1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA
55ª LEGISLATURA
Em 26 de novembro de 2015
(quinta-feira)
Às 11 horas
213ª SESSÃO
(Sessão Especial)

Oradores
Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Sessão do Senado Federal hoje destinada a comemorar o Dia da Consciência Negra e a conferir a Comenda Senador Abdias Nascimento àqueles que se destacaram na luta contra o preconceito, o racismo, na luta pelos direitos humanos.
A presente sessão do Senado Federal lembra esta data tão importante, que é o Dia Nacional da Consciência Negra, conferindo a Comenda Senador Abdias Nascimento, em sua segunda premiação, conforme prevê a Resolução nº 47, de 2013.
Permitam-me fazer aos agraciados, aos premiados no dia de hoje, uma referência não especial, porque todos são importantes, mas ao meu querido amigo, lá do meu Estado, lutador dos direitos humanos sem fronteira, o ex-Governador Alceu de Deus Collares. (Palmas.)
Agraciado, também, Frei David Raimundo Santos, que está fazendo a revolução pela educação, principalmente ao povo negro. (Palmas.)
Fundação Cultural Palmares, entidade que tem muito bem representado o povo negro, não só no Governo, mas em todo o País e também em nível internacional. Vida longa à Fundação Cultural Palmares! (Palmas.)
José Vicente, o nosso Reitor da Universidade Zumbi dos Palmares - só dizendo isso, eu disse tudo. (Palmas.)
Por fim, a Srª Mari de Nasaré Baiocchi, uma lutadora dos direitos humanos que foi aqui apresentada a nós todos em uma brilhante defesa feita nesta Casa. Sua indicação foi aprovada por unanimidade. Todos aqui foram aprovados por unanimidade: Alceu, Frei, Fundação Cultural Palmares, José Vicente. E, se aqui não estivesse entre os agraciados, com destaque, uma mulher, não seria um bom momento. Com certeza, palmas a Mari de Nasaré Baiocchi, indicada pela Senadora Lúcia Vânia. (Palmas.)
Serão homenageados, in memoriam: Carlos da Silva Santos, do Rio Grande do Sul - depois leremos o histórico -, a quem peço uma salva de palmas. (Palmas.)
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E Linduarte Noronha, que estarão representados aqui, respectivamente, nesta atividade, pela Srª Neiva Maria Santos da Silva e pelo Sr. Leonardo Henrique Ponce Leon Noronha de Oliveira.
Palmas, também, a todos os nossos convidados. (Palmas.)
Convido, neste momento, para que assumam seu lugar aqui na mesa, os agraciados presentes.
Chamamos o ex-Governador, Deputado Federal e Líder de Direitos Humanos Alceu Collares. (Palmas.)
Frei David, o nosso querido Frei David - eu já comentei aqui -, da educação e da luta de todo o povo negro. (Palmas.)
Representando a Fundação Cultural Palmares, a Presidente da instituição, Srª Cida Abreu. (Palmas.)
José Vicente, da Universidade Zumbi dos Palmares. (Palmas.)
E Mari Baiocchi, a quem já fiz referência. (Palmas.)
Representando o Sr. Carlos da Silva Santos, in memoriam, a filha do homenageado, Srª Neiva Maria Santos da Silva. (Palmas.)
Representando o Sr. Linduarte Noronha, o filho do homenageado, Sr. Leonardo Henrique Ponce Leon Noronha de Oliveira. (Palmas.)
E aqui, com muita alegria, chamamos também para a mesa a Diretora Presidente do Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros, e viúva do nosso líder maior. Sempre digo que, no Brasil, há dois grandes momentos: Zumbi e Abdias.
Viva Zumbi! Viva Abdias Nascimento!
Srª Elisa Larkin Nascimento. (Palmas.)
Os convidados estão chegando, os nossos agraciados. Vamos só esperar as pessoas, aqui.
Registramos a presença, enquanto os convidados estão se sentando à mesa, do Embaixador da República do Zimbábue, Sr. Thomas Sukutai Bvuma.
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Registramos também a presença da Secretaria de Políticas de Ações Afirmativas da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República, aqui representada pela Srª Luciana de Souza Ramos.
Cumprimentamos também o Assessor Parlamentar da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República, Sr. Artur Antônio dos Santos Araújo.
E ainda, os Srs. e as Srªs estudantes e professores - que aqui lotam as galerias e também o plenário - da Escola Estadual Damásio Ribeiro de Miranda, da cidade de Flores de Goiás.
Uma salva de palmas a todos. (Palmas.)
Neste momento, convido todos para, de pé, em posição de respeito, ouvirmos o Hino Nacional Brasileiro, que será apresentado pelo Coral do Senado Federal, que está aqui à minha direita.
Peço uma grande salva de palmas. (Palmas.)
Agora é com vocês.
(Procede-se à execução do Hino Nacional.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Com satisfação, registramos a presença aqui, no plenário, das Senadoras Lúcia Vânia, Ana Amélia e Marta Suplicy. (Palmas.)
Todas as três colaboraram muito para que este evento acontecesse.
Neste momento, senhoras e senhores, farei um pronunciamento como Presidente da Comenda Senador Abdias Nascimento.
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Também faço o pronunciamento em nome do Presidente Renan Calheiros, que não pôde estar aqui presente.
Todos vocês acompanharam a sessão, eu diria, delicada que tivemos no dia de ontem, uma sessão que deixou todos tristes, perplexos e, ao mesmo tempo, constrangidos, mas o Senado tomou a posição que tinha de tomar para que o processo continue acontecendo, independentemente de ser Senador ou Deputado, seja quem for. Só faço essa pequena justificativa, porque o Senador Renan está com uma série de tarefas relativas ainda a essa questão.
Então, falarei aqui em meu nome e em nome do Presidente do Senado e do Congresso Nacional.
Senhoras e senhores, em setembro de 2011, este Senador teve a alegria de, junto com a Senadora Lídice da Mata, apresentar o Projeto de Resolução nº 45, criando, assim, a Comenda Senador Abdias Nascimento.
Tínhamos em mente que o melhor antídoto contra o preconceito, sem sombra de dúvida, é a educação. Nada mais eficaz para combater a discriminação contra os negros e contra as negras do que o verdadeiro conhecimento da história e da cultura afro-brasileira. Nada mais saudável para a construção de uma verdadeira consciência cidadã do que o reconhecimento da riqueza da diversidade dos muitos povos que formam e formarão este País, pois, como diz o revolucionário gaúcho Governador Collares, Pátria, Pátria, Pátria somos todos.
Entre os nomes que mais se distinguiram no reconhecimento desta nossa riqueza e desta nossa diversidade, entre os nomes que mais se destacaram na proteção e na promoção da cultura afro-brasileira, sobressai e sempre estará na primeira linha o nome do nosso líder inesquecível e saudoso Abdias do Nascimento. (Palmas.)
Por essa razão, nós o elegemos como insígnia desta comenda e como síntese da luta, que não é apenas dos negros, mas de todos os brasileiros, em busca de igualdade, de liberdade, de paz e de avanços no campo social para todos.
É pois com renovado entusiasmo e com redobrada alegria que vemos a Comenda Senador Abdias Nascimento chegar hoje à sua segunda edição.
No ano passado, tivemos a honra de agraciar o Ministro Benedito Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça; os músicos Gilberto Gil e Martinho da Vila; a militante do movimento negro Edna Almeida Lourenço; o ator Milton Gonçalves; e o Prof. Sílvio Humberto dos Passos Cunha.
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Também celebramos, naquela primeira edição, a memória e a lembrança do líder pescador Francisco José do Nascimento, o Dragão do Mar, herói da luta abolicionista no Ceará e, consequentemente, no Brasil.
Neste ano, o Conselho da Comenda decidiu agraciar outras personalidades que muito contribuíram para a proteção e a promoção da cultura afro-brasileira. São eles: Alceu Collares, Frei David Raimundo dos Santos, José Vicente e Mari Nazaré Baiocchi. (Palmas.)
São lembranças que aqui trazemos.
Lembramos a todos os homenageados que também, nessa mesma linha, nós aqui homenageamos - e aqui fica um aplauso à parte - a Fundação Cultural Palmares, aqui representada pela querida Cida. (Palmas.)
A Fundação Cultural Palmares, a exemplo da Seppir, cumpre um papel fundamental.
Renderemos aqui nossas homenagens póstumas a dois brasileiros que fizeram muita diferença: Carlos Santos e Linduarte Noronha. (Palmas.)
Permitam-me, ao citar os agraciados - aqui já leio um pouquinho da história deles, porque, para contar a história de cada um aqui, precisaríamos ficar aqui dias e dias -, começar por Alceu Collares. Tivemos toda a alegria de ver um filme da história dele, um filme lindo. Todos nós tivemos a alegria de com ele conviver no Rio Grande. A quem fez o filme da história de Alceu Collares - depois, você vai poder falar -, quero dar uma salva de palmas. (Palmas.)
Saúdo aqueles que produziram essa bela história do nosso Governador.
Rendemos aqui nossas homenagens póstumas a Carlos Santos e Linduarte, como já falei, e começo agora a falar dos agraciados.
Permitam-me começar pelo ex-Governador Alceu Collares, meu conterrâneo.
Gaúcho de Bagé, filho de pai negro e de mãe índia, Alceu de Deus Collares poderia ter se resignado à posição periférica que a sociedade da época reservava aos negros e às negras. Mas não!
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O menino de 11 anos que teve de abandonar os estudos para ajudar a família... (Palmas.)
É que, ao lembrar a história do Collares, lembro a história do povo negro deste Brasil.
O menino de 11 anos que teve de abandonar os estudos para ajudar a família ergueu seus braços finos e firmes e passou de quitandeiro a carteiro, de carteiro a telegrafista, de telegrafista a advogado, e fez, então, sua revolução. Foi Deputado Federal por cinco mandatos; foi Prefeito da capital de todos os gaúchos e gaúchas, Porto Alegre; e foi Governador, o primeiro Governador eleito pelo voto direto da história do Rio Grande. Não sei se o Governador faz ideia da diferença que fez para nós, outros tantos negros do Rio Grande e do Brasil. (Palmas.)
Governador, você foi e será sempre uma referência para nós negros e, tenho certeza, para muitos brancos. Como foi bom, naquele ano, vê-lo eleito Governador no Palácio Piratini! Sua eleição nos mostrou o quanto o nosso Rio Grande é verdadeiramente grande. Sua eleição nos mostrou que é possível, sim, chegar lá. Sua eleição nos mostrou que muito maior que o preconceito, que muito maior que a discriminação é a vontade de fazer acontecer. Por isso, você é um revolucionário, um revolucionário da paz, do bem, da liberdade, da igualdade e da justiça.
Muito, muito, muito obrigado a você, Alceu Collares, permita-me que eu diga, pelo exemplo. Muito obrigado pela firmeza, pela diligência, pela tenacidade, por sua coragem, por sua trajetória. Receba o nosso reconhecimento e esta condecoração - com muito orgulho, neste momento, presido esta sessão do Senado da República - de alguém que foi seu discípulo, de alguém que olhou sempre a sua história. E, hoje, estou presidindo esta sessão.
Vida longa ao Governador Alceu Collares! (Palmas.)
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Já que vamos pelo Sul, como não lembrar também da figura de Carlos da Silva Santos, a quem prestamos aqui uma homenagem póstuma? Foi Carlos Santos que serviu de referência, tenho certeza, também para Collares e que, primeiro, abriu os caminhos da política para os negros no Rio Grande. Foi Carlos Santos que nos mostrou que, sim, nós também podíamos. Foi Carlos Santos que nos disse que, mais do que podíamos, deveríamos, toda a comunidade negra, preencher os claros que nossa ausência provocava na política nacional.
Carlos Santos nasceu na cidade de Rio Grande em 1904. Neto de escravos alforriados, metalúrgico, sindicalista, Carlos Santos foi o primeiro Deputado negro da história do Parlamento gaúcho, eleito em 1935. Foi precursor da luta contra o analfabetismo da população negra e foi, ele mesmo, exemplo de superação: formou-se em Letras em 1945, aos 41 anos, e bacharelou-se em Direito, em 1950, aos 46 anos. Chegou à Presidência da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul em 1967 e, em 1975, elegeu-se Deputado Federal.
Na Câmara, onde atuou por dois mandatos, Carlos Santos destacou-se de forma exemplar pela atuação em defesa da proteção à infância e da criança com deficiência.
Carlos Santos faleceu em 1989, mas seu discurso de despedida, em 1982, ainda reverbera como um desafio que precisamos todos enfrentar. Tomo aqui a liberdade de ler um pequeno trecho dessa obra de Carlos Santos. Disse ele:
Nos meus 50 anos de vida política, só vi duas cabeças negras na Câmara dos Deputados. Pode ter havido outros negros, mas de uma negritude camuflada [porque não assumiam a sua identidade]. Declarados pretos, gloriosamente pretos, apenas dois entre 420 parlamentares, quando temos inteligências para fazer uma bancada inteira de pretos!
A nova geração de negros deveria tomar a si a tarefa de preencher esses claros [os espaços vazios na política brasileira].
Minha esperança é de que essa nova geração, saída das universidades, tenha força para realizar o que sempre foi meu grande sonho: a elevação dos negros brasileiros a uma situação condigna e reconhecida.
É o que disse Carlos Santos. Todas essas foram palavras dele, que são atuais. (Palmas.)
O apelo de Carlos Santos merece ser aqui lembrado porque foi ouvido por dois de nossos agraciados, Frei David Raimundo dos Santos e José Vicente, que também temos aqui a honra de homenagear.
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Ambos se destacaram exatamente por promover a educação da comunidade afro-brasileira. Ambos nos marcam por inspirar essa nova geração que, saída das universidades, há de nos levar muito além.
Frei David Raimundo Santos, frade franciscano da Ordem dos Frades Menores, na Província da Imaculada Conceição do Brasil, em São Paulo, fundou, em 1992, o projeto Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes (Educafro), uma rede de cursinhos pré-vestibulares comunitários, hoje presente em quatro Estados, que tem por objetivo inserir e garantir a permanência de negros e pessoas da camada popular dentro de universidades públicas e particulares. Trata-se de iniciativa inestimável para a promoção da cidadania e inclusão social da população pobre e afrodescendente.
Obrigado, Frei David, por seu empenho, por sua dedicação, pela transformação, e, eu diria mais, pela oportunidade de redenção que tem propiciado a toda nossa gente. Grande Frei David! (Palmas.)
Há mais de 20 anos, a Educafro vem iluminando o caminho de muitos jovens que, sem o seu apoio, não conseguiriam chegar à universidade. Se o acesso ao ensino superior passa hoje por um genuíno, ainda que incipiente, processo de democratização, devemo-lo, entre outros, ao senhor. Receba, pois, esta demonstração de reconhecimento.
Também pela causa da educação da população negra e desassistida, agraciamos hoje o Prof. Dr. José Vicente, Reitor da Universidade Zumbi dos Palmares, fundador e Presidente do Instituto Afrobrasileiro de Ensino Superior e Fundador-Presidente da Afrobras (Sociedade Afro Brasileira de Desenvolvimento Sócio Cultural). José Vicente também nos inspira pela trajetória.
Filho caçula de boias-frias, nasceu e cresceu no Morro do Querosene, bairro pobre de Marília, no interior de São Paulo. Trabalhou como boia-frla, como engraxate, como vendedor ambulante, como pintor de paredes, como soldado da Polícia Militar, até formar-se, primeiro, em Direito; depois, em Sociologia; e, por fim, em Educação.
Nos anos 1990, começou a liderar um grupo que lutava por bolsas de estudos para negros em universidades particulares. A iniciativa evoluiu para a Afrobras, que é hoje referência na inserção socioeconômica, cultural e educacional dos jovens negros brasileiros. Uma de suas principais realizações é, sem sombra de dúvida, a Universidade Zumbi dos Palmares, que tem hoje seis cursos de graduação, dois cursos de pós-graduação e 1.500 alunos, 80% dos quais autodeclarados afrodescendentes. Em um País em que menos de 14% dos alunos do ensino superior são negros, não é difícil perceber o tamanho da diferença que faz a grande Universidade Zumbi dos Palmares, que é uma referência internacional. Já estivemos lá e conhecemos o projeto. (Palmas.)
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Parabéns! Obrigado a você, José Vicente. Parabéns! Obrigado pela coragem. Parabéns! Obrigado pela luta. Parabéns! Obrigado pela perseverança! Receba você esta pequena homenagem.
Agraciamos também agora, do lado da cultura, a antropóloga Mari de Nasaré Baiocchi, Professora Titular da Universidade Católica de Goiás e da Universidade Federal de Goiás. Mari Baiocchi mantém, há mais de 30 anos, projeto de pesquisa e extensão junto ao povo Kalunga, uma comunidade de 600 famílias de ex-escravos, que vive na região dos Municípios de Cavalcante, Teresina e Monte Alegre, na Chapada dos Veadeiros, no nordeste de Goiás.
Mari Baiocchi, o povo quilombola, infelizmente, em grande parte, ainda fica invisível neste País. O povo quilombola merece reconhecimento. O povo quilombola tem que questionar. Há setores que questionam até o decreto do Presidente Lula sobre o reconhecimento da terra dos quilombolas. Nós o apresentamos aqui, para que o decreto se transforme em lei.
Vida longa, vida longa a você, Mari de Nasaré! (Palmas.)
Vida longa ao povo quilombola! (Palmas.)
Receba, pois, Mari de Nasaré Baiocchi, esta homenagem. Você soube vencer a precariedade do acesso à infraestrutura das comunidades Kalunga. Você soube levar a universidade até os quilombos e trazer os quilombos até a universidade. Você contribuiu tanto para que os quilombolas fossem também reconhecidos como cidadãos plenos deste País. Parabéns pela luta, pela coragem, pela sensibilidade!
Para concluir, eu só posso dizer, em nome do povo negro e também do povo branco que tem compromisso com as causas: obrigado, obrigado, obrigado, obrigado e obrigado, mais uma vez! (Palmas.)
Para saudar a cultura quilombola, esta edição homenageia Linduarte Noronha, a quem prestamos, juntamente com Carlos Santos, homenagem póstuma. Linduarte Noronha faleceu em 2012, mas sua obra permanece como um marco na história do cinema brasileiro.
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Em 1960, então repórter e crítico de cinema, dirigiu um curta-metragem sobre uma família camponesa remanescente de um quilombo de escravos fugidos, na Serra do Talhado, na Paraíba. O documentário Aruanda, que o próprio Glauber Rocha consideraria precursor do Cinema Novo, descreve o que Linduarte Noronha considerava a Terra da Promissão: um lugar utópico, paraíso da liberdade perdida, síntese dos anseios de toda uma raça.
Linduarte foi desses que se deixou encantar pela vida dos quilombos, em um momento em que o Brasil talvez preferisse esconder a chaga terrível - terrível - do que é ser escravo.
Por retratar tão bem o cotidiano quilombola, merece também aqui todas as nossas reverências e admiração. Obrigado. Obrigado também a você por tudo aquilo que escreveu no passado. E, lá do alto, ele está olhando este momento. (Palmas.)
Por fim, mas não por menos, esta edição também concede a honra e agracia, com muito orgulho, a Fundação Cultural Palmares, primeira instituição pública voltada para promoção e preservação da arte e da cultura afro-brasileira.
Criada em 1988 e vinculada ao Ministério da Cultura, a Fundação Palmares é referência na promoção, fomento e preservação das manifestações culturais negras e no apoio e difusão da Lei nº 10.639, que torna obrigatório o ensino da História da África e Cultura Afro-Brasileira nas escolas de educação básica. É também responsável pela certificação das comunidades quilombolas, o que lhes assegura direitos e dá acesso aos programas sociais do Governo Federal.
À Fundação Cultural Palmares, por lutar e fazer o bom combate da inclusão social das comunidades negras, pelo extraordinário trabalho de demarcação dos quilombos, pela defesa das religiões e manifestações culturais de matriz africana, o nosso reconhecimento e a nossa gratidão.
Vida longa, vida longa à Fundação Cultural Palmares, aqui representada pela líder Cida. (Palmas.)
Finalmente, Alceu Collares, Frei David, José Vicente, Mari Baiocchi e a Fundação Palmares carregam hoje a tocha da luta que era ontem carregada por Abdias Nascimento, por Carlos Santos, por Linduarte Noronha. E devemos a todos eles o nosso agradecimento.
Lembro também aqui os nomes que foram indicados à Comenda Senador Abdias Nascimento. Foram indicados e foram homenageados - todos não poderiam ser votados, nós caminhamos para aquilo que foi a votação unânime -, com muito carinho e respeito: Joaquim Beato, in memoriam, falecido em julho de 2015, aos 91 anos, foi Senador da República; Cristiano Silva, Cris do Morro; Juvenal de Holanda Vasconcelos, Naná Vasconcelos; Lazzo Matumbi; Marizete Silva Lessa; Lucíola Maria Inácio Belfort; Maria José Motta de Oliveira, Mestre Amaral, Raílda Rocha Pitta.
Enfim, uma salva de palmas a todos aqueles que foram lembrados pelos Senadores e Senadoras e que se sentem representados, com certeza, nesta Mesa. (Palmas.)
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Quando Abdias completou 95 anos, escrevi... E hoje eu vou perdoar vocês. Eu vou perdoar vocês, porque eu sempre tenho a mania de fazer declamações, Governador, mas com você aqui presente e como você declama as poesias sem ler, eu não vou ler a poesia. Onde está a esposa do Abdias? Ela sabe de cor, de tanto eu ler essa poesia do Abdias. É uma poesia que, no dia em que o Abdias fez 95 anos, se não me engano, no Itamaraty - ele foi homenageado pelo mundo -, eu fui, em nome do Congresso, falar para o nosso querido Abdias, que estava lá, numa cadeira de rodas. E eu, naquela noite, escrevi uma pequena poesia, da qual só vou ler a primeira parte:
Os poetas vão lembrar de Abdias, falando de paz, rebeldia e, tenho certeza, a emoção será tão forte como é hoje o que sentimos quando ouvimos a batida do tambor.
Falarão de um homem negro, de cabelos brancos e barba prateada, que, independentemente do tempo, nunca parou.
Fez da sua guerra a nossa batalha, como ninguém. Nunca tombou. Foi dele e é nossa [de todos nós] a bandeira da igualdade, da justiça e da liberdade.
Abdias, tu és exemplo para todos nós [para a geração do presente e toda a geração do futuro]. (Palmas.)
Feito o pronunciamento, em nome da Presidência do Senado e deste Senador que, com muita honra, preside esta sessão, eu vou, neste momento, passar a palavra aos nossos Senadores que estão inscritos. Em seguida, nós faremos a entrega das medalhas, até porque o Senador Lasier lembrou aqui que alguns Senadores estão com problema de voo. O importante é que os três Senadores que estão presentes ajudaram em todas as indicações que estão aqui.
Eu passo a palavra, em primeiro lugar - se assim vocês concordarem -, ao Senador Lasier Martins. Em seguida, falarão as Senadoras Lúcia Vânia ou Ana Amélia. Elas decidem quem falará primeiro. (Palmas.)
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(Interrupção do som.)
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, demais integrantes da Mesa, eu quero dizer duas frases. (Fora do microfone.)
Está no ar uma mensagem na televisão muito inteligente e emocionante. Essa mensagem diz, mais ou menos, o seguinte: onde é o lugar do negro? E alguém responde: "É nas artes". Outra pessoa responde: "É no futebol". Alguém poderia dizer: "Lugar do negro é na Presidência de uma sessão especial do Senado". Outro poderia dizer: "O lugar do negro é no governo do Rio Grande do Sul, como foi o meu afetivo e brilhante amigo Alceu Collares". Mas digo eu, conforme a mensagem: o lugar do negro é em todos os lugares, como todos nós, porque somos iguais.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Senador Lasier Martins.
Passamos a palavra à Senadora Lúcia Vânia, pelo entendimento feito com a Senadora Ana Amélia.
Na sua fala, todos já podem dizer qual foi o indicado, mas, na verdade, todos nós indicamos todos.
O som não está indo aí, Senadora.
A SRª LÚCIA VÂNIA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, senhoras e senhores convidados, eu gostaria de iniciar os meus cumprimentos ao querido Governador Alceu Collares. A sua presença aqui nos honra, pelo seu exemplo, pelo seu trabalho, pela sua dedicação e, acima de tudo, pela superação. Parabéns, meu querido Governador!
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Cumprimentando-o, quero cumprimentar o Frei David; a representante da Fundação Cultural Palmares; o José Vicente; a Mari Baiocchi; a Srª Neiva Maria Santos; o Sr. Leonardo, filho do Sr. Linduarte Noronha; e a Diretora Presidente do Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros, a viúva do Senador Abdias Nascimento, a Srª Elisa Nascimento. Cumprimento os Srs. Embaixadores e os senhores convidados, que nos honram com suas presenças.
São passados 320 anos da morte de Zumbi dos Palmares, no dia 20 de novembro de 1695, na Serra da Barriga, hoje Estado de Alagoas.
Zumbi dos Palmares foi adotado pela população brasileira como símbolo da resistência à escravidão imposta à população negra, desde que seus primeiros representantes aportaram no Brasil em 1594.
São momentos históricos que despertam reflexões sobre as relações inter-raciais em nosso País, neste início de século XXI. Não podemos deixar de reconhecer que as relações raciais estão fortemente enraizadas na vida social dos indivíduos, grupos e classes sociais. Nesse sentido, as desigualdades sociais se manifestam nos estereótipos, nas intolerâncias e são polarizadas em torno de etnias, de gêneros e de outras diversidades, como as religiosas.
Diante desse verdadeiro caldeamento religioso e, sobretudo, étnico que é o Brasil, a homenagem que esta Casa presta ao saudoso Senador Abdias Nascimento é por demais oportuna. Abdias Nascimento, Senador e Deputado Federal pelo Rio de Janeiro, foi, acima de tudo, um militante do movimento negro e foi um dos idealizadores do Dia da Consciência Negra.
Cumprimento a Senadora Lídice da Mata - idealizadora desta premiação, ao lado do Senador Paulo Paim - pela iniciativa. Muito apropriadamente, a Senadora Lídice é representante de um dos Estados mais miscigenados e multiculturais do Brasil: a Bahia.
Como representante de Goiás, Estado também bastante identificado com a cultura afro-brasileira, apresentei a essa premiação o nome da Profª Drª Mari de Nazaré Baiocchi, aposentada, professora titular da Universidade Federal de Goiás.
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Levando em consideração que a premiação Comenda Senador Abdias Nascimento, destina-se a "personalidades que tenham oferecido relevante contribuição à proteção e à promoção da cultura afro-brasileira", justifico a indicação da Profª Mari Baiocchi por ter dedicado uma grande parte de sua vida a pesquisar, escrever e conviver com um dos povos mais tradicionais da cultura afro-brasileira, os kalungas.
A pouco mais de 300km da Capital Federal, está localizada a maior e mais antiga comunidade quilombola do Brasil - os kalungas -, que reúne mais de 3 mil pessoas nos limites geográficos de dois Municípios de Goiás, Teresina e Cavalcante.
Coincidentemente, a população kalunga tem vivido uma triste situação de impunidade, que está corroendo a infância de toda uma geração de crianças. Elas estão sendo vítimas de abuso sexual e exploração do trabalho infantil, e não são poucas as ocorrências. O Conselho Tutelar registra, por mês, pelo menos cinco acusações só de abusos, o que, fazendo as contas, são mais de 50 casos por ano.
Temendo pelas famílias e, sobretudo, pela infância e pelo futuro da comunidade, adotei, como pessoa pública, uma série de medidas e ações. Uma das iniciativas foi uma audiência com a Ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Tereza Campello. Sensível ao problema, a Ministra enviou uma equipe a Cavalcante para apurar a situação do Centro de Referência de Assistência Social do Município, que não recebia recursos federais há meses.
Os kalungas, de fato, sofrem da maior e mais grave ameaça que pode atingir uma comunidade: o silêncio perante os abusos que já destruíram tantas famílias.
Foi a esse povo que a antropóloga Mari de Nazaré Baiocchi dedicou parte considerável de sua vida. Porém, a Profª Mari Baiocchi não se contentou apenas em pesquisar e escrever sobre os kalungas. Ela os apoiou nas suas lutas, indo inúmeras vezes conviver com eles na sua isolada comunidade, mas também recebendo-os em sua residência em Goiânia, quando membros da comunidade tinham que vir à capital resolver várias de suas pendências.
Por tudo isso, cumprimento todos os premiados na pessoa de Mari Baiocchi, pelo todo do seu trabalho como pesquisadora, mas, acima de tudo, pela dedicação pessoal a essa comunidade dos kalungas, que continua a exigir a atenção das autoridades públicas.
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Espero, minha querida Profª Mari Baiocchi, que, com a real situação de uma comunidade que V. Sª tão bem defendeu, ela venha a obter evidência perante as autoridades e que, através de todo esse trabalho e desse despertar que o prêmio ocasiona a V. Sª, tenhamos um resultado efetivo, para defender, com toda a força, o povo kalunga do nosso Estado de Goiás.
Parabéns, minha querida professora e antropóloga.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Senadora Lúcia Vânia. Senadora Lúcia Vânia, seu pronunciamento valoriza o povo quilombola.
É com muita, muita alegria que registramos, neste momento, a presença da Senadora Lídice da Mata. Ela estava em outra atividade na frente em defesa das crianças e adolescentes e agora chegou aqui. Eu tive alegria - conversamos muito, ela dialogou muito conosco - de criarmos a Comenda Senador Abdias Nascimento. É com grande honra que queremos dar uma salva de palmas, com toda força, à Senadora Lídice da Mata. (Palmas.)
A Senadora Lídice da Mata usará a tribuna no momento em que entender mais adequado.
Agora, neste momento, com satisfação, chamo para usar a palavra a nobre Senadora do Rio Grande do Sul, Senadora Ana Amélia. (Palmas.)
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Caro Senador Paulo Paim, que preside esta sessão especial destinada a comemorar o Dia Nacional da Consciência Negra e a entregar a Comenda Senador Abdias Nascimento na sua segunda edição, eu quero cumprimentar a iniciativa do Senador e também a criação dessa comenda, que tem um sentido didático e simbólico, o sentido de nos inspirar para o sentimento de combatermos e tentarmos tirar do nosso dicionário, do nosso linguajar palavras como racismo e discriminação. Quando conseguirmos não usar tanto essas palavras, começaremos a pensar e a ter um olhar mais generoso, mais humano em relação a esse tema tão caro nesta Casa, liderado por figuras como o Senador Paulo Paim, a Senadora Lídice da Mata e tantos outros. (Palmas.)
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A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Eu queria, na figura do nosso Governador, homenagear todos aqueles que estão aqui.
Fiquei muito honrada de ter tido a ideia de prestar uma homenagem póstuma a Carlos Santos, que foi o primeiro negro a presidir a Assembleia do Rio Grande do Sul em 1967. (Palmas.)
E o Senador Paulo Paim, imediatamente, por conhecer a história de Carlos Santos... Ele era muito jovem, um guri, estava começando a sua atividade política, e eu tive o privilégio de conviver, como jornalista, com aquela figura notável - a foto que apareceu mostrou a sua grandeza, com um sorriso muito largo. Era um homem preparado, um homem afável, um senhor do seu tempo e avançado mais do que o seu tempo, um papa-areia, como nós chamamos quem nasce em Rio Grande.
Quando nós apresentamos também o nome do Governador Alceu Collares, foi uma proposta unânime. Apresentei a sugestão ao Senador Paim e imediatamente ao Senador Lasier. Senador Paim, essas foram grandes escolhas.
Estou particularmente feliz por esses grandes talentos do Rio Grande do Sul. Eu gostaria também de citar outros nomes, como Antônio Carlos Côrtes, um dos fundadores do movimento negro no Rio Grande do Sul e do Grupo Palmares, e também Oscar Henrique Cardoso, do site Afropress, que fomenta a integração entre intelectuais negros e brancos para discutir a cultura afro-brasileira e o cotidiano afro-brasileiro em nosso Estado do Rio Grande do Sul.
E eu também não posso deixar de falar de figuras fantásticas do nosso Estado nas artes, na música. Cito o grande compositor, cujo centenário de nascimento celebramos aqui recentemente, Lupicínio Rodrigues. (Palmas.)
Quem não se lembra de uma música de Lupicínio Rodrigues, que sempre cantou os bons e belos sentimentos, com a sua boemia, e até o hino do seu time, o Grêmio? Aqui estão dois gremistas. Por isso, faço questão até de lembrar que Lupicínio Rodrigues foi...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Quem são os dois gremistas? A senhora e o Collares? Eu sou Caxias.
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Foi só uma provocação para saber. O Senador Paim saiu pela tangente.
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Eu queria lembrar também de figuras no esporte. Eu me lembro, pela figura que aparecia, do jogador da nossa Copa do Mundo, tricampeão, o Everaldo. É bom lembrar essas figuras que nos encantaram tanto. E, recentemente, houve essa menininha, a Daiane dos Santos, que, nas Olimpíadas, com aqueles saltos mirabolantes, nos encantou.
Com esta singela homenagem, eu queria me concentrar na figura do nosso Governador Alceu Collares, cara Neuza Canabarro, sua esposa, nossa sempre Primeira-Dama. Quero dizer que aprendi a admirar o Governador Collares quando cheguei a Brasília em 1979. Ele era o Líder do PTB - depois, PDT, quando da chegada de Brizola aqui e da briga com Ivete Vargas, que nós acompanhamos. Na Liderança do PTB - lembro até a sala onde ficava -, houve a primeira reunião com o então Governador Brizola, inesquecível, e eu me lembro da luta e das brigas de Collares com Delfim Netto pelo salário mínimo, Senador Paim. Então, a causa social e a causa dos negros, na figura de Collares, Senador Paim, eu acompanhei como jornalista. Além de grande político, é um grande gestor - Prefeito de Porto Alegre, Vereador, Governador do Estado e, agora, dirigente da Itaipu Binacional, membro do Conselho da Itaipu Binacional. No trato com essa questão tão difícil, ele teve uma forma leve de abordar a questão racial, como todo brasileiro, fazendo, inteligentemente, uma piada e tirando proveito com a ironia, porque com a ironia se fere a moral - a ironia, a caricatura fere a moral. E a moral desse costume do racismo era ferida por esse humor ferino também, mas a forma de Collares fazer o humor era uma forma de condenar o racismo. Então, Governador Collares, esta é uma homenagem que o Senado lhe presta como um político que orgulha a todos os gaúchos.
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E há outra forma, Senador Paim: a sua emoção, quando contou a história do nosso homenageado e de todos os outros que o seguiram, mas, talvez, por conhecer melhor a história desse nosso Governador, e porque a sua história não é diferente da dele e não é diferente da minha. O que emociona também é que as pessoas que vieram da pobreza, também de alguma forma sofreram dificuldades, discriminação e tiveram que pelear muito - para usar um termo gauchesco - para chegar aonde chegamos.
Então, é duplamente um orgulho para mim, Senadora de primeiro mandato, estar nesta homenagem a uma figura que já nos deixou, lá no ano de 1989, Carlos Santos, que é uma figura emblemática para a política do Rio Grande.
Depois, esse Governador sendo o primeiro negro eleito pelos gaúchos e gaúchas. E quando o Obama se elegeu o primeiro negro Presidente dos Estados Unidos, nós aqui também podemos nos orgulhar. Temos obamas em todas as áreas, aqui com essa grande força. (Palmas.)
Parabéns a todos os homenageados! E nós também queremos tirar do nosso dicionário e do nosso vocabulário racismo e discriminação.
Parabéns, Senador Paulo Paim! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Senadora Ana Amélia, parabéns pela fala.
Como disse a Senadora Ana Amélia, quando a comissão especial, Senadora Lídice, indica dois gaúchos, que foi o Carlos Santos, já falecido, e o Alceu Collares, em vida, só tenho que agradecer. Foi indicação dos três Senadores, Lasier Martins, Ana Amélia e este Senador, mas um foi post mortem, e outro, em vida. A Senadora Lídice está até agora questionando por que o nome dela não foi indicado. (Risos.)
Mas faz parte.
Agora, passamos a palavra à Senadora Lídice da Mata. O Senador Cristovam seria o próximo mas não se encontra ainda aqui.
A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Bom dia a todos os convidados e homenageados.
Quero saudar a todos e dizer da nossa alegria. Eu fui autora, com o apoio do Senador Paulo Paim, desta comenda, porque entendia que era indispensável ao Parlamento brasileiro poder destacar, primeiro, o nome de Abdias neste Senado como o grande Senador das causas da negritude no Brasil; e, segundo, ao fazer essa saudação e manter vivo o nome de Abdias anualmente, neste momento em que homenageamos estas figuras públicas do Brasil, nós pudéssemos ter este instante de dar visibilidade a personalidades negras que contribuem ou contribuíram com a história política, com a história social, com a história econômica, com a história cultural do nosso País e pessoas não negras que também têm participação nesta luta antirracista em nosso Brasil.
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Foram homenageados, no dia de hoje, o ex-Governador, sempre Governador, Alceu Collares, do Rio Grande do Sul, uma enorme honra tê-lo aqui; Frei David, parceiro da nossa luta na CPI da Investigação do Assassinato de Jovens Negros no Brasil, especialmente jovens negros; a Fundação Cultural Palmares, criada em 1988 e vinculada ao Ministério da Cultura, justamente para fortalecer e dar guarda às manifestações culturais afrodescendentes em nosso País; José Vicente, também filho de agricultores, nascido no Município de Marília, no interior de São Paulo, que hoje se destaca como doutor em educação na Universidade Metodista de Piracicaba e que fundou o Instituto Afrobrasileiro de Ensino Superior; Srª Mari Baiocchi, que integra a comunidade Kalunga, reunindo, portanto, essa luta dos quilombolas, destaca, estuda e promove a população quilombola em nosso País; Carlos Silva, como já foi citado aqui pela Senadora, in memoriam, uma homenagem do Rio Grande do Sul a este político negro, Presidente da Assembleia Legislativa; Linduarte Noronha, também in memoriam, foi jornalista, crítico de cinema, professor universitário e cineasta, falecido em 2012, no Rio de Janeiro.
Esta é realmente uma homenagem muito pequena que o Senado presta a estas personalidades e que acho que nós deveríamos, Senador Paim, até buscar aumentar o número de agraciados ou de homenageados anualmente, porque toda vez que a gente vai debater e votar tem uma enorme dificuldade para trazer aqui nomes tão importantes, como, por exemplo, o de Zezé Motta, esta extraordinária atriz brasileira... (Palmas.)
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... que é um ícone da luta antirracismo no Brasil.
Eu vou, depois de falar rapidamente dos homenageados, sintetizar a minha fala para dizer que, realmente, a Senadora Ana Amélia, ao dizer que nós precisamos riscar do nosso dicionário, apagar do nosso dicionário as palavras "discriminação" e "racismo", diz muito bem da necessidade que nós sentimos. E eu queria destacar que, nesse período de 16 dias de ativismo, de luta contra a violência sobre as mulheres brasileiras - ontem nós tratávamos disso, Senadora -, infelizmente, cresce o número de mulheres violentadas, de mulheres assassinadas no Brasil. E as estatísticas demonstram que ela se concentra mais nas mulheres pobres e negras. É também a realidade da CPI, quando nós tratamos da CPI de Assassinato de Jovens - o Frei David é um lutador nisto, esteve fazendo o seu depoimento há uma semana naquela Comissão -, nós registramos esse absurdo: de 56 mil assassinados em 2013 no Brasil, 33 mil são jovens negros!
Então, nós estamos convivendo com uma herança maldita de mais de 300 anos de escravidão no Brasil, com essa marca de morte, de violência, de pobreza, de dificuldade da comunidade afrodescendente em nosso País. Nós precisamos de políticas compensatórias urgentes para remediarmos e para compensarmos essa população.
E eu fico feliz que a gente esteja fazendo essa sessão hoje aqui, também tendo coisas a comemorar, não apenas registrar essa marca tão dura, mas também conquistas que realizamos. Nós estamos em um momento em que temos, no Brasil, políticas compensatórias já conquistadas pelo movimento negro, como as políticas de cotas nas universidades e, agora, de cotas em concursos públicos.
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Na Bahia, este ano, Senador Paim, o Governo, com outras entidades da área cultural, lançou uma coleção para crianças com personalidades negras da nossa sociedade, como Milton Santos, como Teodoro Sampaio, negro que governou a Bahia, como figuras da cultura negra que fazem parte da sociedade baiana. E é uma coleção belíssima, escrita por poetas, por pessoas da literatura baiana consagradas, que nesse momento fazem esse reencontro com a história.
E eu vim da Frente da Criança e do Adolescente e vi que aqui há um grupo de jovens que estavam lá na Frente da Criança e do Adolescente, jovens, meninos, jovens homens e meninas negras, que participavam e faziam uma apresentação lá, uma apresentação cuja frase, dura, o slogan principal, numa manifestação bonita que eles faziam, dizia: "A carne mais barata no mercado é a carne negra", denunciando especialmente a discriminação racial entre as mulheres, das mulheres negras na nossa sociedade. Tudo isso é a tomada de consciência... Eu peço aplauso para eles. (Palmas.)
É a tomada de consciência de uma geração nova, que se afirma.
Na Bahia e no Brasil, este ano já aconteceu uma marcha belíssima de mulheres e jovens que diziam: "Sou negro e crespo." Quer dizer o quê? Sou negro de cabelo crespo e sou bonito e sou bonita, porque a beleza estética, a nossa estética negra se afirma com o seu reconhecimento.
Então são movimentos que se incorporam de maneira forte à vida social brasileira, como foi a Marcha das Mulheres Negras, com cerca de 10 mil pessoas, que aconteceu aqui na Esplanada dos Ministérios, agora no dia 18, que é uma coisa bonita e que certamente marcará, de agora por diante, novas marchas de mulheres negras nas ruas do nosso País. E é o movimento negro que sai das salas pequenas para se afirmar na sociedade brasileira, para firmar a sua dignidade.
E eu quero parabenizar o Senador Paim, que aqui, no Senado Federal, desenvolve, de forma tão brilhante, o seu trabalho, que foi o autor do Estatuto da Igualdade Racial e que tem dado essa contribuição tão efetiva à nossa luta contra o racismo no Brasil.
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Até rasgarmos essas palavras do nosso dicionário e da nossa vida cotidiana nossa luta continua, permanece cotidianamente contra o racismo e contra a discriminação.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Um belo pronunciamento, Senadora Lídice da Mata.
Nós avançamos agora para a Senadora Vanessa Grazziotin.
Só mulheres.
Viu, Vanessa? Vanessa, só mulheres tem uma razão: eu participo aqui no Senado da Frente Parlamentar dos Homens Pelo Fim da Violência contra as Mulheres. Por isso as mulheres são privilegiadas.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM. Sem revisão da oradora.) - A Senadora Lídice está dizendo "com a camisa que eu dei". De fato, foi um presente dessa minha querida companheira, Senadora e amiga Lídice da Mata. Eu digo onde quer que eu vá que, no ano de 1988, Rafael, quando o Congresso Nacional fervia porque discutia a nova Carta Constitucional, a Senadora Lídice, Collares, era Deputada Federal, Constituinte do meu Partido, o PCdoB. E eu era uma jovem estudante que vinha a Brasília lutar pela educação e lutar pelos direitos das mulheres e ficava lá na área de serviço do apartamento da querida Senadora Lídice da Mata.
Enfim, Srs. Senadores, companheiros e companheiras convidadas, eu quero iniciar, Senador Paim, homenageando V. Exª, que tem sido um lutador das causas e das almas do povo brasileiro. Quero homenagear V. Exª, um grande parceiro deste Senado Federal, homenagear todos os agraciados que receberão aqui a Comenda Senador Abdias Nascimento, todos e todas que estão à Mesa, homenageando aquele em que me inspiro, aquele que tem sido uma luz, uma referência em toda essa minha pequena e humilde trajetória política, que é o nosso querido Alceu Collares.
Um prazer muito grande em revê-lo, Alceu. (Palmas.)
Eu tive a alegria de acompanhar um pouco a trajetória de Alceu Collares e de, ao lado dele, como ao lado da Senadora Lúcia Vânia, sermos Deputados Federais juntos.
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Toda vez que eu me pronunciava e descia, eu percebia o quanto ele prestava atenção no que eu estava dizendo, não só no conteúdo, mas também na forma. Ele dizia: "Senadora, não fale assim. Isso fica muito prepotente. Fale sempre assim, chamando as pessoas, comemorando as pessoas, e não apontando de forma autoritária o dedo às pessoas".
Senador Collares, eu ainda não aprendi a lição, mas todos os dias eu me esforço para falar assim. É uma alegria revê-lo e ver que V. Exª recebe um reconhecimento muito importante do Parlamento brasileiro, do Senado Federal.
Falar da Senadora Lídice é muito difícil. A Senadora Lídice já foi prefeita da capital Salvador, no Estado mais negro deste País, por isso um dos mais alegres. Eu digo "um dos" porque meu Estado também é um Estado muito alegre e tem uma presença negra não tão forte, mas indígena significativa. É o Estado de maior população indígena, que é um outro segmento da nossa população também muito discriminado, muito sofrido, deste País.
Não é fácil. Por isso mesmo, eu trouxe aqui alguma coisa por escrito, falando do Dia Nacional da Consciência Negra. Além de homenagear essas figuras que estão à mesa, nós estamos comemorando o Dia Nacional da Consciência Negra, que foi a data da morte de Zumbi dos Palmares, em 20 de novembro de 1695. Simbolicamente representa o reconhecimento da luta história dos negros, mas também indica sua pertinácia e resistência, características essas que vêm gerando cada vez mais conquistas, embora persistam as dificuldades de toda ordem.
No plano oficial, o reconhecimento se deu primeiro com a Lei nº 10.639, de março de 2003, que tornou obrigatório o ensino da história e culturas afro-brasileiras na rede oficial de educação, valorizando a diversidade e a consciência identitária. Em 2011, a Presidenta Dilma sancionou a Lei nº 12.519, instituindo o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra e consagrando de vez no calendário honorífico nacional essa data de crucial importância para os movimentos negros e para todos os brasileiros e brasileiras.
Como Parlamentar, como mulher, como cidadã, portanto, e como titular da Procuradoria Especial da Mulher no Senado Federal, cuja missão é não só zelar, fiscalizar, controlar, mas incentivar e lutar pelos direitos das mulheres, eu não poderia deixar de vir a esta tribuna, comemorando esta data tão importante, em um momento de reconhecimento para tanta gente que tem, na sua história, tantas lutas acumuladas. A melhor e maior de todas as heranças que vocês podem deixar para aqueles que os sucederão é a história da dignidade, a história da luta e a história das conquistas.
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Neste momento, eu quero falar um pouco sobre a situação da mulher, destacar sobretudo a situação da mulher negra. Sei que estou falando aqui para quem mais entende do assunto, não do ponto de vista da teoria, mas do ponto de vista da vivência do dia a dia. Além da desigualdade de gênero, pesam sobre as mulheres negras os preconceitos e opressões que são peculiares à sua cor, tornando duplamente árdua a sua luta e difíceis de transpor os obstáculos para seu empoderamento e para sua plena inserção nos espaços sociais.
Na semana passada, nós tivemos uma das mais belas atividades, e eu tive a alegria de poder falar em um caminhão de som. Nos últimos anos em que eu estive em Brasília, esta foi uma das mais belas e emocionantes atividades de que eu participei: a Marcha das Mulheres Negras.
(Palmas.)
Eram milhares. Emocionante por quê? Porque eu me dirigi à Marcha, Senadora Lúcia Vânia, depois do que aconteceu. Nós estávamos em sessão do Congresso Nacional - Senadores e Senadoras, Deputados e Deputadas -, no plenário da Câmara, quando a Deputada Benedita chegou e relatou o que havia acontecido com as mulheres na Marcha. Elas haviam sido ameaçadas, Senador Cristovam, agredidas, por uma meia dúzia de pessoas que não sabem sobre - porque não respeitam - a democracia do Brasil. Imagino que não respeitam, porque não sabem o que significa a democracia, o quão importante ela é para a convivência das diferenças em nossa sociedade.
Aquele pronunciamento da Deputada Benedita comoveu todos. Todos foram apoiar e exigir a intervenção e a fiscalização, que foi feita prontamente, tanto que aqueles, aspas, "ativistas" não do bem, mas do mal, foram retirados do gramado, logo em seguida à agressão que fizeram às mulheres negras em marcha, vindas do Brasil inteiro.
Logo depois desse episódio, eu fui à Marcha, Senador Paim, e lá, já na rua, com o caminhão andando na Esplanada, elas disseram: "Senadora, fale aqui." Eu não queria nem falar, porque bastava estar lá. Depois de tudo aquilo, daquele sofrimento, daquela agressão, as mulheres cantavam; as mulheres dançavam; as mulheres reivindicavam! Eu falei: Isto é um exemplo para o Brasil, para o mundo inteiro, de como se enfrenta a adversidade com alegria, com unidade!
Esse é o exemplo que vocês dão, no dia a dia, a todos nós! Esse é o exemplo que as mulheres dão também, Senador Paim! (Palmas.)
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Porque nós mulheres somos discriminadas só pelo fato de ser mulher. E a mulher negra sofre duplamente essa discriminação. Estão aí todos dados estatísticos a comprovar o que eu aqui falo.
Como bem lembrou a representante aqui do Escritório da ONU Mulheres no Brasil, Nadine Gasman, uma grande parceira, nós temos, em nosso País, instituições oficiais de combate às desigualdades, como o Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos, e políticas públicas como o Bolsa Família, o Minha Casa Minha Vida, o Pronatec ou o Brasil sem Miséria, que têm sido muito importantes para mudar a situação das mulheres, sobretudo das mulheres negras, e para contribuir para sua inserção igualitária na sociedade.
Porém, a caminhada ainda é extensa. No Brasil, deparamos com o fenômeno do feminicídio, os assassinatos de mulheres, geralmente praticados por parentes ou por parceiros, cônjuges, namorados. Os números são assustadores: de acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), pelo mapa da violência divulgado recentemente, entre 2001 e 2011, estima-se que tenha havido pelo menos 50 mil assassinatos de mulheres no Brasil decorrentes do conflito de gênero, cuja causa é apenas uma: a mulher ser mulher - única causa.
Não por acaso, nós aprovamos um projeto de lei do Senado que foi transformado em lei, a Lei nº 13.104/15, a qual altera o Código Penal para prever o feminicídio como um tipo de homicídio qualificado e incluí-lo no rol dos crimes hediondos. A medida se impunha para que o Brasil abandonasse a 7ª posição - e, segundo o Mapa da Violência, a 5ª posição - infame no ranking mundial de assassinato de mulheres.
Pois bem, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, companheiras e companheiros, 61% desses óbitos foram de mulheres negras. As razões radicam na discriminação que sofrem, em sua posição de fragilidade social e econômica, e no fato de serem, também, as maiores vítimas de todas as facetas da violência de gênero.
Além da violência de gênero a que está exposta, expressa em sua maior intensidade pelo feminicídio, a mulher negra tem menor acesso à educação, à saúde e à renda. Uma situação deveras preocupante e para a qual temos de destinar nossa energia e nossa vigilância.
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Sr. Presidente, Senador Paim, eu gostaria ainda, neste pouco tempo de que disponho, de me congratular com as companheiras que participaram da exitosa marcha. E digo que aprendi muito, Senadora Ana Amélia, porque me comoveu ver, depois de um episódio de agressão, diante de tanto descaso, de tanta discriminação, de tanta falta de reconhecimento, as mulheres unidas, de forma alegre, lutando contra isso tudo. Então, devemos lutar contra as adversidades, contra a discriminação, sendo cada vez pessoas mais generosas, pessoas mais solidárias. É isso que nós precisamos fazer.
E por fim, Senador Paim, quero dizer que essa comenda muito importante entre nós, a Comenda Abdias Nascimento - esse que foi um verdadeiro herói na luta dos negros -, é sem dúvida nenhuma uma demonstração de como nós já avançamos na sociedade. Se hoje está ruim, podemos concluir que o passado ainda era pior. Então, está um pouco melhor. Hoje está um pouco melhor do que ontem.
Mas nós temos que continuar lutando, unidos, homens e nós, mulheres, que, apesar de sermos a maioria da população e termos um grau de escolaridade superior, só ocupamos dez por cento dessas cadeiras. Dez por cento das cadeiras, no Parlamento do País! Ganhamos 30% a menos. Não somos reconhecidas. Nós, mulheres, que somos punidas nessa sociedade capitalista por exercermos a função mais nobre da humanidade, que é a da geração, a da reprodução. Pois bem! A sociedade nos pune por sermos mães, porque muitas vezes, no trabalho, nós não ascendemos à posição de direção porque vamos dar à luz, porque vamos ter que tirar licença-maternidade, porque vamos cuidar dos nossos filhos.
Então, a luta pelo direito dos negros, a luta contra a desigualdade, contra a discriminação de qualquer forma - de gênero, de opção sexual, seja do que for - é uma luta que tem que ser permanente, porque talvez seja, de todas, a primeira e a mais nobre.
Então parabéns, Senador Paim; parabéns a todos e a todas, por esse grande reconhecimento feito pelo Senado Federal.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Senadora Vanessa Grazziotin, pela sua fala.
É com satisfação que eu vou chamar o último Senador inscrito para falar. Em seguida nós vamos para as homenagens, entregar as homenagens.
É com orgulho que eu quero convidar o Senador Cristovam Buarque, que é o autor deste livro: Dez Dias de Maio em 1888. É um livro belíssimo do Senador Cristovam, que está nas mesas, do qual eu tive a alegria de ser convidado para fazer a apresentação. E também o livro Abdias Nascimento: Grandes Vultos que Honraram o Senado, escrito pela grande Elisa Larkin Nascimento. Uma salva de palmas para ela, que escreveu esse livro. (Palmas.)
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Eu tive, a convite de ambos, a alegria de escrever, na contracapa, uma homenagem a ambos. Então, os livros - eu faço questão de que lembrem - encontram-se nas mesas.
Senador Cristovam, com a palavra.
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Bom dia a cada uma e a cada um de vocês.
Permita-me, Senador Paim, cumprimentar, na ordem de importância desta Mesa, Alceu Collares, em primeiro lugar, pela história de luta - pela idade não, porque estamos muito próximos -, pela presença sempre na história deste Brasil. O senhor nos orgulha em estar aqui conosco nesta tarde já começando. (Palmas.)
Eu quero também cumprimentar, de maneira muito especial, o José Vicente, figura por quem eu tenho a maior admiração. Já disse a ele e a muitos que ele é um dos poucos brasileiros que, para mim, é candidato a Prêmio Nobel da Paz, pelo que fez na Universidade Zumbi dos Palmares, que me fez ter uma sensação que me emocionou muito, no dia em que eu fui lá, numa das vezes. (Palmas.)
De repente, eu me senti no estrangeiro. Eu senti que não estava no Brasil e não entendia por quê. Era por que havia negros demais naquela universidade, e isso nós não vemos no Brasil.
Contei a ele e me lembrei, Senador Paim, de que eu, Reitor da Universidade de Brasília, caminhando pela universidade, naquela época, com uma jovem norte-americana, hoje uma senhora, que traduziu alguns livros meus, eu disse, com orgulho, dando a entender, Senadora Ana Amélia, que as nossas universidades são até comparáveis com as americanas - as escolas de base não, mas as universidades são, os prédios: o que você vê de diferente aqui?" Ela olhou assim e disse: "eu não vejo negros". Norte-americana, e havia mais negros lá do que aqui. As cotas estão ajudando bastante a mudar essa realidade. (Palmas.)
Mas o que vai mudar mesmo é quando a educação de base for igual para todos. Aí, nós vamos ver que a população universitária refletirá a demografia brasileira ou, talvez, até haja mais negros ainda, como nós conseguimos com o futebol. No futebol, os grandes craques são negros por quê? Porque a bola é redonda para todos, mas chegam ali os melhores e não os que podem comprar o ingresso para jogar futebol.
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Lamentavelmente, as escolas são quadradas e redondas no Brasil. Se paga, entra na redonda; se não paga, fica numa quadrada, salvo raras exceções.
Quero cumprimentar o Frei David, que tem sido um parceiro. Aliás, eu é que tenho sido parceiro dele nas lutas que ele faz para aumentar o número de universitários negros nas universidades brasileiras.
José Vicente faz isso por um caminho, querendo uma universidade para negros com cota para brancos, desde o começo. Frei Davi o faz, colocando negros em todas as universidades.
Quero cumprimentar o Linduarte pela história, pela vida, pelo que teve aqui.
Quero cumprimentar a Mari Baiocchi, a Fundação Cultural Palmares, mas, sobretudo, o Abdias Nascimento, essa figura fundamental, que nos honra em dar seu nome a esse prêmio. (Palmas.)
Para fechar tudo isso, quero dizer de uma maneira muito simples que o Brasil tem um desafio que, para mim, é fundamental: fazer uma mente diferente da mente do Brasil de hoje. Lembro-me de um livro que me impactou muito quando o li, que era A Mente da África do Sul. A África do Sul tinha uma mente, que era a mente do apartheid. Os povos têm mentes, como as pessoas as têm também. O Brasil tem uma mente, e temos de mudar a nossa mente. A nossa mente tem de ter mais sentimento nacional. Estamos muito divididos em corporações isoladas, cada uma querendo sua parte. Deve haver uma perspectiva de longo prazo. Nossa mente é muito imediatista, consumista.
Temos de valorizar a educação, a nossa mente brasileira. Nós brasileiros não valorizamos a educação - vejo aqui o Rafael -, como Cuba a valoriza. Nós não a valorizamos, como a Europa a valoriza. Não é questão de socialismo, mas de capitalismo também. Os orientais a valorizam, e nós não a valorizamos. Aqui, quando alguém paga um dinheirão para ter uma boa escola para o filho, não está querendo uma boa educação, está querendo é que, depois, o filho ganhe um bom salário com aquela educação. Por isso, todo mundo quer um bom professor para o filho, mas ninguém quer o filho sendo um bom professor para o filho dos outros.
Precisamos valorizar a educação, precisamos ter uma mente solidária, precisamos ter uma mente que respeita a diversidade. Mas há um ponto além desse: precisamos ter, meu caro Alceu, uma mente que faça com que nos orgulhemos da nossa negritude. Não basta fazermos o que não fizemos ao longo de séculos, que é respeitar os negros.
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Não basta isso. É preciso que eu me sinta negro também. É preciso que cada brasileiro tenha orgulho de ser também negro, não na raça, pois nossos pais não deixaram. É preciso sentir a negritude na maneira como vê o mundo e na maneira como gosta de certas músicas, e não de outras; como gosta de algumas danças, e não de outras; como pinta de uma forma, e não de outra. O orgulho da negritude tem de ser algo que perpasse todos os brasileiros. Os que são brasileiros e negros, com mais razão ainda, plenamente, têm de ter orgulho da própria raça. Eu não posso ter esse orgulho, mas posso, como brasileiro, ter orgulho da minha cultura e reconhecer que minha cultura tem traços, obviamente, da branquitude ocidental, que tem muitas qualidades também. A minha cultura carrega em si influência negra, mas não basta eu reconhecer isso, tenho de me orgulhar disso.
Um prêmio como este ajuda a dizer ao Brasil inteiro: nós, todos os brasileiros, somos negros e nos orgulhamos disso também. Lamentamos até, alguns de nós, que não tenhamos a cor da pele negra. Outros podem não se preocupar com isso, mas, na cultura, na maneira de ser, na maneira de pensar, nossa mente não apenas é também negra, mas precisa se orgulhar disso. Ela ainda não se deu conta dessa realidade e, ao não se dar conta disso, Senador Paim, não se orgulha disso.
Eu vim aqui para dizer que minha participação, como membro do Conselho deste prêmio, deu-se, sobretudo, para poder ajudar o Brasil a formar essa nova mente com tudo aquilo que eu disse e também a formar uma mente em que haja orgulho da negritude da própria mente dos brasileiros.
É isso, Senador Paim.
Muito obrigado por me ter aqui. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Neste momento, vamos entregar aos homenageados a sua placa. Em seguida, os homenageados terão direito à palavra.
Digo a melhor forma que, combinado com a Mesa, encontrei de fazer esta homenagem: como há três Senadores no plenário, eu convidaria os três Senadores a subirem aqui na frente - eu estarei junto -, para nós quatro entregarmos a todos as placas, já que todos já falaram da tribuna e fizeram suas referências.
Então, neste momento, convido os três Senadores para virem aqui na frente.
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Peço ao Senador Cristovam que retorne agora ao plenário. E, aqui da frente, vou também me deslocar.
Os quatro Senadores estão aqui.
Então, neste momento, convido Alceu Collares a vir aqui, na frente - eles vão tirar uma foto -, para receber a placa.
Você vai receber a placa dos quatro Senadores.
Convido a Senadora Ana Amélia para ser a portadora da placa, em nome dos três Senadores gaúchos e de todo o Senado.
Senadora Ana Amélia, por favor! (Palmas.)
Muito bem! Agora, Alceu Collares retorna para seu lugar de origem.
Convido o Frei David.
Frei David, permita-me entregar-lhe a placa, porque sei que o Senador Cristovam faz questão de entregá-la ao José Vicente. (Palmas.)
Convido o José Vicente.
Senador Cristovam, por favor, pode pegar a placa. (Palmas.)
Convido, agora, a Mari Baiocchi.
Convido a Senadora Lúcia Vânia, que foi quem a indicou. (Palmas.)
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Representa aqui o Sr. Carlos da Silva Santos, em memória, a filha do homenageado, Srª Neiva Maria Santos da Silva.
Convido a Senadora Ana Amélia para ficar aqui do lado. Foi em nome dos três Senadores gaúchos que fizemos essa proposta. (Palmas.)
Representa aqui o Sr. Linduarte Noronha, em memória, o filho do homenageado, Sr. Leonardo Henrique Ponce Leon Noronha de Oliveira.
Senadora Lídice da Mata, por favor! (Palmas.)
Agora, convido a representante da Fundação Cultural Palmares, a sua Presidenta, a companheira Cida, presente na Mesa neste momento.
Como todos os Senadores já entregaram as placas, ninguém vai ficar com ciúme se eu convidar o Senador Collares, numa deferência especial, para fazer essa entrega. (Palmas.)
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Peço aos Senadores que retornem aos seus lugares, porque agora concederemos a palavra aos convidados. (Pausa.)
Neste momento, passamos a palavra, como forma, inclusive, de homenageá-la, à Diretora Presidente do Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros, viúva do Senador Abdias Nascimento, Srª Elisa Larkin Nascimento. Ela falará em primeiro lugar, em nome da Mesa.
A SRª ELISA LARKIN NASCIMENTO - Senador Paulo Paim, é uma grande honra estar aqui mais uma vez, como tive a honra de aqui estar no ano passado, na primeira outorga desta Comenda, que tanto nos emociona, não apenas como viúva de Abdias Nascimento, mas como uma ativista, uma pessoa mais do que convicta e que viveu, junto a ele e junto aos negros brasileiros, no meu País, a luta de combate ao racismo.
Eu gostaria de cumprimentar cada um dos que estão na Mesa, cada um dos agraciados. De cada um deles eu poderia dizer uma história de convivência, mas isso levaria muito tempo.
Eu gostaria de lembrar aqui dois momentos. Primeiro, em 1981 e em 1982, recém-chegados do afastamento de Abdias do País em razão da ditadura militar, nós estávamos, junto com o então Deputado Alceu Collares, construindo o PTB, que, depois, quando perdemos a legenda, teve de assumir a legenda do PDT, muito honrosamente.
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Ao mesmo tempo, o Abdias vinha do exterior, de uma série de lutas. Uma delas foram os três Congressos de Cultura Negra das Américas. O primeiro foi, em 1977, em Cali, na Colômbia; e o segundo, em 1980, no Panamá. Foram os primeiros grandes eventos que reuniram os negros nas Américas - Caribe, América Central, América do Sul e também América do Norte - para cuidar das suas questões e da cultura.
No segundo congresso, no Panamá, Abdias lançou, em um trabalho apresentado, a sua tese do quilombismo, que hoje é discutida e é uma referência para todos. O próprio Governador Alceu Collares acabou de se lembrar do título O Quilombismo. E a Fundação Palmares publicou, em 2002, a segunda edição desse livro O Quilombismo, de Abdias Nascimento.
Ele foi eleito Vice-Presidente, no segundo congresso, no Panamá, para organizar o 3º Congresso de Cultura Negra das Américas, que teria lugar aqui, no Brasil. Só que o financiamento desses dois congressos havia sido da OEA (Organização dos Estados Americanos) e também da Unesco. Naquele tempo, para você conseguir algum apoio desses dois organismos internacionais, era necessário encaminhar a documentação do projeto através do governo do país. E o governo brasileiro, naquele momento, recusava-se a encaminhar para a Unesco e para a OEA os papéis do projeto para a realização desse 3º Congresso de Cultura Negra das Américas no Brasil.
O Deputado Alceu Collares levou essa causa à tribuna, fez tudo o que pôde, junto com outro Deputado do PDT, o José Frejat. Eu me lembro do belo pronunciamento. Nós temos, na nossa revista Afrodiáspora, do Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros, que saiu em seis números, o texto desse pronunciamento. Então, esse é só um momento que eu queria lembrar.
Mais tarde um pouquinho, há exatos 30 anos, em 1985, Senador Paulo Paim, foi um momento em que o Abdias, ainda Deputado - ele foi Deputado na legislatura anterior à Constituinte -, levou à Câmara dos Deputados a proposta de que o dia 20 de novembro fosse o Dia Nacional da Consciência Negra e feriado nacional. Esse foi um dos seus projetos que conseguiu passar por todas as comissões e depois ser aprovado pela Câmara dos Deputados e seguir para o Senado.
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Em 1985, o dia 20 de novembro foi o dia em que Abdias junto com o Ministro da Cultura Aluísio Pimenta e outras autoridades, inclusive com o Prefeito de União dos Palmares e o então Governador de Alagoas, subiram a Serra da Barriga e ali foi feita a assinatura da homologação do tombamento da Serra da Barriga.
Esse foi um momento extremamente importante para todo o movimento negro simbolicamente e, de forma muito concreta, mostrou como o movimento negro conseguia repercussão da sua causa no plano nacional, no Brasil. Mas, naquele mesmo momento, aqui, no Senado Federal, onde o projeto também havia passado por todas as comissões e havia sido aprovado - e havia um acordo de Lideranças para que fosse aprovado -, levantou-se um Senador, cujo nome nem merece ser lembrado, que foi contra e conseguiu derrubar a aprovação daquele projeto naquele momento.
Nós estamos, exatamente neste momento, no Ipeafro, fazendo o tratamento técnico da documentação referente ao trabalho dele na Câmara dos Deputados. Eu li o discurso dele desse dia 20 de novembro. Como o Abdias fazia um discurso comovente! Não sei se o nosso Deputado, Governador, Senador Alceu Collares concorda comigo, mas até a leitura do texto foi bastante emocionante, sobretudo neste momento.
Ele continuou junto com os colegas, junto com os companheiros do movimento negro e conquistaram, daí a um ano, em 1986, a criação da Fundação Palmares, criada basicamente como continuação de uma assessoria de cultura afro-brasileira, que nasceu também da comissão que foi criada para a comemoração do Centenário da Abolição da Escravatura, em 1988, que coincide exatamente com a Assembleia Nacional Constituinte.
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Eu trago essas duas lembranças de fatos históricos aqui para nos lembrar do quanto José Vicente, Frei David, Cida Abreu, Alceu Collares, Mari Baiocchi - eu fico muito contente de poder estar na Mesa contigo - e os dois agraciados in memoriam... O Carlos Santos Silva está num texto que eu escrevi sobre o negro no Parlamento Federal. Lembro-me muito bem dele.
Quero dizer que o fato de podermos homenagear vocês com o nome de Abdias Nascimento certamente é o coroamento de algo que sempre caracterizou a expressão dele, que foi a referência aos outros. O Abdias era uma pessoa que sempre trazia, nas falas dele, a referência às figuras históricas que o precederam e aos companheiros que lutaram junto com ele.
Então, muito obrigada por este momento, Senador Paulo Paim. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Nós que agradecemos à Diretora Presidente do Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros e viúva do Senador Abdias Nascimento.
Passamos a palavra, neste momento, ao Frei David. Não precisamos ler novamente o seu currículo aqui.
Só lembro, permita-me, Srª Elisa Larkin Nascimento e também Cida Abreu, Presidente da Fundação Palmares, que o Carlos Moura foi fundamental na época. Eu daria uma salva de palmas para o Carlos Moura no momento da criação da Fundação Palmares. (Palmas.)
O SR. FREI DAVID - Senador Paim, demais Senadores e demais assistentes, eu partilho com vocês uma dor: de ontem até hoje não consegui dormir. A crise foi grande e por várias vezes pensei: não vou receber esta comenda, não vou receber.
Acho que, enquanto o Congresso Nacional não levar a sério o povo, fazendo uma reforma política justa e honesta, não dá para nós botarmos azeitona em pastel dos outros. Depois pensei: não, há muita gente boa no Senado e eles não merecem isso, como o Senador Paim e outros mais. E pensei mais: não conheço nenhum país que saiu da ditadura e foi para a democracia sem primeiro enfrentar, com coragem, a corrupção! Não conheço!
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Com muita dor, ao mesmo tempo, transformo a dor em alegria. Esse choro agora é de alegria por saber que o Brasil, tendo coragem de enfrentar a corrupção, e o STF, tendo coragem de prender aquele que parecia ser o homem mais honesto entre os Senadores, estão provando que o Brasil está entrando na linha. Por isso, recebo esta comenda em homenagem a todos os bons brasileiros que compõem esta Casa, mas eu peço a esses bons brasileiros que contagiem os demais. É impossível esta Casa permitir que esse péssimo trabalho feito por alguns manipuladores da Câmara passe aqui, que é essa coisa chamada de arremedo de reforma partidária. Aquilo não é coisa séria, não é coisa séria!
Faço um apelo aos bons Senadores, faço um apelo a esta Casa para ver a possibilidade de ainda fazer uma convocação de uma Constituinte exclusiva para a reforma político-partidária. Por amor a Deus, por amor ao Brasil, não permitamos uma reforma meia-boca! Queremos uma reforma verdadeira e profunda!
Não podemos dizer e negar que a OAB, a CNBB, a Educafro e dezenas de entidades elaboraram uma minuta de reforma que infelizmente a Câmara Deputados, através do Presidente - que não tem sensibilidade popular com os que lutam por um Brasil melhor -, não permitiu que prosperasse no debate, nem a aceitou para debater. Então, eu faço um apelo ao Senado para que acolha a proposta feita, com muita dor, no Brasil inteiro, pela OAB, pela CNBB e por muitas outras entidades.
Falo de coração: recebi a comenda com crise, mas, ao mesmo tempo, com um compromisso de falar para o meu povo negro, de falar para o meu povo brasileiro que, se não houver mudança, eu vou devolver a comenda. Se não houver mudança, eu vou devolver a comenda.
Primeira mudança fundamental: haver reforma política séria e honesta. Segunda mudança: não aceitar que a nossa Casa querida, o Senado, meus irmãos Senadores queridos e firmes, vote a favor da maioridade penal. Queremos que vocês votem contra esse absurdo!
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Nenhum país que reduziu a maioridade penal resolveu o problema. Pelo contrário, dois deles voltaram atrás. E todos os países em que o menor só é punido após os 18 anos têm tempo integral de escola. A única maneira de resolver o problema do menor é dar a ele a dignidade do tempo integral, com educação de qualidade.
Eu prometo não devolver a comenda se meus irmãos Senadores revirem e não permitirem essa vergonha inaceitável que é a mulher negra brasileira ganhar menos que a metade da mulher branca. Isso se repete ano a ano. E nada foi feito para combater esse racismo institucionalizado.
Não devolverei a comenda se o nosso querido Senado for contra a bancada da bala e não deixar que o auto de resistência fique engavetado. Queremos que essas leis estaduais maldosas que a Constituição não recepcionou, chamadas auto de resistência, que é o direito de o policial matar jovens negros e brancos pobres, sejam revogadas no Brasil inteiro, em todos os Estados.
Que o Senado vote a favor das terras indígenas e quilombolas. É inaceitável que este Senado permita esse absurdo que a Câmara está bolando e querendo aprovar lá, que é maltratar os indígenas e os negros, roubando suas terras para o agronegócio e para a especulação.
Concluindo, Senador Paim, eu peço desculpas por ter desabafado. Concluindo, eu peço que esta Casa chamada Senado, por favor, honre esse povo negro. Somos 53,7% do Brasil. No entanto, o Congresso teve a coragem, bonita, linda, de aprovar cota para mulheres, mas nem admitiu botar em pauta a cota para negro ser Deputado e ser Senador. Isso é uma afronta a nós negros. Isso é uma afronta a 53,7% do povo brasileiro.
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Senadores e demais convidados, rezei muito ao longo dessa vinda para cá e cheguei atrasado inclusive aqui, porque a minha intenção era não receber a comenda. No entanto, vendo toda a conjuntura, avalio isto: recebo na condição de devolver se essas pautas fundamentais do povo negro, se a pauta fundamental do Brasil, que é reforma política honesta, justa, reforma política que realmente suspenda... Todos os partidos políticos devem convocar uma Constituinte para fazer isso, pois não podem ser esses Senadores nem esses Deputados para fazer reforma política - vigiar o próprio ninho de ovos, não tem condições. Então, pelo amor de Deus, façamos isso. A Comenda está recebida. Vou guardar com carinho e amor. E, em homenagem e pela memória do Abdias Nascimento, esse grande homem, se o Senado continuar permitindo passar aqui absurdos, vou devolver a Comenda, em data a ser marcada.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Esse foi o Frei David.Muito bem, Frei David.
Agora, passamos a palavra ao ex-Governador Alceu Collares.
O SR. ALCEU COLLARES - Presidente Paim, eu quero saudar a Senadora Ana Amélia, o Senador Lasier Martins e V. Exª, Paulo Paim, por terem feito a indicação do meu nome para que eu aqui comparecesse para receber esta homenagem do Abdias.
Abdias foi meu companheiro de Partido. Ele era trabalhista, brizolista, socialista e teve, sem dúvida alguma, uma influência muito grande não apenas como militante do PDT, mas como Deputado Federal e também, depois, como Senador.
Dos livros do nosso companheiro Abdias, todos com muito conteúdo, com muita substância, com muitas ideias, com muitos projetos, o mais avançado deles é o livro sobre o quilombismo. O quilombismo é uma forma de governo em que se verificam o socialismo democrático e a propriedade da terra coletiva, alterando profundamente isso que é estrutura capitalista do mundo.
Eu vou declamar um poema meu e pedir aos companheiros, através das suas entidades, se assim resolverem, que tentem fazer a chegar a cada negro, a cada negra no Brasil um instrumento que possa despertar na consciência de todos que cada um de nós tem uma responsabilidade, que cada um de nós tem que participar.
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Se somos perseguidos, se somos vítimas da escravidão, como fomos ao longo do tempo, o que ainda perdura em muitas partes do próprio País, também temos que ter consciência política - e é exatamente isso o que está se discutindo - no sentindo de que nós podemos. Nós os negros e as negras podemos. Se nós os negros e as negras podemos, está faltando é realizar, é fazer, é avançar, é participar, é conscientizar, é ter, sem dúvida alguma, no dia a dia, a vontade de transformação. Não nos basta uma tribuna. Não nos basta um discurso. O que nós temos que fazer é transformar o dia a dia em instrumento de luta. E não há segmento que tenha mais razões ou razões mais profundas para um grande movimento, transformando-o em uma revolução, do que o negro e a negra, porque o nosso sangue é cravado de injustiças, de maldades. É por isso que nós temos condições não só pelo Brasil, mas também pelo nosso povo, que está enterrado nos confins da injustiça social que sofremos.
Eu vou declamar um poema que eu fiz há um longo tempo, mas eu vou pedir aos companheiros, principalmente da Fundação, que, se acharem que tem conteúdo, que tem mensagem, que é possível chegar à consciência do negro, para que não se satisfaçam apenas com o discurso, mas também com a participação. Os partidos estão aí, quase todos eles fragilizados, mas não há democracia sem partidos políticos. Todos nós os negros, tendo consciência do nosso poder e da nossa força, vamos escolher um deles e vamos começar a fazer uma revolta lá dentro dos partidos, com a presença nossa, no cotidiano de cada atividade.
[Negro]
Mandam no teu destino.
Mas ele é teu, meu irmão.
Ergue teus braços finos
E acaba com a exploração
Faz tua revolução!
O voto é tua única arma.
Põe teu voto na mão.
O voto é tua única arma.
Põe teu voto na mão.
O voto é tua única arma
Põe teu voto na mão.
[Negro]
Tua casa está caindo;
Pouca comida tem no fogão;
Tua mulher está mal vestida;
Teu filho de pé no chão.
Faz tua revolução!
O voto é tua única arma;
Põe teu voto na mão.
O voto é tua única arma;
Põe teu voto na mão;
O voto é tua única arma;
Põe teu voto na mão.
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Cristianismo, judaísmo, [islamismo];
Todos querem a tua salvação.
Tu rezas noite e dia,
Ninguém ouve a tua oração.
Faz tua revolução!
O voto é tua única arma;
Põe teu voto na mão
O voto é tua única arma;
Põe teu voto na mão.
O voto é tua única arma;
Põe teu voto na mão.
Cristianismo, judaísmo, [islamismo];
Todos querem a tua salvação.
Tu rezas noite e dia,
Ninguém ouve a tua oração.
Faz tua revolução!
O voto é tua única arma;
Põe teu voto na mão.
O voto é tua única arma;
Põe teu voto na mão.
O voto é tua única arma;
Põe teu voto na mão.
[Negro]
Construíste, com teu trabalho.
Toda riqueza desta nação;
Por justiça, tens o direito;
Vai pegar o teu quinhão.
Faz tua revolução!
O voto é tua única arma;
Põe teu voto na mão.
O voto é tua única arma;
Põe teu voto na mão.
O voto é tua única arma;
Põe teu voto na mão.
A liberdade é o pão do espírito;
Do corpo, a liberdade é o pão.
Desperta pra luta, amigo;
Faz tua revolução.
O voto é tua única arma;
Põe teu voto na mão.
O voto e tua única arma.
Põe o teu voto na mão.
O voto é tua única arma.
Põe teu voto na mão
O processo que nós vamos fazer tem que ser trabalhado na consciência de cada um. Há aí uma mensagem, para nós acreditarmos na nossa condição de cidadão. Só nós negros e negras temos um poder revolucionário muito grande, porque ele é construído em cima da injustiça social que nós sofremos! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Sempre Deputado Federal e sempre Governador, Governador Alceu Collares! Falou pouco até, meu Governador!
O SR. ALCEU COLLARES (Fora do microfone.) - Vamos fazer a revolução! (Risos.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Esse foi o nosso querido ex-Governador, sempre Deputado Federal, Alceu Collares.
Agora, chamamos para usar a palavra, a Presidenta da Fundação Cultural Palmares, Srª Cida Abreu, com a presença aqui dos Carlos Moura, o primeiro Presidente da Fundação Cultural Palmares. (Palmas.)
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A SRª CIDA ABREU - Eu quero, em primeiro lugar, Paim, Senador e Presidente desta sessão solene, dizer que estou muito feliz de falar depois do nosso Governador Alceu, porque eu sou produto dessa luta, Senador.
Governador, eu fui empossada pelo movimento negro por quem está aqui e que foi o primeiro Presidente da Fundação Cultural Palmares e hoje divide comigo o pensamento, o Dr. Carlos Moura. (Palmas.)
Presidindo hoje a Fundação Cultural Palmares, com um quadro formado por essas pessoas que acreditaram na filiação de um partido e entenderam que a revolução estava a partir da nossa participação política, eu fico extremamente honrada de estar hoje aqui representando essa organização institucional de governo.
Eu quero também pedir aqui licença para cumprimentar os servidores em nome da Dª Edir, que queria que ficasse de pé. É uma funcionária de 27 anos da Palmares. (Palmas.)
Em nome da Dª Edir, em nome dos servidores da Fundação Cultural Palmares, eu quero dizer que eu tenho a honra de receber a mais alta comenda representada por um negro na Casa do Congresso Nacional, no Senado Federal.
Eu entendo que a Fundação Cultural Palmares reúne todas as representações que estão não só na mesa, mas também na nossa plateia. É uma instituição que nasce, como rememorou e revisitou a Elisa, de uma luta de negros e negras para ter no espaço público um órgão que tratasse do tema das relações étnico-raciais. E a Fundação Cultural Palmares nasce do tombamento do maior e do mais importante espaço na América Latina de resistência negra, que é a Serra da Barriga, o Quilombo Zumbi dos Palmares. A Fundação não nasce de uma vontade alheia, ela nasce de uma resistência. Então, é importante entender que, em 1986, quando se tomba a Serra, se cria uma assessoria para que cuidasse da serra. E posteriormente, em 1988, ela se torna uma autarquia do Governo Federal que, até hoje, representa com muita propriedade e respeito os territórios quilombolas, os territórios de matriz africana, os territórios indígenas e a cultura urbana não só da metrópole, mas principalmente da periferia, que é onde está a cultura contemporânea que fala da realidade de uma sociedade.
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Eu acho que o primeiro cumprimento que eu quero dar é à memória de Zumbi, aos ancestrais. Eu quero também aqui cumprimentar a memória de Abdias, cujas cinzas descansam na Serra da Barriga. Suas cinzas descansam num patrimônio cultural ancestral de cem anos de resistência contra a escravidão e que deu origem a essa instituição, hoje aqui homenageada com o seu nome. Então, isso é para entender um pouco a história de como se constrói também a legitimidade da representação negra e das manifestações culturais no Brasil.
Quero cumprimentar a todos os Senadores e Senadoras que estão aqui presentes.
Quero cumprimentar também o Zulu Araújo, que esteve aqui. Não sei se todo mundo viu, mas ele esteve e me fez um cumprimento, de abraço, de longe. Foi também um Presidente da Fundação Cultural Palmares, um baiano que muito fez pela cultura afro-brasileira.
Eu acho que a nossa proposta, hoje, de receber a comenda, a principal homenagem aqui no Senado Federal, só reafirma o papel estratégico e fundamental dos órgãos que cuidam das relações raciais no Governo.
Sabemos que, mesmo sendo 51%, 52%, 57% da população brasileira, a população negra é a maioria. É por isso que eu quero de novo me remeter à fala do nosso Governador Alceu, sobre a maioria que tem que se apropriar do seu voto, que tem de se apropriar da mudança - é o que ele disse aqui - e que tem que se apropriar do seu patrimônio, que é o território brasileiro, porque, enquanto nós não fizermos essa revolução da mudança de conceito, de pensamento e de representação, essa propriedade vai estar em risco.
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É por isso que esses espaços do Senado e da Câmara Federal são importantes, para reafirmar e para que a gente, na tribuna - que é o único lugar que por enquanto nós temos para falar -, possa dizer, como representante da Fundação Cultural Palmares, que nós estamos vivos, que a cultura afro-brasileira está viva e ela está nos territórios contemporâneos e tradicionais para dizer que a população negra brasileira e a população negra escravizada africana no Brasil deram origem a esse cenário de visibilidade que o nosso País tem. Então, essa consciência e essa deferência têm que se dar à população negra.
Nesta Casa, que, comemorando o mês da consciência negra, de tantas lutas, vem reafirmar, a partir dessas sessões, a partir de várias atividades, nós queremos aqui afirmar também que nós estaremos firmes na trincheira até que a revolução da mudança possa ser feita.
Eu quero terminar dizendo a vocês que a Fundação Cultural Palmares, após o 20 de novembro, que foi o primeiro 20 de novembro que eu dirigi, estando à frente da Fundação Cultural Palmares, vai indicar ao IPHAN a cidade de União dos Palmares para ser patrimônio nacional e vai indicar à Unesco a Serra da Barriga para ser patrimônio da humanidade. (Palmas.)
Dessa forma, nós poderemos garantir, na história e nos espaços institucionais, não só no Brasil, mas fora dele, o respeito, a conservação à memória, à oralidade, ao simbólico e à matriz africana, que é o que faz, que é o que justifica e que é o que sustenta a Fundação Cultural Palmares.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem.
Essa foi a Presidenta da Fundação Cultural Palmares, Cida Abreu, que rendeu homenagens também ao nosso querido Moura, primeiro Presidente da fundação, velho companheiro de guerra, articulador da criação da fundação, ainda na época do ex-Presidente Sarney. Eu estive junto com você lá.
Agora, eu queria passar a palavra ao Reitor da Universidade Zumbi dos Palmares, o nosso querido amigo José Vicente.
(Soa a campainha.)
O SR. JOSÉ VICENTE - Exmo Senador da República Paulo Paim, na pessoa de V. Exª, eu quero transmitir os mais efusivos cumprimentos de amizade, estima e consideração de cada um dos membros da comunidade acadêmica da Universidade Zumbi dos Palmares, de cada um dos membros da Sociedade Afro Brasileira de Desenvolvimento Sócio Cultural (Afrobras).
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Peço licença a V. Exª para estender os cumprimentos também aos Exmos Senadores e Senadoras que fizeram uso da palavra, que compõem essa comissão especial e que também fizeram a indicação minha e dos colegas, na pessoa da Senadora Lídice da Mata, na pessoa da Senadora Ana Amélia, da Senadora Lúcia Vânia, da Senadora Vanessa Grazziotin e do Senador e amigo de sempre Cristovam Buarque, a quem coube a honra de ser indicado para competir a essa comenda importantíssima.
Peço também a licença a V. Exª para transmitir um abraço de amizade, de afeto, à minha querida amiga Elisa Larkim, viúva do Senador Abdias Nascimento, com a qual, ao longo dessa trajetória, trabalhamos e realizamos discussões importantes dentro desse tema e cuja grandeza e dedicação ao nosso tema, Sr. Senador e Presidente, permitiram que tivéssemos, há aproximadamente 15 dias, um dos grandes acontecimentos dentro desse tema, na cidade São Paulo, no Estado de São Paulo, que foi viabilizar a presença do Prêmio Nobel de Literatura, Wole Soyinka, que esteve conosco ao longo desses três dias. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Você o trouxe, inclusive, à Comissão de Direitos Humanos. Foi importantíssimo.
O SR. JOSÉ VICENTE - Também.
Wole Soyinka, um prêmio Nobel negro, nigeriano, que veio ao Brasil, em São Paulo, para nos estimular e para mostrar que não existe obstáculo quando existe trabalho e crença na capacidade de superar.
Quero pedir também licença a V. Exª para fazer uma saudação muitíssimo especial a esse que, seguramente, é a referência de todos nós, que é o nosso queridíssimo Governador Alceu Collares. (Palmas.)
Dentre as possibilidades que a vida me ofertou, Senador, uma foi poder fazer uma pequena celebração em homenagem a grandes personalidades que abriram o caminho e que permitiram que pudéssemos chegar, inclusive, a essa tribuna hoje. E uma delas, satisfatoriamente, foi ao nosso Alceu Collares, o primeiro a receber o Troféu Raça Negra, na cidade de São Paulo.
Quero também dizer que essa comenda, esse reconhecimento, essa premiação, compartilho com cada um dos negros paulistas.
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É bom frisar que Abdias Nascimento era um paulista, de Franca. É bom frisar que a luta de Abdias começou em São Paulo. E é bom frisar que foi por ali que ele estimulou a todos para que pudessem um dia ter coragem de lutar a luta que precisasse ser lutada.
Nós, em algum momento, compreendemos que tínhamos uma obrigação e um dever de fazer mais por nós, pelas nossas futuras gerações, pela nossa cidade, pelo nosso Estado, e mesmo pelo nosso País.
E, nesse dia, nós, os negros paulistas - e podemos dizer os negros de todas as cores paulistas, porque, no nosso grupo e no nosso trabalho, negros e brancos juntam-se na mesma direção - imaginamos que pudéssemos contribuir com o nosso tema se criássemos uma instituição de ensino superior onde todos pudessem participar do processo civilizatório e libertador da mente; onde todos pudessem construir um novo caminho para os corações, e onde todos, irmanados, pudessem construir um novo cidadão, um novo indivíduo, em que o valor da diferença não fosse obstáculo, em que o caráter e o sentido de defesa à dignidade da pessoa humana pudessem ser o norte e pudessem fazer com que isso se constituísse o combustível da sua luta e do seu trabalho.
Para isso, criamos uma instituição de ensino, e essa instituição de ensino nós nomeamos com a nomenclatura daquele que nos antecede e daquele que construiu o caminho, que foi Zumbi dos Palmares.
Hoje, quando completamos 15 anos; hoje, quando nós já colocamos mais de três mil jovens negros formados, nós queremos, com esta premiação, dizer muito obrigado aos Senadores da República, que permitiram que este trabalho se concretizasse, que este trabalho cumprisse seus objetivos e que, nesta tarde, este trabalho fosse reconhecido, de modo que, em nome de toda a nossa comunidade acadêmica, na pessoa de V. Exª, quero dizer muitíssimo obrigado a todos os Senadores da República e quero também cumprimentar cada um dos meus colegas, que, como eu, recebem esta comenda nesta oportunidade.
Em nome dos jovens negros paulistas, em especial, queremos dizer que estamos felizes e honrados por esta distinção.
Muitíssimo obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem.
Este foi o Reitor José Vicente, da Universidade Zumbi dos Palmares.
Agora, passamos a palavra à Profª Mari Baiocchi, que vai falar aqui da Mesa. O microfone já está ligado.
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A SRª MARI BAIOCCHI - Serei breve. Quanto à oportunidade, agradeço nesta sessão ainda, a esta Casa a outorga da Comenda Abdias Nascimento.
Destaco para meus agradecimentos a ilustríssima Senadora Lúcia Vânia; o Exmo Presidente da Mesa, Paulo Paim, que foi o Presidente da comissão e que está presidindo esta Mesa; todos que possibilitaram que o trabalho fosse feito, que as pesquisas fossem realizadas e que eu pudesse repassar às comunidades alguma coisa de útil e de conquistas sociais que elas mereciam.
Agora, quero referendar duas coincidências que me comoveram muito nessa Comenda Abdias Nascimento.
Eu conheci Abdias no Teatro Experimental do Negro, nos anos 1950, no Rio de Janeiro, que, juntamente com Maíte, uma sua colega, montava uma peça. Ensaiavam na UNE (União Nacional dos Estudantes).
Mais tarde, precisando de apoio para os kalungas, dirige-me a Brasília. A quem? A Abdias Nascimento. Então, por dois momentos Abdias entrou na minha história de vida.
Então, onde você esteja Abdias, meu agradecimento a você também.
E outra coincidência do prêmio é que o Senador aqui presente chama-se Paulo Paim. Aí me lembrei de que a primeira comunidade em que trabalhei, que pesquisei, em que tivemos algumas conquistas importantes, como a questão fundiária, foi Cedro, no sul de Goiás, no sudoeste goiano.
Quando, nos anos 1980, lancei o livro Negros de Cedro, contando a história da comunidade, quem escreveu o artigo, discutindo o livro? Isaías Paim.
Então, dois Paim estão na minha história de vida hoje.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Quer dizer, um Paim incomoda muita gente, dois Paim incomodam muito mais.
Mas incomoda, não me estou elogiando.
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A SRª MARI BAIOCCHI - À ilustríssima e querida Lúcia Vânia, Senadora pelo nosso Estado, o meu profundo agradecimento pelas suas palavras. Estou muito comovida.
Como o tempo urge, não vou estender-me mais.
Muito obrigada a todos, aos colegas de Comenda, a todos aqui presentes, e a Carlos Moura.
(Soa a campainha.)
A SRª MARI BAIOCCHI - Eu não me esqueci, Carlos Moura, de quando batalhávamos pela Fundação Palmares, pela sua criação, em 1984, 1985, 1986. Eu estive na criação da fundação e lembro-me de você.
Agradeço também aos meus filhos e aos meus netos que me acompanharam.
É só o que tenho a dizer. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Profª Mari Baiocchi.
Meus cumprimentos pela sua fala, que lembrou um pedaço da história de todo o nosso povo, inclusive a vida e a relação do Abdias.
Agora, representando o Sr. Carlos da Silva Santos, in memoriam, a filha do homenageado, Srª Neiva Maria Santos da Silva.
A SRª NEIVA MARIA SANTOS DA SILVA - Boa tarde a todos.
Cumprimento o Exmo Sr. Senador Paulo Paim, Presidente do Conselho da Comenda Senador Abdias Nascimento; a Exma Srª Senadora Ana Amélia Lemos; o Exmo Sr. Senador Lasier Martins; as autoridades e os demais presentes.
Agradeço aos Senadores gaúchos pela indicação da homenagem prestada em memória ao meu pai, Carlos da Silva Santos.
O que poder-se-ia dizer sobre ele? Que foi exemplo de homem público, sem nunca deixar macular sua imagem durante todo o período em que exerceu, com dignidade, a vida pública, como representante do povo, dos desprovidos de uma condição financeira melhor, das crianças com necessidades especiais, dos idosos, etc.
Só temos a agradecer eu, minha irmã e demais familiares pela lembrança ao receber a Comenda Senador Abdias Nascimento, depois de muitos anos de falecimento de nosso pai, que foi exemplo para todos nós, deixando um legado de dignidade, fé, crença e respeito mútuo ao próximo.
Muito obrigada. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem!
Srª Neiva Maria Santos da Silva - que aqui falou em nome do inesquecível Deputado Carlos da Silva Santos (in memoriam) -, meus cumprimentos pela fala, objetiva e muito bonita.
Agora, passo a palavra ao representante do Sr. Linduarte Noronha (in memoriam), o filho do homenageado, Sr. Leonardo Henrique Ponce Leon Noronha de Oliveira.
Depois, no encerramento - não me esqueci de V. Exª -, a última palavra será de um Senador, o Senador Hélio José.
O SR. LEONARDO HENRIQUE PONCE LEON NORONHA DE OLIVEIRA - Boa tarde a todos.
É com muita honra que venho receber, em nome do meu pai, esta Comenda, que é tão importante e por uma causa tão nobre. Eu queria agradecer, em nome da família, esta honrosa homenagem.
Em particular, meu o muito obrigado também ao Senador Cássio Cunha Lima, que foi quem indicou o nome do meu pai a receber esta Comenda.
"Aruanda", que foi o documentário realizado por meu pai na década de 60, que conta a história de um povoado quilombola, na Serra do Talhado, na Paraíba, soa como um manifesto; o manifesto de um homem que sempre ressaltou, em seus trabalhos, as suas preocupações sociais e antropológicas. E essas preocupações sociais e antropológicas incluem a formação da sociedade brasileira, na qual o negro tem papel mais que fundamental.
Não vou me prolongar muito.
Eu gostaria de encerrar este agradecimento com uma parte de um discurso que meu pai fez no lançamento de "Aruanda", ainda na década de 60, em João Pessoa, no qual ele falou: "O documentário não é um meio para publicidade gratuita de seus realizadores, mas elemento provocador de debates ao homem que não vive alheio aos problemas e finalidades da espécie."
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Esse foi o representante do Sr. Linduarte Noronha, homenageado in memoriam, filho do homenageado, o Sr. Leonardo Henrique Ponce Leon Noronha de Oliveira, que, percebendo que já são quase duas da tarde, fez de forma bem objetiva também o seu pronunciamento.
Assim, passo a palavra ao Senador Hélio José, que, tenho certeza, será também muito firme, muito claro e bem objetivo na sua fala.
O SR. HÉLIO JOSÉ (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - DF. Sem revisão do orador.) - Boa tarde a todos.
Eu queria cumprimentar o nosso Presidente, S. Exª, o Senador Paulo Paim, e cumprimentar o Sr. Governador do Rio Grande do Sul, Alceu Collares. Cumprimento toda a Mesa, também cumprimentando a nossa querida Elisa Larkin Nascimento, viúva do nosso querido colega Senador Abdias Nascimento.
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Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em atenção ao Requerimento nº 688, de 2015, protocolado pelo Senador Paulo Paim e outros subscritores do Senado Federal, o Senado Federal promoveu, na semana passada, uma sessão especial em homenagem ao Dia Nacional da Consciência Negra - acabou sendo nesta semana, na verdade - e à Marcha das Mulheres Negras contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver. Na ocasião, também se deu a segunda edição da outorga da Comenda Abdias Nascimento, que hoje estamos fazendo.
Com efeito, o dia 20 de novembro tornou-se especialmente importante e simbólico para a comunidade negra no Brasil, pois assinala o dia da morte do herói Zumbi dos Palmares, representante da força e da tenacidade do povo negro, líder de um quilombo que resistiu, por mais de 100 anos, a pressões diversas, entre elas as investidas das tropas militares portuguesas e holandesas.
São tantas as lutas da comunidade negra, tão discriminada por tantos!
Devido ao avançar da hora, vou considerar meu discurso lido, do qual lerei só o último parágrafo.
Quero dizer que é com muita alegria, Senador, que eu venho aqui prestar essa homenagem. Acho que os nossos irmãos negros - tenho um avô negro também - merecem todo o carinho, todo o apoio. Nós temos de ser contra qualquer tipo de discriminação, qualquer tipo de situação em que se trate as pessoas de forma diferenciada.
Ontem, tivemos muita dor aqui em ter de reconhecer a posição do STF, que nós reconhecemos - eu, o Paulo Paim e a Senadora Lúcia Vânia -, mas com o coração partido, porque é um amigo de todos nós, uma pessoa que tem o carinho desta Casa, e foi envolvido numa trama. Nós avalizamos a posição do STF, na esperança de que a justiça prevaleça e as coisas sejam esclarecidas o mais breve possível.
Contra todos os nossos irmãos negros, jamais poderia aceitar qualquer tipo de discriminação. Essa Comenda Senador Abdias Nascimento é muito importante. Acho que ela coroa um momento muito importante na vida de todos que a receberam, e também de nós todos que estamos aqui, concedendo-o.
Muito obrigado, Senador Paulo Paim.
Um grande abraço a todos.
Peço que considere lido o meu discurso.
SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DO SR. SENADOR HÉLIO JOSÉ. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Cumprimento o Senador Hélio José, brilhante como sempre. Resumiu em poucas palavras esse momento tão importante da vida de todos nós.
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Nós vamos encerrar esta sessão de homenagem - alguém já me disse aqui atrás que é sessão de homenagem e não audiência pública. É que eu fiz hoje a 120ª audiência pública este ano. Batemos todos os recordes nós mesmos. Eu já havia feito 80 num ano, mas não 120, e aí fica a mania de falar audiência pública, que é um evento importante, onde debatemos com a sociedade as questões de interesse de toda a nossa gente.
Já fiz o discurso na abertura, e quero encerrar agradecendo a presença de todos aqui, principalmente a todos os convidados presentes, ao plenário que heroicamente ficou aqui ouvindo, desde às 11h até este momento. Mas é um momento importantíssimo, meus amigos, essa reflexão que aqui foi feita.
O Governador Collares me provocava aqui, e eu a chamo de Cida pela liberdade e amizade, ela vai muito ao Rio Grande. Ele dizia, Paim, pega essa bandeira desse poema e sai por este País dizendo: "O voto é tua única arma, põe teu voto na mão, faz a tua revolução."
Para que tenhamos mais negros e negras nas câmaras de vereadores, nas prefeituras, nas assembleias legislativas, aqui no Senado, na Câmara Federal, como governador e, por que não dizer, um dia termos neste País um presidente negro e uma presidenta negra.
Quero encerrar com o meu querido Governador Collares. Nós vamos nos levantar e você vai chamar este seu poema, que vai ficar marcado. Depois do poema, dou por encerrada a sessão.
Vamos lá, pessoal! Vamos lá, Governador!
O SR. ALCEU COLLARES - O Voto e o Pão.
Mandam no teu destino.
Mas ele é teu, meu irmão.
Ergue teus braços finos
E acaba com a exploração
Faz tua revolução!
O voto é tua única arma.
Põe teu voto na mão.
O voto é tua única arma.
Põe teu voto na mão.
O voto é tua única arma
Põe teu voto na mão.
Põe teu voto na mão.
Tua casa está caindo;
Pouca comida tem no fogão;
Tua mulher está mal vestida;
Teu filho de pé no chão.
Faz tua revolução!
O voto é tua única arma.
Põe teu voto na mão.
O voto é tua única arma.
Põe teu voto na mão.
O voto é tua única arma
Põe teu voto na mão.
Põe teu voto na mão.
[...]
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Muito cumprido, lá no fim diz assim:
A liberdade é o pão do espírito;
Do corpo, a liberdade é o pão.
Desperta pra luta amigo;
Faz tua revolução.
O voto é tua única arma;
Põe teu voto na mão.
O voto é tua única arma.
Põe teu voto na mão.
O voto é tua única arma.
Põe teu voto na mão.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Obrigado a todos.
Está encerrada a nossa sessão de homenagem no mês da Consciência Negra.
Eu convido os Senadores presentes para que subam aqui - por favor, Senadora Ana Amélia, Senador Hélio José, Carlos Moura e todos aqueles que puderem subir aqui - para tirarmos a foto aqui com todos os homenageados.
Convido também a nossa querida Neuza Collares, para que suba aqui também.
(Levanta-se a sessão às 13 horas e 39 minutos.)