3ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA
55ª LEGISLATURA
Em 12 de junho de 2017
(segunda-feira)
Às 14 horas
86ª SESSÃO
(Sessão de Debates Temáticos)

Oradores
Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Declaro aberta a sessão.
Sob a proteção de Deus, iniciamos nossos trabalhos.
A presente sessão destina-se a debate temático sobre os 25 anos da Rio 92 e da Convenção do Clima, nos termos do Requerimento nº 406, de 2017, de S. Exª o Senador Jorge Viana e outros Srs. Senadores.
Esta sessão será realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. As pessoas que tenham interesse em participar com comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do portal e-Cidadania ou do link www.senado.leg.br/ecidadania e do Alô Senado, através do número 0800-612211.
Convido para compor a Mesa: S. Exª a ex-Ministra do Meio Ambiente de 2010 a 2016, Srª Izabella Mônica Vieira Teixeira; (Palmas.)
Ex-Ministro de Estado do Meio Ambiente no ano de 1992, Sr. Prof. José Goldemberg; (Palmas.)
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S. Exª o Embaixador Marcos Azambuja, Coordenador da Conferência Rio 92; (Palmas.)
O Subsecretário-Geral da Organização das Nações Unidas e Diretor-Executivo da ONU Meio Ambiente, Sr. Erik Solheim. (Palmas.)
Convido a todos para, em posição de respeito, ouvirmos o Hino Nacional.
(Procede-se à execução do Hino Nacional.) (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Gostaria de convidar para compor a Mesa S. Exª a Srª Deputada Bruna Furlan, Presidente da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados.
Gostaria de convidar para fazer parte da Mesa o Presidente do GT Organizador da Rio 92, S. Exª o Embaixador Carlos Moreira Garcia. (Palmas.)
Gostaria de agradecer, em nome da Mesa Diretora dos trabalhos, a presença de todas as senhoras e de todos os senhores, representados na figura de S. Exª o Embaixador Paulo Tarso Flecha de Lima, que teve um papel primordial para que a Conferência Rio-92 pudesse ser realizada no Brasil, na cidade do Rio de Janeiro.
Sejam todos muito bem-vindos. (Palmas.)
Passo a Presidência dos trabalhos a S. Exª o Senador Jorge Viana, Presidente da Comissão Mista de Mudanças Climáticas do Congresso Nacional.
(O Sr. Fernando Collor deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pelo Sr. Jorge Viana.)
O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Queria cumprimentar todos os convidados que estão nos dando a honra de suas presenças aqui à Mesa.
A pedido do Ministro Herman Benjamin, justifico sua ausência. Era um convidado especial pela relação que tem, no Judiciário brasileiro, com a causa ambiental. Ele pede, por questões de saúde, que eu justifique sua ausência. Ele esteve aqui no Senado, pessoalmente, fazendo essa justificativa.
De modo muito especial, queria também agradecer, como já fez o Senador que fez a abertura desta sessão, Senador Fernando Collor, a presença de muitos que colaboraram e que colaboram com a causa ambiental e com a agenda do nosso Planeta.
Quero, de modo muito especial, cumprimentar o Embaixador Marcondes, que é o negociador e que aqui representa também S. Exª o Ministro de Relações Exteriores do nosso País, Senador Aloysio Nunes Ferreira.
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É muito importante cumprimentar Alfredo Sirkis, Secretário-Executivo do Fórum de Mudança Climática, e todos que compõem o Fórum.
E eu queria dizer que, num entendimento - porque esta é uma sessão de comum acordo com a Comissão de Relações Exteriores e a Comissão de Mudanças Climáticas -, nós estamos promovendo esta sessão. E, claro, com a Presidência da Casa, e, em nome do Senador Eunício Oliveira, queria agradecer a todos os servidores da Casa que nos ajudaram a organizar esta sessão. Ela é muito especial para nós.
Foi exatamente neste período, 25 anos atrás - hoje é dia 12 de junho, uma data muito especial -, que a Rio 92 aconteceu. E, por tudo que tem ocorrido até aqui e o que ainda haverá de ocorrer nesta agenda do clima, do meio ambiente, das nações que compõem este Planeta, nós achamos e entendemos - o Presidente da Comissão Senador Fernando Collor e eu, como Presidente da Comissão de Mudanças Climáticas - que deveríamos fazer esta sessão solene.
E, sem delongas, procuramos dividir pelo menos em duas partes. Num primeiro momento, resgatar o momento histórico da Rio 92. E, por coincidência boa que o destino nos oferece, o então Presidente da República na época Fernando Collor é hoje Senador e Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado; e ninguém melhor que ele para iniciar esta sessão, contando um pouco e falando da importância daquele tempo que vivemos no Brasil e que, a partir daquela data, mudou a agenda do Planeta.
Eu convido, para fazer uso da tribuna, S. Exª o Sr. Senador Fernando Collor de Mello, ex-Presidente da República e que foi determinante para a realização e o sucesso da Rio 92.
V. Exª tem a palavra, Sr. Presidente.
O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco Moderador/PTC - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Excelentíssimo Sr. Presidente desta sessão de lembrança da passagem da Conferência Rio 92, realizada há 25 anos, em nosso País, Senador Jorge Viana; excelentíssimos senhores que compõem a Mesa Diretora dos trabalhos; minhas senhoras e meus senhores, há 25 anos, em 3 de junho de 1992, o Brasil inaugurava a maior conferência internacional de todo o século XX. Recebíamos chefes de Estado e de governo de 179 países, representantes de todos os grandes organismos internacionais, de todas as organizações não governamentais que tratavam da sustentabilidade do nosso Planeta.
Naquela primeira quinzena de junho, as atenções da humanidade estiveram voltadas para as questões essenciais da vida, do desenvolvimento e da justiça na Terra. E o Rio de Janeiro foi o cenário dessa nova consciência, dessa nova vontade, dessa nova esperança.
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Animava-nos, a todos, o "espírito do Rio", como o definia Boutros-Ghali, então Secretário-Geral das Nações Unidas. Inspirava-nos o desafio histórico e a obrigação ética de forjar um novo modelo de desenvolvimento. A Rio 92 significava uma oportunidade histórica de redenção e a oportunidade para que o Brasil pudesse ser o palco de um novo contrato social internacional que, inspirado no princípio da solidariedade, pudesse unir toda a comunidade dos Estados em torno de uma causa comum. E assim nós fizemos.
Sr. Presidente, senhoras e senhores, tenho o orgulho de não ter poupado esforços, como Presidente da República, à época, para que os caminhos do desenvolvimento sustentável se tornassem mais nítidos e mais consolidados. Aqui, durante a Rio 92, firmamos três acordos ambientais, assinados por 175 líderes e, posteriormente, ratificados pela imensa maioria dos países: a Convenção sobre Diversidade Biológica; a Convenção para o Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca; e a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima.
Aqui elaboramos a Declaração de Princípios sobre Ecossistemas Florestais. Aqui formulamos a Declaração do Rio sobre ambiente e desenvolvimento, versão seminal da Carta da Terra. Aqui definimos a Agenda 21, documento-base para a elaboração dos planos nacionais de preservação do meio ambiente e principal instrumento de avaliação do desempenho ambiental dos países signatários.
No Rio de Janeiro, opusemos à perspectiva de um futuro distópico a utopia de um congraçamento universal; combatemos o imediatismo com o planejamento de longo prazo; e exortamos o mundo à paz e à justiça social.
Reconhecemos ali a diferença entre poluição consciente, proveniente do excesso, e poluição inconsciente, derivada da falta, e admitimos que os adversários mais persistentes do equilíbrio ambiental são a ganância, a busca do lucro a qualquer preço, e a miséria, que é a busca da subsistência por qualquer meio. Em oposição a um e a outro, enfatizamos a necessidade de um princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, com compromissos específicos para as nações desenvolvidas, e encorajamos uma reconversão econômica que produzisse estabilidade regional e global, que pacificasse a disputa entre os detentores dos recursos genéticos e os detentores dos meios científicos e tecnológicos e que permitisse o desenvolvimento social, sem degradação da natureza e com impacto ambiental assimilável.
A partir da Rio 92, a consciência de nossa biodiversidade e das potencialidades da biotecnologia se tornou mais disseminada; a disposição para a proteção ambiental, mais amadurecida; e as alternativas de desenvolvimento sustentável, justo e equilibrado, mais concretas.
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Cheguei mesmo a sugerir, à época, que passássemos a mensurar o Produto Nacional do Bem-Estar, que incluiria indicadores de liberdade e harmonia social, de diversidade cultural, de integração racial e respeito ao meio ambiente.
Enfim, Sr. Presidente, registro a importância e o papel do Secretário Nacional de Meio Ambiente de meu governo, entre 1990 e 1992, José Lutzenberger. Apesar de reações contrárias ao seu nome por setores mais conservadores, ele se mostrou a personalidade determinante na inspiração, na condução e na disseminação da causa ambiental e nos resultados da Rio 92. A ele, in memoriam, rendo as minhas homenagens e o meu agradecimento.
Da mesma forma, devo ressaltar a imprescindível atuação do Embaixador Paulo Tarso Flecha de Lima, nas discussões e negociações em foros internacionais para definição do Brasil, e do Rio de Janeiro, como sede daquela segunda Conferência Mundial das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento. Sua habilidade na articulação diplomática garantiu a escolha brasileira para a Rio 92 e, ao mesmo tempo, o cargo de Secretário Executivo da Conferência ao canadense Maurice Strong, cujo país também pleiteava recepcionar o encontro. Igualmente, a ele, Maurice Strong, bem como ao Embaixador Marcos Azambuja, Coordenador da Conferência no Brasil, e aos Embaixadores Carlos Moreira Garcia e Marcílio Marques Moreira, devemos reverenciar aos quatro, pela competência e dedicação aos trabalhos da Rio 92.
Sr. Presidente, senhoras e senhores, procurei fazer de meu governo o exemplo a ser seguido, com a demarcação de terras indígenas dos ianomâmi, dos caiapó e dos mekrãgnoti; com a assinatura do acordo Brasil-Argentina para o uso exclusivamente pacífico da energia nuclear; com as diligências, junto à Agência Internacional de Energia Atômica, para contra-arrestar a corrida armamentista e a proliferação nuclear, bem como banir as armas químicas e bacteriológicas; e com uma política de conservação, de proteção e de recuperação ambiental que estivesse em consonância com os objetivos e as metas definidos na Rio 92.
A Rio 92 representou um divisor de águas. Três anos mais tarde, as conferências anuais das partes - as COPs - começaram a detalhar as estratégias para um mundo mais hígido. Na COP 3, em 1997, em Quioto, Japão, firmou-se o Protocolo para a redução das emissões de gases do efeito estufa, e foram criados os certificados de carbono e o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo. Na COP 5, em 1999, em Bonn, Alemanha, tiveram início as reuniões sobre a mudança de uso da Terra e das florestas.
No entanto, a agenda ecológica terminou por ser atropelada pela nova ordem mundial, que, sobretudo a partir do início dos anos 2000, voltou a colocar o Planeta em segundo plano. Diferentemente do esperado, a multipolaridade que emergiu da Guerra Fria não nos trouxe um mundo de paz e harmonia, mas de guerras e disputas localizadas, acirradas pela ameaça terrorista. Neste choque de civilizações, neste clima generalizado de instabilidade e insegurança, nesta competição fratricida entre blocos regionais, a primeira vítima foi o consenso ecológico internacional.
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Embora a agenda global tenha sido irreversivelmente afetada pela Rio 92, os instrumentos elaborados durante a Cúpula da Terra terminaram por se revelar insuficientes: a não ratificação do Protocolo de Quioto pelos Estados Unidos e uma nova escalada de políticas isolacionistas fizeram com que as metas estipuladas fossem objeto de um relaxamento generalizado, ainda que as anomalias climáticas confirmassem uma tendência de aquecimento global que precisava ser urgentemente estancada.
Foi então, Sr. Presidente, senhoras e senhores, que, para resgatar o espírito do Rio, requeri a este Senado, em 2007, a realização de um novo encontro, a Rio+20, aprovado pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 2009 e realizado no início de junho de 2012, quando expiravam as metas iniciais propostas pelo Protocolo de Quioto.
A Rio+20, embora tenha produzido resultados importantes, não teve o mesmo poder e o mesmo alcance da Cúpula da Terra. Mas conseguimos, ali, operar a defesa do legado conceitual e jurídico da Rio 92 e consolidar o princípio do não retrocesso, de forma a evitar que prosperassem as tentativas revisionistas de recuo em relação aos objetivos, metas e direitos acordados nas convenções e nos tratados internacionais já firmados, que erigimos em patrimônios irretratáveis da Comunidade de Nações. Trata-se de princípio jurídico fundamental nos diversos postulados ambientais, que serve de contrapeso a possíveis decisões políticas.
Também avançamos em relação às alternativas e perspectivas da economia verde e de governança global e reafirmamos a interdependência entre os três pilares do desenvolvimento sustentável: o pilar econômico, o pilar ambiental e o pilar social. Mas não posso deixar de observar que nos deparamos com um déficit de implantação que, ainda hoje, nos impede de avançar.
A emenda de Doha ao Protocolo de Quioto, um dos subprodutos da Rio+20, que estabelece novas metas de redução de emissões até o ano 2020, foi aprovada, até o momento, por apenas 77 Estados, metade do requerido para que entre em vigor.
A saída da Rússia, do Canadá e do Japão, que haviam ratificado a primeira versão do Protocolo, complica ainda mais o cenário. A própria demora do Brasil em ratificar a emenda é constrangedora: o Projeto de Decreto Legislativo (PDC) 433, de 2016, que trata do tema, está parado na Câmara dos Deputados desde o fim do ano passado, aguardando parecer do relator na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.
É bem verdade, Sr. Presidente, senhoras e senhores, que, nesse meio tempo, ratificamos o Acordo de Paris costurado na COP 21, cujo objetivo é limitar o aquecimento global a menos de 2ºC até o ano 2100, em comparação com as temperaturas médias da era pré-industrial. O Brasil se comprometeu com a redução de 37% das emissões de carbono até 2025 e com o indicativo de redução de 43% até 2030, tomando por base o ano de 2005. Mas de nada, de nada adiantarão esses esforços se não houver um movimento internacional coordenado. Embora sejamos hoje o sétimo maior poluidor do Planeta, somos responsáveis por pouco mais de 4% das emissões de gases que causam o efeito estufa. Sem que as iniciativas de redução sejam também adotadas em âmbito planetário e, principalmente, pelas economias desenvolvidas, dificilmente a meta será atingida. E não podemos perder de vista que a contenção do aquecimento global, apesar de necessária, não é suficiente.
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Apesar de deter 20% da água potável de todo o mundo, o Brasil hoje tem sede, e não há mais como adiar uma reformulação completa da gestão de nossos recursos hídricos. O desmatamento da Amazônia, que vinha retrocedendo, cresceu quase 30% em 2016. E, mesmo com a Política Nacional de Resíduos Sólidos, despejamos ainda 30 milhões de toneladas de lixo por ano, de forma inadequada, em quase 3 mil lixões e aterros irregulares, com um impacto negativo na qualidade de vida de 77 milhões de brasileiros.
Sr. Presidente, senhoras e senhores, repito que, para alguns eventos, não é preciso aguardar o julgamento da história. Vejam o que se passa com o Distrito Federal, que enfrenta um racionamento de água há mais de quatro meses; vejam o que se passa com o Rio São Francisco, que, assoreado, vai se transformando em um enorme areal; vejam o que se passou com o Rio Doce, convertido em um curso estéril de lama; vejam o que se passa no Nordeste, que viveu a pior seca dos últimos cem anos. É já passada a hora de agir.
Por isso, eu gostaria de me valer aqui desta sessão de debates para lançar um apelo: que o espírito do Rio volte a animar esta Casa. Que este Senado Federal tome a dianteira na causa ambiental. O passo inicial já foi dado com a iniciativa de S. Exª, o Senador Jorge Viana, Presidente da Comissão Mista de Mudanças Climáticas, de propor este primeiro grande debate pelo transcurso dos 25 anos da Rio 92.
Nesse sentido, Sr. Presidente, senhoras e senhores, proponho a criação, no âmbito do Senado Federal, de uma instituição ambiental independente, com o objetivo de acompanhar e articular, com foros e assembleias legislativas de nações mais reticentes, o cumprimento das metas do Acordo de Paris, oriundo da COP 21. Com um conselho executivo enxuto, pragmático e apartidário, a instituição seria estruturada com autonomia de atuação, poder de mobilização e capacidade de mobilidade para exercer atribuições específicas de assessoramento e convencimento de atores influentes e decisivos no conjunto dos países. Sua composição contaria com representantes do mundo científico, da sociedade civil e do Senado Federal, todos de reconhecida autoridade na causa ambiental.
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Trata-se, assim, de modelo de organização similar ao grupo executivo que criei durante os preparativos da Rio 92, que, sob o comando e a competência do Prof. José Goldemberg, Secretário de Meio Ambiente de meu governo - a quem aqui agradeço -, promoveu um autêntico périplo pelo mundo, com o papel de mensurar a adesão aos propósitos da conferência; de persuadir, com argumentos, as personalidades e nações resistentes; e, ainda, de aparar arestas no plano técnico e político.
Sem dúvida, Sr. Presidente, a criação dessa instituição seria uma salutar contribuição do Poder Legislativo para o rearranjo das relações exteriores perante as ameaças ambientais que advirão com a decisão dos Estados Unidos da América de sair do Tratado de Paris.
E penso que poderíamos marcar também o nosso compromisso com a responsabilidade ambiental pela ratificação - antes da COP 23, na Alemanha - da Emenda de Doha, tão logo nos seja encaminhada pela Câmara dos Deputados. Cumpre-nos, pois, instar aquela Casa para acelerar a tramitação do PDC 433, de 2016.
Sr. Presidente, senhoras e senhores, o Planeta é um só, indivisível. Como relembrou o Presidente Macron, não existe plano B, porque não há planeta B. Portanto, não há saída! Cada atitude do passado e do presente pertence à morte do astro. O resto será silêncio!
Não existem fronteiras para o meio ambiente. A preservação ambiental não admite barreiras, não admite muros que possam salvar um país em detrimento de outro. Não há como isolar a poluição, circunscrever os seus danos ou criar campânulas particulares. Ao contrário, temos apenas uma redoma que encobre todo o Planeta, que é a redoma da camada de ozônio, que, progressivamente, está sendo destruída pela cegueira, pela irresponsabilidade e pela estupidez humana.
O aquecimento global é fenômeno incontestável, a despeito do ceticismo de uma minoria. A extinção de espécies marinhas e animais é real. Os ecossistemas estão se desintegrando. Os mananciais se contaminam. O desmatamento avança. As calotas polares degelam, a ponto de já servirem como rotas comerciais, como o caminho do Ártico.
Países irão desaparecer com a elevação dos mares. Chegamos ao extremo de uma nação, como o Kiribati, ter comprado 2.400 hectares de florestas em Vanua Levu, nas Ilhas Fiji, como precaução para estoque de alimentos e talvez como futuro lar para parte de seus habitantes. O aquecimento global, portanto, é o tsunami planetário. A diferença é que as ondas gigantes destroem, mas passam e permitem a reconstrução. O aquecimento global, não! É irreversível!
Sr. Presidente, senhoras e senhores, se não bastasse esse cenário degradante, ainda padecemos com a irracionalidade de alguns líderes regionais. No primeiro dia do mês, em que comemoramos a Semana do Meio Ambiente, as nações se abismaram com a decisão mais despropositada e excêntrica que um presidente da maior potência do mundo poderia tomar: contra tudo e contra todos, Donald Trump anunciou a retirada dos Estados Unidos, o segundo maior poluidor do Planeta, do Acordo de Paris, atitude totalmente diferente - vale registrar - da importância dada ao tema pelo Presidente George Bush em 1992.
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Mas, ao brincar com um poder deletério, Trump sentenciou a humanidade ao desaparecimento paulatino e condenou todo tipo de vida à morte. Por isso, é preciso dizer: assim como o Acordo de Paris não se restringe a Pittsburgh, o mapa-múndi não se resume aos Estados Unidos da América.
O Presidente Barack Obama havia se comprometido, em 2015, com uma redução das emissões entre 26% e 28% até 2025, em comparação sempre com os níveis de 2005. Agora, com a decisão do atual Presidente americano - equivocadíssima em termos científicos e catastrófica em termos ambientais -, a perspectiva é de que a redução, no caso dos norte-americanos, não supere os 14% absolutamente insuficientes para evitar o aumento das temperaturas médias.
Resta-nos, então, quem sabe, torcer para que a China, como o maior poluidor entre as nações, assuma o papel e o protagonismo dessa luta. Afinal, antes, a filosofia chinesa dizia que, enquanto o Ocidente tem como referência o relógio, a China tem como referência o tempo. Agora, eles não mais têm o tempo... O relógio está no pulso da própria China! Se ontem ela exaltava a paciência, a reflexão e o tempo disponível para suas decisões, hoje ela corre contra o tempo, diante da iminência das catástrofes ambientais que se anunciam com o abandono americano do Tratado de Paris. Daí a relevância da atuação chinesa a partir de agora, seja por sua responsabilidade nas emanações que causa, seja pelo tamanho de sua economia, seu território, sua população, mas também pela sua capacidade de se reinventar.
No mesmo sentido, o mundo anseia para que as empresas e os Estados americanos, no uso da autonomia que detêm, mantenham a consciência ecológica, não deixando de cumprir o Acordo de Paris - o que, aliás, já se pronuncia -, a despeito da decisão do Governo central, que, aliás, está sendo objeto da reunião do G7, hoje, em Bolonha, na Itália, mas que nós já sabemos que de nada vai adiantar, em termos do propósito para o qual ela foi chamada.
Por tudo isso, Sr. Presidente, senhoras e senhores, não podemos permitir que a traição do Governo americano ao Acordo de Paris faça com que o "espírito do Rio" se esvaneça. Precisamos estancar a passividade, o conformismo e a contrafação. Precisamos semear o ponto de partida de uma nova transformação. Que revivamos, pois, os compromissos da Rio 92, porque para isto serve a lembrança de datas marcantes como esta: para perpetuar, em nós mesmos, a memória do que já fomos capazes e reunir forças para que sigamos adiante e alcancemos muito mais além.
Que nos superemos, então, senhoras e senhores.
Muito obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Eu cumprimento V. Exª, Senador Fernando Collor, Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado Federal, que nos traz aqui a memória de um tempo em que o mundo precisava se encontrar para tratar de uma agenda global, a Conferência da Terra.
Obviamente, por conta, talvez, da liturgia, do rito, V. Exª não tratou do esforço pessoal que V. Exª teve, da iniciativa pessoal, do contato direto, não só para que o Brasil pudesse sediar tão importante conferência, mas para que pudessem também estar presentes os mais importantes líderes do mundo. Isso, certamente, a história haverá de registrar, como também fez V. Exª, com o Presidente Lula, um esforço direto, objetivo, que também tem nuances importantes a serem registradas, para que tivéssemos a Rio+20.
Então, é algo fundamental. Não sei se sigo aqui, agora, com a lista de oradores, mas, no entendimento com ele, gostaríamos de ouvir um pouco mais sobre a memória da Conferência da Terra, Rio 92.
Assim, então, chamaria...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Vamos então pedir que possa nos prestigiar e a esta sessão o ex-Ministro, Prof. José Goldemberg, Ministro do Meio Ambiente em 1992.
Se quiser falar daqui...
Com a palavra V. Sª.
O SR. JOSÉ GOLDEMBERG - Sr. Presidente, meus amigos, a adoção da Convenção do Clima em 1972 faz parte de um longo caminho seguido pela humanidade para chegar onde estamos hoje: 7 bilhões de seres humanos, com nível de vida razoável, que fez com que a idade média de vida tenha atingido 70 anos. Um século atrás era metade disso.
Esse progresso só ocorreu graças a avanços científicos e técnicos que deram origem a políticas públicas saudáveis.
Os romanos, há mais de 2000 anos, parecem ser os que primeiro entenderam isso ao garantir à cidade água corrente e um sistema de esgotos exemplar. Sem tais medidas, Roma não se teria tornado a maior cidade do Ocidente com mais de 1 milhão de habitantes.
Após a revolução industrial no século XIX, o problema passou a ser a qualidade do ar, que só começou a ser resolvido a partir de 1972, após a Conferência de Estocolmo. Foi dela que surgiram os ministérios de meio ambiente no mundo todo.
Sem água, ar limpo e esgoto, cidades não são viáveis, e hoje mais de 70% da população mundial vive em zonas urbanas.
Todos esses problemas podem ser atacados e resolvidos em nível local, regional e nacional.
Sucede que, no fim do século XX, foi identificado cientificamente um novo problema, que é o aquecimento global provocado pelas emissões de gases resultantes principalmente da queima de combustíveis fósseis. Esses gases não conhecem fronteiras, e os problemas que causam só podem ser atacados em nível internacional. Isso é o que a Convenção do Clima de 1992, no Rio de Janeiro, tentou fazer.
O governo brasileiro, sob a Presidência do Presidente José Sarney, inicialmente, e do Presidente Fernando Collor, logo a seguir, assumiu um papel importante nas negociações que precederam a Conferência.
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Durante o período militar, era dominante a ideia de que preocupações ambientais eram secundárias e que a prioridade era o desenvolvimento mesmo que predatório, afetando inclusive a Floresta Amazônica. Visões correntes na época eram as de que os países industrializados é que eram os responsáveis históricos pelas emissões e deveriam arcar com os custos de sua redução nos demais países. Essa é ainda a visão de alguns países menos desenvolvidos.
O Presidente Collor teve o mérito de ter conseguido atrair ao Rio de Janeiro, em 1992, mais de 150 chefes de Estado que sinalizaram, de forma inequívoca, o caminho a seguir, que era o de promover um desenvolvimento moderno e pouco poluente. É a modernização a chave do problema. Ninguém nega a importância do desenvolvimento, mas o desenvolvimento pode ser feito de uma maneira coerente, com respeito ao meio ambiente.
Tive o privilégio de participar desse esforço como Secretário do Meio Ambiente da Presidência da República, junto com o Secretário-Geral do Itamaraty, Marcos Azambuja, numa missão que foi a Washington, Nova Deli, Tóquio e Beijing convencer os chefes de Estado da importância da Convenção do Clima, o que na época não foi uma tarefa trivial, mas que teve sucesso.
Tomo a liberdade de usar uma linguagem coloquial. Quando eu cheguei aos Estados Unidos, junto com o Embaixador Azambuja, fui recebido pelo Chefe da Casa Civil, que era um engenheiro que tinha sido Governador do Estado de Connecticut, que me disse simplesmente que o aquecimento global era de pouca importância para os Estados Unidos, porque eles aumentariam a potência dos aparelhos de ar-condicionado. Eu disse a ele - e a nossa missão era uma missão que combinava diplomatas com pessoas da área científica - que eu achava essa ideia muito interessante, mas que eu gostaria de saber como que ele faria isso para colocar uma campânula sobre o Meio-Oeste americano, onde a agricultura e os alimentos eram produzidos.
Eu creio que o Chefe da Casa Civil ficou suficientemente impressionado para me levar ao Presidente Bush pai, o que era uma consideração especial, porque eu estava lá apenas como um Ministro de governo. Eu participei de uma reunião do Gabinete dos Estados Unidos, onde tive oportunidade de explicar que o Brasil era um player, um jogador importante por causa da Floresta Amazônica e que seria preciso que todos fizessem a sua parte.
Eu creio que mais simbólica ainda foi a visita ao Primeiro-Ministro da China. De novo, que nos recebeu, que não seria o normal dentro dos hábitos... E é muito interessante o que aconteceu, tomo de novo a liberdade de explicar. No momento em que eu entrei na sala, que era provavelmente a sala ocupada pelos antigos imperadores chineses, o Primeiro-Ministro chinês, Li Peng, que tinha sido o homem que suprimiu as manifestações da Praça Tiananmen, perguntou: "O que é que eu posso fazer pelo senhor, Professor?" Eu disse - eu tive o sangue frio de responder: "Eu não estou aqui como Professor da Universidade de São Paulo, apesar de ser conhecido na China, mas como representante do governo brasileiro, que está se esforçando para viabilizar uma convenção que vai ajudar a nós todos."
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E eu creio que o resultado é que eles vieram ao Rio de Janeiro.
Eu tenho um grande orgulho, junto com o Embaixador Azambuja, de ter participado dessa missão e creio que foi um dos pontos altos do período do Presidente Collor, na área ambiental, nessa ocasião.
Passados 25 anos, a Conferência de Paris, de 2015, coroou o sucesso inicial da Conferência Rio-92, e nem mesmo a posição anticientífica do Presidente dos Estados Unidos vai impedir que os compromissos lá assumidos sejam atingidos. O sucesso da Conferência de Paris se deve muito à Ministra Izabella Teixeira, que está aqui presente.
O Acordo de Paris é um acordo em que países adultos e responsáveis voluntariamente decidiram que reduzir as emissões serve ao interesse nacional e como fazê-lo. Não é favor nenhum o que os países fazem. E eu acredito que justamente o que os Estados Unidos estão fazendo, o que o Presidente dos Estados Unidos está fazendo é um desserviço ao próprio país que ele preside.
Nesse contexto, Sr. Presidente, eu tomo a liberdade de mencionar que uma ideia que seria interessante seria convidar os chefes de Estado dos principais emissores do mundo - China, Índia, Japão, Inglaterra, África do Sul, Indonésia - ao Rio de Janeiro, como foi feito em 1992, para reafirmar o que se alcançou, em 1992, e, em Paris, em 2015. Essa seria uma forma de o Brasil voltar a assumir uma posição de liderança nessa área, como ocupou em 1992.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Cumprimento o Professor José Goldemberg, ex-Ministro de Meio Ambiente, quando da realização da Conferência Rio-92.
Imediatamente, convido, para que possa fazer uso da palavra, S. Exª, o Embaixador Marcos Azambuja, que, como já foi dito, tanto pelo Presidente Collor como pelo Ministro, cumpriu um papel fundamental também para a realização daquela histórica Conferência.
Com a palavra V. Exª.
O SR. MARCOS AZAMBUJA - Obrigado, Presidente, muito obrigado pela apresentação.
Eu cumprimento todos os meus colegas de Mesa - o Presidente Collor; o senhor; o José Goldemberg, meu querido amigo; à Srª Ministra; ao Carlos Garcia; à Srª Deputada. Estendo meus cumprimentos ao Paulo Tarso Flecha de Lima, meu velho e querido amigo e de quem eu sou um fiel admirador. Parabéns, Paulo, por tudo que você tem feito!
Eu queria dizer que a Conferência do Rio de Janeiro, que foi ontem, foi o resultado de uma conjugação de fatores afortunados e fatores virtuosos. Afortunados porque ela se deu num momento em que parecia que o mundo ia encontrar uma nova forma de convívio. A Guerra Fria tinha terminado. O Muro de Berlim tinha caído. E parecia que havia espaço para que o engessamento daquele enfrentamento tão longo, militar e ideológico, que foi a Guerra Fria, pudesse dar lugar a uma fase de cooperação, de criatividade.
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Portanto, o Rio de Janeiro se beneficiou de uma trégua, de uma pausa, de um momento em que as coisas estavam andando bem.
Foi virtuosa porque a Rio-92 se vestiu com as melhores roupas. Ela investiu no meio ambiente, investiu no desenvolvimento, investiu na defesa das civilizações indígenas. Ela se investiu de todas as boas causas. Ela era uma aliança virtuosa e que, portanto, tinha a força daquilo que é irresistível, que é o bom, que é o justo, que é o necessário.
O Rio é, de certa maneira, o ground zero de tudo o que se faz. Estocolmo foi uma grande conferência, mas Estocolmo teve um pouco a marca do regionalismo. Era uma conferência que se dava num grande país desenvolvido, num momento em que a causa do meio ambiente era, a rigor, transformada numa causa mundial, mas sem a contrapartida da ideia do desenvolvimento. O que faz o Rio de Janeiro e 1992 memoráveis é que é o casamento entre a necessidade de preservar o Planeta e de garantir o desenvolvimento. As duas coisas se casam de uma maneira essencial.
Eu creio que, como tudo o que dá certo, há espaço para que todos se sintam condôminos do sucesso. O Presidente Collor, por todos os títulos; no Itamaraty daquela época, José Francisco Rezek, depois Celso Lafer; no Rio de Janeiro, Leonel Brizola e Marcelo Alencar. Em nível internacional, Maurice Strong e Tommy Koh é que foram duas pessoas essenciais.
Portanto, havia, Presidente Collor, Presidente da nossa sessão, uma ideia de que as forças se somavam, de que aquilo era uma coisa que era possível fazer entre nós.
Eu não quero fazer aqui, porque o tempo é curto, e o terrível da memória é que ela vai se alongando com o tempo, e pouco a pouco eu vou me lembrando de mais e mais coisas. O José Goldemberg agora lembrou uma viagem que nós fizemos, tão memorável pelo alcance do que se fazia. E o Brasil, que vinha de um período em que o Brasil e o meio ambiente não se entendiam, e, em Estocolmo, a posição brasileira era defensiva e um pouco paranoica. A ideia brasileira era de que o meio ambiente era uma causa inventada pelos ricos para nos manter pobres. Era uma coisa complicada, porque havia um resíduo de verdade nisso. De certa maneira era uma teoria dos países altamente desenvolvidos, já satisfeitos, que não levavam em conta as nossas carências e as nossas expectativas.
Portanto, o problema no meio ambiente, eu sempre encontrei, é fugir ou do ceticismo, que leva a não fazer nada, ou da ideia ingênua de que tudo é virtude. É preciso encontrar um ponto de equilíbrio. Nem toda causa é virtuosa por definição; nem toda suspeita é legítima. É preciso encontrar uma relação madura com os fatos e aceitar que é preciso, em cada caso, julgar.
Mas, sobretudo, o Brasil voltou a ser o mocinho do filme. Em 1992, o Brasil reassume uma posição maravilhosa no mundo. O Brasil, de acusado, de País desrespeitoso, de País insensível, passa a ser um País responsável e sensível. Não é que ele esteja impecável; não é que ele tenha feito, então e agora, tudo o que deve, mas ele aponta na direção certa. O que eu acho que se inicia, em 1992, é o Brasil apontando na direção certa, o Brasil apontando para o que deve ser. Claro que com imperfeições, claro que com falhas, mas, de certa maneira, eu continuo convencido de que a causa está sendo vitoriosa.
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Eu noto com desprazer o que houve agora nos acordos de Paris. A saída dos Estados Unidos é um desastre. Mas os Estados Unidos não estão saindo: o seu Presidente está saindo. Está havendo uma coisa extraordinária: os Estados Unidos estão se separando, de certa maneira. A Califórnia, Nova York, os grandes Estados vão continuar com as políticas, de certa maneira. Eu não quero dizer que o Presidente Trump está falando sozinho, mas não está falando em nome daquele extraordinário país. De modo que eu não vejo, nem neste caso, uma derrota. E eu acredito que nós vamos continuar.
Eu, há dias, tive no Rio de Janeiro uma experiência extraordinária. Eu joguei no lixo uma coisa que não devia estar naquele lixo. Eu sou de uma geração em que lixo era uma coisa universal, era lixo. Não havia diferenciação de lixos. Eu tenho três netos, para quem o lixo é uma compartimentalização diferenciada. Então eu joguei alguma coisa num lugar que não devia e fui objeto de uma fulminação. Como eu fazia aquilo? Que exemplo era aquele? Que diabo de pessoa que trabalhou em meio ambiente e faz aquilo? E eu não sabia que o lixo hoje requer uma atenção. Quando vi aquelas três crianças mobilizadas em defesa do lixo, eu me dei conta de que a guerra estava ganha. Eles estão carregando a tocha. O caminho está aberto.
Portanto, eu queria dizer ao Presidente da Mesa, ao Presidente Collor...
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS AZAMBUJA - ... que eu estou agradecido a eles por este convite e que, de certa maneira, sinto que, pela própria reunião de hoje, a causa é irresistivelmente vitoriosa. O mundo vai continuar, e nós também.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Muitíssimo obrigado, Embaixador Marcos Azambuja, por essa fala tão fantástica e essa aula que nos dá aqui sobre a evolução que vivemos no tempo.
Peço para também se manifestar o Embaixador do Brasil na Espanha no ano de 1997 e Presidente do Grupo de Trabalho Organizador da Rio 92, Sr. Carlos Moreira Garcia.
O SR. CARLOS MOREIRA GARCIA - Muito obrigado, Sr. Presidente, Sr. Presidente Fernando Collor, senhores componentes desta Mesa. A mim me coube, na época, ser o Presidente do Comitê Organizador. Portanto, vou me centrar nas coisas de organização da conferência.
O Itamaraty, sob a liderança do Embaixador Paulo Tarso Flecha de Lima, havia conseguido que as Nações Unidas decidissem sediar no Rio a sua II Conferência sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Era a maneira de o Brasil contestar, na prática, a imagem então difundida internacionalmente de que éramos poluidores e destruidores da floresta. Foi uma aposta diplomática ousada e vitoriosa.
Em 1991, era eu Secretário da Administração Federal quando fui chamado ao Planalto, e o Embaixador Marcos Coimbra me informou que o Presidente Fernando Collor havia decidido formar um grupo de trabalho para organizar a Conferência, que se iria realizar no Rio de Janeiro em 1992, e que eu deveria assumir as funções de Secretário Executivo. Mais tarde, passei a Presidente do grupo de trabalho, com meu colega Flávio Perri como Secretário Executivo.
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Havia muitas dúvidas, no Brasil e entre países desenvolvidos, sobre a nossa capacidade de organizar uma Conferência tão grande e tão complexa numa cidade com os problemas do Rio de Janeiro de 1992.
O problema era saber como se organiza uma Conferência na qual se previa a presença de mais de 170 Chefes de Estado e de Governo, além de milhares de ONGs e jornalistas de todo o mundo numa cidade com enormes dificuldades de infraestrutura e de segurança.
A ONU não tinha muita experiência a nos facilitar. Suas conferências eram, em geral, organizadas pelos países-sede. Mas o Secretário-Geral da Conferência, Maurice Strong, foi sempre muito atento e muito disposto a ajudar naquilo que podia.
Assim, tivemos de aprender fazendo. E, para minha grande alegria, a ONU passou a recomendar a outros países-sede de conferências internacionais que nos consultassem sobre como organizá-las.
Havia decisões a tomar. E a principal foi a de separar a Conferência Governamental, no Rio Centro, e a da sociedade civil, no Aterro do Flamengo. Isso nos permitiu organizar o trânsito e a segurança de modo racional, e permitiu que os milhares de participantes das ONGs ambientais se reunissem e difundissem suas mensagens enquanto os delegados governamentais discutiam os documentos principais que fizeram da Rio-92 um marco no tratamento das questões ambientais.
Parece óbvio e racional, mas havia grande oposição tanto das ONGs quanto da ONU, que queriam estar no mesmo local porque acreditavam que a presença de manifestantes no entorno do Rio Centro seria essencial para influenciar as decisões das delegações governamentais. Mas mantivemos nossa decisão e fomos bem-sucedidos. As duas áreas foram devidamente ocupadas e interligadas, e tanto as delegações quanto as ONGs puderam atuar com segurança, sem problemas de confronto.
Em paralelo, o Itamaraty constituiu um grupo de diplomatas para conduzir a negociação dos acordos intergovernamentais com pessoas de experiência diplomática inigualável, como Marcos Azambuja, Rubens Ricupero, Luiz Felipe de Seixas Corrêa, Luiz Filipe de Macedo Soares e outros, que muito ajudaram o Secretário-Geral Maurice Strong e as delegações dos principais países na negociação dos textos finais, porque interessava à diplomacia brasileira que os textos fossem uma expressão do nosso esforço para o pleno êxito da Conferência.
Era importante para todos nós, como organizadores, contar com o maior respaldo popular. E fizemos um grande esforço para difundir em todo o País a mensagem de que a defesa do meio ambiente não é incompatível com o desenvolvimento. Isso hoje é um lugar comum. Ninguém mais alega que proteger o ambiente prejudica o desenvolvimento. Mas, há 25 anos, essa era uma teoria inovadora que foi preciso difundir em palestras, entrevistas, artigos e seminários. Mas conseguimos passar a mensagem. Nos anos seguintes, o Brasil avançou muito mais que outros países na percepção popular dos benefícios da defesa ambiental.
Contamos todo o tempo com o apoio inabalável do Presidente da República, Fernando Collor, que seria o Presidente da Conferência. Era um trabalho que afetava múltiplas esferas, incluindo governos estaduais e prefeituras. E o Presidente Collor sempre me apoiou nesses contatos, também dentro do Governo Federal, quando precisamos de outros Ministérios, ou no Congresso, quando precisamos de recursos orçamentários e apoio político.
Devo ressaltar que o Governador Leonel Brizola foi uma fortaleza em seu apoio sempre presente, assim como o Prefeito Marcello Alencar. Sem o apoio dos dois, seria muito difícil organizar uma Conferência de tal envergadura no Estado do Rio de Janeiro.
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Foram 18 meses de trabalho intenso e de dificuldades decorrentes das desconfianças sobre a nossa capacidade de organizar a Conferência, algumas vozes chegaram a pedir o adiamento e a transferência para outra sede. Mas, no dia da abertura, pela manhã, na hora certa, o Presidente Collor declarou abertos os trabalhos e todas as delegações estavam acomodadas num plenário feito sob medida, hospedadas em seus hotéis, seguras e comunicadas. E, no Aterro, começava a grande festa das ONGs.
As comunicações há 25 anos não eram comparáveis às de hoje: celulares estavam começando, linhas telefônicas eram poucas, as chamadas internacionais só tinham DDI para alguns países. E a imprensa internacional, que veio em peso, cerca de sete mil correspondentes, demandava circuitos de imagens e som para suas reportagens e nossas saídas por satélite eram poucas, se comparadas com as de hoje. Ao final, conseguimos atender às necessidades de comunicação e o Brasil ficou mais bem conectado com o resto do mundo.
Outro dos grandes problemas era o da segurança, com tantas delegações chefiadas por presidentes e primeiros-ministros, além de milhares de ONGs e jornalistas. Tivemos que apelar às Forças Armadas, e o Exército e o Corpo de Fuzileiros nos cederam tropas, a Aeronáutica fez o controle aéreo e a proteção a dezenas de aviões privativos que trouxeram as delegações. O controle de delegações começava no Galeão, ia aos hotéis e às reuniões e seguia até o embarque de volta, 15 dias depois. Uma tarefa imensa, que o então Diretor da Polícia Federal, Romeu Tuma, conduziu com êxito e discrição.
A cidade do Rio de Janeiro viveu 15 dias de uma comemoração alegre e consciente da natureza e dos benefícios da conservação de nossas riquezas naturais, assim como nas reuniões do Business Council das possibilidades de desenvolvimento de um novo setor econômico ligado à proteção do meio ambiente.
Fizemos um grande esforço e esperávamos que a ONU nos compensasse com a instalação, no Rio de Janeiro, de um organismo ligado ao tema da Conferência, o que traria um papel importante para a cidade nesse mundo das organizações intergovernamentais. Mas antes da Assembleia Geral que poderia criar esse organismo sobreveio a crise política de 1992 e a oportunidade se perdeu.
Ficamos sem a nossa compensação direta, mas ficamos também com a grande alegria de ter mostrado que nosso País podia organizar bem uma Conferência de tal magnitude - até então a maior da história - e que havia, por parte do povo brasileiro, uma grande concordância com a defesa do meio ambiente, em sintonia com o desenvolvimento. Meio Ambiente e Desenvolvimento, dois objetivos que o Brasil continua a perseguir e que são centrais em nossas políticas internas e internacional.
Que o Brasil brilhe sempre na defesa de nossa natureza.
Muito obrigado, Sr. Presidente Jorge Viana, pelo convite para participar desta comemoração de um dos grandes momentos de nossa diplomacia.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Cumprimento mais uma vez o Embaixador Carlos Moreira Garcia, que faz aqui um relato bem apropriado de quem estava na linha de frente da organização da Conferência.
Bem, passada essa fase mais histórica, nós temos aqui ainda para ouvir a ex-Ministra do Meio Ambiente, que trabalhou, como foi dito aqui, tão intensamente com o acordo assinado em 2015, em dezembro de 2015 em Paris, com a equipe do Ministério de Relações Exteriores. Mas, antes, eu pediria licença, Srª Ministra, eu combinei aqui com o Presidente Fernando Collor de nós ouvirmos primeiro - e aí V. Exª encerra esta fase -, nós ouvimos também, porque as Nações Unidas foram fundamentais em todo esse processo, e nós temos o privilégio de poder contar com o Subsecretário-Geral da Organização das Nações Unidas e Diretor Executivo da ONU Meio Ambiente, que tão bem conhece o Brasil. Inclusive, já esteve duas vezes, em oportunidades, em meu Estado, o Estado do Acre. Hoje esteve no Fórum da Sociedade e Mudança Climática, secretariado por Alfredo Sirkis.
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E, antes disso, eu queria só fazer um brevíssimo registro também da presença do Prof. Dr. Gylvan Meira. Talvez na pessoa dele possamos registrar o envolvimento da sociedade civil, da comunidade científica. Um professor da USP que tanto... Ainda há pouco lá no encontro, no fórum, foi registrado como não o mais velho, como ele bem registrou, mas talvez um dos mais antigos que atuam nesta causa.
E eu faço aqui o agradecimento e o registro também, porque eu estava na Rio 92. Mas lá...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - No Aterro, como um técnico recém-formado, que já trabalhava em uma fundação de tecnologia. E lá foi onde pude viver e dar a minha parcela de contribuição também, como centenas e milhares de brasileiros e pessoas de toda a parte do mundo.
Então, fica esse registro. Registro também a presença do Senador Cristovam.
E, mais uma vez, na pessoa do Alfredo Sirkis - esperamos daqui a pouco poder ouvi-lo também -, agradeço a todos da sociedade civil que estão aqui presentes.
Eu passo imediatamente a palavra - para que possa também fazer uma fala - ao Sr. Erik Solheim.
Por gentileza.
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O SR. ERIK SOLHEIM (Tradução simultânea.) - Muito obrigado, muito obrigado por me darem a palavra.
Como jovem membro do Parlamento europeu, eu estava no Rio de Janeiro em 92. Foi a minha primeira visita ao Brasil. Mais tarde, eu repeti a minha visita indo ao Acre, à Boa Vista, à Foz do Iguaçu e a vários lugares desta Nação maravilhosa. Se há uma nação no Planeta que é fácil amar, é o Brasil. Tanta variedade na natureza e tantas pessoas que são brilhantes. Esta Nação é uma nação fantástica. Os senhores estão no meio de uma crise, mas eu tenho certeza que desta crise os senhores sairão vitoriosos, fortes e vão renascer como uma potência global importante. Tenham confiança da sua própria força.
Eu gostaria de dar os parabéns ao Senador Collor por tudo o que o senhor alcançou no Rio de Janeiro em 92. E eu falo em nome do Secretário-Geral e gostaria de agradecer pelo que fizeram em 92: foi um grande serviço para a humanidade e um grande serviço para o Planeta.
Foi muito bom ouvir suas histórias sobre o Presidente americano George Bush, sobre a sua visita à China, muito obrigado por trazer isso à nossa atenção. Mas eu gostaria de dizer que aquela Conferência foi uma das conferências mais importantes na história das Nações Unidas. E eu quero afirmar que levou o Planeta a uma nova posição, o que foi um benefício para todos nós.
Se alguém fizer a pergunta: "Como é que nós podemos levar a mensagem do Rio para o futuro?". Precisamos saber primeiro qual é esta mensagem. E, na minha opinião, nós já ouvimos isso dos oradores. Número um, a mensagem do Rio não é nada como se fosse um caminho ambiental, um caminho de desenvolvimento, um caminho econômico, é todo um caminho unido de desenvolvimento - econômico, social e ambiental - e só podemos ser bem-sucedidos no Brasil, na China, nos Estados Unidos ou na África, só podemos ter sucesso se houver uma fusão desses três pontos de vista. É por isso, também, que o setor privado é tão essencial. O setor privado, ainda que não seja uma força motriz, tem que ver os benefícios.
Há três meses, eu estive em São Paulo me encontrando com a associação dos bancos do Brasil. Algumas pessoas podem imaginar que os banqueiros são pessoas antiquadas, que não têm nenhum interesse no meio ambiente, mas não, esse grupo está na vanguarda do pensamento ambiental. Inclusive, há muitos políticos que são muito envolvidos com o meio ambiente. É importante para o desenvolvimento do Brasil e é importante também, no caso da associação dos bancos, é importante para a agenda desses bancos.
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A segunda mensagem do Rio 92 é reunir tudo. O que é mais importante no mundo, hoje em dia, é trabalhar juntos. Sim, nos Estados Unidos, na Europa, algumas pessoas ou alguns políticos falam como se o seu país pudesse caminhar sozinho. Ninguém pode fazer isso, nem o País mais forte. Todas as nações têm que pensar em paz, segurança, ambiente, progresso social, liberdade da pobreza. Trabalhando tudo isso, as nações terão sucesso juntas ou fracassarão juntas. Não é que uma nação seja bem-sucedida enquanto as outras fracassam. Não. Isso pode ter ocorrido nos primórdios da história do ser humano; isso pertence ao passado. Temos que trabalhar juntos, produzindo mais e melhor juntos, empurrando o mundo para frente juntos. Essa é a mensagem do Rio de Janeiro.
Eu gostaria de descrever três áreas em que precisamos agir juntos, como uma agenda conjunta. Número um: temos que criar um planeta livre da poluição. Pode ser surpreendente para muitos, mas, hoje em dia, a poluição é o que mais mata a humanidade. Isso não era o que ocorria em 1992. Na época, não era isso. Na época, havia a poliomielite, a malária, o sarampo, que matavam muita gente. Hoje, a malária foi reduzida na África em 70%, a varíola está erradicada, e tivemos uma substancial redução da poliomielite, que só existe no Afeganistão e em alguns países naquela área. Em tudo isso, tivemos muito sucesso em termos de saúde pública, mas há novas ameaças; o que mais mata o ser humano hoje é a poluição.
O Brasil é uma das nações mais urbanizadas no mundo, se não me engano, 85%. Temos que agir para reduzir a poluição urbana, a poluição do ar, porque isso leva a questões de saúde e a questões do meio ambiente. E, é claro, é também um ônus para a economia; então, temos que trabalhar juntos.
Podemos observar que as cidades mais bem-sucedidas do Planeta - Singapura; Shenzhen, na China - foram cidades que tiveram sucesso na redução da poluição; são cidades verdes. Eu acho que aqui, no Brasil, Curitiba tem uma história de sucesso, Curitiba, que tem um sistema de ônibus. Pelo meio ambiente, temos que trabalhar com a Organização Mundial de Saúde e eu insto cidades brasileiras a unirem-se nesta campanha.
Precisamos também agir sobre a poluição gigantesca do oceano. O Brasil tem uma costa longa; há muito plástico que chega aqui agora. Estamos agora numa situação em que o peso do plástico nos oceanos do mundo corresponde ao mesmo peso dos peixes. Precisamos agir. Lançamos uma campanha chamada Mares Limpos, e há muito interesse da parte empresarial, da sociedade civil e dos governos. A Indonésia, que envolve várias ilhas, também está tentando reduzir a poluição de plástico em 70% nos próximos sete anos. Foram proibidos sacos de plástico. O Canadá e muitos países estão agindo, e as empresas estão também participando, porque não querem ser vistas produzindo e jogando mais plástico no oceano.
Então, eu insto o Brasil a unir-se a esta campanha, trabalhando conosco nessa área. Em segundo lugar, perto de um Planeta livre da poluição, temos de criar um Planeta onde não vamos ver o aumento da temperatura. E a boa notícia é uma mensagem que nos chega... Nós temos de nos unir. Eu estive numa reunião do G7 em Bolonha. Todos os seis Estados-membros da Europa, o Japão e o Canadá, todos disseram: "Vamos avançar. Nós acreditamos nisso. Isso é essencial. Não vamos parar." E na verdade, também a China e a Índia disseram que vão assumir o Acordo de Paris.
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Imaginem, o Primeiro-Ministro Modi, na Índia, não está falando tanto sobre a mudança climática, mas ele está falando sobre a Índia limpa. E ele fala sobre o fornecimento da eletricidade aos vilarejos indianos; está falando sobre a nova oportunidade dos empregos verdes. Com isso, ele vai fazer da Índia e da China as principais forças motrizes nessa área. Alguns Estados indianos, que têm dezenas de milhões de pessoas, estão fazendo coisas que jamais imaginamos ser possível. A China e a Índia estão reduzindo os níveis... Nos últimos dois anos, pela primeira vez na história da humanidade, há mais eletricidade eólica e eletricidade solar do que provenientes do petróleo e do gás combinados.
Nos Estados Unidos, nós temos também uma expansão da energia solar. Então, a reação da Casa Branca foi... A China, a Índia, a Europa, o Brasil, o Canadá, o Japão, a África, todos estão unidos e vão avançar. Mas tão interessante quanto isso foi a reação do setor privado, inclusive do setor privado dos Estados Unidos. Todas as principais empresas do capitalismo moderno - Apple, Microsoft, Google, Amazon - disseram: "Nós discordamos do Presidente e não vamos passar... Nós vamos adotar cada vez mais energia renovável, o que quer que ocorra na Casa Branca. Nós fazemos isso não para a Casa Branca, mas para os nossos clientes, para o meio ambiente, e também porque nós achamos que isso é correto."
E não são apenas as empresas modernas como a Apple e o Google, mas também, por exemplo, o maior investidor no mundo disse a mesma coisa. Um dos maiores bancos do mundo, Goldman Sachs, disse a mesma coisa. E também o valor de suas ações ultrapassou o valor que tinha antes.
E agora, o que nós vamos fazer? Vamos ver como é que nós vamos olhar para o futuro. A cor do futuro é a cor verde. A Tesla tem um valor de ações maior do que as ações da General Motors, porque estão produzindo mais carros verdes. Então, precisamos de um Planeta livre da poluição, e também de atacar a mudança climática no setor privado e no público. A China, a Índia, o Brasil, todos juntos, avançando.
O terceiro ponto é a proteção da beleza e da natureza. No Brasil, essa beleza é incrível; na Amazônia, o número de pássaros, o número de borboletas, os animais, as onças; é uma riqueza gigantesca. Os senhores são a Nação mais megadiversa do Planeta. Então, vamos manter essa diversidade para a beleza, para o turismo, mas também para o clima.
De uma forma geral, os senhores atingiram um enorme sucesso. É como disse o embaixador: antes do Rio, o Brasil era visto como uma nação que destruía a floresta; depois da Rio 92, isso mudou. E, durante os últimos anos, o desmatamento na Amazônia vai caindo ano após ano. O Brasil criou o seu próprio modelo. Outro dia, eu fui a Jacarta, na Indonésia, e disse: "Se o Brasil pode, vocês podem." Eu fui a Bogotá e disse a mesma coisa lá: "Se o Brasil pode, vocês também podem."
Houve um aumento perturbador no desmatamento na Amazônia. Eu insto os senhores a impedirem que isso continue, porque, se continuar, vai ser muito ruim para reputação do Brasil. E os senhores têm que ser um modelo de como serem verdes, protegendo a floresta ao mesmo tempo. Então, nesta reunião hoje, eu falei com o Presidente para vetar ou para emendar a nova legislação, que está sendo examinada pelo Congresso. É claro que as Nações Unidas não podem decidir pelos senhores, mas insto os senhores a não destruírem a floresta, porque seria ruim para o Brasil, mas também ruim para o mundo.
O Presidente Temer disse que ele reduziu a inflação no Brasil de 10% para 6%; isso é muito importante para o Brasil. Mas ele disse que quer fazer algo semelhante em termos do desmatamento, e a ONU está pronta para dar suporte aos líderes brasileiros para que façam a redução do desmatamento da mesma forma que conseguiram reduzir a inflação. E nós apoiamos uma política nessa linha.
Finalmente, a Conferência do Rio em 1992 foi uma realização gigantesca para a humanidade. É algo que precisa ser continuado, e o principal ponto é entender que todos têm que trabalhar juntos - setor privado, Governo, sociedade civil, em todos os cantos do mundo. Precisamos de uma agenda conjunta para criar empregos, progresso social, cuidando do meio ambiente.
Eu acho que o recém-eleito Presidente da França nos deu este slogan. Ele disse o seguinte: vamos fazer o Planeta grande mais uma vez.
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O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Eu cumprimento o Sr. Erik Solheim e agradeço-lhe pelo privilégio de termos tido aqui essa explanação, que expressa bem o momento que estamos vivendo e os desafios que temos.
Passemos a ouvir a Srª ex-Ministra Izabella Teixeira, minha queria amiga, que traz agora a memória das consequências e dos desdobramentos que tivemos após a Rio 92, a Rio+20, de que ela participou e em que cumpriu um papel tão importante até chegarmos ao acordo do clima em Paris 2015.
Com a palavra, V. Exª, querida amiga Izabella Teixeira.
A SRª IZABELLA MÔNICA VIEIRA TEIXEIRA - Obrigada, Senador Jorge Viana, meu caro amigo.
Quero saudar o Presidente Collor, também um amigo, mais do que um amigo, um companheiro de muitas lutas nesta Casa em torno da Agenda Ambiental e da Agenda de Mudanças do Clima.
Cumprimento todos aqui da Mesa, que são queridos amigos - e é verdade, porque, quando você assume a condição de ex-Ministra, você vem com um passado inteiro como um ativo da sua vida. Então, você passa a conversar de outro jeito e eu vou explicar esta minha frase daqui a pouco.
Meu caro amigo Erik Solheim, hoje na condição de Subsecretário da ONU Meio Ambiente, para mim, você é o Erik, ex-Ministro do Meio Ambiente e um grande amigo, um grande aliado, um dos responsáveis diretos pela aprovação do Protocolo de Nagoya, a terceira perna da Convenção sobre a Diversidade Biológica.
Eu faço aqui um apelo...
Ele foi um aliado - ele não gosta que se fale isso, mas na política você tem que ter aliados o tempo inteiro, inclusive para o dia seguinte - e ele permanentemente se colocou na negociação junto com o Itamaraty, comigo pessoalmente, para que nós pudéssemos ter aquilo que a gente chama de terceira perna da Convenção sobre a Diversidade Biológica aprovado. E assim foi feito em 2010.
E aqui um pedido pessoal, mas eu acho que em nome de todos: que o Congresso brasileiro também ratifique Nagoya. É absolutamente estratégico. Depois que nós aprovamos a nova Lei de Acesso a Recursos Genéticos neste País, não se justifica que o Brasil, país detentor da maior biodiversidade do mundo, não esteja sentado à mesa com os países que ratificaram o Protocolo de Nagoya.
Estou vendo aqui meu amigo e cúmplice, Senador Cristovam Buarque; por favor, seja um agente infiltrado do bem nesta comissão mista que foi criada - e o Senador Collor já é um infiltrado do bem nessa agenda -, para o Brasil poder realmente encerrar, além de Doha, essa pendência que nós trabalhamos tanto para ter.
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Eu estava aqui atentamente ouvindo os meus amigos de Mesa e amigos de vida sobre a história de cada um em relação à Rio 92 e à Convenção do Clima em uma determinada fase da vida de cada um. Se eu for contar todo o meu envolvimento, vou falar desde o início da minha vida profissional. São 32 anos. Então, eu fiquei ouvindo atentamente as colocações dos meus amigos, mas, obviamente, não vou ficar aqui discorrendo sobre minha vida profissional como analista ambiental do Ministério do Meio Ambiente. Mas eu tive a honra ou a sorte de trabalhar na área ambiental no Brasil, como funcionária de carreira do Estado brasileiro, tendo como contexto o legado de uma herança que passa pela Secretaria Especial de Meio Ambiente da Presidência da República, a famosa Sema, que decorre da Conferência de Estocolmo, mas, mais do que isso, avança e ganha robustez com a Conferência Rio 92. Foi essa nova estrutura de governança pública ambiental que o País teve que estabelecer fora, após essa Conferência que trouxe os temas ambientais, na realidade, para uma centralidade dos temas de desenvolvimento.
O que nós estamos falando - e aí a grande marca - é de uma agenda que foi celebrada em 1992, acordada em 1992, mas que pauta o século XXI. É uma agenda do século passado que pautará e continuará pautando este século que vivemos - e é por ela falar de desenvolvimento sustentável e, como o Embaixador Azambuja sinalizou com muita propriedade, por buscar de fato e apontar na direção certa. Ela apontou na direção certa, e não é diferente em relação ao Acordo de Paris ou não foi diferente em relação ao Acordo de Paris, de que eu vou falar brevemente daqui a pouco.
Mas é óbvio que, além do sucesso, além do legado, do fortalecimento do multilateralismo, todos que estão aqui sentados, pelo menos a maioria dos que estão neste plenário hoje, todos passaram pela Rio 92 em alguma condição: ou no Riocentro, com as mangas arregaçadas e trabalhos virando a noite, ou numa militância, diria eu, selvagem porém sustentável, no Aterro do Flamengo. Eu fui aos dois. (Risos.)
Eu sou uma pessoa meio híbrida.
E me lembro... Aqui vou fazer um reconhecimento importante não só sobre o que aconteceu no Fórum Global. Como só eu e a Deputada Bruna Furlan representamos as mulheres nesta Mesa, vou lembrar que foi exatamente nesse fórum que você teve uma iniciativa chamada Planeta Fêmea.
Eu estou olhando aqui... Não sei se o Marcelo Furtado ainda está aqui, mas o pessoal da coalizão... Antes de vocês inventarem a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, nós tínhamos uma coalizão de mulheres, a Coalizão da Mulher Brasileira, que foi responsável - a Ana Ottoni está aqui e sabe disso - por essa mudança de paradigma em relação à agenda da mulher globalmente. Quando se faz o famoso Planeta Fêmea, isso foi liderado pela hoje imortal da Academia Brasileira de Letras Rosiska Darcy de Oliveira, que foi quem convidou, e coordenado por mais quatro mulheres impressionantes, porque... Eu vou fazer aqui uma homenagem a elas. Cabe a mim fazer essa homenagem. São elas a americana Bella Abzug; depois a Maria de Lourdes Pintasilgo, que foi Primeira-Ministra de Portugal - essas pessoas estavam no Planeta Fêmea, soltas no Aterro do Flamengo, ouviu, Presidente? -; a Antoinette Fouque, pela França; e a Wangari Maathai, do Quênia, que depois vira Prêmio Nobel.
Essas mulheres todas andaram seus rumos no mundo, fizeram o que fizeram e continuam fazendo o que têm que fazer, e mais ainda, por uma agenda que, na realidade, era uma visão política de que, se este mundo está do jeito que está, as mulheres precisam ocupar seus espaços.
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Ocupamos. E vamos continuar ocupando, e, daí, vai ONU Mulheres e aí vem toda uma história que decorre do fortalecimento do multilateralismo na agenda do desenvolvimento sustentável. Isso é um legado importante, e, como mulher, eu me sinto na obrigação de fazer lembrança disso aqui.
Há um segundo aspecto, e foi citado aqui pelo Sr. Gylvan Meira Filho junto com o Prof. Goldemberg. Eu me lembro de que, na minha vida profissional, os dois falavam com muita propriedade sobre mudança do clima, mas com o rigor científico de falar sobre mudança do clima. Não havia o achismo do carbono - essa é a grande verdade. Não se pode falar de emissões sem uma robustez de conhecimento técnico-científico, que é um ganho expressivo da Convenção do Clima; de se criar, inclusive, um painel científico, que é o IPCC, que dialoga politicamente com os tomadores de decisão no mundo. Esse é um modelo novo, um modelo que foi criado ali e com grande valia. Quando você vem para o mundo político, como é importante: todos nós esperamos os relatórios do IPCC, e, mais do que isso, hoje nós temos uma mulher, uma brasileira, como Vice-Presidente do IPCC, que é a Drª Thelma Krug, do Inpe. São conquistas que vêm nessa trilha.
Todos nós éramos muito jovens naquela época, mas eu nunca vou me esquecer de quando cheguei a uma conferência em Bonn - se não me engano em 1999 -, o Prof. Gylvan Meira Filho era uma estrela. Ele entrava, Goldemberg, na conferência, e havia mais mídia do que se a Angelina Jolie entrasse aqui. (Risos.)
Ou o Herman Benjamin, porque o Herman, meu querido amigo, está sendo literalmente...
Ele entrava, e tudo acendia em cima dele. Eu nunca me esqueci disso. E eu passava e pensava: gente, que prestígio desse homem! A minha carreira ali... E foi um dos motivadores - ele, o Prof. Goldemberg e tantos outros - que determinaram a mim, também na minha carreira, que eu fosse procurar fazer qualificação profissional, mestrado e doutorado na área de energia, na Coppe. Virei "coppeira".
Está aqui o Emilio La Rovere. Por intermédio dele, eu homenageio uma geração de pesquisadores que se envolveram e que são parte do legado da Rio 92, porque tudo acontece - meio ambiente, desenvolvimento - depois da Rio 92, também nas universidades.
Isso é um passado que nos traz ao presente, mas, mais do que isso, nos remete ao futuro. E há legados importantes: desde a questão de cooperação internacional, de financiamentos; o PPG7; a própria evolução hoje da Unep para assembleia geral, que vem com a Rio+20; a própria questão dos ODS hoje na agenda. Tudo isso deriva de uma discussão, de um legado da Rio 92.
E quanto ao próprio avanço em relação a clima, por mais complexo que seja, absolutamente há avanços, porque nós passamos a falar de uma geopolítica, de uma diplomacia do carbono...
(Soa a campainha.)
A SRª IZABELLA MÔNICA VIEIRA TEIXEIRA - ...e de uma geopolítica sobre desenvolvimento sustentável, sobre mudança do clima, em que o Brasil tem liderança e protagonismo.
Aqui, uma observação importante que eu gostaria de deixar registrada: nada se fez nessa agenda, nada se faz e quero crer que não se fará sem o forte engajamento do Itamaraty, do Ministério das Relações Exteriores e do domínio desse assunto como política de Estado.
Então, há uma visão maior de Brasil, uma visão maior de mundo, em que se tem uma visão de mundo e uma visão de planeta. Cuidado com essas afirmações, e é preciso negociar - mais do que negociar -, naquilo que o Erik colocou aqui, sobre o grande país que somos, não só como país, mas como força política nessa agenda. Isso é fruto, e eu sempre falo isso... Em tudo o que eu pude fazer à frente do Ministério do Meio Ambiente na agenda internacional, eu tive um aliado, um cúmplice, que foi o Ministério das Relações Exteriores. E faço aqui o registro formal dos meus queridos embaixadores, secretários, diplomatas, todos que, na realidade, atuaram nos bastidores e continuam atuando nos bastidores, quer para o fortalecimento da relação bilateral, quer para o fortalecimento da agenda multilateral, agora com o Dr. Guterres à frente da ONU e com a nossa querida Embaixadora Maria Luiza Viotti - também no Gabinete do Dr. Guterres, do Secretário-Geral das Nações Unidas.
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Vejam só, nós estamos presentes em todos esses lugares. A gente ouvia no passado que, se você falasse português em algum lugar, você achava sempre um cearense. Eu quero dizer que você acha sempre um diplomata. Se ele é cearense, eu não sei, mas você vai ter sempre nesses meios um diplomata brasileiro que vai estar buscando... Obviamente, às vezes, a discussão é dificílima, você tem que brigar mesmo, fazer rupturas, porque, às vezes, eles são cabeça-dura, mas a convicção de apontar numa nova direção como país é inequívoca do ponto de vista não só do legado da Rio 92, da Rio+20 e da Convenção do Clima, mas de um forte compromisso de uma política de Estado, que é a política de Relações Exteriores, associada as outras políticas públicas, como a política ambiental, que tem muito que trocar em relação a isso.
(Soa a campainha.)
A SRª IZABELLA MÔNICA VIEIRA TEIXEIRA - Do ponto de vista forma - e aqui eu me dirijo já para a parte final -, eu acho que nós temos talvez três aprendizados importantes desse processo todo que nos afirma esse protagonismo do Brasil e o desafio de continuarmos andando além da crise que nós vivemos hoje.
Ninguém aqui é avestruz, nós temos uma crise política grave no País, mas também temos um país e um povo que consegue se reinventar pela sua grande capacidade de indignação e pela sua diversidade cultural e política de propor soluções. Então, nós temos que olhar para as soluções.
O Acordo de Paris, em última instância, é um acordo voltado para as soluções, para fazer uma ruptura de uma inércia que vinha derivada da baixa implementação do Protocolo de Quioto e do fracasso da negociação do Protocolo de Quioto 2, que leva às chamadas regras de Doha - por isso, o desembarque de tantas nações. E por isso o Brasil propôs, em 2011, que ele topava negociar um novo acordo global. Na Conferência de Durban, o Brasil muda essa posição do ponto de vista diplomático. E aqui o meu reconhecimento e a minha homenagem tanto ao Embaixador Figueiredo quanto ao Embaixador André Corrêa do Lago, que estavam comigo: nós mudamos o parágrafo do meu discurso morninho - era um discurso morninho, como diriam os portugueses -, para falar "o Brasil topa" e ali a gente muda a história, para construir, durante cinco anos, um novo acordo.
Paris é mais que um novo acordo. Paris aponta numa nova direção sobre as alianças globais e os novos formatos de cooperação em relação à agenda de desenvolvimento, à agenda econômica e de inclusão social. O segundo parágrafo do Acordo de Paris fala literalmente "erradicação de pobreza", que era um tema meio complicado em 1992. Todo mundo falava "o pilar social", mas isso você não conseguia integrar. Paris chama isso, e lembro a vocês, se lerem com cuidado, o Acordo de Paris tem referências explícitas a também uma posição política muito avançada que foi assumida pela Igreja, pelo Vaticano, pelo Papa Francisco, quando ele manda, inclusive, um negociador a Paris para fazer os bastidores. O Lucero está aqui, as pessoas todas que estão aqui e se lembram muito bem do debate político, das negociações que envolviam. Mais do que isso, envolveram também...
Aqui um reconhecimento: falou-se tanto do Presidente Trump, mas eu reconheço e concordo plenamente com a capacidade - que o Embaixador Azambuja fala - e com a grandeza da sociedade americana e daquele país de moverem-se. E lembro aqui o papel estratégico do Presidente Obama na construção de Paris, e toda a sua equipe, como o da Chanceler Merkel, o do Presidente da China, enfim, do conjunto de atores do Brasil e do próprio Chanceler Fabius, francês, e do Presidente Hollande, que foram responsáveis - nós fomos responsáveis - por construir esse framework em parceria com tantos outros países.
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E esse desenho, Presidente Collor, definiu para o Brasil relações e acordos bilaterais específicos que precedem Paris. Nós temos agenda bilateral de clima: isso foi uma estratégica política do Brasil; pensar em novos modelos de negócios pensando em novos caminhos para investimento e desenvolvimento, pensando em inovações tecnológicas, e não só com uma visão - e eu vou usar uma palavra - simplista de financiamento. Não é isso, mas uma visão de parceria, desenvolvimento e modelo de negócio e inovação. E isso está firmado com a China, com os Estados Unidos, com a Alemanha e depois com a Noruega, que se revela nessa segunda metade, a partir de 2010, um parceiro estratégico na cooperação internacional na área do meio ambiente - está aqui o representante do BNDES - em relação ao Fundo Amazônia e outras parcerias conosco.
Quero lembrar também que, na trajetória do Pollution-Free Planet, na trajetória da Rio 92, a gente consegue fazer a Convenção de Minamata, a convenção de banimento de mercúrio, numa ação estruturada, lembrando o desastre de 1961. E eu tive a honra de assinar essa convenção em nome do Brasil. Foi conferida a mim a honra de assinar isso. Essa convenção muda completamente - ela é tão inovadora do ponto de vista de combinação e de convergências - o olhar sobre como enfrentar soluções e problemas. Lembro a vocês que toda agenda internacional é uma agenda pautada por convergências. Às vezes as pessoas acham que a ambição é pouca. Quando se junta todo mundo - esta Casa é um bom exemplo - para haver um acordo, às vezes você tem que abrir mão dos seus dez itens para poder fechar em dois ou três que são prioridades, e a agenda anda. Isso é Paris.
Em Paris, como o Prof. Goldemberg lembrou bem, o Brasil construiu uma agenda de que eu me lembro. Eu me recordo de que ele foi um grande parceiro - como também Jorge, como todos outros, como o Ministro Joaquim Levy - no sentido de construir não só com a equipe técnica, com as ONGS ambientalistas, com os especialistas em clima, mas também com as lideranças políticas deste País esse acordo. Nós conversamos com todo mundo nos bastidores. Nós queríamos posições de todos. Os discursos que os senhores faziam aqui eram colecionados. O Miguez está aqui - uma homenagem ao carbono tombado do Brasil -, junto com o Gylvan. E eu mandava contabilizar: "Jogue isso no modelo, tente ver que modelos matemáticos são esses" - para que a gente pudesse construir uma proposta mais robusta não só de protagonismo, mas, de fato, para apontar numa nova direção de desenvolvimento, que é o desenvolvimento de baixo carbono. E foi esse o trilho pelo qual o Brasil optou.
Nós vamos além do desmatamento, do combate ao desmatamento. Eu acho que a questão do desmatamento ilegal é algo que a sociedade brasileira não tolera, como a sociedade brasileira não tolera uma série de outros ilícitos e irregularidades. E eu acho que o nosso momento político mostra isso com toda a veemência. Eu tenho a convicção de que nós seremos capazes de resolver o problema do desmatamento ilegal do Brasil, por todos os avanços que o Brasil tem em relação a isso. Eu não conheço nenhum país do mundo que possa estabelecer instrumentos de controle de uso da terra como nós temos hoje no Brasil.
Obviamente, o uso e o convencimento político pelas demais políticas públicas dos instrumentos de política ambiental, evitando os retrocessos como, infelizmente, ocorrem em alguns momentos - e hoje o Brasil se depara com isso -, não são toleráveis numa agenda que está olhando para o futuro, mas trazendo o futuro para o presente, que é a agenda de mudança do clima.
Isso se deve não só pela questão de emissões, de mitigação, mas também pelas questões de vulnerabilidade, de risco e de adaptação. E isto estará cada vez mais presente: essa incerteza sobre os cenários climáticos. Isso será cada vez mais presente nas nossas escolhas econômicas.
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O Brasil tem uma forte combinação em relação a emissões, no que diz respeito ao uso da terra e à questão energética, sendo que, na questão energética, o País tem a melhor matriz do mundo, do ponto de vista, até hoje, de buscar soluções. Se eu não estiver errada, o Prof. Emílio, que foi meu professor e orientador do doutorado, não vai me reprovar publicamente agora.
Mas, de qualquer maneira, nós temos como avançar mais. E, no uso da terra, nós temos que ir além da questão do desmatamento. Nós temos que, de fato, fazer uma agricultura competitiva, do ponto de vista do baixo carbono. E, para isso, temos que evoluir na ciência, mensurando cientificamente, capturando cientificamente os ganhos das boas práticas de manejo e de uso do solo no Brasil, em termos de seus inventários nacionais, e não ficar inventando regras sobre inventários ou fragilizando instituições técnico-científicas do Governo brasileiro, oficiais, públicas, em nome de coisas que têm uma visão de curto prazo. Isso não cabe mais no Brasil. Isso é backsliding, isso é retrocesso.
(Soa a campainha.)
A SRª IZABELLA MÔNICA VIEIRA TEIXEIRA - E, no meu entendimento, nós temos uma tremenda oportunidade de avançar.
Sei que o Deputado Sirkis está numa grande dedicação ao Fórum Brasileiro de Mudanças do Clima, fórum esse criado - aqui uma homenagem ao meu amigo Deputado Fábio Feldmann - por insistência dele em 2000, 1999 ou 2000, no governo Fernando Henrique, por conta de o Brasil ter uma estratégia mais ampliada de conversa com a ciência e a sociedade civil, e o Presidente da República ter interlocução internacional e usar o seu ativo em interlocução internacional com os vários líderes globais. Assim fez o Presidente Fernando Henrique, por exemplo, negociando com o Presidente Clinton. Os mais antigos se lembram disso, do telefonema, das reuniões, como é que isso acontecia, de favorecimento.
Sei que o Sirkis está debruçado na tarefa - é um dos que está debruçado na tarefa - de visão de implementação da NDC do Brasil e seus financiamentos, seus novos caminhos. Acho que devemos ir além disso. A visão de financiamento, de inovação, na realidade é uma visão que tem que estar inserida numa questão mais abrangente, de natureza política, em que o Brasil sairá desta crise - e eu tenho certeza de que ele sairá desta crise, que eu chamo de um "fog" que está sobre nós -, mais forte, assumindo a questão de baixo carbono como uma rota de desenvolvimento.
Nós não somos um país... Eu não conheço nenhum país no mundo que renuncie ao desenvolvimento. Mas conheço países que podem e devem - e talvez o maior potencial, com as maiores condições, nos próximos 30 anos, seja o Brasil afirmar, como o Erik sinalizou, internacionalmente que a agenda de baixo carbono veio para ficar. Nós temos condições de fazer isso. Talvez o único país no mundo em desenvolvimento que tenha condições de fazê-lo num curto espaço de tempo. Obviamente que custa dinheiro, mas desenvolvimento custa dinheiro.
Mais do que isso, eu acho que o Brasil tem, além disso, o dever...
(Soa a campainha.)
A SRª IZABELLA MÔNICA VIEIRA TEIXEIRA - ... dentro do seu protagonismo político, de ir em torno de três coisas que sempre foram uma marca do nosso País: a nossa capacidade de diálogo, a nossa credibilidade com entregas - e o senhor sabe disso, como chefe de Estado que foi, como é importante ter credibilidade. O mundo não tolera mais diz que me diz ou historinhas, ou questões alternativas, porque hoje, com a transparência, com tudo o que está colocado aí e com a força da sociedade civil e do setor privado, que é outra consequência importante da Rio 92... - e, finalmente, o firme compromisso de não retrocesso. Não cabe mais retrocesso. O Brasil tem que procurar soluções daqui para a frente.
Então, eu acho que, quando nós temos a capacidade de convergir com essas três questões, com uma visão comum, inovadora de País, de País líder, que olha para a sociedade, para o seu território, um País continental, um País ainda com muitas assimetrias regionais e sociais, muito intensas, mas com um povo excepcional, e um povo com uma capacidade criativa, inventiva, de convergir para soluções... Eu tenho certeza de que nós, ao rompermos essa crise, estaremos fazendo a diferença no mundo. Já estamos fazendo.
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Hoje o Brasil talvez seja o país, no mundo, por tudo o que eu leio na imprensa internacional - e acabei de voltar do exterior -, que faz o maior esforço de combate global sobre corrupção. Não existe um país que esteja fazendo isso. E é absolutamente importante que a gente o faça, porque as novas gerações - não é, Prof. Goldemberg? E eu vejo aqui a Deputada Bruna, que é a nova geração, literalmente - exigem isso de nós. E nós temos que mostrar esses novos caminhos, esses novos caminhos de fazer política, esses novos caminhos de liderar, com base, efetivamente, na capacidade de um país colocar a questão de baixo carbono como um dos alicerces da sua economia, do seu desenvolvimento e de inclusão social.
Acho que a responsabilidade daqueles que fizeram a Rio 92 - alguns deles falaram aqui - e daqueles que fizeram a Rio+20 mostra para a gente...
(Soa a campainha.)
A SRª IZABELLA MÔNICA VIEIRA TEIXEIRA - ... que o Brasil pode fazer mais. E eu tenho a firme convicção de que ele o fará.
Só tenho um último apelo: por favor, Presidente Temer, não faça retrocesso na área ambiental. O custo é imediato. E mais do que isso: as soluções não existem. Nós iremos continuar punindo os que não precisam ser punidos, exatamente o elo mais fraco da cadeia, que não é a área ambiental. São aqueles que têm a ilusão de achar que uma solução de desafetação de unidade de conservação, de conflito, que viabiliza, muitas vezes, a ilegalidade e o crime ambiental, isso vai levar a soluções estruturantes de desenvolvimento de um País que é muito além disso. Vamos buscar soluções para esse povo, tendo a área ambiental como aliada. Isso é de uma miopia política que não cabe mais no Brasil e não é da grandeza do País. Eu tenho orgulho de ser brasileira.
Então, muito obrigada a todos por esta homenagem à conferência. Eu me sinto tombada pelo patrimônio do desenvolvimento sustentável. Estou, inclusive, deixando meus cabelos brancos, para ficar na reta aqui da mesa - todo mundo absolutamente grisalho. Mas, mais do que isso, eu quero dizer o seguinte: nós estamos todos vivos, the elders and the Kids, lutando por um Brasil mais justo e por sociedades mais justas no Planeta. Eu tenho absoluta certeza de que retrocessos, como se vê com o Presidente Trump e outros retrocessos, mesmo aqui no Brasil, não sobreviverão, não permanecerão. E nós teremos que lutar e continuar lutando para mostrar que este País faz a diferença para o bem e para aquilo que, de fato, traga um País mais justo, mais inclusivo, mais sustentável e, diria eu, cada vez mais alegre, porque somos, antes de tudo, um povo feliz e alegre.
Obrigada a todos. E parabéns a todos que me antecederam. Obrigada pelo legado que vocês me entregaram, como funcionária pública e brasileira. Mas mais do que isso: eu espero que a nossa luta em relação à clima, à biodiversidade, etc. continue. E contem comigo, com essa cumplicidade.
Erik, muito obrigada pela sua parceria com Nagoia. Foi um complô. Nós nos emocionamos muito, quando nós tomamos a decisão e conquistamos Nagoia, mas eu te agradeço também o fato de você estar à frente da Unep, do PNUMA, fazendo essas transformações todas na agenda global, porque é importante para o Brasil seguir essa trilha e ter mais ambição em relação ao desenvolvimento mais sustentável, mais inclusivo e, mais do que isso, mais permanente. O Brasil também não aguenta mais esse vai e volta. Temos que ir para os nossos ganhos. E contem com os velhinhos, em que me incluo, se assim são chamados.
Eu já virei referência, Presidente. É de 2010 a 2016. Eu já sou uma nota bibliográfica. Mas, enfim, isso são os novos achados.
E acho que Paris veio para ficar. Paris não terá retrocesso. Paris terá nova geopolítica de carbono. Está aqui o gaúcho. Estamos trabalhando no setor privado, no setor de financiamento, no setor público, buscando esses novos arranjos da geopolítica do carbono, como eu gosto de falar, das novas parcerias. E a sociedade americana vem junto. Há aqui representantes da Embaixada Americana. Se o Presidente americano resolveu tratar dele de uma maneira, ele escolheu o passado; a sociedade americana está escolhendo o futuro. Eu tenho convicção sobre isso.
Obrigada a todos. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) - Eu queria muito agradecer à Ministra Izabella Teixeira pelo depoimento que deu aqui, pela forma como sempre fala, pondo sentimento.
E eu devolvo a presidência dos trabalhos - já vamos encaminhar para o encerramento - ao Senador Presidente da Comissão de Relações Exteriores, Fernando Collor de Mello.
(O Sr. Jorge Viana deixa a cadeira da Presidência, que é ocupada pelo Sr. Fernando Collor.)
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Tenho a honra de passar a palavra a S. Exª, o Senador Jorge Viana.
O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Eu espero - não é uma promessa, é um compromisso - ser o mais breve possível.
Eu queria muito agradecer o privilégio de ter, de alguma maneira, colaborado para que esta sessão possa estar ocorrendo. E não imaginava o prestígio que temos aqui, de tantas pessoas que, nas suas organizações, nas suas atividades profissionais, se dedicam a esta causa que nos tem a todos; e ter vivenciado aqui esse histórico, numa hora em que o Brasil é tão questionado e até, de certa forma, diminuído, e em que a autoestima da sociedade decai também. Acho que esse apanhado que fizemos de 25 anos do papel do Brasil nessa questão que é tão pessoal e tão global nos ajuda a todos a ter fé, esperança de que não há problema que não possa ser superado por esta Nação, pelo nosso povo.
Eu saio daqui melhor que cheguei, com a responsabilidade maior, mas também com mais esperança, ouvindo o Sr. Erik e todos os que trabalharam na difícil missão de fazer do Brasil um endereço para uma causa global.
O Presidente Collor fez uma fala aqui histórica, porque coube a ele, como Presidente, cumprir a missão de trazer os maiores líderes do mundo. O episódio do esforço, das ameaças que ele fez - desculpe-me, Presidente - para que o Presidente dos Estados Unidos pudesse estar presente aqui foi algo fantástico. Deixou fora a diplomacia, tão elogiada pela Ministra Izabella, e fez ameaça de suspender a conferência, fazer uma manifestação na frente da Casa Branca, fazer telefonemas...
E hoje é dia 12 de junho. Hoje é o dia do aniversário do George Bush pai. Eu estou lembrando porque outro dia, na Comissão de Relações Exteriores, lembrava isso. Ele não vinha. Houve um esforço para ele vir. Imaginem aquela conferência sem os Estados Unidos, naquela época. E ele veio, passou o aniversário dele aqui no Brasil, porque era assim que a história exigia, era assim que esta causa tão fantástica exigia.
Mas houve um esforço pessoal do então Presidente Fernando Collor, um complô do bem. E o ponto mais crucial ali - ali havia um divisor de água -: será uma conferência global, que muda a agenda do Planeta ou não? Sem os Estados Unidos, certamente não seria, por mais esforço que tivéssemos tido. É bom que se diga.
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Então, o Brasil sediou dois eventos fundamentais: a Rio 92 e a Rio+20. E cumpriu, à altura desses dois eventos, um papel de protagonista no Acordo de Paris. Lembro o Figueiredo, lembro o Corrêa do Lago, que prepararam o terreno, o Embaixador Marcondes, e, obviamente, a Ministra Izabella. Mas não posso deixar de lembrar também o ex-Presidente Lula, que foi sensível à Rio+20, e a Presidente Dilma, que deu as condições para que o Brasil pudesse fazer a negociação do Acordo de 2015, o Acordo de Paris. Então, são eventos que fazem parte da história, mas que estão muito presentes na nossa agenda do dia a dia.
Estamos vivendo uma crise econômica, política e também institucional sem precedentes. Neste momento, parte daquilo que compõe a agenda que fundamenta a busca de uma economia de baixo carbono corre risco na Câmara e no Senado, com medidas que, talvez se aproveitando desses desencontros que estamos vendo na economia, na política e até nas instituições, alguns tentam fazer passar, propostas que diminuem o prestígio do País e põem em risco as conquistas que tivemos até aqui. Está-se mexendo na estrutura fundiária, urbana e rural do País, de maneira nada responsável, do meu ponto de vista. Está-se mexendo na integridade de unidade de conservação neste País. Está-se mexendo naquilo que o Brasil ganhou respeito no mundo, que é a demarcação de áreas indígenas, o cuidado com essas populações originárias.
Eu venho do Acre. Tenho relação de amizade com esses povos. Temos um trabalho feito nessa área. Sou formado em Engenharia Florestal, na época aí do Prof. Reitor Cristovam. Mas não foi na UnB que eu aprendi e fui ganho para a causa; foi na convivência com Chico Mendes, com os seringueiros, com os índios, com pessoas simples do nosso povo. Foi com eles que ganhei uma formação e assumi compromisso de vida, como muitos aqui. Muitos pesquisadores, cientistas e professores só se entregaram à causa quando se encontraram com o mundo real, onde ela se reflete.
Ano que vem, nós vamos ter 30 anos sem Chico Mendes. Ideias de uma pessoa simples, que resolveu pensar o ambiente, o Planeta, para se defender de problemas absolutamente locais, de sobrevivência local. Ele deu essa dimensão. E acho que o Brasil também fez isso. Nós já fomos marcados por sermos um País que mais destruía, queimava florestas e fazia emissões de carbono. Nós já ficamos marcados por isso. Mas também, mais recentemente, ficamos marcados por ser o País que maior redução de emissões fez e que aumentou suas propostas voluntárias de redução de emissões, que agora, de certa forma, se essa agenda atrasada... Não chamo de conservadora; se fosse conservadora eu até entenderia que poderia ser boa. Mas uma agenda atrasada põe em risco, inclusive, esse prestígio que o Brasil adquiriu. Tomara que o atual Governo consiga - como nós da sociedade estamos procurando fazer - ter uma agenda que passe, que atravesse a crise que estamos vivendo, que é essa agenda do clima, que é essa agenda da busca de uma economia de baixo carbono, que o Governo faça isso, que não reduza os recursos da Funai de R$9 milhões por mês para R$3 milhões por mês - a repercussão que um descaso com as populações indígenas pode dar negativamente para o Brasil é enorme, é exponencial - e que se consiga, de alguma maneira, fazer com que o Brasil siga esses ensinamentos feitos pelos mestres que negociaram, que realizaram, que materializaram a Conferência da Terra, em 1992, no Rio de Janeiro.
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Eu queria concluir fazendo um chamamento. Aqui sugiram algumas ideias: qual é a agenda - e aqui falo para o Syrkis, que tem feito um trabalho importante no Fórum, junto com tantos que estão aqui - que um país que acumulou em 25 anos essa história, esse legado, tem pela frente, na hora em que o governo Trump assume essa posição tão atrasada, que tenta levar os Estados Unidos para o século passado? Qual é a agenda do nosso País?
Prof. Cristovam é um dos grandes Senadores desta Casa. Eu aprendi, professor, com um outro mestre de gestão, que ser ético tem vários conceitos, mas ser ético é trabalhar pelo bem comum. Eu acho que a causa comum que nós temos hoje na humanidade, no Planeta, é cuidar dele. Cuidando deste Planeta, vamos estar combatendo a pobreza, a miséria, a exclusão. Cuidando do Planeta, vamos estar pensando na convivência com ele, de maneira harmônica.
As gerações futuras não estão aqui para reclamar seus direitos. Eu tenho uma netinha de 2 anos e meio. Ela não pode reclamar por um País, por um mundo igual ao meu ou melhor do que este em que eu estou vivendo. Nós temos que, de algum jeito, fazer isso por elas, porque ainda não nasceram. Eu acho que isto é ser ético também: trabalhar pelo bem comum. E acho que este País, que sediou eventos tão importantes, que podem ser chamados de eventos éticos do ponto de vista planetário, tem que seguir com essa agenda.
Eu não posso aceitar, Sr. Presidente, viver na Amazônia. Temos 25 milhões de pessoas. Foi na Amazônia que se materializou a respeitabilidade ao nosso País, por conta da redução das emissões. Foi lá que aconteceu a redução do desmatamento. Era lá que aconteciam o desmatamento e as queimadas, mas foi lá que aconteceu a redução. Mas o nosso povo não pode viver na região mais rica do Planeta e passar fome, ter sede, mesmo tendo 12% da água doce do Planeta, por falta de políticas públicas que incluam as pessoas, que vejam a floresta como ativo econômico, não como uma maldição. Nós temos 20% da biodiversidade do Planeta.
Eu conversava com a Ministra Izabella, na época do Código Florestal. Eu falei: mas, gente, é tanta ação contra estabelecermos regras de boa convivência homem-natureza, de uso do solo, que parece que até é uma maldição ser brasileiro ou o Brasil ter tanta biodiversidade, ter os biomas que tem. E não é nada disso; é uma vantagem comparativa, que nos diferencia diante do mundo.
Já ajudamos a criar fundamentos que são a base de uma economia moderna, do século XXI, do novo milênio, que é a economia de baixo carbono. Eu estou seguro de que o governo Trump vai fracassar, não porque vai haver uma reação dos outros países, mas porque a reação está vindo da sociedade americana, das empresas, das companhias, dos governadores, dos prefeitos.
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É ali que ele vai fracassar, porque ele não está querendo gerar mais emprego; ele está querendo diminuir emprego, porque a economia de baixo carbono é algo do presente e do futuro, sem volta. O que não tem mais volta é aquilo que ele está tentando pregar.
Então, eu torço para que o Brasil, o quanto antes supere essa crise terrível, que nos envergonha a todos. Falei desta tribuna outro dia. Falei que, quem sabe, não estava chegando a hora de nós, da classe política, fazermos uma espécie de pedido de desculpa coletivo para o País. Não é por nada, porque somos todos criminosos, de jeito nenhum. Criminoso é apontar o dedo e chamar todos os que estão na atividade política da mesma coisa. Não; nós temos, talvez, omissão de um lado, conivência de outro, acomodação de um outro lado, mas nós precisamos acreditar neste País, superar isso, porque o Brasil é importante para nós, mas ele também é importante para o mundo.
Então, eu estou muito honrado por, de alguma maneira, ter com o Presidente Fernando Collor, realizado - porque foram as duas comissões, de que o Senhor é Presidente e eu também - mais esta conferência aqui. Esse olhar do passado, das dificuldades superadas com a Rio 92 e a Rio+20, fazem-me ter certeza e convicção de que nós vamos, sim, ser protagonistas da implementação do Acordo de Paris e da agenda que o mundo vai precisar viver nos próximos 25 anos, para que, quem sabe, estejamos aqui alguns, ou, se possível, quase todos, lembrando que o Brasil segue ajudando o Planeta a seguir firme por uma economia sustentável, por uma convivência harmoniosa dos 7 bilhões que ocupam este planeta e os seus recursos naturais, que são tão fantásticos e que fazem a Terra ser sinônimo de vida.
Muito obrigado, Sr. Presidente, pela oportunidade. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Cumprimentando S. Exª, o Senador Jorge Viana, autor da proposta para a realização desta sessão, pelo seu pronunciamento, tenho a satisfação de passar a palavra para o Deputado Alfredo Syrkis.
O SR. ALFREDO HÉLIO SYRKIS - Presidente Fernando Collor, demais integrantes da Mesa, eu me lembro: era o ano de 1990, a ONU tinha decidido que a conferência seria no Brasil, e uma pequeníssima delegação de aficionados cariocas, da qual faziam parte o Fernando Gabeira, o Fernando César Mesquita e eu, fomos visitar o Presidente Fernando Collor, no Palácio do Planalto, para lhe pedir que a conferência fosse feita no Rio de Janeiro. Havia outras cidades brasileiras na disputa. Eu, até hoje, não sei até que ponto aquela conversa teve algum efeito, mas o fato é que a Rio 92 foi Rio 92.
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Aquilo foi, verdadeiramente, um momento admirável. Primeiro, uma concentração de chefes de Estado como nunca foi vista - não só no Brasil, como raríssimas vezes em outros países foi vista. Nós tivemos George Bush pai; tivemos François Mitterrand, Presidente da França; Helmut Kohl, Chanceler da Alemanha; John Major, Primeiro-Ministro do Reino Unido; Fidel Castro. Tivemos mais de cem chefes de Estado e os olhos do mundo voltados para o Rio de Janeiro.
Aquilo foi a primeira vez em que a humanidade, de forma coletiva e multilateral, se dotou de meios para enfrentar aquilo que vinha sendo chamado, desde o século XIX, por Fourier, por Arrhenius e por outros cientistas pioneiros de efeito estufa; passou, depois, a ser chamado de aquecimento global; e, hoje, pelos efeitos muito mais abrangentes, nós chamamos de mudanças climáticas.
Então, até o Rio de Janeiro, era uma denúncia científica, uma preocupação dos verdes, do movimento ambientalista e de alguns governantes mais avançados. Depois do Rio de Janeiro, passou a ser uma ação coletiva, uma ação multilateral e, verdadeiramente, uma ação que passou a transcender as forças políticas.
Um dos setores que mais se transformou com a Rio 92 foi o setor empresarial. Eu me lembro das discussões que eu tinha com empresários brasileiros, no final dos anos 80, em que se dizia: "Não, isso aí nós temos que esperar. Isso aí é coisa para os suecos, para os dinamarqueses, para os noruegueses, para os americanos, para os franceses, mas nós aqui temos fome, temos miséria; precisamos nos desenvolver antes", que, aliás, é um discurso parecido com o discurso que boa parte da esquerda tinha naquela época também.
E aí, muito por força do trabalho incansável de formiguinha de um homem verdadeiramente extraordinário, Maurice Strong, a expressão "desenvolvimento sustentável" passou a circular e passou a ser aceita cada vez mais.
Então, eu notei, à saída da Rio 92, aqui, no Brasil, uma mudança de posicionamento, de um lado, por parte da mídia - que antes nos tratava de pessoas exóticas, "ecochatos", gente que era contra o desenvolvimento -, que passou a pautar o assunto como um assunto importante no próprio setor empresarial.
Eu, à época, era vereador da cidade do Rio de Janeiro, meu primeiro mandato, e dei uma contribuição, que foi a aprovação da chamada Lei Syrkis, que foi uma lei de incentivos fiscais para projetos ambientais e culturais, que, como sempre acontece, contou com uma feroz hostilidade da Secretaria Municipal de Fazenda. Aí eu consegui negociar com meu amigo, então Prefeito, Marcello Alencar, que essa lei vigeria apenas por um ano, por um único ano, o ano de 1992. Essa lei propiciou que o Fórum Global 92 pudesse fazer o seu trabalho de arrecadação e se viabilizar no Aterro do Flamengo. Então, foi algo de que eu me lembro com muito carinho.
De lá para cá, foi criado um sistema de governança internacional em torno da questão climática, que é corporificado pela Convenção-Quadro sobre Mudanças Climáticas da ONU (a UNFCCC, como se diz em inglês), e as conferências anuais, as COPs anuais - em geral, em novembro ou em dezembro -, que estabelecem um consenso de hoje, 196 países, para poder avançar.
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O resultado mais importante desse processo é o Acordo de Paris. O Acordo de Paris é imperfeito, mas estabelece mecanismos para o seu próprio aperfeiçoamento.
Costumo dizer que, se todas as NDCs fossem ser rigorosamente, religiosamente cumpridas, ainda assim chegaremos ao ano de 2030 com uma sobra de 12 giga de emissões e uma trajetória de mais de três graus, o que é inaceitável e seria verdadeiramente catastrófico. Mas o Acordo de Paris estabelece o processo de revisão para a maior ambição nas NDCs. E eu defendo fortemente que o Brasil propugne que esse processo deve começar em 2020, e não em 2025.
O acordo fala um pouco das duas coisas - ele tem uma ambiguidade construtiva -, mas existe margem para que o Brasil defenda essa posição e para que nós mesmos apresentemos, em 2020, uma NDC um pouco mais avançada. Aí temos que discutir se, de novo, será incondicional ou não.
A recente decisão do Presidente Trump de sair do Acordo de Paris - e aqui cabe notar que essa saída se dá dentro de quatro anos, justamente no próximo ano eleitoral americano, que é 2020; esperemos que com resultado diferente -, de fato, prejudica o esforço de mobilização internacional, sobretudo pelo mau exemplo e por eventual estímulo a outros governos, a outras forças políticas retrógradas, para recuar no tempo. Mas, por outro lado, eu confio nos Estados Unidos, como aqui já foi dito, um grande país onde existe já um clima de mobilização, não só da sociedade civil, mas dos estados; estados que juntos representam a quinta economia mundial.
Eu brincava aqui com o representante da embaixada americana, que já não está mais neste plenário, que é o UDSA ("United Decarbonizing States of America"). Então, a Califórnia, Nova York, o Estado de Washington, Illinois, outros Estados, junto com centenas de cidades americanas estão se juntando e dizendo: "Não, nós iremos cumprir a NDC norte-americana; nós iremos cumprir o Acordo de Paris."
Então, eu penso que são tempos novos, que nós devemos, ao mesmo tempo, estimular uma diplomacia que é feita hoje não só com governos nacionais, mas, como atesta a recente reunião do Governador Jerry Brown, da Califórnia, com Xi Jinping, da China, é necessário se pular determinados obstáculos, determinados atrasos de vida, como esse Presidente dos Estados Unidos, para estabelecer relações com aqueles agentes que importam na descarbonização.
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Eu vou ressaltar uma coisa que considero muito interessante: nos últimos dois anos, houve um crescimento do PIB mundial de mais de 3%. E, pela primeira vez, desde que se começou a prestar atenção nisso, as emissões não acompanharam a curva do PIB. As emissões globais, pelo menos as de energia, mantiveram-se mais ou menos estáveis, até com pequeníssimo decréscimo. Se essa tendência persistir, ela indica que de fato teremos chegado ao pico de emissões antes daquilo que era imaginado. Isso é uma das raras boas notícias que nós recebemos no front climático, que em geral abunda de más notícias.
Esse é um dado interessante. Isso foi feito quando as INDCs ainda não estavam em processo de execução. Isso não foi previsto no Acordo de Paris, mas a economia real de países como os Estados Unidos e a China parou de queimar a mesma quantidade de carvão que queimava anteriormente. No caso da China, houve uma grande queda na queima de carvão nos últimos dois anos e nos Estados Unidos, também, por razões diferentes. São processos que acontecem na economia real.
Então, é importante criarem-se mecanismos que transcendam os governos nacionais, que continuam importantíssimos no processo, da mesma forma que o processo das COP, mas é necessário, no âmbito da economia, no âmbito do contato com os governos subnacionais, no âmbito da mobilização da sociedade civil, no âmbito da articulação para novas formas de financiamento da descarbonização, ser inventivos, ter imaginação e ir além.
Uma última palavra, é necessário fazer o respectivo dever de casa. E aqui, nesta própria Casa onde estamos, Casa legislativa, têm-se urdido retrocessos assustadores. Ameaça sobre a floresta do Jamanxim, que está inserida em duas medidas provisórias que foram adulteradas no seu conteúdo aqui neste Senado. É gravíssimo! E hoje mesmo, durante a reunião do Fórum de Mudanças Climáticas com o Presidente da República, foi solicitado ao Presidente que vete essas medidas provisórias tenebrosas e funestas.
Espero que assim seja feito. Esse é o nosso dever dentro do Fórum.
O Fórum serve ao Estado brasileiro, serve a uma linha histórica que começa com o Presidente Fernando Henrique, prossegue com o Presidente Lula, prossegue com a Presidente Dilma, esperamos que prossiga agora e continuará com quem vier mais à frente. É o Estado brasileiro, não é este ou aquele governo.
Em relação aos governos, todos eles em algum momento foram suscetíveis de críticas e todos eles devem ser estimulados a fazer a coisa certa. Essa foi a minha postura em relação ao governo do Presidente Fernando Henrique, ao governo do Presidente Lula, ao governo da Presidente Dilma - e a Izabella é uma boa testemunha disso -, ao atual Governo e ao governo que virá.
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Nós temos que ter, ao mesmo tempo, a plena liberdade de criticar, mas a capacidade de oferecer, a cada momento, alternativas: "Olha só, essa é a coisa certa. Faça isso, porque você estará fazendo em seu próprio bem, você estará fazendo a bem do povo brasileiro, você estará fazendo a bem do Planeta".
Então, penso que hoje é um dia extremamente importante. É quando comemoramos aqui as bodas de prata da humanidade com a Convenção do Clima e com uma conferência pioneira, que foi a Rio 92, que inclusive produziu outros documentos históricos, como a Agenda 21, a Convenção da Desertificação, abrindo caminho para que rapidamente fosse assinada, meses depois, a Convenção da Biodiversidade.
Hoje é um dia extremamente importante. A cidade do Rio de Janeiro, no dia de amanhã, por iniciativa nossa, do Centro Brasil no Clima, do Instituto Onda Azul e de uma série de outras associações, vai comemorar a Conferência Rio 92. Vamos debater a importância que ela teve e também as questões futuras, como a questão da governança climática no Brasil, a questão da ciência e tecnologia, a questão do financiamento da transição para economias de baixo carbono. Tudo isso estará na nossa agenda com convidados internacionais importantes, com o apoio - gostaria de ressaltar e agradecer - da Embaixada da França, porque a França, nesse momento, ocupa um papel importantíssimo. A partir do posicionamento do Presidente Macron abriu-se claramente um processo de mobilização entre vários países.
Então, nós temos de estar unidos aos países que se mobilizam em defesa do Acordo de Paris, firmes no nosso posicionamento, inventivos nas soluções que propomos. E assim seremos dignos da Rio 92.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Nossos cumprimentos ao Deputado Alfredo Sirkis.
Convido para fazer uso da palavra o Sr. Virgílio Viana, pela coalizão das entidades da sociedade civil.
O SR. VIRGÍLIO MAURÍCIO VIANA - Sr. Presidente Collor, Senador Jorge Viana e todas as autoridades que estão aqui na Mesa, é um prazer ter esse privilégio de falar em nome de uma grande coalizão que aqui está representada por diversos membros.
Diria que talvez nós tenhamos grandes motivos para comemorar o dia de hoje, que foram muito bem elencados pela Mesa que antecedeu a esta fala. Mas nós temos também grandes motivos para sairmos da sessão preocupados. Nós não podemos deixar de fazer menção à grave crise política em que vivemos. Não digo isso apenas com relação à Lava Jato e a todos os problemas que o Brasil vive, mas à crise de representatividade.
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Uma coisa muito interessante na época do Código Florestal foi que todas as pesquisas de opinião mostravam que a sociedade brasileira tinha posições em prol da conservação das florestas, enquanto o Congresso Nacional se posicionou de forma contrária. Vejo o debate das MPs hoje da mesma forma. O Congresso brasileiro não representa a sociedade brasileira no que diz respeito à redução das Unidades de Conservação na Amazônia. Então, eu acho que essa é uma crise seríssima. Nós temos, sim, que refletir muito sobre isso, nesse momento em que comemoramos os 25 anos da Rio 92. É um momento em que eu vejo um descolamento da representação formal no nosso Parlamento em relação à sociedade.
Do ponto de vista objetivo, nós temos uma agenda seríssima com relação à Amazônia, e essa agenda, meu querido professor Goldemberg, nos impõe uma mudança de paradigmas. Durante muito tempo nós falamos em conservar a Amazônia com um olhar muito polarizado pela agenda internacional, mas hoje a ciência, pelos nossos colegas professores da USP, do INPA, de tantas outras instituições de pesquisa nos mostram que a Amazônia é essencial para a segurança hídrica brasileira. O regime hidrológico que abastece as chuvas de Brasília e os reservatórios que geram a energia elétrica brasileira depende da Amazônia funcionando como uma grande bomba d'água, ou seja, é essencial para o interesse nacional, é essencial para o agronegócio manter a chuva, porque sem a chuva não existem lavouras.
Isso nos impõe uma mudança profunda de paradigmas. E uma dessas mudanças, como nós temos debatido com os colegas do Itamaraty - o Marcondes aqui presente -, é a mudança de paradigmas com relação aos offsets. O Brasil defende uma posição anacrônica, que é apenas os offsets para aterros sanitários, para projetos de MDL, e não para florestas. E esse é um tema que a coalizão tem debatido muito, que nós acreditamos que deva ser parte de uma nova agenda, uma agenda contemporânea, capaz de fazer com que as florestas da Amazônia tenham mais valor.
O Senador Jorge Viana tem sido um grande defensor dessa agenda de valorizar a floresta em pé, valorizar os serviços ambientais da floresta em pé. E não é só o carbono. É também o papel da floresta como essa bomba biológica de água que abastece o resto do Brasil e o manancial de biodiversidade que temos.
Então, essa valorização da Amazônia é essencial, e isso deve ser feito a partir de nós, brasileiros. Nós temos a inteligência, nós temos a competência e os recursos financeiros para isso, ainda que a cooperação internacional seja essencial, seja importante. Nós temos que fazer isso não só pensando na Amazônia brasileira; pensando também nos 40% que estão nos países vizinhos onde nascem os rios brasileiros, inclusive o Rio Amazonas.
Aproveito para fazer uma manifestação importante para a nossa diplomacia: nós temos que nos irmanar ao Peru, porque a nascente do Rio Amazonas que está no Peru, a 5 mil metros de altitude, ainda não é uma área protegida. E ela deveria ser uma área protegida a partir de um movimento internacional, ou binacional, entre o Brasil e o Peru, porque até hoje a nascente do Rio Amazonas, talvez o lugar mais simbólico do mundo, não tenha ainda sido objeto da proteção que merece.
Com isso eu queria agradecer a todos e dizer que o Marcelo Furtado representa, como regra, a nossa coalizão, que envolve um número grande não apenas de instituições ambientalistas, mas também de grandes empresas do setor do agronegócio, de acadêmicos importantes e de vários outros segmentos da sociedade brasileira que têm produzido uma contribuição relevante para esse debate do clima.
Muito obrigado. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Grato ao senhor Virgílio Viana, que falou pela coalização das entidades da sociedade civil.
Como último orador inscrito, passo a palavra a S. Exª o Senador Cristovam Buarque.
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Uma boa tarde a cada uma e a cada um.
Sr. Presidente, senhores que compõem esta Mesa, vou querer guardar uma foto, porque há muito tempo eu não vejo uma mesa tão respeitável neste Senado, não pelos cabelos brancos, meus caros, mas pelo conteúdo de ideias propostas e de lutas que vocês têm tido.
Nós estamos aqui e de todo se falou muito sobre 1992, mas eu creio que a gente ainda não tem a dimensão exata do que aconteceu a partir de 72.
Meu caro Goldemberg, você foi um dos que pela primeira vez ouvi falar nisso através do Prof. Sachs. Eu tenho a impressão de que o mundo nasceu em 72, no sentido do mundo de hoje. Ele tinha nascido - eu falo das ideias do mundo - com o Renascimento.
O Renascimento trouxe uma visão de mundo que prevalece, mas foi 72 que permitiu descobrirmos coisas como o limite ao crescimento econômico. É claro que alguns intelectuais teóricos, o próprio Clube de Roma, já haviam trabalhado essa ideia, mas não era uma descoberta geral, como alguns desde a Grécia, diziam que a Terra era redonda. O mundo só descobriu que a Terra era redonda muito recentemente, depois das descobertas e da circunavegação.
Foi a partir de 72 que se espalhou pelo mundo a ideia de que havia limites ao crescimento, que havia risco de esgotamento de recursos, que havia uma fragilidade ou até impossibilidade de o consumo satisfazer as aspirações humanas plenamente. Descobrimos que o desenvolvimento não reduzia necessariamente a desigualdade nem eliminava a pobreza, porque se acreditava, a partir dos anos 60, pelo menos nisso.
Então, foi ali que os políticos participaram, representando os seus países, e de fato levantaram essa ideia. Em 92, ficou mais clara ainda essa posição política. Talvez, Jorge, lembrando o que você disse aqui - e ontem nos telefonamos e você me falou disso -, precisamos pedir desculpas ao povo brasileiro pelos nossos erros. Em 92 e em 72, os líderes do mundo começaram a pedir desculpas sobre o rumo do processo civilizatório inviável, insustentável.
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Em 1992 e 2012 - eu creio que o mundo havia sido criado dessa maneira como nós o vemos -, nós fizemos duas grandes reciclagens, Presidente Collor, e o Brasil deixa o seu nome na história da humanidade a partir disso. Nós participamos, nós estivemos presentes e nós mostramos que houve uma tomada de consciência. Mas, lamentavelmente, ainda há um descompasso entre a consciência do problema e a mentalidade que formula as propostas. Não estamos casando. Não estamos casando a consciência do limite ao crescimento com a mentalidade de abrir mão do crescimento. Não conseguimos ainda casar. E o Trump, no fundo, é resultado isso. Ele se elegeu porque a consciência ecológica não chega à casa de cada um.
Nós fazemos política de uma maneira, Presidente Collor, que, a meu ver, hoje não responde às necessidades de um mundo que ficou global e de longo prazo, quando se ganha o voto com propostas para o imediato e para o seu redor. Há uma incompatibilidade, Goldemberg, entre fazer política, tendo votos, e pensar o mundo, como nós tentamos aqui. Esses discursos nossos não dão votos, a não ser de um pequeno grupo da tribo ecologista, da tribo verde. Mas quem está desempregado quer emprego; quem está com baixa renda quer alta renda. O discurso de que não dá para ter automóveis e de que eles não levam ao bem-estar é verdadeiro, mas não é eleitoralmente positivo.
Por isso - eu não quero perder tempo, até porque sou o último, nem tomar o de vocês -, eu queria dizer que, para mim, minha querida Ministra, o que de fato fica hoje, além da consciência, são algumas perguntas ou muitas perguntas que não vai dar tempo de fazer aqui. Perguntas, por exemplo, sobre os recursos naturais, e eu tomo apenas dois: água - como preservar? E energia - para quê e como usar? Aqui está um mestre nisso. Não basta querer produzir mais energia; é preciso mais energia sustentável. Mas não basta isso. É preciso saber se a gente precisa desse ar-condicionado tão frio ou se não podemos ter uma arquitetura que prescinda de ar-condicionado. Eu vejo ali alguém se cobrindo com um cobertor, nos trópicos brasileiros, apesar de estar a mil metros de altura. Então, a ideia da energia... As perguntas são: para que mais energia? Como produzi-la?
Na economia, há uma lista imensa, mas eu vou apenas citar algumas. Crescimento econômico: até onde vamos poder? Economia verde: qual é o limite da própria economia verde? Muitos verdes acham que não existe limite. Economia: como fazê-la regida pela ética? Como conseguir isso? É difícil. Ela tem uma mecânica quase que física.
Desenvolvimento sustentável: o que é e como é? A economia solidária: como fazer? A economia de criar tempo livre: como valorizar o ócio para que isso possa entrar, no final do ano, nos indicadores? Aumentamos o tempo livre - a gente não mede isso. A gente diz: aumentamos a produção, usando o tempo.
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A ciência econômica, como reinventá-la? Ela está velha, ela não responde mais às exigências pós 1972. A ciência econômica é um instrumento arcaico, como - com todo respeito a muitos - foi a teologia a partir do Renascimento. Como reinventá-la?
São perguntas que não são fáceis de a gente responder.
E eu concluo.
E o decrescimento? Por que não? E como fazê-lo positivo?
E os bancos? Como utilizar os bancos em vez de eles nos utilizarem?
E o governo? Como orientá-lo no mundo em que ele tem que responder a curto prazo, mas é do longo prazo que a humanidade precisa.
E a moeda? Como reduzir a monetarização da civilização? Veja que eu não disse acabar com a monetarização. Ou seja, eu não radicalizei na ideia de que uma civilização do futuro pode prescindir de moeda, mas pode desmonetarizar um pouco, desmercantilizando também.
E os padrões que nós temos? Quais são os novos indicadores? Como mudar os padrões de consumo? Como mudar os padrões de produção e distribuição, que têm essa coisa inacreditável, tantos anos depois de 1972? Aqui em Brasília a gente come ovos que foram produzidos em São Paulo, mas, antes de virem para cá, foram para Goiânia e, às vezes, para Belém. Ou seja, é um sistema de produção e distribuição irracional do ponto de vista da realidade de hoje.
E a ciência e a tecnologia? Como subordiná-las aos valores éticos? Como conviver no mundo da robotização, da informática, sem ficar prisioneiro delas?
E a Terra? A Terra como Planeta. Veja que essa já é outra novidade. Até pouco tempo atrás Terra era com t minúsculo. Agora Terra é com t maiúsculo, a partir de 1972, se for para marcar uma data.
E como é que a gente vai manter a biodiversidade?
E como respeitar os animais? Nós esquecemos de falar isso muitas vezes.
E como tratar o lixo?
E como regredir a desertificação?
E a quem pertencem os oceanos e o espaço? A quem tem foguete ou à humanidade inteira? Adianta a gente dizer que pertence à humanidade inteira se só alguns têm foguete? E se todos tiverem foguete, a gente vai respeitar o oceano?
E a sociedade?
A pobreza? Como superar a pobreza?
Como trazer solidariedade, despertar solidariedade no mundo do individualismo, do egoísmo mais forte?
E as cidades, o que fazer? Talvez seja um dos maiores problemas nossos. O que fazer para as cidades não serem o que a gente vê todos os dias nessa tragédia do consumo de drogas, dos engarrafamentos e dos lixos?
E o trabalho? Como vai ser o trabalho no futuro?
E a saúde? A saúde é apenas para dar conforto ou é para aumentar o tempo de vida? E se for para aumentar o tempo de vida, até quando? Já se fala que é possível dizer que a morte morreu. Um desses dias eu assisti a uma palestra em que o cientista dizia: "A morte morreu". Aí eu disse para ele: "Na minha idade, eu não estou mais interessado na imortalidade. Eu quero saber quando é que eu vou poder ressuscitar". E ele disse que para isso não tem resposta ainda.
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Pois bem.
E a desigualdade, como reduzir?
E a habitação? Como fazê-la para todos, mas sustentável? Porque até fazer casa para todos é possível, mas de forma insustentável.
Eu não vou continuar, mas a política é uma lista grande de perguntas que eu tenho.
E a demografia? A gente vai querer continuar aumentando o número de pessoas? Vai impor a redução, como a China fez?
E a migração? Quem está aí pensando no que fazer com a migração? Vamos abrir todas as portas dos países? Vamos aterrar todos os mediterrâneos, inclusive os invisíveis, que separam nossa casa daqueles que desejariam morar numa casa boa? Vamos aterrar o mediterrâneo que separa os nossos hospitais do povo sem saúde, que não consegue entrar lá? E os mediterrâneos invisíveis que separam a escola dos nossos filhos e netos daqueles que não têm boas escolas? Talvez não seja a solução eliminar os mediterrâneos e os muros. Mas construir muros, a gente sabe que não é o caminho.
E a cultura? Como manter a diversidade?
E os riscos adiante, inclusive do terrorismo?
E duas perguntas, para terminar, ou pelo menos dois grupos de perguntas: a filosofia e a civilização.
Para onde ir a civilização? Essa é uma pergunta fundamental, que 1972 levantou, mas não respondeu.
Quanto à filosofia, eu quero concluir.
E, aí, falo para os meus dois colegas, Presidente Collor e Jorge Viana. Eu creio que esse fracasso nosso, dos políticos, que não é só nosso, é quase geral no mundo, se deve menos ao excesso de políticos ruins que somos nós do que à falta de bons filósofos, que estão faltando no mundo. Nós não temos orientação. E, sem orientação, o político vira apenas uma máquina de conseguir voto. É a filosofia que nos dá um sentido, que nos dá um destino. E isso está faltando.
Foi 1972 talvez, escolhendo uma data, que nos trouxe o despertar dessas perguntas. Mas, no caso do Brasil, e estamos aqui, eu concluo dizendo, Jorge Viana, Presidente Fernando Collor: nós precisamos fazer uma pergunta que resolva duas palavras que faltam entre nós: coesão e rumo. Como fazer com que o Brasil tenha uma coesão de 220 milhões de pessoas com um sentimento comum? E qual o rumo para o futuro que essa sociedade coesa vai querer para si?
Não temos respostas. Eu, pelo menos, não tenho. Eu trouxe perguntas. Mas eu quero dizer que fico satisfeito.
E aqui quero dizer que o mundo deve a muitos, mas especialmente a vocês, que representam alguns a quem mais nós devemos. Ministra Izabella, à senhora especialmente; a Collor, pelo 1972, e a gente de vez em quando conversa do esforço; a todos os outros. O mundo inteiro vai dever muito àqueles que fizeram esse despertar de 1972, de 1992 e de 2012.
Por isso, muito obrigado a vocês que, como brasileiros, deram a contribuição para a gente descobrir o mundo. Agora, falta inventá-lo como nós desejamos que ele seja. Enquanto não sabemos como inventá-lo, pelo menos perguntemos. É isso que tentei fazer.
Parabéns a vocês.
Muito obrigado. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Fernando Collor. Bloco Moderador/PTC - AL) - Grato a S. Exª o Senador Cristovam Buarque pelas suas palavras cercadas de indagações. E, a cada um de nós caberá, em algum momento de nossas vidas, oferecer respostas adequadas.
Ao finalizar a presente sessão de debates temáticos tendo como objeto a lembrança sobre os 25 anos da realização da Conferência Rio 92, agradeço a presença de todos os que aqui estiveram, para que nós possamos, em conjunto - cada um à sua maneira e dentro dos seus limites e atribuições -, fazer renascer o espírito do Rio para este grave momento que o nosso Planeta vem atravessando.
Eu pediria licença a S. Exª o Senador Jorge Viana para fazer o agradecimento em conjunto, seu e meu. O Senador Jorge Viana, como nós sabemos, é o autor da proposta para a realização desta sessão. Agradecemos a presença da Srª Ministra de Estado do Meio Ambiente, nossa sempre Ministra Izabella Teixeira; ao Ministro do Meio Ambiente em 1992, Prof. José Goldemberg; ao Coordenador da Conferência Rio+20, Embaixador Marcos Azambuja; ao Presidente do Comitê Organizador da Rio 92, Embaixador Carlos Garcia; ao Subsecretário-Geral das Nações Unidas e Diretor Executivo da ONU Meio Ambiente, Sr. Erik Solheim; a S. Exª Deputada Bruna Furlan, Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados; ao Sr. Embaixador do Reino do Marrocos, Sr. Nabil Adghoghi; ao Sr. Embaixador Paulo Tarso Flecha de Lima; ao Deputado Federal Alfredo Sirkis; ao Secretário de Mudanças Climáticas e Qualidade Ambiental do Ministério do Meio Ambiente, Everton Lucero; ao Subsecretário-Geral de Meio Ambiente, Energia, Ciência e Tecnologia do Ministério das Relações Exteriores, Embaixador Antônio Marcondes de Carvalho, ao Prof. Luiz Gylvan Meira Filho; ao Sr. Diretor da Secretaria de Mudanças Climáticas e Floresta do Ministério do Meio Ambiente, José Domingos Gonzales Miguez; à representante do Ministério da Justiça, Srª Clarice Oliveira; à Diretora Executiva do Instituto Clima e Sociedade, Srª Ana Amélia Campos Toni; ao Diretor do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola e Coordenador do GT Plano Safra e ABC, Sr. Luis Fernando Guedes Pinto; ao Diretor do Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia, Sr. Mariano Cenamo; ao Diretor do Fundo Amazônia do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social, Sr. Gabriel Visconti; à Diretora do World Resources Institute Brasil e Coordenadora da Câmara Temática Cidades e Resíduos do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, Srª Daniely Votto Fontoura; ao Diretor da Ludovino Lopes Advogados e Coordenador da Câmara Temática Finanças do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, Sr. Ludovino Lopes; ao Superintendente-Geral da Fundação Amazonas Sustentável e Coordenador do GT Repique do Desmatamento, Sr. Virgílio Maurício Viana, ele, que também falou representando aqui o conjunto das entidades da sociedade civil, que aqui acorreram para esta sessão; ao Secretário Executivo da Coalizão Clima, Agricultura e Florestas e Coordenador da Câmara Temática Florestas, Agropecuária e Biodiversidade do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, Sr. Marcelo Furtado; ao Coordenador de Mudanças do Clima e Desenvolvimento Sustentável da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, Sr. Carlos Aragon; à Gerente do Clima do WRI, Srª Viviane Romeiro; ao Analista em Políticas Públicas da WWF, Sr. Jaime Gesisky; aos ilustríssimos senhores representantes do corpo diplomático.
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E, com a permissão dos presentes, in memoriam, gostaríamos, Senador Jorge Viana e eu, de cumprimentar e agradecer pela participação importante e decisiva que tiveram para o sucesso da Rio-92, o ex-Secretário de Meio Ambiente, José Lutzenberger, in memoriam. (Palmas.)
Ao Sr. Governador do Rio de Janeiro, à época da realização da conferência, Leonel Brizola. (Palmas.)
E ao Prefeito do Rio de Janeiro, também à época da realização da Rio-92, Marcello Alencar. (Palmas.)
Agradecendo mais uma vez a presença de todos e, tendo sido cumprida a finalidade da presente sessão, agradeço mais uma vez a todos que, com suas presenças, com o seu comparecimento, honraram a realização desta sessão, que declaro agora encerrada.
Muito boa tarde.
(Levanta-se a sessão às 17 horas e 22 minutos.)