na eficiência do Coaf. Não é que eles não tenham essa competência. Eu acho que em algum momento isso será objeto de uma discussão no Supremo Tribunal Federal, se o Coaf precisa, em cada caso, pedir autorização judicial. Se essa visão se confirmar, eu acho que isso aumenta a dificuldade operacional da unidade.
É isso.
O SR. PRESIDENTE (José Serra. PSDB - SP) - Eu vou ter um problema porque o Senado está abrindo o painel para uma votação. Em cinco minutos vou ter que me dirigir para lá, você continua.
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O SR. PAULO LINO GONÇALVES - Com relação à motivação técnica, não há nada que a justifique. Inclusive, ontem, na audiência pública, tanto o representante do Banco Central quanto o presidente da UIF tiveram muitas dificuldades em tentar esclarecer e não foram convincentes nas suas palavras. Não há uma justificativa técnica. A transferência deve passar por outros caminhos que não a técnica.
E acreditamos, assim como disse o ex-Ministro Maílson a respeito da dispersão das funções do Banco Central, que isso realmente é muito perigoso. Nós estaremos levando para dentro do banco algo que não é da sua natureza, algo que não faz parte das suas atribuições. E certamente qualquer problema que possa vir a acontecer na UIF terá uma imagem do Banco Central respingada e isso é muito ruim para o País, porque o Banco Central nos representa internacionalmente e tem uma grande capacidade hoje de receber elogios em função dos serviços prestados.
Então, nós acreditamos que neste momento termos a integração da UIF vinculada administrativamente, que seja, ao Banco Central, traz mais riscos do que qualquer benefício para a própria UIF, já que o Coaf vem, nos seus 20 anos de criação, funcionando muito bem.
O SR. HENRIQUE SEGANFREDO - Sobre o parâmetro técnico, bem, no meu conhecimento, o funcionamento de ambas as instituições se pretende que seja totalmente isolado uma da outra. Certo? Então, assim, eu também não vejo ganhos de escala nesse tipo de cooperação, que hoje já ocorre de forma institucional através do Siscoaf, que é o instrumento de comunicação entre as partes.
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Eu vejo algum ganho em questão administrativa, em economia de recursos, quando eu falo talvez em temas mais básicos, como ocupação predial, sistemas informáticos, alguma coisa nessa seara. Mas realmente hoje o Coaf funciona da forma que funciona e hoje o Banco Central funciona da forma que funciona. Então, seriam ganhos relativos. O.k.?
Sobre a composição do conselho deliberativo, realmente a recomendação de uma maior independência somente virá com o retorno da redação antiga, que estava na 886, que é do acolhimento desses profissionais, servidores públicos gabaritados dos mais diversos órgãos, como CVM, Susep, do próprio Banco Central, Receita Federal, Polícia Federal e assim por diante.
No tocante ao quadro técnico, nós temos com uma associação uma preocupação. Ainda que soube há pouco pelo Deputado Reinhold sobre a existência de funções de confiança na estrutura do quadro técnico, a associação preza para que inclusive o quadro técnico seja composto somente por servidores públicos efetivos. Não importa tanto a origem deles, desde que seja do mesmo rol que compõe o conselho deliberativo, porque nós acreditamos que o acesso à informação desses analistas de informação é um acesso de informação muito refinado e que, por mais controle que já exista hoje no Siscoaf, em todo o procedimento interno do Coaf, o desejo de uma maior blindagem institucional também depende de um rol mais fechado para o quadro técnico administrativo.
Seria essa a minha contribuição.
O SR. PRESIDENTE (José Serra. PSDB - SP) - Deputado Chinaglia.
O SR. ARLINDO CHINAGLIA (PT - SP) - Pois não. Bem, ao cumprimentar os nossos convidados, eu registro que as palavras do Ministro Maílson, pela experiência e pela contundência, vão entrar de maneira decisiva nas referências que nós vamos ter nesta discussão. Falo aqui em nome dos concursados que não tomaram posse no Banco Central. Fiz carreira no Banco do Brasil temporariamente, mas não é o meu forte.
E ontem nós tivemos a oportunidade de, com outros convidados, terem sido feitas observações... Como é que é? Pois não.
(Intervenção fora do microfone.)
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O SR. ARLINDO CHINAGLIA (PT - SP) - Eu quero começar por uma coincidência que me parece que ainda não tenha havido hoje, digamos, um exuberante rol de afirmações, mas ficou implícito pelas opiniões correlatas, que é a autonomia e a independência do Banco Central. O Ministro Maílson não deixou dúvidas quanto ao risco que coloca o órgão responsável pela estabilidade da moeda e do próprio sistema financeiro ficar sob suspeição, exatamente quando ele voltar a ser infectado, para usar o seu adjetivo forte e bom, por aquilo que vai dispersar daquilo que é seu foco principal, gastando energia, mas, o que é pior, todos nós sabemos que está sob questionamento o Parlamento, como sempre esteve, o Executivo, mas nós involuímos para um questionamento duríssimo sobre o Ministério Público, a Polícia Federal e até mesmo o Judiciário, o que é ruim para a democracia.
O que ocorre? A Operação Lava Jato foi pensada para ser assim. O atual Ministro Moro escreveu dizendo o seguinte: o vazamento de informações - e ele não ressalva que não deveriam ser vazadas as sigilosas - é parte do processo para criar o constrangimento para obrigar, chegando ao ponto de um empresário, por ter dupla cidadania, que estava e está em Portugal, ter a filha abordada para ver se o pai faria delação. Está nos jornais. Isso não é pouco. Nós não podemos analisar essa matéria sem considerar o que acontece no País hoje.
Eu faço agora na forma de pergunta. O que garante a autonomia e a independência do Banco Central: o seu modelo atual de estruturação, inclusive do seu corpo dirigente; ou deixar na mão do Presidente do Banco Central o poder para indicar a seu bel-prazer o presidente da unidade e os conselheiros. E aí uma particularidade, de 8 a 14, não sei por quê. Por que não se define? Mas, enfim, não é a questão principal.
Para piorar, eu queria pedir especialmente ao Ministro Maílson, mas se os demais convidados quiserem também abordar... O Deputado Reinhold pesquisou e fez uma afirmação em que eu quero que a gente chegue um pouquinho mais longe. Ele tem razão quando fala que sempre houve cargo de confiança, mas, nas respostas que o Ministro Maílson deu, ele enfatizou novamente que o fato de haver substituição de servidores públicos é um retrocesso. Então, para combinar onde pode e onde não deve ter alguém que não seja do quadro funcional ou do próprio Banco Central ou dos outros órgãos que o Presidente da Associação, Henrique, relatou, nós sabemos que são vários órgãos que emprestam ou designam pessoas especializadas.
Ontem, quando isso foi abordado, a indicação de pessoas fora do quadro de carreira, foi argumentado, se não me engano - se eu estiver equivocado peço mil perdões -, pelo Sr. Leal, que aquilo foi para permitir a entrada de pessoas especializadas em crimes cibernéticos e correlatos.
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E o Sr. Henrique fez questão de dizer que 70% ou 73% dos funcionários do Banco Central têm algum tipo de pós-graduação, muitas vezes com doutorado. E, por acaso ou não, falou de TI. Vou fazer uma pergunta provocativa: os funcionários do Banco Central que atuam em Tecnologia da Informação e também em crime cibernético não têm competência para suprir essa nova função, a que também estou contrário, que é trazer crimes de terrorismo e também da divulgação de armamentos de distribuição em massa? E ontem eu fiz uma pergunta a que ninguém respondeu. Eu vou repeti-la, portanto: por que o Coaf atual, quando faz investigação de um crime financeiro, o que impede de ele chegar, inclusive como se chega ao narcotraficante, por que não se chega ao terrorista? Não é papel chegar ao narcotraficante. Ele investiga aquela anomalia na movimentação financeira, possivelmente passa para a polícia, para o Ministério Público, esses chegam ao traficante. Por que não continuam o mesmo e não podem chegar da mesma maneira a um eventual terrorista? Não vejo porque. Até brinquei ontem, a não ser que o Coaf psicografasse e falasse: aqui vai chegar um traficante de armas, não vamos lá não. Não faz sentido. O argumento não me convence.
Finalmente, é um tema que, quando quem tem experiência diz que não serve... Aí eu quero fazer referência ao Presidente do Sindicato, Sr. Paulo Lino. Eu só vou admitir fazer emenda, eu, até o momento, se eu for derrotado naquilo que é o principal, porque o principal é rejeitar a medida provisória. Esse é o elemento de convicção que tenho hoje. Ontem eu estava ainda com alguma dúvida, mas, com certeza, outros convidados vão poder opinar, mas eu acho, por exemplo, que ex-presidentes do Coaf, está previsto pelo menos um vir aqui, e outros deverão ser ouvidos. E eu acho fundamental, Presidente em exercício e Relator Reinhold Stephanes, contraditoriamente - parece um paradoxo, mas, na minha opinião não é -, quanto mais pessoas nós trouxermos que tiveram experiência de governo, mas, neste momento, não têm nenhuma subordinação com referência ao Governo atual, isso libera as pessoas para poderem falar, porque é normal, se a pessoa tem uma função pública neste exato momento, mesmo não tendo sido convidada para opinar no que estava sendo feito, é difícil a pessoa... O Brizola tinha uma frase: ninguém aposta contra o cavalo do comissário. Então, é bom registrar. Alguém que vem representando o próprio Estado brasileiro vai falar contra aquilo que o Governo atual está propondo. Então, é uma observação, Presidente e Relator Reinhold Stephanes Junior, para a gente cuidar de fazermos audiências. Em todas elas, com certeza, haverá contribuições.
E agradeço a contribuição dos senhores.
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O SR. MAÍLSON DA NÓBREGA - Deputado Arlindo Chinaglia, em primeiro lugar, eu confesso que só agora me dei conta de que há um risco que eu não havia identificado: esse de o Presidente do Banco Central fazer as nomeações para os cargos da Unidade de Inteligência Financeira. Até hoje, desde sua criação, o Presidente do Banco Central nomeia apenas pessoas do quadro permanente do Banco Central para cargos de chefia de departamento, de divisão, etc. Pela primeira vez, o Presidente do Banco Central vai poder fazer nomeações políticas para a Unidade de Inteligência Financeira, e esse é um risco que eu confesso que não havia identificado. Ele passa a ter certa responsabilidade pela escolha de pessoas que às vezes não conhece, pode ser indicação de um Parlamentar, legítima, mas sujeita a erros. Portanto, isso agrega mais um fator que recomenda a volta ao status quo, que é o Coaf subordinado hoje ao Ministério da Economia.
O seu segundo ponto sobre trazer pessoas de fora para a gestão do Coaf, eu repito, é um retrocesso. O Coaf foi muito bem pensado para ter pessoas de diferentes órgãos do Governo que exercem atividades afins. A Comissão de Valores Mobiliários, o Banco Central, a Receita Federal e assim por diante, mas pessoas de carreiras desses órgãos. A mudança é muito radical. E é sempre bom lembrar uma coisa que o Brasil um dia vai ter que ter: um serviço público efetivamente profissional, com um mínimo de indicações políticas. E, naquilo que já está funcionando desse jeito, você faz um retrocesso!
A matriz do moderno serviço público em todo o mundo são as reformas da segunda metade do século XIX no serviço público britânico, a chamada Northcliff Commission. Hoje, pelo que eu vi, o primeiro-ministro e seus membros do gabinete têm poder de nomeação de menos de cem pessoas. No Brasil, só no Governo Federal, são 23 mil. E entre essas quase cem pessoas que o primeiro-ministro pode nomear, estão os ministros, os chamados secretários, membros do gabinete. Portanto, é um retrocesso.
Se eu entendi bem a terceira questão sua, se o Coaf pode chegar ao terrorista, na verdade, até o ponto que eu entendo, o Coaf exercita exclusivamente atividade de inteligência financeira, ou seja, a ele cabe, através do seu sistema de inteligência artificial e de análise, identificar transações suspeitas que podem indicar indícios de crime. E a investigação vai ser feita por órgãos típicos de investigação. Então, quem chegará ao terrorista é o Ministério Público ou a Polícia Federal. É isso.
Muito obrigado.
O SR. PAULO LINO GONÇALVES - Com relação à capacidade do servidor do Banco Central, ela é ilimitada, ela é permanentemente colocada à prova, e até hoje o corpo funcional, ao longo do tempo, tem mostrado ser capaz de dar conta de todas as tarefas que lhe são colocadas.
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Com relação à medida provisória, eu reproduzi as palavras do Senador José Serra, na CAE, em que ele dizia que o ideal seria recusá-la integralmente, e é assim que nós pensamos também.
O ex-Ministro Maílson foi muito feliz em explicar a terceira pergunta, e, com relação à parte da TI, especificamente perguntada ao Henrique, eu deixo para ele.
O SR. HENRIQUE SEGANFREDO - Bem, sobre a questão da medida provisória, a nossa posição é de rejeição sobre realmente a sua efetividade. Qual é a real intenção dessa movimentação? E, caso os Parlamentares desta Casa decidirem - isso não é uma decisão nossa, enfim -, entendemos que existem severos condicionantes na redação que devem ser tratados através de emendas.
Isso conduz ao segundo assunto, que é a parte que o colega Lino falou, sobre a tecnologia, enfim. Nós, como associação, vimos uma possível sinergia e economia de recursos exatamente nessa área tecnológica. Eu sou servidor da área de tecnologia do Banco Central, trabalho há mais de 13 anos nessa área. Ajudei a implantar vários sistemas, várias tecnologias que hoje são utilizadas tanto para o auxílio da política monetária quanto para a supervisão bancária. Eu acredito que nós damos conta de qualquer missão que nos seja entregue, mas nos frustraram muito declarações do Presidente do Banco Central, em que ele, insatisfeito com alguns sistemas e soluções providas hoje, no Serpro, alegou que precisaria, para isso, de livremente nomear pessoas para trazer para a UIF. Ele também não nos confiou essa capacidade de absorver e tentar, juntos, a UIF e o Serpro, solucionar esses problemas.
Existe a esperança dele num terceiro ente, que não é Serpro, que não é a tecnologia do Banco Central, de que veja os problemas que hoje acometem a tecnologia, as soluções que estão na UIF, e que seja dado um encaminhamento para isso. Por isso, exatamente a nossa tentativa de influir na questão das emendas para que o quadro técnico efetivamente possa ser composto tão somente por pessoas que também componham um conselho deliberativo que, por consequência, é todo aquele rol de pessoas realmente especialistas, cada uma na sua área, seja a Receita Federal na tributação, o Banco Central na supervisão bancária, a Susep no mercado segurador, e assim por diante.
É isso.
O SR. MAÍLSON DA NÓBREGA - Pegando o gancho aqui do que disse o Henrique, de sinergia, eu acho que não é preciso transferir o Coaf para o Banco Central para haver sinergia nos seus quadros técnicos.
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A rejeição da medida provisória, a meu ver, é a ação mais correta desta Comissão, como proposta para o Plenário de cada uma das Casas do Congresso. A volta do status quo permite ao Coaf, como já permitia, trazer pessoal qualificado do Banco Central na área tecnológica.
E há um assunto que o Henrique levantou aqui, que eu confesso que poderia ter mencionado também na minha exposição, que é se há compatibilidade entre os sistemas de tecnologia do Serpro, que é o que o Coaf utiliza, com o Sisbacen, não é? É uma pergunta que não foi respondida, não estava em nenhum lugar mostrando que isso seria tranquilo, transferir o Coaf, porque se ele passar a ser um órgão vinculado ao Banco Central, o natural é que ele use o Sisbacen. Essa é mais uma dúvida que eu levantei em artigo que publiquei no jornal O Estado de S. Paulo.
O SR. PRESIDENTE (Reinhold Stephanes Junior. PSD - PR) - Alguém tem mais alguma pergunta?
Bom, todos os que desejarem participar deste evento podem enviar perguntas e comentários por meio do portal e-Cidadania, no endereço www.senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone 0800-612211.
Eu vou citar dois comentários, um deles também uma pergunta.
Leanderson de Souza, da Bahia. Ele pergunta: "Em que vai agregar, e somar para o Coaf tornar-se em unidade de inteligência agora de fato?". Bom, isso é o que nós estamos debatendo aqui.
E o Julio Cesar, de Santa Catarina, manda uma sugestão: "[...] [Os] conselheiros poderiam ser escolhidos por outras instituições [como o Conselho Federal de Contabilidade, a] OAB. Evitaria a troca de favores e aumentaria a democracia no ambiente". É a opinião do Julio Cesar, de Santa Catarina.
Eu vou passar para o encerramento, agradecendo a presença dos Deputados, das senhoras e senhores, e dos nossos convidados, que bastante elucidaram questões.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Reinhold Stephanes Junior. PSD - PR) - Pode.
O SR. MAÍLSON DA NÓBREGA - A questão de trazer pessoas do Conselho Federal de Contabilidade, da OAB, na minha opinião, não faz nenhum sentido. Eu acho que a ideia é que o órgão seja composto, até o momento em que ele tiver seus quadros próprios, por pessoas do serviço público federal. Essa é a resposta para o Julio Cesar. Com todo o respeito, eu acho que é uma boa ideia, mas não considera as especificidades do serviço público brasileiro nem do Coaf ou da Unidade de Inteligência Financeira.
Quando ao Leanderson, o que vai agregar para o Coaf tornar-se unidade de inteligência agora de fato? É só mudança de nome; não agrega nada. Na verdade, como eu disse na minha exposição, há uma diminuição do status do Coaf, que passa a se subordinar, em vez de ao Ministro de Estado, a um órgão de segundo escalão do Governo, por mais relevante que ele seja, como é o caso do Banco Central.
O SR. PRESIDENTE (Reinhold Stephanes Junior. PSD - PR) - Bom, eu agradeço a presença de todos os nossos convidados, de todos os presentes, de quem nos acompanhou na televisão e nas redes sociais.
Nada mais havendo a tratar, declaro encerrada a presente reunião.
Muito obrigado.
(Iniciada às 15 horas e 04 minutos, a reunião é encerrada às 16 horas e 13 minutos.)