11/12/2019 - 17ª - Comissão Parlamentar Mista de Inquérito - Fake News

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Havendo número regimental e sobre a proteção de Deus, declaro aberta a 17ª Reunião da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, criada pelo Requerimento do Congresso Nacional nº 11, de 2019, para investigar os ataques cibernéticos que atentam contra a democracia, o debate público, a utilização de perfis falsos para influenciar os resultados da eleições de 2018, a prática de cyberbullying sobre os usuários mais vulneráveis da rede de computadores, bem como agentes públicos e o aliciamento e a orientação de crianças para o cometimento de crimes de ódio e suicídio.
A presente reunião destina-se às oitivas decorrentes dos Requerimentos nº 22, 46 e 64, de 2019, de autoria da Deputada Relatora Lídice da Mata, do PSB, da Bahia.
Estão presentes os seguintes convidados, os quais chamo para compor a Mesa: Sr. Rafael de Almeida Evangelista, representante do Labjor da Universidade de Campinas (Unicamp); Sr. Leonel Azevedo de Aguiar; Diretor do Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio de Janeiro. Agradeço antecipadamente a presença de todos os que compõem esta plenária e também já aos convidados. Informo que o outro convidado da pauta, o Sr. Diogo Rais Rodrigues Moreira, doutor em Direito Constitucional pela PUC-São Paulo, teve o seu voo de Congonhas para Brasília atrasado e está a caminho do Senado Federal.
Antes, porém, eu recebi uma mensagem do jornalista Herculano Filho, do UOL, que eu faço questão de ler aqui para esta Comissão. O Herculano me passou.
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Hoje, pela manhã, recebi uma série de mensagens do repórter Herculano, do UOL, com quem conversei, há alguns dias, para uma reportagem que ele fazia sobre o Vereador Carlos Bolsonaro, filho do Presidente da República. Nas mensagens de hoje, o jornalista Herculano Filho, do UOL, me relatou que, dois dias depois da publicação da reportagem sobre Carlos Bolsonaro, os dados do celular dele foram invadidos. Ele recebeu uma ligação do próprio número. Herculano teve também sua conta de Twitter "hackeada".
O título da reportagem publicada no último dia 8, domingo passado, é: "Após adotar discrição digital, Carlos Bolsonaro se mantém vereador calado". Esse é o título da nota. O texto mostra que o filho do Presidente se mantém ausente das redes sociais, embora seja um dos maiores influenciadores da extrema-direita brasileira, e cita também, segundo o Herculano do UOL, a pouca atividade do mandato do Vereador, mantendo o isolamento na Câmara do Rio de Janeiro.
O jornalista Herculano Filho me relatou ainda hoje que um colega de redação, Gabriel Sabóia, passou pelo mesmo problema. Sabóia foi o autor da reportagem, aspas, "Carlos Bolsonaro adota silêncio e apoia CPI do PSOL na volta à Câmara do Rio de Janeiro", fecha aspas, publicada em fevereiro deste ano e que traça um perfil do Vereador Carlos Bolsonaro, mostrando um Parlamentar ausente e pouco atuante no seu mandato - segundo aqui a reportagem do Sabóia, que me passaram hoje.
A reportagem de Sabóia foi citada por Herculano na matéria do final de semana. Ele diz o seguinte: são coincidências muito fortes o fato de uma reportagem sobre Carlos Bolsonaro ter sido publicada, e dois repórteres, o autor e outro envolvido com outra reportagem sobre o mesmo tema terem sofrido ataques cibernéticos. "Quem está por trás disso? Que tipo de organização é responsável por isso?", pergunta-se. Qual segurança temos hoje, ao usar a telefonia, e qual segurança temos, por parte das plataformas de redes sociais, quanto aos nossos dados de contas? São questões também que esta CPMI precisa responder e trabalhar para garantir que haja segurança cada vez maior.
Fica aqui o registro do jornalista Herculano, do UOL, e também do Gabriel Sabóia, que me passou esse texto que eu estou aqui traduzindo para os senhores.
Concedo a palavra, por 15 minutos, ao Sr. Rafael de Almeida Evangelista, representante do Labjor da Universidade de Campinas, para a sua exposição.
Antes, porém, o Dr. Rafael de Almeida Evangelista é doutor em Antropologia Social pela Universidade de Campinas, tem graduação em Ciências Sociais, mestrado em Linguística e doutorado em Antropologia Social, todos os títulos pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Desde 2003, é pesquisador do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor), da Unicamp, e, desde 2011, é professor do Programa de Pós-Graduação em Divulgação Científica e Cultural também da Unicamp. Entre seus tópicos de pesquisa estão: cultura da vigilância, capitalismo de vigilância e capitalismo de vigilância no sul global, o uso econômico de dados pessoais, trabalho informacional, tecnologia da informação e comunicação em processos eleitorais, cibernética, cultura hacker, ideias e ideologias ligadas às tecnologias da informação de comunicação, movimento software livre e cultura livre. É membro da Rede Latino-Americana de Estudos em Vigilância, Tecnologia e Sociedade, autor do livro digital "Para além das máquinas de adorável graça: Cultura hacker, cibernética e democracia".
Passo a palavra...
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A SRA. LUIZIANNE LINS (PT - CE. Pela ordem.) - Sr. Presidente, antes de o Sr. Rafael Evangelista falar, eu queria só... Porque o que V. Exa. leu sobre esse jornalista da UOL, para mim, é ameaça. E ameaça é exatamente o objeto desta CPMI de que nós estamos tratando.
Então, eu gostaria de solicitar à Relatora e ao próprio Presidente da Comissão que a gente solicitasse uma investigação sobre isso. O jornalista, que tem fé pública, está fazendo uma denúncia grave. Ele foi "hackeado", ele está praticamente sob ameaça, então, eu acho que a gente tinha que dar uma consequência a isso, porque essa é uma denúncia gravíssima. Nós não podemos achar que é natural o jornalista estar sendo ameaçado ou estar sofrendo um processo de intimidação digital do filho do Presidente da República, que ontem inclusive o Sr. Paulo Marinho disse que era doido, disse que ele era doido. Eu perguntei: "Por que o senhor acha que ele é doido?" "Por tudo, porque ele é doido, precisa de tratamento psiquiátrico". Foi dito isso. Então, isso não pode... Ameaçando todo mundo, um jornalista, daqui a pouco é não sei quem. Onde é que vamos parar com isso? Então, solicito encaminhamento desta Comissão para esse caso específico desse jornalista.
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - O.k., Deputada. A nossa Relatora tomará as providências.
Passo a palavra ao Rafael de Almeida Evangelista.
O SR. RAFAEL DE ALMEIDA EVANGELISTA (Para expor.) - Boa tarde a todos.
Agradeço bastante pelo convite.
Cumprimento o Senador Angelo Coronel, a Deputada Lídice da Mata, o Prof. Leonel Azevedo.
Eu trouxe uma pequena introdução ao meu trabalho para facilitar os trabalhos de hoje. Vou começar falando um pouco então da minha trajetória profissional em relação aos temas desta Comissão, para apontar no que imagino que posso contribuir nesses trabalhos.
Eu quero começar falando um pouco de como eu me envolvi com o estudo do fenômeno da pós-verdade, fake news e desinformação na internet, que são os temas desta CPMI, em especial o impacto desses temas e desses fenômenos para a política e para a democracia.
Como dito pelo Senador, minha formação é em antropologia social e eu trabalho com métodos mais qualitativos do que quantitativos, mas eu tenho interesse específico na relação entre ideias e economia e por temas da economia política.
Já faz alguns anos que tenho estudado as redes sociais e a política, além de me interessar pela dinâmica de lucro das plataformas de internet. Um dos objetivos do meu trabalho é entender a economia dos dados e da atenção na internet, e entender como o escândalo, o sensacionalismo, o ódio e também as rivalidades políticas despertam a atenção e o engajamento das pessoas nas plataformas. Isso, por sua vez, serve ao lucro das plataformas, que comercializam a atenção e os dados dos usuários.
No ano passado, eu estive fora do Brasil de licença para um período de pós-doutoramento. Foi de fora do País, via notícias e via redes sociais, que eu acompanhei a paralisação dos caminhoneiros. Li sobre como os grupos de WhatsApp estavam sendo usados pelos motoristas para organizarem seus protestos em manifestações. Comecei então a tentar entrar nesses grupos para ver como esse fenômeno se ligava aos meus temas de pesquisa. Eu já sabia da relevância e penetração dos grupos de WhatsApp no Brasil, de como muitas vezes boatos e mentiras, inclusive de teor político, eram espalhados nesses grupos. Também já sabia da dificuldade dos pesquisadores em monitorar a atividade desses grupos de WhatsApp, de modo a saber que tipo de desinformação estaria sendo compartilhada.
A partir de alguns grupos que se pretendiam de caminhoneiros, eu comecei a perceber que havia uma tentativa de entrada de atores políticos nesses grupos. Notei a presença em especial de militantes da direita radical e de atores que manifestavam saudades da ditadura militar e que pediam por algum tipo de intervenção militar.
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Além disso, percebi que havia constante formação de novos grupos, além daqueles que já existiam, com links de convites sendo mandados desses novos grupos, enviados aos grupos que já estavam acontecendo. Alguns dos novos grupos já não se colocavam mais como de caminhoneiros, como inicialmente, e eram grupos mais voltados já diretamente para a discussão política.
A partir desse momento, então no início do período eleitoral, comecei a fazer uma pesquisa mais sistematizada. Passei a entrar tanto em grupos de WhatsApp quanto de Telegram. No exterior, eu estava trabalhando em um centro de estudos sociológicos da vigilância e o tema de uso de dados pessoais em eleições é de interesse dessa área de pesquisa.
Parte das observações que eu realizei junto com um relato analítico do contexto das eleições brasileiras de 2018 foi apresentada num seminário internacional, em abril de 2019, seminário que teve o tema "Eleições influenciadas por dados" e que procurou refletir sobre o uso de microssegmentação dos eleitores. Esse trabalho deve ser publicado em forma de artigo científico ainda agora em 2019.
Talvez em virtude do modo como foi minha entrada no campo, minha amostragem é quase totalmente feita de grupos de direita ou da extrema direita. Como eu disse, eu entrei nesses grupos que se pretendiam de caminhoneiros e, a partir daí, fui entrando sucessivamente em outros grupos a partir de links de convites. Eu ainda acompanho alguns desses grupos, mas diminuí bastante minha observação hoje.
Das observações que eu colhi nesse meu último ano de campo, eu quero ressaltar algumas coisas que percebi. Eu percebi alta presença de informações claramente falsas e forjadas, frequentemente sendo distribuídas simultaneamente em diversos grupos; alta presença de análises enviesadas ou distorcidas de fatos com o propósito de arregimentar apoio para certos candidatos e correntes políticas; com frequência, os números de telefones dos administradores desses grupos são internacionais, em especial com prefixo dos Estados Unidos; indícios de que esses grupos são gerenciados por uma estrutura única e possivelmente profissionalizada, que incide sobre o fluxo de mensagens nos chats, direciona ataques a pessoas que estão fora ou dentro desses grupos e também indícios de postagens em massa nesses grupos - então, acompanhando vários desses grupos, às vezes eu percebia que as postagens iam se repetindo, embora fossem grupos com temáticas próximas, mas grupos diferentes; manutenção de um controle sobre os membros dos grupos, de modo a que aqueles que se manifestassem contrariamente à linha política fossem expulsos ou atacados.
Essas minhas observações de campo, embora usem outro tipo de metodologia, essa metodologia de bola de neve de entrada nos grupos e muito mais qualitativa, vão ao encontro do que foi observado por um grupo de pesquisa em ciência da computação da UFMG, cujo trabalho está publicado num artigo chamado "(Mis)Information Dissemination in WhatsApp: Gathering, Analyzing and Countermeasures". Esse grupo da UFMG - e minhas observações batem bastante - monitorou eletronicamente mais de 300 grupos de discussão política no WhatsApp e concluiu pela ação coordenada de diversos desses membros em diferentes grupos, tendo em vista a administração da dinâmica e o fluxo de conteúdos informativos. Então, o que eu percebi pela minha análise qualitativa eles conseguiram comprovar pela análise quantitativa. Um dos pontos avaliados em especial por eles foi o envio de mensagens comprovadamente falsas.
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Do ponto de vista dos estudos de vigilância, o meu trabalho de campo com os grupos políticos de Telegram e Whatsapp e a estrutura de ação coordenada, revelada pelo trabalho do pessoal da UFMG, são importantes, porque revelam uma assimetria política invisível a um membro inocente desses grupos de política no Whatsapp. Dando um exemplo, o cidadão entra em um desses grupos imaginando que eles são grupos autênticos em que os membros são todos iguais e são cidadãos querendo discutir política como ele, porém, na verdade, esse membro inocente está sendo monitorado por atores políticos interessados que operam em diversos grupos de maneira coordenada formando uma rede. Esses atores mandam imagens, áudios, vídeos para diversos grupos e buscam conquistar a atenção das pessoas e persuadi-las politicamente. Justamente por achar que os outros membros do grupo são cidadãos inocentes como ele, porque a estrutura de administração e de coordenação desses grupos é invisível, o indivíduo acredita que aquela informação que está sendo repassada está sendo repassada de boa-fé e tende a acreditar nela.
Aí eu quero citar também o trabalho de outra pesquisadora, trabalho feito pela Professora da Universidade Federal de Santa Catarina Letícia Cesarino, que corrobora um pouco essa ideia da confiança que esses grupos passam. Também investigando esses grupos de política no Whatsapp, ela aponta que os grupos se caracterizam por relações de confiança, esses chats se caracterizam por relação de confiança. Mesmo que os membros desses grupos não se conheçam pessoalmente, como os grupos têm uma arquitetura semelhante a grupos que o usuário já costuma ter com relação de familiares e amigos, essa confiança que ele tem e essa sensação de proximidade de familiares e amigos são repassadas para esse outro tipo de grupo. Então, as mensagens tendem a ser recebidas e repassadas para pessoas do círculo pessoal e viralizam. Eles recebem nesses grupos de política, imaginam uma relação de confiança semelhante a que eles têm com os grupos familiares e repassam dessa mesma forma. Esses grupos de política se aproveitam dessa dinâmica.
Há outro agravante nesse processo todo. No modelo de negócio conjunto das operadoras de telefonia e das plataformas, modelo de negócio que se chama zero rating, a informação recebida em canais como Whatsapp quase nunca pode ser checada pelo usuário. Vou explicar o porquê. As pessoas que assinam os planos de telefonia mais baratos e com pouca franquia de dados terminam, quando essa franquia acaba, confinadas ao Whatsapp. O acesso ao Whatsapp é ofertado promocionalmente de graça pelas operadoras, mas as informações que chegam ali não podem ser verificadas na internet, porque a franquia de dados do plano original que elas contrataram é pequena e acaba rápido. Isso é uma infraestrutura de dados que favorece a desinformação e o espalhamento de notícias falsas, porque o sujeito não tem a possibilidade de verificar a aquela informação.
Eu quero ressaltar ainda um outro fenômeno que eu apurei no meu campo. Há os grupos que se especializaram em fazer um debate político a partir de informações que podem ser falsas ou distorcidas. A eles não importa. E é disso que eu estou falando. Em paralelo a esses grupos, tem emergido também um conjunto de veículos sensacionalistas que se pretendem noticiosos e que construíram uma estrutura para lucrar com a desinformação. São sites na web e canais do Youtube que fabricam notícias muitas vezes de maneira bastante rudimentar, a partir de pedaços de informações coletadas na internet, embalando tudo de maneira a conseguir alguns clicks ou minutos de visualização dos vídeos. Às vezes, é um vídeo com um texto de título que é malicioso; às vezes, é um vídeo que não passa de uma narração que vai se arrastando por minutos e que inventa uma revelação chocante, que nunca vem e que é falsa.
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Os links para esses materiais têm sido distribuídos nesses grupos de Whatsapp e circulam, porque favorecem a visão política dos administradores desses grupos. Os indícios são de que esse material é produzido justamente para isto: para ser viralizado em grupos. O único compromisso desse ecossistema é com a viralização sensacionalista que os grupos políticos proporcionam. O material é feito para circular nesses grupos. Há uma relação de benefício mútuo entre plataformas que conseguem audiência para esses vídeos, indivíduos empreendedores que fazem esses vídeos e buscam lucrar com os clicks produzindo conteúdo de má qualidade, e atores políticos que espalham esse tipo de desinformação. O modelo de negócios das plataformas de internet e seus algoritmos contribuem para esse ecossistema que tem essa perversidade.
Há diversas pesquisas internacionais, em especial sobre o Youtube, que mostram que o algoritmo de sugestão da plataforma favorece conteúdo sensacionalista. É a emoção causada pelo sensacionalismo que desperta o engajamento e faz com que as pessoas fiquem mais tempo visualizando e interagindo com esse material informacional. E esse sensacionalismo favorece a radicalização política e a polarização extremada.
Esta é a análise final que eu queria deixar aqui. Para combater fake news, é preciso olhar para os estímulos econômicos que têm sido criados para a disseminação de notícias falsas, com esses estímulos, no limite, levando à disseminação do ódio na política. Esses estímulos econômicos impulsionam produtores de notícias falsas, de mensagens de ódio e de desinformação. Esses estímulos econômicos distorcidos também estão presentes em estruturas que restringem o acesso amplo à internet - estou falando desse pacote de dados promocional, como o zero rating, esse modelo de negócios. Essas estruturas fazem com que os consumidores de mais baixa renda só consigam acessar o Whatsapp sem ter meios para conferir a veracidade das informações que recebem. O resultado acaba sendo que as pessoas acabam se relacionando com esses canais do Whatsapp quase como se fossem microcanais de televisão, em que ele vai recebendo aquela informação de graça, vendo vídeos etc., confinadas no Whatsapp por causa dessas práticas de zero rating. Mesmo que os sujeitos tivessem essa disposição de verificar a veracidade daquelas informações se utilizando da internet, isso é impossível, porque o plano de dados deles acabou.
Acho que é isso.
Muito obrigado pelo convite.
Espero contribuir com a discussão. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Agora, por 15 minutos, o Sr. Leonel Azevedo de Aguiar.
O SR. LEONEL AZEVEDO DE AGUIAR (Para expor.) - Boa tarde a todos e a todas aqui presentes.
É uma honra estar aqui presente, Senador Angelo Coronel, Deputada Lídice da Mata.
Saúdo os Parlamentares e as Parlamentares aqui presentes, em especial dois Parlamentares que eu conheço. Um é o Deputado Paulo Ramos, já de muitos anos. Eu comecei como repórter na década de 80 no primeiro Governo do meu xará, o Governador Leonel Brizola. Já fui chamado pelo Deputado também para participar de algumas audiências na Assembleia Legislativa do Rio, defendendo a profissão de jornalista, a obrigatoriedade do diploma para o exercício profissional. Saúdo também a Deputada Luizianne Lins, minha querida amiga Lu, minha orientanda de mestrado no programa de pós-graduação em Comunicação Social da PUC Rio. É uma honra e uma alegria estar aqui podendo falar com vocês. Saúdo também o Rafael de Almeida, do Laboratório de Jornalismo da Unicamp. Tive a honra de conhecer esse laboratório junto com o colega e amigo Alberto Dines, do Observatório da Imprensa, um dos fundadores do Observatório da Imprensa. Isso já é um ponto a se destacar, porque a sociedade civil sempre se organizou, na verdade, para manter exatamente essa observação, esses diversos observatórios sobre o trabalho da imprensa. Aqui eu rendo uma homenagem ao colega Alberto Dines, que começou, foi um dos primeiros que iniciou com esse Observatório de Imprensa. Hoje em dia no Brasil nós temos uma Rede Nacional de Observatórios da Imprensa (Renoi), que funciona em várias universidades, nos mais diversos órgãos da sociedade brasileira, fazendo esse trabalho, uma rede nacional de observatórios de imprensa que vem contribuindo muito para esse papel de observar o trabalho que a imprensa realiza. É um trabalho importante, junto com as agências de checagem de notícias também.
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Sou Diretor do Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio. A minha contribuição é exatamente tentar desfazer essa grande confusão que existe entre o que é notícia, reportagem, o que é o jornalismo informativo; o que é opinião; e o que é calúnia, difamação e injúria, que é aquilo que circula pelo Whatsapp. Aquilo que se chama fake news, na verdade, são crimes. É crime de injúria, é crime de calúnia, é crime de difamação. Não tem nada de news naquilo que circula pelas mensagens veiculadas pelo Whatsapp. Não tem nada de news. Isso é uma questão que a gente tem que deixar bem clara, principalmente para os Srs. Parlamentares, Deputados, Deputadas, Senadores e Senadoras. Eu acho que aqui nesta Casa Legislativa é que a gente começa a ter que marcar essa diferenciação.
Essa diferenciação começa, na verdade, no século XIX, na nascente democracia moderna, nas nascentes sociedades democráticas do século XIX, nas sociedades de massa do século XIX, com esse processo de urbanização, com esse processo de avanço das jovens democracias modernas, quando aparece esse gênero textual de conhecimento sobre o mundo chamado notícia. Eu já começo com uma primeira definição em relação à questão do jornalismo. O jornalismo é uma forma de conhecimento sobre a realidade social imediata, sobre a nossa vida cotidiana imediata. É esse o papel do jornalismo informativo. A sua gênese tem a ver com essa questão da realidade social imediata. Portanto, a gente tem essa primeira questão de um vínculo entre as sociedades democráticas do século XIX e o aparecimento do jornalismo informativo. Há uma série de autores, há uma série de historiadores que fazem exatamente essa relação entre a importância do aparecimento dessa forma de narrativa sobre os acontecimentos da vida cotidiana e aquilo que importam para o cidadão, e como isso contribuiu para o avanço da democracia no Ocidente. Eu acho que esse é um primeiro ponto que a gente deve demarcar: que o jornalismo informativo tem, tradicionalmente, historicamente, uma contribuição fundamental, e ele tem uma contribuição premente com o alargamento e com o avanço dos processos democráticos. Eu acho que essa é a primeira questão. O que me deixa bastante preocupado, como professor e como jornalista também, são esses ataques que partem principalmente dos nossos governantes, a começar pelo Presidente dos Estados Unidos, que é um dos primeiros a atacar aquilo que a gente chama dos órgãos de imprensa modernos, como o New York Times, o Washington Post, a CNN, aquilo que nas universidades, aquilo que na escola de jornalismo a gente diz que são os órgãos de imprensa que produzem o chamado jornalismo de referência, um jornalismo que tanto a sociedade civil, os mais diversos setores organizados da sociedade civil, quanto os próprios jornalistas reconhecem como um modelo de se fazer jornalismo, porque é um jornalismo voltado para a questão do interesse público, antes de tudo, para a defesa dos interesses públicos, para a defesa do processo democrático, para a defesa dos direitos humanos, e é um jornalismo nesse sentido que contribui para isso. É isso que se chama jornalismo de referência. Eu estou citando esses dois jornais norte-americanos, mas aqui no Brasil também a gente pode tomar aquilo que antigamente a gente chamava de grande imprensa e que, na verdade, hoje em dia a gente prefere chamar de jornais de referência, que são as organizações Globo, a Folha de S.Paulo, o Estado de S.Paulo, esses grandes "jornalões", como a gente chama. Portanto, nessa minha perspectiva de historiador, aquilo que eu vejo circulando pelos "zaps", pelas redes sociais, no caso da Folha de S.Paulo... Para nós, pesquisadores e jornalistas, a Folha de S.Paulo não é nem "foice de São Paulo" nem a "falha de São Paulo", é simplesmente um jornal chamado Folha de S.Paulo.
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É a partir desse ponto de vista que eu vou tentar sustentar essa minha convicção e essa minha prova de que os jornalistas profissionais não produzem fake news. O jornalismo profissional não produz fake news. Fake news, na verdade, tem uma grande contradição no seu próprio nome, porque, se é news, não pode ser falso. O jornalismo trabalha com o estatuto da verdade.
Quando eu olho para a própria história do aparecimento do curso de jornalismo da PUC, um dos primeiros que surge no Brasil, em 1952 - o primeiro foi o da Cásper Líbero, em 1947; depois, em 1948, a Escola de Jornalismo da UFRJ, e o da PUC é de 1952 -, o curso de jornalismo da PUC nasce ligado, vinculado à Faculdade de Filosofia. Nada mais caro para o Ocidente do que essa invenção dos gregos, 24 séculos atrás, que é a filosofia e a importância de dizer a verdade. Essa é uma invenção grega, essa é uma invenção do Ocidente. Dizer a verdade é um dos pilares de constituição da sociedade ocidental, 24 séculos atrás. Sócrates, Platão, Aristóteles, todos esses tradicionais filósofos gregos tiveram como construção da filosofia, antes de tudo, você - não sei se a palavra é exatamente essa - desconstruir... Eu ia usar a palavra "atacar" a mitologia, a narrativa mitológica, mas na verdade é desconstruir as narrativas mitológicas, desconstruir o mito em favor do discurso do verdadeiro, a verdade contra o mito. Por incrível que pareça, continuamos, 24 séculos depois, travando essa batalha, travando essa luta filosófica que, no fundo, é uma luta política, como diriam Sócrates, Platão e Aristóteles. A verdade contra o mito - é disso que se trata aqui nesta CPI. Eu espero poder avançar, esclarecer nesse ponto. Os jornalistas profissionais não produzem fake news. O jornalismo profissional não produz fake news.
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E aí, quando eu estou dizendo dos jornalistas profissionais, do jornalismo profissional, eu não estou falando só das empresas de comunicação. A gente precisa um pouco alargar essa noção. Sem querer ficar citando nomes de autores, de teóricos, há um teórico francês chamado Pierre Bourdieu, que gosta muito de usar a noção de campo jornalístico, porque ela é uma noção muito mais ampliada. Desse campo jornalístico fazem parte não só as empresas, como a gente conhece essas que eu acabei de citar, e não só essa, que é o polo empresarial desse campo jornalístico... Mas o polo empresarial não é o único polo que existe aí, a gente tem um outro polo profissional, que é o polo dos jornalistas profissionais, que tem os seus códigos de ética, tem os seus modos de atuação, tem o modo de fazer a checagem de fonte. Nós temos, dentro desse próprio campo jornalístico, aquilo que antigamente se chamava de público-alvo e que, hoje em dia, se chamam de audiência ativas. Então, as audiências participam ativamente do processo de construção das notícias, cada vez mais com as redes sociais, cada vez mais com a internet 2.0.
Além das audiências ativas, o antigo público-alvo, nós temos também as fontes de informação, ou melhor, aquilo que antigamente se chamava fontes de informação e que, hoje em dia, se chama construtores da notícia. Portanto, isso que os Deputados, os Parlamentares, qualquer cidadão, hoje em dia, faz, quando vai, por exemplo, para o YouTube e ali faz um ao vivo para dar a sua informação, mais do que uma fonte de notícia, também é neste momento um construtor de notícia. Não é que esteja fazendo jornalismo, não. Quem vai para o YouTube, quem vai para o seu "zap" mandar uma mensagem só está fazendo isto: mandando uma mensagem. Se essa mensagem é caluniosa, se a mensagem tem injúria e se essa é uma mensagem difamatória, é uma outra questão, mas essa pessoa, esse cidadão, seja Parlamentar ou não, se está ali no YouTube fazendo um ao vivo, não está produzindo jornalismo, ele está dando uma opinião, ele está produzindo uma mensagem, mas não é uma mensagem jornalística, muito menos é uma news, é no máximo um comentário.
Essa é a divisão tradicional do século XIX. O século XIX, nos Estados Unidos - e depois esse modelo foi copiado no Brasil -, fez exatamente essa divisão entre news e comments, entre notícias e comentários. Os fatos são sagrados, mas os comentários são livres. Você pode comentar o que quiser, mas o fato, a linguagem jornalística tem um referencial concreto, tem um referente concreto, que é chamado de realidade objetiva. Jornalismo não é ficção. Jornalismo é uma convenção que a sociedade democrática aceitou e incumbiu uma determinada categoria profissional de realizar esse processo de mediação. Que processo de mediação? O processo de mediação entre os conflitos e as disputas de interesses que existem em toda a sociedade democrática. Não existe sociedade democrática sem disputa de interesses e sem conflitos, os mais diversos tipos. Essa é a marca da sociedade democrática. E os jornalistas são esses profissionais a que as sociedades democráticas, desde o século XIX, outorgaram, delegaram essa função jornalística, a função de serem mediadores sociais. Eles vão lá, eles ouvem as mais diversas fontes de informação, eles ouvem os contraditórios e ali eles sabem exatamente realizar um balanço daquelas mais diversas posições que disputam determinados interesses e conflitos, e é óbvio que o jornalismo tem um lado quando ele vai produzia a matéria no final. O lado do jornalismo é sempre o lado da democracia, é o lado da defesa dos direitos humanos.
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O jornalismo consegue ser isento, imparcial e objetivo, mesmo assim, a partir dessa tomada de posição, que é a sua gênese. A gênese do jornalismo é democracia, mais democracia; é defesa dos direitos humanos; é estar sempre ao lado da sociedade civil contra os governos, gostem os governos dessa posição ou não do jornalismo. O jornalismo informativo é isto: é a sociedade contra o governo, e o jornalismo assume... O jornalismo informativo, não é? Eu estou tratando aqui da notícia e da reportagem, esse gênero textual. Eu não estou falando de opinião. Opinião é aquilo que está consagrado até no ditado popular: os fatos são sagrados, a opinião, os comentários são livres, cada um comenta aquilo que quiser e responde na forma de lei se aquela pessoa se sentiu atingida por aquele comentário ou por aquela opinião, na forma de injúria, calúnia e difamação.
(Soa a campainha.)
O SR. LEONEL AZEVEDO DE AGUIAR - Já vou encerrar.
Além disso, eu queria dizer também que, além desse polo empresarial, esse polo profissional, as audiências ativas, os construtores da notícia, a gente sempre teve, dentro desse campo jornalístico, a imprensa alternativa, mais antigamente - hoje se chama de midiativismo, midialivrismo, temos as agências independentes de jornalismo desenvolvidas por profissionais, temos os blogues jornalísticos, temos também os sites jornalísticos.
Enfim, sintetizando, o jornalismo é lugar de produção de informação jornalística, de notícia. O jornalismo profissional não produz informações falsas, não produz fake news. As redes sociais é lugar de formação de opinião, é lugar de produção de comentários. Os comentários são livres. O grande problema para a democracia é que, nas redes sociais, em vez daquilo que se diz no popular, contra fatos não há argumentos - eu acho que isso eu aprendi com o meu avô -, é o contrário: contra argumentos não há fatos. Eu acho que isso é o grande perigo que existe para a democracia, tanto para a democracia brasileira, quanto para a democracia norte-americana, quando os Presidentes passam a atacar os jornalistas profissionais e o jornalismo profissional, fazendo essa acusação de que esse modelo de jornalismo, jornalismo profissional, jornalismo investigativo, produz fake news. Não produz fake news. Os jornalistas produzem simplesmente notícias e reportagens.
Muito obrigado pela atenção. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Passo a palavra para a nossa Relatora, Deputada Lídice da Mata.
A SRA. LÍDICE DA MATA (PSB - BA. Como Relatora.) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Parlamentares, nós iniciamos a tarde bem, com essas duas belas intervenções. Quero agradecer a presença dos senhores que aqui se dispuseram a contribuir com esta CPMI, que já realiza um trabalho, na minha opinião, importante, que é o de colocar ao acesso de todos, pela mídia da Câmara e do Senado, esse tipo de contribuição que foi dada hoje aqui na nossa reunião, como de outros especialistas que aqui estiveram.
Então, eu vou repetir alguma coisa em termos de pergunta, apenas para consolidar no nosso relatório.
Está faltando o Diogo Rais, que deve estar chegando, mas nós vamos adiantando aqui com os que já chegaram e já falaram.
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A primeira pergunta é a pergunta que faço a todos, e ambos devem se pronunciar se assim desejarem.
O Prof. Gabriel, de certa maneira, fundamentou o seu pensamento exatamente nisto, que é o que é fake news? Como os senhores conceituam fake news - os dois?
Para os senhores também, vivemos um período de desordem informacional? Na opinião dos senhores, há alguma relação entre desinformação - igual à fake news - e pós-verdade?
Há técnicas para a produção de fake news? Quais? Com qual intuito?
Esta foi mais sobre a fala do Sr. Rafael. Qual o impacto de bots, algoritmos e robôs na produção, disseminação das desinformações?
Na opinião dos senhores, podemos considerar as plataformas empresas de marketing - essa é uma pergunta mais direta para o Sr. Rafael, que justamente fundamentou e desenvolveu o raciocínio em torno da questão da economia e as redes, ou economia das redes também... As empresas comercializam os dados dos cidadãos para a venda de publicidade direcionada a partir dos seus algoritmos? Quais as possíveis consequências disso?
Quais são os desafios da democracia frente ao domínio das grandes plataformas? É claro que nós constatamos que há perigo da fake news para a democracia, é o que reafirmamos aqui a todo momento. Essa é a opinião dos senhores também?
E eu queria saber se, diante dessa realidade, os senhores conseguem identificar alguma mudança ou até mesmo distorção da forma de se fazer campanha política ou a própria forma de se fazer política ocasionada pela fake news?
Os senhores acreditam que o fenômeno da produção e disseminação de fake news antes e durante as eleições, especialmente das notícias falsas que acabam por viralizar, podem gerar maior impacto na formação da opção do voto do cidadão? Em sua visão, podemos mitigar os seus impactos sobre as eleições municipais que se avizinham?
Na opinião dos senhores, o atual ordenamento jurídico nas esferas eleitoral, civil e criminal está adequado e é suficiente para enfrentar o processo de desinformação que impacta a democracia, a sociedade e as instituições? Há lacunas normativas a serem preenchidas? Quais as lacunas e como superá-las? Isso é mais relacionado à área do Direito.
Como os partidos, os cidadãos, as instituições públicas e privadas e as organizações da sociedade civil podem auxiliar no enfrentamento à fake news para prevenir, aperfeiçoar, detectar e conter os danos da produção e disseminação de fake news?
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Essas são algumas das perguntas que eu gostaria de fazer para que pudesse ouvir dos senhores a colaboração na formação do nosso relatório em relação a fake news.
Também, Sr. Presidente, queria solicitar a V. Exa., porque recebi um extrato pequeno de uma pesquisa realizada pela Câmara e pelo Senado sobre redes sociais e fake news, que pedisse ao DataSenado que nos desse conhecimento de todo o resultado da pesquisa para que ela pudesse incorporá-lo ao nosso relatório.
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Solicito ao nobre secretário que formalize o pleito da nossa Relatora.
A SRA. LÍDICE DA MATA (PSB - BA) - Só uma pergunta... Eu já terminei. É uma pergunta ao senhor, ao Presidente.
Como é que nós pretendemos funcionar? Eles responderão a mim, e, quando chegar o próximo, ele falará até abrirmos para as Sras. e Srs. Deputados? Provavelmente, não é?
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - É.
A SRA. LÍDICE DA MATA (PSB - BA) - Tá.
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Com a palavra Rafael.
O SR. RAFAEL DE ALMEIDA EVANGELISTA (Para expor.) - Muito obrigado pelas perguntas, Deputada.
São várias coisas, eu vou tentar juntar alguns desses aspectos na minha resposta, emendando com alguns comentários que falam mais direto ao tipo de pesquisa e de experiência de campo e literatura com a qual eu tenho trabalhado.
Vou começar pela definição de fake news e a ideia de pós-verdade. Eu acho que a expressão "pós-verdade" tem sido utilizada e pensada como algo mais amplo do que fake news. Pós-verdade tem sido um termo utilizado para descrever, na verdade, uma sensação, um outro momento de relação com a informação em que a informação mais factual e a informação ou ficcional ou essas diversas narrativas acabam se misturando justamente junto com a mistura dos diversos meios e também com um momento político que a gente tem vivido de enfraquecimento de certas instituições. E aí estou aludindo ao jornalismo, que passa a ser mais questionado a partir das redes sociais, da internet etc, o que de alguma maneira democratiza a possibilidade de informação, mas estou também falando sobre o que tem acontecido com o campo científico, os questionamentos que têm acontecido com relação à legitimidade da ciência para ser como alguém que faz uma representação do que é o real. Então, eu acho que a ideia de pós-verdade está dentro desse contexto.
Fake news eu acho que é uma expressão - e aí eu vou bastante na linha do que o Prof. Leonel também comentou -, eu acho que é alguma coisa que serve muito mais para expressar essa cópia de uma fórmula estrutural ou de uma aparência estrutural do que seria o jornalismo, não é?, essa coisa que dá para um pedaço de informação um formato de como seria o jornalístico, mas que não é feita a partir desses critérios de busca de apuração da informação, que são históricos do jornalismo. Então, fake news, acredito que a expressão seja melhor usada para algo que é deliberadamente falso.
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Técnicas para produzir fake news: acho que tem várias técnicas, eu não sei quais são, não sou especialista na produção disso, mas consigo perceber diversas técnicas de produção, certas iscas que há para atrair a atenção das pessoas, que fazem parte dessa técnica de produção de fake news, e também da maneira como essas fake news são envelopadas, são descritas, a partir de título etc., de maneira a se aproveitar dos algoritmos das plataformas, fazer uso deles, para que isso viralize e gere maior engajamento. É isso que foi, mais ou menos, o ponto que eu quis dar para a minha fala: o quanto você tem atores maliciosos, tanto dentro da política quanto dentro de um jornalismo que talvez não caiba ser chamado de jornalismo, que só está procurando fazer dinheiro com sensacionalismo, que aprende como funciona, fica tentando entender como funciona a distribuição algorítmica das notícias nas plataformas e se aproveita disso para produzir os seus conteúdos.
Tinha também uma questão sobre a influência dos bots, e aí eu queria colocar uma outra expressão que tem sido usada também que são os cyborgs. Quer dizer, os robôs seriam esses truques de programação feitos para automatizar uma certa resposta. Os robôs são importantes, mas, junto com os robôs, é importante pensar os cyborgs, que seriam essas pessoas que trabalham junto com esses bots, para fazer... Pode ser uma campanha de espalhamento de uma notícia falsa, pode ser um ataque para uma determinada pessoa, algo assim. Isso é presente nesse ecossistema informativo de uma maneira bastante grande. Eu acho que o Twitter é um dos grandes lugares onde isso se expressa bastante, a compra de alguns desses robôs e de pessoas para viralizarem determinadas hashtags, conteúdos etc.
Isso eu acho que me permite ligar com a pergunta sobre a desordem informacional. Eu acho que a ideia de desordem informacional está muito ligada a uma perspectiva que a gente tem de que uma democracia só é saudável, só é boa se ela estiver funcionando, se tiver uma organização da produção da informação que seja saudável - não sei se essa expressão é boa -, uma boa ordem informacional. Eu acho, na minha leitura como pesquisador do jornalismo e da comunicação, que o Brasil nunca teve uma organização informacional muito boa. Então você sempre teve: concentração de meios de jornais, de televisões, a propriedade muito pouco distribuída para diversos atores da sociedade, essa propriedade muito concentrada. Quando você entra numa era como a que tem esses novos atores que são viabilizados pela internet, que são as plataformas, isso se torna ainda mais dramático, essa desordem se torna mais ampla. Acho que é uma missão do Legislativo pensar sobre essa desordem e pensar politicamente como reorganizar o sistema informacional, porque, sem a organização do sistema informacional, essa tentativa de organização do sistema informacional, que não é controlar esse sistema, mas estabelecer regras que possam ser de igualdade, de liberdade de acesso etc, sem você conseguir fazer isso você não vai ter uma democracia boa, funcional e que possa nos ajudar a melhorar as condições do nosso País.
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Há uma questão que eu queria particularmente responder muito diretamente, a questão sobre as plataformas. A pergunta foi sobre se elas são empresas de marketing. As plataformas, quando instituem algoritmos que passam a distribuir a informação, porque elas buscam prender a atenção desse seu leitor ou de quem está visualizando vídeos etc, elas deixam de ser atores neutros, as plataformas deixam de ser neutras porque elas privilegiam certos conteúdos. Quando elas mudam para esse momento, é preciso repensar esse papel delas. Eu não sei se a empresa de marketing é uma boa ideia, mas elas se tornaram empresas de mídia e isso precisa ser discutido pela sociedade.
Sobre desafios para a democracia e mudanças na campanha política. Eu acho que a gente tem enormes desafios para a democracia, desafios que são antigos, de uma desorganização informacional já antiga, já problemática, mas que piora. Em vez de ter melhorado com a democratização do acesso, que acontece com a própria internet, acesso de reprodução, você tem na verdade um ambiente, uma possível piora dessa organização, com a atuação desregulada das grandes plataformas. Isso coloca enormes desafios para nossa democracia, que são desafios da ordem de produzir um ambiente social que seja de efetivo diálogo e não pautado por um sensacionalismo ou por um ódio que forneça mais engajamento por pedaços de notícia, a partir de pedaços de notícia. Então, esse é um desafio enorme. Isso tem um potencial de ter um efeito muito ruim para as democracias globais.
Eleições são feitas de quatro em quatro anos ou de dois em dois anos, porque você tem também a eleição municipal. Elas são momentos muito especiais. Se você consegue influenciar o público nesse momento muito especial, estimulando o ódio e estimulando propostas que não sejam construtivas, democráticas etc, você potencialmente tem um prejuízo bastante grande para o próprio sistema democrático. Então, acredito que essa seja uma das grandes transformações que aconteceram, um dos desafios para a democracia.
Eu acho que a última campanha, em especial, mostrou que as campanhas mudaram, porque o que os meus dados me mostram e o que a literatura me mostra é que os mensageiros e os grupos de comunicação, os aplicativos de comunicação e de grupos de discussão, em especial, foram transformados em arma política, eles foram transformados da sua função ou do seu propósito original em algo para ser instrumentalizado por campanhas políticas. E há indícios muito fortes sobre ações coordenadas em cima desses grupos.
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Sobre questões legislativas e se o nosso arcabouço legislativo é suficiente. Eu acho que, como o Prof. Leonel manifestou, tem uma coisa muito... Nosso sistema penal, a Justiça já está bastante bem equipada para responder ao desafio com relação à calúnia, difamação etc. Não acredito que a criminalização das fake news, por exemplo, seja uma saída. Vejo com muita reticência. Não sou especialista na área de Direito, então vejo só com uma reticência, justamente pela dificuldade de a gente classificar o que é um meme, o que é uma piada. A gente vai entrar num território que é complicadíssimo. Acho que a gente já tem um sistema jurídico para dar conta de problemas específicos. Agora, isso não significa que nós não temos que interceder para regular esse sistema: nisso eu acredito que a gente tem muito o que fazer, como cobrar dos tribunais eleitorais, como aperfeiçoar a legislação eleitoral, como pressionar as plataformas para serem mais transparentes - as plataformas e empresa de telefonia -, no manejo desses dados.
Só para finalizar, porque não posso deixar de falar sobre isso que é justamente meu tema de pesquisa, respondendo muito diretamente: sim, as empresas comercializam dados pessoais. Algumas com uma autorização que é bastante precária, fajuta. Acredito que a lei de dados pessoais ajuda a disciplinar isso que tem acontecido. Agora, é um desafio enorme para nós pesquisadores - e acredito que para o Legislativo também - pensar as transformações que estão acontecendo no mundo, em especial no capitalismo, no que tem sido chamado hoje de capitalismo de vigilância, ou seja, o fato de que você tem grandes plataformas que construíram modelos de negócio em cima da coleta de dados e do perfilamento de pessoas, que constroem uma maneira, um modo de acumulação econômico baseado na predição de comportamentos e na tentativa de mudança do comportamento dos indivíduos, dos usuários. Esse é um tema importantíssimo que eu acredito que necessita de bastante discussão, reflexão e regulação para que se chegue a um equilíbrio ou a um ecossistema que não seja tão predatório, como é o ecossistema pretório que a gente tem hoje.
Acho que é isso. Acho que falei bastante coisa.
O SR. PAULO RAMOS (PDT - RJ) - Presidente, poderia pedir-lhe uma gentileza?
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Pois não, Deputado.
O SR. PAULO RAMOS (PDT - RJ) - Em homenagem aos nossos convidados.
Eu estou pressionado a presidir uma reunião do Parlamento do Mercosul...
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Eu também.
O SR. PAULO RAMOS (PDT - RJ) - ... porque eu sou eu sou mais velho, por incrível que pareça, e tenho que presidir a eleição do Presidente, mas só queria deixar uma indagação. Como as respostas são gravadas, eu depois teria a oportunidade... Não queria ser indelicado saindo depois das exposições, até numa homenagem mais especial ao Leonel, que é lá do Rio de Janeiro. A São Paulo não estou prestando muita homenagem não. (Risos.)
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Mas só para deixar a minha... Porque nós estamos aqui... A CPI é um instrumento de investigação; nós estamos diante da prática de crimes. Então, a grande questão é como se identifica o autor.
A Constituição diz lá que é livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato. A grande questão é como essas empresas perdem o direito à proteção de quem... Nós ouvimos aqui um convidado, que também fez uma intervenção relevante, dizendo que é possível identificar. Demonstrou aqui os caminhos para a identificação e, mais, ainda acrescentou que esteve participando de encontros na Polícia Federal, deixando a impressão de que a Polícia Federal está habilitada hoje a identificar aquele que se utilizou da rede social para a prática de ilícitos dos mais diversos.
Nós estamos tratando da política, da injúria, da calúnia, mas tem pedofilia, tem as coisas... Quer dizer, a grande indagação é - e ouvi depois - a questão da identificação de quem se utiliza desses mecanismos para a prática de crimes, não só para influência no processo eleitoral.
Por último, quero dizer que nós sabemos que o avanço tecnológico, num certo sentido, desconcentrou...Porque os nossos meios de comunicação, especialmente os dominantes, em várias oportunidades, assumiram claramente um lado e destruindo a honra de muitas pessoas em homenagem ao processo político, especialmente na ditadura. Alguns meios de comunicação cresceram na ditadura; outros foram aniquilados. A última... O nosso Samuel Wainer, acabou que está aqui no Jornal do Comércio. Ele acabou, mas o Jornal do Brasil, vários outros jornais, o Diário de Notícias.
Ué, meu Senador. O senhor veio presidir, eu vou lá elegê-lo.
O SR. PRESIDENTE (Nelsinho Trad. PSD - MS) - Nós estávamos precisando do quórum do Senador Angelo Coronel.
O SR. PAULO RAMOS (PDT - RJ) - Ah, tá.
O SR. PRESIDENTE (Nelsinho Trad. PSD - MS) - Eu vim aqui substituí-lo.
O SR. PAULO RAMOS (PDT - RJ) - É que eu vou lá presidir a sessão, porque o Senador vai ser eleito Presidente do nosso grupo aqui do Parlamento do Mercosul.
Eu encerro deixando essa indagação.
É a questão da identificação, quer dizer, qual o constrangimento legal que deve ser imposto às empresas no sentido de, a partir da prática de um crime, elas terem que assumir a responsabilidade de identificar o autor sob pena de cumplicidade, de coautoria. Como é que os expositores veem isso?
Porque sempre vem aqui assim: a criminalização não, nós temos que encontrar mecanismos de controle. Está bem, mas, quando um instrumento é utilizado para a prática de um crime, como é que nós ficamos diante disso?
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Então essa é a minha indagação.
Obrigado por se lembrar das nossas audiências lá na Comissão do Trabalho, defendendo a Luizianne, defendendo o jornalismo, o diploma, a importância da profissão.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Nelsinho Trad. PSD - MS) - Agradecemos ao Deputado Paulo Ramos.
Passamos a palavra ao Dr. Leonel Azevedo de Aguiar.
O SR. LEONEL AZEVEDO DE AGUIAR (Para expor.) - Obrigado pela beleza de suas palavras.
Bom, a primeira questão aqui perguntada pelo Senador, desculpe, pela Deputada Lídice, é a definição de fake news. Há muitas definições, mas fake news, na verdade, é a prática de produções textuais e de postagens produzidas por grupos políticos ou por internautas e disseminadas nas redes sociais. Não se relacionam com o trabalho jornalístico. Eu acho que essa é uma outra questão também em relação a essa denominação que é, no meu ponto de vista, errônea. Por quê? Se é fake não pode ser news. Exatamente porque essas produções textuais não aplicam os princípios éticos profissionais, nem as técnicas jornalísticas na produção de notícias e na reportagem. Por exemplo, alguns termos técnicos que nós usamos nesse processo de ensino e aprendizagem do jornalismo, que é critério de noticiabilidade, valor de notícia, o nosso Código de Ética. Então essa é uma primeira questão que eu gostaria de destacar. Então, é como assim digamos, um determinado pesquisador da academia compreende essa questão de fake news.
Agora, há uma versão equivocada do que é fake news, que é essa que eu estou falando aqui em relação a essas figuras notórias, como o Presidente Trump, mas não é só ele; essa visão equivocada sobre fake news considera que as fake news é um conceito que tenta, na verdade... Fake news é algo que esses notórios, como o Presidente Trump, por exemplo, usam para acusar a imprensa, a imprensa profissional, ou seja, acusa o jornalismo profissional de produzir notícias falsas. Essa é uma outra visão que é bastante equivocada, aquilo que o Presidente Donald Trump diz. Fake news são todos os veículos de imprensa. Ele aponta os dedos para os jornalistas e diz lá: You are fake news! São todos fake news nesse sentido. Tudo aquilo que desagrada o Presidente da República se torna fake news. Isso é um conceito, não só equivocado, como, do meu ponto de vista, perigoso para a questão da democracia.
É preciso entender que a imprensa, o jornalismo profissional, existe para manter o Governo, qualquer Governo, sob a responsabilidade de dizer a verdade. Essa é a questão. Então, assim, é preciso criar mecanismos de transparência, para que cada vez mais, os dados, as informações dos Governos - seja em qualquer nível, Municipal, Estadual ou Federal - sejam informações confiáveis, informações transparentes e facilmente acessíveis para qualquer cidadão.
Então, é uma questão fundamental a gente compreender que o papel da imprensa, o papel do jornalismo profissional é exatamente este: cobrar do Governo, manter o Governo sob a sua responsabilidade de produzir informações verdadeiras.
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Não que o boato, o balão de ensaio, nunca tivesse existido no mundo da política e do jornalismo. Eu, que sou um jornalista, digamos assim, um pouco das antigas, muito antes do aparecimento da internet, já vi exatamente isso que se chama balão de ensaio. Um determinado governo, um determinado político quer passar uma ideia, ele usa, utiliza a mídia e a imprensa para passar uma determinada ideia para ver qual é aquele impacto que tem. Primeiro, entre os integrantes governamentais; depois, entra a própria mídia; entre alguns setores da sociedade. O balão de ensaio sempre existiu. E os jornalistas experientes, esses jornalistas que conhecem o código de ética profissional, são atentos aos critérios de noticiabilidade, aos valores-notícia, à questão de se produzir um jornalismo voltado para o interesse público, eles sabem exatamente como lidar com essa questão do balão de ensaio e do boato.
A questão é que, com fake news, a gente criou um novo regime, que é um regime massivo e globalista de se difundir as mentiras. Esse é o problema de fake news. É um regime massivo de produção da mentira. Produção massiva, produção em massa, produção automatizada. O grande risco disso, eu digo de novo, é a democracia representativa. Então, eu acho que essa é uma primeira questão para a gente apontar.
Quando eu disse que o jornalismo é uma forma de conhecimento, se a gente for olhar na nossa contemporaneidade, não é a única forma de conhecimento que está sob ataque. A ciência, que é uma forma de conhecimento universal, é um outro lugar que também está sob ataque generalizado desses setores conservadores e obscurantistas. A arte, que é também um modo de você produzir conhecimento sobre a nossa vida, sobre a humanidade, é um outro setor de produção de conhecimento que também está sob ataque. O Judiciário, que é um outro lugar que não só reflete uma forma de conhecimento, mas que também produz um processo de mediação social, tanto quanto o jornalismo, é um outro lugar que também está sob ataque dessas forças obscurantistas e antidemocráticas.
Então, a situação não é uma situação fácil. Essa situação contemporânea que a gente vive não é uma situação só brasileira, mas eu acho que esta CPI, que, como disse o Deputado Paulo Ramos, está investigando essa questão de fake news, tem que tomar medidas urgentes e necessárias para evitar que os alicerces democráticos neste País sejam abalados.
Ano que vem nós temos eleições. Então, um primeiro modo que eu acho de se combater isso, e eu acho que os Deputados, as Deputadas, os Senadores e as Senadoras podem muito bem propor isso, criar isso dentro de seus partidos e aqui mesmo no Senado e na Câmara Federal. É um grupo de advogados, grupos de juristas, que vão o tempo todo, mais do que investigar as redes, entrar com processos, processos em massa nas várias instâncias, nas várias comarcas. Entrar com processos em massa contra calúnia, injúria e difamação. Fazer exatamente isso que já se faz... Algumas forças conservadoras neste País, quando são atacadas, fazem esse processo. Entram com processos jurídicos simultaneamente em 50, 150, 200 comarcas neste País.
Eu acho que está na hora de o cidadão de bem, de os Parlamentares, daqueles que são os defensores da democracia adotarem essa tática também: processos massivos, pelas mais diversas comarcas brasileiras, contra calúnia, injúria e difamação. Montar mesmo grandes redes, juntando 30 mil, 40 mil juristas deste País para fazer um contra-ataque massivo a esse ataque massivo de mentiras.
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Eu não vejo imediatamente, para 2020, algo emergencial que possa ser feito, além de se montarem assim grandes gabinetes de juristas e de técnicos de informática que vão mapear e fazer um sistema de vigilância contra a calúnia, a injuria e a difamação, que ficaram conhecidas popularmente com o nome de fake news. Eu acho que essa é a saída.
Identificou injúria, identificou calúnia, identificou difamação, tem que ir atrás dos autores. Não pode deixar ou esquecer ou achar que isso é um caso menor. Sofreu qualquer tipo de ataque, seja ataque à sua honra, ou qualquer tipo de violência, violência moral, é imediatamente denunciar esses casos através desses gabinetes, que estou propondo aqui. É montar esses grandes centros jurídicos espalhados pelo País todo. É juntar 30, 40 mil juristas e técnicos e fazer esse contra-ataque a esse ataque massivo de mentiras que estão aí sendo cultivados por essas fazendas de fake news, através desse trabalho desses robôs.
Há muitas saídas para isso. A própria Comissão Europeia, bastante preocupada com essa questão, tem apontado alguns problemas para tentar enfrentar isso.
O primeiro é esse que a gente está fazendo aqui: montar comissões parlamentares de inquérito nos mais diversos níveis dos países - Comissão Europeia estava propondo isso - e um debate público constante em relação a isso.
O segundo ponto, eu acho que é esse que a gente já faz nas universidades, é promover uma educação para as mídias cada vez mais. Por exemplo, a gente tinha, até pouco tempo, no ensino médio, professores de Sociologia e professores de Filosofia; é ter agora professores de comunicação no ensino médio também, para ensinar para essa juventude exatamente o que é calúnia, difamação e injúria, nas redes sociais, e que notícia funciona pelo estatuto do verdadeiro.
Um outro ponto que a Comissão Europeia também apresenta é estimular estudos sobre a desordem informacional global, que é um pouco isso que eu e meu colega Rafael fazemos. Eu estudo teorias do jornalismo. Oriento várias teses de doutorado e várias dissertações de mestrado sobre essa questão voltada para o jornalismo nos mais diversos campos.
O terceiro ponto - que eu acho que é esse que eu acabei de citar e que esta CPMI aqui pode fazer muito bem, porque é preciso ter um aparato jurídico e um aparato financeiro também para isso - é desenvolver instrumentos e ferramentas para que os cidadãos e os mais diversos setores organizados da sociedade possam combater esse processo de desinformação e esse processo de produção da mentira massiva através das redes sociais.
Então, eu acho que essa é mais uma contribuição que eu queria deixar aqui, Senador. Eu acho urgente o Senado e a Câmara Federal montarem esses grupos bem centralizados de juristas e técnicos de informática que possam ter essa capacidade de, imediatamente, acionar a justiça e fazer processos simultâneos contra a injúria, a calúnia e a difamação, que circulam na rede.
Eu acho que é mais uma contribuição, sem querer me alongar muito, para a gente passar para mais debates.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Vamos ouvir agora a explanação do Dr. Diogo Rais, Doutor em Direito Constitucional pela PUC, São Paulo, pelo projeto CNJ Acadêmico, na Capes, em parceria com o Conselho Nacional de Justiça e em convênio com a Universidade Presbiteriana Mackenzie.
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O Diogo também é Mestre em Direito Constitucional pela PUC de São Paulo, colunista na área de Direito Eleitoral no Valor Econômico, durante as eleições de 2016, e da Folha de S.Paulo, para as eleições de 2018.
Diogo Rais é Professor de Direito Eleitoral da Universidade Presbiteriana Mackenzie, da FGV, membro fundador da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), coordenador dos livros Direito Eleitoral Digital e Fake News - A conexão entre a desinformação e o direito, ambos publicados em 2018 pela Revista dos Tribunais.
Passo a palavra a mais um convidado, o Dr. Diogo Rais Rodrigues Moreira.
O SR. DIOGO RAIS RODRIGUES MOREIRA (Para expor.) - Olá, boa tarde a todos.
Eu queria agradecer imensamente o convite e dizer que é uma honra enorme estar aqui.
Eu queria começar me desculpando - eu acho que é a primeira coisa que eu preciso fazer. Eu me atrasei e não pude acompanhar presencialmente a reunião, pois o meu voo estava marcado para as 10h, da manhã saindo de São Paulo, mas era fake news - eu descobri isso só depois. E levei mais de duas horas de atraso, o que acabou fazendo com que eu chegasse depois.
Mas, graças à tecnologia, eu pude acompanhar a reunião enquanto vinha para cá, porque já havia aterrissado aqui em Brasília, e pude ver e, inclusive, tomar nota das perguntas da Deputada Lídice, além de ver a explanação dos colegas ali, aos quais peço desculpas por não estar aqui presencialmente: colega Leonel, Rafael, Senador Angelo Coronel, Deputada Lídice da Mata, e todos os colegas e todos os Deputados e Senadores que estão presentes.
Eu queria agradecer esta oportunidade e falar um pouco a respeito daquilo com que tenho deparado com esse tema e no que eu poderia, talvez, colaborar com essa questão.
Qual que é a minha experiência nesse tema e como que eu passei a estudar isso?
Toda a minha formação jurídica é voltada para direitos políticos, mas, nos últimos 13 anos, passei a estudar tecnologia, pois acreditava que a política poderia encontrar na internet um grande espaço de atuação. E, aí, passei a estudar o chamado Direito Eleitoral digital. Tive bastante orgulho de ter coordenado o primeiro livro desse tema aqui no Brasil.
Nos últimos quatro anos, passei a estudar desinformação on-line - um pouco antes de ela ter o apelido de fake news também - em que a gente estudava muito a desordem informacional, mas sob o ponto de vista do Direito focado nas eleições, mas isso acabou se estendendo.
Então, de toda forma, minha tentativa de colaborar aqui é sob o ponto de vista regulatório e focado a partir das eleições, mas um pouco para além delas.
Esse tema tem me trazido enorme preocupação, mas também várias alegrias, como a oportunidade de conhecer estudos da área e de também conectar com outras experiências acontecendo em vários outros lugares do mundo.
Eu queria chamar a atenção um pouco aqui sobretudo ao trabalho da Organização dos Estados Americanos a respeito do tema. O Prof. Leonel já trouxe a respeito da Comissão Europeia. Eu só vou fazer esse contraponto.
A Organização dos Estados Americanos, a OEA, criou a Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão, que é conduzida pelo Edison Lanza, e tem feito um trabalho muito interessante a respeito da liberdade de expressão e, sobretudo, do diálogo político, olhando para o ambiente digital.
No passado, em julho, eu fui observador internacional das eleições no México, para estudar como fake news poderiam aparecer por lá, e, neste ano, a Organização dos Estados Americanos chamou professores de vários países, para que pensassem quais seriam algumas diretrizes razoáveis para a regulação desse fenômeno.
Então, eu acho que a primeira notícia é que não estamos sozinhos; é um fenômeno global. E isso, ao mesmo tempo, não é bom, porque, quanto mais global, talvez mais incidente esse fenômeno.
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Naquela ocasião da OEA, eu pude apresentar um estudo de caso das eleições brasileiras, que foram as eleições de 2018, e trazer um pouco do que eu tenho visto a respeito do aspecto jurídico-eleitoral do tema. E aí uma das diretrizes que acabou sendo discutida e aprovada lá - isso já está disponível, está na internet o Guia de Combate à Desinformação, Guia da Relatoria de Liberdade de Expressão... Eu não sei se há um espaço em que eu possa deixar o link do estudo para quem tiver assistindo e se interessar; e também, se alguém quiser, eu posso postar no Instagram ou em algum outro acesso em que a gente consiga se conectar.
Mas, nesse Guia de Combate à Desinformação, dentre as diretrizes, algumas delas se referem muito ao que a gente está discutindo aqui, a este tema específico de como regular e como entender esse processo da desinformação no ambiente político e fora dele.
Eu queria chamar atenção para dois pontos e falar um pouco a respeito deles. Um ponto é sobre qual é o tamanho da responsabilidade das plataformas pelo conteúdo de terceiro e qual é a dificuldade de tratar desse tema; o outro ponto é a respeito da utilização da lei penal, do Direito Penal para cuidar desse tema.
Diante da responsabilidade das plataformas, uma das recomendações é que as plataformas não sejam de forma automática responsáveis pelo conteúdo de terceiro, por uma razão, por uma indicação: as plataformas não fazem um filtro de quem será o usuário; ela tem lá os requisitos para se ingressar naquele espaço, mas os conteúdos são próprios e de cada um, de tal forma que, se as plataformas forem incentivadas a retirar conteúdo sob pena de responsabilização pelo conteúdo de terceiro, talvez abra-se um ciclo de responsabilização porque, ao mesmo tempo, quando se dá a responsabilidade para alguém, antes disso você dá poder; eu não posso responsabilizar alguém que não tenha o poder de fazer aquilo pelo que eu o estou responsabilizando. Daí o perigo de, na dúvida, as plataformas removerem, e a gente ter... Porque a gente não pode se esquecer de que estamos numa situação extremamente grave, mas, diante dela, está a liberdade de expressão, que também deve ser, de alguma maneira, compatibilizada ali.
Outra questão é a questão do Direito Penal, do quanto é difícil regular isso. Dentre as perguntas da Deputada Lídice da Mata sobre o que é fake news, é extremamente difícil conceituar fake news, porque é difícil saber o que você espera que seja fake news. E você pode falar: "Então, não tem regra?" Na verdade, eu acho que há uma grande expectativa dessa expressão e é uma expressão totalmente infeliz. Eu acho que o Coronel comentou e o Rafael também que, se é fake, não é news; se é news, não é fake. Não existe notícia falsa porque esse conjunto... Não tem como. É um paradoxo. Se é notícia, não é falso; se é falso, não é notícia.
O que eu tenho estudado sobre isso e com o que eu, de alguma maneira, queria tentar colaborar aqui para iniciar o debate e ficar à disposição para que a gente possa conversar a respeito: qual seria, talvez, uma das estratégias para a gente combater esse desafio? Qual é o grande problema? O grande problema é que a desinformação bagunça nossos parâmetros de verdade, e, com base nela, nós tomamos decisão. A tomada de decisão é com base nisso. Então, se você acreditar, como eu, que acreditei hoje que meu voo sairia no horário... Era para eu estar aqui bem cedo. Se você partir dessa premissa, o resultado pode ser completamente oposto ao que você esperava. Então, basear-se nessa desordem informacional pode viciar a sua vontade, ou seja, a desinformação é também um problema de liberdade, de liberdade de escolha, da sua liberdade de escolha. Então, é neste cenário que eu acho que a gente tem que desenvolver.
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É muito comum identificar fake news e muitas vezes ela acaba sendo resumida à mentira. Eu tenho bastante restrição a esse conceito ou a essa ideia, porque eu acho que mentira é um dos elementos da desinformação, mas não é o único e talvez nem seja o principal, pelo menos para a atuação jurídica, porque eu realmente acredito, sobretudo no âmbito jurídico, que o Direito, quando ele procura punir a mentira, ele não pune a mentira como um fim em si mesmo, mas, sim, como um meio para atingir um outro lado que é o dano. Então, me parece que o Direito é ferramenta para regular e trazer um respeito ao objeto tutelado, para que ele não sofra um dano, ainda que potencial, um dano potencial, um dano efetivo, um dano difuso ou dano individual, mas não me parece que o Direito deve regular a verdade e a mentira. Eu acho que isso está muito mais um campo da moral e da ética. E eu não acho que o Direito seria capaz de resolver essa questão. Eu creio que nós somos mentirosos, e somos desde sempre, menos eu, e que a gente deveria, de alguma maneira, entender esse fenômeno para além desse dilema de mentira.
Eu penso que dois elementos muito importantes para que o Direito se envolva é o dolo e o dano. A vontade de enganar e de produzir efeitos; e o dano provocado, ou com potencial de ser provocado.
E daí uma das grandes questões, porque talvez a gente poderia... Eu tenho emprestado muito ideia de que a desinformação, fake news é a mentira que tem a estética da verdade. Ela empresta a estética jornalismo, que goza de credibilidade, para tentar colocar aquilo como se verdade fosse. Mas talvez a maior dificuldade de definir isso em abstrato é identificar a verdade em si. Primeiro, porque, quando a gente vai procurar regular conteúdo, falar do conteúdo, existe um outro elemento fundamental para que a gente entenda o que é esse conteúdo que é o contexto. O conteúdo e o contexto são indissociáveis. E você tem situações em que um elogio, dependendo do contexto, vira uma ofensa.
Eu tenho usado um exemplo que é um exemplo bem ruim, mas é o único de que eu me lembro agora, que é o seguinte: imagine uma eleição em que um adversário, num debate, vira para o outro adversário e fala: "Olha, você é apenas mais um rostinho bonito aqui". Essa palavra "bonito", que é um elogio, se transforma numa ofensa e num sinônimo de incompetência, num sinônimo de incompetência! E aí, imagine, no final da eleição: "E aí vocês votarão no 'bonitão'?". Essa palavra é essa expressão que parece ser um elogio vira na verdade uma ofensa. O contexto é fundamental para se entender o conteúdo.
Então, como regular ou tratar essa questão? Me parece que o caminho é a gente entender qual é o espaço em que a regulação pode atuar e como tratar essa questão talvez muito mais diante do fenômeno da massificação do que do conteúdo em si. Não que eu ache que o conteúdo não seja importante, mas eu penso que o conteúdo é parte do processo e que não é, por meio da legislação ou do Judiciário, que a gente vai punir os mentirosos por si sós. A mentira parece que, quando ela é alvo do Direito, é ela como instrumento, como meio, e não como um fim. O Direito não seria o árbitro da verdade ou da moral para isso.
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Então, talvez, a gente poderia entender que há, talvez, três eixos de atuação. Uma das coisas que eu tenho discutido muito é: como resolver isso? Eu acho que a gente precisa dar um novo passo. E eu acho que essa tarefa... Quando a gente entende desinformação como ofensa - porque ora ela é e ora pode não ser... Por exemplo, vamos supor que eu seja um candidato e diga que "olha, eu construí dez escolas" e monto - ou o pessoal que trabalha comigo - fake news, dizendo que eu construí tanta coisa... Aquilo não está falando mal de mim: está falando bem. Mas tem um impacto político também.
Então, eu acho que a gente precisa, talvez... Oi?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. DIOGO RAIS RODRIGUES MOREIRA - Está enganando. E há um impacto.
Quanto ao aparato jurídico da ofensa, como os professores já disseram muito bem, nós temos todo um conjunto de proteção: proteção contra a calúnia, injúria, difamação... Então, parece que, talvez, a gente devesse olhar a desinformação como um gênero, no sentido de que pode ser positiva ou negativa - ou seja, aquela que fala bem ou que fala mal -, mas o que têm em comum? É o engano, o engodo. E, aí, talvez esse engano, esse cenário, talvez funcione, para a gente poder enfrentar o tema.
Qual seria, talvez, um dos caminhos? Eu tenho falado que tenho pensado numa solução que seja multissetorial. Eu acho, justamente, que fake news é um grande problema, é um grande desafio, justamente porque ela é fragmentada, difusa e vem de tudo quanto é lugar. Porque a solução teria que ser de um lugar só, fazer isso e resolver, e parece que a gente deveria ter diversos olhares para esse fenômeno e tentando o que eu venho dividindo em três eixos e com base em toda essa produção que já foi feita, tanto nacional quanto internacional: a ideia de prevenção, educação e repressão.
Quanto à prevenção, eu tenho citado um exemplo que, para mim, tem funcionado muito e eu espero que produza bastantes efeitos, principalmente na próxima eleição, que é o do desempenho do Tribunal Superior Eleitoral, ao criar um portal de combate à desinformação.
Hoje, se os senhores olharem o portal do TSE, ele tem um portal específico de desinformação. Ali há...
(Soa a campainha.)
O SR. DIOGO RAIS RODRIGUES MOREIRA - ... vários mitos e verdades sobre a Justiça Eleitoral...
Tenho um minuto para concluir só?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. DIOGO RAIS RODRIGUES MOREIRA - É?
Então, você tem mitos e verdades sobre a própria Justiça Eleitoral, você tem jogos, você tem livros, vídeos, e um conteúdo em que a Justiça Eleitoral, como instituição, previne-se de fake news, de desinformação, trazendo a verdade sobre si. Não que ela montou um portal para ser o árbitro da verdade para todo mundo, mas para ela, como instituição. Ela explica como é feita a urna eletrônica, quais são os processos e tudo o mais. Esse é um exemplo em que eu acho que a prevenção tem funcionado muito bem e deveria, na minha opinião, se estender muito mais.
A educação. A educação midiática é o grande tema. Qual é a pergunta para se solucionar desinformação, fake news? Eu realmente acredito na educação midiática. O que todos os meus colegas fazem eu também tento fazer. Dentro desse meu escopo, a gente tem, na Universidade Mackenzie, um curso de combate à desinformação, em que os alunos atuam, e eles checam o conteúdo, para entender esse processo, junto com o Direito e o jornalismo.
Então, a educação é a grande chave, porém ela leva muito tempo e depende de toda uma mudança cultural e estrutural. E a pergunta é: o que fazer até lá? Parece-me que a educação pode ir prosseguindo, enquanto também haja, de alguma maneira, este outro eixo, o da repressão.
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Ao falar em repressão, a gente precisa imaginar esse cenário sem atingir diretamente o cidadão no âmbito da sua liberdade de expressão. E aí eu venho pensando que talvez a gente poderia pensar muito mais no comportamento do que no conteúdo em si, se aquilo é falso ou verdadeiro. Talvez processar o senhor de Pindamonhangaba que acreditou em um fake news e colocou lá não seja melhor caminho, porque uma das características muito curiosas desse fenômeno é que o agente propagador muitas vezes é também a vítima, e há uma fusão entre agente e vítima. E daí eu penso que talvez, se pensarmos em algum tipo de repressão, é interessante pensá-la na forma do comportamento de massa. Talvez o maior perigo seja esse conteúdo, mas esse conteúdo orquestrado e esse conteúdo propositadamente criado não para trazer a mentira, mas, para além dela, bagunçar o parâmetro da verdade, porque hoje a gente vive num ambiente digital, assim como no real - não há mais dois mundos, é um mundo só, ele é híbrido. E, quando a gente vai pesquisar alguma coisa, se estiver todo mundo falando sobre aquilo, talvez você tenha a grande sensação de que aquilo seja verdade. Talvez, se você estiver em grupos de WhatsApp que dizem as mesmas coisas, você tenha a sensação de que seja verdade. Então, muito pior do que o conteúdo em si - porque a gente não vai reabilitar a mentira da humanidade - seja esse comportamento de massa e propositado, com a intenção de enganar. Aí que eu acho que talvez a repressão poderia olhar esse ponto, mas sem se desviar da liberdade de expressão.
Era isso que eu queria falar nessas considerações iniciais. Agradeço a vocês e fico à disposição para aquilo que pudermos debater a respeito.
Obrigado.
O SR. ALEXANDRE FROTA (PSDB - SP) - Presidente, tempo de Líder.
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Pois não, Deputado Alexandre Frota.
O SR. ALEXANDRE FROTA (PSDB - SP. Pela Liderança.) - Muito obrigado, Presidente, a todos da Mesa.
Presidente, eu vim aqui mostrar uma curiosidade para todos nós, porque, na semana passada, quando nós recebemos aqui a Deputada Joice, ela mostrou aqui - e nós fizemos questão de nos aprofundar mais - que tinha um grupo chamado Secreto 2GO. Durante a fala da Joice, eles começam falando: "Meu Deus, acabei de ver aqui na CPMI - Fake News! Estão mostrando o nosso calendário e falando do dia em que vamos atacar! Que loucura! Neste momento, estão lendo as coisas aqui." E aí alguém pede para esse Rômulo Lima, que é o administrador do grupo: "Cancelar o grupo agora". E aí ele começa a cancelar o grupo. O grupo é Bolsolindas, Bolsoteus, Carlos Opressor, Chega de Corruptos, Conservadores 2, Conservadores 3... Está aqui, ele está aqui.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. ALEXANDRE FROTA (PSDB - SP) - Aqui não falam de Bolsoface. Mas está aqui. Aí, esse Rômulo Lima, dias depois, dois, três dias depois, esse tal de Rômulo Lima aqui se autodivulga na rede dele, dizendo o seguinte: "Rômulo Lima, empreendedor, advogado, citado na CPMI - Fake News, no dia 4/12/2019, às 3h34, pela Deputada Joice Hasselmann. Eu sou dono de um humor inquestionável". Esse Rômulo Lima se vangloria de ter sido citado aqui, como muitos estão se vangloriando.
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E aí a gente foi pesquisar mais a fundo as redes sociais dele. E a gente vê ele brincando com um golfinho, ele começa a trocar, ele troca mensagem com o Carlos Bolsonaro. Ele esteve na Câmara aqui e fez essa fotografia: "Estou em reunião operacional no gabinete de Eduardo Bolsonaro". Aí ele fez uma foto com o Eduardo Guimarães, que é o assessor Chefe de Gabinete do Eduardo Bolsonaro. Está aqui a foto. Lembra o que a Joice falou, colocou até a ... Então, esse cidadão que opera e operava um desses grupos do WhatsApp está aqui. Ele ainda brinca e fala: "Estou em reunião no gabinete do ódio". Aí, o Dudu Guimarães escreve: "Onde a morte se faz verdade". E aí ele ameaça não só a Joice, como me ameaça também, achando que eu tenho medo dele, porque ele tem 1,90m. Ele me ameaça aqui. Ainda me chama para ir lá ao gabinete dele. Eu vou lá, entendeu?
Aí, temos aqui: Bolsofeios. Bolsofeitos entram falando - naquela tarde aqui, a gente questionando, falando sobre como eles atacam -, chamando a Joice de obesa. "Talvez eu tenha alguns vídeos subindo num apartamento. Se liga, viu? Imagina seu marido, um cara renomado, sendo corno". Vai vendo. E aí há uma série de ataques deles aqui, que estão aqui: Bolsofeios, Lorena não sei das quantas aqui. Atacam o Deputado Heitor Freire, do PSL, que esteve aqui há pouco tempo.
Aí ele faz uma foto, credenciado. Sabe onde é essa foto? No Palácio do Governo, lá do lado desse charlatão...
(Soa a campainha.)
O SR. ALEXANDRE FROTA (PSDB - SP) - ... que está tomando conta deste País. Aí nós temos aqui ó: "Mais do que amigos, somos friends". Uma foto dele com Jair Bolsonaro: "Somos friends", dentro do gabinete do Bolsonaro - olha aqui, Rui Falcão -, dentro do gabinete do Bolsonaro!
E aí o Bolsonaro troca mensagem com ele. E acreditem - ele mencionou, o rapaz -, e aí acreditem: ele almoça com o Bolsonaro, dentro do Palácio, na cozinha que fica ao lado do gabinete do Presidente. Só mais um minuto que eu estou terminando já aqui. "Bolsonaro diz que vai estudar a liberação do rodeio de gordas, grande dia". Está aqui a foto dele. Daqui a pouco, ele está entrando com outra conta aí: "Olha lá, o Frota está me mostrando, fiquei famoso", porque é assim que eles estão agindo. Só que eu falei hoje, no Plenário, eles estão rindo agora, mas eles vão chorar amanhã.
"Bom dia, milícia! Estou chegando em Brasília". Quem paga essa passagem desse cidadão que ataca as pessoas, que destrói a reputação das pessoas, faz um enfrentamento com Deputadas e Deputados aqui dentro? Porque é isso que essa milícia tem feito, tem desconstruído o senhor, tem que desconstruído a senhora, não acreditam nesse trabalho que está sendo feito aqui dentro.
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E aí acreditem: "Estou no Royal Tulip Brasília. Estou aqui tomando uma piña colada". Olhe, ele aqui ó, no Royal Tulip, que eu entendo que é um dos hotéis onde muita gente se hospeda aqui. Enfim, está aqui no Royal Tulip. E aí o cara - olhe essa aqui, é para terminar - fazendo ameaças a quem critica a milícia, fazendo ameaças a todos nós aqui: "O 'cara' que posta merda acordou vivo e saudável, já Marielle Franco..." Está aqui. Então, esse é um dos sujeitos que compactua com essa lambança, com essa sujeira, com essa covardia. É um sujeito que merece ser trazido aqui também.
Mas aqui fica explícito, mais uma vez, mais uma vez, que essa milícia frequenta, almoça, conversa, faz reuniões com o chefe do País. A prova está aqui. Tivemos o Santos Cruz sentado aqui, no lugar do Rafael, que afirmou que quem contratou aqueles três pilantras, covardes, que estão na sala ao lado do Bolsonaro, foi o próprio Santos Cruz. Ele falou aqui para gente.
Então, eu trago aqui - e quero colocar à disposição da equipe técnica - mais um documento oficial, porque foi tirado das redes, de ataque, de linchamento, de covardia e avalizado pelo Presidente Bolsonaro, que almoça, que janta, que enaltece esse tipo de coisa e depois diz: "Ah, as pessoas que vão lá na CPMI são idiotas. Deve ter mais um idiota hoje falando", como ele falou na semana passada, desdenhando do nosso trabalho. Isso não se trata de perseguição, isso se trata de fatos comprovados que a cada dia esta CPMI vem mostrando ao povo brasileiro. É óbvio que existe uma parcela que não quer acreditar nisso, mas já foi mostrado diversas vezes aqui dentro o modus operandi, como eles fazem, como eles atacam, os nomes.
Então, eu só vim aqui hoje para trazer mais esse documento - por favor - para deixar claro aqui a anuência do Presidente Bolsonaro. Ele não pode dizer que não conhece, que é apenas um amigo, porque ele almoçou, o cara ficou hospedado no Royal Tulip e fazia parte de um grupo importante que se comunicou durante a reunião.
Quero agradecer ao senhor por ter dado esse tempo. Quero agradecer mais uma vez ao Carlos Bolsonaro que virou fã da CPMI, está sempre nos assistindo, ora com o Léo Índio do lado, ora sem o Léo Índio. O Léo Índio não está aqui hoje, né?
Hoje não, ele vem só no dia que sabe que tem muito fotógrafo.
Então, quero agradecer a você, Carlos Bolsonaro. E a gente está chegando lá.
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP) - Sr. Presidente, pela ordem.
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Pela ordem, Deputado Rui Falcão.
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O SR. RUI FALCÃO (PT - SP. Pela ordem.) - Eu sei que a nossa pauta aqui era outra, mas o Deputado Alexandre Frota, membro desta CPI, traz novas informações.
A CPI, a qualquer tempo, pode receber informações. Mas eu levanto a questão de ordem com uma preocupação muito grave, porque uma das mensagens que ele leu coloca nós todos sob ameaça. Vejam bem, diz o seguinte: "Estão todos saudáveis e tal..." Vamos ler de novo. Não é brincadeira. É uma coisa gravíssima. Por favor, Deputado, leia de novo. As outras têm bravatas e tal; essa é uma ameaça concreta: estão todos saudáveis de manhã. Vejam Marielle Franco."
O SR. ALEXANDRE FROTA (PSDB - SP) - "O cara que posta merda acordou vivo e saudável. Já Marielle Franco..." Está aqui.
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP) - Eu acho que nós temos poderes nesta CPMI...
O SR. ALEXANDRE FROTA (PSDB - SP) - O nome dele é Rômulo Lima.
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP) - ... de investigação, poderes judiciais. Eu entendo - e aí cabe ao senhor e à senhora decidirem qual o melhor caminho - que seria o caso de oficiar a Polícia Federal ou alguma autoridade constituída, porque essa é uma ameaça concreta a cada um de nós, porque, na opinião deles, nós é que estamos postando essa excrescência que ele considera o nosso trabalho.
Então, quando falam em Marielle Franco, a gente sabe que Marielle e Anderson foram executados por uma milícia. Alguns estão presos, e há suspeita, inclusive, sobre milicianos ligados à família do Presidente. Então, acho que isso não pode passar em branco, não pode ser como uma mera comunicação importante do Deputado Alexandre Frota; é uma ameaça concreta. Nós não podemos ficar trabalhando aqui, com um cara identificado, bandido. Isso não é fake news; isso é uma ameaça real às nossas vidas. Então, eu pediria ao senhor que avaliasse a gravidade disso e, em nome da CPI, tomasse providências.
Eu me sinto ameaçado, embora não cite o meu nome, ainda mais se ele tem 1,90m. Está certo que um cara de 1,90m não é imortal, e a gente não tem medo... Eu não tenho medo de ninguém, mas eu posso ser vítima de uma emboscada, como foi a Marielle. Então, qualquer um de nós... O senhor já foi ameaçado. Então, agora, tem identificação... Inclusive, se o Deputado Alexandre Frota disse que vai lá...
O SR. ALEXANDRE FROTA (PSDB - SP) - Sim...
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP) - ... é bom o senhor ir com segurança, porque pode haver alguma coisa com o senhor também.
A SRA. LUIZIANNE LINS (PT - CE) - Sr. Presidente, pela ordem.
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Só um momentinho, Deputada.
Eu vou acatar a questão de ordem do Deputado Falcão, com a documentação do Deputado Alexandre Frota. Vamos encaminhar para a Polícia Federal - temos um delegado da Polícia Federal designado para nos apoiar aqui na CPMI - para que proceda à devida investigação para se chegar à pessoa que tem ameaçado os membros da CPMI.
Pela ordem, Deputada Luizianne Lins.
A SRA. LUIZIANNE LINS (PT - CE. Pela ordem.) - Daqui a pouco eu vou fazer as falas em relação aos nossos convidados, mas eu acho que o que o Alexandre traz aqui já não é a primeira vez. Eu queria solicitar a esta Comissão, Presidente e Relatora, que a gente procedesse às visitas que nós definimos desde o início da CPMI à Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ao Ministro Alexandre de Moraes, do STF, que está com um processo relativo a isso, conversar com o próprio Presidente do STF sobre isso. Acho que tem que haver uma comitiva, acho que tem que ser tirada uma comitiva para ir e saber, inclusive, dos processos que estão sendo investigados sobre fake news das mais diversas origens, inclusive do próprio Supremo, que teve seus membros ameaçados, como a gente viu aqui aquele suposto sequestro do Ministro Gilmar Mendes, que foi glamourizado com o grupo que até hoje... Ontem, inclusive, a Relatora falou sobre isso.
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Então, eu acho, Deputada Lídice da Mata, que a gente precisa tirar aqui uma data para visita. Se a Câmara e o Senado funcionarem na próxima semana, eu acho que a gente deveria ir antes do recesso do Tribunal porque nós estamos prorrogando isso, que é de interesse do Brasil inteiro, inclusive dessas instituições que estão sendo vítimas diretas disso.
Esse pessoal de que o Deputado Alexandre Frota fala está caçoando - a palavra é essa -, como se não houvesse de fato nenhum tipo de punição para o crime que eles estão praticando.
E eu queria incluir nessa investigação que o Deputado Rui propõe o que eu falei antes. No início, o Presidente da CPMI, o Senador Angelo falou que um jornalista da UOL, Herculano, estava sob ameaça, escreveu uma carta para a CPMI para ser lida, dizendo que estava sofrendo ameaça, teve a conta do Twitter "hackeada" e inclusive acusa o Vereador Carlos Bolsonaro por isso, o que também é muito grave. Então, eu quero que se coloque nessa investigação desse delegado que está apoiando aqui esta CPMI isso também, porque não é possível que a gente esteja falando aqui sobre uma coisa publicamente e essa coisa reiteradamente fique acontecendo na nossa cara!
O SR. ALEXANDRE FROTA (PSDB - SP) - Exatamente.
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP. Fora do microfone.) - Presidente, parece que nós não estamos falando publicamente, porque ontem não houve transmissão da nossa reunião. Eu não sei se ela hoje está sendo transmitida. Seria importante que houvesse a transmissão.
O SR. ALEXANDRE FROTA (PSDB - SP) - Presidente, eu tenho mais uma coisa só, se o senhor permitir...
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Pois não, Deputado.
O SR. ALEXANDRE FROTA (PSDB - SP) - É bem rápido.
Eu estava esperando, Deputado Rui Falcão, justamente mudar o nosso painel ali. A partir de hoje, nós não temos mais aquela tropa que vem aqui defender o Presidente Bolsonaro e também não temos a tropa para defender a si própria, trazendo convidados que só são do interesse deles.
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP) - Há o Marcos Feliciano ainda.
O SR. ALEXANDRE FROTA (PSDB - SP) - Sim, mas o Feliciano a gente ajeita... Ele está com dente novo, a gente ajeita.
Agora, em cima disso, Deputada Lídice da Mata, nossa Relatora, Presidente, eu fiz aqui quatro requerimentos. Inclusive de acordo com o Regimento Interno, no item 1 do título de requerimento desta Comissão, é vedada a análise de qualquer requerimento de Parlamentares que não são membros desta Comissão. Então, eu gostaria de retirar os 37 requerimentos, convocações e convites que a Dona Carol de Toni fez, que o Eduardo Bolsonaro fez, que o Filipe Barros fez e que o Márcio Labre fez também. Eu gostaria de retirá-los - estou entregando aqui esses requerimentos -, uma vez que eles não são mais membros desta Comissão e muito menos suplentes desta Comissão. Era sobre isso que eu gostaria de me posicionar aqui.
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Será encaminhado, Deputado, para a Secretaria desta Comissão, e as providências serão tomadas.
Eu passo a palavra para a Deputada Luizianne Lins para fazer as perguntas aos nossos palestrantes convidados.
A SRA. LUIZIANNE LINS (PT - CE. Para interpelar.) - Eu queria, primeiro, Sr. Presidente, lamentar o fato de que muitas pessoas que aqui vêm para defender o bolsonarismo e o terraplanismo não comparecem para entender e para compreender o significado e o conceito das coisas, o que é muito triste. Eles continuam perpetuando esse comportamento de terraplanista mesmo, de quem não quer saber: "Eu não quero saber porque não me interessa, porque a minha convicção é que vai me dar a verdade; a minha verdade, e a verdade com que vou, inclusive, enganar as outras pessoas" - supostamente, não é?
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Mas eu achei muito interessante a composição desta Mesa. Eu queria fazer algumas observações sobre cada uma das falas depois deixar alguns questionamentos. A ideia desta CPMI é a gente ir montando esse quebra-cabeça, que é uma investigação, onde vamos juntando as partes, conceituando as partes e construindo um relatório.
Primeiro vou começar com algumas questões que o Rafael de Almeida Evangelista colocou.
Você trouxe para nós uma coisa de que eu tenho falado reiteradamente, Rafael: exatamente que cada uma das democracias no mundo hoje está sendo ameaçadas em várias circunstâncias por questões de redes sociais, mas rede sociais inclusive diferenciadas, que estão se adaptando ao próprio processo da constituição do País. E eu tenho falado muito...
Ontem citei aqui uma pesquisa do DataSenado. Câmara e Senado fizeram uma pesquisa que foi publicada pela EBC, segundo a qual 79% dos brasileiros hoje usam WhatsApp, e um dos motivos é pela questão da baixa renda. Ou seja, passou a ser uma conta de telefone gratuita, acima de tudo. E isso faz com que ele tenha esse poder mobilizador. Ele não faz isso por acaso; ele faz por ter esse poder mobilizador de capilaridade. Porque até nós... Por exemplo, eu tenho o Telegram, mas o que é mais utilizado, o que a gente reproduz é essa tecnologia americana do WhatsApp, que hoje é do Facebook, como é o Instagram. Ou seja, é uma conectividade de busca de dados também que extrapola até a nossa compreensão de que a que ponto eles chegam nesse processo todo.
Além disso, estava observando que o WhatsApp hoje é o principal veículo de informação para a maioria dos brasileiros, ficando atrás de outras fontes citadas pelos brasileiros, segundo a pesquisa, de um misto de redes sociais e veículos tradicionais. Dentre eles, os canais de televisão aparecem com 50% de brasileiros que se informam por eles; logo em seguida, vem o YouTube com 49%. Quer dizer, a gente não percebeu o momento... Quando a pesquisa aprofunda, ela diz o seguinte: o YouTube apareceu como mais popular entre os mais jovens. Os que afirmam ver vídeos sempre na plataforma chegaram a 55% dos jovens entre 16 e 29 anos, ou seja, mais da metade dos jovens nessa faixa etária se informa através do YouTube.
Então, foi-se constituindo - e hoje eu tenho muita clareza disso - um mundo paralelo sendo visto e observado por essa faixa etária que foi ficando longe dos olhos das pessoas da minha faixa etária para frente, e não se entendeu a mudança de paradigma de onde se recebe a informação.
Depois da televisão, vem o YouTube com 49%. E a televisão tem 50%, ou seja, está batendo o percentual que se informa pela televisão e pelo YouTube. O Facebook tem 44%; os sites de notícia, 38%; a rede social Instagram, 30% - está em processo de crescimento; as emissoras de rádio, 22%; os jornais impressos, 8%; e o Twitter, 7%.
Qual é o grande papel do Twitter? Ele é, digamos, um formador de opinião. Ele pauta os jornais, ele pauta televisão, ele pauta outras redes e ele circula em um setor muito pequeno da opinião pública, porém um setor poderoso economicamente ou formador de opinião. Essa é uma grande tarefa que o Twitter faz.
Uma coisa para o que eu queria chamar a atenção é que, de todas essas redes de que eu falei, incluindo televisão, inclusive rádio, sites de notícia, etc., só há uma que é privada: o WhatsApp. Só há uma que é privada, que é o WhatsApp, só há uma em que eu não consigo penetrar se eu não for uma participante daquele grupo. Eu posso ter o WhatsApp, mas se o seu grupo não me acolhe, eu não estou fazendo parte do seu grupo. E o TSE muito menos, que é quem deveria fiscalizar. Ele não tem como, porque são grupos privados, são grupos fechados, são grupos de família, são grupos... E há um dado estarrecedor que eu já citei também aqui, que inclusive eu utilizei num artigo que eu fiz sobre isso: nós tivemos aí, no ano de 2018, em junho do ano de 2018, precedendo as eleições, que 12 milhões de pessoas compartilharam fake news no Brasil, 12 milhões de pessoas em junho, só no mês de junho. O levantamento monitorou 500 páginas digitais de conteúdo político falso ou distorcido. Ou seja, isso indica que essas notícias têm um potencial de alcançar quase toda a população brasileira, se você considerar uma média de 200 seguidores por usuário. A gente sabe que o WhatsApp pode fazer grupos de até 256. Cada um dos 246 é, em potencial, um retransmissor. Então, você hoje tem capilaridade para, a partir de um determinado posicionamento, seja ele verdadeiro ou falso, chegar a atingir a grande totalidade da população brasileira. E com uma diferença, ele não é detectado publicamente.
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Então, no Brasil, devido à condição de renda do povo brasileiro com relação à telefonia, devido à questão também da facilidade...
(Interrupção do som.)
A SRA. LUIZIANNE LINS (PT - CE) - ... está trabalhando, você está vendo o WhatsApp. No intervalo ali, você vai lá no seu "zap" para olhar o que que aconteceu. Você não pode fazer isso com a televisão. Nem todo espaço de trabalho tem televisão, mas está ali o smartphone com você, acompanhando você direto.
Então, eu penso que esta CPMI... E estou dizendo tudo isso para dizer o seguinte: que eu achei muito interessante porque você fez uma avaliação, sua pesquisa está vindo de fora para dentro, combinando com os pesquisadores daqui. Que é o que vem sendo feito, mas parece que isso não está chegando a canto algum. Por isso que eu acho que nós temos que procurar as principais autoridades brasileiras hoje em relação a isso: TSE e STF. Por quê? Porque as coisas estão muito claras para nós.
Ontem a gente trocava uma ideia, conversando com o Prof. Leonel, que é o estudioso dessa questão muito antes de isso estar sendo um problema tão extremamente grave como está. Está provado que o YouTube, que hoje, agora chega a 49%, a metade da população, é um canal formador de opinião e formador, além disso, de desinformação, em que os jovens são os principais... Mais da metade dos jovens de 16 a 29 anos está se informando por ele, porque eles não vêm mais de TV, vêm TV através do smartphone.
Por tudo isso, o próprio YouTube tem regras dele próprias, que a gente chama de reprodução automática, que já foram pesquisadas por pesquisadores daqui do Brasil, juntamente com universidade de fora daqui. O New York Times deu uma matéria enorme sobre isso, colocando de forma clara que o YouTube tem sido o responsável por organizar, por fazer conhecer e por articular a direita e a extrema-direita brasileira. Eles se encontraram ali. Hoje eu tenho clareza disso por tudo que eu li. Se foi o canal que juntou a extrema-direita... De onde saiu esse povo? Todo mundo já se deparou com isso depois do processo eleitoral. A gente não imaginava que esse discurso do ódio, a política como ódio, o ódio como política, a questão do preconceito, a questão do racismo descarado, a questão do fascismo aberto e a questão de as pessoas terem prazer em falar isso, o sadismo digital... Tudo isso para nós foi uma grande surpresa depois que passou o processo eleitoral, e a gente não sabia de onde tinha vindo isso.
Então, hoje as redes sociais, que conectam, conectam a maldade também, elas conectar o mal pensar, elas conectam esse sentimento de ódio que algumas determinadas pessoas passam a ter e a exercitar por doença mesmo, doença mental, doença social, doença de várias ordens.
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Então, eu queria reiterar isso, que eu acho que é muito importante e valioso para pesquisa nesse sentido, de que esta CPMI - e, aí, eu vou colocar isso de forma muito forte para a Deputada Lídice da Mata - tem que carregar no WhatsApp, como um instrumento que foi danoso e prejudicial no processo eleitoral do ano passado. Não só ele, mas ele foi o mais significativo, por todas as pesquisas que eu fiz, e eu tenho estudado esse tema.
Não há uma coisa que tenha sido mais danosa, em 2018, de que se ouviu falar, do que as marcas que foram deixadas... Porque ninguém tinha coragem de botar mamadeira de piroca na televisão. Essa é a questão central. Ninguém tinha coragem de dizer, de acusar o Haddad de pedófilo, como foi feito, na televisão e no rádio. Por quê? Aí vem o que o Prof. Leonel coloca: porque, bem ou mal, a gente gostando ou não dessas emissoras, dessas grandes imprensas, existe um código para os jornalistas - e a gente é formado para isso -, para se cumprir. Existem técnicas, como foi colocado aqui, de noticiabilidade. Por que uma coisa vira notícia e por que não vira? Não é só... Claro que há a questão da própria opinião, digamos assim, da formação do jornal, o que o jornal pensa, o que ele defende, etc. e tal, que aí diz respeito aos donos dos jornais, mas o jornalista que está lá, no seu exercício profissional, tem algumas regras que ele tem que cumprir, que ele aprendeu na universidade a cumprir. É por isso que a gente defende o diploma. A gente defende o diploma como um valor, porque não é só você escrever qualquer coisa e achar que é jornalista. Eu fico impressionada, porque vem aqui, Prof. Leonel, tudo quanto é aventureiro de construção de conteúdo - eu chamaria assim - que acha que é jornalista. Na cabeça dele, ele é jornalista de si mesmo, interpretando a si próprio e o mundo que o rodeia.
Então, é uma coisa muito complicada, porque todo mundo está sendo atingido, não só aquele que tem capacidade de vislumbrar que aquilo ali é uma mentira. Os jovens, às vezes, não têm essa capacidade. Ainda não têm inteligência emocional, ainda não têm formação para compreender essas maldades e as artimanhas da vida. E são capturados.
Então, isso eu tenho colocado muito, porque isso me preocupa profundamente. Uma das coisas que me preocupa profundamente é como essa juventude agora... Até nós. Você ouve uma coisa, a pessoa diz assim: "Aconteceu isso e isso". Aí, você diz assim: "Mas isso é verdade?". Hoje a gente está vivendo sob o espanto da mentira e da verdade o tempo todo.
A gente diz assim... Eu mesmo, às vezes, olho e digo: mas isso não é fake de novo? Você já foi atrás para saber se é verdade? Ou seja: onde... Aí eu vou citar a Profa. Lucia Santaella, que é inclusive minha professora no doutorado este semestre, que fala o seguinte: "A pós-verdade não é uma coisa que vem depois da verdade, como esse prefixo 'pós' poderia trazer de significado". Ela diz que essa pós-verdade inventada, na verdade, é uma grande tentativa de você criar uma confusão no mundo, na opinião pública, nas pessoas, de uma forma geral, em que você vai dizer "pouco me importa a verdade, pouco me importam os fatos que compõem a verdade. O importante é o que eu acredito". "O importante é a verdade que eu introjetei e em que eu quero acreditar". Quer dizer, isso é uma loucura! É como se a gente estivesse recuando no processo civilizatório mundial, e eu acho que aí, nesse caso... Aí eu vou entrar agora na seara do Prof. Leonel, porque eu acho que uma coisa que o Leonel trouxe aqui, Deputada Lídice, é o conceito de fake news, que a gente, até agora, não conseguia fechar - não conseguia fechar que eu digo é com quem veio aqui -, que é exatamente a construção... Depois ele deu a definição. Eu gostaria até que entregasse essa definição, porque a gente precisa começar... Já que nós estamos fazendo uma CPMI de fake news, é fundamental que a gente traga uma fundamentação acadêmica, e eu acho que ele trouxe, que é exatamente o quê? Não é uma informação que está sendo passada de forma equivocada. Não. É a construção de qualquer conteúdo que está sendo passado de qualquer jeito para qualquer pessoa. E ele colocou isso de forma acadêmica, de forma... Eu acho que isso deve tecer o nosso conceito para trabalhar isso.
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A segunda coisa que eu acho que o Prof. Leonel traz - no caso, eu e o Deputado Rui somos jornalistas de formação - é essa questão de que todos eles aqui vêm de forma desqualificada, de forma rasa, sem nenhum tipo de aprofundamento de conteúdo, vários Deputados bolsonaristas vêm aqui, os bolsomínions vêm aqui colocar que quem faz fake news é jornalista, como se isso fosse a mesma coisa. Ou seja, a produção de uma peça de meme desqualificada para detonar a Deputada Lídice ou o Senador Angelo, de qualquer jeito, inventando o que quer, de forma às vezes pitoresca - para não dizer de forma desrespeitosa - ou de forma mais chocante, na verdade não é a mesma coisa de um jornal que comete, que pode cometer erro. Porque o jornalista pode cometer erro, e muitos vieram aqui reclamar de uma ou outra coisa que o jornal deu errado, mas o jornal tem responsabilidade, pode ser acionado juridicamente, ele tem responsabilidade para corrigir, inclusive agora, com a lei do direito de resposta, que foi uma vitória para a democracia, recentemente. Alguns veículos se negavam a dar, e a gente agora tem uma lei que obriga o direito de resposta quando eu me sinto atingida. E não existe nada, nada, nada disso no ambiente digital, então ninguém pode comparar. Eles querem misturar o tempo todo, dizendo que o jornal faz fake news igual a uma fake news qualquer, que é disseminada para milhões no WhatsApp.
Então eu acho que isso daí vem para pontuar esse momento, principalmente agora, em que nós estamos diante da Medida 905, que a Câmara Federal está apreciando, que está tirando até do registro no Ministério do Emprego, do Trabalho agora, o registro de jornalista, como também desregulamentando as cinco horas. Nós estamos inclusive com emenda - o Deputado Rui Falcão também tem emendas - nesse sentido para a gente recompor, mas acho que não tinha outro momento para a gente estar vendo isso melhor do que este momento, porque todo mundo aqui vem e diz que é jornalista. Nunca sentou numa cadeira para discutir ética. Nós discutimos ética. Nunca sentou numa cadeira para saber técnicas de codificação do jornalismo, como é que eu escrevo uma notícia. É do jeito que eu estou querendo contar uma história? Não, não é. Existe ciência por trás; a ciência da comunicação é uma ciência, ela estuda, tem parâmetros: como o discurso é construído, como se dá o significado das coisas, como chega na opinião pública. Tudo isso é ciência, não é um achismo, a pessoa resolveu fazer uma coisa engraçadinha e saiu passando para os outros. Isso tudo eu acho que tem sido muito importante.
E por fim, o Dr. Diogo Rais traz aqui essa questão do Direito. Aí eu queria também aproveitar para fazer alguns questionamentos que eu acho que são importantes. Por exemplo, essas grandes empresas, Google, WhatsApp, Facebook, Instagram, Twitter, YouTube - a gente conversava um pouco sobre isso ontem, não é, Prof. Leonel? -, elas são meio que um não-lugar, porque se elas têm alguma sede física não importa, o que importa é que elas têm uma mão sobre o mundo hoje - sobre o mundo, olha só, não estou falando pouca coisa, não, elas têm uma mão sobre o mundo - a partir de um lugar invisível e elas entram nas sociedades como se não devessem nada para aquela sociedade, que tem uma legislação própria. É como se as leis fossem as leis deles, o Google tem a lei dele, o WhatsApp tem a lei dele, não abre porque não é para abrir... Tudo bem, é a política de privacidade, etc. e tal, de cada empresa, não estou nem entrando nesse mérito. O que eu quero saber é o seguinte: é possível que uma empresa seja regida por uma legislação dela, própria, e atravesse fronteiras e permaneça mantendo a sua legislação própria, da empresa, e não se submetendo à legislação? Porque nós estamos aqui para legislar; os Deputados e Senadores são para isso. Mas pouco importa o que a gente disser aqui? Pouco importam as leis, não é? Então, pouco importa também que a gente esteja fazendo lei. Em cima disso, eu queria saber... É importante que caminhemos para algumas regras pelo menos, para regras gerais de conduta, que nós vamos ter que apontar nesta CPMI. Nós vamos ter que apontá-las, porque senão vai ficar tudo do jeito que está.
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A segunda coisa é: como a gente faz... Esta é uma coisa em que tenho pensado muito. Agora eu sou leitora assídua de políticas de privacidade. Toda vez que me pedem para aceitar, eu tenho que parar... É um saco, porque é uma coisa gigantesca, mas, na verdade, o que eles querem mesmo está em um parágrafo! Você está aceitando que seus dados sejam compartilhados com as empresas amigas da empresa para a qual você está dando seus dados. As parceiras da Gol, por exemplo - vou citar a Gol, porque eu uso internet no voo -, só deixam eu entrar no sistema... Eu pago com meu cartão, mas só consigo entrar no Gogo Entertainment, eu só consigo entrar lá se eu aceitar a política de privacidade, mesmo pagando. Aí o que se está dizendo? A primeira coisa que é dita é que ela está autorizada a compartilhar os meus dados com as empresas que são parceiras dela, mas que não são minhas parceiras.
Então, eles vão construindo o big data e vão construir a partir disso sistemas de algoritmos que vão localizar a gente de qualquer jeito em todo o nosso... Eles localizam não só onde estamos, com a história do Google Maps etc. e tal, mas também as 15 últimas pesquisas que eu fiz na internet, exatamente o que eu sou e o que eu penso. Uma empresa dizer que tem... Aquela Cambridge Analytica tinha 5 mil informações sobre um cidadão. Eu sempre digo assim: nem eu tenho 5 mil informações sobre mim mesma! E cada vez isso vai aumentando mais! Aquele filme Privacidade Hackeada, que é um documentário, afirma que, daqui a alguns anos, os filhos dele - um tem 11, outro tem 4... O big data terá 70 mil informações sobre uma pessoa só. Conhece a pessoa mais do que a pessoa mesma se conhece!
Então, isso é covardia! É covardia, porque isso fica em qualquer dispositivo que você abre. Pula em cima de você tudo que você quer ver às vezes. Por exemplo, a Cambridge fez isto: pegou as pessoas que eram a favor de porte de arma e fez a propaganda contra a Hillary Clinton, dizendo o seguinte... Eles botaram a hashtag #hillarycorrupta e, em seguida, colocaram o seguinte: "Ela vai tomar a sua arma". E isso foi dito para quem? Exatamente para aqueles que defendiam o porte de arma, embora votassem na Hillary. Isto foi direcionado para eles: "Ela vai tomar sua arma". Eles sabiam quem eram essas pessoas, estavam localizadas. Toda vida, quando esse cidadão abria o computador, pulava de lá uma propaganda dizendo: "Hillary corrupta vai tomar sua arma". Depois, ele ia para o smartphone, e aparecia a mesma coisa. Por quê? Porque você está "logado" numa conta só. Por isso, é tudo conectado. Eu posso continuar com o Facebook. Continue com o Google! Isso é tudo coisa nova, mas é real! E nós estamos sendo vítimas disso.
A gente quer conversar com algumas pessoas aqui... É aquela visão terraplanista mesmo. Eu fico usando isso, porque para mim isso é emblemático. Para mim, isso define muito bem os terraplanistas. Eles não querem ouvir isso. Por quê? Porque eles querem continuar se elegendo através de fake news! Deu certo uma vez, mas eu tenho fé no brasileiro, tenho fé na humanidade, tenho fé em que essa situação não vai perdurar. Imagino que o mundo vai encontrar formas de se proteger disso.
Então, Dr. Diogo, para finalizar, há uma coisa que me preocupa: o processo eleitoral. A nossa assessoria trabalhou alguns questionamentos que eu acho que são importantes aqui.
Como é que você vai exigir que, nas campanhas, por exemplo, elas não deem os bancos de dados delas, mas declarem os bancos de dados de quem elas estão com banco de dados? Isso para que elas não saiam fazendo disparos de forma... Houve vários tipos na eleição passada. Eu estudei várias modalidades, e uma delas era o seguinte: disparo em massa para quem for. Botavam as pessoas no grupo, faziam um grupo, e aí a pessoa saía do grupo.
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Por exemplo, eles colocavam 25 pessoas, aí 9 pessoas imediatamente saíam do grupo, 4 depois saíam devagarinho. Ali ele já encontrou um terreno fértil para pelo menos 12 pessoas serem audiência. E daí vira orgânico, porque ele começa a repassar aquelas informações, ou seja, acaba se produzindo e se construindo um bolsomínion. Eu estou dando um exemplo aqui que foi esse disparo para dizer: "Tem que votar...". Aí começa.
Inicialmente a estratégia - eu finalizo com isso - a estratégia não é você carregar logo no processo eleitoral, dizer "vote em 'fulano'" ou "vote em 'beltrano'"; é construir tendências, tipo o anti-PT. O anti-PT... Por que todo mundo, de uma hora para outra, o pessoal começou: "Não, o PT não!". Ora, "o PT não"? O PT foi que fez este Brasil ser o que é, no período recente, que está sendo desconstruído agora. De uma hora para, o pobre, a pessoa que era pobre e que usufruiu de várias políticas do Governo Lula, anti-PT. E ninguém entendia o que era. Então, foi um ataque covarde, feito através de uma montagem muito elaborada, muito ardilosa, através de grupos fechados. Em especial a comunidade evangélica, parte do setor evangélico foi atacado. E a gente está vendo aí os pastores. Está aí o pastor - eu não queria falar aqui, não, porque ele não está aqui, mas senão eu não vou falar, porque ele não vem nunca quase.
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP. Fora do microfone.) - Não; vem sempre e ataca a gente...
A SRA. LUIZIANNE LINS (PT - CE) - Vem, mas vai embora.
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP. Fora do microfone.) - ... e vira as costas.
A SRA. LUIZIANNE LINS (PT - CE) - É, Rui, vem, mas vai embora, não é? Que é o Pastor Marco Feliciano. É o exemplo de pastor, da comunidade evangélica - porque ele é eleito pelos evangélicos -, o exemplo é ele, que agora foi expulso do partido por questão de corrupção, por questão de assédio, por questão não sei de quê. Então, assim... Mas houve um grupo do setor evangélico que foi induzido ao erro, que foi enganado. Enganado! Eu não vou fazer juízo de valor porque respeito todas as religiões, mas eles foram enganados. E esse fundamentalismo... Quem é que imaginava que o povo brasileiro ia acreditar em mamadeira de piroca? Mas acreditou! Acreditou e foi brigar contra o Haddad na rua por causa disso. Então, gente, não é possível que a gente tenha que concordar com isso.
Então, Diogo Rais, eu gostaria, dentro também da sua especialidade, do Direito Constitucional, pudesse dar uma luz aqui no sentido de como é que essa questão da proteção dos dados... Essa questão mesmo de, durante a campanha eleitoral, como é que você vai aplicar essas regras de proteção de dados, para que a gente de novo não esteja, não venha correndo atrás do prejuízo: "Ah, ninguém sabe o que aconteceu".
E, por fim, eu acho que esse Carlos Bolsonaro... Ontem aqui o empresário Paulo Marinho disse que ele tinha que fazer um tratamento psiquiátrico, porque disse que ele era doido, mas na verdade ele ameaça agora um jornalista do UOL que também já fez uma carta para o Presidente. Aí daqui a pouco ele está ameaçando não sei de quê. Tem que dar um freio nisso! Tem que dar um freio nisso, porque é um absurdo que a gente esteja discutindo uma coisa aqui... Então, convoque-se logo esse rapaz! Se é para a gente saber o que está achando, convoque-se, porque está difícil. Ele está aqui... As mãos e os pés da CPMI, por fora, criando as milícias digitais, organizando as milícias digitais. Saiu das redes com medo, agora, da influência da CPMI, mas não para de criar problemas para nós aqui.
Então, eu gostaria de ouvir os três, nos pontos que dizem respeito à área de cada um, mas principalmente para a gente pensar no futuro, em como é que nós vamos fazer uma legislação que dê minimamente conta dessa situação que está acontecendo.
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Com a palavra o Deputado Rui Falcão, porque aí depois os três respondem as perguntas.
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP. Pela ordem.) - Estão chamando para votação nominal. Então, eu queria, se possível, interromper por dez minutos para que a Deputada Lídice e o senhor também - ah, não, é sessão da Câmara -, para que nós três pudéssemos votar rapidamente e retornar. Suspenderíamos por cinco, dez minutos; o tempo de votar.
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - V. Exa. vai querer fazer pergunta?
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP) - Sim, sim, mas não quero atropelar...
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Não, não. É a questão somente do tempo, porque os convidados... Eu fui informado de que eles têm voo também no final da tarde.
A SRA. LUIZIANNE LINS (PT - CE. Fora do microfone.) - A gente vai e volta.
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP. Fora do microfone.) - Vou só perguntar, não vou fazer consideração.
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O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Então, fica suspensa a nossa reunião por dez minutos, até os Parlamentares irem ao Plenário da Câmara Federal para exercer o seu direito de voto.
(Suspensa às 15 horas e 36 minutos, a reunião é reaberta às 15 horas e 59 minutos.)
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O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Ficam reabertos os trabalhos, para darmos sequência às perguntas e respostas dos nossos convidados nesta tarde de hoje.
Eu vou aproveitar...
Com isso, declaro reaberta a sessão.
E vou aproveitar.... A Deputada Luizianne já fez as perguntas? Fez, não foi?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Então, o Deputado Rui Falcão com a palavra, para fazer as perguntas, como último orador inscrito.
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP. Para interpelar.) - Vou procurar não tomar muito tempo, eu sei que o senhor está com viagem agendada e eu acho que os palestrantes também, mas é forçoso eu fazer uma primeira consideração: eu não acho, Dr. Diogo... O senhor não falou isso, que só o TSE, mas eu acho que o TSE...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP) - Não, entendi. O TSE, durante toda a campanha eleitoral, com dezenas de denúncias, a única atitude, digamos assim, "punitiva", entre aspas, que adotou foi com relação ao candidato Fernando Haddad, por fazer campanha - não fake news - negativa contra o Bolsonaro. Contra todo o resto, todas as calúnias, injúrias, nada, o TSE não fez nada. Agora mesmo, há um inquérito sobre a campanha eleitoral. A jornalista Patrícia Campos Mello, que fez várias denúncias comprovadas, inclusive, de disparo de mensagens a partir do exterior, sequer foi ouvida pelo TSE.
Então, eu acho que a gente tem que... Há esse portal do TSE, que não é nenhuma maravilha, mas é uma... Precisa-se de mais coisa. Eu acho sempre que há uma narrativa, para usar um termo moderno, de que tudo que se faz, com alguma regulamentação, nessa área, significa censura, atentado à liberdade de expressão, logo num Governo que ameaça cassar a concessão da Rede Globo, que proíbe a Folha de S.Paulo de entrar numa licitação. Então, é estranho isso. E, logo quanto àqueles que mais defenderam a liberdade de expressão no País, continuam a defender, parece que nós queremos aqui cercear alguém quando nós queremos acabar com a campanha de desinformação, de mentira, de destruição de reputações, de incitamento ao crime e de ameaças, e de atentados. Então, eu acho que, com todo o respeito... Sou contra o punitivismo que grassa na sociedade também, mas também não adianta só contemplar e... Então, queria fazer essa primeira observação, embora o senhor não tenha ido nessa direção, mas também não foi na direção oposta.
Então, eu queria, dito isso... Eu sou advogado também formado, além de jornalista, mas há um monte de advogado aí, não é o seu caso, e de juristas que estão indo numa direção terrível de convalidar o autoritarismo, o fascismo e principalmente o sistema de Justiça no País hoje, como ficou demonstrado no julgamento do Lula, de outros, na destruição de empresas nacionais, nas denúncias que o Intercept fez de procuradores venais, de um juiz venal que virou Ministro da Justiça.
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Aliás, tem um vocabulário tosco: porque foi chamado de ladrão outro dia aqui, criou uma celeuma danada. Eu disse que ele era venal e... Talvez ele ache que "venal" é uma coisa leve, que "ladrão" é muito ofensivo, "venal" ele assimilou. É um juiz venal e um ministro venal que se vendeu para um candidato esperando uma vaga no Judiciário, no Supremo, que não sei se terá. Então, esse sistema de Justiça, na sua grande maioria, está podre. Eu não tomo esses tribunais superiores como modelo de defesa da democracia - tomara que estejam gravando.
A nossa CPI está investigando... Por que eu estou insistindo nisso? Está investigando uma organização criminosa. Ela se instalou no Brasil, ela tem um comando operacional, tem um núcleo político que produz informação dirigida, tem um núcleo difusor, tem um núcleo de influentes e tem um núcleo financeiro, cujo dinheiro nós vamos rastrear, como sugeriu a Deputada Joice. Ninguém quer falar sobre isso, mas há rios de dinheiro financiando essa operação. E o seu QG está instalado ao lado do gabinete do Presidente da República. A gente está pedindo ajuda a todos os democratas aqui para desbaratar essa organização criminosa. Então, considerando a experiência internacional, o que os outros países têm feito para combater essas organizações criminosas? O que a gente poderia fazer aqui?
Outra pergunta que eu faria a todos é a seguinte. No documento "Internet e eleições no Brasil", a entidade InternetLab, centro de pesquisa em direito e tecnologia, defende a atualização de dispositivos sobre o uso de dados pessoais. O documento afirma que o art. 57-E da lei eleitoral, que trata do uso do cadastro, está em desarmonia com a lei geral de proteção de dados. O senhor concorda com essa recomendação do InternetLab? A mudança deveria ser em qual sentido?
Especialistas ouvidos por esta CPMI, entre os quais o advogado Francisco Cruz, afirmam que as novas ferramentas de marketing digital precisam ser regulamentadas, sob pena de produzirem desigualdade de competição, a exemplo do que aconteceu em 2018. Os senhores concordam com essa avaliação? Quem deveria fazer a regulamentação? O Congresso? O TSE? Em que sentido seria essa regulamentação para criar parâmetros de, pelo menos, redução das desigualdades, se não fossem parâmetros de igualdade?
Os senhores defendem e acham que é viável a criação de unidades especiais no Ministério Público Eleitoral dedicadas à investigação de fraudes e comportamentos abusivos no meio digital?
Eu tenho muita preocupação com as mensagens de ódio, com os conteúdos preconceituosos, sobretudo racistas, machistas e homofóbicos. Ontem, aqui, um depoente disse o seguinte: "Não, o Bolsonaro não é homofóbico. Ele faz piadas de conteúdo gay". "Bom, mas isso é homofobia...". "Não, é uma brincadeira." Então, essas brincadeiras, como essa brincadeira que o Deputado leu aqui, não são brincadeiras, elas vão se transformando em conceitos, em iniciativas.
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Então, para nossa surpresa, nós recebemos cópia de uma ação civil pública que à época foi movida pelo Procurador da República de Goiás Ailton Benedito de Souza contra o Facebook exatamente porque o Facebook retirou da rede perfis que propagavam mensagens de ódio e mensagens racistas. Esse senhor, vocês todos sabem, está na onda aí, foi nomeado pelo Procurador-Geral da República Secretário de Direitos Humanos e Defesa Coletiva da Procuradoria-Geral da República.
Pergunto: como avançar no combate desse tipo de mensagem para que não se diga que é cerceamento à liberdade de expressão? Isso poderia ser feito pelo Legislativo, pelo Poder Judiciário para coibir essas práticas tão comuns atualmente, especialmente em períodos eleitorais?
Claro que um dos objetivos desta CPMI é justamente produzir regulamentos, sugestões, projetos de lei nessa direção. Então, a gente busca sugestões dos senhores também.
Os senhores consideram que os chamados influenciadores digitais devem ser autorizados a atuar no processo eleitoral?
Como declarar esse apoio?
Isso porque artistas, por exemplo, têm sido hoje proibidos de fazer depoimentos na televisão, no rádio.
Como lidar com o fato de que os candidatos estão montando redes muito antes do período de campanha e aproveitando-as no curto período eleitoral? Atualmente a regulação de propaganda antecipada limita-se a proibir pedido explícito de voto. Há um vácuo de controle da Justiça Eleitoral no período anterior à campanha. Como lidar com essa situação?
Por fim, no futebol, como ocorreu no último final de semana, o Cruzeiro foi rebaixado ao perder para o Atlético, e aí os torcedores quebraram cadeiras. Houve polícia, bombas e tal. Quando isso ocorre, quando a torcida pratica esse ato, o clube é punido.
No caso das eleições, como limitar a ação das torcidas que muitas vezes, sob o argumento da liberdade de expressão, organizam pesadas estruturas econômicas para destruir candidatos adversários, como é o caso do famoso Luciano Hang, aquele que tem uma estátua fajuta da liberdade e para o qual os bolsomínions batem continência, conhecido como Véio da Havan, e que está convocado para depor na CPMI e que financia até as eleições do Uruguai. Apoiou o candidato vitorioso, mas apoiava mesmo o candidato da extrema-direita, candidato vitorioso e que por sinal repeliu o apoio do Bolsonaro achando que isso poderia prejudicá-lo nas eleições do Uruguai.
Então, como tratar essas torcidas organizadas, que não são de partidos, que não se assumem como candidatos, mas derramam dinheiro e subvertem os resultados eleitorais e, mais do que nas eleições, propagam essas campanhas pelo AI-5, contra a democracia, promovem a destruição de reputações, estímulo ao suicídio, e assim por diante?
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Eu passo a palavra, por ordem da esquerda para a direita, ao jornalista Leonel Aguiar, para responder às perguntas da Deputada Luizianne e do Deputado Rui Falcão.
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP) - O senhor começou da esquerda para a direita por nossa causa aqui?
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Evidentemente que foi para seguir o rito.
O SR. LEONEL AZEVEDO DE AGUIAR (Para expor.) - Bom, é muito estarrecedor, primeiro, essas questões que a gente tem levantado aqui. E a Deputada Luizianne também agora veio me alertar que houve vários ataques na página do YouTube da TV do Senado já estão acontecendo em relação aos membros desta Mesa.
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A SRA. LUIZIANNE LINS (PT - CE. Fora do microfone.) - Neste exato momento.
O SR. LEONEL AZEVEDO DE AGUIAR - Isso, Sr. Presidente, é inconcebível numa democracia, entendeu? É inconcebível. Isso é estarrecedor. Para que buraco este País está caminhando nesse sentido?
Então acho que de fato a Comissão tem que ficar atenta, tem que acionar a Polícia Federal. Isso não é possível, que você venha aqui para falar, discutir, somos três professores universitários, com carreiras reconhecidas, e aí você é desonrado por esses robôs, por essas milícias digitais, que nos atacam, não respeitam a democracia, não respeitam o Parlamento, não respeitam o Senado, não respeitam a Câmara Federal. Realmente fico muito preocupado no sentido de saber onde vamos parar.
Eu acho que está na hora de uma união entre os democratas deste País. É preciso dar um basta a essa desonra que se instalou neste País para todas as pessoas do bem. Isso é muito difícil, viu? É muito difícil, nós que somos três professores pesquisadores, neste momento nós estamos sendo atacados em massa por esses robôs.
A SRA. LUIZIANNE LINS (PT - CE. Fora do microfone.) - São mensagens de ódio, de ataque à pessoa.
O SR. LEONEL AZEVEDO DE AGUIAR - Isso.
A SRA. LUIZIANNE LINS (PT - CE) - São mensagens de ódio, são criminosas.
O SR. LEONEL AZEVEDO DE AGUIAR - São mensagens criminosas, não é? Eu acho que é isso. Acho que está na hora de a Polícia Federal, Senador Angelo Coronel, ser acionada e olhar, neste momento, os ataques que estão sendo feitos a nós três professores aqui, o que é algo grave para a democracia, é algo grave para este Parlamento. É realmente uma onda de mentira que toma conta deste País. Estou estarrecido.
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Dr. Leonel, é importante até que os senhores fiquem sabendo que nós contamos, em todas as reuniões da CPMI, com o Delegado Federal Dr. Sobral, que se encontra aqui no plenário, entendeu? Ele está observando também todos esses depoimentos, e evidentemente, quando há alguma denúncia como essa que o senhor falou agora, nós já vamos pedir à Secretaria que consiga algum post, alguma coisa, para que a gente encaminhe para a Superintendência da Polícia Federal, para fazer a devida investigação.
O SR. LEONEL AZEVEDO DE AGUIAR - Eu agradeço, porque acho que nenhum de nós três professores e pesquisadores que aqui nos encontramos, nenhum cidadão brasileiro merece, mas a gente vem aqui fazer um depoimento, com o nosso saber, com as nossas pesquisas, para ajudar o processo democrático. E aí, o que a gente encontra, na verdade, são essas mensagens de ódio, de que querem fazer isso, fazer aquilo com a gente, enfim, perseguições de todos os tipos, não é? Obrigado pelas providências que serão tomadas, Senador.
Tentando responder aqui a algumas perguntas que me foram feitas, uma das questões que eu coloquei, uma tentativa de definição de fake news, que é muito difícil, assim como a definição de notícia e também de reportagem. A gente sempre se debruça sobre isso. Mas o que eu apontei aqui foi que fake news são as produções textuais e as postagens, geralmente inverídicas, produzidas por grupos políticos e/ou por internautas, que são disseminadas nas redes sociais e que não têm nenhum relacionamento com o trabalho jornalístico, exatamente porque não aplicam os princípios éticos e profissionais do jornalismo, não aplicam as técnicas jornalísticas, entre as quais eu citei aqui os critérios de noticiabilidade, valor de notícia ou o próprio modo de construção da notícia e da reportagem.
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A questão central é que eu vejo que esses ataques que são feitos ao jornalismo profissional e aos jornalistas são uma tentativa de desqualificação da credibilidade jornalística, desse jornalismo profissional. E aí, a gente tem, como consequência dessa desqualificação da credibilidade jornalística, um questionamento da própria liberdade de expressão, já que são assim as figuras centrais que estão, o tempo todo, apontando o dedo para os jornalistas profissionais e para as empresas, essas várias que eu citei aqui, dizendo que elas são produtoras de fake news, o que não é verdade, e a consequência dessa desqualificação da credibilidade jornalística é colocar sob questionamento a liberdade de imprensa e a atuação profissional do jornalista. Em última instância, o que corre risco é sempre a democracia e a liberdade de opinião, a liberdade de expressão da sociedade.
Eu já participei de outros debates aqui no Senado e na Câmara Federal também em relação à profissão e eu me lembro de que uma das questões que se colocava era a obrigatoriedade, a exigência do diploma para o exercício da profissão de jornalista e, muitas vezes, dizia-se algo que não corresponde à realidade, ou seja, que a exigência do diploma - e isso tem muito a ver agora com fake news - para o jornalista atuar profissionalmente era um atentado à liberdade de expressão da sociedade.
Faz mais de dez anos, talvez nove, que eu vim aqui convocado para uma dessas Comissões Parlamentares de Inquérito, e a questão central era de que a atuação profissional do jornalista, em momento algum, é um cerceamento à liberdade de expressão da sociedade, menos agora quando a gente tem todo esse aparato da internet e das redes sociais disponível. Na verdade, é uma regulação profissional que protege a sociedade no sentido de que os jornalistas profissionais são aqueles que têm a capacidade cognitiva, a capacidade profissional, têm o treinamento devido para isso, o treinamento prático, o treinamento teórico, a perspectiva teórica para produzir um material jornalístico de qualidade que, antes de tudo, forneça à sociedade informações de qualidade, informações jornalísticas de qualidade.
Para que fornecer informações jornalísticas de qualidade? No fundo, no fundo, é para que qualquer cidadão, de posse dessas informações de qualidade, consiga orientar a sua vida em relação às escolhas democráticas que ele tem de fazer nessa sociedade.
Nós, professores de jornalismo, jornalistas profissionais, lutamos e batalhamos por informação jornalística de qualidade, por um jornalismo de qualidade, por um jornalismo voltado para o interesse público de modo que a gente consiga fornecer para a sociedade informações jornalísticas de qualidade, informações jornalísticas equilibradas para que essa sociedade consiga, de posse dessas informações, decidir que rumos ela quer tomar. É por isso que a gente, o tempo todo, fica falando da importância do jornalismo de interesse público, da importância da qualidade da informação jornalística, da informação jornalística com parâmetros éticos e com responsabilidade social, exatamente para que o cidadão possa, com essas informações, decidir que rumo ele quer dar à sua vida e à vida social como um todo.
É isso. Eu encerro aqui a minha fala nesse sentido.
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Passo a palavra ao jornalista Rafael de Almeida.
O SR. RAFAEL DE ALMEIDA EVANGELISTA (Para expor.) - Muito obrigado.
Queria agradecer aos Deputados pelas perguntas, Deputado Rui Falcão, Deputada Luizianne Lins.
Eu gostei muito do resumo que a Deputada Luizianne fez, ou seja, a fala que ela fez e a forma como ela condensou o panorama geral. Ela foi muito competente e muito forte. E, aí, eu só queria reforçar algumas coisas para passar o que eu tenho de experiência de pesquisa e da literatura e pensar como isso pode contribuir para as medidas que essa CPMI vai estabelecer, sugerir ou projetos de lei, etc.
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Eu acho que existe uma questão importante com que a gente precisa tomar muito cuidado que é com relação à criptografia. Acho importante que a gente não criminalize a criptografia, quer dizer, o direito do cidadão de se comunicar com segurança e com inviolabilidade dessa mensagem que ele está mandando para outra pessoa. Isso é essencial para que essa liberdade possa ser exercida.
Vamos lembrar que diversas revelações, por exemplo, que o Snowden fez foram feitas usando criptografia. Se você não tem essa possibilidade de fechar esse canal de comunicação para fazer essa comunicação, você acaba desestimulando diversas denúncias, algo que vai, na verdade, contribuir para a democracia. Agora, a gente tem um problema muito claro, e por isso que eu tentei falar bastante nessa expressão do zero rating, que é um problema, inclusive, que coloca uma desigualdade de competição entre os próprios serviços de mensagem. Quando você tem o fato de que certas plataformas conseguem gozar desse privilégio nesses acordos de zero rating, isso significa que você, inclusive, inviabiliza a competição entre elas.
Então, por exemplo, por que os grupos de WhatsApp são o lugar em que mais tem acontecido essa disseminação de notícias falsas? Porque, nesses grupos, o sujeito que assina um serviço de telefonia, quando acaba o plano de dados dele, continua acessando o WhatsApp de graça.
Então, isso coloca, inclusive, uma questão de competição com outros serviços, outras empresas que poderiam fornecer o mesmo tipo de serviço. Isso cria, inclusive, essa situação de confinamento informacional dos sujeitos, em que eles estão podendo acessar um único serviço. E aí eu acho que, pensando sobre os todos os atores nesse gigantesco problema que a gente tem, acho que é importante a gente marcar o quanto... Há evidências de uma ação concertada, em cima dos grupos de WhatsApp, de sujeitos maliciosos, procurando afetar as discussões nesses grupos.
Então, você tem um conjunto de evidências sobre isso. Acho que as revelações da Patrícia Campos Mello na Folha de S.Paulo são, inclusive, muito importantes com relação a isso. Ela denuncia ali também as tentativas de fazer microssegmentação nos grupos, ou seja, você classificar os usuários justamente para fazer isso que a Deputada Luizianne estava comentando, você entregar mensagens falsas específicas para determinados grupos.
Nesse sentido, acho que há muita pressão que se pode fazer sobre as plataformas, buscando maior colaboração delas na investigação dessas organizações. Elas têm muito mais a contribuir do que elas têm contribuído até agora. Elas precisam ser pressionadas. O Deputado Rui Falcão perguntou sobre experiências internacionais: essa é uma coisa que o Governo dos Estados Unidos tem feito; o Governo da do Reino Unido também tem feito. A gente viu o Zuckerberg ser convocado para dar depoimentos. É preciso que... Não cabe dúvida de que, para essas empresas, o mercado americano é muito mais importante, e eles procuram preservar a sua imagem lá, e aqui no sul global, eles meio que estão dando de ombros. Então, você tem o próprio WhatsApp agindo de uma maneira... não colaborando o tanto quanto poderia colaborar, justamente, porque são lugares - vamos dizer - com menos prestígio no mundo.
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(Intervenção fora do microfone.)
O SR. RAFAEL DE ALMEIDA EVANGELISTA - Exato.
Inclusive, há problemas que a gente está enfrentando agora que são específicos desses lugares periféricos, dos países periféricos. O WhatsApp é um fenômeno no sul global porque o zero rating é - entre outros motivos - uma política feita para países pobres, por países pobres. Nos países ricos, os sujeitos mandam SMS, há grupos de SMS; não há grupos no WhatsApp, isso não é tão disseminado quanto é disseminado no sul. Então, isso exige de nós pesquisadores, e eu acho que exige do Legislativo também, uma capacidade de olhar para esse problema que é única no mundo, porque são problemas únicos no mundo. Os sujeitos que usaram o WhatsApp como arma nas eleições no Brasil e que devem continuar usando nas próximas eleições inventaram coisas, eles elaboraram uma estratégia específica para essas condições que estavam dadas.
Queria só fechar falando sobre o YouTube, que foi muito bem lembrado pela Deputada Luizianne: o YouTube se tornou o lugar de expansão dos grupos de ódio globalmente. Também no Brasil há pesquisas ótimas sobre como essa aliança de grupos extremos aconteceu. Nos Estados Unidos, há o instituto Data & Society que tem um paper ótimo justamente investigando esses canais, como eles vão se retroalimentando, essa cultura de celebridades nos canais vai se retroalimentando até os pontos extremos. Há pesquisas ótimas feitas no Brasil também com relação a isso. Agora, essa mídia em especial, essa plataforma em especial colocou diversos estímulos, e os sujeitos estão respondendo a esses estímulos econômicos. Foi isso também que eu tentei trazer na minha fala. Você teve o estímulo para canais de desinformação produzirem conteúdo, porque eles ganham em cima de visualizações, cliques e etc.; isso interessa às plataformas e interessa aos grupos políticos que eventualmente os potencializam.
Então, há muito - acredito - a se entender sobre essa dinâmica de lucro que favorece as plataformas. Há muito a se pressionar com relação a isso. E isso ataca uma questão central, que é o fato de que elas se tornaram... Quando elas começam a utilizar algoritmos de recomendação, elas deixam de se tornar lugares neutros, plataformas neutras e passam a se tornar recomendadores de conteúdo proativos.
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Então, há uma estatística, que acho que é do grupo do Virgilio Almeida, daqui, do Brasil, que levantou esse número - não tenho certeza -, mostrando que 70% das visualizações dos vídeos no YouTube acontecem motivadas por recomendações da própria plataforma. E as recomendações da própria plataforma vão nessa espiral de radicalização porque isso gera mais engajamento. Então, acho que é preciso, primeiro, entender essa economia que se formou e aí atuar sobre ela e sobre quem se beneficia dessa economia de forma a evitar esses efeitos negativos, não só para a política, de deslegitimação da política ou de radicalismos políticos, mas também contra outras instituições. E aí, como foi muito bem lembrado, acho que pelo Prof. Leonel, sobre outras instituições como a ciência mesmo, e a gente está vendo aí o exemplo do terraplanismo, que é ótimo, a negação do aquecimento global e todas essas negações da ciência, do pensamento científico.
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Passo a palavra para o Dr. Diogo Rais, para elaborar suas respostas e, ao mesmo tempo, suas considerações finais.
O SR. DIOGO RAIS RODRIGUES MOREIRA (Para expor.) - Muito obrigado, Senador. Agradeço pelas perguntas. Eu tentei organizá-las, para aproveitar esse tempo, em alguns eixos aqui, como a questão da privacidade de dados, a questão da responsabilidade das plataformas pelo conteúdo de terceiros, essa questão global e local e, por último, também a respeito do Tribunal Superior Eleitoral e o que, pelo menos nas pesquisas que eu tenho desenvolvido, a gente tem encontrado.
Acho que vou começar com a ideia da privacidade. A gente realmente tem pouco apreço pela privacidade dos dados, e isto é uma pena, porque, frequentemente, a gente acaba se preocupando menos em como atuar nesse espaço.
A gente tem uma lei aprovada, a Lei Geral de Proteção de Dados, e agora a gente começa...
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP. Fora do microfone.) - Não tem autoridade ainda.
O SR. DIOGO RAIS RODRIGUES MOREIRA - Pois é. Não tem autoridade, o que é uma das grandes dificuldades ali, mas a gente começa a desenhar um sistema de alguma proteção.
Eu acho que é fundamental a privacidade de dados, considerando o fenômeno da desinformação. Pelo que eu tenho pesquisado a esse respeito, a desinformação customizada tem maior chance de impacto, aquela que é produzida para determinado grupo. Aquele grupo acredita em tal coisa, então, de repente, aquela desinformação desacredita ou enfrenta aquela convicção daquele grupo. Então, ela acaba podendo ter um comportamento ou um impacto maior.
Eu realmente acho que a privacidade de dados deve ser amadurecida, e a gente está construindo um sistema, e eu acho que isso, de alguma maneira, vai irradiar também para o campo eleitoral, e a gente vai ter, talvez, algumas regras a respeito disso. Eu tenho acompanhado bastante essas discussões, embora não seja minha atuação específica a privacidade de dados, mas, como se lembrou do Francisco, do InternetLab, a respeito de como cuidar ou, talvez, prestar contas desses bancos de dados... Então, de certa maneira, eu tenho muito mais ouvido as pessoas que estão trabalhando em privacidade de dados dizerem o quanto isso pode irradiar para o eleitoral, e eu acho que isso é muito importante, é uma das formas para ajudar a combater senão a quantidade de desinformação, talvez seu potencial de impacto, já que a desinformação seria menos confeccionada sob medida, já que eu não sei exatamente o que é que você pensa, e o que é que cada pessoa pensa. Então, aqueles que geram a desinformação fariam mais genericamente, então, com menos chance de acerto.
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Vou falar um pouquinho da responsabilidade. Eu acho que isso tem bastante a ver com as coisas que eu tenho pesquisado. O meu universo de pesquisa é a Justiça Eleitoral, eu tenho feito isso há 13 anos e, na Justiça Eleitoral, eu tenho acompanhado o índice de atuação. Quando a gente fala na Justiça Eleitoral é sempre sensível, porque... Eu já tive que responder várias vezes algumas perguntas do tipo: "A Justiça Eleitoral foi bem na eleição de 2018?". E eu pergunto: "Qual Justiça Eleitoral?", porque a Justiça Eleitoral no Brasil tanto administra as eleições, ela cuida do processo eleitoral, como ela julga os conflitos eleitorais e normatiza também as eleições por meio das resoluções. Então, quando a gente vai tentar...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. DIOGO RAIS RODRIGUES MOREIRA - Pois é, ela tem esse poder de resolução que deve ficar dentro da legislação. Algumas, inclusive, foram revistas. Isso cabe ao Supremo como um sistema de controle, de pesos e contrapesos.
Na pesquisa que eu fiz, eu levantei todos os processos digitais. Primeiro, em 2014, eu fiz em companhia de vários outros pesquisadores da Fundação Getúlio Vargas, esta pesquisa está publicada, em que a gente mapeou o quanto se remove conteúdo na internet e por que se remove. O debate sobre a desinformação ainda não estava aquecido, mas a própria Fundação Getúlio Vargas replicou essa pesquisa para este momento, e hoje, eu e um grupo de pesquisa no Mackenzie fizemos uma pesquisa de todas as ações que chegaram ao Tribunal Superior Eleitoral a respeito desse tema. O que a gente constatou é que houve muito julgamento a respeito desses conflitos eleitorais. Então, a Justiça Eleitoral, como julgadora, atendeu isso e julgou em tempo - parece-me - muito rápido, inclusive comparado com o tempo que a Justiça comum costuma levar para julgar as coisas. A gente mediu, por exemplo, que as liminares foram concedidas ou negadas em 24 horas, então, acho que mostra esse comprometimento.
A Justiça Eleitoral como administradora do processo. Eu acho que é esse o ponto para que eu queria chamar a atenção: do portal de combate à desinformação, parece-me que ela faz isso institucionalmente. É esse o ponto que eu gostaria de ressaltar, porque eu acho que é importante trazer a verdade sobre as instituições para que a população consiga se instruir a respeito disso. Eu acho que a Justiça Eleitoral tem feito muito bem, sim. E, sobretudo, eu tenho indicado como exemplo mais claro. É minha opinião.
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP. Fora do microfone.) - Posso?
O SR. DIOGO RAIS RODRIGUES MOREIRA - Claro, Deputado, por favor.
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP) - Durante as eleições, o candidato Bolsonaro disse que se ele não fosse vitorioso é porque a eleição seria fraudada. Não houve nenhuma manifestação da Justiça Eleitoral para dizer: olha, nosso sistema é seguro e tal...
O SR. DIOGO RAIS RODRIGUES MOREIRA - Pois é. Por isso, eu estava falando da função de administradora, olhando para as eleições 2020, como julgadora nas eleições 2018 ela fez rápido.
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP) - Defesa da instituição.
O SR. DIOGO RAIS RODRIGUES MOREIRA - Inclusive, Deputado, é muito interessante o senhor falar isso, porque eu realmente escrevi também sobre isso, na época, dizendo que a Justiça Eleitoral deveria ter agido já antes das eleições - como ela tem feito agora. Por isso, eu sou tão fã desse projeto da desinformação e, por isso, eu o defendi aqui - pelo menos, como minha opinião.
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A questão da responsabilidade das plataformas. Nós já temos sistema de responsabilidade, esse sistema é o marco civil. Nós temos o art. 19 do marco civil que atribui a responsabilidade das plataformas para remover conteúdo de terceiros após decisão judicial. A ideia é que as plataformas não sejam os árbitros da verdade e não removam um por si só o conteúdo. Eu acho muito mais perigoso o conteúdo removido por si só na plataforma do que o conteúdo que eventualmente não é removido. Por que isso? Porque eu acredito que as plataformas, muito diferente da mídia profissional, como o caso que os colegas já colocaram, não contratam seus usuários. Então, elas não deveriam ser responsáveis pelos seus usuários - não são seus funcionários, o que é diferente do jornalismo, da imprensa, do rádio e da televisão. Então, esse é o sistema.
Esse sistema de responsabilidade deixa um espaço no qual a gente sofre efeitos colaterais de todos os processos. Esses efeitos colaterais me parecem que são, talvez, o alvo para que a gente possa pensar em como minimizar isso. Eu não acredito que a gente consiga erradicar isso.
Falando um pouco desse aspecto internacional, eu não acho que a gente tenha nenhum exemplo no mundo que tenha resolvido isso, e eu acho que a tendência é ainda piorar com a transformação de fake news em deep fakes, que são aqueles vídeos nos quais você aparece fazendo uma coisa que nunca fez, ou aparece num lugar onde nunca esteve, ou falando uma coisa que nunca falou. E você tem que convencer a pessoa dizendo assim: "Olha, você acredita em mim ou no que os seus olhos veem?". Isso é muito difícil. Então, a gente está falando de uma evolução em tecnologia. E eu penso que, talvez, a tecnologia pode ser uma grande aliada para isso. Uma das coisas que eu vi recentemente foi um concurso, acho que feito pela Microsoft ou Facebook ou por outras empresas, com US$10 milhões oferecidos para as pessoas mandarem projetos de tecnologia que ajudem a combater deep fakes. Eu realmente acho que a solução é multilateral: a gente não vai conseguir resolver isso vindo de um lado só.
E, talvez, só para fechar e falar um pouquinho da lógica de dados das plataformas, eu sempre comparo muito com o que sempre aconteceu talvez no âmbito do comércio. Os meus avós, tanto paternos, quanto maternos, foram comerciantes, e desde pequeno eu ficava no comércio, e eu lembro que, toda vez que chegava um cliente, a grande estratégia era agradá-lo, mostrar para ele coisas de que ele gostava, falar coisas de que ele gostava e trazer para ele coisas por que ele pudesse se interessar. Quanto mais ele ficasse lá, mais chance ele teria de comprar. Eu acho que as plataformas desenvolvem esse negócio, e é o modelo de negócio delas. Mas é importante mais transparência, como por exemplo: como se remove ou a questão das políticas. Eu acho que a transparência sempre é bem-vinda num cenário de democracia, mas eu me preocupo muito com a ideia da criminalização das ferramentas, como o Prof. Rafael, que também trouxe, por exemplo, a questão da criptografia em si. Eu me preocupo muito porque dá uma impressão de que a gente criminaliza as ferramentas ou a gente acha que, de uma certa maneira, tudo que aconteceu foi por responsabilidade dessas plataformas.
Um dos criadores da internet, o Vint Cerf, tem uma frase bem antiga que eu sempre gosto de comentar que é a ideia de que a internet é um espelho da sociedade. E isso quer dizer que, quando você olha para o espelho e não gosta da imagem que você vê, não é quebrando espelho que você vai resolver. Eu acho que realmente precisa mudar essa imagem refletida.
Hoje, talvez, a gente tenha outras questões, como por exemplo o próprio sensacionalismo e o ódio impregnado. É aí que eu acho que a gente tem que trabalhar tanto com a ideia da repressão no sentido massivo, quanto com a ideia da educação.
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E eu acho que são esses os itens que eu tentei abordar no tempo que podia.
Queria, como consideração final também, se for o caso, agradecer mais uma vez o convite e elogiar: eu sempre acreditei na conexão e sinergia da universidade com o Estado, então a possibilidade de estar aqui dividindo a Mesa com todos vocês e os professores reforça a minha crença de que a gente tem uma energia estudantil, que pode fazer e colaborar para a solução do País e para um Estado cada vez mais democrático, pelo menos, sobretudo, diante da energia dos nossos estudantes.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Com a palavra a nossa Relatora, Deputada Lídice da Mata.
A SRA. LUIZIANNE LINS (PT - CE) - Deputada Lídice, me permita só fazer uma observação rapidamente, só para dizer que, embora a gente veja aqui que muitos não compareceram ou não ficaram na reunião, porque, como eu digo, não querem saber do conteúdo, nós temos agora, neste momento, Presidente, uma audiência de 1.210 brasileiros, que estão vendo, neste momento, o vídeo. E há dez que estão propagando as mensagens de ódio contra a Mesa. Você vê que é, de fato, sistemático: retuitar, no caso, se for o Twitter; mas no caso, assim, sistematicamente os robôs disparam dez. Isso entre 1.210 que estão querendo ouvir o que se está dizendo neste momento. Para você ver como as pessoas estão interessadas neste tema.
Era só para fazer essa observação.
A SRA. LÍDICE DA MATA (PSB - BA. Como Relatora.) - Bom, Presidente, eu quero também dizer que uma parte dos companheiros e dos membros desta Comissão não estarem aqui presentes se dá pelo fato de nós estarmos, na Câmara, numa votação muito importante, para a qual devemos nos dirigir neste momento também, que é a votação do novo marco legal do saneamento no Brasil.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. LÍDICE DA MATA (PSB - BA) - Com a privatização da água, trazendo um grande debate político para a Casa.
Eu quero, novamente, agradecer a todos que estão nos assistindo, agradecer a todos que estão participando; dizer que esta é a última reunião que nós estamos realizando neste ano. Nós vamos voltar para mais oito semanas de intenso trabalho, para apresentar um relatório, para o qual eu quero a contribuição de todos vocês.
Não é um relatório fácil, volto a pontuar. Nós estamos diante de desafios complexos, que foram aqui colocados, inclusive, pelo Dr. Diogo aqui, de forma mais enfática ainda. E eu me pergunto... Fico muito a me perguntar isto, Dr. Diogo: como tornar a democracia mais efetiva numa realidade em que o instrumento da falsificação de notícias vira um instrumento de opressão contra o conjunto da sociedade. Ao mesmo tempo, nós vamos simplesmente concluir que não há nada a fazer? Só temos que educar? Mas como temos só que educar se novas tecnologias e ferramentas são colocadas à disposição a todo momento? Então, é como se nós ficássemos paralisados.
Eu acho que não é possível para a sociedade se colocar dessa maneira. Se nós formos concluir que devemos apenas fazer processos... Vejam bem: quanto tempo leva uma ação, um direito de resposta? São dadas 24 horas. Ora, 24 horas diante de uma notícia falsa divulgada nos meios de ferramenta hoje... Eles arrebentam uma candidatura, por exemplo, a um cargo majoritário ou a um de vereador.
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Então, não é possível que nós possamos continuar nos colocando absolutamente como se a única coisa que nos restasse fosse baixar para o desconhecido. Eu acho que nós estamos diante de uma situação de desconhecido, mas temos que aprimorar nossa posição democrática sobre isso.
Toda liberdade de expressão tem um limite legal. Então, nós temos que buscar como conceituar esse limite legal, o que é crime na internet. Será que não há nenhuma evolução do marco legal para cá, com essa nova realidade, com a intensidade com que essas novas ferramentas estão ocorrendo em todo o mundo? Se o desafio é global, vamos nos debruçar para a articulação dessa troca de ideias globalmente. Mas eu acho muito difícil que nós possamos concluir apenas em deixar correr, em ter a medida da educação. Eu acho que tudo o que nós estamos fazendo aqui, neste momento, é educação para as redes na sociedade, educação com jovens, com crianças. Haveremos também de ter como interferir.
Agora, sinceramente, digamos assim - não é nem ambição -, na minha inquietação democrática, eu não consigo me conformar que nós possamos viver nesse universo de prática de crime, na forma que está na internet, sem ter uma possibilidade de fazer alguma regulação que seja ou que nós possamos discutir objetivamente com as plataformas que novo tipo de medida tomar, porque, se há claramente um conteúdo de interesse econômico nas plataformas, isso precisa ser regulado. Senão, nós vamos estar entregues ao deus-dará e, como eu sempre costumo dizer, à barbárie. Se o conteúdo econômico determina um comportamento e se nós não tivermos como regular até do ponto de vista econômico esse comportamento, vamos, então, oferecer à sociedade exatamente a ideia...
Enquanto nós estávamos aqui, eu recebi a comunicação de uma notícia que tem corrido lá pela Bahia, que é claramente fake news. As pessoas estão desesperadas me mandando dizer: "Mas, num supermercado, alguém estava comentando isso". Isso é uma velha prática. Quando fui Prefeita, os adversários botavam duas, três, quatro pessoas em cada linha de ônibus para divulgar uma mentira. Havia um momento em que isso era descoberto e que você podia responder a isso. Hoje não há resposta possível.
Então, o que nós vamos concluir? Que vamos esperar, como é previsto por alguns cientistas, que as máquinas substituam o humano e concluir que é um desenvolvimento natural da humanidade? Eu creio que, neste momento, enquanto estamos nos deparando com esse tipo de desafio, que é o desafio da existência dos regimes democráticos ocidentais, de as democracias ocidentais sobreviverem, nós precisamos, como diria um amigo, suar o cérebro para encontrar um caminho para que nós possamos impedir a prática desse crime. Isso é um crime! Todos concluíram aqui que é um crime, e assim se trata aqui e em outras Mesas que fizemos.
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E é claro que a lei que nós temos hoje não está dando conta de resolver esse crime, porque, se estivesse dando conta de resolver esse crime, objetivamente, nós estaríamos conseguindo impedi-lo, mas nós não estamos conseguindo impedir a sua prática. Então, como é que a lei está dando conta de tudo, se nós não estamos conseguindo que a aplicação dessa lei resolva?
Então, eu acho que é um desafio para esta Casa, que é a responsável pela organização das leis, pela criação das leis, e é um desafio que nós temos que realizar convocando a sociedade para nos ajudar, para nos ajudar no combate, no esclarecimento. Existem as normas, as formas de checagem das empresas. Vamos buscar ver de que maneira chegar a isso.
Agora, eu sinceramente acho que a esse desafio nós precisamos responder, de fato. Eu tenho um profundo compromisso democrático, mas o que é a democracia no tempo atual? De que maneira nós podemos caracterizar o que é a democracia com um procedimento que é profundamente antidemocrático?
Eu não consigo achar a resposta apenas... Perdoe-me, porque não foi o senhor quem disse isto: "A internet reflete a sociedade." Tudo reflete a sociedade, mas como é que nós chegamos a isso? Na internet, minorias podem se tornar maiorias, em função do uso de ferramentas que transformam notícias fraudulentas, que fazem com que as pessoas acreditem, e do uso de robôs.
Então, o que nós estamos discutindo é justamente isto: como é que as minorias se tornam maioria, num movimento claramente fraudulento? Esse é o desafio que eu acho que está se colocando.
Então, nesse sentido, eu acho que o espelho pode refletir a nossa dificuldade em abordar esse tema. Isso não quer dizer que eu acho que as maiorias são sempre maiorias. Elas se modificam socialmente, em determinado momento. Por isso que a democracia existe. Elege-se um Presidente que tem uma tendência mais à esquerda; depois é a direita. Isso acontece no mundo inteiro. Em todas as democracias, acontece dessa forma.
Agora há um procedimento em que esse sentimento é capitalizado. E esse que nós estamos vendo acontecer é uma movimentação mundial, invertendo principalmente valores construídos ao longo da construção de valores democráticos e que estão sendo desconstruídos. Pode ser que o futuro seja isto: a desconstrução total e a ida para um regime que não é democrático, que é essencialmente autoritário, porque se dá com a utilização de instrumentos que redefinem o desejo das pessoas, impedem o pensamento das pessoas e que agem diretamente para impedir a razão e o raciocínio, para levá-los a um nível de exclusão da razão.
Mas vamos adiante. E que Deus nos proteja e nos dê capacidade para enfrentar o desafio!
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Encerramos aí esse bloco final de perguntas e respostas.
Eu queria agradecer a presença do jornalista Leonel Aguiar, do Prof. Rafael Almeida, do Prof. Diogo Rais, e a presença de todos os senhores e senhoras que estão hoje nos prestigiando neste momento com suas presenças nesta CPMI.
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Eu queria aproveitar e colocar em votação as Atas da 15ª e 16ª reuniões, solicitando a dispensa de suas leituras.
Os Srs. Parlamentares que as aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
As atas estão aprovadas.
Queria também informar que, no dia 4 de fevereiro, estamos retomando os nossos trabalhos. Vamos ter essa pausa agora pelo recesso. Na semana que vem não teremos sessão porque teremos votação no Congresso Nacional do Orçamento e, quando temos sessão deliberativa no Congresso, não podemos fazer sessão deliberativa nas comissões.
Então, no dia 4 de fevereiro acontecerá a nossa primeira sessão, no retorno do nosso recesso, quando iremos fazer uma sessão deliberativa, já que estamos na Casa com aproximadamente 80 requerimentos precisando ser deliberados pelo Plenário da CPMI. A partir daí, vamos dar sequência às nossas oitivas, convidando novas pessoas, porque nós vamos ter aí, aproximadamente, oito semanas, após o recesso, para que a gente possa ouvir o máximo e, a partir daí, a nossa Relatora lavrar o seu relatório, a ser apreciado aqui pelo Plenário.
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP) - Pela ordem, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Pela ordem, Deputado Rui Falcão.
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP. Pela ordem.) - Antes de o senhor encerrar a sessão, era justamente sobre isso que eu queria me manifestar.
Em tese, a CPI...
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Está na metade.
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP) - São 180 dias, só que ela pode ser prorrogada. Então, não necessariamente nós vamos encerrar a CPMI em abril. É possível que sim, mas é possível que não.
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - Depende do Plenário da Câmara.
O SR. RUI FALCÃO (PT - SP) - Então, mas a gente deve ter o direito de propor o adiamento se for necessário.
Quero me reservar esse direito, porque, pelo volume de requerimentos e pelo andar da carruagem, inclusive com a ênfase que a Relatora dá às suas convicções, talvez não haja elementos suficientes nesse prazo para que a gente tenha um relatório mais efetivo.
Então, em princípio sim, mas que a gente deixe no ar essa possibilidade.
O SR. PRESIDENTE (Angelo Coronel. PSD - BA) - O.k., Deputado. Obrigado.
Então, retomando: no dia 4, primeira sessão deliberativa do chamado segundo turno da CPMI - estamos encerrando hoje o primeiro turno.
Repetindo: na próxima semana não teremos sessão em virtude da votação do Orçamento no Congresso Nacional; dia 4 é votação deliberativa, sessão deliberativa; dia 5, oitiva, provavelmente de alguma plataforma - vamos solicitar a disponibilidade delas, ou Google, ou Face, ou o Insta, para vir aqui já a primeira plataforma -, para que a gente a partir daí comece a fazer o fechamento da nossa CPMI.
Eu queria agradecer a presença de todos mais uma vez.
Desejo a todos um bom final de semana.
Nada mais havendo a tratar, agradeço a presença dos Parlamentares que vieram aqui dar quórum a esta CPMI.
Declaro encerrada a sessão.
Que todos vão para casa para casa com Deus, que é quem nos guia.
(Iniciada às 13 horas e 20 minutos, a reunião é encerrada às 16 horas e 53 minutos.)