29/04/2021 - 4ª - Comissão de Agricultura e Reforma Agrária

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO. Fala da Presidência.) - Declaro aberta a 4ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 56ª Legislatura do Senado Federal.
Antes de iniciar os nossos trabalhos, proponho a dispensa da leitura e a aprovação da ata da reunião anterior.
As Sras. e os Srs. Senadores que a aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovada.
Há expediente sobre a mesa, que passo a ler.
Esta Presidência comunica ainda o recebimento da seguinte manifestação externa.
Recomendação 02, de 2021, do Ministério Público Federal, Procuradoria da República de Rondônia ao Incra quanto à sua atuação relacionada à sistemática adotada pelo Memorando-Circular nº 1, de 2019, Incra, à sua sede, que suspendeu a realização de vistorias em imóveis rurais para fins de reforma agrária em processos de obtenção por meio de desapropriação. O Ministério Público Federal cita que áreas públicas de Rondônia, devido à restrição do memorando-circular, têm sido impedidas de cumprirem sua função social constitucionalmente estabelecida de destinação às muitas famílias com perfis de beneficiários de reforma agrária aguardando assentamento.
Conforme instrução normativa da Secretaria-Geral da Mesa, todos os referidos documentos ficarão à disposição da Secretaria desta Comissão e na página da Comissão na internet.
Hoje nós temos como convidados...
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A presente reunião destina-se à realização de audiência pública para debater as proposições legislativas (em especial o PL 510, de 2021) e as regulamentações vigentes sobre regularização fundiária, bem como a aplicação do Decreto nº 10.592, de 2020, que regulamenta a Lei nº 11.952, de 25 de junho de 2009, para dispor sobre a regularização fundiária das áreas rurais situadas em terras da União, no âmbito da Amazônia Legal, e em terras do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, por meio de alienação e concessão de direito real de uso de imóveis.
Os convidados para esta reunião de hoje são: Dra. Brenda Brito, Pesquisadora do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon); Muni Lourenço Silva Júnior, Vice-Presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA); Alair Luiz dos Santos, Secretário de Política Agrária da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag); Luiz Antônio Nabhan Garcia, Secretário Especial de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; Geraldo José...
O SR. JAQUES WAGNER (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Presidente...
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Só um minutinho.
Prossigo: Geraldo José da Camara Ferreira de Melo Filho, Presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra); também o autor do PL 510, o Senador Irajá; e o Senador Carlos Fávaro, que é o Relator desta matéria.
Antes de nós entrarmos nesse assunto, faço algumas considerações muito rápidas com relação ao que o Brasil enfrenta ainda com relação à Covid-19. Nós, infelizmente, atingimos a marca de 400 mil pessoas que faleceram pela Covid-19. Não há outra coisa a fazer senão concentrarmos todas as nossas energias para buscar vacina para toda a população brasileira. Essa é a meta, tenho certeza, de todos os Senadores, de todas as Senadoras, pois estão todos realmente muito preocupados com a situação neste momento.
Nós temos algumas ações importantes a serem feitas no nosso País. Mesmo com relação à Covid-19, nós não nos podemos esquecer da educação do nosso País, não nos podemos esquecer da produção de alimentos, não nos podemos esquecer da nossa infraestrutura.
E, para nós que precisamos aumentar ainda mais a produtividade no nosso País, não só em quantidade, mas também em qualidade, um dos temas é a regularização fundiária. Nós temos que levar documento ao homem do campo, àqueles que têm realmente direito de receber o seu título definitivo e de, posteriormente, fazer a sua escritura.
Nós temos também outro tema importante: recuperação das áreas degradadas, principalmente na Amazônia. No nosso Estado de Rondônia, por exemplo, nós temos aproximadamente 30% de áreas degradadas a serem recuperadas, para aumentarmos a produtividade sem haver desmatamento. É investir nas áreas degradadas.
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E outro ponto: não adianta nós aumentarmos a produtividade, nós aumentarmos a produção, a qualidade do nosso produto, se nós não tivermos infraestrutura para transportar e escoar a nossa produção.
Ao longo deste mês de abril, eu recebi várias comunicações, cartas, pedidos de associações, de cooperativas com relação ao custo Brasil, com relação às estradas brasileiras, com a ameaça do aumento do preço do pedágio nas estradas brasileiras, o que, com certeza, trará um aumento de custo para o nosso País. Nós já contatamos também a Comissão de Infraestrutura do Senado, para que a gente possa avançar nesse debate.
Nós estamos cuidando das questões também de concessões da ANTT, porque há uma consequência direta no custo dos nossos produtos de exportação e também para a população brasileira, que precisa dos alimentos que nós produzimos. Nós temos, por exemplo, as ingerências da ANTT nos contratos de concessão de rodovias da segunda e terceira etapas do programa de concessão de rodovias federais. Esse é um tema que nós vamos trazer em uma próxima audiência pública, junto com a Comissão de Infraestrutura, com relação ao Processo 010.222/2019, que está no TCU, sobre esse tema, que poderá encarecer, e muito, o transporte de carga no nosso País. Aumentando o custo do transporte de carga, vai aumentar o custo da cesta básica da população brasileira.
Há outro pedido que faço com relação à questão de infraestrutura. Nós estamos com vários caminhões tendo dificuldade entre o Estado do Acre e o de Rondônia por conta da construção da ponte na Ponta do Abunã sobre o Rio Madeira na BR-364. Essa obra iniciou-se em 2014. Já está pronta há 45 dias e ainda não foi liberada para que os caminhoneiros possam utilizar a ponte. É importante inaugurar? É importante inaugurar, com certeza, mas a festa maior são dos caminhoneiros, das pessoas que utilizarão essa ponte, que deixarão de utilizar a balsa, que leva hoje duas horas para fazer essa travessia. Nós estamos em meio a uma pandemia, não é hora de concentração de pessoas. Vamos liberar essa ponte. Fica aqui o nosso apelo ao Ministério da Infraestrutura: vamos liberar a ponte sobre o Rio Madeira na Ponta do Abunã. Isso é muito importante para a população de Rondônia e, principalmente, para a população do Acre.
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A atualização e a consolidação de normas legais e regras administrativas para fazer a regularização fundiária acontecer com mais rapidez em todo o País, com menos burocracia e mais segurança jurídica, promovendo a cidadania no campo e na cidade, é o que buscamos com esta audiência pública. Esse é um tema que a gente tem discutido muito aqui no Senado e que precisa sair do campo das discussões políticas, ideológicas e técnicas para o campo da prática, da realização, ou seja, o título da terra na mão dos agricultores.
Esta audiência pública é resultado de um acordo que fizemos com os demais Senadores no último dia 15 de abril, quando aprovamos, no Plenário virtual do Senado, o PL 4.348, de 2019, que trata da regularização fundiária das ocupações com características de colonização de terras da União reconhecidas antes de 10 de outubro de 2008. A aprovação dessa matéria no Plenário do Senado já foi um grande avanço. Agradeço mais uma vez aos Senadores e às Senadoras pela aprovação da matéria. Estamos aqui cumprindo o nosso acordo e ampliando o debate sobre este tema. Portanto, esta audiência pública também atende ao acordo que realizamos na sessão plenária de ontem, quarta-feira, dia 28 de abril, quando estava na pauta o PL 510, de 2021, de autoria do Senador Irajá e relatado pelo Senador Carlos Fávaro. O PL 510, que também trata da regularização fundiária, das ocupações incidentes em terras situadas em áreas da União foi retirado de pauta para que pudéssemos discutir seu mérito de forma mais ampla, aqui nesta audiência pública.
É bom que fique bem claro que nosso objetivo aqui hoje é discutir como podemos articular a regularização fundiária em terras da União, de que tratam tanto o Decreto 10.592, de 2020, como o PL 510.
Não vamos tratar aqui de regularização de terras invadidas, de terras griladas ou ocupadas de forma irregular. Não vamos tratar de regularização de reservas ambientais, unidades de conservação, terras indígenas ou qualquer outra situação que não esteja na ementa do Decreto 10.592 e do PL 510, sendo que ambos tratam exclusivamente das ocupações em terras da União e do Incra.
O que buscamos é a evolução e a modernização do processo de regularização fundiária no País, com a utilização de tecnologia, como o sensoriamento remoto, o cruzamento dos bancos de dados e a parceria com as prefeituras, para dar mais agilidade, segurança, transparência a todo o processo.
Precisamos aperfeiçoar a aplicação das legislações existentes, o que pode ocorrer com a aprovação do PL 510 e de outros projetos que estão tramitando nesta Casa, não só nesta Comissão, mas em outras Comissões, projetos que tratam da regularização fundiária ou da recuperação de áreas degradadas, como o PLS 403, de 2017, que institui o Programa de Restauração de Áreas Degradadas na Amazônia ou simplesmente Restaura Amazônia. Esse projeto de minha autoria está tramitando na Comissão de Assuntos Econômicos, onde aguarda a sua votação.
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Através desse projeto, proponho incentivos fiscais para restauração ambiental de áreas degradadas ou em vias de degradação na Amazônia Legal. Por meio do Restaura Amazônia, sugiro instrumentos financeiros para compensação dos proprietários, concedendo, por exemplo, isenção de alguns tributos, tais como o Imposto de Renda e o Imposto Territorial Rural, para os proprietários de imóveis que aderirem ao programa e cujas declarações anuais à Receita Federal evidenciem a restauração da área identificada como degradada, bem como seu uso sustentável.
Nós recebemos do nosso colega Senador Jaques Wagner, Presidente da Comissão de Meio Ambiente, um relatório da PUC do Rio de Janeiro que trata de iniciativas de políticas climáticas que contém críticas e sugestões ao PL 510/2021, que passo à mão do Relator para que possa fazer a análise dessas informações.
Também informo que recebemos a indicação, através do Senador Jaques Wagner, de mais uma pessoa para debater junto conosco esse tema, também da Senadora Eliziane Gama. Eu informo, em função inclusive do horário de início da nossa reunião, da nossa audiência pública, que nós teremos que terminá-la às 15h30, para que o Presidente do Senado possa dar início à Ordem do Dia do Senado Federal.
Eu proponho aos colegas Senadores e Senadoras, como esses dois nomes - não os tenho aqui agora - não estão incluídos na pauta de hoje, e creio que não vamos conseguir ouvir a todos que estão convidados a participar, que nós incluamos esses dois nomes nessa audiência e passemos a ouvir até 15h30 aqueles que nós conseguirmos ouvir, e poderemos dar continuidade na segunda-feira, a partir das 14h, se as Sras. e os Srs. Senadores concordarem, pois eu acho importante nós ouvirmos, Senador Carlos Fávaro, todos aqueles segmentos que têm interesse em contribuir para o PL 510. É importante debatermos, ouvirmos todos aqueles que podem nos ajudar a melhorar o PL 510.
Portanto, eu sugiro que a gente inicie a nossa audiência pública e possamos dar sequência até às 15h30, darmos um intervalo e reiniciarmos se não conseguirmos finalizar - entendo que não, porque temos apenas uma hora para que todos possam fazer suas considerações -, darmos sequência segunda-feira. E aí sim, nós incluiremos os dois nomes indicados, tanto pelo Senador Jaques Wagner, Presidente da Comissão de Meio Ambiente, como também pela Senadora Eliziane Gama.
Passo a palavra ao Senador Jaques Wagner.
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O SR. JAQUES WAGNER (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA. Pela ordem.) - Não, Presidente Acir. Na verdade, eu tinha pedido uma questão de ordem simplesmente para tentar essa inclusão. Mas a solução dada por V. Exa. me atende e eu agradeço.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado, Senador Jaques Wagner.
Eu entendo que é um assunto importantíssimo. Nós não podemos perder a oportunidade de fazer esse debate ampliado, com todos aqueles que pretendem e querem contribuir para que a gente possa, de fato, fazer acontecer a regularização fundiária com toda a segurança necessária, com toda a segurança com relação ao meio ambiente, com relação a todos aqueles que estão nas suas áreas, que precisam e dependem dessa regularização.
Eu agradeço a compreensão de todos os Senadores e Senadoras e passo a palavra agora, de pronto, ao nosso Relator do PL 510, Senador Carlos Fávaro.
O SR. CARLOS FÁVARO (PSD - MT. Para discursar.) - Muito obrigado, Sr. Presidente, Senador colega Acir Gurgacz, também demais Senadores e Senadoras que estão participando desta importante audiência pública, convidados, todos que querem contribuir com esse tema tão relevante para o nosso País.
Primeiramente, Sr. Presidente, eu quero fazer o uso inicial e muito breve neste momento das minhas palavras porque o que nos interessa neste momento é ouvir sugestões, é ouvir as demandas para que nós possamos, de fato, fazer um projeto de lei equilibrado, que venha atender de forma eficiente a regularização fundiária com a preservação ambiental.
Eu vou, de novo, passar o conceito daquilo tudo que falei com os colegas Senadores nos últimos dias. O senhor disse muito bem na introdução, na abertura desta audiência pública. Ninguém está aqui para contemporizar grileiro de terra; ninguém está aqui para ser conivente com crimes ambientais.
Eu e o Senador Jaques Wagner conversamos bastante ontem, fiquei muito feliz com a nossa conversa, entendimentos de que podemos e devemos ter políticas públicas com eficiência, porque o mundo todo quer produção sustentável, equilibrada, respeitando o meio ambiente, respeitando as leis trabalhistas, respeitando o direito de produzir, mas respeitando o direito do consumidor internacional, que quer essa segurança jurídica.
Portanto, amigos, minha participação inicial é no sentido de estar aberto. Eu ontem fiz mais convites ainda de todos os que se manifestaram em redes sociais, muitos até com críticas antecipadas. Nós não precisamos ter esse tipo de preconceito, nós temos que vir para dentro do debate. Estou completamente aberto como Relator, como também o autor do projeto, Senador Irajá, a quem quero agradecer a confiança, assim como do Presidente Rodrigo Pacheco, por me designar como Relator desse projeto. Em nenhum momento eu consegui encontrar dentro do Projeto de Lei 510 onde se flexibiliza, que seja conivente com crimes ambientais. Não vou sair desse tema com essa flexibilização.
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Também deixo muito claro: não vamos defender latifundiários. Esse projeto de lei visa a regularizar as terras de pequenos e médios produtores, e é isso o que faremos com o apoio de todos que contribuírem nesse sentido.
Por isso, Sr. Presidente, quero, a partir de agora, mais ouvir, para que nós possamos chegar ao final desta audiência pública, na segunda-feira, equilibrados para trazer esse assunto à pauta do Senado Federal e votarmos com tranquilidade o melhor texto possível.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado, Senador Carlos Fávaro.
Passo a palavra ao Senador Irajá, que é autor do PL 510.
V. Exa. tem a palavra, Senador Irajá.
O SR. IRAJÁ (PSD - TO) - Boa tarde, Presidente Acir Gurgacz, boa tarde meus colegas Senadores e Senadoras.
Eu ouvi atentamente...
Está me ouvindo, Presidente?
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Sim, estamos ouvindo.
O SR. IRAJÁ (PSD - TO. Para discursar.) - Ótimo!
Eu ouvi atentamente o nosso Relator, o amigo Carlos Fávaro, que, talvez, entre os 81 Senadores que estão presentes hoje nesta legislatura, seja o Senador mais habilitado para poder tratar desse tema de regularização fundiária, porque ele viveu na pele o drama que os assentados do Brasil, os pequenos produtores enfrentam e sofrem com a falta da sua terra reconhecida perante as instituições constituídas no Brasil. Como ele vivenciou isso há 40 anos - e ele deu esse depoimento na sessão de ontem, quando todos puderam acompanhar -, ele está, mais do que todos nós, credenciado a poder mediar e fazer essa interlocução em torno de um marco regulatório que seja compatível com a necessidade do nosso País, que respeite as nossas leis, a nossa soberania, que preserve o meio ambiente, que garanta o cumprimento da função social da terra - que é produção, não é especulação -, e também as leis trabalhistas, entre outras obrigações.
Então, Fávaro, eu fico muito feliz, na condição de autor deste projeto, e lisonjeado, por ter você conduzindo e liderando esse processo de poder ser o interlocutor para que nós possamos chegar a um entendimento com racionalidade, com equilíbrio e, acima de tudo, com o senso de urgência que requer este assunto.
É um projeto que já vem sendo exaustivamente discutido no Congresso Nacional, especialmente nesses últimos dois anos, quando tivemos a nossa MP 910 editada pelo Executivo e que, no entanto, teve a sua caducidade depois de quatro meses. Infelizmente, nós não conseguimos avançar na discussão no Senado e na Câmara porque entramos nesse período da pandemia e os trabalhos da Comissão Especial constituída foram suspensos, e isso prejudicou a sua tramitação.
No entanto, nós estamos diante de uma nova oportunidade de poder rediscutir esse assunto e, sob a sua liderança, sob o seu conhecimento, com o seu know-how como pequeno produtor que chegou ao Mato Grosso há 40 anos como assentado e que passou por essa experiência ruim, você, mais do que todos nós aqui, sem desmerecer nenhum colega que estaria também em condições de relatar esse projeto, mas, pela sua experiência, eu percebo que todos nós ficamos muito confortáveis de você poder fazer esse bom trabalho que você iniciou como Relator do Projeto 510/2021.
É uma oportunidade ímpar de nós podermos aprovar um marco regulatório que seja verdadeiramente uma oportunidade para essas pessoas, quase 300 mil famílias no Brasil, que esperam há décadas por essa chance de terem o título definitivo da sua terra. Esse marco regulatório, na verdade, vai corrigir essa injustiça histórica de décadas dessas pessoas que esperam uma chance de poder tirar um financiamento da sua propriedade, tirar um custeio, um investimento, melhorar a condição de vida da sua família, gerar emprego e, claro, também, como dono da terra, ser um grande cumpridor das leis, porque é disso que se trata o projeto. Uma terra sem dono é uma terra sem lei. Eu enfatizei muito isso na fala que tive a oportunidade de poder transmitir durante a nossa sessão.
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Nesse sentido, o projeto fortalece o combate ao desmatamento, porque ninguém fica no anonimato, nem o criminoso e muito menos as pessoas de boa-fé vão ficar à margem da lei e vão ficar na sombra da União, porque é isto que está acontecendo hoje: tanto o criminoso quanto as pessoas de boa-fé, que são a grande maioria, estão à margem da lei e ficam na sombra da União, que hoje é o verdadeiro proprietário, é o verdadeiro detentor do domínio - claro, sem considerar que existe a posse pacífica e mansa na grande maioria dos casos. Mas, uma vez reconhecida a titularidade dessa área, os nossos órgãos de controle, como o Ibama, como o Ministério do Trabalho, como o próprio Incra, poderão cumprir o seu papel de fiscalizador, o seu trabalho punitivo, quando for o caso, àqueles que não estiverem cumprindo a lei.
Portanto, além de estarmos corrigindo essa distorção histórica com mais de 300 mil famílias, nós estaremos dando e responsabilizando essas pessoas que estão na posse desses imóveis rurais por todos os Estados brasileiros, principalmente nos sete Estados que compõem o nosso bioma amazônico, entre eles o meu Estado do Tocantins.
Mas eu tenho absoluta confiança, Presidente Acir e meus colegas Senadores e Senadoras, de que, com o bom senso, com o espírito que nos une, que é de poder corrigir essa distorção histórica de regularizar essas famílias de pessoas de boa-fé, que representam a grande maioria dos casos... E nosso papel aqui é discutir e definir uma lei que beneficie a maioria, que são os 99% de brasileiros de boa-fé que existem, e jamais contemplar criminosos, que representam a minoria ou o 1% que seja. E este é um papel em que precisamos nos debruçar nos próximos dias: fazer esse enfrentamento, respeitando as opiniões divergentes, as posições de cada um, mesmo aqueles que são contrários, mas procurando chegar a um entendimento e principalmente se apegando à racionalidade, que eu acho que é o que deve nortear o nosso trabalho nesta audiência pública e que, acima de tudo, vai também conduzir o trabalho do nosso grande Relator Carlos Fávaro.
Eu encerro as minhas palavras, Presidente, agradecendo a todos que têm contribuído com as suas emendas. Ninguém aqui é dono da razão, muito menos eu, também o nosso Relator Carlos Fávaro. Nós estamos aqui como instrumento para poder construir um texto que seja adequado, compatível, responsável e que possa modernizar esse marco regulatório, que é arcaico, obsoleto e que, infelizmente, não deu certo, porque, se tivesse dado certo, esse passivo todo já teria sido resolvido. Essa é a maior prova de que a lei que nós temos atualmente não tem resolvido o problema desses pequenos produtores brasileiros.
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É igual ao exemplo, Carlos Fávaro, de uma turma que tem 50 alunos; se 49 reprovam, a culpa é do professor ou dos alunos? É a mesma analogia que eu faço para as leis que nós temos atualmente voltadas à regularização fundiária. Existe um arcabouço jurídico de leis que tratam desse assunto da regularização; no entanto, na prática, esses pequenos produtores não são regularizados. Então, o problema não pode ser com eles. A grande maioria está errada? Ou é a lei que não está adequada, ou porque ela não proporciona algum tipo de desburocratização e não permite que essas pessoas possam receber o seu título definitivo?
Mas eu encerro definitivamente, Presidente, agradecendo a contribuição de todos os Senadores, através das suas emendas, e me coloco à inteira disposição, para que a gente possa, num debate de alto nível, conseguir definir um texto que seja razoável e que nós possamos aprovar na semana que vem.
Muito obrigado, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado, Senador Irajá.
Pedem a palavra aqui o Senador Wellington Fagundes e o Senador Izalci. Pergunto se é agora ou se é para depois dos nossos oradores.
Depois, não é? Muito bem.
Só para atualizar, então, os nossos convidados... Além dos que eu já mencionei, também incluímos agora, a partir do início da reunião, Professora Raoni Rajão, da Universidade Federal de Minas Gerais, e a Dra. Cristina Leme Lopes, pesquisadora da PUC do Rio de Janeiro. E também Evaristo Eduardo de Miranda, pesquisador da Embrapa. São esses, então, os convidados, os oradores desta tarde.
Passo a palavra agora para a Dra. Brenda Brito, pesquisadora do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon).
V. Sa. tem em torno de 15 minutos, se assim o desejar. Se precisar de um pouco mais, não há problema. (Pausa.)
A senhora precisa liberar o seu microfone.
A SRA. BRENDA BRITO - Agora sim, não é?
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Agora sim.
A SRA. BRENDA BRITO (Para expor.) - Ótimo. Obrigada.
Bem, boa tarde a todas e todos os Senadores e Senadoras presentes, ao Senador Acir Gurgacz, Presidente da Comissão, a quem agradeço o convite para falar nesta audiência, representando o Imazon, que é um instituto de pesquisa não governamental brasileiro, sediado em Belém, fundado há 30 anos, que tem como missão promover o desenvolvimento sustentável e conservacional da Amazônia.
Nós temos, nos últimos 15 anos, estudado e nos debruçado sobre esse tema fundiário, especialmente na Amazônia. Temos várias publicações sobre o tema. Publicamos, há pouco tempo, um relatório chamado "Dez fatos essenciais sobre regularização fundiária na Amazônia Legal" e também temos uma nota técnica específica sobre o Projeto de Lei 510, de 2021, sobre o qual vou dedicar a maior parte da minha fala hoje.
Eu queria, inicialmente, enfatizar que a regularização fundiária é importante para garantir a segurança no campo, para reduzir conflitos, para gerar renda, desenvolvimento... Acho que, quanto a isso, não há contradições, não é? Nós todos concordamos. Mas é igualmente importante que as leis e práticas fundiárias sejam compatíveis com as leis ambientais e com os objetivos de redução do desmatamento. Ou seja, o Brasil precisa resolver o seu passivo fundiário, precisa regularizar as demandas legítimas de direito à terra, sem provocar mais ocupação ilegal de terras públicas associada a desmatamento. Esse é o nosso grande desafio nesse tema. Mas, infelizmente, na minha avaliação, o Projeto de Lei 510 não traz inovações para combater grilagens de terras ou para avançar na regularização fundiária com as salvaguardas necessárias no tema socioambiental, e ainda podem estimular novas invasões de terras públicas associadas ao desmatamento.
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Para explicar melhor essa minha posição, eu queria abordar três aspectos principais. Primeiro, esse argumento de que é necessário titular a terra para reduzir o desmatamento, na lógica de que só quando a gente consegue identificar quem desmata que é possível punir. Esse é um argumento que tem sido muito falado, principalmente nos últimos dois anos, por conta do aumento absurdo de desmatamento, especialmente na Amazônia, que ocorreu a partir desse ano de 2019, que superou, pela primeira vez em uma década, 10 mil quilômetros quadrados de desmatamento. Na minha avaliação, essa afirmação não possui nem base jurídica nem base científica. Do ponto de vista jurídico, não existe, na legislação ambiental brasileira, a exigência de que uma pessoa só pode ser punida por praticar um dano ambiental se ela for dona do imóvel, até porque a gente tem, na própria Lei de Crimes Ambientais, a previsão do crime de desmatar floresta pública. Então, não faz sentido dizer que eu não posso punir quem está praticando o desmatamento em floresta pública porque essa pessoa não é dona dessa área. E há vários estudos, como um estudo do MapBiomas, por exemplo, que indica que já é possível identificar CPFs e CNPJs ligados a desmatamentos ilegais em 75% dos casos, usando informações que já estão disponíveis em cadastros governamentais, como, por exemplo, o Cadastro Ambiental Rural. Então, basta realmente, se houver essa intenção de punir o crime ambiental, utilizar essas informações para poder identificar quem está praticando o desmatamento legal.
O segundo ponto é que essas florestas que estão sendo desmatadas têm dono, e os donos somos todos nós brasileiros e brasileiras, porque a gente está falando de terras públicas - terras públicas da União, como foi colocado aqui. São florestas públicas, e a manutenção dessas florestas como públicas é fundamental para que elas continuem sendo conservadas, porque vários estudos que foram publicados na última década mostram que as áreas mais conservadas são justamente as áreas públicas protegidas, especialmente como terras indígenas ou também como unidades de conservação. O projeto MapBiomas também fez uma avaliação que mostra que, nos últimos 35 anos, as áreas mais desmatadas são justamente as áreas privadas, e as áreas mais conservadas são as áreas públicas protegidas. Então, se a gente quer, como Nação, reduzir o desmatamento, a gente precisa alocar essas florestas rapidamente para proteção, porque senão elas acabam sendo alvo de ocupação ilegal.
No Imazon, a gente estima que, em média, 40% do desmatamento anual na Amazônia está ocorrendo nessas áreas públicas que ainda não tiveram uma destinação, mas isso não significa dizer que essas áreas devem ser tituladas, porque, na nossa avaliação, fazer isso é, na verdade, premiar o desmatamento, não é punir o desmatamento. E esse tipo de desmatamento que ocorre nas florestas públicas está acontecendo justamente para forçar a privatização dessas áreas. Isso é um ciclo histórico que se repete aqui na Amazônia, que já aconteceu em outras regiões do Brasil, mas que agora visivelmente ocorre na Amazônia, que começa justamente com a ocupação, com a invasão de uma terra pública; seguido de desmatamento para demonstrar o uso dessa área. Na sequência, esse imóvel é loteado, é inscrito em cadastros, como o Cadastro Ambiental Rural; quem ocupou pede um título de terra para esse imóvel, muitas vezes acaba vendendo essa ocupação para terceiros que acabam comprando muitas vezes de boa-fé, sem saber que se trata de uma área ilegalmente ocupada. Quando a lei não permite que essas áreas sejam regularizadas, o que a gente observa é uma pressão sobre o Congresso, justamente para mudar a lei. E, quando essa lei é mudada, a gente, então, acende essa nova expectativa de que as áreas continuem sendo ocupadas, porque no futuro vai haver uma mudança da lei que vai legalizar essas ocupações.
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A gente viu exatamente isso acontecendo quatro anos atrás, porque a Lei 11.952, sobre a qual a gente está conversando aqui hoje, já foi amplamente modificada em 2017. Inclusive, foi feita uma extensão do prazo de ocupação de terra pública em que pode ser legalizada. Esse prazo era 2004 e, com a lei mudada em 2017, passou a ser 2011, se a gente considerar todas as situações que são previstas na lei. E a minha avaliação do PL 510 é que há uma tentativa de ampliar esse marco temporal, agora, para 2014, porque a gente precisa olhar não só lá o que está no art. 5º, que fala 2012, mas também a proposta do art. 38, que acaba estendendo isso para 2014.
E o ponto que eu acho que talvez seja um dos mais problemáticos do PL é que, também no art. 38, há uma proposta de permitir a legalização de áreas públicas que sejam, na minha avaliação, invadidas a qualquer tempo, inclusive no futuro, porque o artigo prevê que imóveis que não atendam aos requisitos de regularização, ou seja, por exemplo, a ocupação ocorreu após o marco temporal, que esses casos que sejam indeferidos possam ser privatizados via licitação, mas dando preferência para quem ocupou e invadiu essa terra.
Então, aprovar o PL 510 com essa redação vai permitir a venda de terra pública ocupada após o marco temporal, o que é um estímulo direto para que haja mais ocupação de terra pública na expectativa de que essas áreas sejam regularizadas. E a gente sabe que isso está associado ao desmatamento.
A gente já estimou no Imazon que esse tipo de mudança na lei pode levar a um desmatamento adicional de até 16 mil quilômetros quadrados, fora o desmatamento que já está ocorrendo todo ano. E isso se a gente considerar... No nosso estudo, a gente considerou uma área de 19 milhões de hectares, que já estava, digamos, carimbada como área para regularização fundiária pelo Governo Federal. Mas a gente sabe que esse PL vai abranger uma área ainda maior e também fora da Amazônia. Então, na prática, a gente nem sabe ainda qual é o possível impacto total de desmatamento que esse tipo de disposição pode trazer.
Um segundo argumento que eu gostaria de trazer aqui para os senhores é a questão de se precisa ou não mudar a lei para corrigir essa injustiça, de fato, histórica com milhares de famílias que aguardam o título de terra há décadas - isso é fato. Aqui na Amazônia isso é uma situação infelizmente. A gente sabe que há um passivo. A questão é que essas demandas já estão plenamente cobertas na atual Lei 11.952, porque ela já prevê, como eu falei, a regularização para pessoas que ocuparam terra pública até 2011. Então, não faz sentido defender que é preciso aprovar o PL para reconhecer o direito de quem já está nessa área há décadas, desde que essas pessoas, obviamente, ocupem de forma pacífica e estejam produzindo. Então, não faz sentido mudar a lei para atender essas famílias. O que a gente precisa é implementar a legislação.
E o terceiro ponto que eu gostaria de trazer é a proposta do PL de praticamente retirar a vistoria prévia ao imóvel como se fosse uma solução para resolver a demora na titulação ou uma possível desburocratização. Entendo que isso também não está certo, está equivocado, porque, se a dispensa de vistoria é a solução para agilizar a regularização fundiária, então eu entendo que essa solução já nasce fracassada, porque a maior parte dos imóveis que aguarda a titulação nunca precisaram de vistoria. Desde a aprovação lá atrás, em 2009, da Lei 11.952, os imóveis de até quatro módulos fiscais, que são imóveis da agricultura familiar e que, segundo o Incra, são em torno de 80% dos imóveis que aguardam a titulação, não precisam de vistoria prévia. Então, se fosse verdade que a vistoria é aquilo que emperra a regularização, como é que pode, depois de 12 anos da lei, ainda haver tantos imóveis, a maioria, justamente nessa faixa de tamanho que aguardam titulação?
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É bom e importante reforçar que é impossível ter certeza se a área tem conflito, se tem ou não conflito, só olhando pela imagem de satélite. O uso de tecnologia, de sensoriamento remoto, é importante, é bem-vindo, o Incra já tem o sistema, desde 2019, que faz esse trabalho, que cruza dados, o uso já está regulamentado pelo Decreto 10.952, de 2020, já pode, já se está usando essas ferramentas. E é importante porque pode, sim, reduzir o tempo de vistoria, é possível pela imagem de satélite já ter uma noção se a área tem ou não uso produtivo, mas a lei exige a ocupação mansa e pacífica, e sem vistoria não tem como garantir isso.
Então, aumentar o tamanho dos imóveis que têm essa dispensa de vistoria ou até excluir, como propõe o PL 510, aumenta o risco de titulação em áreas com conflito, e conflito não traz segurança jurídica, que é o que se pretende ao final, a gente quer a segurança jurídica no campo também.
E, além disso, essa dispensa que está sendo proposta acaba contrariando uma decisão do STF, que já julgou a Lei 11.952 e considerou que a vistoria só pode ser dispensada para imóveis de até quatro módulos fiscais e se houver uma checagem robusta de banco de dados que deem segurança de que aquela área, de fato, de que o titular daquela área não está violando nenhum outro direito, mas eu não vejo no PL 510 inovações que, de fato, contribuam com essa robustez na checagem e que digam que com segurança é possível dispensar a vistoria, porque "olha, eu consigo com esses dados, agora, checar conflitos". Infelizmente, não vejo que isso está sendo proposto no PL.
Nesse tema de demora para titulação, que eu acho que é um dos principais nesse caso, eu realmente queria chamar a atenção - imagino que o Presidente do Incra vai apresentar os dados de titulação que ocorreram nos últimos anos - para um dado da titulação de terra feita diretamente pelo Governo Federal, em títulos definitivos, em 2019 e 2020. O Incra emite vários tipos de títulos: títulos para assentamentos, títulos provisórios, liberação de cláusulas resolutivas, enfim, mas a gente está falando aqui da Lei 11.952, e eu acho que é importante focar nos títulos definitivos de terra. Quando a gente olha para a média, de 2009 a 2018, a gente vê que houve uma média de 3.190 títulos emitidos por ano, o que não é suficiente, é baixo desempenho. Eu acompanhei a implementação dessa lei, a gente tem vários relatórios analisando, é um desempenho baixo, até porque já chegou em um momento a ser quase 10 mil títulos. Então, de fato, houve uma queda, mas a média é de 3 mil títulos.
Quando a gente olha o que aconteceu em 2019 e 2020, a gente vê, segundo informações que o Incra enviou para o STF, numa nota técnica recente, que em 2019 foi emitido um título definitivo diretamente pelo Incra. Em 2020, foram 553. Eu trago essas informações porque se a preocupação do Senado, do Congresso, é acelerar a titulação, esse tipo de titulação, com a segurança que é necessária e propor uma solução para isso, eu acho que é importante o Congresso questionar por que houve uma redução tão brusca no número de titulação, porque se já era baixo, ficou ainda pior. A gente saiu de 3 mil para, agora, 553 e 1 em 2019.
Então, eu entendo aqui que realmente houve uma decisão precipitada de repassar para o Incra essa atribuição, porque é importante lembrar que a implementação da Lei 11.952 não era do Incra, desde a aprovação em 2009 havia uma estrutura fora do Incra para implementar essa lei; o Incra participava de vários, de diferentes momentos - e muitos que são importantes nessa prática -, mas de fato não era lá que tramitava. Então, o que aconteceu? Houve uma decisão do Estado de repassar isso para o Incra sem dar as condições adequadas. Veio um legado de, como o próprio Presidente do Incra já falou em outras situações, processos de papel. A equipe foi totalmente dispersada, então não ficou o histórico daquele processo dentro da instituição, e, de fato, não foram dadas as condições para que essa implementação acontecesse. Eu acho que esse é um ponto talvez principal que deveria ser avaliado para realmente ver que tipo de medidas podem ser feitas para reforçar a capacidade institucional do Incra, porque não vai adiantar mudar a lei agora, tentando fazer todas essas flexibilizações que eu comentei aqui, se no final não houver estrutura. Vai continuar sendo lento. Infelizmente, essa é a realidade.
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E, antes de concluir, eu queria enfatizar que qualquer solução para esse tema fundiário realmente requer um ambiente de confiança, de diálogo e de transparência, e, infelizmente, esses três aspectos não existem atualmente quando a gente fala desse tema, quando a gente fala do Governo Federal, em alguns casos eu diria até do governo estadual, e do ponto de vista da sociedade mais ampla, isso porque o comitê que foi previsto, que está previsto na Lei 11.952 para acompanhar a implementação dessa lei foi extinto em 2019 e até hoje não foi recriado. Então, não existe, efetivamente, um espaço para o acompanhamento da sociedade, dos Estados, dos diferentes atores, para entender como tem sido a aplicação dessa lei e para contribuir com soluções, porque é importante esse tipo de espaço justamente para poder discutir as soluções que podem ser dadas.
Então, eu acho que é importante registrar isso aqui de que este tema requer realmente um ambiente de transparência e de diálogo e que, infelizmente, isso não está acontecendo.
Eu teria outros pontos para trazer sobre problemas e riscos do PL, mas eu gostaria, obviamente, de encerrar e dar espaço para que outras pessoas possam falar. Deixo a sugestão de que os assessores, os Senadores e Senadoras possam ler a nossa nota técnica, em que a gente detalha vários outros aspectos que entendemos serem problemáticos no PL.
E eu queria finalizar reforçando que qualquer tentativa, proposta de mudar a lei fundiária que pretenda permitir titulação de terras públicas invadidas depois de prazos previstos em lei, que atualmente é 2011, isso é, sim, falar em legalização da grilagem, porque grilagem também é invadir terra pública com a intenção de ocupá-la, é um crime previsto numa lei de 1966. Então, toda vez que se permite que isso aconteça e se legalize, a gente está na prática, como País, legalizando a grilagem; a gente está premiando, a gente não está punindo quem está desmatando para ocupar a terra.
Então, eu entendo que, como País, como Brasil, a gente realmente precisa dar um basta nesse ciclo de grilagem de desmatamento se a gente tem qualquer intenção de conservar a Floresta Amazônica, de produzir de forma sustentável e de ter credibilidade dos nossos compromissos de redução de desmatamento.
Eu agradeço mais uma vez pela oportunidade e fico à disposição para qualquer discussão e perguntas.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado, Dra. Brenda Brito, pela sua colaboração. E concordo plenamente com a senhora: tem que haver confiança, diálogo e muita transparência para que a gente possa avançar nessa questão de regularização fundiária.
Eu entendo que há, sim, uma ligação direta entre a regularização e a diminuição do desmatamento ilegal. Não creio que a regularização possa trazer um aumento de desmatamento. Mas isso é só uma opinião. Mas entendo e agradeço a sua contribuição.
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E vamos continuar a debater este tema, que é da maior importância para toda a população brasileira.
Passo a palavra, agora, ao Dr. Muni Lourenço Silva Júnior, Vice-Presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
V. Sa. tem 15 minutos também, um pouquinho mais, comparado com a Dra. Brenda Brito.
O SR. MUNI LOURENÇO SILVA JÚNIOR (Para expor.) - Boa tarde, Senador Acir Gurgacz.
Boa tarde, Senador Carlos Fávaro, Relator da matéria, e todos os Exmos. Senadores presentes nesta audiência pública virtual.
Queremos agradecer, Senador Acir, em nome da nossa Presidência da CNA, João Martins, o honroso convite para que nós pudéssemos participar desta audiência pública, que debate um tema de extrema relevância para o nosso País e, em particular, para o nosso setor rural.
A nossa visão é de que a regularização fundiária é uma política pública essencial para o desenvolvimento econômico e social do nosso País. Para o nosso setor rural, o Estado brasileiro, como foi dito por vários que já se pronunciaram, tem uma dívida história. Existe uma injustiça histórica com milhares de pessoas, milhares de brasileiros que estão no campo, aguardando reconhecimento de um direito constitucionalmente assegurado, que é o direito à propriedade, brasileiros em especial que estão aqui na Amazônia, na nossa Amazônia. Muitos deles, inclusive, aqui estão porque atenderam o chamamento do Estado brasileiro, há décadas, para ocupar a Amazônia, para produzir na Amazônia. Aqui estão já na segunda, até na terceira geração, aguardando por esse reconhecimento. Verdadeiros heróis, enfrentando toda a sorte de doenças tropicais, carência de infraestrutura para ganhar o seu pão e produzir de sol a sol, honestamente, para o sustento das suas famílias.
Para nós, CNA, e, por extensão, para os produtores rurais brasileiros, Senador Acir, regularização fundiária é sinônimo de segurança jurídica, de cidadania, de acesso a políticas públicas, como, por exemplo, o financiamento do crédito rural, tão fundamentais para o crescimento da renda das famílias rurais. É sinônimo de tranquilidade, de paz no campo, de tranquilidade na sucessão familiar e também de desenvolvimento econômico e social do campo.
A nossa visão é de que este debate é muito importante e urgente. É imperioso que nós tenhamos regras que possam acelerar a regularização fundiária com segurança, com precisão, para que esses milhares de produtores, esses milhares de brasileiros tenham esse atendimento, esse reconhecimento por parte das políticas públicas.
A nosso ver, o relatório do Senador Irajá no PL 510 apresenta significativos avanços no sentido de proporcionar essa celeridade à regularização fundiária.
Queremos destacar, aqui, alguns pontos muito importantes trazidos por esse relatório. O primeiro deles, o aumento do escopo da atuação da regularização fundiária, unificando a legislação de regularização fundiária para todo o nosso País, e não só para a Amazônia Legal. Outro ponto fundamental: alteração do marco temporal, com a possibilidade da comprovação do exercício de ocupação e de exploração direta, mansa, pacífica e de boa-fé anteriores a 25 de maio de 2012, data de edição do Código Florestal, de modo realmente a prestigiar e a reconhecer a ocupação, a tempo relevante, daqueles que estão no campo para efeito de regularização fundiária.
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Um outro ponto fundamental que consideramos neste relatório, neste PL, é o limite de área de até 2.500 hectares, atendendo ao limite previsto na Constituição Federal. Também outro ponto fundamental é a possibilidade de regularização de títulos antigos, firmados até 10 de dezembro de 2019, por requerente anteriormente beneficiado por programa de reforma agrária.
Outro ponto bem-vindo amplia a utilização de tecnologia remota para verificação das informações prestadas e nas vistorias, ressaltando, mantendo a obrigatoriedade das vistorias em caso de infrações ambientais e de conflitos fundiários.
No mundo de hoje, nós não podemos abrir mão dessas tecnologias que dão segurança, dão precisão e possibilitam a ampliação da política pública para todos os produtores. A nosso ver, inclusive, ainda reportando à questão da limitação de área, todos são produtores, pequenos, médios e grandes, e o direito à regularização fundiária, o direito à propriedade, previsto na Constituição, não se restringe a um determinado porte de produtores. Nós não podemos, a nosso ver, confundir a integridade, o caráter, a idoneidade com o tamanho da área que o cidadão ocupa para efeito de ser beneficiado com a política pública. A política pública tão importante que o Congresso hoje discute, a nosso ver, não pode ter o caráter excludente. É muito importante que ela seja ampliada, como prevê o relatório do Senador Irajá, para contemplar, para que não se condenem médios produtores, principalmente, e até mesmo grandes produtores, a permanecerem numa fila, praticamente interminável, de espera por um título de terra. Quantos produtores aqui na nossa região, na Amazônia, quando jovens, protocolaram pedido de regularização fundiária, envelheceram, faleceram, e não conseguiram obter o título da terra? Isso traz, realmente, um contexto de muita insegurança jurídica.
Outro ponto que nós entendemos importante é a metodologia do georreferenciamento por sensoriamento remoto; a questão, muito bem salientada, do cumprimento da legislação ambiental. Nós não concordamos com algumas versões, narrativas, que procuram, de forma ofensiva, e isso tem o nosso repúdio, misturar produtor rural com grileiro. São questões completamente diferentes. Grileiro é exceção. A maioria esmagadora, absoluta, são pessoas de bem, trabalhadores, lutadores, que não podem de maneira alguma serem confundidos com infratores ambientais ou da legislação posta. Para isso, esse PL, a nosso ver, não flexibiliza qualquer salvaguarda ambiental. Então não há risco de flexibilização ou afrouxamento de exigências ambientais.
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Outro ponto positivo que o PL traz, a nosso ver, é a dispensa de pagamento de custas, de emolumentos e demais tributos no registro de títulos expedidos pela União, ainda não registrados, como forma de incentivar a regularização fundiária, a ampliação das possibilidades de convênios e contratos do órgão fundiário federal - no caso o Incra, o Ministério da Agricultura - com cartórios, com bancos, com entidades de classe, governos, prefeituras, para ampliar a capacidade de ação da regularização fundiária.
Queremos também destacar que, a nosso ver, é muito importante que tenhamos clareza de que a regularização fundiária proporciona, possibilita ganhos no que diz respeito à sustentabilidade ambiental. Dados de um estudo recente do Incra mostram, analisando dados, inclusive, do Prodes, 2008 a 2018, que as áreas regularizadas têm menor índice de desmatamento ilegal. Então, o meio ambiente ganha com a ampliação e a aceleração da regularização fundiária.
Nós queremos também registrar que a nossa CNA, assim como já foi dito por vários Senadores, tem como princípio fundamental da sua atuação o princípio inarredável da legalidade. Nós não defendemos quem está à margem da lei. Para aqueles que estão à margem da lei, os rigores da lei. Nós não concordamos com a generalização da exceção, até muito provavelmente para confundir a opinião pública e um debate honesto intelectualmente.
Então, nós consideramos muito importante esse avanço da regularização fundiária. São 60 milhões de hectares sem destinação na Amazônia. Isso equivale a quase 10% da região. E essa regularização fundiária, Senador Acir, é muito importante também pelo prisma do ordenamento territorial, tão fundamental para a nossa região e para a área rural.
Então, por todas essas considerações, eu expresso aqui, Senador Acir e a todos os Exmos. Senadores, a posição da CNA favorável, e por extensão dos produtores rurais, à aprovação do PL 510. Obviamente, já encaminhamos algumas manifestações para o Senado de apoio também a algumas emendas, mas a essência fundamental do PL, a nosso ver, é extremamente positiva, favorável e merece a aprovação do Senado e do Congresso Nacional.
Muito obrigado, Senador Acir.
Boa tarde a todos.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Boa tarde, Dr. Muni Lourenço. Muito obrigado pelas suas colocações.
Passo a palavra agora ao Dr. Alair Luiz dos Santos, Secretário de Política Agrária da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag).
Com a palavra o Sr. Alair Luiz dos Santos.
Muito bem-vindo à nossa audiência!
O SR. ALAIR LUIZ DOS SANTOS (Para expor.) - Muito obrigado. Boa tarde, Senador Acir! Boa tarde aos demais Senadores e Senadoras que participam deste brilhante debate.
Como foi dito, meu nome é Alair Luiz dos Santos. Eu sou do Estado de Goiás e estou representando a Contag aqui por ser Secretário de Política Agrária daquela Confederação, importante confederação que, há mais de meio século, vem trabalhando em prol da defesa dos agricultores e agricultoras familiares e trabalhadores rurais por este Brasil afora.
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Eu gostaria de, inicialmente, dizer que a nossa intenção aqui, Srs. Senadores, é, de fato, contribuir com o debate que trata de regularização fundiária.
No entanto, eu estou chegando à Contag agora, há dois dias - sou diretor da federação aqui de Goiás e estou chegando -, e confesso que fiquei, assim, me perguntando o porquê e qual é o intuito de tantas iniciativas de alterar a legislação de regularização fundiária no Brasil, tendo em vista que nós temos legislação suficiente para se fazer regularização fundiária da maneira que nós estamos discutindo aqui hoje.
Então, a legislação existente, no nosso entender, enquanto Contag, já atende a todas essas premissas que foram colocadas pelos meus antecessores e ao objetivo geral que se tenta tratar no PL 510. Então, essa é uma primeira colocação que eu gostaria de dizer aqui para todos nós.
A outra coisa que eu quero dizer é que se trata de regularização de terras públicas, que é, de fato, patrimônio de todos nós, brasileiros. Então, quando se trata de ceder e regularizar patrimônio, terras públicas, de todos nós, brasileiros, precisa-se ter uma atenção muito especial. É preciso tratar com muito carinho, porque senão a gente acaba tirando proveito ou cedendo aquilo que é da União para poucas pessoas que tenham participação.
A outra questão que nós estamos levantando aqui é que um projeto dessa magnitude precisa passar por todas as Comissões do Senado. Ele não pode ser aprovado de uma hora para outra sem passar pelas Comissões, fazer diversas audiências públicas, ouvir todos os segmentos da sociedade. Então, isso é uma coisa que nós estamos dizendo que precisa ser feita.
A nossa vontade mesmo, o que nós estamos propondo é a retirada desse projeto da discussão. Por quê? Porque a legislação já compreende tudo isso de que está se falando hoje - claro, exceto a legalização, a regularização fundiária de terras com extensão de até 2,5 mil hectares, que essa legislação atual não prevê. Então, fica nos parecendo que é para simplesmente beneficiar alguns grandes ocupantes de terras públicas aí pelo Brasil afora.
Por isso que eu estou dizendo: a intenção, o bom seria que se retirasse esse projeto de pauta, se aplicasse a legislação já existente, se colocassem pessoas para trabalhar e fazer a regularização fundiária, observando as leis que já existem.
Então, nesse sentido, não justifica fazer regularização, fazer uma nova legislação para tratar de regularização, tendo em vista que já existem leis suficientes para isso. É dessa forma que a gente está entendendo isso. E, se a gente pensar, a gente pode ver que as leis existentes tratam de regularização no tamanho de agricultura familiar - sei lá, são quatro módulos fiscais -, mas é preciso que a gente entenda que as leis já existem para a regularização fundiária neste Brasil.
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Nós entendemos que, para se fazer regularização fundiária, seja na Amazônia, seja em terras públicas, seja em terras pertencentes ao Incra, é preciso vontade de fazer. Se nós tivermos vontade de fazer a regulamentação, nós temos condição de fazê-la, mas, para isso, é preciso que o Governo disponibilize recursos financeiros, é preciso que o Governo disponibilize recursos humanos, é preciso que o Governo disponibilize equipamentos suficientes para poder fazer a regularização fundiária. Falar que regularização fundiária é uma injustiça, que pessoas aguardam por décadas e décadas, isso é uma verdade. Mas onde há a vontade de se fazer a regularização fundiária neste Brasil?
Eu preciso defender aqui, Senadores, que nós precisamos aplicar a legislação existente. A Constituição Federal já fala disto: da destinação de terras públicas para famílias de agricultores que queiram ali produzir e ali viver com a sua família. Por isso, é um assunto bastante interessante essa questão da discussão da regularização fundiária.
Nós estamos falando aqui também da necessidade de se ter mais transparência com relação ao bem público. E terra é bem público. Nós precisamos fazer com que a terra seja cedida às pessoas que ali estão trabalhando, às pessoas que ali produzem.
E aqui, da nossa parte, estou falando exclusivamente dos agricultores familiares. Não se pode imaginar que um país como o Brasil venha falar que não existe agricultura familiar, que não existe um diferencial entre os produtores comerciais e os agricultores familiares. Nós precisamos entender que isso existe, não é? Nós não podemos juntar tudo no mesmo bolo. Nós precisamos saber que a agricultura familiar é aquela que até hoje, no Brasil, é desassistida: a assistência técnica não chega aos agricultores familiares; o crédito, quando chega, já chega atrasado; e outros benefícios, tratando-se de escoamento da produção, tratando-se de investimento na agricultura familiar. Então, é preciso que a gente compreenda isso. Nós não somos contra a agricultura empresarial, não. A agricultura empresarial tem o seu papel, tem o seu lugar, mas não podemos desconhecer a importância da agricultura familiar para um país como o Brasil.
Em se tratando da Amazônia, eu não sou um grande conhecedor da Amazônia, mas sei que existem várias famílias de agricultores familiares que precisam ser regularizadas, que precisam ter o seu título de propriedade - nós sempre defendemos que é preciso ter título da propriedade -, mas a legislação existente atualmente já atende, se a gente quiser fazer regularização, quiser fazer titulação, muito bem aos princípios para que isso possa ser feito.
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Outra questão: o Senador - salvo engano, o Relator; acho que o então autor do projeto de lei - me falou de regularização de assentamentos, da titulação de assentamentos. Eu conheço e entendo e acho que a lei existente já permite a titularização das pessoas que ocupam regularmente as parcelas de assentamento por este Brasil afora. E não se faz por quê? O Incra está sucateado. O Incra - e aqui eu falo especificamente do Estado de Goiás, mas eu acho que não é muito diferente Brasil afora - não tem mais quadro de pessoal suficiente para sequer fiscalizar os assentamentos existentes. Imagine para fazer titulação, que precisa de pessoas para poder visitar as parcelas, visitar os assentamentos?! Então, é preciso valorizar o Incra. É preciso que a gente... E eu nem estou falando aqui... Parece que eu vou defender o Incra, e eu defendo mesmo, porque o Incra precisa de pessoas, precisa de gente, precisa de recursos, precisa de disponibilidade para se trabalhar.
Então, hoje, para qualquer tipo de regularização que se fala, seja na Amazônia Legal, seja de terras públicas, seja de terras do Incra, seja em assentamentos, como foi dito, nós temos uma legislação bastante suficiente para poder fazer com que essa titularização, essa regularização aconteça. Nós acreditamos que a lei existente já atende à necessidade da população. E concordo que nós não podemos ficar enrolando, dando mais tempo para que pessoas até fiquem ali sem segurança jurídica. Mas aí eu volto a repetir: se a gente quiser, a gente pode fazer com que a lei existente regularize, titularize várias pessoas, várias famílias, centenas de milhares de famílias pelo Brasil afora.
Então, eu estou encerrando aqui, não vou necessariamente gastar meu tempo completo, mas, mais uma vez, quero agradecer pelo convite, em nome do nosso Presidente Aristides Veras, e dizer que estamos à disposição para poder contribuir com o tema da regularização fundiária, não necessariamente com o PL 510, porque ele traz uma série de coisas que não ficam bastante claras. Para mim, principalmente, que peguei agora já há dois ou três dias, eu não consegui ter confiança no PL 510 para poder entender que ele, de fato, está preocupado com a agricultura familiar, com o pequeno e médio agricultor, querendo chamar assim. Eu acho que ele tem muito mais preocupação com outras coisas que talvez nem sejam ambientais, que talvez nem sejam trabalhistas, de caráter trabalhista, e sim, talvez, no sentido dos termos que se propõem a regularizar aí até 2,5 mil hectares sem vistoria. Isso nós estamos achando um absurdo, porque se trata, na Amazônia Legal, de cerca de 65 milhões de hectares que estariam nesse bojo aí para poder ser regularizado e, quem sabe, com conflitos ali dentro. Porque, vistoriando presencialmente, já se corre o risco de haver um conflito que a gente não percebe, imaginem vistoriando da forma como está sendo pensada, por satélite, por outros mecanismos?!
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É isso. Eu encerro minha fala, agradeço mais uma vez pelo convite e nos coloco à disposição.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado, Alair Luiz dos Santos. Na pessoa do senhor, cumprimento e saúdo toda a diretoria da Contag, que, fruto de uma eleição, assumiu há dois dias toda a diretoria. Meus cumprimentos pela ascensão de todos. Muito obrigado pela sua participação junto a esta Comissão neste debate.
Nós já chegamos a 15h27. Eu pergunto aos Senadores se poderia passar a palavra aos Senadores para que a gente possa, na segunda-feira, ouvir, então, o Dr. Luiz Antonio Nabhan Garcia, o Dr. Geraldo José da Camara Ferreira de Melo Filho e também os outros três convidados que nós temos aqui, Professor Raoni Rajão e Dra. Cristina Lemes Lopes.
Passo a palavra, então, agora ao Senador Wellington Fagundes para fazer as suas colocações. (Pausa.)
Não está logado.
Senador Paulo Rocha com a palavra. O Izalci está ao telefone. Então, Senador Paulo Rocha com a palavra. (Pausa.)
Tem que ligar o microfone, Senador Paulo.
O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA. Para interpelar.) - Obrigado, Presidente. Queria parabenizá-lo por essa iniciativa e (Falha no áudio.)
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Sua internet está muito ruim, creio.
O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) - Opa! E agora?
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Agora melhorou.
O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) - Presidente, queria parabenizá-lo pela iniciativa e pela Comissão, apesar da dificuldade, mas a gente demonstra com isso que é possível fazer o mínimo de discussão nas nossas Comissões. Portanto, queria saudar a todos e a todas.
Quero dizer que, primeiro, tenho conversado muito com o Relator e com o autor do projeto, o Senador Irajá e o Senador Fávaro, sobre essa questão desse Projeto 510, para ficar claro que nós não somos contra a regulação fundiária, muito menos com a titulação de terra. Aliás, foi nos governos anteriores nossos, principalmente no Governo Lula, que criamos inclusive uma secretaria especial para regularizar, regulamentar terras na Amazônia.
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Agora, é preciso a gente entender, primeiro, o seguinte: a estrutura agrária do nosso País é totalmente viciada num processo que começou com governos anteriores, desde a época dos militares, não é? E toda vez que chega um governo, por exemplo, como agora o atual Governo, ao contrário de cumprir as leis já existentes, ele vai incentivando e inclusive desmoralizando as nossas leis.
Não é à toa que voltou de novo, pelo menos no meu Estado, na Região Amazônica, a questão das chacinas: vide a chacina, logo imediatamente, a chacina do Pau d'Arco, a chacina dos indígenas no Maranhão.
Por quê? Eu digo isso porque a guerra que havia no meu Estado, em relação à questão da terra, era por ausência de políticas governamentais, ou seja, a ausência do Estado. Por quê? Porque, desde os militares, incentivaram-se os grandes grupos econômicos a irem para a Amazônia, com a justificativa de que - e naquela época eu me lembro muito bem de que a palavra de ordem era: "o Sul vai ao Norte", "integrar para não entregar" - a Amazônia era muito cobiçada internacionalmente, enfim.
E ali incentivaram-se grandes projetos, financiados pelo próprio Poder Público, ou com isenção fiscal, como foi o caso de uso do Imposto de Renda para poder construir esses grandes territórios na nossa região. Por exemplo, no meu Estado do Pará, havia a Fazenda Bradesco, a Fazenda Bamerindus, a Fazenda Cristalina, que era da Volkswagen, que eram verdadeiros territórios dentro de outros territórios. Então, isso naturalmente se foi corrigindo ao longo do tempo.
E todo mundo sabe que, para fixar o homem no campo... Se já é difícil fixar o homem grande no campo, porque ele só vai para lá se tiver retorno econômico, imagine fixar o pequeno, através do processo que se estabeleceu para fazer os assentamentos. Criavam os assentamentos lá para dentro da floresta, mas não davam nenhuma condição para fixar o homem na terra.
Foi já nos Governos mais recentes, como o do Lula, que se criaram políticas públicas como o Pronaf e outras coisas para criar as condições de fixar o homem na terra.
Então, fazer uma legislação sobre a questão agrária, sobre a questão de reforma agrária, assentamento, política de incentivo a produzir mais no campo é complicado, porque fazer uma legislação nacional com todas essas diferenças regionais - diferenças de biomas, diferenças de módulos regionais - é muito complicado.
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Você vê que, por exemplo, o Código Florestal demorou quantos anos? Com discussão diuturnamente, no Congresso Nacional, para se consolidar o mínimo de um Código Florestal que atendesse os interesses de cada região.
Ora, vêm os governos e fazem políticas via decreto, via medidas provisórias. Mexer com uma estrutura dessas que está, digamos assim, se consertando não é fácil. Por isso, as reivindicações de um modelo, de uma discussão dessas, de um projeto desses precisam realmente ter um tempo devido para ouvir todos os especialistas, os interesses do grande, do pequeno, do médio, para que a gente formule uma legislação capaz de assegurar a presença do Estado no campo.
Quando a gente diz que flexibiliza os requisitos da regulação fundiária - e, inclusive, a questão enfraquece essa questão dessas vanguardas ambientais -, não é que conste na proposição da lei, mas é porque a postura do Governo vai, exatamente, ao encontro disso. Sobre as políticas públicas que nós já tínhamos conquistado, o atual Governo cortou tudo, mudou, inclusive, a estrutura do Estado brasileiro em relação ao tratamento da terra, cortou políticas públicas, cortou verbas orçamentárias ou reduziu verbas orçamentárias. E, aí, essa regularização que nós estamos propondo precisa de fiscalização firme. Portanto, tem que ter condições para o Ibama fiscalizar. O que o Governo faz? Ele tira verbas da fiscalização do Ibama. Acabou com o Pronaf, reduziu o orçamento do Incra, sucateou.
O processo de vigilância na Amazônia, o Sivam, foi sucateado totalmente, a ponto de que um radar, em plena cidade de Belém, que faz todo o processo de vigilância, de mapeamento, está todo sucateado, está quebrado, não está funcionando.
Por isso, meu caro Fávaro e meu caro Irajá, a iniciativa é importante, mas nós precisamos realmente aprofundar, dialogar, discutir e sermos capazes de fazer uma legislação que vá ao encontro, realmente, da necessidade de reorganizar, de reestruturar ou até de avançar no processo. O que é que nós queremos? Queremos que todo mundo produza, mas que o pequeno também tenha as suas condições para produzir, porque, com o Pronaf, no nosso País, acabou que 70% da alimentação que vem para o prato do brasileiro é da agricultura familiar.
Então, eu queria saudar a todos e a todas por fazerem este debate tão importante para a nossa legislação agrária e agrícola.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado, Senador Paulo Rocha.
Pede-me para falar, aqui, hoje, o nosso amigo Luiz Nabhan.
V. Sa. tem 15 minutos para fazer as suas explanações.
Passo a palavra, então, para Luiz Nabhan, do Ministério da Agricultura.
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O SR. LUIZ ANTONIO NABHAN GARCIA (Para expor.) - Boa tarde a todos!
Presidente Acir Gurgacz, Presidente desta audiência, desta Comissão, nosso grande amigo e defensor das causas republicanas, peço até desculpas por eu solicitar esta oportunidade de falar, porque, como eu tive Covid e fiquei 31 dias numa UTI, 14 dos quais intubado, eu tenho uma consulta médica na próxima segunda-feira e não poderei estar presente a essa tão importante audiência pública.
O que eu gostaria de ressaltar, em primeiro lugar, são os meus parabéns a esse Projeto de Lei nº 510, de autoria do Senador Irajá, porque ele respeita, ou melhor, ele começa respeitando a Constituição brasileira.
O Governo do Presidente Bolsonaro não faz nenhuma discriminação contra o pequeno, contra o médio ou contra o grande produtor que e passível de uma regularização fundiária.
Só para os senhores terem uma ideia, na agricultura familiar, ou seja, em assentamentos, nós já passamos de mais de 100 mil títulos outorgados para essas pequenas propriedades. Isso é para deixar bem claro que não há que se dizer: "Olha, o Governo do Bolsonaro está aí para defender só o grande ou só o médio". Pelo contrário; são mais de 100 mil títulos que nós já outorgamos, já entregamos para os pequenos agricultores.
Então, eu reitero: está de parabéns o Projeto de Lei nº 510, porque ele respeita a Constituição Federal, ou seja, todas as propriedades, todas as áreas até 2,5 mil hectares serão passíveis de regularização fundiária de uma forma eficaz, moderna, que não permitirá nenhum tipo de erro, de corrupção, de falhas ou de demora. E digo isso porque nós estamos aí com um passivo, Senador Acir Gurgacz, desde 1500, ainda quando Cabral chegou aqui. Na verdade, nós nunca tivemos uma regularização fundiária a contento, haja vista essa demanda dos próprios pequenos produtores, da própria agricultura familiar e dos assentamentos, onde nós temos um passivo de quase 900 mil agricultores oriundos da reforma agrária e que não têm o seu título de propriedade.
E, nesse sentido, não querendo menosprezar ninguém, a prioridade do Governo tem sido entregar títulos, fornecer títulos de propriedade justamente para esses pequenos agricultores. E nós temos os números: já foram entregues mais de 100 mil títulos, e, agora, com a entrada do Serpro fazendo toda a assistência, dando toda cobertura ao Incra na questão de viabilidade na área de informática, entregaremos muitos e muitos títulos, principalmente para os agricultores da reforma agrária, para os agricultores familiares.
Agora, nós temos um outro passivo, que é aquilo que a Constituição determina: são as áreas até 2,5 mil hectares e que estão, a maior parte delas, inseridas na Amazônia Legal, ou seja, nos nove Estados da Amazônia Legal. São famílias que há 40, 50 anos foram para Rondônia, para o Acre, para Roraima, para o Pará, para o Mato Grosso, enfim, e até hoje não têm o título de sua propriedade.
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Então, esse Projeto de Lei nº 510 vai ao encontro da ansiedade de tantas e tantas famílias que estão ali, aguardando seu título de propriedade, e de uma forma muito eficaz, porque, dessa forma, nós estaremos preservando o meio ambiente - as pessoas terão que ter um comprovante de que estão ali, respeitando o meio ambiente -, nós estaremos combatendo a grilagem de terra, combatendo as ilegalidades, extrações de madeira ilegal, desmatamento ilegal, garimpo ilegal e até mesmo o narcotráfico. E, aí, todas essas propriedades terão o CPF, o RG daquelas pessoas que estão ali usando a terra.
O uso da terra é para o bem, é benéfico, ou seja, é para a produção. E com o contrário disso aí o próprio Projeto de Lei nº 510 - que, se Deus quiser, será convertido em lei - vai acabar, que é essa história de grilagem de terra, e vai dar, realmente, título a quem merece, porque as obrigações e o que a legislação solicita fazem com que ninguém vá lá se beneficiar de uma forma irregular. Ou seja, todos vão ser beneficiados, porém respeitando, em primeiro lugar, a questão ambiental, e caracterizando que estão ali.
O que nós temos hoje de modernidade na questão de satélite, georreferenciamento, localização... Nós temos satélite hoje, Senador, por meio do qual nós conseguimos identificar até a marca de um telhado da casa. Então, nós temos, sim, que nos beneficiar da modernidade, daquilo que a modernidade, a tecnologia moderna pode nos oferecer.
Então, quero dizer que, em nome do Governo Federal, nós estamos aí parabenizando esse Projeto de Lei 510, porque, realmente, ele vai ao encontro da necessidade de todos e, reiterando, por parte do nosso Governo, que nós não estamos aqui para discriminar ninguém. Nós temos que regularizar todos, os pequenos, os médios, e os grandes, muitos dos quais, talvez, infelizmente, pela própria Constituição, fiquem de fora, porque o limite que a Constituição estabelece é de 2,5 mil hectares de terras.
Então, fica aqui a nossa mensagem.
No mais, a gente quer respeitar, integralmente, o Poder Legislativo, o Senado Federal, a Câmara Federal, para que isso seja discutido entre os Parlamentares, até porque é de autoria de um Parlamentar.
Mas, de qualquer forma, nos colocamos à disposição para qualquer debate em que haja a necessidade de trocarmos ideias salutares e republicanas, para nós acabarmos com essa pecha, porque não é possível, num país como o Brasil, com toda essa riqueza, essa abundância, nós termos pessoas que ainda são qualificadas de posseiros ou de acampados ou de assentados. Nós precisamos dar mais dignidade a essas pessoas, outorgando o título de proprietário de terra.
Muito obrigado aí, Senador, pela oportunidade.
Obrigado, Senador Carlos Fávaro.
Um abraço a todos aí.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado, Dr. Nabhan.
Passo a palavra, por três minutos, para o Senador Izalci, para que a gente possa encerrar, pois a Ordem do Dia tem que começar.
Com a palavra o Senador Izalci.
O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF. Para interpelar.) - Presidente, quero aproveitar a presença do Nabhan, só para fazer um apelo a ele. Fiz esse apelo à Ministra na última audiência pública que nós fizemos no Senado, porque, de fato, quando se fala em regularização fundiária, 90% das pessoas olham para a Amazônia e esquecem que, em Brasília, no DF, nós temos problemas.
No Governo de 2019, no Governo do Bolsonaro, nós entregamos, pelo menos, 600 títulos aqui de regularização. Não é assentamento. Esses estão sendo feitos no sistema. Mas mudaram o sistema, e a Ministra assumiu o compromisso de uma semana. E nós estamos cobrando isso vai fazer um ano, porque há expectativa aqui do Incra, das pessoas que estão na regularização. Já está tudo pronto, os documentos estão prontos, já foi feita a vistoria, só falta entregar o título.
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E, como houve uma modificação, o sistema antigo não está rodando os títulos, tem que ser um sistema novo, e esse sistema novo não está funcionando.
Então, já pedi várias vezes ao diretor de regularização, e o último pedido foi à Ministra numa audiência pública, e ela disse: "Não, daqui a 10 dias, 15 dias está tudo pronto". Mas já faz um mês, e não saiu ainda.
Então, eu quero pedir a V. Sa., Nabhan, que conhece bem, para ver se nos ajuda aqui, porque há 1,5 mil títulos para serem entregues, e só falta rodar o impresso, o sistema. É o apelo que eu faço.
Com relação ao projeto, Presidente, eu não vi ainda o relatório do nosso querido amigo Fávaro, que ficou, inclusive, de... Nós tínhamos três emendas e as retiramos naquele dia do projeto de V. Exa., Senador Acir, que estava relatando, para colocar no 510.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Exatamente.
O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Eu mandei também algumas observações só para saber... Como eu não vi o relatório ainda, eu não sei se foram acatadas ou não as sugestões. Mas era só para colocar isto - eu vou conversar com o Fávaro depois -, só para indagar, primeiro, se acatou as emendas e, ao mesmo tempo, sobre as observações que fiz. Só isso.
Obrigado, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado, Senador Izalci.
Nós estamos no limite para encerrar esta reunião e continuarmos na segunda-feira. Lembrando que é importante a sua participação, Brenda Brito, na segunda-feira, do Alair Luiz, da Contag também, do Dr. Nabhan também. Se puderem, na segunda-feira, será importante a presença de todos os senhores e senhoras.
Continuaremos, portanto, esta audiência pública para debater o PL 510 , de 2021, na segunda-feira.
Nada mais havendo a tratar neste momento, declaro encerrada esta reunião.
Muito obrigado a todos.
(Iniciada às 14 horas e 11 minutos, a reunião é encerrada às 15 horas e 48 minutos.)