03/05/2021 - 05ª - Comissão de Agricultura e Reforma Agrária

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO. Fala da Presidência.) - Sob a proteção de Deus, iniciamos nossos trabalhos.
Declaro aberta a 5ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 56ª Legislatura do Senado Federal.
Antes de iniciar os nossos trabalhos, proponho a dispensa da leitura e a aprovação da ata da reunião anterior.
As Sras. e os Srs. Senadores que a aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovada.
Há expediente sobre a mesa, que passo a ler.
Esta Presidência comunica o recebimento da seguinte manifestação externa:
- Ofício 173, de 2021, da Presidência da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil, com o pedido de apoio para a aprovação do Projeto de Lei do Congresso Nacional nº 4, de 2021, que prevê a recomposição de dotações na Lei Orçamentária Anual (LOA), de 2021, especialmente para a subvenção, na forma de equalização de taxas de juros do crédito rural, necessária para a viabilização do Plano Agrícola e Pecuário 2021/2022.
Conforme instrução normativa da Secretaria-Geral da Mesa, todos os referidos documentos ficarão à disposição na secretaria desta Comissão e na página da Comissão na Internet.
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A presente reunião destina-se à realização de audiência pública para debater as proposições legislativas e as regulamentações vigentes sobre regularização fundiária, em especial o PL 510, de 2021, que altera a Lei nº 11.952, de 25 de junho de 2009, que dispõe sobre a regularização fundiária das ocupações incidentes em terras situadas em áreas da União; a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, que institui normas para licitações e contratos da administração pública; a Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, que dispõe sobre os registros públicos; a Lei nº 13.240, de 30 de dezembro de 2015, que dispõe sobre a administração, a alienação, a transferência de gestão de imóveis da União e o seu uso para a constituição de fundos; e a Lei nº 10.304, de 5 de novembro de 2001, que transfere ao domínio dos Estados de Roraima e do Amapá terras pertencentes à União a fim de ampliar o alcance da regularização fundiária e dar outras providências.
Esta audiência pública é interativa, por meio do portal e-Cidadania, no site do Senado. Portanto, se alguém quiser participar, pode fazê-lo através do telefone 0800-612211.
Antes de abrir essa audiência pública para a apresentação dos convidados e o início do debate, faço algumas considerações sobre um alerta de diversos questionamentos que temos recebido aqui, na Comissão de Agricultura, quanto aos novos modelos de concessões rodoviárias e ferroviárias em implantação em nosso País.
A infraestrutura do País é de fundamental importância para o agronegócio nacional, com altos impactos nos custos de produção e operacionais da produção agropecuária e, consequentemente, no custo dos alimentos para a população brasileira. Nesse sentido, o Congresso Nacional, o setor produtivo, em especial o agronegócio, e todos os cidadãos brasileiros precisam saber como o Ministério da Infraestrutura e a ANTT estão tratando as concessões de rodovias da segunda e da terceira etapas do programa de concessão de rodovias federais, sendo que estamos requerendo informações junto ao Tribunal de Contas da União sobre o conteúdo dos relatórios técnicos e deliberações no Processo nº 010222/2019-7, que trata da auditoria nos atos relacionados à inadimplência dos contratos de concessões de rodovias em que se investigam ingerências e irregularidades da agência na renovação de concessão mediante a autorização da ANTT.
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Só para dar ciência, nós recebemos vários ofícios de cooperativas deste Brasil, de associações preocupadas com a possibilidade de aumentar os custos de transporte da produção agrícola, através dos pedágios, diante de uma nova sistemática de concessão. Esse é um debate que nós vamos fazer junto com a Comissão de Infraestrutura do Senado também. Já conversamos também com a Comissão de Agricultura da Câmara Federal, com a qual deveremos fazer esse debate tão importante, pois nós estamos, ano a ano, aumentando a produção no nosso País e a nossa infraestrutura não apenas não está acompanhando esse crescimento, como também estamos antevendo um aumento do custo dos pedágios em nosso País. Alguns desses pedágios já existem e outros serão em outras rodovias que ainda não são pedagiadas, mas que deverão ser. Isso nos traz uma preocupação muito grande com o custo Brasil daquilo que nós produzimos e que evidentemente temos que transportar. Por isso a importância desse debate com relação aos pedágios brasileiros.
Na semana passada, nós ouvimos quatro convidados: o Vice-Presidente da CNA, Muni Lourenço Silva Júnior; Secretário Especial de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Nabhan Garcia; e a pesquisadora Brenda Brito, do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon); e também o Secretário de Política Agrária da Contag, Alair Luiz dos Santos.
Dando sequência aos nossos trabalhos, vamos ouvir hoje o Professor Raoni Rajão, da Universidade Federal de Minas Gerais; a pesquisadora Cristina Leme Lopes, do Iniciativas para Políticas do Clima, da PUC/Rio de Janeiro; o Professor José Benatti, da Universidade Federal do Pará; e o Presidente do Incra, Dr. Geraldo José da Camara Ferreira de Melo Filho. O pesquisador Evaristo Eduardo de Miranda, Chefe Geral da Embrapa Territorial, também iria participar dos debates, mas por motivos pessoais não poderá participar.
Dando início aos nossos trabalhos, eu passo a palavra ao Raoni Guerra Lucas Rajão.
A sua indicação foi feita pela Senadora Eliziane Gama.
Parece que a Senadora Kátia pede a palavra.
Com a palavra a Senadora Kátia.
A SRA. KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO. Pela ordem.) - Obrigada, Presidente Acir.
Cumprimento todos os convidados, Raoni Rajão, José Benatti, da Universidade, Cristina Leme Lopes e Geraldo Melo.
Sr. Presidente, eu gostaria de fazer uma sugestão, se for possível e se todos aprovarem. Eu sugiro que o Gerado Melo, Presidente do Incra, quem sabe, pudesse mostrar para nós, primeiro, a plataforma, a proposta do Incra de titulação dessas terras, porque eu conheci - já quero adiantar - essa plataforma e ela me impressionou bastante, positivamente, mas, como há muitas pessoas de respeitabilidade que não concordam com a titulação, eu fico bastante curiosa para entender o que há de distorção. Eu, em princípio, sou a favor da titulação de terras, mas como há pessoas que são contra - e eu as respeito -, como o Professor Raoni Rajão e tantos outros, eu gostaria de entender qual é a preocupação. Às vezes, eles me tirarão a venda e eu conseguirei, e a gente chegue a um acordo para tirar essas dúvidas e esses perigos que possam haver nessa forma e nessa plataforma que o Incra pretende.
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Então, se todos concordarem, Sr. Presidente, eu gostaria de propor essa inversão para nós vermos o que o Governo propõe. O Senador Irajá, com seu projeto, tem trabalhado muito com Geraldo Melo e, com certeza, deve estar de comum acordo, eu tenho a impressão.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito bem. Muito obrigado pela sua sugestão, Senadora. A princípio, o Dr. Geraldo tinha pedido para falar no final. Agora, da nossa parte, não há nenhuma preocupação com relação à inversão.
A SRA. KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO) - Eu queria considerar com o Presidente do Incra Geraldo Melo que eu tenho certeza absoluta de que a apresentação inicial da plataforma e do modus operandi que o Incra pretende atuar pode ser que a gente já possa dirimir muitas questões, muitas dúvidas e muitas diferenças.
Eu conheço Geraldo Melo há mais de 15 anos. Nós trabalhamos na CNA, ele foi Superintendente da CNA. Então, eu conheço a sua forma de pensar e a sua forma de agir. Ele é um produtor rural do Nordeste, criador de guzerá. Eu não conheço dele nenhuma tendência a destruir a Amazônia ou algum golpe que possa... Vou brigar com ele feio, se houver alguma coisa que eu não tenha visto.
Mas, nessa confiança e na lembrança da minha convivência com ele, eu peço a todos essa boa vontade de ouvi-lo com o coração aberto. Eu garanto a vocês que não existe nenhuma pegadinha ou alguma coisa maldosa por parte de Geraldo Melo, já não posso dizer o mesmo de alguns outros por aí, mas do Geraldo eu me arrisco a dizer. Então, Geraldinho, eu acho que - e é Geraldinho não é porque ele seja menino, é porque o pai dele era Geraldo -, se você não se incomodar, seria de grande utilidade você apresentar primeiro.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito bem.
Então, façamos essa inversão, a pedido da Senadora Kátia Abreu, para que o Incra possa fazer as suas colocações com relação a esse PL 510 e, o que é mais importante, à regularização fundiária. Este é um tema muito importante para todos nós, mas especialmente para nós da Amazônia e principalmente para o nosso Estado de Rondônia.
Portanto, vamos ouvir atentamente não só o Incra, mas todos os nossos convidados, para que a gente possa colaborar com o Relator do PL 510 e para que a gente possa avançar. É um PL importante. Pelo que eu li, não encontrei nada de grilagem de terra; muito pelo contrário, é apenas regularização fundiária, que é o que nós estamos buscando há muito tempo no nosso País.
Agradeço ao Geraldo e passo a palavra, então, a V. Sa., Geraldo José da Camara Ferreira de Melo Filho, Presidente do Incra.
Seja bem-vindo, Geraldo.
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O SR. GERALDO JOSÉ DA CAMARA FERREIRA DE MELO FILHO - Obrigado, Presidente. O nome é meio grande mesmo. Deixe-me abrir aqui, porque a apresentação não estava no ponto aqui.
Tem como liberar para eu compartilhar uma tela? Porque está dizendo aqui que não está liberada para fazer.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Pode tentar novamente. É que nós não tínhamos essa informação de que haveria uma apresentação, mas agora já foi liberado, Geraldo.
O SR. GERALDO JOSÉ DA CAMARA FERREIRA DE MELO FILHO - O.k.
Não sei se todos estão vendo a tela.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Sim, a tela está no ar.
O SR. GERALDO JOSÉ DA CAMARA FERREIRA DE MELO FILHO (Para expor.) - O.k. Vamos lá!
Vou tentar fazer um histórico... Desculpem. O assunto é um pouquinho complexo. Normalmente, eu tento começar, todas as vezes, por essa mesma tela, porque, via de regra, a gente para nessa primeira confusãozinha aqui, que é a confusão da questão da regularização fundiária em glebas públicas federais, que é a Lei nº 11.952, e a regularização dos lotes de assentamentos, que também é uma política de titulação e que, na verdade, é regulada pela Lei nº 8.629. Então, muita gente, quando a gente conversa sobre regularização fundiária, pensa que a gente está tratando das duas coisas, e, na prática, a gente está tratando aqui apenas da regularização fundiária em glebas públicas federais, ou seja, apenas da Lei nº 11.952. Nós não estamos falando aqui da Lei nº 8.629. Portanto, nós não estamos falando aqui de assentamentos de reforma agrária, apenas de glebas públicas federais.
Para a gente falar um pouquinho sobre regularização fundiária, a gente tem que voltar um pouquinho aqui no tempo e conversar um pouquinho sobre a questão do Terra Legal. O Programa Terra Legal, na verdade, é o resultado prático, vamos dizer assim, é resultante da implantação da Lei nº 11.952 e teve a execução, no início, direta pelo MDA e, somente em 2019, veio para o Incra. E ele veio, em 2019, para o Incra com alguns legados que vieram juntos para a gente: um conjunto de sistemas incompletos, com problemas de manutenção e de segurança, ou seja, o Sisterleg, o Sigef Resultados, o Sigef Titulação, que é quem deveria estar fazendo o processo de titulação, o Sigef Acervo, uma família Sigef, que deveria se comunicar com o Sigef Geo, e com todos os problemas legados de sistemas com um histórico de manutenção deficitário; dez anos de arquivos e processos físicos espalhados nas regionais da Amazônia Legal, lembrando que, até 2019, o Terra Legal era uma estrutura à parte da estrutura do Incra; e 68 mil processos dentro de um SEI, que não era o do Incra, da antiga Secretaria Especial da Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário (Sead). Esses processos só foram liberados, efetivamente, para o Incra no final de 2019. Existe um trabalho enorme de andamento da gente para colocar em dia tanto a parte tecnológica disso quanto esses processos. Na prática, a gente recebeu dois arquivos mortos - um arquivo morto físico, em papel e um arquivo morto digital - e, mais do que isso, uma análise feita por um acórdão no Tribunal de Contas da União, de uma auditoria feita do período de 2008 a 2019 em cima do Programa Terra Legal, aponta inúmeras irregularidades e problemas na execução disso, em sua grande maioria, resultantes dessa estrutura que foi montada deficitária e incoerente para a execução desse projeto.
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Então, estou falando isto aqui na introdução para ficar claro que não é exatamente assim tão irracional quanto foi posto em alguns momentos a transferência do antigo Terra Legal para o Incra, até porque, quando você volta ao Terra Legal e vai ao despacho do Tribunal de Contas da União, uma das coisas que estão colocadas lá é que a titulação executada pelo Terra Legal atingiu apenas 13% de toda a área que foi efetivamente georreferenciada para esse intuito e que os resultados do Programa Terra Legal - isto está lá no acórdão - não têm sido suficientes para tratar os problemas de instabilidade jurídica, grilagem de terras e avanço do desmatamento na região da Amazônia Legal relatados na Exposição de Motivos da Medida Provisória 458, convertida na Lei 11.952.
Por que eu estou colocando isto? Primeiro, isso é um documento público, é um acórdão do Tribunal de Contas, referente a um programa que já não existe mais e foi o que deu vazão a uma necessidade de mudança do Terra Legal para o Incra.
Mas isso teve resultados também.
Esse é um quadro com os resultados do Programa Terra Legal ao longo dos seus dez anos de execução na Amazônia. Basicamente, você tem esse quadro. Ele foi bastante mexido e utilizado, e, basicamente, como indicador de resultados de titulação, o que a gente utiliza para quantificar os números de titulação são esses quatro índices aí, esses quatro tipos de título: títulos rurais, títulos estaduais, que são títulos feitos por convênio com os Estados, liberação de cláusula e CRO, que é uma espécie de título provisório, que só começou a ter a partir de 2018.
Então, o nosso número - e esse indicador vem desde 2009 - é que o total de títulos emitidos nesse período, de documentos titulatórios, vamos dizer assim, porque nem tudo chama título - então, são documentos titulatórios -, é de 40.808, diferindo um pouquinho do número apresentado na semana passada, quando, em uma apresentação, se deu um número um pouco diferente desse, e, basicamente, foi dado esse número por não terem sido computados naquele quadro apresentado na quinta-feira o número do CRO. Então, o número que se apresentou em uma das falas na quinta-feira, falou-se em um número de cerca de 3.190 documentos por ano entregues pelo Terra Legal. E aí vale um adendo, porque se disse que eram apenas títulos emitidos pela Lei 11.952 e eram títulos definitivos pelo Incra, não contando liberação de cláusulas, etc. E não é bem assim, porque, na verdade, estão contados aí, sim, liberação de cláusulas e os títulos emitidos em convênios com os Estados.
O que nos causou certa surpresa na utilização desse número foi apenas que o documento que é citado... Também foi citado, na mesma apresentação, um documento que o Incra encaminhou em uma prestação de contas para o Supremo Tribunal Federal, mas, quando foi para somar os títulos emitidos em 2019 e 2020, misteriosamente, só se contou a linha dos títulos definitivos, em que estão esses 554 títulos. Então, para somar o número anterior, usou-se os títulos estaduais e a liberação de cláusula resolutiva, e, quando foi para somar 2019 e 2020, esqueceu-se disso tudo.
Então, assim, nós também não estamos satisfeitos com os números, achamos que o Programa de Regularização Fundiária precisa produzir muito mais do que está produzindo. Há uma necessidade desse público.
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Não precisa se trabalhar com esses dados a ponto de se alterar esse número para que esse resultado venha. Nós não estamos satisfeitos também, mas apenas assim, se é para termos critérios reais e corretos na apresentação dos dados, vamos ser justos nos dados para trás e nos dados atuais. Esses são os dados corretos e essa tabela aqui que está apresentada estava integralmente no documento que foi citado como fonte na apresentação da semana passada.
Então, para execução da regularização fundiária, assim que a gente assumiu em 2019 - e a gente assumiu no final do ano de 2019 aqui o Incra -, a gente encarou que precisava de algumas alterações em relação aos marcos legais. Essas alterações basicamente começam a partir da proposição da Medida Provisória 910, que aconteceu em dezembro de 2019.
E aí há uma linha de tempo, eu vou ser rápido nela. Em janeiro, a gente entra com uma série de alterações de sistemas de acordo com a nova instrução normativa que teve que ser publicada, uma estrutura de planejamento para que a gente fizesse a atuação nas superintendências regionais.
Com tudo isso feito, começamos um treinamento de toda a estrutura das superintendências do Incra para atuar dentro do novo marco legal e dentro de um novo sistema. E em março começa a pandemia. Desmobiliza toda a capacitação, começa um modelo de capacitação a distância. E em maio cai a medida provisória, voltam as regras antigas, desfaz as regras todas do sistema, muda tudo novamente e volta-se a trabalhar com a 11.952 e sem as automatizações todas de sistema que nós tínhamos.
Tivemos que esperar até dezembro, com a publicação do Decreto 10.592, regulamentando novamente a Lei 11.952, e com a formalização do contrato com o Serpro, que nós fizemos também no mês de dezembro e eu vou falar um pouquinho dele aqui, que é o que a Senadora Kátia colocou aí.
E o que foi o decreto? O decreto basicamente é uma tentativa de incorporar alguns dos avanços previstos anteriormente e que não precisariam, respeitados os limites da Lei 11.952, isso é importante que se coloque, mas basicamente a possibilidade de apresentação da documentação de forma digitalizada, a possibilidade do uso do sensoriamento remoto e de consulta às bases de dados do Governo para todos os imóveis e processos simplificados para regularização de imóveis de até um módulo fiscal. Tudo isso respeitado o que está previsto na Lei 11.952.
Também um outro ponto que a gente escuta sempre: o Incra não tem condições e estrutura para tocar o processo de regularização fundiária. O Incra nunca negou que enfrenta dificuldades, como todos os órgãos do serviço público brasileiro, não só federal, como estadual e municipal, enfrentam dificuldades.
Nós encontramos uma infraestrutura, por exemplo, sistemas e equipamentos obsoletos há anos sem investimentos ou manutenção adequada. Encaramos isso. Ano passado fizemos todos os processos licitatórios e começamos a troca de todo o parque tecnológico do Incra. Começamos toda a renovação de equipamentos, de tabletes e de sistemas e de softwares de toda a rede do Incra e concluiremos isso ao longo de 2021. Isso tudo já está licitado.
Uma frota sucateada. Visitar a garagem do Incra é visitar uma sucata. Começamos, ainda em 2019, na virada de 2019 para 2020, a trocar essa frota e o restante da renovação de frota está no orçamento de 2021. Defasagem de quadro de pessoal e a dificuldade, ou seja, a falta de possibilidade, ainda mais com o Covid, de imediato, de contratação. Qual a saída para isso? A gente precisa de pessoal, e a saída de curtíssimo prazo é a possibilidade de estabelecimento de parcerias institucionais para trabalhar.
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Um dos caminhos que a gente encontrou para trabalhar isso foi o Programa Titula Brasil, lançado ainda no final do ano passado e que na prática regulamenta o art. 32 da Lei 11.952, ou seja, a ideia é você trabalhar em parceria com as prefeituras, com os Municípios em parte das ações do Incra, não apenas de regularização, mas em ações do Incra na base. Nós já temos este número até sexta-feira: 744 prefeituras que já solicitaram adesão para trabalhar junto conosco nesse processo.
E aí uma outra vertente que para a gente acho que é o grande legado que de fato ficará para a casa e acho que para o País é o Plano de Transformação Digital. Acho que é o grande passo que está sendo dado, que começa - na verdade, o planejamento começou muito antes disso - efetivamente com a assinatura, no final do ano passado, do contrato com Serpro, ou seja, a estruturação da plataforma de gestão e inteligência territorial do Incra com o Serpro.
E tem como alguns dos seus objetivos: acelerar o processo de análise e emissão de títulos - com segurança, aqui não se trata de pular etapas -; ampliar os serviços ao público de reforma agrária; promover a unificação dos cadastros, ou seja, fazer com que as bases do Incra se comuniquem e, na sequência, as bases do Incra se comuniquem com as demais bases do Governo Federal, isso já está sendo implantado, até o meio do ano já vai estar funcionando a unificação dos cadastros; promover a transformação digital do Incra; aperfeiçoar a governança fundiária e territorial.
E os primeiros resultados já começam a existir, já começam a aparecer. O Incra hoje já é um dos dez órgãos que mais promoveram interoperabilidade, com a obtenção automática de informação do cidadão. O Incra nem aparecia nessa lista. Hoje já um dos dez mais dentro da administração pública federal.
Mas isso aqui tudo é área meio. E na área técnica? Quem é que vai nos ajudar a fazer a leitura? Porque isso é outra coisa. "O Incra não tem a capacidade técnica [isso eu escuto], não vai ter a capacidade técnica de fazer essas análises." Muito bem, nós estamos buscando os parceiros para fazer esse trabalho, como o Ministério da Justiça. Nós já aderimos formalmente ao programa Brasil Mais. O programa Brasil Mais é o programa em que o Ministério da Justiça, junto com a Polícia Federal, trabalha, do acesso ao sistema SCCON, da Planet, com imagens de satélite, para a plataforma de visualização de imagens diárias, ou seja, isso já está sendo utilizado no Incra, no monitoramento.
Censipam, ou seja, elaboração de relatórios de inteligência de combate a grilagem e desmatamento no âmbito do Conselho Nacional da Amazônia. Nós estamos lá dentro, estamos fazendo isso, estamos participando.
Inpe e Embrapa, estamos tendo reuniões e estamos costurando, já trabalhando formalmente na disponibilização da plataforma TerraClass para verificação de uso e ocupação de solo, de acordo com o marco legal de 2008.
Validação da metodologia para o uso do sensoriamento remoto na regularização fundiária e para o acompanhamento do cumprimento das cláusulas resolutivas previstas no processo de regularização fundiária, que, diga-se de passagem, é um dos principais apontamentos que estão colocados lá no Tribunal de Contas da União.
Então, tudo isso, nós estamos fazendo junto com o Inpe e com a Embrapa, com a tecnologia e a validação da metodologia.
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Isso tudo, essas parcerias técnicas de que nós estamos falando, quando a gente junta as parcerias institucionais, Inpe, Embrapa, SCCOM, mais a inteligência territorial, mais os sistemas integrados, nós estamos falando do que vai ser essa plataforma de gestão fundiária que a gente terá funcionando antes do final deste ano - na verdade é no início do segundo semestre a nossa previsão, não estou querendo dar data. A gente vai ter uma plataforma única que vai dar acesso a todos os serviços prestados pelo Incra. O que é que essa plataforma vai fazer? Ela vai substituir gradualmente todos os sistemas legados e antigos existentes no Incra, inclusive todos aqueles existentes no antigo Terra Legal, que serão migrados para dentro dessa plataforma. A plataforma vai abarcar toda essa tecnologia nova aqui dentro e a automatização, com inteligência artificial, tudo aqui dentro.
Então, você tem um tripé de recursos. E quando a gente fala de recursos vem um agradecimento ao Congresso Nacional. Nós tivemos uma recomposição orçamentária significativa para 2021, que está por trás de parte disso que estou falando que vai acontecer no ano de 2021, o recurso de pessoas, o recurso tecnológico. A tecnologia é o pilar de tudo, acho que é a grande transformação que haverá no Incra nesses próximos anos e, por fim, a legislação.
E aí eu me permito falar um pouquinho do PLS 510. Eu me permitiria dizer que já assisti a esse filme, já assisti a essas cenas todas que nós estamos vendo nessas últimas semanas, em especial nas últimas duas semanas, ao longo da discussão da Medida Provisória 910. Antes de ser lançada ela já tinha apelido, era a MP da Grilagem, a MP do Desmatamento. Então, acho muito interessante porque se está falando a mesma coisa do 510 e, em parte, também do 2.633, que está correndo na Câmara.
Então, só para exemplificar - e não vou me aprofundar na análise técnica dos parâmetros ou dos artigos do projeto -, esse é o art. 13 atual, a íntegra dele, que trata dos requisitos para a regularização fundiária de imóveis de até quatro módulos fiscais: serão averiguados por meio de declaração do ocupante, sujeita à responsabilização nas esferas penal, administrativa e cível, dispensada a vistoria prévia. Isso é o que diz hoje a lei. Tudo o que a lei hoje - hoje - diz sobre os requisitos para a regularização... E aqui eu faço um parêntese: fora o que está colocado via Decreto 10.592, porque aí não é a lei. Então, o que a lei diz hoje é isso.
Nesses últimos dias, a gente começou a ver documentos muito bem formatados, bonitos, dizendo que a lei atual já prevê um monte de coisas, dizendo que a lei é suficiente para isso, mas o que a lei hoje diz como requisito é isso daí. E o que se está dizendo é que o PLS 510, na verdade, abre uma enorme brecha. Mas o que é que na prática está escrito? Só para fazer um adendo, quem está escrevendo esses documentos bonitos deveria respeitar mais o Congresso Nacional e saber que os Parlamentares vão ler, porque a lei é essa, só isso. E o que está escrito hoje na proposta do PLS 510 é isso aí. Além da declaração, que não deixa de ser uma ironia, porque se chegou a dizer que era a Medida Provisória 910 que tinha inserido a tal da autodeclaração, quando ela, na verdade, já está na lei. Aliás, voltou a ser só ela, porque a 11.952 só pede ela. Mas, assim, o que o 510 diz, incluiu, foi isto: planta e memorial descritivo assinado por profissional com ART.
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O CAR - também li um documento de que o CAR já está na lei -, o CAR não está na lei não. As declarações do requerente e do cônjuge, aí tem a lista do que é preciso declarar, a realização de vistoria prévia, dizendo aqui quais são as obrigatoriedades de vistoria... Ah, porque eu esqueci de dizer antes: seguem as obrigações colocadas aqui.
Então, quem diz que o PLS 510 está flexibilizando os requisitos para o imóvel é porque está achando que as pessoas não vão ler. É isso, é o caput e um parágrafo único. Hoje passa a ser isso aqui. Então, não é verdade.
É a mesma coisa na questão ambiental, a mesma coisa. Também li documentos bonitos essa semana, de que é a questão ambiental que vai flexibilizar, que o PLS, que não precisa disso, porque, na verdade, a Lei 11.952 já prevê tudo.
Muito bem, pessoal. Vou fazer aqui uma provocação a quem tiver curiosidade na parte de informática. Entra aí no site, procura a Lei 11.952 e dá um procurar, um buscar, um "control f", que é o comando para buscar, e procura a palavra "embargo" no texto da Lei 11.952 ou procura a palavra infração. Essas palavras não existem na Lei 11.952, não existem. Elas existiram durante um período, exatamente no período de vigência da Medida Provisória 910, e deixaram de existir. O que existe na Lei 11.952 sobre legislação ambiental está no art. 15, e aí vale uma explicação: o art. 15 está falando "depois da titulação, na verificação das cláusulas resolutivas". Ou seja, pode rescindir o contrato, a pessoa já recebeu o título, você vai ter que verificar o respeito à legislação ambiental, em especial quanto ao cumprimento do disposto no Capítulo VI da lei ambiental. É isso que fala sobre legislação ambiental. Então, quem apresentar coisa diferente disso, eu gostaria de saber em qual artigo da Lei 11.952 está dito que precisa.
E, no PLS 510, que vai facilitar e que vai prejudicar o meio ambiente? Além do próprio art. 13, e aí vale voltar no art. 13, porque o art. 13 é o que diz antes, antes, fala sobre antes da titulação. Só para lembrar, o art. 15, que já tem essa cláusula ambiental, é depois do título. Então, o PLS 510, assim como o 2.633 e assim como a Medida Provisória 910, inclui cláusula ambiental antes da titulação. Incluiu o CAR; incluiu aqui, nas declarações do requerente, que ele tem que declarar que não tem embargo ambiental, que não tem infração; torna obrigatória a vistoria prévia no caso de haver embargo ou infração, porque, independentemente da declaração, isso vai ser checado com a base federal de dados. Então, você tem uma série de outros... Segue aqui, o próprio art. 15 está mantido e, além disso, o art. 19, que é lá adiante, ainda proíbe que sejam renegociadas, está proibido que se aprecie a renegociação de um imóvel se essa área for objeto de embargo ou auto de infração. Lá na frente.
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Então, a lei atual tem uma cláusula resolutiva, o texto do 510 tem uma cláusula antes, a mesma cláusula, e uma cláusula depois, que proíbe a renegociação. Esse é o quadro da questão ambiental no PLS 510, comparado com a lei atual. Exigência do CAR: não existe hoje, está sendo colocada; proibição de regularização em área com infração ambiental: não existe hoje, está sendo colocada. Então, é isso! A única coisa que já existe hoje na legislação é o que está no art. 15, que é o respeito à legislação ambiental como condição resolutiva.
Então, no nosso entendimento, o texto global - e não vou entrar no mérito, porque acho que cabe ao Congresso, aos Parlamentares, aos Senadores e Deputados avaliarem o mérito do conteúdo do que está sendo proposto. O Incra não é órgão de proposição dessa política, mas órgão executor. O que vier do resultado dessa discussão será executado, parametrizado dentro desse sistema, e o papel desse sistema será fazer essa execução da maneira mais ágil e segura possível. Mas a gente entende que o PLS promove a utilização de tecnologias, permite a validação das informações dos requerentes das bases de dados e sistemas, favorece a aplicação da legislação ambiental aos ocupantes, aperfeiçoa o processo administrativo de verificação dos requisitos da lei, proporciona mais segurança jurídica e transparência ao processo de regularização e aumenta a governança fundiária e o ordenamento territorial.
E por que a gente precisa disso? Aí vem um detalhe: eu acho a gente, como órgão de governo, tem que pensar em todos os vieses, ou seja, tem que pensar na questão de regularização fundiária, na atividade econômica dessas famílias que lá estão, tem que pensar - é óbvio, porque é essencial - na questão da política ambiental, da sustentabilidade desse pessoal, mas tem que lembrar também da qualidade de vida dessas pessoas que estão lá.
A Amazônia é a região potencialmente mais rica do Brasil, porém, quando você observa esse público, vê que ele tem uma renda média de 1,01 salário mínimo, quando a gente olha para essas famílias de produtores rurais com área de até 500 hectares - e 500 hectares são praticamente seis módulos fiscais na Amazônia -, a renda média dessas pessoas é de 1,01 salário mínimo. Quando a gente olha o nível de desenvolvimento humano, o IDH do Brasil - esse número varia de acordo com o ano que a gente olha - é de 0,765, equivalente aos da China e Colômbia. Quando a gente olha só os Estados da Amazônia Legal, em que pese toda a riqueza que temos na região, esse número cai para 0,683, a gente iguala com o Iraque. Se a gente considerar apenas a Amazônia rural, ou seja, retirar as capitais e as cidades maiores, as cidades polo, esse número cai para 0,547, ou seja, a gente vai para o nível de Uganda, Benin. E, se a gente for para alguns dos Municípios mais críticos em termos de desmatamento e de pobreza rural, como é por exemplo o Município de Portel, que é uma das regiões alvo da nossa ação, o IDH é de 0,483. Nós estamos falando, em plena Amazônia brasileira, com toda a sua riqueza e com toda a abundância de recursos naturais, de pessoas que vivem com um padrão de qualidade de vida abaixo do Haiti ou da Etiópia. Então, é nessas pessoas que a gente também tem de pensar e ver de que maneira a gente consegue compatibilizar esse conjunto de políticas públicas para chegar até elas e tentar, efetivamente, afetar a qualidade de vida de cada uma delas.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado, Dr. Geraldo, pela sua apresentação.
Informo aos Srs. e Sras. Senadores que essa apresentação estará à disposição na Comissão de Agricultura para que todos os Srs. e Sras. Senadores possam ter acesso a ela.
A Senadora Kátia pede a palavra.
V. Exa. tem a palavra.
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A SRA. KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO. Pela ordem.) - Obrigada, Sr. Presidente.
Eu gostaria de indagar ao Presidente do Incra se ele trouxe as imagens da plataforma. Essa era a minha expectativa, Presidente, que talvez possa dirimir mais dúvidas a respeito do que a plataforma faz, porque, às vezes, fica parecendo que é uma coisa burocrática, mas na verdade é uma coisa extremamente técnica e de campo. De certa forma, eu quis ver em detalhes para ver o avanço em cima das áreas protegidas na Amazônia. Então, eu penso que a parte mais importante, a meu ver, Geraldo Melo, era esta: mostrar o que essa plataforma é capaz de fazer e identificar se as terras estiverem tituladas.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito bem, Dr. Geraldo, o senhor tem essa apresentação?
O SR. GERALDO JOSÉ DA CAMARA FERREIRA DE MELO FILHO - Tenho, sim.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Quer aguardar um pouco mais ou já pode produzi-la?
O SR. GERALDO JOSÉ DA CAMARA FERREIRA DE MELO FILHO - Posso em dois minutos... Se me der um minuto eu a coloco na tela, por favor, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito bem.
Enquanto isso, eu informo ao Dr. Raoni Rajão, à Débora Assis, ao Felipe Nunes e também ao Britaldo Silveira Soares Filho que eu recebi o documento de vocês e estou encaminhando-o ao Relator para que ele possa analisar o documento. Ele chegará à mão do Relator daqui a pouco. Nós vamos digitalizá-lo, porque o Relator está em Cuiabá, e ele o receberá hoje ainda digitalizado.
Só quero informá-los de que esse documento estará na posse do Relator, pois é ele que tem que fazer essa análise - e claro que nós também -, e vamos disponibilizar também para todos os Senadores, para que possam ter acesso a esse documento que os senhores e a senhora mandaram para a Comissão. (Pausa.)
Estamos prontos, Geraldinho? Estou aqui usando essa aproximação da Senadora Kátia, também o chamando de Geraldinho. (Risos.)
O SR. GERALDO JOSÉ DA CAMARA FERREIRA DE MELO FILHO - Fique à vontade. Estou só passando para o pen drive, porque estava no outro computador. Deixe-me só plugá-lo aqui. (Pausa.)
Aqui está o.k.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Fique à vontade.
O SR. GERALDO JOSÉ DA CAMARA FERREIRA DE MELO FILHO - Posso compartilhar aqui.
Deixe-me só não apanhar do sistema aqui. (Pausa.)
Estão vendo aí?
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Positivo.
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O SR. GERALDO JOSÉ DA CAMARA FERREIRA DE MELO FILHO (Para expor.) - Bom, então, vamos lá!
O processo de regularização passa por dupla checagem na verdade. A gente tem uma primeira etapa da checagem, em que a gente faz a checagem do CPF do ocupante. E, desse CPF do ocupante, é feita a checagem do enquadramento dele em relação aos requisitos daquela pessoa com relação à lei e à possibilidade de ela ser beneficiária ou não da política de regularização fundiária. Então, isso é basicamente com o cruzamento dele dentro das bases de dados do próprio Governo e do próprio Incra. Isso é feito automaticamente.
Então, todos esses requisitos são os que já estão na lei, no decreto ou que vierem a ser incluídos. E aí é um ponto que eu sempre digo: que esses requisitos que sejam colocados, na medida do possível, sejam coisas checáveis de maneira automatizada. Para gente, esse é o melhor dos mundos, porque a gente faz com que o sistema funcione automaticamente.
A segunda etapa da checagem é checagem do imóvel. Vamos lá. Se a pessoa não passou, se o CPF, se a análise daquela pessoa não prosperou, acabou aí o processo, e esse processo está negado.
A segunda etapa é o processo do imóvel. Faz-se o processo de checagem do dado geográfico. Ou seja, aí nós vamos identificar se as demais informações prestadas batem em relação àquele imóvel. Ou seja, sobreposição, comprovação de prática de cultura efetiva, ocupação, exploração por seus antecessores. Ou seja, o enquadramento daquele imóvel em relação aos requisitos também da lei.
Isso aqui é hoje, é como está funcionando. Isso aqui ainda não é a tela do sistema novo. Então, tudo isso aqui é feito de maneira automática com consulta das bases automáticas. Ou seja, tudo isso aqui se sobrepõe à área de reserva militar, se situa em faixa de fronteira, se sobrepõe à terra indígena, à área de interesse da Funai, à área de serviço florestal, à área de base. Eu vou pular. Em resumo, aqui tem um checklist de todas as restrições legais do processo de regularização fundiária, previstos pelos senhores, na lei ou ainda adicionalmente nos decretos. Essas checagens são feitas automaticamente pelo sistema, seja com a checagem na base georreferenciada ou na base do CPF.
Então, isso aqui é feito. Havendo um "sim" - e aqui há um "sim", mas o "sim" aqui é porque foi feito já o georreferenciamento pelo Poder Público e aqui é simplesmente para dizer que aquele georreferenciamento vai ter que ser cobrado da pessoa. Havendo um "sim" aqui, o processo para ou, se for o caso, a pessoa vai ter que justificar isso tudo. Então, tudo isso daqui é feito automaticamente.
Isso aqui roda automaticamente no sistema. E o que está rodando automaticamente no sistema para aparecer naquelas telas ali? Então, isso aqui é o mesmo exemplo que eu mostrei para a Senadora Kátia, quando ela aqui esteve. Isso aqui é a análise de um contexto. Aqui é o exemplo do Estado do Pará. Essas são as glebas públicas federais. Essas são as áreas indígenas. E aí vem a informação. Esses perímetros de glebas públicas das áreas indígenas, todos, são lançados pela Funai. As unidades de conservação lançados pelo ICMBio, ou seja, só quem coloca ou retira esses perímetros é a Funai ou o ICMBio. Ou seja, o Incra não domina esses perímetros. Aí os assentamentos lançados pelo próprio Incra. Por quê? Porque são áreas de restrição.
Vamos dar um zoom aqui numa região. É a Região de Rurópolis. E aí, para ficar claro, essas áreas em azul aqui - estou tentando mostrar com laser - são parcelas com processo de regularização. Se vocês observarem, elas não sobrepõem nem as áreas laranjas, que são assentamentos, nem as áreas amarelas, nem as áreas verdes.
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Esses azuizinhos aí, na verdade, são perímetros dentro do Sigef. O Sigef, basicamente, é uma área com perímetro georreferenciado, e você tem que ter um técnico que vai assinar uma ART. Se uma pessoa tentar fazer um perímetro de Sigef dentro de uma área indígena, o sistema não vai aceitar; ou, dentro de unidade de conservação, não vai aceitar; dentro de assentamento aceita, porque, em assentamento, a gente também faz Sigef dentro do assentamento, mas não com o objetivo de regularização.
As manchinhas vermelhas são embargos lançados pelo Ibama dentro dessas áreas, e o sistema checa automaticamente.
Isso é o CAR, e aí já vem uma primeira coisa: o CAR não tem nada a ver com o Sigef - o CAR e o Sigef. No Sigef, não há sobreposição; no CAR, pode haver sobreposição, e o CAR é autodeclaratório. Porém, o CAR não é o documento que virará um título de propriedade - isso é essencial que a gente diga. O Sigef é um cadastro com o objetivo fundiário, ele tem responsabilidade técnica, tem um ART, tem um engenheiro, a pessoa entra no sistema do Incra e lança o seu perímetro georreferenciado, e, se esse perímetro não bater ou sobrepuser qualquer outra área, seja de um vizinho, seja de um perímetro indígena, seja de unidade de conservação, o sistema rejeita. O CAR não é a mesma coisa: o CAR é um cadastro autodeclaratório em que a pessoa entra, lança um perímetro e diz o que está fazendo lá dentro - ela faz isso. Eles são complementares, mas o CAR não tem o objetivo fundiário; o CAR tem o objetivo ambiental, e ele é instrumento para que os órgãos ambientais executem a sua política ambiental.
Além disso, nós fizemos o cruzamento também com a base dos estabelecimentos agropecuários do IBGE, para checar se havia efetivamente ocupação anterior ao marco temporal.
Aí, a gente está dando um zoom em uma daquelas vicinais, checando cada uma daquelas ocupações. Então, cada uma dessas areazinhas em vermelho aqui são parcelas em que há o embargo lançado pelo Ibama - e esse processo, aqui, não prospera, isso aqui não irá adiante.
As outras áreas aqui onde há um CAR e onde há uma ocupação e onde houver um processo... Vamos lá; não significa que todas essas outras áreas estão o.k. Essas outras áreas terão a sua documentação checada, mas, pelo critério de embargo, elas andarão.
E isso aí é o mapa de uso de solo de 2008. Especificamente aqui nós usamos o MapBiomas, que está colocado aqui em cima - utilizado aqui. O que está sendo utilizado dentro da plataforma é o TerraClass, da Embrapa com o Inpe. Mas aqui, especificamente neste exercício que nós estamos mostrando na tela, é uma parcela utilizada do MapBiomas, e essa foto é de 2008, para comprovar que havia a ocupação da área anterior ao ano de 2008, o que não inutiliza o argumento anterior de que as parcelas onde existe o embargo não serão objeto de regularização.
Então, é isso que está sendo feito. Só que o que eu estou mostrando manualmente é o que está sendo feito de maneira automatizada. Esse eslaide aqui é só para a curiosidade de demonstrar para os senhores que o processo de regularização utiliza como base o Sigef. O CAR está sendo solicitado adicionalmente como um complemento, para que os órgãos ambientais tenham mais uma informação de fiscalização ambiental das propriedades.
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Para a instrução do processo fundiário, a utilização que dá o limite, que dá sobreposição ou que dá qualquer coisa, é necessário que a pessoa faça um Sigef georreferenciado, com a ART e com toda a responsabilidade técnica. Aí, nessas áreas, nós podemos afirmar que não há nenhum tipo de sobreposição.
Só para esclarecer, há possibilidade, sim, de sobreposição de CAR. Aqui, eu não estou defendendo nenhuma dessas pessoas até porque eu não sei quem são. Existem, várias vezes, pessoas que têm CAR em algumas dessas áreas em disputa judicial ou disputa de reconhecimento com Funai ou com o ICMBio em algumas coisas; em outras, não. Em outras, são tentativas de burlar a lei.
E essas pessoas, na minha opinião, o que elas fizeram foi se autodenunciar, e merecem ser levadas ao extremo da responsabilização da lei, quando for esse o caso.
É isso, Senador. Espero ter ajudado a esclarecer.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Sem dúvida.
Geraldo, esse sistema já está à disposição? Já está sendo usado? Ou é todo esse sistema que vai ficar pronto até o final do ano?
O SR. GERALDO JOSÉ DA CAMARA FERREIRA DE MELO FILHO - Senador, o que nós estamos fazendo? Hoje, nós estamos funcionando com os sistemas ainda herdados do Terra Legal. Eles estão funcionando de maneira muito menos ágil do que o que a gente precisaria. E não estamos fazendo mais evoluções nele. Por quê? Porque o que nós contratamos foi a plataforma, para onde, na verdade, vai haver a migração de todos os sistemas.
Então, hoje estão funcionando. As checagens já estão sendo feitas dentro de uma plataforma, que não é a definitiva.
A expectativa do Incra é a plataforma definitiva estar rodando a partir da virada do semestre, do início do segundo semestre. Aí, sim, a gente estará funcionando da maneira que, vamos dizer assim, o processo de regularização fundiária do País precisa, sendo suficiente para encarar o tamanho do desafio, que é enorme.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado, Dr. Geraldo, pelas suas colocações.
Dando sequência aos nossos convidados, eu passo a palavra para o Raoni Guerra Lucas Rajão, para fazer as suas colocações.
O SR. RAONI RAJÃO (Para expor.) - Boa tarde a todos. Boa tarde, Senador Acir; Senadora Kátia Abreu, com que já tive a honra de conversar anteriormente; Sr. Geraldo de Melo; Professor Benatti; Cristina Lopes; Senadora Zenaide, que entrou aqui; demais presentes, realmente é um prazer muito grande estar aqui para poder apresentar os resultados das nossas pesquisas e, de certa forma, debater, porque eu acredito que é de maneira clara, transparente, com debate de ideias em cima de fatos, que podemos avançar num assunto tão importante como a regularização fundiária.
V. Exa. pode autorizar a minha apresentação, por gentileza?
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Claro, com certeza.
Já está liberada, professor.
O SR. RAONI RAJÃO - Perfeito.
Antes de tudo, um ponto importante, que vem até do título: é importante, sim, como os senhores vão ver durante a minha apresentação, buscar a regularização fundiária principalmente para aqueles que merecem, para aqueles que ocuparam de maneira mansa e pacífica terras públicas dentro dos prazos regulamentares. E eu recebo de maneira muito calorosa, muito feliz, porque realmente estou positivamente pressionado pelos resultados do novo sistema desenvolvido pelo Incra.
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Coincidentemente, nós estamos com acordo de cooperação técnica com o Estado do Pará, onde existe também o órgão estadual, o Iterpa, que tem um desafio enorme. Estamos adotando, inclusive, mecanismos muito similares. Até, por acaso, aqui, só para os senhores terem ideia, por trás dele, está o Selo Verde, que é um mecanismo de monitoramento da pecuária, da agropecuária, na verdade, cruzando dados também de defesa animal, mas que também traz informações ambientais. E um dos seus usos será no apoio à questão fundiária.
Então, por exemplo, aqui, ele já faz cruzamento automático, se a área tem infração, se tem embargo, se ela tem sobreposição de CAR. No caso aqui está no lote do Iterpa... Já se calculam todas essas questões - se está em terra indígena, em unidade de conservação -, de modo exatamente a acelerar, porque é da nossa opinião, sim, que aqueles que têm direito, precisam, sim, de uma regularização rápida, célere e sem peso, principalmente os pequenos produtores, que são a maioria daqueles que estão esperando há décadas. Então, nesse sentido, temos, compreensão e estamos 100% de acordo.
Agora, o que nos preocupa, em particular, com o PL 510, é que traz avanços importantes - algumas das questões ambientais que foram até levantadas -, mas traz outras questões que nos preocupam e que estaremos apresentando aqui.
Em primeiro lugar, então, a gente precisa, e aqui as duas referências principais: esta, que é esse estudo que vai estar sendo disponibilizado para o público geral hoje, e que, por intermédio da Senadora, já pôde ser entregue para os Senadores. Realmente, agradeço aí pela divulgação também.
Então, antes de mais nada, é preciso separar, conceitualmente, o que é regularização e o que é grilagem? Nem toda regularização é grilagem. É preciso deixar isso muito claro. O que é regularização? Regularização é uma situação onde você tem uma posse mansa e pacífica, inclusive porque havia um incentivo do Governo até 1985, para que essas pessoas fossem para Amazônia! Depois se criou, um caos fundiário que, em 2009, buscou ser resolvido com o Terra Legal, que dizia que todas as pessoas que ocuparam até 2004, mansa e pacificamente, poderiam ter as suas áreas regularizadas.
Isso foi modificado em 2017, permitindo que as pessoas que entraram nas áreas até 2008 também pudessem ser regularizadas. Ou seja, é algo que ocorre dentro dos parâmetros da lei! É manso e pacífico, é um direito da terra, onde se tem o uso direto pelo próprio produtor. Você tem, no caso da legislação atual, o início da atividade pré 2011, e são produtores majoritariamente pequenos, que aguardam há décadas a regularização.
E o que que é grilagem? É a posse, muitas vezes, com violência e fraudes, o uso de laranjas, invasão de terra pública após 2012... Hoje, senhores e senhoras, se alguém entra em terra pública, sem a devida autorização, ou seja, e começa a atividade agrícola pós 2012, isso é um crime enquadrado pela Lei nº 4.947, no art. 20, com detenção de até três anos. É um crime! Por quê? Porque essas terras públicas são públicas, é patrimônio público, é como se alguém entrasse na sede da Petrobras e abrisse o caixa-forte. Então, é preciso defender essas áreas públicas também, e a lei estabelece muito claramente o que é possível, passível de ser regularizado, e o que, de fato, entra e pode, inclusive, ser punido, pela Lei nº 4.947.
E aí, o primeiro ponto é: Precisamos mudar a lei para reconhecer o direito de milhares de agricultores que esperam, há décadas, a regularização? Bem, esses, nós temos, de certa forma, uma amostragem de quem são esses produtores, a partir do registro do próprio Incra, da base do Incra, das parcelas em regularização que ainda não foram tituladas, que hoje são cerca de 108 mil imóveis, que estão já preparados, inclusive, porque tem a área georreferenciada. O universo total é maior, mas nós sabemos que as proporções continuam bastante similares a essa quantidade de imóveis dentro já do Incra, e a informação importante é a seguinte: 70% desses imóveis são de até um módulo fiscal.
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Somando-se de um a quatro módulos fiscais, ou seja, todos os pequenos, nós temos aqui, arredondando, 96% dos produtores rurais que estão aguardando regularização e que são pequenos.
O que a lei fala sobre isso? Ela já tem uma série de vantagens provindas do Terra Legal, em 2009, e, com a decisão do STF recente, juntamente com o decreto recente - é um decreto, inclusive, com avanços importantes feito pela atual gestão do Incra, citado pelo Sr. Geraldo Melo -, permite-se, com a imagem de satélite, sem vistoria, já titular 96% de todos os produtores que estão aguardando a regularização fundiária. Isso é feito com a lei atual; não precisa do Congresso. Com esses avanços técnicos que estão sendo feitos no Incra, eu tenho certeza de que isso vai avançar muito.
O que está sendo debatido, então? Facilitar isso para esse número muito pequeno de produtores aqui, mas que possuem uma área muito substancial, que são os produtores médios e os grandes.
De fato, precisamos acelerar esse processo de regularização. Eu entendo que, em todo novo Governo, existe um processo de reorganização, mas, olhando para os títulos definitivos em glebas federais, que é o objeto específico desse PL, do nosso debate aqui agora - são imóveis particulares, não é assentamento -, houve uma paralisia do processo de regularização nesses últimos dois anos, sendo que, em 2020, o Incra executou só 34% do orçamento. É claro que a gente entende agora que o Incra está se capacitando, com novas tecnologias, e que ele vai conseguir avançar nisso, mas o que hoje nós temos é uma falta de celeridade nos próprios processos do Incra. Houve anos, como o de 2014, em que foram titulados 10 mil imóveis. Se nós estivéssemos titulando, ano a ano, um volume de 10 mil imóveis, podem ter certeza de que essa fila de 100 mil produtores aguardando a regularização hoje seria de 50 mil, 40 mil, 30 mil produtores, pela lei atual.
Assim, não é preciso mudar a lei para poder avançar e para poder resolver o problema de 96% dos produtores, que já têm, junto com as tecnologias desenvolvidas pelo Incra atualmente e junto com a legislação atual, realmente um caminho muito claro para poder avançar na regularização.
Agora, o segundo ponto é o seguinte: a regularização, a titulação reduz o desmatamento ilegal? O primeiro a nos dizer que esse não é o caso é o próprio Tribunal de Contas da União. A mesma auditoria apontada pelo Sr. Geraldo mostra também uma quantidade enorme de irregularidades pós-titulação. No caso aqui, eles fizeram uma análise de 208 parcelas tituladas, por amostragem, e, dessas, 118 parcelas foram desmatadas de maneira indevida após 2008, além de outras irregularidades também somadas aqui, o que fez com que, em 198 dessas 208, ou seja, em quase todas, houvesse irregularidades. O que o TCU aponta é a incapacidade do Incra de agir em cima dessas irregularidades, ou seja, de fazer cumprir a lei e tomar de volta o título dessas pessoas, como exige a legislação.
O que está acontecendo hoje? Está se titulando, o que é um presente, uma doação, de certa forma - até cem módulos fiscais, até 100 hectares, inclusive, é gratuita -, para os produtores, mas não se está controlando devidamente o que esses produtores fazem nessa área e a obediência deles à legislação pós-titulação.
Então, é por isso que, quando nós olhamos, por exemplo, esse estudo publicado, por Probst et al, no ano passado, na Nature Sustainability, após o título, nos anos posteriores ao título, vemos que o desmatamento aumenta em comparação com aqueles imóveis que não receberam o título. Também por quê? Porque, de um lado, não há controle ambiental e, do outro, há ali um incentivo para que o produtor invista na terra. Se a terra é dele, ele vai formar pasto; formar pasto é desmatar, e desmatar custa. Ele não vai fazer isso quando ele não tem certeza de que a terra é dele. Assim, existe ali um incentivo para investir - e, muitas vezes, investir se traduz em desmatamento -, mas não existe o controle da ilegalidade na outra ponta.
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É por isso que, por exemplo, em comparação com as públicas destinadas para a conservação e até com as não destinadas, a média percentual de vegetação nativa nessas áreas, na Amazônia, tem caído substancialmente: era por volta de 70%, mais de 70% aqui no caso da... Era um pouco menos de 70% da privada destinada em 1999, e chegamos a 55% em 2008.
Há o segundo ponto: o próprio Incra já citou que há um estudo que fala que cabe ao titular diminuir o desmatamento. Enfim, eu busquei essa informação. Até depois, caso haja um segundo estudo, eu gostaria também de ter acesso. De fato, o que ele aponta? Ele compara a área total desmatada - vou colocar aqui - dentro das áreas irregulares, no caso de assentamento, ou seja, são pessoas que têm o CAR, e o titular do CAR não coincide com a lista do Sipra, que é uma lista dos assentados que têm o direito de estar ali. E, de fato, nós temos aqui uma quantidade de desmatamento acontecendo nesses cadastros dentro dos assentamentos, maior naqueles irregulares, ou seja, aqueles que não coincidem com a lista do Incra, com relação àqueles regulares. Só que, quando nós consideramos que a área regular é muito menor do que a área irregular, na verdade, aqueles que estão regulares e que coincidem, que estão na lista do Sipra, de fato, estão desmatando mais do que aqueles irregulares, o que reforça o que toda a literatura científica já aponta: você, titular, sem controles ambientais, como se fez até agora, infelizmente, aumenta o desmatamento e não diminui.
Há o segundo ponto: é seguro titular áreas médias e grandes sem vistoria de campo? Então, essa, inclusive, é a mudança principal trazida pela proposta, pelo PL 510. É muito fácil você olhar na Amazônia imóveis que estão à venda, inclusive, buscando se beneficiar exatamente desse processo de titulação. Nós fizemos aqui algumas contas de maneira a estimar o lucro de alguém que invade uma área de, por exemplo, seis mil hectares - há várias à venda ali na região, inclusive uma gleba federal próxima de Altamira. Você investe entre R$1 mil e R$2 mil para poder formar pastagem. Você, a partir disso, paga uma taxa para o Incra com relação àquela área, que é um percentual muito pequeno comparado ao valor real. Para os senhores terem uma ideia, são R$46 por hectare o que você paga pela terra ao Incra. São R$46 por uma terra que vale R$2 mil, R$3 mil, R$4 mil. Por isso, ao final das contas, numa operação como essa - é fácil encontrar anúncios de seis mil, sete mil hectares -, você tem lucros milionários a partir da titulação dessas áreas.
Afora isso, há situações claras de fraude. Por exemplo, já se tem discutido há algum tempo aumentar o limite da titulação e da titulação sem vistoria de campo para 15 módulos fiscais até 2,5 mil hectares. É comum você ver situações onde há registros no Incra que são parcelados em bloquinhos de 15 módulos fiscais, já esperando depois titular tudo isso, normalmente em nome de laranjas, e formar um grande imóvel.
Também há outra situação que é muito preocupante, na qual há uma grande área declarada em regularização no Incra e, embaixo dela, vários pequenos imóveis. Imagine titular essa área sem o trabalho de campo, sem verificar, por exemplo, quem são esses pequenos que estão aqui embaixo, sem verificar, por exemplo, se, às vezes, não haverá até uma situação em que o grande chega ali, titula, chega ali com a polícia inclusive, e pede, depois, uma reintegração de posse, expulsando quem, na verdade, merece estar ali, porque, pela ausência da vistoria de campo, não se pôde verificar a realidade.
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De fato, nós fizemos aqui um levantamento na internet, na OLX... No Facebook, no caso, não verificamos isso, mas sim em vários sites inclusive de empresas que vendem terras, de imobiliárias, e encontramos uma centena de anúncios, totalizando 127 mil hectares e meio bilhão de reais. Em todos esses anúncios, estava escrito: "Protocolado no Terra Legal". Por exemplo, há uma área aqui de 1,8 mil hectares. Há áreas até de 6 mil hectares, de 7 mil hectares. Inclusive, isso é contra a Constituição. Para poder titular uma área pública acima de 2,5 mil hectares, é preciso passar pelo Congresso Nacional.
Então, o que está acontecendo é que o mercado da grilagem de terras na Amazônia está tão aquecido, com uma expectativa tão grande de impunidade, que as pessoas estão colocando na internet. É como se eu roubasse um carro e anunciasse na internet: "Carro roubado pode ser regularizado".
Então, existe realmente um risco muito grande e a necessidade de ser fazer um trabalho benfeito para poder evitar essas situações.
O que significa, por exemplo, você modificar a legislação? Eu trouxe até alguns eslaides, inclusive, apresentados pelo Sr. Geraldo. De fato, o PLS 510 não modifica toda a legislação anterior. Ele modifica uma série de pontos-chaves. Ele traz algumas melhorias. Inclusive, essa questão dos embargos e das multas é positiva, sim. Agora, o que é preocupante aqui é que, em primeiro lugar, enquanto a lei anterior permitia ao beneficiário obter somente uma terra, uma área, o PL 510 permite que um cidadão, no caso de já ter uma área, consiga outra área, contanto que ela não passe de 2,5 mil hectares. E 2,5 mil hectares é muita terra! Nós estamos falando de uma área de milhões de reais.
Enquanto a lei atual permite titulação na situação que era comum até 2008 e até 2011, no caso do art. 38, já no caso principal, em que há um desconto maior, ela já permite para 2012. E, no caso principal, do art. 38, permite até 2014. E, ainda por cima, há a introdução do art. 33, que diz das áreas que não são passíveis de regularização. Por exemplo, se elas estão embargadas ou estão com algum tipo de problema ou foram invadidas após o marco atual, que é 2011, elas podem ser alienadas por meio de licitação pública, com preferência da pessoa, que já é o posseiro. A pessoa invade ilegalmente, cometendo um crime, de acordo com a legislação atual, e ainda tem o benefício de ser o primeiro na licitação, numa área de 2,5 mil hectares, que, inclusive, vai ser titulada sem vistoria de campo.
É essa, senhoras e senhores, a nossa preocupação. Nós não queremos interferir no processo de regularização fundiária, que já está acontecendo e que já pode beneficiar 96% dos produtores que estão esperando na fila. Mas essas pequenas mudanças têm um grande impacto na forma como se faz a regularização fundiária. Inclusive, é possível visualizar esses... Aqui, em amarelo, nós temos... Em laranja, são as áreas que já são regularizadas pela legislação atual. Há essa minoria de imóveis, inclusive muitos deles são grandes imóveis, concentrados em Roraima. Alguns deles também estão em Tocantins, e boa parte, no Pará, principalmente em áreas de fronteira, na BR-319, áreas onde há o quente do desmatamento, onde de fato existe uma concentração muito grande de desmatamento. Vão ser exatamente essas áreas de desmatamento recente que vão ser beneficiadas exclusivamente pela mudança na lei.
Portanto, quais são as opções para a regularização? Sim, é crucial avançar na regularização fundiária. A lei atual já permite titular, sem vistoria presencial, 96% dos imóveis. O que é preciso é avançar na questão tecnológica, como já está sendo feito pelo Incra, investir, fortalecer o próprio órgão. E todos os produtores, com ocupação mansa e pacífica pré-2011, já têm direito à regularização. E esses são a maioria absoluta. Quem é que invadiu? Quem é que entrou em terra pública após 2011? Certamente, não é esse produtor que foi para a Amazônia para poder buscar uma vida melhor.
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As modificações trazidas, as modificações que nos preocupam - também há pontos positivos - no PL 510 são as de que ele facilita somente para médios e grandes, porque os pequenos já são facilitados, já podem ser titulados pela imagem de satélite; anistia invasões pós-2011, que são hoje consideradas ilegais; e também cria uma sequência de anistias. A lei de 2009 já anistiou todo mundo que invadiu pós-1985; a de 2017 já anistiou todos que invadiram de 2004 a 2011. E, agora, vamos aprovar uma lei que vai anistiar todo mundo que invadiu até e inclusive 2020, 2022, 2025, visto o artigo que coloca a possibilidade de licitação quando aquela área não é cabível de regularização?
Por isso, precisamos, sim, de um PL de regularização que coloque esse procedimento acelerado para os pequenos, porque eles têm um risco menor, têm um lucro menor - então, os grileiros não vão focalizar tanto a grilagem de áreas pequenas -, são, normalmente, proprietários que já estão ali e possuem só um imóvel. Isso é muito importante porque a titulação é uma doação do público para o privado e tem que ser pensada com um viés social; não se pode fazer isso para poder beneficiar um grande. Se um grande quer investir em terras na Amazônia, que ele vá lá, compre uma terra e faça uma grande área de soja, de pecuária. Não sou contra o médio ou o grande; agora, eu sou contra um recurso público ser repassado para médios e grandes a preço de banana, porque nós todos perdemos depois.
É preciso, sim, fortalecer o Incra, fortalecer os controles ambientais e manter esse marco temporal. É importante também destinar terras públicas para assentamentos que estão paralisados e para unidades de conservação - inclusive, essas unidades de conservação formam uma infraestrutura verde também para a nossa agropecuária através da chuva - e aumentar a punição para a grilagem. A lei atual é de 1966. Ela precisa ser atualizada. É preciso, inclusive, aumentar a punição, como no projeto, por exemplo, do Sr. Capiberibe.
Por isso, agradeço a atenção. Eu estou aqui disposto ao diálogo, a mais informações.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado, Professor Raoni Rajão. Peço, por gentileza, que envie para a Secretaria da Comissão de Agricultura a sua exposição, para que a gente possa deixá-la à disposição dos Senadores e Senadoras - é um estudo importante - e, principalmente, para que o nosso Relator, que está nos acompanhando, também possa tê-la à sua disposição a qualquer hora e tempo. Assim como o Incra fez, enviando a exposição para a Secretaria da Comissão de Agricultura, que também o senhor o faça. Muito obrigado pela sua participação.
O Senador Jaques Wagner pede a palavra.
Eu pergunto: quer falar agora ou após a fala de mais dois convidados, Senador Jaques Wagner?
O SR. JAQUES WAGNER (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Senador Acir, boa tarde!
Boa tarde a todos os amigos!
Eu vou ter que embarcar para Brasília, mas ainda tenho tempo.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Pois não!
O SR. JAQUES WAGNER (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Então, por mim, posso ouvir os outros dois. Se realmente o tempo ficar premente e se eu tiver que entrar no avião, eu queria fazer duas ou três perguntas ao Presidente do Incra. Mas aí eu posso deixar para depois.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito bem! Ao final, V. Exa. terá a preferência, então, para usar da palavra.
O SR. JAQUES WAGNER (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA) - Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Também a Senadora Zenaide pede a palavra para depois da apresentação.
Passo a palavra agora à Professora Cristina Leme Lopes, para que faça as suas colocações.
Muito obrigado pela sua presença junto conosco.
A SRA. CRISTINA LEME LOPES (Para expor.) - Boa tarde a todos!
Boa tarde a todos os Senadores e Senadoras que nos assistem! Cumprimento esta Mesa virtual, na pessoa do seu Presidente, Senador Acir, e gostaria de agradecer ao Senador Jaques Wagner pelo convite de participar desta audiência pública tão importante.
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Bom, eu sou advogada, pesquisadora sênior do Climate Policy Initiative da PUC-Rio, e a gente tem acompanhado de perto essa questão da regularização fundiária. Já publicamos várias análises sobre a MP 910 e sobre os dois projetos de lei que estão atualmente em tramitação: o PL 2.633, que está em tramitação na Câmara dos Deputados, e o PL 510, que é o objeto desta audiência pública. Além disso, o CPI/PUC-Rio também lidera uma força-tarefa de regularização fundiária na coalizão Brasil, clima, florestas e agricultura, um movimento que reúne quase 300 representantes do agronegócio, do setor financeiro, da sociedade civil e da academia. E nossas análises têm contribuído para os posicionamentos da coalizão, como o posicionamento que foi publicado na semana passada, alertando para os riscos da aprovação do PL 510.
Bom, antes de iniciar a minha apresentação, eu vou fazer uma apresentação técnica. Inclusive eu vou me ater à minha especialidade, que é a jurídica - eu sou advogada. Então, como disse bem o Sr. Geraldo Melo, que não levantou os parâmetros da lei... E, justamente, a minha apresentação é sobre os parâmetros da lei. Mas, antes, eu queria reafirmar e, inclusive, falar para a Senadora Kátia Abreu que nós lá do CPI da PUC-Rio e da coalizão - eu posso falar também em nome da coalizão - reconhecemos a importância da regularização fundiária. Ninguém é contra a regularização fundiária. A regularização fundiária é importante, é importante para apaziguar os conflitos fundiários, evitar novos conflitos, trazer segurança jurídica. Todo mundo sabe que a titulação é importante, é uma fonte de segurança jurídica, e a gente tem um problema histórico de insegurança jurídica. Os problemas fundiários brasileiros nascem com a ocupação do Brasil pelos portugueses, pela legislação da ocupação da terra. A forma como Portugal, a época, resolveu titular foi a maneira que hoje a gente está tendo essa série de problemas, porque a titulação era feita só para algumas pessoas. Então, essa questão da ocupação das terras públicas é histórica. Então, não há a menor dúvida de que a gente precisa enfrentar isso. E eu acho que estamos enfrentando e estamos avançando - e já avançamos muito -, mas precisamos avançar muito mais. E, além disso, o título também permite a inclusão econômica dos produtores rurais e vai promover a justiça social, que é o que todo mundo quer.
Mas a gente acha que não é o PL 510 que vai trazer as soluções para os desafios atuais. Eu acho que o Sr. Geraldo Melo, Presidente do Incra, trouxe, sim, já algumas soluções para os desafios atuais. Ele mostrou o quanto o Incra tem investido em plataformas, em sistemas, em integração de base de dados, tudo que não estava ao nosso alcance alguns anos atrás. Eu não tenho a menor dúvida de que esse instrumental tecnológico vai acelerar a titulação, e isso vai trazer uma série de benefícios.
Mas, para poder falar sobre os parâmetros técnicos da lei, gostaria também de compartilhar uma apresentação.
Deixe-me tentar compartilhar aqui. (Pausa.)
Pronto.
Então, com essa apresentação, a gente fez uma análise detalhada do PL 510 e selecionou alguns parâmetros para a gente mostrar quais são essas propostas, quais são essas alterações em relação à legislação atual.
Pois bem. A primeira alteração é uma alteração que tem sido muito falada. O Raoni Rajão acabou de apresentar muito bem o que acontece quando a gente faz alteração do marco temporal. O marco temporal é a data que permite: a ocupação anterior a essa data pode ser regularizada; posterior a essa data, ela é considerada uma ocupação ilegal - e essa ocupação ilegal a gente também pode denominar como grilagem.
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Então, a legislação atual... E há uma pequena confusão em relação a essas datas porque a lei estabelece duas datas. Por quê? Pela primeira regra, que eu chamo de regra geral, a legislação atual estabelece como data limite 22 de julho de 2008. O que diz essa data de 2008? Ela permite a regularização mediante descontos no valor da terra. Mas há, também, outro dispositivo na lei que permite a regularização para ocupações até dezembro de 2011. Nesse caso, o ocupante também vai pagar pela terra, também vai poder regularizar, mas ele vai pagar pelo valor cheio da tabela do Incra, que é bem abaixo do valor de mercado. Ainda é um grande prêmio regularizar a ocupação até 2011. E o que o PL 510 traz? O que o PL 510 traz é a alteração desses dois marcos temporais: o marco temporal da regra geral para pagamento com desconto até 25 de maio de 2012 e a regra que vai permitir todas as ocupações até 10 de dezembro de 2014.
Ora, como já está explicado, essa alteração não vai resolver aquelas ocupações históricas. É comum a gente ouvir "poxa, mas as pessoas vieram há 30, há 40 anos, e não têm o título da terra!" Realmente, é um absurdo, mas não é o PL 510 que vai conseguir titular essas pessoas. As ocupações históricas podem ser tituladas pela lei que já está vigente. Então, essa alteração do marco temporal só vai beneficiar aqueles que ocuparam novas terras públicas depois de 2011, dez anos atrás, data pela qual o programa, a Lei 11.952 já tinha sido publicada e já era bastante sabido que qualquer ocupação para a frente era uma ocupação irregular, era uma grilagem. Então, essa alteração do marco legal não favorece titulações históricas, não favorece os pequenos agricultores; ela favorece aqueles que ocuparam e invadiram terra pública sabendo que eram ilegais.
Bom, o segundo parâmetro que eu selecionei...
Desculpem-me. Os senhores estão me ouvindo? Porque eu recebi uma informação de que...
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Afirmativo. Nós a estamos ouvindo bem.
A SRA. CRISTINA LEME LOPES - O.k. Obrigada.
O segundo parâmetro trata dos requisitos para a regularização. A lei faz alguns requisitos. Não é qualquer ocupação, não é qualquer ocupante. Por exemplo, uma empresa que ocupou uma área e está fazendo atividade produtiva pode requerer a regularização em nome da empresa? Não, não pode. Então, a lei traz estes requisitos: precisa ser uma pessoa natural, ela não pode ter sido beneficiada por programa de reforma agrária ou regularização fundiária anterior e não pode ser um proprietário de outro imóvel rural. Por quê? Porque, justamente, como foi falado, a regularização de terra pública... A terra pública é um bem, um patrimônio de toda a sociedade. No momento em que você flexibiliza e dá condições facilitadas a preços menores para regularizar uma área, você tem que colocar alguns requisitos. O objetivo é um objetivo de justiça social. E o que faz o PL 510? Ele permite a regularização por quem já é proprietário de outro imóvel rural. É claro que ele coloca o limite de até 2.500 hectares. Sim, porque esse é o limite constitucional. Talvez, se a Constituição não tivesse estabelecido esse limite, o PL 510 também colocaria qualquer tamanho de área. E ele também permite que a pessoa tenha sido beneficiada em programa anterior. Ora, se o trabalhador já teve o seu título de terra, por que ele precisa ter outro? Quem está ganhando para essa alteração? Não são os pequenos, não são aqueles que estão há anos na fila da titulação esperando por uma propriedade em seu nome. Então, novamente, essa alteração serve a quem? Serve para um grupo, um grupo que já tem benefícios, um grupo que já tem terras. Então, a gente não entende como isso possa ser alguma vantagem para a sociedade.
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Bom, um terceiro dispositivo, parecido com o dispositivo anterior, que é de beneficiar aqueles que hoje podem não ter nenhum título. Eles ganham um título e, se eles repassarem, se eles venderem esse título, no futuro eles poderão ser beneficiados novamente com regularização fundiária. Ora, isso é incentivar a invasão constante. Porque, se eu sou beneficiário hoje de um título e eu acho que é interessante vender o meu título e ganhar dinheiro em vez de produzir naquela área. Aí, no futuro, eu posso novamente entrar em outra terra pública e ser titulado novamente.
Então, assim, essa alteração serve a quem? Àqueles que foram para o Centro-Oeste, para a Região Norte 30, 40 anos atrás, expandir, garantir a agricultura familiar? Não. Essa alteração só vai beneficiar aqueles que pretendem fazer da invasão de terra pública um negócio.
Uma outra alteração, que já foi comentada aqui também, diz respeito ao procedimento simplificado. O que é esse procedimento simplificado? O próprio presidente do Incra, Sr. Geraldo, explicou. É um procedimento pelo qual o ocupante entrega, faz declaração, vários requisitos. E esse procedimento simplificado isenta a vistoria prévia no local, ou seja, a vistoria vai ser feita remotamente. Como? Através de todo aquele sistema que foi apresentado aqui hoje, imagens da Planet, cruzamento de bancos cadastrais, e você vai conseguir verificar.
E a legislação hoje permite esse procedimento para posses até quatro módulos fiscais. E o que faz o PL 510? Ele amplia, mas ele amplia até o limite de 2.500 hectares. Ora, vimos agora com os dados públicos que em torno de 95, 96% dos cadastros hoje aguardando para regularização fundiária são menores do que quatro módulos fiscais.
Portanto, a maior parte dos beneficiários hoje da regularização fundiária já podem se regularizar pelo procedimento simplificado. Qual é o valor de estender esse procedimento para imóveis até 2.500 hectares? Se é 5% da base cadastral, mas representa uma grande área e, é claro, esse procedimento ainda não está totalmente implementado. O Sr. Geraldo acabou de mostrar, é um procedimento que está em via de implementação.
Temos garantia de que a vistoria por sensoriamento remoto vai dar certo? Será que ela vai ser suficiente? Será que ela vai evitar a fraudes? Então, inicialmente, por que não implementar para a maioria dos produtores que aguardam a titulação e se, efetivamente, no futuro tiver justificativa com base em dados e em ciência, a gente possa discutir essa extensão. No momento, não há justificativa para essa extensão.
Uma outra questão muito importante diz respeito às salvaguardas ambientais. Bom, as salvaguardas ambientais são aquelas regras que, dentro da legislação fundiária, são regras de proteção ao meio ambiente ou regras que vinculam a regularização fundiária à regularização ambiental. Por quê? Ora, muito se tem dito que o que esse PL vai trazer é que ele não vai anistiar crimes ambientais e vai evitar novos desmatamentos ilegais, mas não é verdade.
Então, o Sr. Geraldo falou muito bem que a lei, no stricto sensu da lei, a Lei 11.952, em seu texto legal, não estabelece obrigatoriedade de entrega do CAR e ela não vai estabelecer a obrigação de você declarar que a área não foi objeto de embargo a auto de infração. Ele fez uma provocação: onde está escrito embargo na Lei 11.952? E eu queria dizer que a legislação não depende de aplicação de uma lei, ela não é feita apenas no stricto sensu, lei em sentido estrito. Existe lei em sentido amplo. O que é isso? Ao aplicar uma política pública, a gente usa todo o arcabouço legislativo em vigor. E justamente o que o Sr. Geraldo reafirmou é que no final do ano passado, em 24 de dezembro de 2020, foi promulgado o Decreto 10.592. O que diz o art. 5º do decreto? Então, eu copiei o art. 5º aqui. Eu só vou chamar a atenção para os pontos principais.
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O art. 5º, no inciso I, na letra "d", o que precisa ser entregue como declaração: comprovante de inscrição no Cadastro Ambiental Rural. Isso está escrito textualmente no Decreto 10.592, atualmente em vigor. Continuando o artigo, nº 6, que "não mantenham, em sua propriedade, trabalhadores em condições análogas às de escravos". Também não é uma novidade do PL 510. Esse requisito já está previsto na legislação em vigor. Item 7, "o imóvel não se encontre sob embargo ambiental e não seja objeto de infração", de auto de infração expedido pelo órgão ambiental federal, ou seja estadual, distrital e municipal, ou seja, a legislação em vigor prevê, sim, como requisito para a regularização, a entrega de declaração dizendo que o imóvel não se encontra sob embargo ambiental. O artigo continua: que as análises das ocupações vão ser feitas por meio de sensoriamento remoto. Portanto, já está previsto, já está legislado, já está regulamentado o uso de novas tecnologias.
Todo o arsenal, todo o sistema que o Incra está montando, que vai entrar em vigor e que vai dar conta de mais de 95% das ocupações, vão ser feitas pelo procedimento simplificado, por sensoriamento remoto. E realizada a análise remota, será feita a verificação dos documentos declarados. E o que é que eles vão verificar? Se há termos de embargo ou infração ambiental, porque nesse caso, vai ser obrigatória uma vistoria no local. Vão analisar a inscrição no CAR.
Portanto, quando eu coloco que a Lei 11.952 já prevê essas salvaguardas ambientais, e não precisamos de uma nova lei, é porque a legislação em vigor já prevê. E um decreto, eu não posso acreditar que esse decreto... Ou a gente reconhece que o Governo publicou um decreto flagrantemente ilegal, e eu não acredito, porque a AGU certamente fez o controle de legalidade prévia... Portanto, esse decreto não tem um problema de vício formal de legalidade, então está em vigor. Se o decreto já prevê a entrega do comprovante do CAR, a entrega de declaração de que a área não é objeto de embargo, nem auto de infração e que esses cruzamentos vão ser feitos com as bases de cadastros atualmente em vigor, que em caso de constatação de dano ambiental, é preciso aderir ao Programa de Regularização Ambiental ou fazer um termo de ajustamento de conduta.
O que então traz o PL de novidade? O que ele traz de novidade é o seguinte: ele define infração ambiental como conduta lesiva ao meio ambiente comprovada por meio de esgotamento das vias administrativas, ou seja, isso, sim, é uma pegadinha. É uma pegadinha ambiental. Por quê? Sabemos, e há um relatório da Controladoria-Geral da União, de abril de 2019. Ela traz uma análise aprofundada do processo administrativo federal do Ibama. E em suas conclusões, ela diz: "os processos permanecem por tempo excessivo em todas as (...) etapas (...)" São no mínimo cinco anos. Sabendo que os autos de infração com desmatamento são as multas mais elevadas, outra coisa que esse relatório de auditoria traz de informação, esses processos podem demorar dez anos, doze anos, quinze anos.
Então, o que PL 510 traz é o seguinte: não é que ele vai verificar qualquer auto de infração ou embargo; ele só vai verificar aquelas áreas cujo auto de infração ou embargo tem o seu processo administrativo finalizado transitado em julgado; ou seja, na prática, você não vai ter nenhuma área sujeita a esse controle prévio de titulação.
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E o que ele faz depois, o PL 510? Aí está o seu artigo, para mostrar que já está na lei. Quais são as garantias pós-titulação? O mesmo decreto que eu mencionei diz que, no pós-titulação, as cláusulas resolutivas estabelecem o respeito à legislação ambiental, que o ocupante vai ter que fazer a comprovação de regularidade ambiental através de certidões negativas, através da análise do CAR e que o descumprimento das condições implica a perda do título.
E o que traz o PL 510 para a Lei? O simples respeito à legislação ambiental. O PL 510, efetivamente, enfraquece as salvaguardas ambientais. A novidade que ele traz em relação à legislação anterior é no sentido de enfraquecer, de limitar. Do jeito que essa proposta está sendo construída, o que a gente vai ver é a anistia nos crimes ambientais. Não anistia do ponto de vista da legislação ambiental, porque esses crimes não podem ser anistiados, mas a legislação fundiária não vai garantir um alinhamento das políticas. Você vai estar regularizando, titulando áreas que foram objeto de desmatamento ilegal, que não foram autuados porque o próprio Governo reconhece que quando não há titulação não há autuação. Um dos discursos é: é preciso titular porque quem tem o título da terra pode ser responsabilizado. Ora, se o controle ambiental é feito através da verificação de autos de infração e embargo, se eu já sei que quem não é titulado não tem autos de infração e embargo, que controle é esse? Não há controle. O controle ambiental é fraco.
Se o PL 510 quisesse trazer efetivamente um avanço na política ambiental, na vinculação da política fundiária ambiental, ele deveria verificar se houve desmatamento ilegal. E a gente vai verificar se houve desmatamento ilegal cruzando as bases de dados, essas mesmas bases que o Incra já mostrou que é possível cruzar: CAR, Planet, Prodes, MapBiomas. E não é isso que o PL 510 está trazendo.
Por fim, como já foi dito, esse PL traz também essa possibilidade de o ocupante do imóvel ter direito de preferência na aquisição de área por meio da licitação pública. O que é esse artigo? Esse artigo é o seguinte: as áreas não podem ser tituladas por meio das regras que foram estabelecidas - verificação da pessoa, da área, comprovação, vistoria, etc. Que áreas são essas? Ou elas são maiores do que 2,5 mil hectares ou elas extrapolam a lei ou elas extrapolam o limite do marco temporal, áreas ocupadas após 2011 ou, pelo próprio PL, após 2014, ou são áreas que possuem trabalhadores escravos. Essas áreas que não cumprem os requisitos legais, mas que estão sendo ocupadas por invasores de terras públicas, lá no futuro, vão ter direito de preferência na aquisição dessas terras. Isso é ou não é incentivar a ocupação de novas terras, incentivar o desmatamento ilegal, incentivar a grilagem?
Portanto, o que eu fiz aqui foi apenas comparar a legislação em vigor com as propostas do PL 510. E o que eu vejo muito claro nessa proposta é: ela não resolve as ocupações históricas, ela não resolve os problemas dos pequenos, ela não resolve o desmatamento ilegal. Ela apenas beneficia médios e grandes e incentiva novas ocupações.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado, Professora Cristina. Também peço que a senhora envie à Secretaria da Comissão de Agricultura a sua apresentação para que a gente possa deixar à disposição dos nossos Senadores e Senadoras para fazerem as suas pesquisas.
Muito obrigado por sua presença junto conosco.
Agora, passo a palavra ao Professor José Heder Benatti, para fazer as suas colocações, também agradecendo a presença de V. Sa. nesta Comissão, neste debate tão importante para todo o nosso País.
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O SR. JOSÉ HEDER BENATTI (Para expor.) - Boa tarde!
Primeiro, gostaria de agradecer ao Senador Acir, Presidente da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária, às Sras. e aos Srs. Senadores aqui presentes nesta sessão. Também, é um prazer estar hoje, aqui, à tarde, com a Professora Cristina, o Professor Raoni Rajão e o Presidente do Incra, Geraldo Melo.
Na realidade, ser o último a falar tem uma grande vantagem, porque não preciso repetir o que os demais já argumentaram e apresentaram de informação, que levam a todo um questionamento, e, de fato, pretendo apenas destacar dois aspectos desse rico debate que nós colocamos aqui.
A primeira questão é: quando o debate é sobre regularização fundiária, vou colocar isso diante da minha experiência de quatro anos como Presidente do Instituto de Terras do Pará, entre 2007 e 2010, antes disso, já um curioso, e continuando a pesquisar e conhecer melhor essa complexidade que é a questão de reconhecer o direito à terra, ou seja, dizer quem tem direito a ter direito à terra.
O primeiro aspecto que eu levanto, e aí, usando a analogia com a Amazônia, é que esse debate da regularização fundiária tem que parar de olhar como se estivesse olhando somente para a árvore. Nós temos que olhar para a floresta. Ou seja, se a única alternativa apresentada - e os dados que têm sido levantados indicam isso - é regularizar a terra, nós não vamos resolver o problema da Amazônia e, muito menos, do Brasil, que é o que, na realidade, a lei está regulamentando. Ela extrapola, hoje, a nova legislação, extrapola a Amazônia. Ela é uma regularização federal para o Brasil.
O que quero dizer sobre parar de olhar para a árvore e olhar para a Amazônia? Quero dizer que, na realidade, a regularização fundiária começa lá em 2009, depois, tem, em 2017, uma nova modificação, e, dois, três anos depois, hoje, estamos debatendo novas modificações sobre ela. Só que essas alterações, que têm todas as fragilidades colocadas, a gente tem que aprender, pelo menos eu aprendi como estudioso e na prática, que as normas, por si sós, não mudam uma realidade, mas formatam e passam um recado de comportamentos.
Eu vou dar só um exemplo sobre isso. Orientando um doutorado, em que se trabalhou sobre a nova lei, o Novo Código Florestal, e ela é uma advogada e professora no Mato Grosso, ela analisou dois Municípios no Mato Grosso antes da nova lei, o Código Florestal. Um Município tinha uma lei municipal, que articulava e ajudava a proteger a reserva legal e a Área de Preservação Permanente e o outro Município não tinha. Qual era o cenário? No que não tinha, a APP e a reserva legal eram mais desmatadas do que no Município que tinha uma legislação municipal de proteção da APP e da reserva legal.
Quando veio a alteração da lei, que muda a referência da reserva legal e da APP, principalmente, porque ela começa a contar a partir do leito e não mais da enchente média, o que aconteceu na prática? No Município que tinha uma lei municipal que mais protegia a APP, começa a aumentar o desmatamento na APP. Por quê? Porque assim a lei o permitia, ou seja, a lei deu um comando que estimula o desmatamento daquela área que antes era protegida; quer dizer, flexibilizou as regras. Na discussão atual, a grande questão é esta também: se a gente olhar todo o debate que está ocorrendo sobre a questão de direito à terra, e não só sobre regularização fundiária, os dados apresentados, tanto os que estão disponíveis no Incra, no Instituto Chico Mendes, na Funai, apontam que, desde 2010, você tem uma queda no reconhecimento do direito à propriedade de quilombolas, ribeirinhos, para criação de assentamentos, de povos indígenas, de seringueiros, de extrativistas. Ou seja, de um lado, você tem uma queda desse reconhecimento e, de outro lado, você tem o quê? A partir de 2019, o aumento do desmatamento da Amazônia, quando você tem todo um discurso que diz: "Se você ocupar, eu vou te regularizar".
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Na verdade, o grande impasse hoje do Estado brasileiro - e aí o Presidente do Incra, Sr. Geraldo Melo, mostrou que ter instrumentos de controle é fundamental, só que é preciso também ter uma política pública não só de regularização fundiária... O que nós estamos discutindo, para resolver o problema do desmatamento, da violência no campo e do respeito à diversidade de ocupações existentes no Brasil, em particular na Amazônia, segundo a própria ordem hierárquica de preferências estabelecida pela Constituição e pelas normas infraconstitucionais, é regularizar todo mundo. Todos têm direito à regularização fundiária, não é só o pequeno, o médio ou o grande, como claramente a Lei de Regularização Fundiária aponta como seus sujeitos prioritários, excluindo os demais.
Se o Incra, que faz a regularização fundiária, que cria assentamentos, que reconhece as áreas quilombolas, vai fazer regularização fundiária também, sendo que o seu corpo de servidores cada vez diminui mais, com aposentadorias, etc., qual a capacidade que ele tem para trabalhar com toda essa complexidade? Não tem; não vai conseguir. E os dados estão aqui demonstrando isso. E mais ainda quando você tem uma legislação que aponta para um único segmento que vai ser privilegiado na diversidade desses sujeitos sociais que querem ter acesso à terra.
Então, na realidade, o grande problema do impasse hoje em torno dessa dicotomia colocada, ou seja, se é bom ou não fazer a regularização fundiária, que é uma dicotomia falsa - e todos que aqui se manifestaram são favoráveis à regularização fundiária, mas têm preocupações com o que a lei pode estimular, com que sujeito será privilegiado em detrimento dos demais... Então, na realidade, o que se precisa discutir - e aqui o Parlamento, o Congresso Nacional e esta Comissão são sujeitos privilegiados e fundamentais nesse debate - é uma governança da terra.
Ora, os dados apresentados todos eles são frágeis, por quê? Porque nós ainda não temos um cadastro que consiga realmente representar a maioria dos imóveis titulados no Estado do Pará, em particular, que eu conheço mais, mas também na Amazônia e no Brasil. Você tem questionamentos sobre a fragilidades do registro de imóveis. Há questionamentos sobre se tudo que está registrado é realmente propriedade e foi legitimamente transferido do Estado para o particular.
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Então, se você tem fragilidades nos órgãos ou nos cadastros - que são fundamentais - fundiários e do direito de propriedade, é óbvio que vai haver toda uma dúvida sobre quem vai ter que ser regularizado. Então, um primeiro aspecto que eu levanto é este: na realidade, o que mais precisamos discutir, mais do que regularização fundiária, são normas de governança da terra, e aí nós temos leis que podem auxiliar com esse processo, basta uma organização muito mais administrativa e política, e para isso há pessoal, dinheiro, orçamento para que as políticas públicas possam ser implementadas.
E o segundo aspecto que eu levanto nesse debate que é fundamental são as preocupações levantadas anteriormente nas exposições, e elas são mais que justas. Na realidade, a Lei de Regularização Fundiária, e até aqui o que se conhece de política pública do Governo, é uma regularização fundiária passiva. O que é uma regularização fundiária passiva? Ela é passiva porque é o esperar da iniciativa privada em procurar o órgão público, em apresentar o georreferenciamento, em apresentar toda a documentação para dizer que ela tem direito. Ou seja, eu crio nesse aspecto onde... Se o Estado tem uma fragilidade de informação, se não sabe quem realmente está ocupando, onde, nem como, quanto e quando, se não tem controle sobre a violência, se tem só dados em que eu vejo o grau de desmatamento que está ocorrendo, mas não sei quem são os sujeitos, o que estimula e quando eles estão e quanto, porque eu não tenho um dado mais próximo da realidade, o que eu faço? Eu estimulo quem tem dinheiro, quem tem mais capacidade técnica, quem tem mais acesso aos órgãos, que apresente rapidamente o seu pedido de regularização fundiária. E aí em detrimento de quem? De quem tem menor poder aquisitivo, tem maior dificuldade de fazer georreferenciamento, que algumas vezes está esperando já há cinco ou dez anos uma proposta do Governo para ter uma titulação coletiva, para que tenha um assentamento criado, para que tenha uma reserva extrativista criada ou o reconhecimento da área quilombola ou de terra indígena.
Então, na realidade, o que está colocado, mais do que esse detalhe de se vai ou não aumentar a grilagem, é a questão da prioridade na regularização fundiária, é o reconhecimento da diversidade de sujeitos que têm direito a serem titulados, e não só um segmento que eu concedo que ocupe o imóvel a partir de uma data, que preenche alguns requisitos legais individuais.
Então, veja que todo um outro aspecto fundamental, de sujeitos históricos, que faz anos que estão esperando, que faz décadas que estão ali brigando pelo reconhecimento de seus direitos, não vão estar reconhecidos. E se eu priorizo uma única política, eu agravo essa situação. E aí todos os dados me mostraram que só a titulação não resolve o desmatamento.
E aí me vem, concluindo, a minha preocupação terceira: que nós vamos colocar não só em risco a regularização fundiária proposta, com as normas que têm todas as falhas aqui apresentadas, mas também toda uma preocupação de proteção com a Amazônia. Hoje se há uma preocupação nacional e internacional de proteção da Amazônia de ter a floresta em pé por causa da sua biossociodiversidade, por causa do papel e dos serviços ambientais que cumpre essa floresta, aí vem uma lei que estimula a ocupação e o desmatamento? É estimulado o quê? Só porque as pessoas querem desmatar têm maldade? Não, porque, como foi colocado aqui, a valorização da terra tem aumentado muito nesses últimos anos e há toda uma corrida, desde 2010, conforme os documentos do Banco Mundial já demonstraram, há uma corrida internacional em busca de novas terras. E cada vez mais a legislação brasileira abre o seu mercado para a compra de terras por estrangeiros. Então, todo esse componente faz com que você tenha todas as políticas econômicas, jurídicas e políticas colocadas estimulando a ocupação e o desmatamento. E aí vai, mais uma vez, na atual situação que nós estamos vivendo, agravar o cenário nacional de conflitos e violência pela terra, o desmatamento da floresta, como também a nossa imagem internacional, mostrando a nossa incapacidade de reverter uma tendência que os dados têm indicado, que é o aumento da violência e da destruição da Floresta Amazônica.
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Então, acho que talvez, no Senado Nacional, esta Comissão tem o papel fundamental de abrir esse debate e dizer: na verdade, a regularização fundiária é fundamental como instrumento e não como política pública geral. Instrumento porque ela vai estabelecer a forma, quando e como; como política, quem é que tem prioridade na diversidade de sujeitos que ocupam não só a Região Amazônica, mas, se você pegar hoje, parte do Cerrado brasileiro, o Nordeste, o Sudeste, de disputa pela terra. E aí, nesse dado, a regularização fundiária não pode aumentar um dado ainda muito ruim para o Brasil que é a concentração da terra.
Infelizmente, fui convidado hoje de manhã para fazer essas rápidas palavras, mas há um entendimento fundamental nesse debate que é o debate econômico: o que é que nós estamos regularizando e qual estímulo nós vamos estar criando? Porque a lei não basta ser boa ou não; a questão é qual estímulo ela traz para levar os sujeitos sociais a terem uma atitude na sua ação.
Por exemplo, finalizando, por que aumentou tanto o número de ocupação e desmatamento na Amazônia de terras ocupadas reconhecidas e não ocupadas por garimpagem, por garimpos na Amazônia? Os garimpeiros, de repente, resolveram ver a Amazônia como grande área a ser explorada? Não, não é só isso. É porque aumentou consideravelmente o preço do ouro no mercado internacional. Isso faz com que os riscos que vão empregar estimulem aquela atividade, porque sabem que vai ter retorno. A mesma lógica leva-se também à questão da terra. Se não tem direito de propriedade claramente estabelecido, se não tem os cadastros bem organizados, estipulados, se não tem todos os direitos reconhecidos pelos diferentes sujeitos sociais, eu estimulo a ocupação, a exploração, o desmatamento e a violência.
Então, na realidade, mais do que regularizar, nós estamos discutindo se vamos ou não dar o aval para aumentar o desmatamento e a violência no campo, em particular, na Amazônia.
Eu agradeço a possibilidade de aqui rapidamente apresentar essas preocupações e destaco que, mais que regularização fundiária, deveria ser um instrumento de administração e não um instrumento de política pública; deveria ser a governança da terra e não a regularização fundiária.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado, Professor José Benatti, pela sua palestra, pelas suas colocações.
Nós fizemos questão de não limitar o tempo dos nossos convidados, exatamente pela importância deste debate. Assim todos puderam fazer todas as suas colocações e explanações dentro do seu tempo, dentro da sua necessidade.
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Agradecendo mais uma vez a todos, pela participação, agora passo a palavra aos nossos Senadores, inicialmente ao Senador Jaques Wagner, para fazer as suas colocações.
O SR. JAQUES WAGNER (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - BA. Para interpelar.) - Obrigado, Presidente.
Eu já estou a caminho do aeroporto e, por isso, estou de máscara no carro, mas vou rapidamente dizer, primeiramente, da minha alegria pela reunião de hoje, da segunda reunião da CRA sob sua condução para esclarecimento. Porque eu digo sempre que o pior caminho na democracia é escolher a bipolaridade, a dicotomia. Isso não vai levar a gente para lugar nenhum. A privatização do ex-Presidente Fernando Henrique poderia ter sido muito mais bem-feita, a serviço da sociedade brasileira, se não estivéssemos divididos entre dinossauros, que éramos nós que não queríamos, e avançados. E acabou que a gente não conseguiu dialogar e mediar.
Então, como eu sou um convicto disso, eu quero começar dizendo, Presidente, que, para mim, o primeiro consenso construído nesta reunião é que nós não estamos aqui divididos em dois grupos: quem quer e quem não quer a regularização. Na minha opinião, todas as vozes que eu ouvi, seja de que posição for sobre que tipo de regularização, todo mundo fala a favor, inclusive eu.
Só para lhe dar o exemplo concreto, naquilo que me competia como Governador do Estado da Bahia durante oito anos e sequenciado pelo meu colega Rui Costa, até agora, entre 2007 e 2020, nós regularizamos 1 milhão de hectares, dando título de terra - 1 milhão de hectares! São bem mais de 100 mil títulos de terras que demos para os pequenos daquilo que era terra devoluta do Estado da Bahia - evidentemente, não era terra federal, porque eu não tinha competência para isso. E eu sei a alegria que é o pequeno que tem, sei lá, um módulo, dois módulos, seja de que região for, receber, porque aquilo é a alforria dele: ele pode tomar dinheiro no Pronaf, ele pode fazer empréstimos, ele pode fazer várias coisas; e, quando ele não tem o título, ele não é ninguém perante os órgãos públicos, perante o banco, etc., etc.
Então, não vamos nos dividir entre quem quer e quem não quer. Vamos separar o que cada um tem como concepção. Essa que é para mim a realidade.
A exposição do Incra me deixa extremamente satisfeito, porque eu vejo que o Estado brasileiro... Estou à vontade para dizer que eu estou extremamente satisfeito, e não foi num governo de que eu faço parte, é de um governo que é oposição. Mas, segundo os dados apresentados pelo Presidente do Incra, esse acesso à tecnologia se deu agora em 2019 e 2020. Palmas então para quem fez! Agora, vamos entender: o Incra é ferramenta de aplicação de uma política. Como o próprio Dr. Geraldo falou, não é ele que vai dizer se é assim ou se é assado: é a lei que nós Senadores e Deputados vamos votar.
Então, Presidente, eu quero ser muito, assim, sincero, muito honesto de dizer qual é a minha preocupação maior. Como já foi dito pelo próprio Dr. Geraldo, a MP 910 ficou, até caducar, em discussão no Congresso Nacional - na Câmara dos Deputados em primeiro lugar e não veio para ao Senado, porque ela caducou. Foram exercícios - de que eu não participei, mas, pelo que sei, exercícios bons - daqueles que querem construir a democracia, buscando convergência e não apontando... Porque fica muito claro dizer: Não, aqui o problema é o seguinte: de um lado estão os bichos-grilos, do outro lado estão os "motosserras". Nós não vamos para lugar nenhum assim. Mas não é assim que fazem? Aí eu prefiro dizer: o ótimo é inimigo do bom e amigo do péssimo. O bicho-grilo não vai resolver minha vida e os "motosserras" convictos também não vão resolver minha vida. Então, vamos construir o caminho do meio.
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Eu acho - e está longe de ser o meu sonho, porque eu também concordo com a professora que falou, do Rio - que nós já temos instrumentos. E, como o professor de Minas Gerais também falou, nós temos instrumento para titular 95% dos indivíduos que pedem por titulação - 95%! Então, é claro que o instrumento novo não é o que vai determinar, porque esses estão em até quatro módulos, tudo o que já foi dito e não vou repetir.
A minha pergunta com toda a franqueza - e peço vênia ao meu querido Senador Irajá e já tive oportunidade de conversar com o Senador Fávaro: aquela evolução que foi feita na Câmara dos Deputados com pecuaristas, com gente do agronegócio, com gente ambientalista - vou insistir: não é meu sonho de consumo; por mim, eu ficava na lei de 2009 pelo menos até a gente titular 95% dos que estão esperando e que são os pequenos -, mas ali houve uma evolução. Ele volta para a MP 510 basicamente.
Então, eu não consigo, sinceramente, repito, máxima vênia ao querido Senador Irajá, eu não consigo entender, porque aquilo lá não foi feito - eu vou usar a expressão só para caracterizar - pelos bichos-grilos. Aquilo lá foi feito e discutido com pecuarista, discutido com gente que quer produzir, que é o que eu digo, é a coluna do meio, quer produzir racionalmente, pelo ambientalista que quer preservar racionalmente.
Então, só queria dar esse testemunho.
O Incra será nossa ferramenta. Quem vai dizer o que o Incra vai fazer é a lei que o Congresso Nacional vai aprovar. Por isso eu ia deixar esta pergunta, se é que o Incra participou, imagino que participou, da elaboração da 910 e depois da sua discussão, que foi feita até chegar à 2.633: qual é a opinião de Dr. Geraldo? Por que seria melhor a 910 do que, por exemplo, o 2.633?
Era só isso, Sr. Presidente, porque eu já estou indo para o aeroporto, mas vou continuar aqui atento.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Nós que agradecemos, Senador Jaques Wagner, pelas suas colocações sempre centradas e muito positivas, principalmente com relação a esse tema de regularização fundiária.
Passo a palavra agora à Senadora Kátia Abreu, para fazer as suas colocações.
Há aqui a sua inscrição. Não sei se a senhora quer novamente.
Com a palavra a Senadora Kátia Abreu.
A SRA. KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO. Para interpelar.) - Eu queria fazer algumas perguntas para a minha reflexão. Eu ouvi atentamente todos. E quero o material de todos, para que eu possa, de forma bastante lúcida e bastante tranquila, decidir sobre a minha posição.
Eu confesso que a minha preocupação tem várias vertentes. Eu gosto e defendo muito o direito de propriedade, o título das pessoas, a regularização, é claro, também, é óbvio, no sentido de as pessoas crescerem, mas tenho uma preocupação enorme com o desmatamento. Porque essa questão do desmatamento, que se pode regularizar alguns produtores, e são muitos dentro da própria região, mas, comparados ao restante do Brasil, o que é a maioria, nós não podemos deixar que um ato praticado em menos de 10% da agropecuária brasileira possa prejudicar 90% da agricultura deste País, no que diz respeito às exportações.
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Então, nós temos que ter uma responsabilidade muito grande, porque eu não estou disposta a colocar em risco tudo o que nós conquistamos até aqui nesses últimos 40 anos. E eu disse para o Ministro do Meio Ambiente que eu prefiro sacrificar algumas convicções do que sacrificar a agropecuária brasileira. Então, nós precisamos ter muita lucidez, muita tranquilidade de encontrar esse meio-termo de titular aqueles que sinceramente... Olha, gente, são dignos da nossa compaixão! Uma pessoa estar, há muitos anos, num pedaço de terra e não ter um documento dela, é muito triste isso! Então, nós precisamos encontrar esse meio-termo.
Diretamente, a minha pergunta é: Geraldo Melo, a Ministra da Agricultura mencionou uma meta de 300 mil títulos nesses dois anos, junto com os Prefeitos. Eu queria saber se já existe convênio e quais são os recursos disponíveis para essa titulação desses 300 mil títulos? Qual é o planejamento disso? Em segundo lugar, eu queria que você pudesse dar uma explicação para esta audiência: quando que um assentado é dono de verdade da sua parcela? O que é ser dono de verdade da sua parcela? É ser legitimamente o dono. E quem é dono significa que ele pode ficar com ela, que ele pode vendê-la, ou que ele possa comprar mais delas? Como é que a lei explica isso? As pessoas precisam... Eu sinceramente sei como funciona, mas muita gente faz muita confusão sobre essas possibilidades. Por que eu fui assentado e tenho que ter um limite e um prazo para ter terra? Eu que não fui assentado pela reforma agrária tenho outra regra para ter o meu título? Isso independente dessas questões de mérito sobre o aumento do desmatamento, eu queria que você explicasse a diferença dessas duas leis para dois brasileiros com o mesmo tamanho de terra. Certo?
E por último, a terceira questão, para ver se nós chegamos, como disse o Jaques Wagner, se nós chegamos a um consenso mínimo com relação a essa questão? De que universo nós estamos falando, Geraldo Melo? Quantas pessoas você tem em mente? Quantas parcelas, na sua avaliação, deveriam e devem ser tituladas de assentamentos da reforma agrária? Quantas pessoas e quantos mil hectares? E, com relação a até quatro módulos, vamos fazer tudo até quatro módulos, os assentados e os não assentados: nós estamos falando de que, de qual quantidade? A Professora Cristina disse que 95% dos produtores estão na fila para ser titulados. Eu quero a sua confirmação - não duvidando da professora, que é uma grande advogada muito respeitada, mas você está com os instrumentos legais na mão, você tem a documentação, você tem o cartório na mão. Diga para nós o que significa esse universo e no que isso assusta?
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E eu queria, para encerrar, Senador Acir, dar um número aqui muito interessante que o Vice-Presidente da República Mourão me deu agora numa audiência em que eu estive com ele.
Ele apresentou um plano para conter o desmatamento em janeiro, e esse plano o Ministro do Meio Ambiente não utilizou. Não me pergunte por quê. Mas é um detalhamento muito grande de como combater o desmatamento. Mas o que mais me chamou atenção nesse plano é que 11 cidades apenas - 11 - são responsáveis por quase 80% do desmatamento. Então, eu fiquei assim... O Vice-Presidente da República que me disse. Não foi nenhum ruralista e nenhum ambientalista que me disse isso; é o Vice-Presidente. Com certeza, esses dados ele pegou no Incra e pegou no CAR. Então, o que está acontecendo? Por que tanto transtorno e tanta dificuldade - e eu quero saber de verdade? Eu juro que eu imaginei, sob palavra de honra, que essa coisa estivesse mais pulverizada, incontrolável e numa centena de Municípios - 50 Municípios, 100 Municípios. Mas não, gente: 11 Municípios. Do que nós estamos falando? Eu estou simplesmente... Nós estamos nessa situação ridícula, temerária, de alto risco, por conta de 11 Municípios e de uma disputa do Ministério do Meio Ambiente com a Vice-Presidência da República, que estão disputando espaço, porque um é o Presidente do conselho e o outro é o Ministro? Nós, brasileirinhos, vamos pagar esse preço? Não, eu não acredito, Presidente Acir! Nós temos que tomar uma providência, chamar aqui o Mourão para ele apresentar esse grande programa - está aqui na minha mão; ele me entregou - de janeiro de 2021. E chamar o Ministro junto. O que foi que aconteceu? Qual é o segredo? E agora estão dizendo que precisam de um US$1 bilhão para conter o desmatamento e que, se os países lá fora não derem US$1 bilhão... E que não há desmatamento.... Entregue o serviço, porque eu sei quem dá conta de fazê-lo. Entregue, entregue, porque eu sei quem dá conta de fazer isto lá no Ministério do Meio Ambiente: conter o desmatamento em 11 cidades. Quem não tem competência não se estabelece.
Então, nós estamos falando de onze: sete, no Pará; um, se não me engano - o Geraldo Melo deve saber, não sei se ele sabe, mas está aqui no papel; não vou pegar agora -, parece que em Rondônia; outro, no Mato Grosso; um parece que em Roraima... Uma coisa assim, pulverizada, uma aqui, outra acolá. Sete no Pará... Tudo aglutinado na mesma região. Pelo amor de Deus, gente!
Então, eu proponho, Sr. Presidente, que nós possamos fazer em comum essa audiência pública com a CRE e com a Comissão de Meio Ambiente, Jaques Wagner, para que nós possamos debater esse plano de contenção do desmatamento para esses 11 Municípios, porque eu já propus ao Mourão que eu quero entrar nesse helicóptero, junto com o senhor - fiz esse compromisso - e Jaques Wagner, para visitarmos esses 11 Municípios e sabermos o que está acontecendo por lá. Qual é a tamanha dificuldade para controlar esse desmatamento, colocando em risco as exportações brasileiras?
Muito obrigada. São essas três perguntas.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado, Senadora Kátia.
Só para confirmar, então, os nomes dos Municípios: no Pará, são Itaituba, Rurópolis, Portel, Pacajá, São Félix do Xingu, Altamira e Novo Progresso; no Amazonas, Apuí e Lábrea; em Rondônia, Porto Velho; e, em Mato Grosso, Colniza. São esses os 11 Municípios responsáveis por 80% do problema do desmatamento no nosso País, só para reafirmar o que V. Exa. muito bem colocou.
Passo a palavra agora à Senadora Zenaide Maia.
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A SRA. ZENAIDE MAIA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PROS - RN. Para interpelar.) - Sr. Presidente, Acir Gurgacz; o Presidente do Incra, Dr. Geraldo Melo, o Professor Raoni Rajão, a Professora Cristina e o Professor José Benatti, pensem como foi produtiva essa audiência pública aqui, Acir, que só nos mostrou como é necessário a gente ainda debater esse projeto de lei que está aí, o 510.
A que conclusão cheguei aqui? Que a gente já tem 108 mil imóveis e que 96% desses imóveis são de pequenos, de no máximo quatro módulos, e que a lei, já existente, a nº 11.952 já resolve isso, como foi mostrado aqui por esses três especialistas nisso. Isso nos deu um norte, para mim.
O que a gente quer dizer? Ninguém... Eu não sou contra a regularização fundiária, mas isso é uma parte social, como foi falado aqui, o próprio Governo Federal estimulava nordestinos, a todos irem para a Amazônia, em 2008, e foi aumentando. Então, eu acredito que a gente deve... O que está faltando não é mudar a lei, não é criar uma nova lei, é fazer essa regularização fundiária, apesar de ser mostrado aqui que não vai impedir o desmatamento totalmente, mas precisamos equipar o Incra e todos para fazer a fiscalização. Sem fiscalização a gente não vai sair de lugar nenhum.
Então, um, não é necessário criar uma nova lei, podemos fazer a regularização fundiária de 96% daqueles que têm a terra - a grande maioria, em 2008, já tinha, quando foram mudados os anos - e, depois, não está faltando lei, está faltando fiscalização. Se a gente aprovar essa nova lei, sem fiscalização também não chegaremos a nada.
Então, somos a favor da regularização fundiária, mas não precisamos mudar a lei, como foi provado, e essa audiência provou para o Brasil e para a gente aqui que precisamos, sim, discutir esse tema com todos.
Obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Nós é que agradecemos, Senadora Zenaide Maia.
Agora, com a palavra, o Senador Izalci Lucas.
O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF. Para interpelar.) - Presidente, primeiro, eu quero parabenizar, mais uma vez, à Comissão e a V. Exa. por promover mais essa audiência tão importante para todos os brasileiros. Aliás, metade da população brasileira mora em áreas irregulares, seja na área urbana, seja na área rural.
Não acompanhei todas as apresentações porque eu estava participando, concomitantemente, com a reunião do Covid daqui, do DF, mas eu queria dizer que, primeiro, já coloquei por escrito as minhas manifestações para o Relator e algumas sugestões, mas eu queria fazer mais um apelo.
Estou vendo aqui o Geraldo, do Incra.
Há um mês nós tivemos uma audiência, nesta mesma Comissão, com a Ministra Tereza, minha amiga e nossa colega, competente por sinal e, depois, na sequência, tivemos uma outra audiência passada com alguém também do Incra.
Eu quero aproveitar e reafirmar mais um pedido aqui. Eu sei que, quando se fala em regularização, todo mundo pensa na Amazônia, mas no DF não é diferente: a metade da população aqui mora em áreas irregulares. E nós chegamos a entregar as escrituras, aliás, os títulos. Pessoas que esperavam há 40 anos, 50 anos começaram a receber os títulos. E, com a mudança do sistema, nós entregamos aí pelo menos uns 500 títulos. E há 1.500 prontos. Uma questão burocraticazinha, uma informática, porque desativaram o sistema anterior, e o sistema atual não tira os títulos de regularização fundiária, aqui da SR 28, que é a área do DF, de Goiás e de Minas... E há mais de um ano que as pessoas cobram, porque o vizinho recebeu e o outro não recebeu. Então, as pessoas estão achando que há algo errado, e não há. É uma questão burocrática, é o sistema que não aceita rodar; e o anterior foi desativado.
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Então, eu faço um apelo ao Geraldo - viu, Geraldo? Já falei. A ministra disse que ia tomar as providências, o menino lá da regularização também. Mas o tempo está passando e há mais de um ano. Eu vou para a rua e sou cobrado a toda hora: "Izalci, como é que você entrega aqui do lado, e o meu não me entregaram?", como se eu fosse o culpado desse negócio. E olha que eu fui ao presidente da Comissão da MP, da medida provisória. E o Temer, quando lançou a medida, tinha um único objetivo, único, e com o qual eu concordo plenamente: titularizar. Aqui em Brasília, gente, não é possível, nós temos o PAD/DF, que é um assentamento empresarial quase, maior. Foi criado em 1972. Aqui não é do Incra, não, viu, Geraldo? É daqui, do DF. Os caras querem cobrar agora a preço de mercado. Isso aqui não valia nada. Vocês que são da área sabem que o Cerrado antes da Embrapa não valia nada. Os produtores fizeram um sacrifício danado e, agora, os caras querem cobrar R$25 mil, R$30 mil. É brincadeira!
Então, vamos passar o título para todo o mundo, gente. Depois a gente resolvi isso, porque há gente que já morreu na esperança de ter um título. Ninguém financia nada, ninguém investe nada porque não tem o título.
Esse é o apelo que eu faço, Senador Acir.
Agradeço e parabenizo mais uma vez por esta reunião que tenho certeza vai gerar a aprovação desse projeto, com os ajustes necessários, para ficar uma boa lei.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado, Senador Izalci.
O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar PODEMOS/PSDB/PSL/PSDB - DF) - Um abraço.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Agora passo a palavra ao Senador Wellington Fagundes.
O SR. WELLINGTON FAGUNDES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - MT. Para interpelar.) - Sr. Presidente, tudo o.k., não é? Eu estou aqui em trânsito também. Estou indo para o aeroporto para chegar hoje em Brasília. Já participamos hoje pela manhã da reunião da Covid, depois tivemos mais duas reuniões. E, olha, esse tema também é extremamente importante para toda a Amazônia, eu diria, para toda a Amazônia Legal, e para o meu Estado, Mato Grosso, também. Um dos Municípios citados aí é Colniza. Mas é importante dizer que Colniza é o maior Município do Mato Grosso. O segundo é Juína. E Altamira é o maior Município do Brasil. Então, isso também tem que ser analisado, a questão do tamanho, da proporcionalidade, inclusive, da relação de influência, Sr. Presidente. Olha, hoje, nós temos aqui a BR-174, que liga Juína a Colniza, Juína a Vilhena. Nós conseguimos federalizar essa BR. Ela é extremamente importante para que a gente possa promover o desenvolvimento sustentável, porque uma região também abandonada com certeza sofre muito mais a deterioração.
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Então, eu creio que essa questão da regularização fundiária é o melhor bem que nós faremos para o Brasil. Para o meu Mato Grosso, com certeza, representará a maior revolução econômica e sustentável deste Estado, visto que nós temos aqui 80 mil famílias que vieram para cá, como a população de Rondônia, acreditando no chamamento de integrar a Amazônia para não a entregar. Essas famílias, que estão aí há 30, 40 anos na terra, não têm o documento para trazer legitimidade à verdadeira cidadania. O pai, a mãe chefe de família quer deixar a sua propriedade documentada para a sua família, mas, além disso, também é o acesso ao crédito e condições para poder produzir mais e gerar mais riqueza.
No meu Mato Grosso, nós falamos de boca cheia que temos o maior rebanho bovino, a maior criação de aves e somos um dos maiores exportadores do Brasil e do mundo, mas, quando temos também que importar alguns produtos hortifrutigranjeiros de Goiás e de São Paulo, isso nos envergonha, porque é a demonstração de que o pequeno produtor precisa muito de apoio, e o principal apoio é documento e crédito, claro, com a pesquisa também e a comercialização.
Por isso, Sr. Presidente, eu quero aqui apoiar todo o projeto, o Irajá, o nosso Senador Carlos Fávaro e todos os membros da Comissão, que estão trabalhando de forma muito forte. Nós também trabalhamos quando da aprovação daquela medida provisória, e V. Exa. sempre foi um lutador por essa área também da regularização fundiária.
Então, como todos já falaram aqui, além da regularização fundiária rural - o Izalci colocou aí -, a regularização fundiária urbana é outro avanço e uma necessidade que temos que fazer para exercer a verdadeira cidadania.
Então, eu aqui parabenizo mais uma reunião sob sua Presidência, que tem conduzido muito bem, principalmente, um tema como este. Falando de pandemia, claro que nós temos aí que o foco hoje é salvar vidas, é vacina, vacina e mais vacina, mas também é emprego, geração de emprego acima de tudo. Uma família no campo produzindo custa muito menos socialmente para o País, já uma família numa periferia grande de uma cidade grande, com certeza, os impactos sociais são muito maiores.
Então, é isso, Sr. Presidente.
Muito obrigado.
Boa tarde a todos e boa semana com muito trabalho.
Eu agradeço a V. Exa. e a todos os Senadores que aprovaram, por unanimidade, o nosso projeto de lei, que autoriza as indústrias de saúde animal fabricarem a vacina contra o coronavírus. Portanto, é, mais uma vez, o agro salvando o Brasil.
Um grande braço!
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado, Senador Wellington Fagundes.
Passo a palavra agora ao Senador Jean Paul, que é o nosso último inscrito; depois, nós ouviremos as respostas do Geraldo, do Incra, às perguntas feitas pela Senadora Kátia.
Senador Jean Paul Prates.
O SR. JEAN PAUL PRATES (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN. Para interpelar.) - Obrigado, Presidente.
Mais uma vez, esclareço - isso também no início desta audiência foi trazido - que aqui se tratam de regularizações e não de reforma agrária.
Mas, dito isso, eu também, como a Senadora Zenaide, estou muito feliz com a audiência, porque, sem dúvida nenhuma, me esclareceu todas as dúvidas e me coloca uma necessidade de sermos, de fato, transparentes em relação a quem são os beneficiários, qual é a razão e, especialmente, qual é a urgência.
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É isto que eu quero perguntar aos convidados, com uma resposta rápida, talvez, de dois ou três: qual a urgência de se aprovar esse projeto, já que não restou a menor dúvida de que ele está vinculado especificamente a quem ultrapassou o marco temporal de 2011 e cometeu ilegalidades ao invadir e desmatar depois que uma lei regulamentou processos que tinham sido incentivados em políticas, erradas ou não, do passado? Há outro grupo: quem já tem terras e/ou já foi beneficiado por legalizações ou titulações. Por que a urgência de ter esse grupo aduzido? Outro grupo - e eles não são excludentes - é o de grandes áreas que representam 5% da base cadastral do passivo que o Incra tem a tratar ainda, portanto grandes lotes, quando - isso eu quero confirmar - todos aqui disseram que 95% ou mais já podem ser titularizados pelas leis e decretos vigentes. Então, se nós temos um passivo gigantesco e se 95% ou mais podem ser titularizados de acordo com a lei vigente, qual é a pressa de resolver os outros 5%, que são de terras maiores?
Por fim, há quem cometeu infrações ambientais. Dentro de um novo conceito que essa lei passaria a alargar, isso sujeitaria a gente a uma espécie de prisão de última instância, ou seja, um processo administrativo só seria considerado infração ambiental dez anos depois de o processo administrativo terminar - a gente sabe que isso leva tempo -, depois que fosse, então, caracterizada essa infração ambiental, sem nenhuma condição de reverter o dano ambiental, porque, passado tanto tempo, já era!
Portanto, é um processo que, claramente, sem dúvida nenhuma - mais uma vez, fico sem dúvida nenhuma -, estimula a concentração fundiária, a continuidade das invasões e, por último, o próprio conflito agrário. E isso se dá em plena pandemia, com 400 mil mortos ou mais.
Eu não entendo qual é a urgência disso, qual é a razão de não estarmos discutindo, em vez disso, um belo orçamento confortável para o nosso amigo Geraldo, conterrâneo do Rio Grande do Norte, trabalhar competentemente, como está trabalhando, nos instrumentos que vão ajudar a fiscalizar, a executar e a tratar desse passivo de 95% dos pleitos, que já podem ser tratados através dessa lei.
Então, a dúvida, na verdade, é: por que estamos aqui, urgentemente, passando esse projeto em revista já que temos um passivo a dar conta que pode ser tratado perfeitamente com a regra em vigor?
Era isso.
Obrigado, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Nós é que lhe agradecemos, Senador Jean Paul.
Eu passo a palavra agora ao Presidente do Incra, Geraldo, para responder o questionamento da Senadora Kátia.
O SR. GERALDO JOSÉ DA CAMARA FERREIRA DE MELO FILHO (Para expor.) - Eu queria começar respondendo ao Senador Jean Paul e lhe agradecendo, porque a gente está aceitando o belo orçamento.
O Senador Jaques Wagner também tinha feito uma pergunta, mas ele saiu da reunião.
Senadora, eu não sei se posso colocar um quadro na tela.
Presidente Acir, eu não sei se eu posso colocar um número aí na tela.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Pode enviar. Nós abriremos aqui imediatamente.
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O SR. GERALDO JOSÉ DA CAMARA FERREIRA DE MELO FILHO - Ela perguntou sobre o total da... Bom, eu queria só colocar isso.
Prof. Raoni, você me perdoe pela minha discordância. Em outras oportunidades, eu já externei... Inclusive, o Deputado Zé Silva já me trouxe esse número, esse famoso número de 95% que o estudo do senhor mostrou a respeito das parcelas para a regularização fundiária. O seu número, na verdade, foi buscar as parcelas dentro de uma área no site do Incra que chama Acervo Fundiário, que é carregada a partir de dados dos Municípios e dos Estados e do próprio Incra e que reúne todo tipo de parcela, desde áreas comuns de assentamento, pedaços de estrada, parcelas de regularização, tudo isso. Mas ele não é o acervo de regularização fundiária em tramitação no Incra. Que isso fique claro! O acervo em tramitação no Incra para regularização fundiária é o que está dentro do Sigef Titulação e é o acervo recebido desde lá de trás, atualizado, do Programa Terra Legal.
Esse Acervo Fundiário tem 109.470 parcelas e tem 15 milhões de hectares. Os números são bastante distintos. O que não muda, para que fique claro, é um fato: 88% das parcelas - e segue sendo um número expressivo - têm até quatro módulos fiscais. Não são 95%. Então, quero só que isso fique claro. Oitenta e oito por cento das parcelas que estão na base do Incra com processo em tramitação de regularização fundiária - não são 95% - têm até quatro módulos fiscais. Esse é o número correto, oficial. Eu conversei isso com o Deputado Zé Silva mais de uma vez e falei isso, inclusive, outras vezes. Alguém do ministério chegou a falar com o senhor, e eu disse isso. O dado é esse.
Respondo à Senadora Kátia. A Senadora Kátia perguntou qual seria o universo, porque precisávamos saber qual seria esse universo.
A gente fez um exercício, Senadora. Eu queria só que vocês entendessem que há uma diferença... E lá vou eu cair de novo na tentação de falar de assentamento e de regularização fundiária. Quando a gente fala de parcelas de assentamento, sempre é um público para quem é mais fácil a gente explicar, porque é um número...
Não sei se vocês estão vendo minha apresentação, a página aqui.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Estamos vendo, sim.
O SR. GERALDO JOSÉ DA CAMARA FERREIRA DE MELO FILHO - Então, quando a gente fala de assentamentos, é sempre um número mais fácil. É um local certo em determinado lugar, um imóvel do Incra ou da União que foi trazido ou desapropriado pelo Incra, com x lotes lá dentro, com x famílias que foram colocadas ali dentro. Então, você sabe exatamente quantos são os lotes, quantas são as famílias, onde elas estão, e você tem o controle sobre aquela quantidade de pessoas.
Então, especificamente hoje, a gente tem uma demanda para regularização de pouco mais de 600 mil lotes, 650 mil lotes, que precisam ser regularizados em assentamentos, dentro da Amazônia Legal, com uma média de área - Senadora, eu tentei anotar aqui suas perguntas, mas não sei se anotei tudo - de 53 hectares e, fora da Amazônia Legal, de 40 hectares por lote. Esse seria o universo em assentamentos.
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Na área da regularização fundiária, a gente tem este número de 109 mil parcelas, mas não necessariamente você tem o controle exato de todas as pessoas que estão lá, porque, eventualmente, essas pessoas que estão lá não entraram com processo dentro do Incra por desconhecimento ou porque não tiveram interesse ou por qualquer motivo que tenham ou porque eventualmente não têm direito a isso. Então, a gente não tem como precisar exatamente quantos seriam os lotes de regularização fundiária, mas a gente tem como fazer uma estimativa. Quero só explicar a diferença, porque há eventualmente uma família ribeirinha que está em determinado lugar e que nunca procurou o Incra atrás de regularização fundiária. Em que pese ter esse direito, ela nunca o procurou, e esse dado não está registrado.
A partir de cruzamentos dessa informação do Incra sobre esses 109 mil processos, com informação de CAR, fora de parcelas com processos no Incra, mais pontos do Censo do IBGE, que demonstram a presença daquelas pessoas ali, nós chegamos a um número. Então, o número de 109 mil está contido nos 166 mil. Esse número é uma estimativa. Esse número não é um número preciso. Este aqui é o número de parcelas a que nós chegamos, 166 mil parcelas, e - isso varia muito pouco, o percentual praticamente se mantém - 88,4% dessas parcelas teriam até quatro módulos rurais.
Eu vou aproveitar para fazer também uma... Desculpem-me! Fora da Amazônia Legal, estima-se um público de 158 mil imóveis para regularização fundiária. Aí são imóveis menores. Eu tinha feito aqui até a conta da área média desses imóveis e perdi a conta; desculpem-me, mas terei que dividir de novo. São 2,9 milhões de hectares para regularização. Há uma concentração grande no Paraná, na Bahia, um pouco em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, que seriam fora da Amazônia Legal. Isso ocorre em outros Estados também, mas há uma concentração nesses Estados.
Só quero dar uma resposta. De certa forma, este é um questionamento que perpassou algumas das colocações que foram feitas tanto pela Senadora Kátia, quanto pelo Senador Jaques Wagner, quanto, agora no final, também pelo Senador Jean Paul: por que seria importante buscarmos algum tipo de compatibilização eventual entre as políticas?
Lá atrás, quando se discutiu a Medida Provisória 910... Eu queria repetir algo que eu já disse na apresentação lá atrás. Repito: o Incra é somente executor da política. Do que for definido, compete-nos apenas trabalhar na execução. A questão nossa basicamente é a questão do mosaico. Nós temos aqui... Vamos nos voltar para o quadro da esquerda, que são os processos que estão efetivamente dentro Incra. Nós temos dentro do Incra 15,8 milhões de hectares em área com solicitação de processo de regularização fundiária. O que nós temos autorização para trabalhar de maneira... Desculpem, mas não é processo simplificado; processo simplificado é outra coisa. Falo de vistoria remota. São coisas distintas. Processo simplificado é feito em até um módulo. Nós estamos falando de cerca de 40% da área. Por mais que sejam 88% das pessoas, nós estamos falando em 40% da área, 39% da área.
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Por que é importante que os Senadores e o Congresso Nacional avaliem isso e decidam? Por um motivo: se a gente está partindo do princípio - isto é questionável, e cabe ao Congresso essa discussão - de que regularizar essas pessoas, conhecer essas pessoas que estão ocupando essa terra é algo importante inclusive pelo aspecto ambiental, essa política de procedimento de vistoria simplificada só cobrirá 40% desse mosaico a ser coberto. O restante todo, os outros 60%, continuará pendente do processo de vistoria presencial. Esse era o argumento da alteração do marco do número de módulos, porque, com isso, você subia - vamos para o quadro da direita - para próximo de 80% do total da área, que poderiam ser agilizados nesse processo dessa forma.
Lembramos que a titulação não é automática a partir do sistema. Há uma série de requisitos que fazem com que o processo volte a um processo de necessidade de vistoria presencial. Então é isso. Essa é a diferença básica.
Era essa pequena diferença no número que eu queria colocar, professor. Nós não batemos na nossa informação de números e do porquê, do motivo de um eventual ganho de eficiência no processo com a mudança do número de módulos. Aqui atrás, do lado, já se está inclusive com o corte de quatro a seis. Eu peço perdão, porque, no quadro da direita, não está feito de quatro a seis. Quatro a seis é o corte do PL 2.633, da Câmara.
Senadora, a outra pergunta, se eu não me engano, é sobre a questão das diferenças dos processos de reforma agrária e de regularização fundiária.
Acho que eu posso parar aqui o compartilhamento.
No processo de reforma agrária, você primeiro tem... Primeiro, voltando, a gente tem uma limitação do tamanho da área. A área dentro dos assentamentos é uma área... Os lotes são menores. E, mesmo quando há eventuais aquisições dentro desses assentamentos entre esses assentados, há um limite de regularização. Ninguém pode ultrapassar os quatro módulos, ou seja, as pessoas não podem crescer além desse tamanho, enquanto, na regularização fundiária, o limite seria de 2,5 mil hectares.
O pessoal da reforma agrária especificamente tem a política...
Desculpe! Engasgou aqui. Minha apresentação travou aqui.
Ambos têm que fazer a parte de comprovação de cultura. Todos têm que comprovar a posse.
Agora, na questão do público nosso de reforma agrária, o nível de exigência da qualificação... Nós estamos falando basicamente de um programa social, e há uma exigência desse enquadramento diferente, porque a Lei 8.629 exige coisas distintas do que é disposto na Lei 11.952.
Então, quando você titula um assentado, a partir do momento em que você emite o título provisório, vamos dizer assim, que é o CCU, ele tem que ficar mais dez anos naquele assentamento, para, só então, ele poder, se ele não for ficar na terra, mesmo que nesse intervalo se emita o título definitivo, se desfazer legalmente daquela terra.
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No caso da regularização fundiária é a mesma coisa: você vende a terra, você regulariza essa terra. Ele tem um prazo de carência mínimo de três anos, ele pode quitar com três anos, mas continuam se aplicando sobre essa pessoa, durante dez anos, as demais cláusulas resolutivas, não mais as financeiras se ele tiver pago. Mas, durante dez anos, ele segue tendo aplicadas sobre ele todas as demais cláusulas resolutivas. Só então ele pode vender e não pode ser beneficiário novamente da política pública. E o assentado, hoje, tem um intervalo que 15 anos para poder ser beneficiado novamente pela política. Então, há algumas diferenças. Não sei se eu consegui responder tudo.
Senador Izalci, a quem acho que não respondi. Não sei se é para responder a todo mundo de uma vez, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Sim, é para responder a todos.
O SR. GERALDO JOSÉ DA CAMARA FERREIRA DE MELO FILHO - Desculpe-me.
Senador Izalci, na sexta-feira nós tivemos uma reunião, aqui, com o Diretor Humberto e foi autorizado ele entrar em contato com o Superintende Igor, aqui da Superintendência Geral do Distrito Federal e pedir a ele para transferir, inclusive, para a sede os processos para a gente fazer emissão direta aqui pela sede, já que se estava tendo dificuldades com o sistema.
O que é que acontece? No nosso contrato com o Serpro, nós estamos fazendo a... O Serpro está internalizando todos os sistemas do Incra, internalizando um a um. Cada sistema do Incra era feito em um lugar, em uma parceria diferente, com um órgão diferente. Então, nós estamos internalizando um a um. Neste momento, está sendo internalizado o Sigest Titulação. Então, nós estamos exatamente na janela em que o Sigest Titulação está sendo internalizado. Eu não consigo, neste momento, mexer nele. Então, o que é que a gente vai fazer? Vai puxar para cá e emitir. Eu disse a ele: nem que você pegue uma máquina Olivetti e datilografe aí os títulos, checando os processos - obviamente, isso aqui é só uma brincadeira, pessoal. Mas eu pedi a ele para internalizar para cá os processos e ver como é que a gente agiliza para atender o Distrito Federal da maneira mais rápida possível.
Eu acho que era isso.
Não sei se eu respondi a todos.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado ao Geraldo.
Indago aos Senadores e às Senadoras se alguém gostaria de fazer alguma colocação.
A Senadora Kátia com a palavra.
A SRA. KÁTIA ABREU (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - TO. Para interpelar.) - Obrigada pela resposta, Presidente Geraldo.
Eu gostaria de lhe fazer uma pergunta bem simplificada. Sobre essa coluna até 4 módulos fiscais: a lei que temos hoje é suficiente para regularizar 88%? Segunda pergunta: a legislação atual é suficiente para regularizar, também, até 15 módulos? Ou não? Só os 88%? Daria para regular mais os 9,7 dos médios produtores, que são de até 15 módulos, a mesma lei, sem alterar? Se você me responder que tem que alterar, há alguma coisa específica que mudaria e nós regularizaríamos, então, 70, 80% da área e das parcelas quase 90?
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - O Geraldo com a palavra, depois o Senador Jean Paul.
Vamos ouvir o Senador Jean Paul primeiro, Geraldo? Talvez ele tenha uma pergunta para o senhor e fique mais fácil.
O Senador Jean Paul com a palavra.
O SR. JEAN PAUL PRATES (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN. Para interpelar.) - A minha pergunta, na verdade, complementa a dúvida da Senadora Kátia. Eu fiquei com a mesma dúvida. Eu saí daqui sem dúvida nenhuma, agora o Geraldo falou um pouquinho me deu essa duvidazinha. É o seguinte: você justificou... Vou fazer de outra forma, porque a minha dúvida é um pouquinho diferente, mas vai na mesma esteira.
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Então, 88, vamos segurar esse número de 88 como número oficial, 88% das parcelas, e até quatro módulos fiscais, e aí, dizendo: bom, vamos completar o mosaico com o resto da área. Mas se, para completar o mosaico, a minha dúvida é, bastaria mudar, colocar os 2,5 mil hectares, por que, então, a gente está mexendo na questão ambiental, na simplificação da autodeclaração, na questão de o beneficiário poder vender, no direito de preferência, colocando direito de preferência, dispensa de taxa? Todas essas atividades, todas essas dispensas, mudanças nessa lei são necessárias para fechar o mosaico, para completar o álbum de figurinhas aí que você tem no seu mapa ou apenas a mudança para 2,5 mil hectares seria suficiente e a gente poderia eliminar o debate disso tudo, já que a gente está tentando aqui, justamente, convergir para alguma coisa que seja, realmente, o necessário durante o período de pandemia, neste momento agora, para que o seu trabalho se desenvolva bem?
Essa é a pergunta.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Obrigado, Senador Jean Paul.
Com a palavra Dr. Geraldo, Presidente do Incra.
O SR. GERALDO JOSÉ DA CAMARA FERREIRA DE MELO FILHO (Para expor.) - Senador, Senador, Senadora, o que a gente tem de legislação hoje até quatro módulos, somado ao que foi colocado via Decreto 10.592, permite que a gente faça o processo de titulação da maneira que a gente espera poder fazer.
O atraso que a gente está tendo hoje é o atraso da mudança de sistema. Eu até costumo dizer que adoraria ter essa mesma discussão com o sistema rodando, porque era muito mais fácil e eu já estaria dando para vocês qual era o ritmo em que nós estávamos trabalhando nisso tudo.
Então, assim, até quatro módulos, a legislação atual existente é suficiente. Qual é a grande mudança de quatro para quinze ou de quatro para dois e quinhentos? Eu, mais uma vez, não vou entrar no mérito da discussão. É, simplesmente, você permitir que se aplique a mesma metodologia de sensoriamento remoto para o restante das áreas e agilize o processo da mesma forma, porque você amplia essa área atingível a partir da utilização da tecnologia. E não fica a pendência de 60% da área serem feitos, aguardando que vá ser feito algum tipo de vistoria presencial. Em tempos de limitações orçamentárias, limitação de pessoal, limitação de pandemia, limitação de tudo isso, até que você consiga terminar esse serviço vai ser algo bastante demorado.
Então, se você conseguir concentrar isso para as exceções identificadas via sensoriamento remoto, e eu antecipo que, nas experiências que a gente tem feito, rodando dentro do sistema, identificam-se, sim, várias exceções e essas exceções que estão sendo identificadas vão instruídas, porque isso é outra das coisas que pouca gente notou na mudança do Decreto 10.592, que nós estamos fazendo sensoriamento remoto de todas as áreas, nós estamos fazendo de todo mundo... Por exemplo, mesmo as áreas que vão para vistoria, o vistoriador leva um relatório de sensoriamento remoto, como apoio para sua vistoria de campo. Isso não existia antes; ou seja, nós estamos tentando ajudar para que o processo seja mais ágil.
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Então, assim, objetivamente, Senadora, e Senador - desculpe -, a mudança de elevar o total de módulos, para 15 módulos, para 2,5 mil, de acordo com a decisão do Legislativo, sem dúvida nenhuma, é algo que, não no número de parcelas, mas no percentual da área a ser atingida, teria um impacto significativo, sim, na velocidade e na eficiência desse trabalho.
As outras cláusulas, os outros assuntos, Senador, eu acho que são parte da discussão que os senhores estão tendo aí. Eu entendo que parte deles - e sem querer entrar no mérito, e juro que eu tento não entrar nesse mérito -, parte de algumas dessas inclusões, em que pese... Respeitando a opinião do contraditório, dos professores que estão participando, eu entendo que parte das coisas que estão sendo questionadas estão sendo colocadas de uma maneira que agrega às políticas que estão sendo feitas.
Por exemplo, boa parte dos pontos ambientais que estão sendo colocados, na prática, são repetições, são a elevação à lei do que está previsto no decreto. Então, na prática, é içar à lei o que está posto no decreto. E foi posto no decreto porque caiu a medida provisória.
Então, se eventualmente é preciso de algum ajuste - e foram listados aí pelos professores alguns desses itens -, é a discussão dos Srs. Senadores e, no momento adequado, dos Deputados. Mas eu entendo que as colocações, em especial as ambientais, em especial as questões dos requisitos, várias delas eu acho que agregam à segurança do processo. Mas, de novo, o Incra é somente o executor; e, de novo, Senador Jean Paul, eu gostei muito daquela ideia do "belo orçamento".
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado ao Dr. Geraldo.
Passo a palavra, agora, ao nosso Relator, Senador Carlos Fávaro.
O SR. CARLOS FÁVARO (PSD - MT. Como Relator.) - Boa tarde ao Sr. Presidente, Senador Acir Gurgacz; aos demais Senadores que estão presentes a esta audiência pública; a todos os professores que aqui participaram e trouxeram as suas colaborações; também ao Sr., Geraldo Melo Filho, Presidente do Incra; enfim, a todos que estão, de modo tão relevante, preocupados com esse assunto, a regularização fundiária.
Eu me dou por muito satisfeito com esta audiência pública, que esclareceu muitos pontos que se faziam necessários para eu já concluir, entre amanhã e depois de amanhã o relatório e, assim, poder compartilhá-lo com os colegas.
Com relação às mais de 98 emendas sugeridas, se não me engano, pelos colegas também, esse tempo foi muito importante para acolher as sugestões. Vou acolher - ouviu, Jean Paul? - muitas das sugestões de emendas que aperfeiçoam, que trazem segurança jurídica ao texto e que venham garantir o principal ponto desse projeto, que é a regularização fundiária, mas com a preservação ambiental estando garantida. Ninguém vai flexibilizar, em hipótese alguma, a questão ambiental. E também não serei complacente com grileiros de terra. Isso não faz parte.
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Contudo, avançar na regularização fundiária, como disse bem e ficou claro para mim na explanação do Geraldo Melo Filho, e também ampliar o aspecto territorial, a quantidade de pessoas e de terras a serem regularizadas com um incremento de um pouco mais de áreas passíveis nessa flexibilização da legislação, mas sem, em hipótese alguma, nós entrarmos no mérito de corrermos o risco de o Brasil ser levado a uma vala comum de passar a mão na cabeça de criminosos ambientais e grileiros de terra.
Por isso, me dou por muito satisfeito com as colaborações; com todos os colegas: a Senadora Kátia Abreu, que é uma conhecedora do assunto, já foi Presidente da CNA, de sindicato rural, da federação de Tocantins...
Hoje de manhã, eu tive na Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar, aqui no Estado de Mato Grosso, também ouvindo esses pequenos e médios produtores que sofrem, também ouvindo os seus posicionamentos.
Enfim, com tudo isso que foi ouvido nessa audiência pública de dois dias, na quinta-feira e hoje, mais as pessoas, mais as contribuições dos colegas Senadores com as suas emendas, tenho certeza de que nós vamos apresentar um bom texto ao Plenário e nós vamos avançar com a regularização fundiária neste País.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado, Senador Carlos Fávaro.
Eu entendo que nós estamos caminhando até para um possível acordo com relação ao PLS 510. Tudo aquilo que nós ouvimos hoje nos fortaleceu bastante, nos iluminou bastante para que a gente possa chegar a um consenso com relação a esse relatório.
Eu faço uma proposição ao nosso Relator para que a gente possa, antes de concluir o seu relatório, fazer uma reunião com Jean Paul, com o Geraldo, do Incra, junto conosco, para que a gente possa construir um acordo, para que a gente possa levar um relatório de consenso para a votação. Essa é a melhor coisa que pode acontecer com relação a um tema tão importante e tão polêmico como é a regularização fundiária.
O que ficou bem claro é que todo mundo é a favor da regularização fundiária, todos somos a favor, todos queremos dar o título definitivo para que o nosso agricultor possa ter acesso ao Pronaf, possa ter acesso a empréstimos e à assistência técnica oficial. Então, é um tema da maior importância.
Como nós fizemos na época da reforma do Código Florestal, quando tivemos um amplo debate e conseguimos levar um texto que era de consenso de todos e conseguimos aprovar talvez não aquilo que fosse o ideal para o momento, mas aprovamos o que foi possível e melhoramos muito para o agricultor brasileiro... Então, eu entendo que, da mesma forma, nós podemos fazer essa reunião e tentar um relatório de consenso.
Então, deixo aqui essa ideia, Senador Jean Paul, para que o nosso Relator também possa sentar junto conosco e fazermos essa avaliação, junto com o Geraldo e mais algum Senador que queira participar. É claro que será uma honra, porque todos querem dar a sua parcela de contribuição para que a gente possa avançar nesse tema de regularização fundiária no País, principalmente na Amazônia - e eu puxo aqui a brasa para a minha sardinha, preocupado com o nosso Estado de Rondônia também.
Vamos fazer uma rodada simples, apenas para as considerações finais dos nossos convidados.
Passo a palavra, para as suas considerações, ao Professor Raoni Rajão.
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O SR. RAONI RAJÃO (Para expor.) - Muito obrigado, Senador Acir.
Então, só em termos talvez de encaminhamento, mais do que de resultado final, sabemos que, para poder fazer política pública de qualidade, nós precisamos de dados de qualidade. E na altura que realizei esse estudo, que tenta compreender quem são, de fato, os beneficiários, na época da MP 910, o dado disponível era esse nas parcelas no sistema do acervo do Incra.
Fiz uma análise criteriosa, inclusive consultando ex-servidores, ex-diretores, ex-presidentes, inclusive servidores atuais do Incra, de modo a compreender aquela base e filtrei da melhor forma possível. Tanto é que eu cheguei à base de maio do ano passado a 107 mil imóveis, e o senhor agora mostrou 109 mil. Então, assim, de certa forma, as ordens de grandeza estão ali. A soma, um pouco diferente, de 96% e de 89%, eu já sabia, já tinha me sido apresentado para ver essa diferença. Fiz um requerimento pela Lei de Acesso à Informação, que chegou para o senhor, Sr. Geraldo Melo, no Ofício 40.740, pedindo esses dados, mas foram negados.
Então, assim, eu só posso fazer... Inclusive, parcelas em regularização, que era a fonte de dado original, foi retirado do ar também. Hoje, não se encontra mais no site do Incra. Então, até fica a sugestão para os Srs. Senadores, se puderem, por exemplo, requerer ao Incra o acesso a essa base, até a gente ter uma conversa mais direta com os técnicos, porque acho que o princípio base da análise de dados da ciência é a reprodutibilidade. Aí nós vamos descobrir onde é que está o ponto. Pode ser que tenha algum problema aqui, enfim. É normal.
Eu acho que importante, porém, é a gente avançar em cima de resultados sólidos e transparentes, porque um tema dessa importância merece as melhores informações possíveis.
É isso. Agradeço pela oportunidade.
Muito obrigado!
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Nós é que agradecemos a sua presença, professor, num debate tão rico, tão importante, nesta tarde de segunda-feira, na nossa Comissão da Agricultura, sobre esse tema de regularização fundiária.
Passo a palavra à Professora Cristina Lopes, para as suas considerações.
A SRA. CRISTINA LEME LOPES (Para expor.) - Obrigada!
Eu queria dizer, independentemente de o número ser 88% ou ser 95% - eu falei esse número 95%, porque foi o número ao qual eu também tive acesso, foi um estudo que foi publicado -, 88% ainda é muito alto.
E fiquei muito feliz de saber que a pergunta da Senadora Kátia Abreu foi respondida por um sim: sim, podemos hoje fazer regularização que desejamos com a legislação atual.
E sobre a pergunta seguinte, se a gente consegue fazer a regularização dos demais, seja até 15 módulos fiscais ou até 2,5 mil hectares, com a legislação atual, a resposta objetiva também é sim. O próprio Presidente do Incra falou: a gente está usando o sensoriamento remoto para todos. A gente vai com o laudo na vistoria. Ou seja, isso é ótimo! Então, é possível. "Ah, é mais fácil não fazer vistoria." Pode ser mais simples, mais fácil. É óbvio que a vistoria requer um deslocamento, uma equipe, alguma coisa nesse sentido, mas ela traz mais garantias que o processo seja mais claro, mais limpo, mais transparente e a gente evita fraude. Então, de novo, a resposta é sim. A gente vai usar as tecnologias de sensoriamento remoto e vamos usar vistoria para garantir um processo melhor possível.
Então, eu queria dizer, por fim, que a diferença de legislação que o PL traz em termos de salvaguardas ambientais é diminuir as salvaguardas, porque parte do que ele traz é levar à lei o que está previsto no decreto, mas ele traz essa limitação na definição de infração ambiental que, na prática, limita completamente essa regra, que já é uma regra fraca do ponto de vista de proteção ambiental. É isso.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado, Professora Cristina. Agradecemos muito a sua presença conosco nesta tarde de hoje.
Com a palavra o Professor José Benatti.
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O SR. JOSÉ HEDER BENATTI (Para expor.) - Mais uma vez, eu gostaria de agradecer o convite para participar desta rica exposição, com debate claro, transparente, com dados e discussões de interesse de todos.
Eu só levantaria uma questão que passou ao largo do debate e que é fundamental quando se preocupa com a proteção da Amazônia, com a diversidade de sujeitos sociais e com o reconhecimento desses direitos da terra. Qual é? No art. 8º da lei atual, a Lei nº 11.952, está muito genérico. Como eu disse, é o seguinte: o primeiro pressuposto é que nós estamos discutindo regularização fundiária. É tipo assim: vamos acessar um bolo que é disputado por diferentes concepções e visões - e o bolo é o mesmo. A pergunta é: quem é que vai chegar primeiro ao bolo? É esse tipo de disputa que o projeto de lei vai criar? Nós esperamos que não, porque senão ela acaba privilegiando quem tem mais capacidade econômica do que capacidade de necessidade. E o art. 8º diz lá:
Em caso de conflito nas regularizações de que trata este Capítulo, a União priorizará:
I - a regularização em benefício das comunidades locais, definidas no inciso X do art. 3º da Lei nº 11.284, de 2 de março de 2006, se o conflito for entre essas comunidades e particular, pessoa natural ou jurídica;
Mas, veja bem, ele é um artigo passivo, ou seja: caso o conflito surja. E a pergunta é: como é que o conflito vai surgir se não tenho levantamento de campo da informação? Se quem está querendo aquela área - o grupo social, as pessoas, os indivíduos, a família - não conseguiu acessar uma fonte pública de consulta oficial, como é que esse conflito aparece? Não aparece.
Então, talvez, nós temos que buscar um ponto de consenso em que haja transparência antes da definição. Quero saber como é que se vai resolver o problema, porque o problema todo é que, depois que titulou, depois que o processo já se realizou - e espero que seja ágil -, a pessoa está titulada e você vai fazer o quê? Entrar com uma ação de anulação de ato administrativo depois que o ato está registrado em cartório ou depois que o conflito explodiu? E os grupos que se viram prejudicados vão reclamar onde?
Então, na realidade, nós temos que clarear. E, aí, pela instância que existe atualmente, que é uma instrução que vai regulamentar uma instância, que é uma instância estatal, não há participação do movimento social, não há participação dos sujeitos. E como todo mundo aqui reconhece que as informações são frágeis, que as pessoas vão poder declarar e apresentar o geo, ou seja, se eu tenho condições de declarar e pagar para fazer geo, é óbvio que eu estou excluindo muitos que não têm capacidade de fazer e de acessar.
Então, eu acho que talvez, nessa conversa, nessa busca dessa união e de uma proposta consensual, temos que pensar onde e em quem para dirimir os conflitos antes que eles estourem. Nós temos que ter um espaço democrático, de participação efetiva, transparente para saber que aquela área vai ser regularizada com antecedência, para que quem puder possa se manifestar se concorda ou não, já que a própria instrução do Incra estabelece que, quanto ao geo, não há necessidade da outra parte se manifestar se concorda ou não; ou seja, se há conflito, até de limite, esse dado não aparece, porque já foi consensualizado artificialmente.
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Acho que, então, além de pensar em regularizar, nós temos que pensar em como evitar esses conflitos.
Finalizando, com a experiência, a Senadora Kátia até admirou-se de que só 11% dos Municípios, se não me engano agora, estão em conflito na Amazônia e de que milhares e milhares que não estão em conflito e que estão fora da Amazônia podem causar um dano na imagem e na respeitabilidade do Brasil.
Só lembro à Senadora, por minha experiência, que 11%, mesmo que sejam minoria, têm capacidade de absorver tanta energia dos órgãos envolvidos na questão fundiária e ambiental que paralisam as ações exatamente porque não foram incluídos no debate.
Então, para evitar essa paralisação, essa demora, esse questionamento, a dúvida na transparência, temos que criar instâncias legais que obriguem o Poder Público a criar espaços democráticos para resolução, eu diria, desse bolo que é disputado por diferentes sujeitos, para que eles, com as suas diferentes concepções, de posse da propriedade, possam se manifestar, consensualizar ali, como sujeitos legítimos, e definir quem tem direito a ter direito à terra.
Seria essa a minha última contribuição neste rico debate de hoje.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado ao Professor José Benatti.
Passo a palavra, agora, para as suas considerações, ao Dr. Geraldo, Presidente do Incra.
O SR. GERALDO JOSÉ DA CAMARA FERREIRA DE MELO FILHO (Para expor.) - Senador, Senadores, Senadoras, agradeço a oportunidade.
Quero dizer que esta discussão, na verdade, é tão antiga e termina por, ao não concluirmos este processo de discussão, que é mais ou menos o que aconteceu no ano passado, voltar.
Então, acho que nós estamos tendo a oportunidade, neste momento, ao fazermos este tipo de discussão, de uma forma madura, de conduzirmos esta discussão para algum tipo de desfecho, para, na linha do que foi falado aqui, caminharmos e acharmos um encaminhamento, um meio-termo nisto daí e para construirmos algo que efetivamente seja válido para essas famílias que estão lá, aguardando, para a região, para o desenvolvimento da região, respeitando o que precisa ser respeitado, para o desenvolvimento dessas comunidades e para o desenvolvimento da região como um todo.
Da parte do Incra, nós estamos à disposição, como executores da política, mas também tecnicamente, com os recursos que nós temos, para auxiliar a Comissão e o Senador Fávaro no que ele precisar, em termos de informação e do que pudermos contribuir com esta discussão.
Se precisarem que voltemos, contem conosco. Acho que não podemos perder a oportunidade de seguir discutindo até chegarmos a um ponto de amadurecimento das ideias, para que consigamos, como dizem, sair do outro lado com uma proposta madura e para que construamos, juntos, algo que seja o que todos nós estamos desejando.
Obrigado, Senador, pela oportunidade.
Sempre à disposição.
O SR. PRESIDENTE (Acir Gurgacz. Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - RO) - Muito obrigado, Dr. Geraldo, Presidente do Incra.
Parabenizo todos os participantes, todos os Senadores e Senadoras que participaram desta audiência pública.
Cumprimento, mais uma vez, todos os nossos convidados: o Professor Raoni Rajão, a Professora Cristina Lopes, o Professor José Benatti e o Dr. Geraldo.
Foi, de fato, uma audiência pública de alto nível e muito esclarecedora.
Espero poder contar com o Senador Jean Paul, amanhã ou quarta-feira, para nos reunirmos e avançarmos junto com o Relator, nosso colega Carlos Fávaro.
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Estará amanhã aqui em Brasília, Carlos? (Pausa.)
Então, nos reuniremos amanhã à tarde.
Amanhã nós temos sessão do Congresso Nacional, o PLN 4 vai ser debatido, discutido. É um PLN importante que vai recompor o Orçamento de 2021 e, com certeza, trará bastante benefício, principalmente para o agronegócio, para o Pronaf, enfim, tudo mais.
Então, parabenizando a todos, mais uma vez, e agradecendo a presença de todos, nada mais havendo a tratar, declaro encerrada esta reunião.
(Iniciada às 14 horas e 02 minutos, a reunião é encerrada às 17 horas e 09 minutos.)