09/03/2020 - 12ª - Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Bom dia a todos e a todas.
Declaro aberta a 12ª Reunião, Extraordinária, da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 56ª Legislatura.
A audiência de hoje será realizada nos termos do Requerimento nº 4, de 2020, de minha autoria e de outros, para debater o tema: "Defesa dos Segmentos mais Vulneráveis". Hoje, com foco no combate à violência contra as mulheres.
Lembrando a todos que ontem foi 8 de março e hoje mesmo, no Brasil todo, teremos grandes eventos liderados pelas mulheres.
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Esta audiência pública será realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. As pessoas que tenham interesse em participar, com comentários ou perguntas, podem fazê-lo por meio do portal e-Cidadania, link www.senado.leg.br/ecidadania, e do Alô Senado, através do número 0800-612211.
Nós faremos duas Mesas.
Antes de chamar os convidados para a primeira Mesa, eu queria destacar o que está nas manchetes, em todos os jornais de hoje, porque isso preocupa todos, mulheres, homens, enfim, toda a humanidade. Eu só vou destacar aqui: "Preço do petróleo tem maior queda desde a Guerra do Golfo", isso no IG; Valor Econômico, "Crise do petróleo faz disparar pânico entre investidores globais" - a situação já está difícil e o quadro que se apresenta é esse agora -; "Preços da commodity caem mais de 20% nesta manhã, depois de terem despencado 30% na sessão asiática"; "Sauditas abrem guerra de preço, que deve derrubar o petróleo; "Bolsas da Ásia despencam com coronavírus e guerra do petróleo"; R7, "Coronavírus e preço do petróleo provocam queda em bolsa chinesa"; "CSI300, que reúne as maiores companhias listadas em Xangai [...], caiu 3,42%, enquanto o índice de Xangai teve queda de 3,01%" - refere-se a uma outra cidade, aquela pequena diferença de quatro décimos; Folha de S.Paulo, "Bolsas europeias desabam com queda do petróleo e avanço do coronavírus"; Estadão, "Crise do petróleo e novo coronavírus derrubam bolsas da Europa e da Ásia"; "Bolsas da Ásia recuam e petróleo tem forte queda"; "O mercado europeu opera em baixa"; "O cenário está caótico neste começo de semana por dois motivos principais: preocupações com o novo coronavírus e disputa entre Arábia Saudita e Rússia em relação ao petróleo"; Terra, "Tombo do petróleo e coronavírus afetam bolsas asiáticas"; "Arábia Saudita inicia guerra de preço e petróleo cai 20%"; "Decisão de cortar o preço, aumentar a produção e a retaliação entre eles repercute em todo o mundo"; Globo.com, "Coronavírus e preço do petróleo derrubam bolsa"; G1, "Bolsas europeias operam em forte queda após tombo do preço do petróleo".
Eu fiz esse destaque, o que não é comum, porque, de fato, é preocupante. Estou fazendo agora, inclusive, um tuíte sobre a situação. Se essa crise, como sinaliza aqui, continuar, pode saber que vai aumentar o desemprego global e, principalmente, no Brasil. Já falei, na semana passada, no Plenário, que inúmeros investidores estão retirando o que estavam colocando aqui no Brasil e indo embora. E com essa crise aqui, é uma situação preocupante.
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Eu vou pedir que desça o que eu coloquei no Twitter agora de manhã, demostrando a nossa preocupação. São informações que eu recebi agora de manhã de que até as mobilizações - em cujo mérito eu não vou entrar aqui, agora, porque não é local - do dia 15 poderão ser suspensas mediante a crise que está se avizinhando aí. Já está chegando, não é... Nós já estamos num estado de recessão e pode-se aprofundar, e, se se aprofundar, calculem uma situação como esta, de desemprego em massa! Já temos no Brasil cerca de 12 milhões de desempregados. Entre desempregados, aqueles que estão no trabalho informal, aqueles que são chamados desalentados, nós chegamos a 50 milhões de pessoas que estão já numa situação de desespero.
O debate hoje é outro. Eu só faço essa introdução para situar o que está acontecendo no Brasil e que vai ser palco de debate no Plenário também hoje à tarde: desemprego, aprofundamento da recessão - já estamos em recessão - e a questão do vírus.
Mas vamos à nossa reunião de hoje. O debate é sobre a violência contra a mulher.
Nós vamos fazer duas Mesas de quatro.
Primeira Mesa:
Selma Maria Frota Carmona, Presidente da Comissão de Combate à Violência Doméstica e Familiar da OAB/DF.
Seja bem-vinda; (Palmas.)
Joana D'arc de Jesus Soares dos Santos, Advogada-Presidente da OAB, Subseção aqui do DF; (Palmas.)
Abigail Pereira, gaúcha da minha cidade lá de Caxias do Sul, que é pedagoga e representa muito bem o movimento sindical e social em diversas áreas. Ela foi uma candidata à Senadora, quando concorreu, muito bem votada no Rio Grande do Sul. Mas muito bem votada mesmo!
Seja bem-vinda, Abigail! Um abraço a você, como dei para todas aí: um abraço a distância, um abraço a distância; (Palmas.)
Roberta Viegas e Silva, Consultora Legislativa e membro do Comitê pela Promoção da Igualdade de Gênero e Raça do Senado Federal.
Eu vou de imediato passar já para as nossas convidadas. Cada uma terá, como o dia é todo de vocês... E eu sempre digo que todos os dias têm que ser da mulher. Eu vou repetir o que ouvi falar uma Senadora no Plenário - eu vou repetir o que ela disse: "Em primeiro lugar, somos maioria, e vocês só existem por causa de nós. Ou são nossos filhos ou são mulheres". Então, todos vocês... Eu achei uma frase interessante, porque eu não tinha visto por este enfoque: ou são nossos filhos ou somos nós! Então, no mínimo, é isso. E é uma frase que mostra que naturalmente... E vocês irão aprofundar... Eu dizia para mim mesmo que eu não iria falar muito aqui; senão, o Presidente convida as pessoas para expressarem como as mulheres estão vendo toda essa realidade, e ele fala mais que as mulheres. Não farei isso.
Então, de imediato, para ser fiel ao que eu estava pensando, Selma Maria Frota Carmona, Presidente da Comissão de Combate à Violência Doméstica e Familiar da OAB-DF. Registre-se que, no DF, aqui, está muito grave a situação.
A palavra está com você. É você que fala. Fique bem à vontade aí. Você tem 15 minutos.
A SRA. SELMA MARIA FROTA CARMONA (Para expor.) - Perfeito.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - O normal são 10 minutos mais 5, mas hoje serão 15 mais 5, para cada convidada, ou seja, 20 minutos!
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A SRA. SELMA MARIA FROTA CARMONA (Para expor.) - Em primeiro lugar, eu quero agradecer ao Senador por esta oportunidade de a gente discutir mais uma vez, exaustivamente, sem se cansar, essa questão do combate à violência doméstica e familiar.
Quero aqui cumprimentar as mulheres, a Dra. Joana, a Dra. Roberta, a Dra. Abigail, todos e todas aqui presentes.
Eu vou falar, por dois segundos, um pouco da minha trajetória.
Eu fui Delegada de Polícia por 27 anos e tive a oportunidade de implementar aqui, no âmbito do Distrito Federal, a Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente. Só na área da infância, durante a minha trajetória de polícia, eu trabalhei por dez anos - tanto com criança e adolescente vítimas quanto com adolescentes infratores - e tive o dissabor de deparar com muitos casos de adolescentes com práticas de atos infracionais que foram vítimas na Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente, ou seja, com total ausência de políticas públicas, previstas no nosso Estatuto da Criança e do Adolescente e que poderiam ser, sim, cessadas se adotada de uma forma mais eficaz a questão das medidas protetivas previstas no Estatuto da Criança.
Na verdade, nós estamos aqui para querer que seja cumprido - e esta Casa é o lugar mais adequado - o nosso dispositivo constitucional previsto no art. 5º da Constituição, que diz que todos somos iguais perante a lei. Só que eu e isto aqui não...
E o que nós temos aí? Temos uma desigualdade - opa! Bom, mas isso aí é para depois - e, por causa dessa desigualdade, estamos aqui: uma desigualdade de gênero; uma desigualdade que vem lá dos nossos dramaturgos, da nossa cultura, que diz que mulher gosta de apanhar, como o Nélson Gonçalves, não é? Então, nós estamos aqui para tentar fazer com que essa postura seja alterada. E eu só vejo uma forma - somente uma: é com relação à educação, e com relação à educação das nossas crianças. Nós temos que entender que aquele menino, que aquele aluno do ensino fundamental tem que respeitar a coleguinha. E eu adorei que esteja aqui presente uma pedagoga à Mesa. Eu achei perfeito, porque eu acho que parte aí pela educação.
Eu vou falar um pouco... Depois que eu me aposentei como delegada, eu atuo como advogada desde 2013, só na área de família, violência doméstica e sucessões, e fui convidada para ser Presidente da Comissão de Combate à Violência Doméstica e Familiar da OAB, seccional daqui, do Distrito Federal, onde a gente tem como parceira a Dra. Joana, nas subseções, o que é fundamental, porque ninguém faz nada sozinho. Ninguém! Ninguém! Nenhum de nós faz nada sozinho!
Nesse triênio, a gente resolveu, com a gestão do Dr. Délio, em 2019, capacitar todos os advogados para ajudarem as vítimas de violência doméstica e auxiliarem também os ofensores. Estão-se esquecendo do homem, porque alguma coisa está acontecendo com a questão dos homens nessa temática toda. Os homens estão sendo esquecidos, e isso é um problema muito sério. Nós estamos deixando de lado o que está acontecendo com esse homem que não está dando conta dessa evolução feminina, não é? Nas Ordenações Filipinas, mulher não poderia ser nem testemunha. Testemunha advém da palavra "testículo": só o homem poderia ser testemunha. Dessa forma, é muito importante que a gente observe essa evolução da mulher, que foi muito grande e que os homens não acompanharam.
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Então, a ideia inicialmente era capacitar todos os advogados, no curso de 2019, com palestras, com aulas, com participação dos magistrados, do Ministério Público, para que eles possam auxiliar uma vítima que não tenha condições de procurar o acesso a um advogado pago, uma vítima hipossuficiente e um ofensor também que precise ser defendido.
Então, nós procuramos fazer todo esse entendimento e também com palestras - e aqui nós colocamos a OAB, inclusive eu me permito, em nome da Joana também, à disposição para fazer qualquer esclarecimento no tocante à lei, que é uma lei nova, uma lei que foi necessária, uma lei que venha tentar sanar as desigualdades.
Eu digo o seguinte: aqui o Senador está com esse copo, e eu estou com um copo mais cheio. Eu comparo sempre com esse copo. Esse copo mais cheio são os homens, e as mulheres são o copo mais vazio. Então, nós precisamos mais ou menos igualar.
A questão do feminismo é necessária, mas não quer dizer que isso faça com que a mulher deixe de ser feminina, de ser mulher, de ser mãe, de ser amante. Não é isso! Não é essa a proposta das mulheres; é a de serem vistas igualmente, inclusive no campo profissional, o que não é colocado e é uma temática extremamente desumana, eu diria assim.
Vou passar aqui.
Então, a ideia que a gente teve nesse triênio era de, no início, capacitar as pessoas - e podem solicitar à OAB palestras para esclarecimento perante a comunidade. Nós estamos lá para isso. Nós estamos lá para auxiliar toda a população.
O que eu...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Permita-me só, que eu não informei, enquanto você ajusta aí: eu lembro a todos que nós estamos ao vivo para todo o Brasil, pela Agência Senado, Rádio Senado e TV Senado.
O Brasil está acostumado a olhar para o Plenário, mas eu sempre digo que o nosso espaço aqui está muito além do Plenário. O Plenário são os convidados, os painelistas de forma bem objetiva; mas aqui nós estamos falando para em torno de 2 milhões de pessoas, toda segunda, pela manhã. Então, essa é a nossa responsabilidade.
Parece-me que vem alguém também na 2ª Mesa, representando o Ministério da Ministra Damares.
A palavra é sua e lhe darei mais um minuto lá.
A SRA. SELMA MARIA FROTA CARMONA (Para expor.) - Nesse sentido, é muito importante lembrar que, sem ser por intermédio da educação, a gente não consegue nada - eu posso reforçar, viu, Profa. Abigail?
Foi instalado um programa, aqui, no Distrito Federal, que está sendo referência em todo o Brasil, que é o projeto Maria da Penha vai à escola: educar para prevenir. Nesse programa nós contamos com a parceria do Tribunal de Justiça; da OAB; de defensores públicos; do Ministério Público; de várias pastas, tais como a Secretaria de Segurança Pública, a de Educação, as universidades - especificamente aqui no Distrito Federal nós contamos com a Universidade de Brasília e também com o UniCEUB -, para formar os professores, o corpo docente das escolas públicas para que eles possam ser multiplicadores de esclarecimentos no tocante tanto às questões atinentes à mulher vítima como à questão de crianças e adolescentes vítimas no âmbito de escolas públicas daqui, do Distrito Federal.
Então, vejam bem, no período entre 2014 até 2019, foram capacitados 2,75 mil profissionais de educação, em 347 escolas, aqui, no Distrito Federal, e 7,2 mil estudantes foram alcançados.
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Esse programa tem uma abordagem técnica e tem conteúdos específicos das questões de gênero e também do acolhimento e encaminhamento das questões de abuso sexual. Então, é um programa que tem um envolvimento multissetorial - nós precisamos da participação dos professores, da participação da OAB, da participação da Polícia Civil, da participação da Polícia Militar, dos magistrados, do Ministério Público - e tem tido um resultado fantástico. Nós fazemos gincanas, e o envolvimento tanto da docência como dos alunos é uma coisa fantástica, com premiações. É um trabalho fantástico que está sendo replicado para o resto do nosso País. Nós contamos com um encabeçador, o Dr. Ben-Hur, que é o nosso Juiz do Juizado de Violência Doméstica. Nós, aqui, no Distrito Federal, somos blindados por uma rede muito boa, porque nós temos 19 juizados de violência doméstica, aqui, no Distrito Federal, e uma delegacia muito bem aparelhada, o que não é o retrato dos demais Estados brasileiros, das unidades federativas.
Então, eu vejo que temos um desafio: se 75% das mulheres vítimas de feminicídio não tinham sequer um registro policial, nós temos que ir atrás dessas mulheres porque elas, com certeza, foram vítimas de algum delito anteriormente, seja ele um crime contra a honra, uma injúria, seja ele que tipo de delito for. Nesse sentido, eu conclamo a todos... E aqui, Senador, eu gostaria muito que a comunicação social fosse efetivamente provocada, porque essas mulheres ainda estão num nicho que a gente não alcança. A população precisa entender que nós podemos, sim, cessar essa violência porque nós estamos capacitados para isso. Nós podemos discar o 190; ele aceita perfeitamente uma denúncia anônima. Nós podemos discar o 197, porque a denúncia é recebida anonimamente. Então, eu não quero me envolver com a vizinha que eu percebo que está sendo vítima de xingamentos todos os dias. Vamos telefonar anonimamente! Existem vários slogans com relação à questão da mulher, de que "não se mete a colher...", não é?, e agora nós estamos conclamando a sociedade a usá-lo! Gente, isso é uma questão, inclusive, financeira do Estado; as mulheres estão morrendo, deixando crianças órfãs. É um prejuízo gigantesco nesse sentido.
Então, o que eu penso - e provoco aqui todos, para encerrar a minha fala - é que a gente busque essa igualdade, porque, se nós temos leis que tentam pegar um copo - este aqui é o meu copo - e colocá-lo igual àquele, nós precisamos de ferramentas jurídicas e da participação da sociedade, como diz o estatuto. Olhem o que fala o Estatuto da Criança: "é dever do Estado, supletivamente da família e sociedade, zelar pelos direitos das crianças". E, assim, eu ensino todas as mulheres, todas as pessoas que estão na desigualdade.
Nesse sentido, só há uma maneira de fazer isso, além de políticas públicas efetivas: vamos buscar denunciar! Vamos buscar que esse homem também seja tratado, que haja política pública para tratamento desse ofensor que não consegue achar que ele pode fazer uma janta sozinho; e a mulher também, se perceber que ela está sendo vítima de violência. Porque, na maioria dos casos - a Dra. Joana e todo mundo aqui sabe, o Senador inclusive -, todos nós sabemos que ela não se dá conta de que está sendo vítima de violência, porque ela acha que violência é uma violência física. A Lei Maria da Penha só traz um crime; ela não tem crime. Ela só traz um crime. Ela descreve questões administrativas, políticas públicas efetivas e trata o que é violência. Ela só traz um crime, que é o não cumprimento de medida protetiva.
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Então, é um tema que para mim é muito caro, assim como o são as crianças vítimas de violência e abuso sexual intrafamiliar. Nesse sentido, eu peço a vocês todos - a toda a sociedade eu conclamo e peço -, Senador, que encampe isto: nós precisamos divulgar quais são as ferramentas para a denúncia e que a comunidade, ao deparar com isso, não precisa se identificar - não precisa se identificar se não quiser! Não é que seja covardia; às vezes existe uma contextualização que não permite que a pessoa se identifique.
Aqui eu trouxe uma estatística. Se vocês puderem e quiserem abrir na Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal, há uma estatística pormenorizada com relação aos crimes contra a violência doméstica no âmbito do Distrito Federal.
Então, para que esse cenário aqui mude, para que possamos mudar esse gráfico aqui das mulheres mortas aqui, no Distrito Federal, ou em qualquer unidade federativa, nós precisamos de denúncia. Nós não podemos alcançar aquelas mulheres que nunca registraram uma ocorrência policial e que não chegaram à questão estatal.
Então, nós temos aqui que o maior índice de violência contra a mulher não é a agressão física.
(Soa a campainha.)
A SRA. SELMA MARIA FROTA CARMONA (Para expor.) - Perdão, eu só vou completar...
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Não, você tem mais cinco minutos aí.
A SRA. SELMA MARIA FROTA CARMONA (Para expor.) - Tenho? Que chique! Então, tá!
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Se ela tem, você também terá direito.
A SRA. SELMA MARIA FROTA CARMONA (Para expor.) - A Dra. Joana é gente boa!
Nós podemos observar que a questão da violência doméstica e dos registros, gente, não é sexual e não é física a maior; a maior é a moral e psicológica: é você ser xingada de "burra", de "velha que não dá conta de fazer nada". Diz respeito àquela mulher que a vida inteira tomou conta de casa, cujo marido vira e fala: "você não vai conseguir arrumar emprego"; "você é feia"; "você é gorda". Isso aí é uma violência psicológica. E essa violência psicológica não está tratada. Por exemplo, violência psicológica é crime? Não, o que é crime é a ameaça, o que é crime é a perturbação, que estão especificadas em meio extravagante, que estão especificadas em nosso Código Penal. E, quando a gente trata lá de questão patrimonial, é estelionato mesmo; é o marido cuja mulher está doente, está enferma e que pega o dinheiro dela, que pega uma cessão de direitos que ela tem de um terrenozinho, vai lá e vende esse terreno. Isso, sim, é uma violência prevista lá na nossa lei, mas que é prevista no nosso Código Penal e que precisa ser apurada. Mas como ela vai? Ajudem quem está do lado da gente. Nós fazemos parte de uma sociedade. Nós estamos no mesmo mundo. Estamos aqui muito de passagem. Eu acredito na compaixão pelo outro. Eu acredito no amor. Eu acredito no amor infinito. Eu acredito no amor franciscano. Então, a gente tem que fazer essa busca e ser mais solidário, dar mais as mãos uns aos outros.
Então, está aqui essa estatística de que falei e o desafio do qual eu já falei também: a sociedade tem o dever de auxiliar da seguinte forma... Eu até coloquei em casos de flagrante delito, quando a pessoa está assistindo a algum xingamento, violência, a alguma questão. Mas eu quero dizer que o 190 é a Polícia Militar. Eu estou até em dúvida, Senador; o 190 eu sei que é em âmbito nacional, mas se o 197, que é da Polícia Civil, há também nos outros âmbitos. Então, eu acho que pode ser que seja... Pode ser anônima, em caso de flagrante, e, num caso de delito que não é flagrancial, pode ser por intermédio de delegacias, da Delegacia da Mulher. E, em qualquer delegacia, posto policial, o 180 está totalmente capacitado para receber essas informações, que podem ser feitas anonimamente.
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É esse o meu recado, e é uma satisfação de estar aqui. Eu vou passar um vídeo, que é um plágio: isso aqui é da Polícia Militar de Santa Catarina.
Como é? É só clicar? É um videozinho. Só para encerrar e ver se toca o coração das pessoas, porque faz muita diferença essa ajuda à eficiência policial, porque às vezes nós sabemos muito bem que não há.
Quero cumprimentar a Dra. Gleide, que é uma querida delegada de polícia e é hoje requisitada. Que pena que você não estava aqui!
É só clicar aqui?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Vamos ao vídeo.
A SRA. SELMA MARIA FROTA CARMONA (Para expor.) - Há som.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eles têm de liberar lá o som.
A SRA. SELMA MARIA FROTA CARMONA (Para expor.) - Não há som.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Assessoria, veja o som porque não há som ainda.
(Procede-se à exibição de vídeo.)
A SRA. SELMA MARIA FROTA CARMONA (Para expor.) - Aumenta.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Se puder começar novamente.
Se puder aumentar o volume, seria bom.
(Procede-se à exibição de vídeo.)
A SRA. SELMA MARIA FROTA CARMONA (Para expor.) - Gente, eu peguei este vídeo da Polícia Militar de Santa Catarina.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bom o vídeo, porque é um vídeo real e tem de ser mostrado mesmo. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Parabéns pela apresentação do vídeo! Não importa o Estado.
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bom o vídeo, que é um vídeo real e que tem que ser mostrado mesmo.
Parabéns pela apresentação de um vídeo, que importa ao Estado.
A SRA. SELMA MARIA FROTA CARMONA (Para expor.) - Sim, eu acho muito bacana esse vídeo.
Eu quero, então, agradecer a todos e a todas.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem.
Essa foi a Dra. Selma Maria Frota Carmona. (Palmas.)
Presidente da Comissão de Combate à Violência Doméstica e Familiar da OAB/DF.
Eu fiz uma inversão, porque a outra convidada também, Abigail... Eu lhe chamo de Senadora. Foram fundamentais os milhões de votos que você fez lá, e pelo sistema, infelizmente, não é Senadora. E eu inverti, então. Agora fala a Abigail. Depois fala mais uma aqui de Brasília e depois fala Roberta Viegas e Silva. E só para anunciar já, para dar um tempinho, falarão ainda a Dra. Joana, a Dra. Roberta. Depois, na segunda Mesa, Marcos Vinícius Costa dos Santos - só vou citar o nome -, Luciana Grando Bregolin Dytz, Denys Resende, Jolúzia Andreia Dantas Vieira Batista. Já chegou a Dra. Grace, que vai falar também na segunda Mesa. Depois teremos ainda uma terceira Mesa.
Agora, passo a palavra... Eu sei que foi um voo... Ela mora em Caxias; para chegar a Porto Alegre é de 1h30mim a 2h de viagem. E que horas o voo saiu de lá?
A SRA. ABIGAIL PEREIRA - Cinco da manhã.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Porque ela disse que queria estar na hora que iniciasse aqui.
Você é uma mulher guerreira, como todas as outras que estão aqui, comprometida com as causas.
A palavra é sua, Abigail.
A SRA. ABIGAIL PEREIRA (Para expor.) - Muito bem. Eu quero cumprimentá-los e agradecer esta oportunidade de estar aqui, a convite do Senador Paulo Paim. Eu credito esse convite à minha trajetória, Senador, uma trajetória de luta em defesa das mulheres, dos seus direitos, especialmente os direitos trabalhistas, para os quais eu sempre militei - fui sindicalista por mais de 20 anos e sempre trabalhei ao lado das mulheres.
Sou pedagoga de formação, psicopedagoga, fui secretária de Estado no Estado do Rio Grande do Sul, Secretaria de Turismo. Concorri ao Senado já por duas ocasiões, as duas ao lado do Senador Paulo Paim - o que me orgulha muito...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Ela não vai falar, mas eu vou dizer: somando, dão mais de 3 milhões de votos, entre uma e outra. Só os votos dela; não os meus.
A SRA. ABIGAIL PEREIRA (Para expor.) - Esses votos eu angariei frutos desta ligação que nós temos - não é, Senador? - de defender causas que, de verdade, são causas humanas, ao defendermos os direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras, os direitos do nosso povo. Então, toda a minha trajetória me credenciou a estar aqui hoje ao lado dessas mulheres maravilhosas, que eu cumprimento, a Dra. Joana, a Dra. Selma e a Dra. Roberta. Quero ser extremamente solidária contigo aqui, Joana. Ela vai nos relatar, mas ela está muito emocionada. Ela está se recuperando. Não é, Joana? Depois ela nos conta essa situação. Então...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Isso que você falou antes sobre a parceria das mulheres.
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A SRA. ABIGAIL PEREIRA (Para expor.) - Exatamente. A sororidade - não é, Dra. Joana?
Enfim, não há como nós nos situarmos nessa realidade em que estamos vivendo, de tamanhas dificuldades para o conjunto dos brasileiros e das brasileiras. E nós, ao ontem celebrarmos o 8 de Março, um 8 de Março em plena situação de misoginia em que o nosso País vive, numa situação em que, sim, índices de feminicídio nos envergonham, nos assustam sobremaneira... O Brasil hoje é o quinto país do mundo com o maior número de feminicídios, e o meu Estado, o Rio Grande do Sul, o Estado do Senador Paim, é o terceiro Estado do Brasil que mais mata as suas mulheres.
Nós estamos vivendo aí esta situação grave, gravíssima da epidemia do coronavírus, que está mudando inclusive as nossas relações, as nossas formas até de nos cumprimentarmos - e é bom que a gente tenha cuidado, porque é grave de verdade -, mas o feminicídio é uma epidemia também, gente, é uma epidemia que exige resposta imediata, porque está virando já uma endemia, tal a gravidade da situação. Não é possível que o País maltrate tanto suas mulheres, violente tanto as suas mulheres e olhe todos os dias para a imprensa, seja ela no jornal, seja no rádio... Todos os dias absolutamente nós nos deparamos com situações de violência, em que nós ouvimos, em que nós assistimos e a sociedade naturaliza esta situação e o Governo faz olhos de que não enxerga.
Aliás, nós temos um Presidente da República, o mais alto grau de poder no País, que tem a misoginia como parte da sua conduta. Ele nos envergonha quando ataca uma jornalista de forma tão agressiva, com apelo sexual - como fez recentemente - e quando destrata uma Parlamentar aqui no Congresso Nacional. Isso só faz com que a violência também se naturalize. Quando muitos defendem a liberação das armas, nós sabemos que nós mulheres somos as mais ameaçadas por essa liberação.
Então, nós chegamos a este momento para dizer que enquanto nós estamos aqui, Senador Paim, neste momento, uma mulher está sofrendo feminicídio, está morrendo. No Brasil, de duas em duas horas morre uma mulher por feminicídio - de duas em duas horas. A cada minuto uma mulher é violentada, sofre violência. A violência nos dados que a Dra. Selma nos apresenta é grande - a violência psicológica, emocional. E nós poderíamos falar, Senador, da violência moral e sexual que sofrem dentro do trabalho. Agora, se a gente colocar, além dessas, os estupros - e estupros de meninas, crianças... Nós estamos assistindo a isto em pleno 2020: crianças sendo estupradas - e são estupradas e violentadas por pessoas que estão em seu entorno, que são familiares, que são pessoas que dizem amá-las.
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Nós viemos aqui hoje para falar de amor, Senador, porque nós defendemos o amor. E a Dra. Selma diz que é pela educação. Dra. Selma, sim, sem dúvida, concordo. Nós precisamos desde cedo fazer com que nasça um novo homem. Nasceu uma nova mulher, mas os homens não estão conseguindo acompanhar o nascimento desta nova mulher. Por quê? O homem é um ser opressor por natureza? Não! O homem é veículo desta sustentação de opressão, de subordinação, que trata a mulher como objeto, coisifica as mulheres. E muitas mulheres não denunciam, por dependência econômica, por dependência emocional e afetiva, por vergonha - extrema vergonha, da família, dos amigos - ou por acreditar exatamente que este homem não é um ser opressor por natureza; ela acha que vai ser a última vez que ela vai ser agredida, sempre acha que é a última vez, até que a última vez é a última mesmo, como o vídeo mostrou, quando o feminicídio está para ocorrer.
E eu queria chamar a atenção para o fato de que os índices de violência, de feminicídio - aqui já apresentados - acometem muito as mulheres não negras, mas a maioria é das negras. Eu chamo a atenção para essa situação, porque no início desta audiência, o Senador apontou - pelo seu Twitter, não é, Senador? - essa situação econômica que nós estamos vivendo - grave, gravíssima - e apontou para o crescimento do desemprego.
(Soa a campainha.)
A SRA. ABIGAIL PEREIRA (Para expor.) - E se nós olharmos os índices do desemprego, nós vemos que a maioria das desempregadas são as mulheres - e as mulheres negras, de novo. Então, há um recorte nesse nosso debate, há um recorte na questão de gênero, da questão de raça e da questão de classe. Não há como a gente se abstrair e não falar disso, embora a gente saiba que a questão da violência da mulher perpassa todas as idades, as etnias, as crenças religiosas, as classes sociais, mas nós sabemos que a maioria está nas mulheres com dependência econômica e nas mulheres negras. Então, nós precisamos, a partir de dados, gente... E vamos combinar, como se diz no popular, que todos nós conhecemos essas estatísticas. Elas estão estampadas... Nós temos uma vasta literatura e observatórios que nos mostram esses dados. E qual é a nossa reação?
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Eu queria, Senador, cumprimentá-los aqui, porque, do ponto de vista do Congresso, dos Parlamentares, se tomaram inúmeras medidas, a própria Lei Maria da Penha, a Lei do Feminicídio. Nós temos muitas leis.
Quando a Dra. Selma fala que o início se dá lá na educação, que nós devemos também formar as nossas crianças com uma educação respeitosa, que respeite de verdade as mulheres - que nos tratem com as nossas maravilhosas diferenças, mas que nos tratem com igualdade -, nós não podemos deixar de falar de como que a gente vai ensinar as nossas crianças quando estamos ameaçados de não podermos falar dentro das escolas, por causa da chamada escola sem partido. A "escola com mordaça" daqui a pouco proibirá que a gente possa falar da Lei Maria da Penha dentro das escolas. Esta é a realidade em que nós estamos vivendo. E lembrando que esses crimes todos de que nós estamos falando aqui até pouquinho tempo atrás eram chamados crimes passionais, não é? Matava-se em nome da honra deles - como se nós mulheres não tivéssemos honra.
Em briga de marido e mulher ninguém mete a colher, a Dra. Selma já falou. E aí a gente poderia elencar inúmeras frases dessas máximas que a gente lê nos caminhões, que nós precisamos condenar; condenar como é tratada a imagem social da mulher. Para vender cerveja, tem que haver a mulher ali do lado, de preferência com pouca roupa - para vender uma moto, um carro, uma roupa. Nós temos inúmeras propagandas, inúmeras músicas que tratam a mulher desta forma, da forma de naturalizar a mulher como sendo um objeto de mercado, tendo este valor de mercado. Então, a sociedade naturaliza, o Governo naturaliza.
Hoje qual é o principal problema de enfrentamento à questão da violência? A falta de investimentos! Quantas casas-abrigo nós temos no Brasil? Nós estimulamos as mulheres a denunciar - e nós estimulamos, sim, porque são poucos os registros, muito poucos, e a gente aqui já falou das causas. Se a mulher vai lá denunciar, depois de tanto ela ouvir o movimento social pedir para que ela vá lá e denuncie ou que a vizinha denuncie, aí ela volta para casa onde o agressor está e a gente sabe o que acontece: o feminicídio. Cadê as casas-abrigo? Nós temos 100 casas-abrigo no Brasil! No nosso Estado, 14, Senador Paim, 14, somente 14 casas.
E eu tenho a honra de ter participado também deste debate. As primeiras delegacias da mulher no nosso Estado, lá nos anos 80 - eu estava junto nessa luta, Senador -, foram na capital, Porto Alegre; na cidade de Caxias do Sul e na cidade de Canoas. E as primeiras casas-abrigo foram a Casa Viva Maria, em Porto Alegre, e a Casa Viva Rachel, em homenagem à...
(Soa a campainha.)
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A SRA. ABIGAIL PEREIRA (Para expor.) - ... saudosa Rachel Grazziotin, em Caxias do Sul.
Enfim, eu quero aqui dizer que a desigualdade e a exclusão são marcas dos nossos tempos, são marcas muito profundas. Eu sei que já estou chegando ao meu limite, Senador, mas eu preciso dizer que, em função de toda essa realidade, no Rio Grande do Sul, nós criamos uma força-tarefa cujos proponentes foram o Deputado Estadual Jeferson Fernandes, a Deputada Federal Maria do Rosário e o Senador Paulo Paim. Eles foram os proponentes da criação dessa força-tarefa. Eu tive a honra de representar o Senador Paim junto a essa força-tarefa na Assembleia Legislativa. Nós entregamos, Senador, esse material da força-tarefa nesta semana, que vou deixar aqui na Comissão. É uma força-tarefa institucional de combate ao feminicídio criada no Rio Grande do Sul. Nós interiorizamos, fizemos uma jornada em várias cidades, em várias regiões do Estado do Rio Grande do Sul, e no final, quase no Natal, no final de dezembro, nós a concluímos com a conferência estadual, com a jornada estadual. Entregamos esse primeiro relatório, porque nós vamos continuar com esse trabalho.
E mostramos que esse crescimento do feminicídio no Rio Grande do Sul chama a atenção, chama muito a atenção. Agora, já em 2020, nós estamos, Senador, com um aumento de 233% de feminicídios no nosso Estado, comparado a janeiro do ano passado. É assustador. As mulheres têm medo de sair às ruas, medo de ficar dentro de casa, porque nós temos agressores dentro de casa. É uma situação de epidemia, portanto, em que nós sociedade precisamos urgentemente buscar respostas.
A falta de investimento nas delegacias para que haja uma rede de atendimento, para que as medidas protetivas solicitadas não demorem tanto para serem liberadas - vocês sabem do que estou falando -, para que a gente tenha casas-abrigo. A Casa da Mulher Brasileira, esse projeto tão lindo pelo qual nós lutamos tanto, infelizmente, a Ministra da Mulher abriu mão desse projeto, porque cortaram as verbas e foi silenciado. Então, nós vimos uma falta de políticas públicas que deem conta de que a mulher possa estar no mercado de trabalho, que a gente tenha creche para deixar os nossos filhos, que nós tenhamos casas-abrigo, que nós tenhamos condição de exercer a nossa autonomia. Não existem mais essas políticas públicas.
Ao mesmo tempo, nós temos a Emenda 95 - não é, Senador? -, que nos cortou educação, saúde, segurança, qualquer investimento nessas áreas. Quem são as mais prejudicadas? Nós sabemos. Somos nós, as mulheres.
Portanto, quando a gente diz que o Brasil é violento, nós sabemos que essa violência tem cara. É diferente a violência com homens; o tratamento é diferente com as mulheres. Os dados nos mostram isso.
(Soa a campainha.)
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A SRA. ABIGAIL PEREIRA (Para expor.) - Portanto, eu quero dizer, para ir finalizando, Senador, que nós precisamos enfrentar essa epidemia. Nós mulheres temos muitas perguntas, mas temos algumas respostas também para oferecer. É por isso, inclusive, que, nesse 8 de março, o Brasil todo homenageou mulheres, sim, como Maria da Penha, que empresta seu nome para essa lei que o mundo todo reconhece como uma lei de enfrentamento, mas nós também nos oportunizamos dessa data para fazermos os nossos protestos, para dizer que, assim como as mulheres que estão sendo mortas por falta de investimento em políticas públicas, nós também enxergamos a morte da democracia muito forte. E sem ela nós não temos condição de denunciar. Sem ela nós não temos condição de estar aqui fazendo este debate.
(Soa a campainha.)
A SRA. ABIGAIL PEREIRA (Para expor.) - Então, a democracia para nós é muito vital, inclusive mais para nós mulheres. Então, nós denunciamos nesse 8 de março esse ataque que está sendo feito à nossa democracia. Nós lutamos nesse 8 de março por amor, por liberdade. Nós lutamos para estar vivas. Nós lutamos por todas as nossas meninas, pelas mulheres, pela humanidade, porque, quando uma mulher avança, avança a humanidade e nenhum homem retrocede.
Por isso, é também este o momento de nós aqui usarmos este espaço privilegiado, Senador Paim, para fazermos a denúncia desta situação em que vivemos. E, mais uma vez, dizer que nós mulheres somos não objetos, nós somos de verdade sujeitos e protagonistas desta nossa história de conquistas por nosso povo.
(Soa a campainha.)
A SRA. ABIGAIL PEREIRA (Para expor.) - Quando a injustiça se torna lei, a resistência se torna um dever. Nós resistimos. Por isso aqui eu termino dizendo: Viva a luta das mulheres! Viva a democracia, a igualdade, viva o respeito!
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem. (Palmas.)
Valeu a pena, porque a Comissão não paga passagem para ninguém. Aí, quando eu a convido: "Senador, como é que eu faço?" Aí o gabinete bancou a passagem. Parabéns! Foste muito bem.
Eu quero dizer que não vou ser rígido com o tempo com ninguém. Não é porque ela é gaúcha que vou dar um tempo maior. Ela falou 25 minutos com mais 3. Olha que o tempo hoje é de vocês, ninguém aqui vai engessar o tempo.
E depois, nas considerações finais, cada um terá dez minutos para fazer o seu comentário. Eu tenho algumas perguntas que vou encaminhar via e-Cidadania e cinco projetos que estão na Comissão, um já está no Plenário. Há projetos, às vezes, que não tem como os Senadores aceitarem, voltam para mim, que sou o Presidente. E eu tenho que assumir a responsabilidade. Eu queria a opinião de vocês sobre esses projetos, tranquilamente, como que dizendo: esse não dá, esse dá, esse você deveria dar parecer favorável. Isso será num segundo momento.
Agora passo a palavra a Joana D'arc de Jesus Soares dos Santos, advogada e Presidente da Subseção de Samambaia e Recanto das Emas.
A SRA. JOANA D'ARC DE JESUS SOARES DOS SANTOS (Para expor.) - Olá, bom dia a todos.
Meu nome é Joana d'Arc. Atualmente sou Presidente da Subseção de Samambaia e Recanto das Emas.
Eu gostaria de começar agradecendo a Deus por estarmos aqui reunidos, como sempre faço, pois sem Ele nós não conseguiríamos vencer as nossas lutas de todos os dias.
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Eu gostaria de cumprimentar a Mesa e agradecer a oportunidade, Senador, de estarmos aqui.
Agradeço à Dra. Selma, que disfarça muito bem: diz que não tem o dom da oratória, e chega nas entregas de carteira e arrasa. Aqui falou muito bem. Eu me senti representada, viu, doutora, pela sua fala em nome da nossa instituição. Perfeitas as suas considerações. Eu me senti representada aqui também pela pedagoga Abigail, pela sua fala, que também ratifico.
Eu não posso deixar de agradecer a todos os nossos presidentes. Primeiro, agradeço à Dra. Rizonete, que é a nossa tesoureira da subseção. Aqui nós temos quatro Presidentes das nossas comissões: a Dra. Elder, da Jovem Advocacia; o Dr. Márcio, da Comissão de Família, que vem atuando muito bem; Dr. Marcos Vinicius, da Comissão de Direito Penal, da nossa Subseção; Dra. Rayanne, da Comissão da Mulher; e os demais colegas, Dr. Daniel, Dra. Maria Augusta, Dra. Soraya também, que está presente.
Doutores, eu fiz algumas considerações das falas da Dra. Selma, da Abigail. É muito importante, Dra. Selma, que essa educação comece bem cedo, essa conscientização comece bem cedo. Na nossa Subseção de Samambaia e Recanto das Emas, nós temos o projeto OAB vai à Escola levar cidadania, presidido pela nossa Vice-Presidente, que não pôde estar presente, Dra. Elaine Rockenbach. Como é importante esse trabalho preventivo iniciar na educação de base, nós levamos muitos temas, como crimes virtuais, alguns temas para os pais e para as crianças e adolescentes. Então, esse trabalho preventivo, se você começa na educação de base, você forma homens e mulheres melhores para estar na comunidade, em sociedade.
A minha fala é bem curtinha, não vou me exceder nas considerações específicas do tema, porque o Dr. Marcos Vinicius, que é assessor jurídico da Defensoria, vai nos proporcionar.
Eu queria dizer que a nossa subseção está de portas abertas fazendo um trabalho preventivo com a administração, junto ao Espaço da Mulher de Samambaia, no qual estamos elaborando palestras e cursos para atuar, Dra. Selma, de forma preventiva. Então, como a doutora falou, a OAB está muito preocupada com essas questões. Estamos inclusive qualificando os nossos advogados por meio de cursos para que possam caminhar com a nossa comunidade, com a sociedade, para que seja atingido o objetivo nessa prevenção.
A nossa subseção ganhou muito destaque com a caminhada do feminicídio, que aconteceu mês passado, em que juntamos muitas autoridades para trabalhar o tema. E é muito bom ver que a nossa comunidade de Samambaia e a OAB literalmente vestiram a camisa. Vejo aqui colegas com a camisa da subseção. A causa é nobre e nós precisamos trabalhar para combater...
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É muito difícil para mim, é um exemplo de superação estar hoje aqui falando sobre esse tema, porque eu também fui vítima, recentemente, principalmente de violência moral e psicológica. Conseguir estar aqui, falar e dar o meu testemunho é um exemplo de superação para mim.
Eu sou mulher, advogada. Muitas não têm uma formação, uma qualificação, e não conseguem sair disso, como a Dra. Abigail falou. Não conseguem sair porque têm uma dependência financeira. Muitas vezes ela até trabalha, mas o companheiro retém todos os valores. Muitas vezes ela tem uma dependência financeira e emocional do companheiro, mas fica a dica: nós não podemos nos calar diante disso, porque a violência pode começar com um empurrão, um puxão de cabelo, com o fato de não deixar você sair, que foi a que eu sofri, para os seus compromissos: "Você não vai, nós temos um filho, você tem que ficar aqui cuidando dele". Então, nós não podemos deixar que isso se agrave, porque a violência, muitas vezes, é muito sutil e até imperceptível.
A doutora que é da área, é delegada, eu acredito que ela possa observar esses pontos. A violência, muitas vezes, é imperceptível. Quando você toma as rédeas da coisa, quando você quer tomar, ela muitas vezes já gerou uma proporção muito extensa e muito difícil de ser remediada, de ser conduzida.
Então, mulheres, não se calem. Eu não me calei, eu registrei ocorrência, eu fui à Deam no sábado e estou inclusive com medida protetiva. É muito importante esse papel até para os índices que a doutora mencionou, senão nós não teremos estatísticas para saber o quanto a nossa sociedade está sofrendo. Como a doutora falou, enquanto nós estamos aqui, a cada segundo, quantas mulheres não estão sofrendo violência doméstica neste exato momento? Se a mulher se calar fica até difícil trabalhar preventivamente, porque nós não temos dados, nós não temos estatísticas.
Não quero mais me delongar. Eu agradeço a presença de todos. Muito obrigada pela participação. Agradeço à Roberta também pela participação. Fiquei até inibida, diante das falas aqui maravilhosas. Como eu falei, eu me senti representada.
Muito obrigada a todos. Bom dia e bom trabalho. Para os advogados eu sempre gosto de desejar bons honorários, que é a frase que todo advogado gosta de ouvir. Muito obrigada a todos e bom dia.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dra. Joana D'arc de Jesus Soares dos Santos, advogada que preside a OAB/DF - Subseção de Samambaia e Recanto das Emas, que foi aqui, permitam-me que eu diga isso, corajosa, como nós todos temos que ser - fazer o bem sem olhar a quem. Ela deu um depoimento próprio, da vida dela, mostrando que não podemos nos calar, não é, Isadora? Então, os nossos cumprimentos pela sua posição firme e clara, dando exemplo de como as mulheres podem agir, mediante o que você teve, que foi uma agressão de fato - e você denunciou aqui. Meus cumprimentos.
Concluindo esta Mesa, Dra. Roberta Viegas e Silva, consultora legislativa e membro do Comitê pela Promoção da Igualdade de Gênero do Senado Federal.
A SRA. ROBERTA VIEGAS E SILVA (Para expor.) - Bom dia a todos.
Cumprimento o Senador Paulo Paim, sempre parceiro dos temas mais caros desta Casa e nosso, das mulheres, sempre. Eu sou testemunha.
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Agradeço à Coordenação e ao Senado, por terem criado essa consultoria específica de que vocês fazem parte.
Está aqui a colega que também faz parte do grupo de gênero e raça. É isso? Pode dizer seu nome. Diga para nós. Dê essa satisfação para nós.
A SRA. ADRIANA NUNES (Para expor.) - Eu sou Adriana, trabalho com o Senador Paulo Paim na CDH e estou fazendo parte desse grupo, o que tem sido muito bom. Nós nos reunimos para debater assuntos da Casa e de alguns funcionários. Está sendo muito bom, muito produtivo. Dou os parabéns à Ilana, a Diretora. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, muito bem!
Vou repor o seu tempo.
A SRA. ROBERTA VIEGAS E SILVA (Para expor.) - Fique tranquilo!
Cumprimento os membros da Mesa.
Mando um abraço direto a você, Joana D´Arc. Não há como não se sentir ao menos minimamente identificada com o seu relato. Acho que qualquer mulher passa ou já passou por alguma situação de assédio ou de violência em algum grau, praticamente todas as mulheres, desde as crianças até as mais idosas.
Eu fui convidada para falar aqui institucionalmente. Quem vinha falar era a Dalva, que é do Comitê, que hoje em dia é Presidente. Eu fui Presidente do Comitê por três anos. Ela ia falar, mas precisou viajar. Então, a minha apresentação tem um pouco da apresentação dela, até por respeito e consideração ao que ela fez. Mas eu também agrego, ao final, o meu trabalho de consultora legislativa, falando um pouquinho sobre a elaboração de projeto de lei, como é que funciona nesta Casa.
Vou começar falando sobre violência. É uma honra falar por último, mas é uma grande responsabilidade, como você mesmo disse também. Eu tenho de fazer jus às colegas que me precederam.
Falo da minha trajetória. Eu sou consultora legislativa, como eu falei, em direitos humanos e cidadania. Fui Presidente do Observatório da Mulher contra a Violência aqui do Senado, que é um órgão de coleta de dados sobre violência contra a mulher, por dois anos, e voltei à consultoria, mas continuo no Comitê de Gênero e Raça, que foi instituído pela Diretora Ilana em 2015.
A minha apresentação começa sobre violência. A gente já sabe da Lei Maria da Penha. Dalva, inclusive, fala sobre os números. Os números estão nos jornais. Existe uma grande pergunta sobre se a mídia aumenta...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Isso é importante - e a TV Senado está ao vivo - porque grande parte do Brasil não sabe disso. Por isso, este momento, para mim, é um momento nobre que o Senado está colocando à disposição, com essa visibilidade das nossas painelistas. Todas falarão por mais dez minutos no encerramento e responderão perguntas, inclusive minhas. Preparem-se para a sabatina. Digo isso só para descontrair.
A SRA. ROBERTA VIEGAS E SILVA (Para expor.) - Os números são chocantes, não é, Senador? Como eu falei, 42% dos casos de violência ocorrem dentro do ambiente doméstico. Isso é o que a gente sabe, fora a questão da subnotificação de que a Dra. Selma falou antes.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Repita, por favor... Nos últimos 12 meses... Eu a atrapalhei com o meu aparte.
A SRA. ROBERTA VIEGAS E SILVA (Para expor.) - Nos últimos 12 meses, 1,6 milhão de mulheres - é muita gente - foram espancadas ou sofreram tentativa de estrangulamento no Brasil.
Mas, antes de falar nisso, eu queria só falar que são números oficiais. E as mulheres, como a Dra. Selma falou, não procuram a polícia. Eu quero falar um pouco sobre isso também, porque o ciclo da violência começa no Estado. É uma violência institucional também a que a gente sofre. Se alguém já acompanhou uma mulher a uma delegacia tem um pouco da noção do que é ser desacreditada do começo ao fim e desestimulada a prestar qualquer tipo de ocorrência.
Então, quem tem dados às vezes sobre isso, Dra. Selma, é a área da saúde. Quando eu estava no Observatório, a gente acompanhou uma pesquisa da saúde que tentava cruzar o acesso de mulheres à saúde antes de elas efetivamente serem mortas por conta de feminicídio. E as mulheres vão à saúde. Elas vão à igreja também, elas tentam falar com a família. O Estado, na forma da polícia, não é dos mais acessáveis; a saúde é muito mais.
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Então, se a pesquisa fosse à frente - eu não sei como está agora -, seria uma possibilidade de a gente fazer uma prevenção antes que virasse realmente caso de polícia. Na verdade, já é um caso de polícia: um mulher que acessa a saúde já está sendo vítima da violência. Enfim, é outro ponto de acesso que precisa ser observado também.
Assim, 22 milhões de brasileiras passaram por algum tipo de assédio só no ano passado. Como eu falei, são todas as idades, desde crianças... Há até uma charge que fala assim: se estivesse na igreja, não teria acontecido nada, e aí a menina é morta na igreja; se estivesse na escola, não teria acontecido nada, e aí meninas são mortas na escola. Não importa onde estejamos, a roupa que usemos, as palavras que falemos, com quem estejamos, nós somos as mais vulneráveis à violência de gênero no Brasil.
Uma pergunta que sempre fazem quando eu estou falando: "Por que não há uma lei que proteja o homem especificamente?". Porque o homem não morre por ser homem, ele morre por outras causas, e as mulheres morrem por serem mulheres. Então, essa é a grande diferença.
E 52% das mulheres que sofreram violência não denunciaram os agressores. Isso vai muito ao encontro do que eu falei. Como já foi dito aqui também, há a questão da dependência econômica. As mulheres são desacreditadas a pensar que podem denunciar a violência, que vão ter algum tipo de apoio familiar. Muitas vezes, elas não o têm também. O próprio Estado não consegue dar conta de protegê-la, além de ela enfrentar uma via-crúcis desde o momento em que pretende denunciar até o momento em que ela consegue a medida protetiva - no DF, como a Dra. Selma estava me falando, isso é quase imediato, mas essa é uma realidade que não se repete nos outros Estados do Brasil, e, mesmo aqui, essa medida protetiva não está dando conta dos casos de violência -, até o momento em que ela, efetivamente, às vezes, é vítima de feminicídio, mesmo tendo denunciado, porque o Estado não está dando conta de protegê-la.
Houve um momento de dúvida. Eu me lembro de a Senadora Simone Tebet falar isso no Plenário há uns dois anos, pois estava bastante grande o debate na época. A dúvida era se a mídia aumentava os casos de violência. Nós temos a percepção aumentada porque a mídia está falando mais sobre isso, ou, efetivamente, a violência aumentou? É uma pergunta que não tem uma resposta exata, porque as pesquisas estão sendo feitas ainda, mas eu, por observação, acredito que efetivamente tenha aumentado por um motivo muito simples: as mulheres estão conseguindo se separar. Aos poucos, existe uma mudança cultural em que a mulher consegue dizer basta àquela violência, que ela não quer mais, mas ela não é protegida depois disso. Então, o número de mulheres mortas por ex-parceiros está aumentando muito. Na semana passada, o UOL noticiou 33% de aumento de mulheres mortas por ex-parceiros. Então, a mulher efetivamente se separa, tenta dar fim ao ciclo de violência, mas não é protegida depois disso. Ela fica até mais vulnerável, porque o grau de violência aumenta ainda mais.
A cada quatro minutos, uma mulher é vítima de violência doméstica - esse é outro dado também.
Estes são os tipos de violência doméstica previstos na Lei Maria da Penha, de maneira geral: a física, como já foi dito, a psicológica, a moral... E a moral é muito sutil, pois, muitas vezes, a pessoa não se dá conta, não é, Dra. Joana D'Arc? Acredito que, às vezes, é preciso conversar com alguém. Às vezes, uma pessoa que trabalha com o tema não se dá conta também que está sendo vítima daquela situação. E há a violência sexual. Muita gente não sabe, mas, até pouco tempo atrás, uma mulher casada era obrigada a manter relação sexual com o parceiro, e, hoje em dia, isso não existe mais. Então, violência sexual mesmo dentro do casamento é uma realidade. E há também a violência patrimonial, que é referente à realidade financeira da mulher.
A violência tem cor realmente, como já foi dito aqui também. As mulheres negras são muito mais vítimas de violência doméstica. Isso é questão numérica mesmo. Isso tem sido catalogado aqui pelo Observatório do Senado, e quem tiver interesse pode acessar a página. Na página principal do Senado, há um link na parte superior falando sobre o Observatório, há um mapa do Brasil inteiro com números por Estados. E eles fazem também a diferença entre cor das mulheres que são vítimas de violência, há um trabalho bem interessante em relação a isso.
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Aí há o ciclo da violência doméstica, que começa com aumento de tensão. Há um ataque violento, e o agressor geralmente se arrepende, fala que nunca mais vai fazer aquilo, promete que vai mudar, mas ele volta. É um ciclo, ele volta, e há o aumento de tensão. E, muitas vezes, isso aí acaba em morte, uma morte, às vezes, não prevista: "Nossa, mas eles nem brigavam! A gente não percebia nada". Mas esse ciclo subjacente estava acontecendo ali em algum nível.
E aí também chamo a atenção para uma coisa que a Dra. Selma comentou em relação a crianças. Há uma pesquisa no Ceará conduzida por um professor da UFCE que mostra que crianças que crescem em um ambiente violento têm muito maior propensão para serem ou futuros agressores ou futuras vítimas. Uma criança que cresce no ambiente violento naturaliza essa violência e pode se tornar muito mais provavelmente ou um agressor ou uma vítima.
Também no Observatório - eu estou falando bastante...
(Soa a campainha.)
A SRA. ROBERTA VIEGAS E SILVA (Para expor.) - ... do Observatório, porque é um órgão da Casa -, há uma pesquisa sobre as delegacias de polícia que eu também gosto de mencionar. A gente entrevistou agentes por telefone, e foram muito surpreendentes as respostas, especialmente em relação a treinamento específico de violência doméstica, que não havia, e à percepção da responsabilidade da mulher na violência. A maioria dos agentes achava que a mulher era parcialmente responsável pelo menos pela violência havida e culpabilizava relativamente a mulher também.
Agora, vamos falar um pouquinho sobre o Senado. O Senado aderiu ao Programa Pró-Equidade em 2013, lá no começo. Eu não tenho certeza, mas o representante da SPM vai falar se o programa está descontinuado ou não. Ele era um selo a que as organizações públicas aderiam. Para conseguir o selo, elas se comprometiam a uma série de ações relativas à equidade. E o Senado Federal foi um dos pioneiros na adesão desse selo. E a gente já recebeu três selos em relação a isso por ter cumprido com as propostas com que nós nos comprometemos.
Em 2015, foi instituído o Comitê Permanente pela Promoção de Igualdade de Gênero, que, em princípio, era só gênero, mas aí a gente percebeu que não havia como falar em gênero sem falar em raça, era impossível. A raça foi agregada ao comitê. E, hoje em dia, a gente tem reuniões, como uma colega estava dizendo ali, com os servidores que se identificam como negros no Senado para falar sobre as próprias demandas, porque, se não pode ser uma demanda da Casa, é uma demanda dos servidores, como eles se sentem e se percebem sendo servidoras e servidores, terceirizados inclusive, negras e negros.
Nós temos palestras, rodas de conversa, programa de assistência a mulheres em situação de vulnerabilidade econômica em decorrência da violência doméstica e familiar - isso é a cota de violência que o Senado tem nos contratos de terceirização; eu vou falar um pouquinho sobre isso -, materiais impressos e folders informativos, matérias na intranet, cursos na internet abertos a toda a comunidade sobre a Lei Maria da Penha.
Eu falo rápido, porque eu sou pernambucana, e a gente fala rápido, e também porque eu tenho muita coisa para falar! (Risos.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Está indo bem, está indo bem.
A SRA. ROBERTA VIEGAS E SILVA (Para expor.) - Peço desculpas. Alguém me interrompa se não estiver entendendo.
No Programa Pró-Equidade, esses aí são os selos que a gente tem. Criou-se um selo, porque realmente é um programa transversal, que perpassa todos os órgãos, as secretarias, os gabinetes, a Consultoria, a Advocacia, o Senado inteiro. A percepção é que a gente não tem como falar em violência, não tem como falar em igualdade de gênero sem falar com todo mundo da Casa. Não há como haver um comitê isolado que faça ações isoladas. Então, isso envolve a Casa inteira, é transversal mesmo.
Temos esse programa de assistência a mulheres em situação de vulnerabilidade. Esse foi um ato da Diretoria-Geral que destinou 2% das vagas nos contratos de prestação de serviços continuados e terceirizados no Senado para mulheres em situação de vulnerabilidade econômica. Então, o GDF tem um cadastro dessas mulheres e repassa para as empresas que são contratadas pelo Senado, e 2% de mulheres do contrato de cada empresa são mulheres em situação de vulnerabilidade econômica, justamente atacando o problema da vulnerabilidade econômica das mulheres vítimas de violência, que impede que ela saia ou que, para as que já saíram, continuem com a própria vida.
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O Senado possui atualmente 34 mulheres sendo atendidas por essa cota de 2%. A identidade dessas trabalhadoras é mantida em sigilo, é claro, sendo vedado qualquer tipo de discriminação. Iniciou-se agora uma campanha de combate a assédio moral e sexual no Senado, também pioneiro nos órgãos públicos, e a gente tem uma atenção especial, quando a gente fala sobre assédio, em relação a essas mulheres. Elas não podem ser discriminadas ou assediadas, obviamente. Elas já vêm com um peso de vulnerabilidade para cá, são mantidas em anonimato. Às vezes, essa identidade é descoberta por um ou outro motivo, mas a gente tem um cuidado muito específico em relação ao assédio dessas mulheres também, quando a gente dá esse treinamento para os servidores, trabalhadores desta Casa.
Além disso, eu queria só falar, como eu já falei um pouco, sobre o processo legislativo. Quando uma proposta legislativa chega aqui, é como se fosse um braço do Estado, com o Estado acolhendo seletivamente a demanda social.
(Soa a campainha.)
A SRA. ROBERTA VIEGAS E SILVA (Para expor.) - Ela chega sob a forma de proposta legislativa nesta Casa. No caso, são demandas geralmente de grupos organizados. No caso das mulheres, geralmente, isso vem geralmente em forma de demandas do grupo dos movimentos sociais de mulheres organizados para cá. São acolhidas pelo Estado e passam a ser veiculadas por meio de proposta legislativa. Idealmente, essa proposta vem relativamente amadurecida. Ela foi debatida antes de chegar aqui, o que faz uma proposta ser mais robusta e fazer uma modificação realmente incisiva, decisiva, que faça diferença na sociedade.
A Lei Maria da Penha é o melhor exemplo disso. A Lei Maria da Penha foi precedida de uma discussão prévia. Ela chegou aqui por meio de um consórcio de mulheres, o Consórcio Maria da Penha, sob a forma de um anteprojeto. Ao longo da tramitação, ela recebeu interferência bem-vinda de vários outros atores interessados. Na época, a SPM atuou muito, articulando aqui dentro. O Judiciário articulou muito também, até para falar na aplicação da lei, pois é uma lei que perpassa medidas administrativas, prevenção. Há gente que não sabe disso na Lei Maria da Penha. Falam que é preciso investir em prevenção, e, sim, a Lei Maria da Penha fala em prevenção. A gente precisa investir na aplicação da Lei Maria da Penha, pois é isto que acontece: ela não é aplicada, na verdade. Universidades interferiram na forma de grupos de estudo. A OAB foi muito presente, atuante também na época. Isso seguiu pelo processo legislativo, como segue de maneira geral. Isso passa pela escolha das Comissões em que vai tramitar, passa pelas relatorias, não é, Senador? As relatorias são escolhidas ou requeridas para atender e veicular melhor aquela proposta. Então, essa foi uma proposta, e as propostas legislativas tramitam aqui mais ou menos dessa forma.
Na legislatura anterior, a gente observava um tendência muito forte a debater a Lei Maria da Penha. Foi quando realmente a mídia começou a noticiar mais a violência doméstica. Eu acho que eu posso dizer que isso começou a ser desnaturalizado de uma maneira mais intensa. Então, a mídia começou a debater mais. A preocupação no Congresso aqui era em relação a isto: este aumento da violência. Então, houve muito debate em torno de mudanças da Lei Maria da Penha e uma preocupação política com a presença de mulheres no Parlamento. O tom da legislatura anterior tinha muito disto: muitas propostas, muitas propostas de emenda à Constituição, projetos de lei também, tratando sobre cotas para eleição de mulheres, fundo partidário, presença na propaganda eleitoral. A maioria dessas propostas, desses projetos está arquivada. Ao final de cada legislatura, existe uma série de regras que determinam que a proposta seja arquivada ou não.
A gente continua com a questão da representatividade baixíssima de mulheres no Parlamento. Existe uma organização internacional chamada UIP (União Interparlamentar), em que existe um índice que coloca o Brasil na posição 140 no mundo...
(Soa a campainha.)
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A SRA. ROBERTA VIEGAS E SILVA (Para expor.) - No mundo inteiro, estamos no 140º lugar em termos de representação de mulheres no Parlamento. A gente perde para praticamente todos os países, até porque há vários empates. Então, a gente está muito aquém, muito, muito longe de ter uma efetiva representação satisfatória de mulheres aqui, neste Parlamento.
O tema atual - eu fiz uma breve pesquisa e estou disponível depois para conversar sobre isso com quem quiser se aprofundar - é muito essa questão econômica das mulheres e a questão da educação também. Então, tem outra abordagem esta Legislatura, apesar de haver ainda propostas tentando modificar a Lei Maria da Penha. E as propostas que modificam a Lei Maria da Penha, em geral, a gente vê com muita atenção, porque a Lei Maria da Penha ainda não é aplicada. Então, para modificar uma lei que não é aplicada e que foi fruto de tanto debate, é preciso muito cuidado, é preciso um amadurecimento em relação ao que se quer que mude. Se não funciona, não funciona por não estar sendo aplicado ou por ter realmente que melhorar? Eu não vou dizer que seja bom que não haja propostas tentando modificar a Lei Maria da Penha, mas a gente vê também um lado positivo nesse sentido...
(Soa a campainha.)
A SRA. ROBERTA VIEGAS E SILVA (Para expor.) - ... apesar de parecer ser também um desinvestimento político no tema, talvez, pois a gente sabe que o orçamento para combate a violência diminuiu. Mas há também esta perspectiva de que é uma lei excelente, uma das melhores do mundo, que não é aplicada. Então, é preciso investir nessa aplicação.
Eu escrevi bastante aqui.
Existe um projeto específico que propõe mudar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação - não sei se está aqui na CDH, acho que está na Comissão da Educação -, propondo transversalizar na educação básica o tema da violência contra as mulheres. Hoje em dia, na educação básica, existe a transversalização do tema da violência, especificamente quanto a criança e adolescente. O pessoal da área da educação - não sou da área da educação - tem muita resistência também em inserir novos conteúdos na educação básica, que já é bastante saturada com pouco tempo, mas a transversalização de alguns temas é importante. Como eu falei, aqui na Casa, a gente já faz isto: transversaliza o debate sobre gênero. O que quer dizer o tema do debate da violência contra a mulher transversalizado na escola? Isso quer dizer que não haveria uma disciplina específica, necessariamente, de combate à violência contra a mulher, mas, em todas as outras disciplinas, de alguma forma, esse tema seria inserido e debatido nas aulas, nos conteúdos, não em um lugar só, mas em todos, quando se for falar sobre religião, sobre geografia, sobre história, sobre português, de maneira geral. É inserir o tema de maneira transversalizada mesmo.
Então, é isso. A minha apresentação, de maneira geral, é sobre isso.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Ficou no tempo, ficou dentro do tempo a Roberta Viegas e Silva, Consultora Legislativa e membro do Comitê pela Promoção da Igualdade de Gênero de Raça do Senado Federal, que teve a contribuição, inclusive, da Adriana na sua fala. A Adriana falou por três minutos. Ela vai dizer: "Eu não falei por três minutos, não, Senador".
Eu convido as senhoras, se puderem, a voltarem para a primeira fila. Nós vamos ter agora a segunda Mesa. Vamos tentar concluir com a segunda Mesa. Por isso, colocamos aqui seis convidados na segunda Mesa.
Eu queria aqui ainda aproveitar - permitam-me as duas - para tirar uma foto. De cada Mesa a gente tira uma foto. (Pausa.)
No final, tiraremos uma foto coletiva. Isto aqui é só das Mesas. Vai sair um livro no final de todo esse trabalho. (Pausa.)
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A SRA. ABIGAIL PEREIRA (Fora do microfone.) - Joana, só deixe eu fazer depois uma live do Senador.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Eu sabia que esse pedido viria.
A SRA. ABIGAIL PEREIRA (Fora do microfone.) - O senhor sabia, não é, Senador querido?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eu fiquei esperando. Se ela não o fizesse, eu o faria também.
Venham cá!
A SRA. ABIGAIL PEREIRA (Fora do microfone.) - Venham, gurias!
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Fora do microfone.) - Venham as duas.
A SRA. ABIGAIL PEREIRA (Fora do microfone.) - Eu só queria ficar ao lado dele.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Isto é coisa de gaúchos e de gaúchas.
A SRA. ABIGAIL PEREIRA (Fora do microfone.) - Não, é pelo reconhecimento de um Senador que teve a sensibilidade de chamar um debate deste, um homem, vejam bem!
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Todas falarão por mais dez minutos ainda nas considerações finais.
Vamos, de imediato, à nossa segunda Mesa.
Convido Geraldini Grace da Fonseca da Justa, Diretora do Departamento de Políticas de Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres. Seja bem-vinda! (Palmas.)
Convido Marcos Vinícius Costa dos Santos, Presidente da Comissão de Direito e Processo Penal da OAB. (Palmas.)
A SRA. GERALDINI GRACE DA FONSECA DA JUSTA (Fora do microfone.) - Posso me sentar ao seu lado?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Deve! Eu estava preocupado porque você não estava vindo. Já cobrei do seu assessor: "Cadê? Cadê?". Ele disse: "Calma, Senador, ela está vindo". É importante o Governo ter aqui a sua representante.
A SRA. GERALDINI GRACE DA FONSECA DA JUSTA (Fora do microfone.) - Desculpe-me pelo atraso.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Chegou aqui em tempo.
O Marcos já foi chamado.
Convido Luciana Grando Bregolin Dytz, Presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais (Anadef). (Palmas.)
Convido Denys Resende, pesquisador do Observatório Racial do Distrito Federal.
Seja bem-vindo, Denys, que esteve aqui uma vez com a gente. (Palmas.)
Convido Jolúzia Andreia Dantas Vieira Batista, assessora técnica do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), que já esteve conosco também algumas vezes, sempre brilhante.
(Palmas.)
Os que voltam é que foram brilhantes. Aqui, nesta Mesa, há diversos que voltaram já, assim como na outra também.
Convido Soraia Mendes, professora e coordenadora do Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (Cladem), que já esteve aqui também diversas vezes. (Palmas.)
Podem se aproximar um pouco mais. Ainda há espaço aqui.
Depois, na hora de cada um falar, pode-se fazer a troca.
Passamos a palavra, de imediato, à Sra. Geraldini Grace da Fonseca da Justa, Diretora do Departamento de Políticas de Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres.
A SRA. GERALDINI GRACE DA FONSECA DA JUSTA (Para expor.) - Bom dia a todos!
É um prazer estar aqui hoje conversando sobre tema de tamanha relevância.
Eu gostaria de fazer algumas considerações a respeito de palavras que já foram ditas pelos meus antecessores.
Primeiramente, eu gostaria de aproveitar, já que estamos numa Casa Legislativa, já que estamos no Senado, para reiterar aquilo que foi dito pela Sra. Roberta Viegas. Existe uma certa proliferação legislativa no que concerne à Lei Maria da Penha. Todos esses projetos de lei são enviados para o Ministério da Mulher, para que o departamento no qual eu trabalho se manifeste ou outros departamentos que tratem de outras áreas. Na Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres, nós estamos divididos em três departamentos: um cuida da dignidade da mulher, outro cuida da promoção econômica, da autonomia econômica, e outro cuida do enfrentamento à violência, que é o que eu dirijo.
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Quando nós recebemos esses projetos de lei, sempre ficamos com uma preocupação no sentido de que eles possam vir a prejudicar o microssistema, porque a proliferação é muito grande. Então, talvez houvesse a necessidade de que as Casas Legislativas tivessem um cuidado muito grande em relação a isso, porque se sabe que nem todo projeto de lei é feito com cuidado, nesse tema a que eu me refiro, que é o que eu realmente estudo todo dia, em relação ao microssistema. Às vezes, ajusta-se a coisa de um lado, e a coisa desequilibra do outro.
Até me fez lembrar um exemplo que aconteceu em uma empresa automobilística de japoneses, onde todos eram muito bons no que faziam, mas não era uma boa equipe. E aí um consertava o freio, o outro consertava o câmbio, o outro consertava o acelerador; eles consertavam separadamente, e, quando a equipe se juntava, o carro só ficava pior. É com esse tipo de coisa que a gente tem que ter atenção, porque a gente não pode ferir o microssistema.
Estamos falando de uma lei que ainda não atingiu o máximo da sua efetividade. Ainda precisamos cuidar disso para que ela possa alcançar o máximo da sua efetividade.
Então, eu gostaria de citar, por exemplo, que indicações e requerimentos parlamentares às vezes são muito bem-vindos, porque às vezes o Parlamentar cria a lei, a lei entra em vigor, e acontece que ela não está no mundo real. Posso citar um exemplo agora, da lei da mulher com deficiência, que alterou a Lei Maria da Penha. É um projeto de lei de autoria da Roseane Estrela, que esteve como Secretária Adjunta da SNPM e atualmente está no GDF como Secretária da Pessoa com Deficiência. Essa alteração legislativa determina que a mulher com deficiência seja identificada, por exemplo, no registro de uma ocorrência, em um órgão público. Isso é necessário para que estatísticas maravilhosas como essas feitas pelo observatório sejam feitas, mas, se esse dado não for inserido no sistema, a estatística não vai ser feita. Agora, é preciso que isso seja provocado. Então, de parte das Casas Legislativas, as indicações e os requerimentos parlamentares são um bom instrumento, porque, quando é provocado, o órgão é obrigado a se manifestar. Ele pode se manifestar dizendo "olha, ainda não fizemos", mas vai ficar aquela notícia: a gente precisa dar atenção a isso aqui.
Essa é uma observação que eu queria fazer com relação à fala da Sra. Roberta Viegas, que foi muito boa, diga-se de passagem. Depois eu vou pegar toda essa estatística, essa sua apresentação também, porque me interessa muito.
Com relação ao vídeo da Dra. Selma, que ela mostrou, ele é maravilhoso. É impressionante pensar que ainda existe gente com muito poder que pensa que a violência contra a mulher não existe. A violência contra a mulher existe, é real e é assustadora.
Com relação às Casas-Abrigo citadas pela Sra. Abigail Pereira, eu gostaria de dizer que, de acordo com a estatística do IBGE, no ano de 2018 foram identificadas 134 casas. As Casas-Abrigo geram alguns problemas para nós, porque elas são sigilosas, e, pelo fato de serem sigilosas, o endereço precisa estar sempre mudando. Isso dificulta a questão da emenda parlamentar também. Só se fosse uma emenda de custeio, porque é um aluguel e fica muito vinculado à questão municipal ou estadual. Isso é uma preocupação muito forte de minha parte, sobretudo, porque eu considero a Casa-Abrigo um equipamento indispensável para se preservar a vida de mulheres - não só as Casas-Abrigo, mas também as casas de passagem. Por exemplo, hoje, no Rio de Janeiro, não existe casa de passagem. Os juízes, que são quem encaminham as mulheres...É diferente, Dra. Selma, do que acontece aqui entre nós. Nós mandamos as mulheres lá pelas delegacias. Lá no Rio de Janeiro é diferente: as mulheres são encaminhadas pelo Poder Judiciário, e o Judiciário lá se queixa demais pelo fato de que não existe uma casa de passagem, existe somente uma Casa-Abrigo. Os juízes colocam toda as mulheres lá. Então, se a mulher é drogadita, é psicótica, é vítima de violência e está em situação de vulnerabilidade, ela vai entrar na Casa-Abrigo. Só que ela não tem o perfil que a gente está discutindo aqui agora. Ela sai da casa com três, quatro dias. O endereço está queimado. Não tem mais como manter o sigilo daquela casa. Mas é comum que os Estados estejam vivendo uma dificuldade econômica muito grande e, portanto, a Casa-Abrigo continua naquele endereço, com um endereço que já não é mais sigiloso.
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É difícil articular isso porque os próprios Parlamentares têm interesse em projetos como a Casa da Mulher Brasileira, que são projetos grandiosos. É normal, isso é normal no mundo político. Não estou dizendo que é uma coisa que não deva ser respeitada. O fato é que ninguém vai ter tanto interesse em uma Casa-Abrigo, que é uma coisa que é escondida. O Parlamentar não vai poder estar lá na hora de inaugurar, não vai poder haver uma foto. Então, é natural que a emenda parlamentar caminhe no sentido de uma obra que ganhe mais visibilidade. Isso é natural. Mas é um fato, e isso precisa ser dito.
A Casa da Mulher Brasileira, por exemplo, tem atualmente... Deixe eu ver aqui os dados, direitinho. Foram apresentadas, na LOA de 2020, 20 emendas de Ação 14XS, que se destinam à construção e à implantação de Casas da Mulher Brasileira, ou seja, no ano de 2020 estarão acontecendo 20 Casas da Mulher Brasileira. O projeto não está parado. Muito pelo contrário, a gente trabalha muito nas Casas da Mulher Brasileira.
A SRA. ABIGAIL PEREIRA (Fora do microfone.) - Não.
A SRA. GERALDINI GRACE DA FONSECA DA JUSTA (Para expor.) - É verdade, D. Abigail. É sério! Eu estou trabalhando muitíssimo nas casas. E me surpreende quando a senhora fala que não está acontecendo esse projeto. Ele está acontecendo, e está acontecendo firmemente, além dos contratos de repasse já celebrados no ano de 2019 com Belo Horizonte, com Cariacica e com o interior do Ceará, cujas construções vão se iniciar agora, porque já foram assinados os termos de adesão.
Então, a questão da Casa da Mulher Brasileira é um projeto que é muito caro para nós - digo "caro" no sentido afetivo mesmo -, porque é um projeto que é muito bonito, porque ele parte da integração de todos os serviços. Então, aquilo que a mulher fazia em lugares separados, ela agora faz em um só lugar. É uma ideia que veio do Governo passado, e nós reconhecemos o tanto que ela é proveitosa, positiva, inteligente, humana; por isso, estamos dando continuidade. Jamais se pensou em parar com a Casa da Mulher Brasileira, jamais! Existe uma coordenação dentro do departamento que trata somente do Programa Mulher Segura e Protegida, cujo maior trabalho, maior esforço, está justamente destinado às Casas da Mulher Brasileira.
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Eu gostaria de dizer que minha mãe é gaúcha, e que, portanto, a presença de vocês aqui, gaúchos, me enche de responsabilidade e de carinho. E gostaria de dizer que os índices de feminicídio no Rio Grande do Sul, em 2019, foram de 100 consumados e 359 tentados e que esses índices ainda não refletem a realidade.
Apesar de tudo, a Lei Maria da Penha foi alterada, essa qualificadora foi alterada em 2015. Em 2017, foi instituída uma diretriz de investigação para o crime de feminicídio. Essa diretriz foi feita, foi construída, com o apoio da ONU Mulheres, e ela vem sendo adotada paulatinamente pelas polícias. Eu sei, com certeza, que a polícia do Rio Grande do Sul é muito cautelosa em relação a isso, e ela estabelece esse protocolo de investigação desde o início. Desde o momento em que é encontrada uma mulher vítima de morte violenta, a polícia do Rio Grande do Sul inicia o seu protocolo. Mas a polícia do Rio Grande do Sul, diferentemente, por exemplo, da polícia do Distrito Federal, não capitula como feminicídio logo na origem. Ela deixa para capitular ao final, quando ela já está certa de que aquele crime realmente é um feminicídio. É uma forma de pensar. Cada polícia pensa à sua maneira, sendo que a maioria das polícias pensa como a polícia do Rio Grande do Sul. Agora, deixo aqui um recado: e se a polícia do Rio Grande do Sul fizesse como faz a polícia do Distrito Federal, que capitula o crime como feminicídio logo na origem? O dado seria só esse? Não seria, ou seja, esse dado, provavelmente, é ainda menor, porque existem inquéritos que ainda não findaram e que, portanto, vão gerar o aumento dessa estatística que eu estou dizendo agora, que cabe ao ano de 2019, porque provavelmente feminicídios que aconteceram no ano de 2019 ainda não encerraram as suas investigações, ou seja, esse índice ainda vai aumentar.
Deixe-me ver o que mais eu gostaria de dizer.
Com relação à questão da educação, estamos agora com o projeto Maria da Penha Vai à Escola, que é originário do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, atualmente na Conjur do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, para análise, ou seja, o Ministério está preocupado com a prevenção primária e é, de fato, uma coisa que precisa que acontecer porque não basta alcançar essas mulheres só na prevenção terciária. Ou a gente trabalha a prevenção primária ou essa história não vai passar. A gente sabe que todo mundo que está aqui ainda não vai ver aquilo que a gente tem se proposto a fazer, todo o nosso trabalho, todo o nosso esforço. Talvez nossos netos consigam ver os reflexos de tudo que nós estamos fazendo aqui agora, porque isso, de fato, é uma mudança, uma mudança de cultura, uma mudança de atitude. Isso não vai acontecer da noite para o dia.
Com relação a tudo que foi dito, acho que eu já consegui pontuar, pelo menos aquilo que eu escutei. Peço perdão por ter chegado atrasada. É que tive um problema sério no departamento.
Eu gostaria também de dizer que o departamento está agora trabalhando no plano nacional de enfrentamento ao feminicídio e que esse plano tem ações transversais obviamente. Tudo que se refere à mulher tem ações transversais. Para alcançar essas ações transversais, vamos precisar do apoio de outros ministérios, de outras instituições e também das Casas Legislativas. Então, em breve, principalmente com você, Sra. Roberta, teremos muito o que conversar para colocar isso na prática, porque, de fato, vencer o feminicídio nunca será ação de um só. Será ação de toda uma sociedade e, sobretudo, do envolvimento da rede, o que também foi dito aqui hoje. Foi falado sobre a rede. A rede é fundamental para que a gente possa enfrentar o feminicídio - uma rede coesa, uma rede que troque muito, troque informações, troque ações, e que não tenha problema de ajudar outro colega, outra instituição. Isso, de vez em quando, acontece no mundo das vaidades, e não dá para acontecer quando se trata de morte de mulheres. Quando morre uma mulher, a família inteira fica prejudicada. Não é aquela mulher que desaparece. Estão os filhos, está até o próprio agressor, estão todos os parentes. E é preciso ressaltar que os filhos do feminicídio ou vão para uma instituição, porque o pai comete suicídio, ou vão morar com a mãe do agressor. Isso, por si só, já gera sequelas insolúveis para essas crianças.
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Acho que é isso que eu queria dizer. Se alguém tiver alguma pergunta, estou à disposição. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Geraldini Grace da Fonseca da Justa, Diretora do Departamento de Políticas de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres. De forma resumida, procurou responder e, ao mesmo tempo, apresentar o trabalho da Secretaria.
Vamos em frente. Marcos Vinícius Costa dos Santos, Presidente da Comissão de Direito e Processo Penal da OAB - Subseção de Samambaia e Recanto das Emas - e assessor jurídico na Defensoria Pública do DF.
O SR. MARCOS VINÍCIUS COSTA DOS SANTOS (Para expor.) - Obrigado pela palavra, Senador. É extremamente gratificante e também é uma honra estar aqui diante de tantas autoridades e de pessoas que estão extremamente preocupadas em dirimir e, de certa forma, até extinguir a violência contra a mulher.
Esse combate à violência contra a mulher é uma luta de toda a sociedade. É uma luta de todos. Isso está positivado na nossa Constituição Federal. A Constituição Federal, no art. 226, §8º, diz que cabe ao Estado elaborar mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar. Mas antes disso, é muito importante destacar aqui as falas grandiosas e importantes sobre essa temática, principalmente no que tange à apresentação dos dados e estatísticas sobre esse assunto.
Hoje acredito que a sociedade, como um todo, tem se preocupado cada vez mais com o combate à violência doméstica e familiar. Isso se deve, infelizmente, ao número de casos que têm acontecido com maior frequência sobre essa temática. Infelizmente, o nosso noticiário diariamente está apresentado situações de violência doméstica e familiar. Mas aí cabe a pergunta: será que apenas com a elaboração de leis, será que apenas com a ação legislativa, nós conseguiremos resolver esse problema? Certamente, não, porque deve haver uma ação conjunta, uma ação integrada em todos os aspectos. A sociedade civil deve estar presente nessa busca. Eu, atualmente, no âmbito de atuação profissional, em palestras, cursos, seminários, tenho visto que muitas vezes as pessoas ainda têm dúvidas acerca do que consiste a violência doméstica e familiar, de quais são as formas de violência, se há apenas a violência física, se há apenas a violência sexual. Isso me traz um sentimento bastante difícil, porque é certo que a Lei Maria da Penha não prevê apenas a violência física e a violência sexual; há também a violência moral e a violência psicológica. Esses ensinamentos devem ser amplamente divulgados em toda a sociedade. Nós devemos saber que a mulher sofre, sim, muitas vezes, violência moral; que ela sofre, sim, diariamente, violência psicológica. Isso é muito grave.
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Para que possamos resolver um problema, é preciso analisar a origem de todo ele, assim como é imprescindível que tenhamos um estudo detalhado e que possamos, principalmente, compartilhar as informações perante toda a sociedade. Isso se dá na escola, isso pode acontecer em seminários, palestras. E digo mais: acredito que todo esse debate deveria estar presente diariamente na rotina de cada cidadão brasileiro. O nosso País, em que pese a Lei Maria da Penha ser considerada uma das mais imponentes, mundialmente, sobre o assunto, ainda apresenta números alarmantes sobre essa temática.
Como tem acontecido aqui no Distrito Federal... Eu sou especialista em Direito Público. Meu trabalho de conclusão foi sobre a aplicação da Lei Maria da Penha no âmbito do Distrito Federal, e fiquei realmente muito assustado com a precariedade, de certa forma, de alguns sistemas de acolhimento à mulher, assim como com o excedente número de casos e de situações.
Entre as medidas que devemos tomar, a principal, e que foi dita muito bem pelas demais colegas que estiveram aqui, é a instrução da população. Nós precisamos capacitar não só o aluno. Nós precisamos capacitar os agentes públicos. Por que não incluirmos nos currículos escolares universitários e também nos certames públicos, a obrigatoriedade de se compreender, com afinco, os principais aspectos sobre a violência doméstica e familiar?
Se queremos combater um problema, é importante que saibamos e que compartilhemos também, com toda a sociedade, o que significa a violência doméstica e familiar, de que forma vamos combatê-la e quais são os mecanismos de atuação. É certo que atualmente isso já tem sido veiculado, mas precisamos multiplicar. O combate à violência doméstica e familiar não é algo que vai ser resolvido apenas com a lei. A Lei Maria da Penha nos diz que deve haver uma ação integrada. Políticas públicas devem ser elaboradas e praticadas. Nós devemos trabalhar com a realidade, e isso é extremamente importante.
As estatísticas aqui apresentadas pela Sra. Roberta, pela Sra. Selma, pela Sra. Geraldini, que há pouco falou, são assustadoras, e nós precisamos combater os mecanismos que acarretam a violência doméstica e familiar.
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No ano passado, ou melhor, há pouco tempo, nós tivemos nove - repito, nove - legislações que trataram acerca da violência doméstica e familiar. Essas legislações serão suficientes para resolver todos os problemas da nossa sociedade no que diz respeito a esse problema? Apenas a aplicação dessa lei será possível? Penso que não. E aqui faço um compromisso - e peço que todos os senhores e as senhoras façam também -, para que juntos possamos combater a violência doméstica e familiar.
Essa não é uma briga, uma luta só das mulheres, é de nós homens, porque, se a situação sócio-histórico-cultural aqui do nosso País fez com que os números fossem crescentes - e ainda existe esse tipo de violência -, isso se deve a cada um de nós. Então, nós devemos combater, nós devemos ser firmes nessa luta, nessa tarefa, que é árdua, porém não é impossível.
A nossa briga, a nossa luta da OAB/Distrito Federal é por capacitar cada vez mais os nossos colegas operadores do Direito e para que possamos também disseminar cada vez mais os aspectos relacionados à violência doméstica e familiar e as medidas que são cabíveis para a extinção, para que possamos tirar da nossa sociedade essa prática abominável, deplorável, que é violência contra a mulher
E repito: o que me assusta atualmente ainda é a falta de informação das pessoas acerca do que seria uma violência moral, do que é uma violência psicológica e a restrição, o pensamento de que a mulher apenas sofre violência física. Não, a mulher não sofre só esse tipo de violência; ela sofre violência moral, psicológica, sexual, patrimonial. Como iremos resolver esse problema?
Aqui está uma proposta. Vamos instruir cada vez mais a população. Vamos trabalhar com a prevenção primária, capacitando todos e todas acerca dessa problemática.
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS VINÍCIUS COSTA DOS SANTOS (Para expor.) - E, para finalizar este momento importante que me foi concedido aqui de luta, de apresentação de argumentos para que possamos combater a violência doméstica e familiar, é importante ratificar que a violência contra a mulher é uma prática inaceitável em toda a sociedade, seja ela física, material, psicológica ou sexual.
Todos nós somos responsáveis por essa luta, todos nós devemos trabalhar em conjunto. Deve haver uma ação articulada e integrada de todos aqueles que fazem parte da sociedade para que possamos resolver esse problema.
Ajudem a interromper o ciclo de violência doméstica. Mulheres agredidas, não se calem, procurem ajuda. A sociedade, como um todo, está disposta, sim, a combater a prática de violência doméstica e familiar.
E, para finalizar, o combate a esse tipo de violência tem que ser multiplicado, tem que ser ensinado, clarificado, para que todos saibamos quais são os nossos papéis e como devemos agir se conhecermos alguém que está sofrendo esse tipo de violência. Eventualmente pode ser que você mulher não seja vítima, mas certamente você conhecerá alguém que já passou por esse tipo de problema e, sendo devidamente instruída, saberá como encaminhar essa pessoa para os órgãos competentes, saberá como resolver essa situação.
O meu muito obrigado.
Tenham todos um excelente dia. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dr. Marcos Vinícius Costa dos Santos, Presidente da Comissão de Direitos e Processo Penal da OAB, de uma subseção.
De imediato, Luciana Grando Bregolin Dytz, Presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais (Anadef).
A SRA. LUCIANA GRANDO BREGOLIN DYTZ (Para expor.) - Bom dia a todos.
Eu cumprimento a todos da Mesa na pessoa do Senador Paim e agradeço novamente a oportunidade de abrir esse debate importantíssimo para a sociedade brasileira. É um Senador que tem sido sensível a todas as causas mais caras e importantes de nossa sociedade. Obrigada.
Vamos seguir para...
Eu queria dizer que eu preparei um material escrito, como de costume - não é, Senador? -, porque a gente estuda o assunto antes de falar...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Você sempre foi bem no improviso ou no material documentado que está apresentando, cuja cópia vai deixar conosco.
A SRA. LUCIANA GRANDO BREGOLIN DYTZ (Para expor.) - Obrigada. Vou sim, vou deixar sim.
Eu queria também agradecer ao Grupo de Trabalho Mulheres da Defensoria Pública da União, que foi quem fez esse estudo que eu vou passar aqui para vocês, e especialmente à Defensora Pública Federal no Rio de Janeiro Maria Cecilia Lessa, que fez um belo apanhado da situação.
Eu queria agradecer a todos vocês pela presença aqui também e aos palestrantes pelas belas palavras.
A Defensoria da União, da qual eu faço parte, como expressão do instrumento do regime democrático, tem como missão institucional a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa judicial e extrajudicial dos direitos individuais e coletivos de forma integral e gratuita aos necessitados. É o que diz a Constituição, essa é a nossa função institucional. Então, nessa linha, a Defensoria da União tem legitimidade para atuar em defesa das mulheres como um grupo vulnerável.
Coletivamente, a ação da DPU em favor das mulheres se dá através do Grupo de Trabalho Mulheres. Nós temos as atuações individuais das pessoas que vêm aos nossos balcões, ao nosso atendimento e nós temos essa atuação coletiva através do GT Mulheres.
O GT Mulheres é um grupo de trabalho composto por defensores públicos especializados que, cada dia mais, fazem eventos, debates, fazem trabalho de campo. Qual é a função do grupo de trabalho na Defensoria da União? A gente atua no reconhecimento e defesa dos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais das mulheres; monitoramos ações de discriminação e violação dos direitos das mulheres; disseminamos o conhecimento do direito universal à educação, à saúde e à proteção previdenciária às mulheres; estimulamos a autonomia econômica da mulher e promovemos a igualdade no mundo do trabalho em todas as suas acepções; fortalecemos a participação das mulheres nos espaços de poder e de decisão; e atuamos no enfrentamento e combate à violência contra a mulher, entre outras medidas destinadas a coibir a violação de direitos. Essa é a portaria que instituiu o Grupo de Trabalho Mulheres, Portaria nº 200, de 2018. Então, isso revela a preocupação da Defensoria da União nessa temática.
Numa análise apressada, a gente pode perguntar como as mulheres, que são maioria da população brasileira, podem ser consideradas como grupo vulnerável. Muitas vezes a gente se pergunta: "Como é minoria, como essa pessoa é minoria, se elas são maioria?". Minoria não é uma questão de número, vulnerabilidade não é uma questão de número, é uma questão de acesso a direitos, de igualdade. Então, as pessoas muitas vezes confundem o termo minoria: minoria não é número.
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Para compreender a necessidade dessa atenção especial às mulheres, basta pensar nas incontáveis situações de violação de direitos e violências de que são vítimas cotidianamente. Então, aqui vou fazer um levantamento, um apanhado sobre o tipo de violência que as mulheres sofrem, as diversas formas de violência que temos na situação das mulheres.
A violência pode ser física - desde a ameaça de agressão com facas ou armas ou ações como empurrões, socos, chutes, até a violência mais letal, o feminicídio. Também pode ser a violência psicológica, que é uma outra forma, em todas as situações em que as mulheres são agredidas verbalmente, humilhadas ou silenciadas. As mulheres reiteradamente são chamadas de loucas, burras, bruxas e, com sua saúde mental em frangalhos, lotam as unidades do SUS em busca de tratamento para a dor psíquica, tão grave e real quanto as escoriações, arranhões ou ferimentos.
A violência doméstica e familiar deixa inúmeras sequelas como essas, mas há também a violência econômica, que já foi dita aqui também, que atinge de forma especial as mulheres, quando, para a realização do mesmo trabalho, recebem salários menores que os homens ou quando, por serem mulheres em idade fértil, não são contratadas por empregadores que não querem reconhecer seus direitos à licença-maternidade. Também a gente vê violência econômica quando lhes são reservados os subempregos de baixa remuneração.
Não para por aí também a violência, não, viu? Temos também a violência obstétrica. Ela é uma dura realidade para as mulheres em nosso País, tendo negado seu direito a um atendimento digno e humanizado no parto ou mesmo nas situações de abortamento. A violência sexual é outra profunda violação à dignidade das mulheres como pessoa. Poderíamos citar outras hipóteses de violências práticas para com as mulheres.
Eu fiz esse apanhado para percebermos o que é essa vulnerabilidade, o que é essa minoria, por que a gente precisa dessas proteções e desse trabalho especial, mas, para melhor aproveitar o tempo que a gente tem aqui, a gente vai pensar como esta Casa pode atuar em defesa das mulheres. Então, foi feito um estudo pelo grupo de trabalho, nesse final de semana, sobre o que a gente viu aqui na Casa.
Então, primeiro, a gente vai falar dos avanços. A gente avançou muito, sim, no Legislativo na questão do tema. Tivemos, em 2013, a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito que foi instaurada com a finalidade de investigar a violência contra a mulher no Brasil e apurar denúncias de omissão por parte do Poder Público em relação à aplicação de instrumentos instituídos em lei para proteger as mulheres em situação de violência doméstica. No seu relatório final, em mais de cem páginas, em 2013, traçou-se um detalhado perfil da violência contra as mulheres no Brasil.
Também há o trabalho legislativo que resultou na já falada aqui Lei Maria da Penha, a Lei 11.340, de 2006, para enfrentamento da violência doméstica e familiar. Tivemos a Lei do Feminicídio, em 2015, que alterou o Código Penal para penalizar mais gravemente assassinatos de mulheres pela sua condição de ser mulher. Muitas vezes as pessoas até perguntam: "Como feminicídio? Os homens são assassinados". Aqui as pessoas confundem: o feminicídio é um tipo de assassinato de mulher pela sua condição de ser mulher. Claro que, quando ela sofre um latrocínio, ela não entra na questão de feminicídio.
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Para enfrentar as situações de violência obstétrica, temos a Lei 11.108, de 2005, que garante às parturientes o direito à presença de acompanhante durante o trabalho de parto e pós-parto. E também temos o a Lei 11.634, que dispõe sobre o direito da gestante ao conhecimento...
(Soa a campainha.)
A SRA. LUCIANA GRANDO BREGOLIN DYTZ (Para expor.) - ... e à vinculação à maternidade onde receberá assistência no âmbito do SUS. Ela tem direito também a ter conhecimento.
Daí também mais recentemente, houve outros projetos, que é a lei que torna obrigatório informar se a mulher vítima de violência doméstica tem deficiência ou se adquiriu deficiência após a agressão; a Lei 13.880, que prevê a apreensão de arma de fogo sob posse de agressor em caso de violências domésticas; temos a Lei 13.882, que garante a matrícula dos dependentes da mulher vítima de violência doméstica em instituição de educação básica mais próxima; temos a Lei 13.894, que assegura assistência jurídica às vítimas de violência doméstica para pedido de divórcio, separação, anulação de casamento e dissolução de união estável. Esses são alguns exemplos de como a Casa tem feito o enfrentamento, mas é preciso avançar.
O enfrentamento à violência contra as mulheres precisa ser intensificado com investimento público - isso já foi dito aqui. Para isso, merece atenção o Projeto de Lei nº 123, de 2019, que está hoje na Câmara dos Deputados, que altera a Lei 10.201, de 2001, para incluir os programas de combate e prevenção de violência contra a mulher como modalidade de projeto apoiado pelo Fundo Nacional de Segurança Pública, e altera a Lei 11.340, de 2006, autorizando o uso de recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública em ações envolvendo prevenção e combate à violência contra mulher. Esse fundo está sob a mira da PEC 187, a PEC dos fundos, mas, na discussão que houve, na semana passada, na CCJ, os Senadores conseguiram manter alguns fundos e, entre eles, esse - não é, Senador? - foi mantido.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Foi mantido.
A SRA. LUCIANA GRANDO BREGOLIN DYTZ (Para expor.) - A prevenção em educação e direitos...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Combate às drogas...
A SRA. LUCIANA GRANDO BREGOLIN DYTZ (Para expor.) - Ciência e tecnologia...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - E o pessoal da cultura está me cobrando tanto, o Relator disse para mim que vai acatar. Vamos aguardar.
A SRA. LUCIANA GRANDO BREGOLIN DYTZ (Para expor.) - É fundamental, não é? É fundamental essa questão.
Esse Fundo Nacional de Segurança Pública é fundamental, justamente vocês estão vendo: quando a gente começa a analisar os projetos que tentam levar valores para o combate à violência contra as mulheres, esse fundo é um fundo fundamental, e a gente pede que, nesses projetos, vocês possam acompanhar para ver se resolvem um pouco essa situação, que é uma calamidade no Brasil.
A prevenção em educação e direitos deve ser intensificada. Daí temos o Projeto de Lei 6.010, de 2013, que é de autoria da CPMI da violência contra a mulher no Brasil, aquela que eu falei antes, que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação e determina que, entre as orientações que os currículos da educação básica terão de observar, estão a divulgação e a ênfase ao respeito à igualdade de gênero e às minorias na prevenção da violência doméstica - acho que a Roberta deve estar acompanhando nessa linha esse projeto. Há ainda o Projeto de Lei 598, de 2019, que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional para incluir conteúdo sobre a prevenção da violência contra a mulher nos currículos da educação básica. Ambos estão na Câmara dos Deputados.
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A violência obstétrica também é uma dura realidade para a gestante, parturiente. Temos que fazer alguma coisa com relação à violência obstétrica. Temos aqui o Projeto de Lei 7.633, de 2014, que dispõe sobre a humanização da assistência à mulher e ao neonato durante o ciclo gravídico-puerperal, ao qual estão apensados outros projetos afins, que é o 7.633, o 2.693, de 2019. A tramitação desses diversos PLs mostra a relevância do tema e a necessidade de atenção que o Parlamento deve dar a ele.
Também há o projeto de lei que tramita no Senado. A gente tem que destacar que é o PLS 652, de 2015, com a proposta de alteração da CLT e da Lei 8.213, sobre os planos de benefícios da previdência social, para estabelecer a licença-paternidade de 120 dias. Esse projeto foi arquivado ao final da legislatura - art. 332 do Regimento Interno -, mas essa matéria merece muita atenção, pois a paternidade responsável e em paridade de direitos com mulheres no cuidado dos filhos é fundamental para a alteração da cultura de violência que ainda resiste em nossa sociedade.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Ele foi arquivado?
A SRA. LUCIANA GRANDO BREGOLIN DYTZ (Para expor.) - Foi, foi. Está aqui o número, vou deixar...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Para que a gente represente...
A SRA. LUCIANA GRANDO BREGOLIN DYTZ (Para expor.) - Sim, é fundamental.
Então, esses são alguns temas das medidas que podem ser adotadas pela ação consciente da Casa em favor de todas as mulheres brasileiras.
Agora um complemento, depois de a gente falar de todas essas questões legislativas, a Defensoria tem... Para nós, a política de proteção das mulheres contra a violência deve dar ênfase à educação em direitos e prevenção.
Tramitam, nestas duas Casas, diversos projetos de lei que preveem endurecimento da repressão penal, mas destaco que não é suficiente o incremento de penas para os crimes de violência contra a mulher. Não é suficiente. O Direito Penal do Inimigo, que está em voga entre nós, traz diversos riscos aos direitos e garantias fundamentais do indivíduo, como prisões preventivas com excesso de prazo, interceptações telefônicas sem prazo, antecipação da punição com a prisão antes do trânsito em julgado da condenação. Note-se ainda uma desproporção entre as penas e a conduta lesiva com a aprovação de leis especialmente severas, que acabam por definir uma clientela para esse sistema de Justiça penal - população mais pobre, em regra -, que se destina mais ao controle social da população do que à reprimenda individualizada pela infração penal.
A Defensoria Pública é contrária ao Direito Penal do Inimigo. Reiteramos que o Direito Penal é ultima ratio e somente deve intervir na sociedade quando outras políticas públicas não são possíveis ou suficientes.
No caso da violência contra as mulheres, a ênfase precisa ser na educação das crianças e jovens pela equidade de gênero, nas medidas de prevenção, nas estruturas de proteção às mulheres - como foi falado aqui das casas -, que permitam a rápida intervenção dos agentes estatais nos primeiros sinais de violência.
E esse é o apelo da DPU nesta audiência pública.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Luciana.
Foi Luciana Grando Bregolin Dytz, Presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais (Anadef), que deixou por escrito aqui a sua contribuição a esta Comissão.
De imediato, Denys Resende, Pesquisador do Observatório Racial do DF.
O SR. DENYS RESENDE (Para expor.) - Bom dia a todas e todos.
Eu queria agradecer pelo convite do Senador Paim, por estar na CDH novamente. É uma honra estar numa Mesa repleta de pessoas que estão fazendo contribuições importantes para a nossa sociedade.
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Eu queria começar com uma fala sobre ontem. Ontem foi um dia de luta, considerado o Dia Internacional das Mulheres. Aqui, no Distrito Federal, ocorreu uma Marcha das Mulheres, e foi muito bonito, muito maravilhoso ver todas as mulheres unidas em favor de uma causa, de uma luta, além de ser um dia de luto.
Porém, essa união não acontece nos outros 364 dias do ano. É muito triste ver a competição entre as mulheres brancas e as mulheres negras. Eu falo isso porque ontem eu observei todas as mulheres unidas em favor de uma mesma causa: as mulheres cis, trans, LGBTQI. Porém, hoje, será que a gente vai ter essa mesma união? A sociedade cria a gente para competir. O ideal é que a gente possa tratar o outro como igual, independentemente do gênero e da raça.
Falando nisso, a gente tem casos aqui, no Distrito Federal, do genocídio da população negra. Gosto sempre de reiterar e utilizar este termo: genocídio da população negra. E as mulheres negras são as que mais sofrem. São elas que movimentam o capitalismo; são elas que geram mais pessoas para trabalharem no proletariado.
Quando a colega Luciana fala de minorias, eu, nas minhas pesquisas, nos artigos, nos livros, não gosto de utilizar o termo "minoria", porque, primeiro, a população negra é a maior parte da população brasileira. Eu gosto de usar o termo "grupos historicamente excluídos", porque a gente sempre foi excluído de tomar as decisões. Então, a gente sempre fica à mercê de uma parcela da sociedade branca, patriarcal, que decide o que é melhor para os demais e para as mulheres. E isso a gente precisa mudar. A gente precisa mudar desde a educação básica ao ensino médio e ao ensino superior, porque, se a gente não mudar isso na base, a nossa sociedade não vai ter uma empatia com o próximo, não vai ter uma solidariedade com o próximo, nem com as mulheres negras.
Um item importante que a gente precisa citar é que a gente teve, aqui, no Distrito Federal, ultimamente, na última pesquisa que eu fiz, 36 casos de feminicídio. O Distrito Federal está em quinto lugar, das 27 unidades da Federação, entre as que têm o maior número de homicídios das mulheres. Porém, aqui, o Distrito Federal é a unidade da Federação que tem o maior número de homicídios e feminicídios de mulheres negras. A gente está em primeiro lugar. Por quê? Porque, muitas das vezes, eu vejo os colegas falarem que têm que denunciar, têm que protestar, têm que fazer isso, têm que fazer aquilo, só que as mulheres negras, em sua maioria, são pessoas de baixa renda, que moram em periferias. Como é que elas vão denunciar? Como é que eu vou ter o mesmo tratamento de uma mulher do Lago Sul, da Asa Sul, do Sudoeste com o de uma mulher da Estrutural, de uma mulher da Cidade Ocidental ou de São Sebastião?
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E, principalmente, a nossa força policial, de certa forma, é repleta de homens cis, héteros, e as mulheres não se sentem acolhidas nesses espaços. Muitas das vezes, quando elas vão fazer denúncias, as denúncias não são registradas, porque os delegados acham que, só porque ela chegou com um olho roxo, ela não foi espancada pelo marido.
Então, eu acho que precisamos mudar esta sociedade, precisamos ajustar algumas coisas para que os nossos filhos, os nossos netos tenham uma sociedade melhor, porque é muito fácil falar que tem que denunciar; porém, em periferias, a mulher não tem condições financeiras para sair da sua residência e ir a uma delegacia de polícia. E quando ela liga no 190, no 197, também ela não é atendida. Só são favorecidas as mulheres brancas e, principalmente, as mulheres de classe média, média-alta.
Um outro exemplo disso é a ausência da descriminalização do aborto. As pessoas não comentam sobre isso. Por quê? Porque as mulheres brancas têm condições financeiras para fazer aborto em clínicas particulares, em que vão ser cobrados R$1 mil, R$5 mil. Será que uma mulher de São Sebastião, negra, mãe de quatro filhos, que sofreu um estupro, está grávida e não quer ter o quinto filho tem condição de fazer esse aborto, ou ela vai entrar na navalha? Ou ela vai morrer sangrando em algum lugar?
Então, a gente tem que trazer alguns dados que refletem a nossa sociedade, e não falar como coach de palco, falar coisas que as pessoas querem ouvir; a gente tem que falar a realidade do que acontece. Então, a maioria das mulheres que morrem no Distrito Federal são mulheres negras e mulheres periféricas. É interessante que a gente tenha esses dados para que a gente possa tentar mudar um pouco esta sociedade.
Aqui, no Distrito Federal, a gente tem 23 leis, se eu não me engano, de combate à violência contra a mulher. Dessas 23 leis, apenas 6 são de prevenção. Então, há algo errado. A gente precisa mudar, inverter essa ordem, porque, se a gente não prevenir, não vai adiantar haver mais espaços em cemitérios, não é?
O Observatório Racial do Distrito Federal faz diversos tipos de pesquisas: pesquisas sobre a igualdade de gênero, igualdade de raça, inclusão no mercado de trabalho, entre outras coisas. E nós observamos que as mulheres negras são sempre o fio da meada, são sempre as prejudicadas. Existe uma faixa que todo mundo conhece: homem branco, mulher branca; homem negro, mulher negra. Então, a gente precisa tentar reverter um pouco esta sociedade, porque somos a maior parte da população, somos grupos historicamente excluídos.
É importante também ressaltar que muitas dessas mulheres movem as economias. Hoje em dia, o povo, a sociedade como um todo, gosta de chamar de empreendedores. As mulheres negras sempre empreenderam: sempre lavaram roupas, venderam Jequiti, Avon, ou qualquer outro tipo de produto - tem um, dois, três, quatro, cinco empregos para sustentar sua família. Hoje em dia, as pessoas gostam de utilizar termos técnicos bonitos que os outros gostam de ouvir e ver. As mulheres negras foram as primeiras empreendedoras do Brasil - quem sabe até do mundo. As mulheres desenvolveram tudo, desde o primeiro algoritmo de computador, até fazer cálculos matemáticos para o homem ir à lua. Então, a gente precisa valorizar as mulheres, principalmente as mulheres negras, o.k., gente?
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Muitos dos nossos colegas citaram dados, estatísticas pontuais e interessantes. Porém, com o meu trabalho de pesquisador, eu quero citar justamente isto, o que acontece: o genocídio da população negra e, principalmente, a exclusão das mulheres negras do mercado de trabalho, porque, se você é negra e periférica, você não tem chance de entrar no mercado de trabalho. Se você é negra, periférica e mãe, aí que você não tem chance. Então, muitas dessas mulheres até omitem o lugar onde residem, quantos filhos têm, porque elas não terão uma outra oportunidade de fazer um processo seletivo que seja.
A nossa sociedade é formada pelo machismo, um patriarcado que fala que é dono da mulher. A gente tem que vê-las como companheiras, como parceiras, como elas são, porque, simplesmente, fechar os olhos para os números crescentes de homicídios no Brasil não vai dar certo, e fechar os olhos para os números alarmantes de violência contra a população negra...
(Soa a campainha.)
O SR. DENYS RESENDE (Para expor.) - ... e contra a população das mulheres negras, aí é que não vai dar certo, gente.
Eu não vou me delongar. Eu só queria ressaltar essas informações.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Só para destacar que você tem mais cinco minutos, mas fique à vontade.
O SR. DENYS RESENDE (Para expor.) - Obrigado, Senador. Eu não quero me delongar, eu quero só citar esses dados que eu falei e falar que a nossa sociedade brasileira, com mais de 200 milhões de habitantes, só existe em razão das mulheres negras; são elas que movem a cultura, o comércio e todas as demais áreas da sociedade. Então, é necessário que a gente as valorize.
Eu não tenho propriedade de fala por eu ser um homem - sou cis, hétero, não tenho propriedade de fala -, mas eu peço encarecidamente para todas as mulheres brancas que estiverem me ouvindo: respeitem as mulheres negras, colaborem com elas, não sejam somente números e não entrem em competições, porque, se vocês virem uma mulher negra em outro cargo, vocês falarão: "Ah, ela foi indicada por alguém, ela não é competente para isso", sendo que a mulher já tem dois pós-doc. As mulheres negras têm capacidade de fazer qualquer coisa que elas quiserem e elas merecem ocupar qualquer cargo em qualquer área que elas quiserem.
Então, eu só peço que vocês tenham um pouco mais de respeito e, principalmente, empatia para com a próxima, porque o que existe hoje, gente, é só competição. Se uma mulher branca vê uma mulher negra ocupando um cargo de liderança, ela faz de tudo para tirar a mulher negra daquele cargo, ela não colabora, ela não se coloca no lugar daquela pessoa, para saber toda a história dela, a ancestralidade dela, para ela estar naquele local. O.k.?
Então, eu peço para todos que estejam me ouvindo respeito para com as mulheres negras e, principalmente, a favor das mulheres negras e periféricas.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem! Muito bem, Denys Resende, pesquisador do Observatório Racial do Distrito Federal. Como homem e negro ele traz esse enfoque com muita força. Não é uma defesa, mas um alerta - não é, Denys? -, pois elas não precisam de defesa. Você fez um alerta sobre o preconceito contra a mulher negra ao longo da sua fala e deu, inclusive, dados, números muito realistas.
Meus cumprimentos, Denys. Jolúzia Andreia Dantas Vieira Batista, Assessora Técnica do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea). Já tivemos também a alegria de recebê-la aqui.
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Quinze minutos com mais cinco. Fique à vontade.
A SRA. JOLÚZIA ANDREIA DANTAS VIEIRA BATISTA (Para expor.) - Ótimo! Olha, é um ótimo tempo!
Quero dizer que é um momento interessante, embora com o Plenário ainda assim, esvaziado, mas estou apostando na audiência desta audiência pública.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Isso! Eu também!
A SRA. JOLÚZIA ANDREIA DANTAS VIEIRA BATISTA (Para expor.) - Acho que é para isso também que a gente precisa fazer uso deste lugar, deste Plenário, desta fala, mas quero deixar já, de pronto, aqui, ao Senador Paulo Paim, que tem sido um grande apoiador das causas dos movimentos sociais e do movimento feminista brasileiro, que estamos abertas à construção de outras audiências.
Gostaria de começar dizendo que foi importante a presença do Governo aqui. Eu acho que esta audiência pode nos render algum bom debate. Eu quero abrir aqui um pouco a minha fala, fazendo alusão ao relatório do acórdão do TCU que foi publicado no final do ano passado. Acho que todas as mulheres que estão nos ouvindo, prestando atenção nesta audiência, precisam anotar esses dados, certo? O acórdão do TCU de 2019, que analisou as contas do Governo até 2018, com referência ao orçamento, avaliou que houve um corte mais ou menos de 80% do que era previsto para a Secretaria de Políticas para as Mulheres, certo? É bom também dizer que, desde 2015, aquele momento da nossa história brasileira em que houve realmente o golpe, que nós reportamos como tal, houve um corte que foi crescente no orçamento destinado a essa área.
Então, acho que aqui, neste momento, já no final da Mesa, é bom que a gente também pode fazer agora uma leitura, inclusive dando os matizes e os nomes, ideologicamente posicionados. É esse o meu papel aqui hoje, inclusive.
Quero dizer que o Governo brasileiro ainda é um signatário de acordos e tal, frequentador das reuniões da ONU, embora, agora, nos últimos períodos, esteja se aliando à pauta conservadora e fundamentalista, inclusive, mas nós temos uma agenda que se chama Agenda da ONU para o Desenvolvimento Sustentável 2030. Nós estamos passando longe do cumprimento daquilo que está colocado lá como empoderamento das mulheres e das meninas.
O que foi dito aqui, por exemplo, em relação a superar a violência e o feminicídio e algumas pessoas aqui - sobretudo na fala da Luciana e do Denys - colocaram, assim como na fala da Abigail e da Roberta? É enfrentar o que nós, no feminismo, chamamos de educação não sexista, promover a igualdade de gênero, combater abuso sexual das meninas, que agora têm sido crescentemente violadas no seio dos lares, da família tradicional brasileira, meninas, de bebês até cinco anos de idade. Então, é com educação não sexista e igualdade de gênero nas escolas.
Mas, como a gente sempre está nessas audiências, a gente teve um momento histórico aqui muito importante, que foi o da Sugestão Legislativa 15, de 2014, um conjunto de seis audiências que aconteceram aqui entre 2016 e 2017 - acho que é isso -, em que a gente teve aqui quase um tribunal inquisitório: metade da Mesa era de conservadores, "pró-vida", entre aspas, e metade progressistas a favor de que as mulheres pudessem ter o direito a decidir sobre suas vidas e seus corpos. E nós sempre perguntávamos como fazer se está sendo cerceada paulatinamente, na sociedade brasileira, a educação sexual, a distribuição de métodos contraceptivos nos postos de saúde, inclusive a noção de planejamento familiar, como nós conquistamos no País, pela ação de feministas sanitaristas? Foi questionado e dito, na CCJ, por um Deputado constitucionalista que não foi reeleito nesta Legislatura - mas eu gosto de falar sempre sobre esse assunto, porque foi o estado da arte de uma bioética que luta contra a nossa decisão - e que presidiu a sessão que qualificou o PL 5.069, que ele não entendia como nós, mulheres, queremos ter direito ao planejamento, à reprodução assistida. "Como é que nós podemos decidir sobre a vida de um outro ser que está por vir? Ter direito reprodutivo?", ele fez esses questionamentos. Eu e mais meia dúzia de pessoas, incluindo as técnicas da ONU, ficamos com os nossos cabelos em pé porque, ou seja, então, não podemos fazer planejamento familiar, também não podemos ter educação igualitária, não podemos ter educação para inclusive permitir que os homens possam chorar em público, que os homens possam ter paternidade responsável.
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Então, estamos falando do que mesmo para o Brasil em 2030? De um Governo que tem, sistematicamente, retirado o orçamento público para enfrentar a violência contra as mulheres, e o Presidente eleito diz que é uma questão de postura, não de recurso, não é orçamento. Inclusive, é preciso dizer que as Deputadas da bancada feminina, no final do ano passado, na CMO, fizeram uma movimentação dramática para colocar mais ou menos em torno de R$1 milhão para enfrentar a violência contra as mulheres, mas a coisa está barrada, está parada por ali.
Então, também queria deixar já uma questão para a técnica do Ministério da Mulher: como é que esse conjunto de políticas que foi dito aqui que está se desenvolvendo, acontecendo vai realmente sair do papel, porque a gente tem visto um decréscimo sistemático do financiamento, e não é à toa?
E agora, dou, assim, o arcabouço de que a leitura dos dados não é neutra - eu faço parte desse campo da sociologia: dados não são neutros; a informação sempre atende a um grupo, a um interesse. Então, veja: nós estamos vivendo uma ofensiva capitalista no mundo, em que o conservadorismo avança a passos largos junto com o fundamentalismo religioso de algumas religiões que pretendem projetos políticos de poder. E isso não é à toa, porque o capitalismo, neste momento, vive a sua fase mais cruel. Além de financeirizar a nossa natureza, como temos visto todos os crimes ambientais, é a precarização total, certo? Então, além de botar precificação em todo esse aparato de que vai virar um comércio do ar puro, da água pura, da praia saudável, do que vai restar de reserva ambiental, ainda com alguma coisa de uma Floresta Amazônica - talvez vá virar uma coisa de alto luxo, de hotéis -, nossas vidas também estão fazendo conta dessa economia, como sempre fizeram, e o feminismo tem conta para isso.
Quero citar aqui um movimento importante do feminismo mundial, chamado Marcha Mundial das Mulheres, que, junto com a articulação de mulheres brasileiras, nós sempre fizemos conta com relação ao PIB. Sempre dissemos que o trabalho da reprodução social sociologicamente colocado no cuidado da casa, de quem alimenta, de quem lava roupa, de quem limpa, coisa que as mulheres negras fazem historicamente nas periferias, sem nenhum aparato de creche, nem de saneamento básico, nem de água, carregando lata de água na cabeça, esse trabalho é o que sustenta a sociedade e sempre gerou riqueza. Houve um período em que as economias latino-americanas e da América Central levavam, no trabalho precarizado, invisível, no tráfico de mulheres, mulheres para trabalhar na Europa. Agora, esse movimento acabou porque o capitalismo está em crise. Então, cada um está segurando o seu mercado, inclusive o mercado não pago, o trabalho explorado, precarizado. Então, veja bem, com tudo isso, hoje, a gente entende por que existe - depois que houve uma reforma da previdência que tirou todos os direitos basicamente e estamos vivendo um processo de estrangulamento do Sistema Único de Saúde, com educação sugerida para ser feita em casa, a melhor educação vai ser paga, em escolas privadas... E nós, mulheres, as mulheres de periferia que sustentam essa economia, todo esse aparato do poder que reconhecemos, conformadas em famílias heteronormativas, reprodutivas, cuidadoras, somos essa família que interessa para esse modelo, neste momento que estamos vivendo no capitalismo, certo? Porque uma família muito complexa, de duas mulheres, de dois homens, com criança para botar em creche, educação especial, todo um aparato jurídico para poder ter o seu direito realizado, ou famílias de mulheres sozinhas, não estão interessando, porque, se você está vivendo num Estado mínimo, você tem que economizar. Então, você tem que ter uma família que dê um suporte para essa sociedade precarizada. E um suporte desses é a família que tem o pai de família, o chefe da família e a mulher, contida naquele desenho doméstico familiar, tomando conta da família dela e do entorno, porque, se não há saúde, não há creche, num sistema de previdência e de assistência social completamente precarizado, as mulheres estão sendo de novo empurradas a fazer arranjos coletivos de sobrevivência comunitária, completamente ausentes, passando longe do Estado.
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Essa também vai ser a nossa alegria porque, graças à força das mulheres - e a vida é imperativa -, nós vamos viver de novo uma volta ao século XVIII, XIX, com esses arranjos comunitários de autocuidado e autoajuda. Obviamente, agora, num outro momento da nossa história, porque ainda estamos passando por ainda regimes democráticos ou pelo menos, numa memória não muito longe, teremos lembrança do que foi viver num sistema democrático, com um mínimo de direitos.
(Soa a campainha.)
A SRA. JOLÚZIA ANDREIA DANTAS VIEIRA BATISTA (Para expor.) - Então, eu acho que essa é a esperança que nós temos em relação a esse desmonte que a gente está vendo, desse corte orçamentário de 80% desde 2015, pelo qual os 180 não receberam um centavo, em 2019, gente. Então, a gente vai denunciar mesmo para quem?
São perguntas importantes.
Isso sem falar no machismo total e no racismo dos operadores da ponta do serviço que, às vezes, revitimizam muito as mulheres, mandam-nas de volta para casa, mandam-nas conversar com o pastor, mandam-nas se ajustar com o seu companheiro. A gente vive numa sociedade de dominação patriarcal mesmo. E eu vou dizer: muitos homens estão realmente matando suas esposas, suas companheiras, suas ex-mulheres porque realmente não estão aguentando ouvir um "não".
E o feminismo no Brasil e no mundo sempre defendeu que os homens também tivessem uma educação que os libertassem dessa amarra, dessa couraça que é o machismo. Homem pode chorar, gente, pode tomar conta de filho também e pode superar essa coisa aí que se coloca nos lares que se reflete no abuso sexual de meninas, porque os homens acham, tanto numa capital como no interior do Brasil, num recanto, que as crianças, que as meninas são de sua propriedade. Isso é uma coisa impressionante, mas que acontece, certo? Há casamento infantil em Santa Catarina...
Então, assim, há muita coisa para ser feita. É um desafio enorme, estamos aqui nadando numa contracorrente, lutando contra o conservadorismo, que preconiza um tipo de família, mas, mesmo assim, para essa família, não se tem dado o devido apoio que deveria ocorrer, ou seja, pelo menos o orçamento aqui para enfrentar o feminicídio, a violência contra a mulher; delegacias e equipamentos devidamente organizados para receber; educação, campanhas televisivas, porque nunca mais ninguém viu uma campanha no Brasil educativa para nada, não é? Desapareceu tudo.
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Então, é isso.
Eu quero agradecer este momento.
E estamos para o debate. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Jolúzia Andreia Dantas Vieira Batista, Assessora Técnica do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea). Meus cumprimentos pela forma ampla como colocou o seu ponto de vista, estando aberta ao debate.
Soraia Mendes, Professora-Coordenadora do Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (Cladem).
A SRA. SORAIA MENDES (Para expor.) - Bom dia a todas. Bom dia a todos.
Senador Paulo Paim, mais uma vez, é um prazer, é uma honra estar aqui fazendo parte de uma audiência pública das tantas audiências públicas que o senhor já fez questão de chamar para a discussão das questões das mulheres. Muito especialmente quero lhe agradecer, neste momento, a possibilidade de nós termos aqui uma Mesa de diálogo, tendo em vista uma representante aqui do Ministério da Família e dos Direitos Humanos.
Que coisa boa é a possibilidade do diálogo! Que coisa boa é a democracia, embora alguns marchem às ruas querendo acabar com ela.
Então, façamos aqui um diálogo a partir de algumas referências que me parecem fundamentais.
Antes de mais nada, quero fazer uma saudação muito especial à Abigail, porque também sou gaúcha, vivo nesta terra há 14 anos, mas sou filha do Rio Grande do Sul, com muita honra filha de um sindicalista que militou junto com o Senador Paulo Paim na fundação da Central Única dos Trabalhadores. Portanto, faço muita questão de saudar todas aquelas mulheres que vêm do nosso Estado e que detêm a verve para fazer aqueles que são os enfrentamentos que precisamos.
Quero fazer uma saudação muito especial à minha companheira Jolúzia, porque Jolúzia representa aqui o Centro Feminista, o Cfemea, uma instituição que tem, como o Cladem, três décadas de existência na luta feminista deste País. E, quando nós estamos falando aqui, não é, Jolúzia?, cada uma em uma ponta, nós estamos falando aqui mais do que de um movimento de mulheres, estamos falando de um movimento feminista.
E falo com muita honra pelo Cladem, como movimento feminista, porque o Comitê para a América Latina e o Caribe de Defesa dos Direitos da Mulher foi a organização que levou o caso Maria da Penha à Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Fomos nós, junto com o Cejil, que fizemos com que se impulsionasse um movimento lá, externo, mas que está na base daquelas que são as lutas feministas no nosso País.
Portanto, façamos aqui uma referência - e faço eu aqui uma referência à Abigail também - à Jolúzia, muito especificamente, porque representa aqui a luta das mulheres e das mulheres feministas deste País.
Por outro lado, também quero fazer uma saudação aos meus colegas e às minhas colegas da Ordem dos Advogados do Brasil, porque sou Presidenta da Comissão de Direitos Humanos e Consultora da Comissão Nacional de Direitos Humanos da OAB.
E peço desculpas também pelas inúmeras vezes em que precisei sair desta Mesa, Senador, porque recebi vários telefonemas aqui de uma colega que, recentemente, agora, há minutos, foi detida aqui no acampamento, na Marcha de Mulheres do MST. Um ônibus acabou sendo interceptado pela Polícia Federal, e a colega, conduzida até a Polícia Federal.
Felizmente, a nossa Ordem dos Advogados, pela nossa Presidente da seccional, já está se dirigindo até a Polícia Federal com as prerrogativas, porque é bom que se afirme que os advogados e as advogadas neste País - até que mude, e esperamos que não mude, essa ordem democrática - têm o direito, sim, de fazer a defesa de todos e todas aquelas que estão nas ruas em protesto.
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E é isso que as mulheres estão fazendo nos últimos dias, desde o dia 5, se não me falha aqui a data - e a Jolúzia pode me corrigir -, até o dia de hoje nesta Capital Federal.
A minha fala, Senador, se estrutura em um tripé.
O primeiro deles, da própria advocacia, porque, como advogada, visualizo cotidianamente - agora já estou ficando velha, e, se eu ficar velha, o senhor fica também. O senhor sabe disso, não é? Então, a gente não pode fazer muitas referências aqui...
O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Se ela está ficando velha, calcule eu então!
A SRA. SORAIA MENDES (Para expor.) - Enfim, como todo o respeito, Senador: somos. Somos.
Já há duas décadas em defesa dos direitos das mulheres, aquelas que são as reivindicações das mulheres, infelizmente, continuam ainda sendo as mesmas. Por mais que nós tenhamos avançado em termos legislativos, a crueza com que as mulheres são tratadas neste País...
E eu faço aqui uma saudação muito específica, assim como a minha querida colega Joana D'arc fez ao seu Deus, faço saudação à minha Oyá, dada à minha ancestralidade africana, e a todas as mulheres negras que, neste País, sofrem em função de inúmeras violências, não só a violência doméstica e familiar, que hoje tanto está em voga - e é importante que esteja -, mas em função das inúmeras outras violências que são as violências decorrentes da institucionalidade, que trazem consigo marcas que ficam no corpo ou, então, a morte das mulheres, como é o caso da violência obstétrica, como é a ausência de uma política séria, responsável e de respeito à autonomia das mulheres em termos dos seus direitos sexuais e reprodutivos.
Eu, hoje, falo - e agora chego ao meu segundo elemento do tripé - como acadêmica a respeito de um feminicídio de Estado. Sobre isso escrevo. Recentemente, saiu um novo livro, Senador, Processo Penal Feminista. E falo ao senhor de um novo livro que saiu neste mês ainda, que é o Pacote Anticrime: comentários críticos à Lei 13.964, de 2019.
Para que eu faço essa citação, além de aproveitar é claro aqui a audiência da TV Senado e de todos e todas que estão aqui para fazer essa propaganda? Mas não é só para isso, não. É para dizer que o Pacote Anticrime que chegou à Casa Legislativa pelas mãos do Ministro Sergio Moro é um pacote de genocídio da juventude negra, é um pacote de esquecimento dentro dos cárceres brasileiros das mulheres do Brasil.
Portanto, quando nós falamos em violência, precisamos falar dessas mulheres também, que estão lá dentro do cárcere e que vão passar muito mais tempo lá dentro desse cárcere em função de projetos de lei que trazem, sim, uma lógica de inimigo, como muito bem citou aqui a representante da Anadep, da nossa querida Defensoria Pública, Defensoria Pública que, por sinal, eu percorro o Brasil inteiro visitando e pela qual tenho o maior carinho e admiração, porque fazem um atendimento de ponta que é um atendimento aguerrido. Aliás, a Defensoria Pública, aqui, nos é muito cara, bastante cara, no Distrito Federal.
No terceiro e último tripé, eu quero dizer o seguinte, Senador: assim como tenho a advocacia e a academia, eu tenho a dizer e vou repetir isso - na verdade, algumas ou várias outras pessoas já ouviram: eu sou uma mulher filha da classe trabalhadora, uma mulher negra, que fez duas faculdades, mestrado, doutorado e pós-doutorado, todas nas melhores universidades públicas deste País, mas que não precisaria de nenhum desses títulos que tenho para entender a realidade das mulheres negras no Brasil, para entender a realidade das mulheres da periferia no Brasil.
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Nesse sentido, como acadêmica, como professora, trazendo para o chão das lutas sociais - e muito bem dizia o Frei Betto que "a cabeça pensa onde os pés pisam" -, nós vivemos numa era de pós-verdade. Lamento muito que, desta Casa até os organismos internacionais, recentemente inverdades tenham sido repetidas, e nós passamos a enxergar, no dia a dia, nas ruas, faltar aquelas que são as assistências fundamentais às mulheres em termos de políticas públicas e de um apoio a uma política de autonomia da mulher que não se refere em nada ao retornar ao lar, ao assumir o seu papel como mulher, que deve ser o de cuidar os filhos e de cuidar do marido, trazendo, portanto, uma outra cultura, que é a cultura do encarceramento.
Escrevi há um tempo - aí, de novo, volto à questão do tempo e da idade -, na minha tese de doutorado, publicada em livro, que nós mulheres sempre conhecemos o cárcere, porque, historicamente, nós fomos relegadas à casa, trancadas em casa, depois nós fomos trancadas nos conventos, nos manicômios e, finalmente, nos presídios.
Pois bem, além dos presídios, que hoje existem e estão lotados dessas mulheres pretas e pobres, na sua maioria marginalizadas em função do tráfico de drogas, que lá vão ficar esquecidas em função desse tipo de projeto de política criminal que se tem no Brasil, nós estamos sendo, pela cultura que tem sido disseminada, novamente relegadas a dentro das casas. As quatro paredes do lar são uma prisão para as mulheres.
Aqui muito bem disse a nossa querida colega Joana D'arc falando da sua experiência pessoal de encarceramento e de cerceamento.
É disso que a gente precisa falar.
Senador, eu não quero tomar mais nenhum minuto, porque eu quero muito a oportunidade de nós termos aqui uma mesa de diálogo, uma mesa de discussão, para que todos aqueles apontamentos que foram trazidos pela Abigail, pela Jolúzia, por todos e todas que passaram por aqui possam ser, sim, objeto - eu sou advogada e vou usar este termo - do contraditório, com a possibilidade de termos aqui uma representante do Ministério da Família e dos Direitos Humanos.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Essa foi Soraia Mendes, Professora Coordenadora do Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (Cladem), que aqui expôs seu ponto de vista, com muita firmeza. Eu não gosto muito do termo convicção, mas foi muito firme no seu ponto de vista, porque essa história de convicção para mim é: eu tenho convicção ou não tenho convicção.
Então, parabéns a você, brilhante como sempre.
Eu queria, neste momento, dizer que cada convidado que quiser terá dez minutos para a considerações finais. Eu vou, agora, inverter a ordem. Os últimos serão os primeiros, e os primeiros são os últimos, a não ser que alguém, claro, tenha de sair. (Pausa.)
Então, por favor, vamos passar a palavra, então, à Dra. Selma Maria Frota Carmona, Presidente da Comissão de Combate à Violência Doméstica e Familiar da OAB-DF, para suas considerações finais.
De gaúcho para gaúcho. O gaúcho saiu e convidou uma gaúcha para sentar aqui.
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A SRA. SELMA MARIA FROTA CARMONA (Para expor.) - Primeiro, quero pedir desculpa pela minha...
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. SELMA MARIA FROTA CARMONA (Para expor.) - Eu estou achando. E eu que sou do sul, mas é do sul do Maranhão, como diz o outro... (Risos.)
Então eu estou me sentindo assim excluída, bullying aqui, não é? Eu falo que sou do sul. Eu dou aula na Academia de Filosofia e falava para os alunos, quando eu contava uma história, eu falava assim: sou lá do sul. Aí, "ah, é?", e eu falava, não, do sul do Maranhão. (Risos.)
Bom, primeiro eu quero pedir escusas, porque eu realmente vou sair, porque tenho uma entrevista agora lá no Supremo. E quero agradecer aqui esta rica diversidade, estes ricos olhares, cada um de uma maneira, a questão de políticas públicas. À Dra. Grace, que é minha colega, Delegada de polícia também, muito querida, muito aguerrida, muito preparada também. E à Dra. Soraia, sem comentários, autora de vários livros, não é? Então isto é muito rico, isto é muito bom, porque eu sou fã do estudo, sou fã da busca, sou fã do conhecimento. Acho que sem ele a gente não cresce. Assim que foi a minha história pessoal, inclusive.
E eu gostaria de fechar, eu e a Dra. Joana D'arc, para dizer que a OAB está embrionariamente no observatório que foi criado, está sendo criado na verdade, eu estou até me antecipando aqui em nome da nossa Vice-Presidente, a Dra. Cristiane Damasceno, com relação ao observatório. Em vários lugares há um observatório com relação à violência contra mulher, mas esse é quanto ao feminicídio, no tocante à questão da rapidez do aparato judiciário, do aparato policial, da fase inquisitorial, como é que tramita, quanto tempo demora, quais as questões atinentes a esse processo, desde o seu nascimento lá no dia do delito até o seu julgamento, e como é que tem sido feito, como é que está a atuação dos demais órgãos, da Defensoria Pública, se essas crianças órfãs, que a gente nunca pode desprezar, estão sendo efetivamente amparadas e acolhidas e qual está sendo essa demora nesse sentido.
E gostaria realmente de me colocar à disposição. A gente teria muita coisa para dizer, da mulher deficiente, que não tem como ter acesso aos órgãos de segurança pública. Como é que uma muda que é vítima de violência se dirige a uma delegacia de polícia ou liga para o 190?
E gostaria de dizer, sim, que no Distrito Federal, nós vivemos numa bolha. Aqui é diferenciado. As academias... Com todas as falhas das nossas academias de polícia, mas o preparo, o atendimento ainda é muito bom. Mas também temos que preparar esse policial, porque não é fácil ser um policial militar. Eu não sou, mas não é fácil receber toda aquela violência, toda aquela cobrança. E nós não somos heróis. Às vezes eu achava que era, que para todas as pessoas que se dirigiam a mim, eu achava que eu tinha que dar uma solução, na minha trajetória toda como Delegada de Polícia. E eles não são tratados também. Não têm um acompanhamento psicológico. Então é todo um viés, é todo um arcabouço que não pode ser desprezado, não é?
Então, eu infelizmente não vou poder ouvir todo mundo, o que seria uma satisfação. É um tema que, para mim, me emociona, de que sempre eu gostei muito, especialmente as crianças vítimas de abuso e maus-tratos. Mas eu vou ter que me ausentar. Eu acho muito indelicado isso, mas realmente...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Faz parte.
A SRA. SELMA MARIA FROTA CARMONA (Para expor.) - ... a TV Justiça é bem ali, até eu chegar lá... Está bem? Obrigada, viu? (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Meus cumprimentos à Delegada Selma Maria Frota Carmona, que é Presidente da Comissão de Combate à Violência Doméstica e Familiar do DF.
Eu queria registrar a presença, com satisfação, do Senador Marcos Rogério, sempre presente. Não é fácil trazer um Senador aqui numa segunda de manhã. É porque todo mundo tem compromissos em seus Estados, não é? Eu queria dar uma salva de palmas para o Senador Marcos Rogério... (Palmas.)
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... que usará a palavra no momento em que entender adequado. Aí, você que decide, Senador.
Por favor, eu sei que talvez tenha que sair acompanhando.
Eu passo de imediato, então, à Dra. Joana D'arc de Jesus Soares dos Santos, Presidente da OAB, Subseção aqui de Samambaia.
A SRA. JOANA D'ARC DE JESUS SOARES DOS SANTOS (Para expor.) - Isso. Bom dia a todos. Vou ser breve nas palavras, porque pedi à Dra. Selma já para fazer as honras da casa, para falar sobre o nosso observatório.
Mas antes eu tenho que agradecer as belas palavras do nosso Presidente da Comissão de Direito Penal, Dr. Marcos Vinícius, e à Dra. Soraia, que nos prestigiou com as suas palavras e que representa muito bem a nossa instituição.
E apenas quero fazer um lembrete sobre as questões; porque a OAB está muito preocupada com o tema, como as mulheres são tratadas nesses processos. Inclusive nós estamos fazendo estudo de casos sobre o tema.
E muito em breve, o nosso observatório será lançado, que está sendo presidido pela nossa Vice-Presidente da OAB seccional, a Dra. Cris Damasceno. E ela sugeriu, devido aos índices de Samambaia serem muito elevados, que inclusive uma cápsula desse observatório seja lançada em nossa subseção.
Acho que nada mais há a dizer. Meu muito obrigado a todos e ótimos trabalhos!
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Dra. Joana D'arc de Jesus Soares dos Santos. (Palmas.)
Advogada que preside a OAB-DF, Subseção de Samambaia. Agradeço a sua presença e a coragem e firmeza de dar um depoimento pessoal.
Passo agora para a Consultora Legislativa e membro do Comitê pela Promoção da Igualdade de Gênero e Raça do Senado Federal, Dra. Roberta Viegas e Silva.
A SRA. ROBERTA VIEGAS E SILVA (Para expor.) - Bom dia de novo, quase boa tarde. Agradeço mais uma vez estar aqui. Aprendi muito com esta segunda Mesa também, com a primeira também. E eu estou à disposição para conversar sobre os processos legislativos ou os trâmites aqui do comitê. Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Roberta Viegas e Silva. Falou pelo Senado Federal.
Abigail Pereira, pedagoga. Dez minutos, igual a todos.
A SRA. ABIGAIL PEREIRA (Para expor.) - Eu gostaria de saudar novamente esta iniciativa do Senador Paulo Paim, num momento tão difícil do nosso País, em que a ordem democrática e o Estado democrático de direito vêm sendo aviltados, afrontados a cada dia.
Nós, o conjunto dos trabalhadores e das trabalhadoras que todos os dias estamos sofrendo perdas, um retrocesso gigante que acomete os trabalhadores, seja a partir da Emenda 95, que retira investimentos nas áreas sociais, saúde e educação, seja na área trabalhista, em que tanto sofremos, tanto o Senador trabalhou, conseguiu ter uma redução de danos, digamos, no finalzinho, mas sofremos e estamos sofrendo a consequência de trabalho intermitente.
E lá, fazendo um reparo, felizmente, Senador, conseguimos reverter, porque a reforma trabalhista previa que mulher grávida ou lactante poderia trabalhar em serviços insalubres, não é? É de rir para não chorar, não é? Esta é a sociedade que trata como trata as mulheres, e portanto nós vamos chegar à questão da violência quando pegamos lá nas causas, e não só nas consequências, como hoje é comum debatermos. Como é que a gente chega a dados tão alarmantes?
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É ousado da sua parte, Senador, chamar, neste momento, um debate tão amplo, que conseguiu, a partir dessas duas Mesas e desse espaço privilegiado em que a TV Senado, as redes sociais do Senado, as suas próprias redes estão divulgando, portanto, chegar a muitas pessoas, homens e mulheres, que estão interessadas em debater esse tema e enfrentar esse tema.
Ao final desta audiência, nós podemos aqui concluir que nós acendemos a luz de alerta para essa questão. E a luz vermelha. A luz já está vermelha, gente. Ela já ultrapassou o limite quando a gente vê tantos dados. E veja bem, os dados estatísticos apresentados podem ter diferenças de quem pesquisa, com que objetivo, em que data mesmo, o que compreendeu, Geraldini, não é? Então, por exemplo, quando você contesta o dado que eu ofereci aqui, que são cem Casas Abrigos existentes no Brasil, esses dados, eu coletei do IBGE. Não são dados meus. Estão no nosso relatório. São dados do IBGE. Obviamente deve haver outras tantas casas que estão... Por exemplo, como a Casa da Mulher Brasileira aqui de Brasília, que está fechada. Está fechada, certo? Então é isso, quer dizer, existiram, nós podemos computar. Então os dados dependem de quem diz, com que objetivo e de quem lê esses dados. É isso. Mesmo que sejam, Geraldini, 132, como você falou, mesmo assim é um absurdo, gente! Se for esse o dado, mesmo assim é alarmante nós não termos essas casas.
Portanto, Senador, eu pedi novamente para usar a palavra porque é isso, a gente também vem de tão longe para estar aqui... E quero lamentar. É revoltante! Nós poderíamos estar aqui discutindo políticas públicas, como nós avançarmos nas conquistas das mulheres. No entanto, nós estamos discutindo aqui retrocesso, como nós enfrentarmos esse retrocesso e podermos ir em frente com dignidade, respeitando as mulheres.
Eu aprendi, como aqui a Roberta falou, eu acho que as Mesas nos trazem elementos e nos suscitam a buscarmos mais elementos, a reconhecer que esse debate tem classe, tem raça, tem gênero. Então, essas injustiças com as quais nós sofremos.
Nós afirmamos que o principal programa do Governo Federal hoje, de combate à violência contra a mulher, ficou sem um único centavo do ano passado, que é a Casa da Mulher Brasileira, que foi aceita pela Secretaria da Mulher, foi aceita pela Ministra Damares. A ideia agora, retomando, é mudar o nome desse programa, levar para 25 Municípios - é o que a imprensa está divulgando -, com custo baixo, com parcerias, ou seja, desmontou. Desmontou total, como se diz, não é? Então é lamentável.
É lamentável nós vermos matérias como a do G1: "Governo não faz repasses a programas de combate à violência contra a mulher". Isso está no G1. "No Brasil, uma mulher é morta a cada duas horas, vítima de violência"; Jornal Nacional. "País se torna mais violento para a mulher, mostra estudo." São dados da imprensa, divulgados, de que nós nos envergonhamos; nos assustamos quando vemos esses dados, Senador. "Dados da violência contra a mulher são evidências da desigualdade de gênero no Brasil". Não sou eu que estou dizendo; neste momento, estou lendo matérias recentes, matérias atuais, que têm saído na nossa imprensa.
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Eu concluo dizendo que semana que vem, Senador, dois anos da morte de Marielle, uma Parlamentar negra, lésbica, defensora dos direitos da mulher, do nosso povo, uma negra que nós admiramos, admiramos a sua trajetória, a sua história. Dois anos com muitos indícios, e nada foi feito. Dois anos da morte da Marielle. Estaremos nas ruas fazendo essa denúncia novamente.
Esse debate é muito sério, gente, é sério demais. O trabalho que todas aqui apresentaram, seja trabalho de forma institucionalizada, seja trabalho militante, dos movimentos sociais, são trabalhos sérios, que vêm evidenciando a necessidade urgente de nós tomarmos as rédeas dessa situação e apontarmos saídas de enfrentamento à violência contra as meninas, as mulheres de todas as idades, de todas as cores, de todas as crenças.
Muito obrigada, Senador Paim, por esse convite para estar aqui participando desta Mesa extremamente representativa, de estar ao seu lado, porque nós nos orgulhamos do seu mandato, que sempre esteve à disposição da luta de homens e mulheres. E nós sabemos que continuaremos. Eu passo às suas mãos o relatório preliminar da força-tarefa, de que o senhor foi proponente. E nós vamos continuar representando-o no Rio Grande do Sul, eu e a nossa colega Leonita, que fizemos parte dessa força-tarefa.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito obrigado, Abigail. Fica aqui nos Anais da Casa este documento. E no final, tiramos uma foto juntos, para registrar.
Essa foi Abigail Pereira, pedagoga, uma mulher de luta, que tem uma história muito bonita lá no Rio Grande, viu? Toda vez que foi chamada, foi Secretária de Estado, foi sindicalista muitos anos e foi também companheira na caminhada ao Senado por duas vezes. Numa delas, fez em torno de 2 milhões de votos, e na outra, um milhão e pouco. É por isso que eu disse que somados, quando perguntarem, você diz que leva 3 milhões de votos consigo. Amanhã ou depois vai estar eleita para um cargo, consequentemente e de forma bem natural.
Eu vou falar agora... Senador? Então o Senador Marcos Rogério com a palavra, ele que é um Senador atuante aqui nesta Comissão, e não só nesta.
O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - RO) - Muito obrigado. Senador Paulo Paim, cumprimento V. Exa., cumprimento as expositoras e os expositores que participam desta reunião da Comissão de Direitos Humanos. V. Exa. ocupa o maior tempo da TV Senado com as plenárias que promove de segunda a sexta-feira, e isso é muito bom, porque são temas importantes, embora em algumas temáticas haja compreensões diferentes. Isso é natural da representação democrática. Faz parte. Mas é bom que haja um espaço, um fórum onde ideias diferentes são expostas de maneira clara, de maneira bastante abrangente, firme, contundente, como V. Exa. promove aqui na Comissão.
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Temas das reformas estruturantes que o Brasil está enfrentando V. Exa. pauta a semana toda aqui, gerando, inclusive, contrapontos àquelas correntes que, muitas das vezes, são correntes majoritárias. E V. Exa. pontua. Não raras vezes, mesmo estando numa condição circunstancialmente minoritária, V. Exa., com a habilidade que tem, com a sensibilidade que consegue despertar no Plenário da Casa, consegue impor modificações importantes em momentos em que há aparência de que não haverá possibilidade para mudar.
Faço esse registro para lembrar, por exemplo, o caso da reforma da previdência. Quando tudo caminhava para a aprovação de um texto na linha estabelecida pelo Governo e pela maioria dos Parlamentares presentes na Casa, V. Exa. conseguiu ecoar no Plenário uma visão que nos convidou a todos a refletir e, ao final, concordar com V. Exa. para modificar. Então, V. Exa. tem da nossa parte respeito, sobretudo pela capacidade de mobilizar temas para o debate aqui nesta Comissão.
Hoje é um tema importante. Ontem, tivemos o Dia Internacional da Mulher, com manifestações, no Brasil inteiro, em louvor à mulher, em homenagem à mulher, mas talvez o dia não fosse para apenas externalizar essas referências elogiosas, comemorativas, mas mais de reflexão em relação ao momento que a gente vive. Eu acho que a abordagem que se dá aqui é muito importante.
Eu fiz aqui alguns apontamentos. Eu estava no gabinete, assistindo ao debate. Hoje eu vim à Casa para fazer trabalhos mais internos no gabinete. V. Exa. sabe que, na terça e na quarta aqui, são Comissões e Plenário o tempo todo e que, na segunda, a gente aproveita para dar encaminhamento, na condição de Presidente de Comissão também, aos temas do dia a dia da Casa. Mas, ouvindo o debate, assistindo ao debate, fiz questão de vir aqui para cumprimentar V. Exa. e, de repente, trazer aqui, de certa forma - eu não diria um contraponto ao que está sendo dito aqui, porque não é contraponto... A minha visão é convergente com os ideais que estão sendo expostos aqui. Apenas a visão com relação ao que se propõe, ao que se divulga é um pouco diferente.
A mulher tem um papel fundamental na estrutura familiar. E aqui eu já começo fazendo uma abordagem em relação... Acho que não só na sociedade brasileira, mas em qualquer parte do mundo, família, igreja e sociedade: papéis fundamentais. Dissociar isso, distanciar isso daquilo que é o ideal que se busca, a partir das premissas que foram assentadas aqui, ou, de certa maneira, desconhecer o valor implícito em cada uma dessas instituições é afastar instrumentos importantes para a promoção daquilo que se busca a partir do debate que se estabelece. Não há sociedade forte com família fraca. A célula mais importante da sociedade é a família. Nós não conseguimos vencer qualquer mazela, qualquer distúrbio, qualquer tipo de agressão, de violência sem passar pelo caminho da família. A família é base. A família é fundamento. E, às vezes, o tom dos debates que acontecem colore, pinta esse ambiente, especialmente aquele ambiente mais conservador, como se fosse um ambiente nocivo à formação de uma sociedade sadia, justa, igualitária.
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Não vejo problema em ser conservador. Pelo contrário, vejo isso como uma qualidade. O Brasil é um país conservador, foi, é e continuará sendo por muito tempo um país conservador. Desconhecer isso ou negar isso é negar a evidência que nós tivemos, inclusive, nas últimas eleições. Ou alguém imagina que Jair Messias Bolsonaro foi eleito porque tinha um grande plano econômico para recuperar o Brasil? É claro que não. Foi eleito porque verbalizava, porque comunicava o pensamento da maioria brasileira com relação a temas conservadores. O politicamente correto afastou das ruas, dos microfones, das plenárias pessoas que conseguissem verbalizar o que pensam, o que sentem, o que querem como ideal de vida.
Jair Bolsonaro conviveu conosco quanto tempo na Câmara? E vamos ser sinceros: ao longo do tempo... Não estou fazendo uma crítica aqui ao Presidente Bolsonaro. Estou apenas narrando realidades. Durante esse tempo todo, houve um destaque em matérias econômicas sendo debatidas na Câmara dos Deputados? Não. Qual foi a referência que o brasileiro teve do Presidente Bolsonaro, ao longo da sua trajetória no Parlamento, se não foi combater justamente esse estereótipo que se criou no Brasil de uma sociedade absolutamente liberal em relação a valores? Ele fazia um contraponto a isso e foi para a campanha expondo, de cara limpa, aquilo que pensava e aquilo que continua a pensar. E os brasileiros abraçaram a campanha dele, a despeito dos demais candidatos com visão - alguns - de semiliberalismo econômico e progressista em relação a valores. Ele começou a pregar a questão dos valores, dos princípios, enfatizando aquilo que ele sempre foi a vida toda. E, do ponto de vista econômico, ele apenas falou de liberalismo econômico en passant, e sempre falava: "Não. Olha, esse assunto aí é com Paulo Guedes". Desde a campanha. E ganhou a eleição, ganhou a eleição em razão das bandeiras conservadoras que defendeu.
O Brasil é um país realmente progressista? O Brasil é e continua sendo um país conservador. Não é defeito ser conservador. Não é defeito defender família como base. Agora, os temas que são discutidos aqui são temas fundamentais. Talvez a maneira de se fazer esse enfrentamento, a meu ver, na minha visão, é que me parece um pouco equivocada ou menos eficiente, porque esses temas, como já foi dito aqui pela maioria dos expositores, são temas recorrentes. Entra ano e sai ano, as bandeiras continuam as mesmas. Por que não mudou? Aí eu pergunto: é falta de lei? Não, não é falta de lei. Nós temos leis demais e leis boas. Não são leis ruins. Embora o Parlamento seja formado, majoritariamente, por homens, nós temos muitas leis boas de enfrentamento ao crime, de enfrentamento à violência, de enfrentamento ao preconceito. O Parlamento conseguiu dar à sociedade um novel legislativo que é capaz de fazer o enfrentamento. Mas o problema está apenas no ordenamento jurídico, apenas na lei, na norma, na política de persecução penal? É lá que está o problema? Não, não.
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E aí é onde vem a base da sustentação que faço. O problema está antes disso e também nisso, especialmente na efetivação da norma garantidora de proteção e de enfrentamento à violência, mas não é possível fazer esse enfrentamento sem olhar para a base, para o seio da sociedade. Você muda uma sociedade quando você olha para a sua base, para a sua origem, de onde veio, como veio, por que veio. Não adianta querer mudar começando pelo meio. Você muda começando pelo início. Nós temos uma fase da vida que é fundamental no desenvolvimento humano e, às vezes, perdemos a grande oportunidade de olhar para ela como um tempo de oportunidade, como um tempo de mudanças. E a gente vem falar aqui: não, temos que enfrentar o crime, temos que enfrentar a violência, temos que punir os agressores. É verdade. Temos que fazer isso, mas temos que fazer mais do que isso. Temos que olhar para o nascedouro disso.
Se queremos mudar uma sociedade, olhemos para a primeira infância. É lá que está a janela de oportunidade de transformação de uma sociedade. E aqui destaco o papel de duas instituições e de um terceiro que tem papel importante, mas é secundário e, hoje, acaba sendo o referencial primário. Inverteram-se os papéis. Hoje, querem terceirizar para o Estado problemas que são problemas da família, problemas que são problemas da igreja, porque primeira infância é justamente o momento em que quem tem maior contato, maior influência é a família. Aí, famílias desestruturadas, mal orientadas, sem formação, que vieram de uma formação também, em alguma medida, sem instrução vão continuar formando filhos com aqueles referenciais, com aqueles valores, com aqueles conhecimentos que herdaram dos seus pais e avós. Quem teve a oportunidade de, de repente, conhecer algo mais consegue transmitir para os seus filhos algo diferente e vai formar um cidadão diferente. Mas o problema é que nós estamos invertendo hoje. Hoje, querem terceirizar para o Estado a obrigação de tudo. Problema na infância é problema do Estado. O Governo não age. O Governo não tem política pública. E aí a família fica em segundo plano, a igreja fica em segundo plano.
Esse problema da violência contra a mulher, e não só a violência contra a mulher... Há a ausência de uma cultura de respeito à mulher: respeito no ambiente de trabalho, respeito nas promoções, respeito no acesso, aquilo que a lei já garante efetivado na prática. Isso passa por essa compreensão de que é preciso mudar começando do início, olhando na primeira infância. O Brasil, felizmente, vem, nos últimos anos, mudando a sua compreensão e tendo um olhar maior para essa área, mas ainda é muito pequeno. É preciso avançar ainda mais. Mas a própria sociedade precisa ter essa compreensão.
E a cultura do empoderamento da mulher e também essa ideia de que o homem precisa se ocupar o tempo todo para garantir não só a subsistência, mas garantir um futuro melhor para ele, para a sua casa, para a sua família acabaram tirando uma grande oportunidade de transformação da sociedade. Hoje, pai e mãe estão muito ocupados para cuidar dos filhos. Aí a criação de filhos também é terceirizada.
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Então, ou a gente consegue fazer uma reflexão um pouco mais profunda além disso que nós estamos discutindo aqui apenas, e relatar fatos, e relatar situações, e olhamos lá para a origem, para tentar redesenhar o formato de criação e de formação ou nós vamos continuar vivendo esse drama por muitos anos. Só repressão não basta. O Estado repressor, punitivista, sancionador precisa existir em razão dos crimes que ocorrem, mas ele precisa induzir políticas públicas que auxiliem na formação de bons formadores. Se nós não tivermos a capacidade de... Falo isso aqui respeitosamente e não estou divergindo das compreensões que foram expostas na mesa do dia de hoje. Apenas lanço luz a uma reflexão que deve nos conduzir a enxergar a primeira infância como tempo de oportunidade de transformação de uma sociedade. Se nós queremos mudar a sociedade que temos, olhemos para o tempo da oportunidade. É do zero aos seis anos de idade, Sr. Presidente, que temos a grande janela de oportunidade.
Há um autor de que gosto muito e, sempre que posso, faço menção a ele: James Heckman. É um estudioso desse assunto, tem estudos maravilhosos. A escola de Chicago, que é conhecida em outras áreas, deveria ser referência a partir dos estudos que tem na área da primeira infância. Se nós tivermos a capacidade de olhar para isso e induzir uma formação que passe por valorização da família, por orientação mais adequada... Sr. Presidente, o papel mais importante na formação de uma criança nessa fase não está em colocá-la numa boa escola. Isso é importante, mas o mais importante na formação dessa fase da vida está na comunicação, na interação, no nível de contato que você tem, na qualidade da presença que você dispõe para o filho.
Faço votos de que nós possamos, nos próximos anos, ter números que nos envergonhem menos em relação à violência contra a mulher, em relação à violência contra as crianças, em relação à violência contra minorias, porque ninguém defende isso, e possamos, acima de tudo, olhar para a formação lá na base como uma janela de oportunidade para a transformação da sociedade.
Cumprimento todos os expositores, todas as expositoras e V. Exa. por trazer esse tema ao debate no Senado Federal do dia de hoje. Peço vênia para estar na bancada hoje a la Magno Malta. Não é minha prática. Eu sempre venho com a veste adequada, mas hoje vim... Eu estava à vontade no gabinete, mas fiz questão de vir aqui em razão da grandeza do tema, da importância do tema para os brasileiros de modo geral.
Muito obrigado a V. Exa. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Senador Marcos Rogério, que deu a sua contribuição a este debate tão importante sobre a violência contra a mulher.
Só para situar - você vai me ajudar aqui agora -, você era delegado antes, não?
O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - RO) - Não.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Você vem de que área?
O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/DEM - RO) - Eu sou do Direito, mas fui jornalista durante muitos anos, Vereador na minha cidade, Deputado Federal por dois mandatos e, agora, Senador da República, mas a minha área profissional de atuação, ao longo da vida, foi jornalismo, de que tem muito orgulho. Hoje milito na área do Direito, mas o jornalismo foi o que me pôs em contato com muito dessa realidade que vocês estão tratando aqui. Por isso, fiz questão de vir, porque conheço muito de perto essa realidade, e ela é triste e nos envergonha muito. E a gente, realmente, ano após ano, continua retratando os mesmos erros, os mesmos problemas.
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Obrigado pela contribuição ao debate, Senador Marcos.
Vamos em frente. Agora, rapidamente, pessoal, eu tenho, ainda, Senador Marcos Rogério, que fazer, por dever de ofício, a leitura do e-Cidadania. Depois, vamos passar para os membros da segunda Mesa.
Valdemagno Torres, de Pernambuco: "É importantíssima essa discussão, principalmente próximo ao Dia Internacional da Mulher. O que, efetivamente, tem sido feito para coibir?". É que eles mandaram para cá na sexta.
Cesar Vieira, da Bahia: "Qual o real cenário das delegacias de combate a violência contra a mulher no Brasil?". Se alguém puder responder... Senão, depois nós responderemos, porque nós somos obrigados a encerrar às 14h.
Patricia Hamab, de São Paulo: "A Lei Maria da Penha apresenta diversas formas de violência, seja física e até mesmo moral. Porque o sistema ainda é ineficaz?".
Luiz da Silva, de São Paulo: "Quais os avanços que podem ser criados em relação à proteção das vítimas? Vejamos que nos dias de hoje é ineficaz ou muito moroso".
Clarissa Saraiva, do Ceará: "A Lei Maria da Penha visa punir os agressores. E o que tem sido feito para prevenir agressões no âmbito doméstico e familiar?".
Rayell Correia, de Tocantins: "Deve-se tomar cuidado com as leis de proteção à mulher, para que mulheres mal-intencionadas usem para fins ilícitos como vingança".
Ana Celestino, do Ceará: "Pedimos mais ação em relação a isso. As leis existem e são ótimas, por sinal. Porém, está faltando mais para ser cumprida pelo órgão público".
Marcelo Almeida, de Minas Gerais: "O crime é só um. Não precisa criar uma lei para cada tipo de vítima. Quanto mais lei mais fraca fica a norma. É o fenômeno da antinomia".
Depois, eu ainda tenho aqui o que nós chamamos de encaminhamentos. Se alguém quiser complementar, além, claro, do material que eu recebi.
Oficiar ao Relator do Projeto nº 7.633, de 2014, enviando a ata e o link do vídeo da presente reunião, para que levem em consideração as informações trazidas pelos expositores em seu relatório, bem como para apresentar o relatório com a maior brevidade possível.
Oficiar ao Presidente da Câmara dos Deputados e das Comissões onde tramita esse projeto enviando a ata e o link do vídeo da presente reunião para que paute os Projetos 123, de 2019, 6.010, de 2013, e 598, de 2019, a fim de que sejam votados com brevidade.
Temos, ainda, o PL 265, de 2018, de autoria do Senador Magno Malta, que estabelece o direito da mulher vítima de violência doméstica familiar e de seus dependentes à prioridade em matrícula em instituição de ensino, o PL 5.643, de 2019, de autoria do Deputado Ronaldo Carletto, que garante às vítimas de violência sexual atendimento preferencial pela autoridade policial, Ministério Público e Defensoria Pública.
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Também gostaríamos da opinião de vocês sobre o PL 6.393, de 2009, de autoria do Deputado Marçal Filho - esse é o mais antigo e não foi votado -, que estabelece multa para combater a diferença de remuneração verificada entre homens e mulheres no Brasil.
O que diz o PL? Casualmente, eu fui seu Relator. Trabalho igual, salário igual, homem ou mulher, negro ou branco. Esse projeto foi aprovado ainda na Câmara dos Deputados, veio para o Senado, foi aprovado aqui, em todas as Comissões, e agora está pronto para ser votado no Plenário da Câmara dos Deputados. Acho que essa é a grande bandeira da luta das mulheres. Eu tive a satisfação de ser o Relator dessa matéria.
Ainda aproveito a oportunidade para dizer que aprovamos, recentemente, em reunião deliberativa desta Comissão, o PL 5.278, de autoria do Senador Jorge Kajuru, de que fui Relator, que determina o uso de dispositivo eletrônico no monitoramento por parte do agressor, para que ele não chegue perto da residência da mulher. O projeto agora está na CCJ.
E, por fim, acabamos de entregar o relatório sobre o PL 116, de 2020, de autoria da Senadora Leila Barros, que altera a Lei Maria da Penha para incluir meios eletrônicos em ambientes nos quais podem ser praticadas condutas que representem violência psicológica, sexual, patrimonial ou moral contra a mulher, concluindo pela aprovação do projeto.
Sei que é muita coisa para responderem e cada uma só tem dez minutos, mas fica aqui exposto o que me chegou à Mesa neste momento.
Agora, voltamos às nossas convidadas.
Vamos começar de lá para cá, como está previsto aqui.
Jolúzia Andreia Batista, dez minutos.
A SRA. JOLÚZIA ANDREIA DANTAS VIEIRA BATISTA (Para expor.) - Eu queria fazer uma correção. Quando eu disse que determinado programa não recebeu dinheiro no ano passado, foi justamente a Casa da Mulher Brasileira. Ele não recebeu nada, nem um centavo. Então, é uma questão realmente.
Eu achei interessante a intervenção do Senador Marcos Rogério, cuja performance acompanho desde a Câmara. Eu a achei bacana, e acho que a gente aqui tem alguns elementos, sabe, Senador Paulo Paim? A gente talvez merecesse algumas audiências aqui, nesta Casa. Inclusive, acho que há aspectos importantes sobre os quais a gente precisa falar.
A própria questão da laicidade do Estado brasileiro. A gente tem visto que talvez tenha que fazer um debate sobre o novo pacto social para lidar com isso, porque, como o senhor bem disse, o senhor usou o termo dessa entidade jurídica chamada Igreja. Eu já traduzo, do meu ponto de vista, de uma análise sociológica, como religião. Então, precisamos, talvez, falar isso abertamente. Estamos falando de religião, de Igreja... A nossa laicidade...
Eu sempre entendi que a laicidade brasileira nunca foi uma europeia. Esse modelo realmente... Ao entender da nossa formação sociopolítica, de um povo também que veio de diáspora africana, jamais deveríamos ter, talvez, incorporado o modelo europeu. Mas qual deve ser o nosso, talvez? Com tantos jogos de interesse hoje no Estado brasileiro... E acho que é importante, porque esse sujeito e as pessoas que estão ligados a esses projetos da Igreja, ou das Igrejas, porque agora temos o advento do evangelismo brasileiro, mas sempre tivemos o catolicismo com projetos bem determinados, hoje, o Brasil vive um novo momento a respeito disso. Talvez seja importante que a sociedade brasileira se coloque a esse diálogo assertivo sobre esses projetos e sobre que sociedade estamos construindo. Não existe, realmente, de fato, divergência sobre a concepção de políticas de Estado.
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Eu acho interessante falar sobre o problema da terceirização. Na verdade, o Brasil está terceirizando a precarização da vida, por que, se a gente se espelhar nos países com os melhores IDHs do mundo, nos famosos Países Baixos, como a Suécia, a Lituânia, em que pai e mãe também têm direito à licença-maternidade de cerca de um ano - a Lituânia, por exemplo -, para ficar naquele momento que é uma parte da primeira infância. Mas lá o Estado não é precarizado. Pelo contrário, existe uma valorização, uma política. Os salários não são cortados pela metade, quando, às vezes, não deixam de existir. É outra vertente.
Acho que, nesse debate entre conservadores e progressistas, a questão é como nós olhamos o encaminhamento que o Estado deve dar a cada cidadão ou a um projeto de sociedade ou ao seio familiar. Por exemplo, nós defendemos famílias. Todas as famílias brasileiras, nos seus diversos arranjos, deveriam ter o resguardo do Estado brasileiro, políticas públicas para poder prover. Por exemplo, no caso das mulheres negras que vivem em situação de periferia. Boa parte delas tem a presença dos seus maridos porque tiveram, inclusive, que entrar no tal do comércio do crime organizado, que é um problema, é um braço do Estado, é uma empresa... A gente sabe disso, e a gente pode falar sobre o narcotráfico em algum outro momento, porque o Brasil, pegando o Rio de Janeiro, está num desenho muito assemelhado ao que é na Colômbia hoje, com a questão das milícias mesmo. Então, quem estuda um pouco esse aspecto sabe o que a Colômbia vive, que teve que fazer mesmo acordos e teve que colocar isso em questão mesmo para novos tratados e para o Estado poder funcionar.
Então, como é que a gente vai se ver com a situação de periferia, com mulheres jovens e racializadas completamente desamparadas? São mulheres sozinhas! São famílias só de mulheres, gente!
Quando houve o advento da nova classe média, ali por volta de 2012, 2013, no Brasil, num Governo da esquerda, o Ipea fez uma pesquisa para saber quem era essa família da nova classe média. Mulheres negras e jovens e sozinhas. Eu também quero dizer que essa parcela da população ficou desamparada e continua ausente de algumas políticas, mas elas foram, na verdade, na ausência das políticas, abraçadas pelo conjunto das Igrejas brasileiras, que estão nessa proposta agora mais de um cuidado de Estado, de aparatos de negócios que antigamente o Sebrae fazia. São elementos sociológicos importantes da ebulição que a sociedade brasileira está vivendo e que tem rebatimentos importantes nesse problema que estamos enfrentando.
Para encerrar, eu queria dizer que eu estou de acordo com o que a técnica do Ministério disse, assim como a companheira que saiu, a Roberta. Há um problema grave na proliferação de projetos de lei para mudar a Lei Maria da Penha. Na nossa leitura, essa proliferação atende a dois problemas: uma cultura mesmo de tarifismo, porque chegam os Deputados e Senadores de primeiro mandato e querem comprovar ao eleitorado que estão trabalhando, mas também envolvem projetos de reposição, redomesticação, posso falar mais radicalmente, mais de reconfiguração dos desenhos de família ou dos projetos a que as mulheres brasileiras devem atender. Isso tudo está embutido. Eu já disse aqui no início, e o pesquisador pode corroborar, confirmar. Do ponto de vista das ciências sociais, as leis, as teorias, os dados, os números não são neutros. Então, todos os projetos, esses cerca de 348 PLs que existem desde 12 de novembro de 2019 para modificar a Lei Maria da Penha, todos eles, têm embutido em seu escopo um interesse, e boa parte deles é interesse mesmo de fazer o enfrentamento ao que a Lei Maria da Penha sempre se colocou desde o início, em todo o seu período de vigência e de debate, que tem causado, sobretudo entre os constitucionalistas. Então, para encerrar, eu queria agradecer realmente por este momento em que a gente pôde fazer um debate, ouvir o contraditório, mas eu insisto na prerrogativa de que a violência contra nós mulheres atende a um passado muito ruim, que é o do Brasil, mas é a nossa história, em que a violência surge sobre nossos corpos e nossos assassinatos como, realmente, uma coisa que ficou muito banalizada, mas é, de fato, uma punição, um castigo. A violência se coloca em direção aos nossos corpos realmente como a impossibilidade de domínio sobre a nossa vontade, o nosso pensamento e a nossa decisão. É como as crianças são tratadas até hoje, as pessoas ditas sem sanidade mental, que eram depositadas em hospícios. São as pessoas sem controle. Elas precisam ser controladas. Então, a gente vai lá e imprime uma violência, uma tortura, uma punição.
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Há alguns psicanalistas teóricos da subjetividade que falavam sobre isso, que falam sobre isso. Nós somos sujeitos ditos na sociedade ocidental como passíveis de tutela: as mulheres, as crianças e os loucos. Continuamos assim neste nosso modelo ocidental. O momento que nós estamos vivendo agora é de ressignificar todas essas noções que estão na nossa psiquê e na constituição da nossa sociedade. E aí eu coloco também essa ideia de a gente poder discutir que laicidade é essa para onde nós estamos caminhando em que as Igrejas se fazem, se tomam na prerrogativa de realmente terem influência sobre a política.
E, nesse aspecto, quero aqui reforçar uma fala que a Ministra Damares disse há algum tempo, de que as Igrejas, de fato, podem ajudar na solução de alguns problemas do Brasil. Eu acho que talvez sim. Elas estão tão enraizadas no tecido social brasileiro, gerando tantas influências, que a gente talvez tenha que olhar para isso com mais crítica, com mais acuidade, para saber, inclusive, que projeto pactuado é esse. Eu acredito que a sociedade brasileira, Senador Marcos Rogério, está vivendo uma situação de polarização. Eu acredito mesmo. Eu acredito no que todos os dados têm colocado e sou da vertente que acredita que o Presidente eleito se elegeu também na pós-verdade.
A sociedade brasileira, mantendo aquele carnaval que é o Rio de Janeiro, que agora foi com um poder de transgressão muito grande, um carnaval que tem se enraizado tanto nas cidades brasileiras, numa cidade impensada como esta de Brasília, nós temos um conteúdo progressista, um conteúdo de uma sociedade pós-modernizada mesmo. Então, é para isso também que a gente deve olhar. Nós estamos divididos de fato. Uma parte é conservadora. Se bem que é bom lembrar que o eleitorado que se mantém fiel ao Presidente eleito não passa dos 30%. Outra parte já está derivando para outras vertentes.
(Soa a campainha.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Agora eu vou fazer um apelo.
A SRA. JOLÚZIA ANDREIA DANTAS VIEIRA BATISTA - Eu vou concluir.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Tem que concluir nesse minuto.
A SRA. JOLÚZIA ANDREIA DANTAS VIEIRA BATISTA - Eu vou concluir.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - E vou pedir aos próximos que, se puderem, terminem em cinco minutos, porque a equipe tem que almoçar, e nós temos que ir para o Plenário.
A SRA. JOLÚZIA ANDREIA DANTAS VIEIRA BATISTA - É porque é uma discussão empolgante e a gente vai assim, né?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eu sei disso.
A SRA. JOLÚZIA ANDREIA DANTAS VIEIRA BATISTA - Foi um bom diálogo. Então, eu queria só colocar...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Eu mesmo disse que era de dez minutos.
A SRA. JOLÚZIA ANDREIA DANTAS VIEIRA BATISTA - Vou encerrar...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Você tem 40 segundos agora.
A SRA. JOLÚZIA ANDREIA DANTAS VIEIRA BATISTA (Para expor.) - Vou encerrar dizendo que estamos aqui. É um momento importante que a nossa sociedade tem vivido, e todas as organizações, o Parlamento e as universidades estão convocados a esse debate.
Obrigada. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem. Agradeço à Jolúzia Andreia Dantas Vieira Batista.
Eu vou fazer um apelo para que, se puderem, concluam as suas intervenções em cinco minutos. Isso porque a gente sempre gosta de terminar até as 13h, para que a equipe possa almoçar. Muitas vezes, a audiência volta às 14h, mas, hoje, volta no Plenário.
Claro que este debate não termina hoje. Este debate vai continuar, com certeza absoluta, porque ele merece ser aprofundado, como aqui foi dito pelo próprio Senador e pela Mesa.
Então, agora, eu vou passar a palavra, até para que as mulheres encerrem, para o Marcos Vinícius Costa dos Santos, Presidente da Comissão de Direito e Processo Penal da OAB-DF.
O SR. MARCOS VINÍCIUS COSTA DOS SANTOS (Para expor.) - Obrigado, Senador Paulo Paim.
Quero agradecer, mais uma vez, a oportunidade de estar aqui falando sobre este assunto, que tem uma importância primordial para a nossa sociedade, e, assim, também agradecer pelos ensinamentos que foram transmitidos aqui por todos aqueles que expuseram sobre o assunto. Tendo em vista que muitas concepções foram trazidas, boas ideias surgiram; e também é perceptível que há uma luta de toda a sociedade para que haja o combate à violência doméstica e familiar. Na oportunidade, quero ratificar, mais uma vez, que devemos agir, cada vez mais, com ações preventivas, tendo em vista que a nossa legislação está, sim, presente na sociedade e tem aspectos muito positivos, tanto é que a Lei Maria da Penha é reconhecida internacionalmente como uma das melhores leis sobre o assunto.
Aproveito o ensejo também para parabenizar aqui a Dra. Joana D'arc, que, como muito bem disse o Senador Paulo Paim, foi muito corajosa em dar o seu depoimento, dar o seu testemunho de como é difícil superar essa situação, de como é difícil conviver com esse tipo de problema, que, infelizmente, ainda faz parte da nossa sociedade.
O meu muito obrigado a todos e digo que a OAB está à disposição com ações preventivas, com o Programa OAB Vai à Escola, ensinando sobre o que é violência doméstica e compartilhando quais são os mecanismos de combate a essa forma de violência.
Agradeço também a presença de todos os advogados e advogadas que aqui compareceram e que sempre nos encorajam e fazem parte dessa luta, que é árdua, porém, da qual vamos sair vitoriosos.
Obrigado a todos e a todas. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem. Muito bem! Esse foi o advogado Marcos Vinícius Costa dos Santos, que falou aqui como um dos representantes da OAB.
De imediato, passo a palavra a Denys Resende, Pesquisador do Observatório Racial do Distrito Federal.
O SR. DENYS RESENDE (Para expor.) - Vou ser breve.
Para mim, é uma honra participar desta Mesa. Acho que é importante a gente ter esses vários pontos de vista diferentes. Uma história tem várias versões, e é interessante que a sociedade entenda um pouco mais sobre essas versões, até para que ela compreenda melhor todo esse processo de discriminação racial, de discriminação contra as mulheres que existe atualmente.
A nossa Constituição garante que o nosso Estado é laico; porém, a gente sabe que a sociedade está muito polarizada, principalmente nessa vertente evangélica cristã. A gente tem aqui, no Distrito federal, diversos terreiros de matriz africana que estão sofrendo pressões de diversas formas, ora sendo destruídos, ora as mulheres sendo ameaçadas. E sabemos que, na sua maioria, esses terreiros são gerenciados por mulheres. Então, é interessante que a gente faça valer a nossa Constituição.
Como eu disse, ontem foi um dia de luta e um dia de luto; porém, existem outras datas comemorativas das quais é expressamente importante que toda a sociedade participe e que todas as mulheres, brancas e negras, participem, como, por exemplo, do dia 30 de abril, que é considerado o Dia Nacional das Mulheres, e do dia 25 de julho, que é o Dia da Mulher da América Latina e do Caribe.
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O Observatório Racial do Distrito Federal trabalha justamente na promoção da saúde, abordando diversos tipos de questões sobre a igualdade racial, a igualdade de gênero, a equidade, entre outros.
Então, as contribuições desta Mesa foram muito importantes. Quem sabe, numa próxima oportunidade, a gente possa aprofundar melhor essas discussões tão relevantes para a nossa sociedade. Era isso.
Obrigado a todos pela participação. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Denys Resende, Pesquisador do Observatório Racial do DF. Só queria alertar, Denys e todos da Mesa, que está marcada para o dia 17 de março, uma terça-feira, às 9h da manhã, uma audiência pública sobre a intolerância religiosa. E isso devido a denúncias como essa que você colocou aqui. Estão todos convidados.
Vamos caminhar para o enceramento. Eu vou ser muito franco, como sempre sou: como o Governo é sempre minoria nas mesas, o que é natural, porque o Governo mandou um representante... Eu trabalho sempre ouvindo todos, deixando a última fala para aquele que é minoria aqui na Mesa. Viu como eu olho para as minorias? (Risos.)
Como o Governo normalmente é minoria, eu sempre dou a última fala... Senão, o debate vai continuar eternamente. Isso não quer dizer que o debate não tenha sido produtivo. Foi muito bom. O Marcos colocou um ponto de vista, a outra Mesa colocou outro, e a palavra agora é da Dra. Soraia Mendes - que já sabe dessa minha posição, porque já esteve em outros momentos aqui -, Professora e Coordenadora do Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher.
A SRA. SORAIA MENDES (Para expor.) - Senador Paulo Paim, deixo aqui uma deferência feita também ao Senador Marcos Rogério, que são os nossos representantes nesta Casa. É importante que façamos sempre aqui a referência ao Legislativo, ao Congresso Nacional, um dos pilares da nossa democracia. Portanto, é sempre importante que nós tenhamos espaços como este e debates como este sendo promovidos.
Na saída do Senador aqui, eu também tenho a dizer que vou ser muito rápida, porque o debate é absolutamente sedutor. Então, a vontade aqui de fazer um debate mais aprofundado sobre as diversas provocações que foram feitas é quase irresistível. Mas, de qualquer sorte, eu acredito que dois pontos fundamentais, na minha percepção, precisam ainda ser firmados.
O primeiro deles é que a lógica do politicamente correto realmente viola alguns e algumas. Algumas pessoas se sentem cerceadas por não poderem fazer piadas que dizem respeito às pessoas negras, às pessoas em função da sua diversidade sexual, em função da identidade de gênero. Algumas pessoas se sentem incomodadas por não poderem falar a respeito de mulheres a partir de suas características historicamente acentuadas como esteriótipos que nos colocaram dentro de papéis do gênero. Agora, eu posso dizer, com toda segurança, que o politicamente incorreto mata, porque 55% das mulheres, no Rio de Janeiro, que morreram vítimas de feminicídio no ano passado - e esses são dados da Defensoria Pública - passaram por outras espécies de violência. O politicamente incorreto, sim, deve causar alguns incômodos a algumas pessoas, porque entendem que podem fazer graça com aquelas que são as características que historicamente foram acentuadas nas pessoas negras, mas o politicamente incorreto está nos matando. E aí vale aquela frase fundamental que o movimento feminista cunhou, aliás, o movimento feminista e, mais do que tudo, o movimento negro, que é: "Parem de nos matar!". "Parem de nos matar!".
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Neste ponto, encerro dizendo que, por mais que se tenha boa vontade, algo que os nossos estudos mostram... E nós não estamos aqui fazendo discursos com palavras jogadas a esmo. Nós temos bases científicas, sociológicas, filosóficas, políticas, das ciências jurídicas e de diversas outras áreas para afirmar que não se faz a promoção de direitos humanos e, mais especificamente, a promoção de direitos humanos das mulheres e da população negra sem dinheiro. Portanto, se não existe dinheiro para a Casa da Mulher Brasileira, se o Disque 180 não funciona, se os recursos estão sendo cortados, que não se faça discurso de que se estão promovendo políticas de inclusão social ou políticas de defesa em relação às mulheres ou em relação a qualquer outra população neste País, porque isso não está acontecendo.
Então, encerro, muito rapidamente, dizendo novamente: Senador Paulo Paim, muito obrigada por esta oportunidade. E quero lhe dizer também que hoje este é o meu último compromisso oficial como Coordenadora Nacional do Cladem. Cumpri duas gestões à frente dessa organização, o que me trouxe muito orgulho. Durante esses anos todos, sentei-me aqui a esta mesa não só como Professora, mas sentei-me aqui carregando nas costas a responsabilidade da história dessas tantas mulheres que lutaram neste País para a construção de políticas públicas e pela prevalência dessas políticas públicas. Eu não posso falar muito, porque, senão, eu choro, pois o Cladem faz parte da minha, está nas minhas entranhas. Eu costumo dizer que eu nunca fiz parte do movimento de mulheres; eu sempre fiz parte do movimento feminista.
Então, nós estamos em uma discussão que nos coloca - e eu tenho muito orgulho das minhas companheiras, muito orgulho mesmo - entre mulheres que são destemidas, mulheres que aqui eu represento e falo, como falo, porque tenho certeza absoluta de que não têm medo da morte, não têm medo do opressor, não têm medo de estar nas ruas na defesa da nossa democracia.
Obrigada, Senador. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem! Essa foi Soraia Mendes, Professora, Doutora, Coordenadora do Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (Cladem). Você pode sair do Cladem, mas não vai sair desta Mesa. Fiquem com o telefone direto dela para que, seguidamente, ela possa estar aqui.
E, como estamos correndo em função do tempo, agora eu passo para as considerações finais da Diretora do Departamento de Políticas de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, Dra. Geraldini Grace da Fonseca da Justa.
A SRA. GERALDINI GRACE DA FONSECA DA JUSTA (Para expor.) - Agradeço a deferência às minorias. Por isso, serei a última a falar.
Gostaria de pontuar algumas coisas que foram ditas e responder, na medida do possível, dentro dos meus cinco minutos. A Dra. Jolúzia mencionou sabiamente que estamos divididos, reconheceu essa divisão. E, portanto, eu faço aqui o convite para que vão conhecer o nosso trabalho no Departamento de Políticas de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres e, sobretudo, a coordenação do Programa Mulher Segura e Protegida, que está trabalhando atualmente para a entrega de 25 casas. Será um prazer também trabalhar com vocês, ouvir o que vocês têm a dizer, para que a gente possa chegar a um senso comum, sem que seja necessário passar por tantos antagonismos e tantas dificuldades para chegarmos a um lugar onde ambos se sintam relativamente satisfeitos, ambos os lados.
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Com relação à questão das encarceradas, eu gostaria de citar o trabalho do Depen, que é um trabalho maravilhoso, cujos agentes à frente são pessoas dedicadas e apaixonadas pela temática, com um trabalho muito forte, inclusive em relação aos LGBTs. Então, é necessário destacar que o trabalho feito pelo Depen é de excelência e que também precisa ser conhecido.
Em relação às delegacias, como alguém citou aqui, gostaria de pontuar também que estamos desenvolvendo um trabalho, juntamente com universidades, para que o atendimento às mulheres em situação de violência doméstica, ao chegarem às delegacias comuns, seja humanizado, seja sensível e que seja multidisciplinar. Também convido a todos para conhecerem esse trabalho de forma mais aproximada.
No que tange ao 180, a nova sede foi recentemente inaugurada e tem apresentando um trabalho muito bom. As ligações estão sendo atendidas, na média, em 30 segundos. É importante reconhecer o quanto se evoluiu com esse trabalho de atendimento das ligações, porque as pessoas foram capacitadas. Eu estive pessoalmente nesse lugar. Embora a central do 180 não seja ligada diretamente ao Departamento de Políticas de Enfrentamento, eu fui convidada a participar da inauguração, conversei com os funcionários que lá trabalham, e, se for o caso, toda esta Mesa e demais pessoas interessadas ou que façam parte dessa temática estão convidadas a conhecerem. Embora o lugar seja sigiloso, não haveria sigilo em relação a nenhuma das pessoas que compõem esta Mesa.
Gostaria de citar ainda o Substitutivo da Câmara nº 5.000-B, de 2016 (PLS nº 8, de 2016, na Casa de origem), que fala justamente sobre os dados estatísticos e que acredito deva receber uma atenção especial, porque nós carecemos de dados, carecemos de estatísticas para lidar melhor com o fenômeno da violência.
Reitero aqui as palavras do Senador Marcos Rogério, ou seja, que não há sociedade forte com família fraca e que o Estado nunca substituirá a família. E novamente reforço o que disse a Dra. Jolúzia: a Igreja pode, sim, ajudar, não só a católica, que é a igreja da qual faço parte, mas todas as outras. E ressalto, por fim, que o Ministério da Família e dos Direitos Humanos é também o Ministério da Mulher, sobretudo da mulher, a espinha dorsal da família, aquela que, quando morre, faz muita falta e desestrutura todo mundo. Somos a favor da vida em qualquer condição. Não importa como.
Era isso. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem.
Essa foi a Dra. Geraldini Grace da Fonseca da Justa, Diretora do Departamento de Políticas de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres.
Gostaria muito de agradecer a todos. Claro que um tema como este a gente não vai esgotar aqui. Todos nós nos encontraremos novamente, em outros momentos, nesta Comissão ou em outros plenários, naturalmente, pela importância que tem aquilo que foi o eixo deste debate: a luta contra a violência às mulheres. Realmente, é assustador o que vem acontecendo, e todos nós temos obrigação de trabalhar mais para combater esse quadro cruel.
Já convido, repito, a todos para, na terça-feira, dia 17 de março, para a audiência pública que teremos aqui para discutir a intolerância religiosa.
Está encerrada a audiência.
Muito, muito obrigado a todos e palmas para vocês, inclusive para aqueles que ficaram aqui até o momento. E vamos tirar uma foto rapidamente com todos da Mesa e com vocês que estão no plenário. Quem quiser vir está convidado. (Palmas.)
(Iniciada às 9 horas, a reunião é encerrada às 12 horas e 48 minutos.)