2ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA
55ª LEGISLATURA
Em 11 de fevereiro de 2016
(quinta-feira)
Às 14 horas
4ª SESSÃO
(Sessão Não Deliberativa)

Oradores
Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Declaro aberta a sessão.
Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos.
A Presidência comunica ao Plenário que há expediente sobre a mesa que, nos termos do art. 241 do Regimento Interno, vai à publicação no Diário do Senado Federal.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - A Senhora Presidente da República adotou, no período do recesso parlamentar, as seguintes medidas provisórias:
- Nº 703, de 18/12/2015, que altera a Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013, para dispor sobre acordos de leniência, publicada no Diário Oficial da União do dia 21/12/2015;
- Nº 704, de 23/12/2015, que dispõe sobre fontes de recursos para cobertura de despesas primárias obrigatórias e para o pagamento da dívida pública federal, publicada no Diário Oficial da União do dia 24/12/2015;
- Nº 705, de 23/12/2015, que altera a Lei nº 12.722, de 3 de outubro de 2012, que dispõe sobre o apoio financeiro da União aos Municípios e ao Distrito Federal para ampliação de ofertas da educação infantil, publicada no Diário Oficial da União do dia 24/12/2015;
- Nº 706, de 28/12/2015, que altera a Lei nº 12.783, de 11 de janeiro de 2013, que dispõe sobre as concessões de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica, publicada na edição extra do Diário Oficial da União do dia 28/12/2015;
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- Nº 707, de 30/12/2015, que altera a Lei nº 12.096, de 24 de novembro de 2009 e a Lei nº 12.844, de 19 de julho de 2013, para alterar os prazos que especifica, publicada no Diário Oficial da União do dia 31/12/2015;
- Nº 708, de 30/12/2015, que autoriza a União a reincorporar os trechos de rodovias federais transferidos aos Estados e ao Distrito Federal por força da Medida Provisória nº 82, de 7/12/2002, publicada no Diário Oficial da União do dia 31/12/2015;
- Nº 712, de 29/1/2016, que dispõe sobre a adoção de medidas de vigilância em saúde, quando verificada a situação de iminente perigo à saúde pública pela presença do mosquito transmissor do vírus da dengue, da febre chikungunya e do zika vírus, publicada no Diário Oficial da União do dia 1º/2/2016.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Ainda nos termos dos arts. 2º e 3º da Resolução nº 1, de 2002, do Congresso Nacional e do art. 10, A, do Regimento Comum, foram constituídas comissões mistas incumbidas de emitir parecer sobre as matérias.
A composição das comissões mistas e o calendário da tramitação das respectivas medidas provisórias serão publicadas na Ordem do Dia do Congresso Nacional.
As matérias serão publicadas em avulsos eletrônicos.
Será feita a devida comunicação à Câmara dos Deputados.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Antes mesmo de passar a palavra ao primeiro orador, eu gostaria de ler um voto de pesar.
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Nos termos do art. 218, inciso VII, do Regimento Interno do Senado Federal, REQUEIRO voto de pesar pelo falecimento na sexta-feira, dia 05 de fevereiro, do amigo e companheiro de todos os militantes de direitos humanos em longas caminhadas, Exmo Sr. Marcus Vinicius de Oliveira Silva (Marcus Matraga).
Natural de Minas Gerais, aposentado pela Universidade Federal da Bahia, defensor dos direitos humanos e militante das causas sociais, Marcus Matraga foi vítima de homicídio em função de sua atividade política na mediação de conflitos em terras indígenas e de sua militância nos direitos humanos.
O ex-sindicalista e psicólogo foi levado de sua casa por dois homens armados até uma estrada do povoado, onde foi morto covardemente com um tiro na cabeça.
Lamentamos a morte precoce do líder Marcus Matraga, que perdeu sua vida por defender os direitos humanos e a comunidade indígena em conflito de terras na Bahia, cumprindo com o seu papel de cidadão na luta pelos menos favorecidos. Era um militante exemplar dos direitos humanos.
Gostaria que o presente voto fosse enviado para o Sindicato dos Psicólogos do Estado da Bahia e para a Federação Nacional dos Psicólogos, extensivo à família de Marcus Vinicius de Oliveira Silva (Marcus Matraga), nos endereços que seguem abaixo:
- Sindicato dos (as) Psicólogos (as) no Estado da Bahia (Sinpsi-BA)
Rua Francisco Ferraro, nº 11, sala 4 - Bairro Nazaré, Salvador (BA) CEP 40.040 - 465;
- Federação Nacional dos Psicólogos
Rua Tomé de Souza, 860, sala 1.004 - Funcionários, Belo Horizonte (MG) CEP 30140-909.
Esse é o requerimento, que, uma vez lido, será devidamente encaminhado pela Mesa da Casa.
Passo a palavra - depois ele, naturalmente, vai preencher o livro - ao nosso amigo e querido Senador José Medeiros.
V. Exª pode usar o tempo necessário para o seu pronunciamento, independentemente dos 20 minutos regimentais.
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O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, todos que nos acompanham aqui na Casa e também aqueles que nos acompanham pela Agência Senado ou pelas redes sociais, durante o ano de 2015, por diversas vezes, tanto eu quanto o Senador Blairo Maggi e o Senador Wellington Fagundes viemos aqui tratar do assunto sobre o Estado de Mato Grosso.
O Estado de Mato Grosso, Senador Paim, como eu costumo dizer, é também uma espécie de filial do Rio Grande do Sul, que é o Estado que V. Exª muito bem representa aqui nesta Casa. Ele tem hoje boa parte de sua população vinda do Sul, à qual os mato-grossenses são muito gratos e já os consideram como irmãos mato-grossenses, porque essas famílias vindas ali do Sul acabaram sendo protagonistas, sendo atores importantes no desenvolvimento do Estado.
E o desenvolvimento do Estado de Mato Grosso, Senador Paim, apesar de todas as dificuldades, tem sido estrondoso. Mato Grosso, por exemplo, produz 88% de todo o diamante nacional. É o maior produtor de soja, o maior produtor de milho, o maior produtor de semente de girassol; tem o maior rebanho e já caminha agora para ser o principal produtor de peixes. É um Estado que ajuda imensamente o Brasil, é um Estado que contribui com boa parte no equilíbrio da balança comercial.
Mas, Senador Paim, desde os pioneiros sulistas, nordestinos, todos aqueles que ajudaram a construir Mato Grosso, desde aquela época, quando aquelas pessoas para ali foram, o Mato Grosso padece de uma dificuldade imensa no que se refere a infraestrutura. Aquelas pessoas chegaram ali na década de 60, 70 e ajudaram a abrir o Estado na base do facão, na base da foice, enfrentando atoleiros, enfrentando a malária, enfrentando tudo isso. Hoje, a sociedade está amedrontada com o Aedes aegypti, mas, naquela época, eles enfrentavam muito mais, Senador Paim: enfrentavam a malária, enfrentavam todo tipo de intempéries que aquele Estado virgem sofria ali na zona rural.
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Pois bem, construiu-se um grande Estado, um Estado hoje que é a nova fronteira do desenvolvimento do País, mas, Senador Paim, tal como naquela época, Mato Grosso continua praticamente a mesma coisa em relação às suas estradas. Há quem diga que as estradas são as artérias de um país, as veias e as artérias de um Estado. Se for assim, Senador Paim, Mato Grosso está à beira de um ataque cardíaco, Mato Grosso está à beira de um derrame. Se for assim, Mato Grosso está com colesterol altíssimo, porque a grande verdade é que estamos com enorme dificuldade de escoar os produtos. Nada adianta termos uma grande produção, nada adianta sermos protagonistas em toda essa produção se não temos como escoá-la, se os nossos produtos não chegam ao mercado externo de forma competitiva. Ora, tenho dito sempre que o índice de produtividade de Mato Grosso é melhor do que o índice de produtividade dos norte-americanos e do índice de produtividade mundial, mas, Senador Paim, o mercado internacional, como qualquer outro, é na base da concorrência. E, por exemplo, os produtos norte-americanos chegam à China bem mais baratos, não porque tenham índice de produtividade melhor, mas porque sua infraestrutura de transporte é melhor. Então, Senador Paim, subo mais uma vez a esta tribuna para falar justamente desse tema.
Tentando solucionar esse problema, o Governo Federal resolveu fazer a concessão da BR-163 e da BR-364. Foi feita uma audiência pública, e criou-se uma expectativa extraordinária em todo o povo de Mato Grosso de que a rodovia seria duplicada e teria qualidade. Pois bem, foi feito um contrato com o povo, porque, no momento em que se faz uma audiência pública e se acorda, na verdade, é feito um contrato com o povo: "Daqui para frente, vocês terão uma rodovia com pedágio, porém ela vai ter qualidade e será duplicada". E também foi feito um contrato da seguinte forma: a duplicação de parte da rodovia, um trecho de Rondonópolis a Diamantino, seria de responsabilidade do DNIT; e o restante da duplicação seria feito pela concessionária. Ficou acordado também que, quando a concessionária tivesse feito 10% da duplicação, ela já poderia cobrar pedágio. E assim foi feito.
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Antes mesmo do término dessas obras, eu comecei a alertar aqui da tribuna dizendo que havia o risco de, se o DNIT continuar não pagando as empreiteiras, essas empreiteiras abandonarem a obra que ficou de responsabilidade do DNIT, e a concessionária chegar aos 10% que lhe competiam e começar a cobrar pedágio. Aí a população vai estar em uma situação em que a rodovia não estará duplicada, não estará sendo feita a manutenção da rodovia, e estará sendo cobrado pedágio. Pois bem, infelizmente, acabei sendo profeta do caos. Na verdade, eu falei aqui como um alerta, mas hoje nós estamos nesta situação, Senador Paim, Senador Cristovam: a população de Mato Grosso está pagando pedágio no seu único corredor - ali é onde a BR-364 e a BR-163 se fundem, uma rodovia passa por cima da outra -, a estrada está totalmente esburacada, não está duplicada, e a revolta é geral. Essa é a situação a que chegamos - não por falta de alerta.
Agora, eu não digo que alguém levanta de manhã cedo e diz: "Olha, vamos fazer isso só para irritar a população". Não, eu até creio que não, mas eu peço aqui encarecidamente ao Governo Federal que possa alocar recursos para o Ministério dos Transportes. Eu vejo boa vontade do Ministro e de todos os atores que mexem com a parte de logística, mas o que eu sinto é que realmente eles não têm o que fazer, não têm dinheiro para pagar. E não existe bom pagador sem ter dinheiro.
O problema está posto, Senador Paim. O Ministério Público já começa a se mexer. Eu mesmo entrei com uma representação junto ao Ministério Público e conversei com o pessoal da Justiça Federal. E, na segunda-feira, vamos fazer uma audiência pública com toda a comunidade da cidade de Rondonópolis - vereadores, associações de classe, a concessionária, todos -, para tentarmos chegar a um consenso, a uma solução, a uma saída, porque isso não é possível. Nesse feriado de Carnaval mesmo, houve vários acidentes com mortes. E não é possível que a população continue trafegando em uma estrada esburacada, sem segurança e pagando para isso. Isso chega a ser um absurdo.
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E, cada vez mais, nós temos visto absurdos aqui no Brasil. Por exemplo, há situações em que se constrói a usina, mas não se construiu o linhão para fazer a transmissão da energia. Há lugares onde se constrói a ponte, mas não se fazem nem a cabeceira nem a estrada. Aqui os próprios Senadores Capiberibe e Randolfe trouxeram a situação de que, na divisa do Brasil com a Guiana Francesa, existe uma ponte construída há dois anos, a ponte está lá, e a estrada não está pronta. Então, há esse tipo de situação. E não é possível continuar com esse tipo de coisa. A população nos cobra. E cabe ao Parlamentar o quê? Ao Parlamentar não cabe fazer obra, ao Parlamentar não cabe fazer tarefas que são do Executivo. Agora, cabe, sim, a nós, cobrar; cabe a nós acionar os organismos de controle. E isso eu tenho feito.
Entrei com representação no Procon, estamos representando também na Secretaria de Defesa do Consumidor e estamos representando na Justiça Federal. E esperamos que o Governo tome uma providência, porque isso não é possível. Agora mesmo, antes de ontem, um professor do Colégio São Gonçalo, professor há mais de 20 anos no Estado do Mato Grosso, morreu com sua família no trecho da BR-364 entre Cuiabá e Rondonópolis. Então, não é mais possível se quedar diante de uma realidade desta. Na segunda-feira, vamos fazer uma audiência pública. Aproveito a tribuna do Senado para convidar a todos os interessados naquela questão da BR-364 e da BR-163 para fazermos uma reflexão e, acima de tudo, sairmos dali com um plano de ação para que o Governo Federal ou suspenda a cobrança de pedágio ou arrume a rodovia.
Senador Paim, esse era um tema de que não estava pensando em falar hoje, mas, diante da situação, diante do tanto de mortes que houve neste final de semana, resolvi tratar aqui. E vou iniciar a fala que eu pretendia fazer.
Antes, passo a palavra, com muita honra, ao Senador Cristovam Buarque.
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O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Senador, quero apenas dizer da oportunidade da sua fala não apenas em relação ao Estado do Mato Grosso, não apenas em relação aos problemas das estradas, mas a algo muito mais profundo. É um recado sobre a imprevidência. A gente fala tanto em Previdência e da crise da Previdência. O Senador Paim é um dos que mais discute isso e contesta, mas a gente precisa falar um pouco é da imprevidência. Até a própria crise da Previdência decorre da imprevidência, com muitos dos recursos que são pagos à Previdência usados com outra finalidade, como o Paim tanto fala. Veja bem, isto que está acontecendo com as estradas é imprevidência. É imprevidência no projeto. É imprevidência na fiscalização da obra onde foi colocado material que se degrada rapidamente. É também imprevidência o exemplo que o senhor falou, ou seja, fazer a ponte e não fazer as estradas ou fazer as estradas e não fazer a ponte. Isso é imprevidência quanto ao planejamento. O restante de tudo o que está acontecendo no Brasil praticamente vem da imprevidência, como a dengue, o vírus da zika. Isso é imprevidência. Dizem que é o vírus, mas, não, o vírus só está aí por causa do mosquito, e o mosquito só está aí pela imprevidência da gente, que não toma as medidas corretas quanto ao saneamento, que não toma as medidas corretas quanto à educação cívica da população para que esta não deixe que fiquem aí os locais que atraem os mosquitos. A gente está tão preocupada com a inflação, mas ela é resultado da imprevidência com as contas públicas. A inflação não cai do céu, a inflação é o resultado da imprevidência. O descrédito dos políticos é resultado da imprevidência do corpo político - não de fulano, de sicrano, de beltrano ou minha ou do senhor ou do Paim, mas do corpo político -, porque a gente age de tal maneira, com tal imprevidência no zelo da causa pública, que isso leva a esse descrédito. A violência urbana... Hoje, eu tive um almoço no Comando do Exército, e um dos generais estava falando que, no Brasil, há mais gastos, hoje, com a segurança pública do que com as Forças Armadas. Não tem futuro um País como este. Isso é um desajuste, um desatino completo. Esse gasto, hoje, com a segurança pública, que cada um paga sem saber - a gente paga pela segurança que usa no apartamento em que mora, quem mora em casas maiores tem que ter guardinhas protegendo-as, os mais ricos têm carros blindados -, todo esse custo, para não falar das 50 mil mortes, é resultado da imprevidência de erros no passado, por não ter distribuído bem a renda, não ter dado educação de qualidade, não ter tomado medidas para evitar a migração de massas. Todos estão tão chocados com a migração, através do Atlântico, dos sírios, mas essa migração já houve no Brasil, do Nordeste para o Sul, do campo para a cidade, uma migração descontrolada, porque o povo queria ir para aonde estavam as coisas e, então, levou as coisas, por imprevidência, para aonde as pessoas moravam. As pessoas tiveram que migrar para encontrar sobrevivência. Tudo isso tem uma palavra-chave: imprevidência. E o senhor, com seu discurso, inaugura o novo ano, porque eu creio que o senhor talvez seja o primeiro... Não lembro se na semana passada já houve algum?
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Já houve, mas, como dizem que tudo começa depois do Carnaval, ele está iniciando o ano. (Risos.)
O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - O senhor trouxe esse tema. Falando de estradas, falando de seu Mato Grosso, o senhor, ao mesmo tempo, trouxe um tema que é nacional e que está por trás do que a gente tem hoje na crise das estradas e de toda a infraestrutura brasileira: imprevidência. Um pecado brasileiro, e um pecado que, se a gente não conseguir se livrar dele, vai continuar infernizando a vida do Brasil. Incrível é que a gente os políticos é que peca, e o povo é que vai para o inferno, por causa da situação em que vive. Está na hora de o povo mostrar também o inferno para a gente. E, se continuar assim, o povo vai mostrar para a gente, de alguma maneira, como em outros países já fez o povo. É imprevidência o grande pecado brasileiro, talvez um pecado que não dependa só dos políticos, talvez um pecado que esteja impregnado na alma do Brasil - pode ser -, mas a gente tem obrigação de romper com isso. Imprevidência é um pecado, pecado grave, até porque quem vai pagar não é só o povo de hoje, são os filhos e netos do povo de hoje. Eles vão pagar pela imprevidência no momento, como as estradas do Mato Grosso estão pagando. É isso, Senador.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Muito obrigado, Senador Cristovam.
E acrescento também a imprevidência, que V. Exª sempre traz aqui a Casa, sobre a educação. Se justamente a nossa saída é pela educação, nós a estamos negligenciando já desde a base, como V. Exª sempre tem trazido aqui.
Senador Cristovam, como V. Exª sabe, eu cheguei aqui no ano passado. Eu iria fazer um balanço em dezembro, mas resolvi fazer um pequeno resumo do que foi, nesse primeiro ano, a minha impressão aqui no Senado. No início de 2016, trago aqui, inicialmente, esse pequeno resumo do que foi o meu mandato parlamentar em 2015.
Eu não posso deixar de expressar minha profunda admiração e o meu inabalável respeito por esta Casa e seus integrantes - e eu queria dizer que V. Exª é um desses, juntamente com o Senador Paim, por coincidência, grande Senadores que eu já admirava antes de chegar aqui a esta Casa e que passei a admirar muito mais depois de estar aqui.
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Aqui está toda a nossa Federação representada, com suas múltiplas cores, credos e culturas, com seus distintos sotaques, trejeitos, simbologias e toda a simbologia regional.
Confesso que cheguei a esta Casa e que, nos primeiros dias, dava um frio na barriga ao subir a esta tribuna, porque esta é a grande Casa da Federação, a Casa dos grandes debates, a Casa onde se debatem os grandes temas, a Casa onde cada Senador sobe aqui e fala sobre algum tema, sempre sendo ouvido, do outro lado, por alguém com vasta experiência naquele tema. Por exemplo, quando alguém sobe aqui para falar de educação, há aqui o Senador Cristovam Buarque, vários outros Senadores que foram secretários de educação e governadores que entendem extremamente do tema. Se formos falar de economia, existem vários players aqui que entendem extremamente das filigranas da economia.
Enfim, é um privilégio estar aqui, nesta Casa, representando o meu Estado. Esta é uma Casa com um rico mosaico das peculiaridades econômicas, geográficas e sociais, que, conjuntamente, formam nossa amada e indivisível Nação. Fazer parte dessa fundamental missão de amalgamar o Brasil e o interesse nacional tem sido para mim, neste primeiro ano como Senador da República, uma das experiências mais ricas que já tive na vida, Senador Cristovam. Foi exatamente com esse espírito e disposição que por aqui aportei, no começo de 2015, para exercer o papel de representar meu Estado na Câmara Alta, em substituição ao meu querido amigo e companheiro político Pedro Taques, empossado Governador de Mato Grosso.
Minha própria história de vida simboliza bem essa mistura chamada Brasil, Senador Paulo Paim. Sou natural de Caicó, no Rio Grande do Norte, como eu já disse várias vezes aqui. Costumo até a dizer às vezes que sou gaúcho do norte. Em busca das maiores e melhores oportunidades, nossa família foi para Mato Grosso. E lá pude confirmar que o trabalho árduo e honesto - ensinamento herdado do meu querido pai - pode não legar a opulência material, mas traz coisas muito mais importantes, como a dignidade e o respeito dos seus próximos.
Movido por essa premissa, imbuído de lutar o bom combate, defendendo os interesses do meu Estado e da boa gente do meu País, eu me comprometi, desde o início desta caminhada, com bandeiras que reputo das mais importantes, notadamente os temas de maior necessidade e carência de nossa sociedade e, particularmente, da minha região.
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Eu não poderia deixar de registrar minha imensurável satisfação em ter sido agraciado, já no primeiro ano de mandato, com o título de um dos dez melhores Senadores do Brasil, honraria concedida pelo prêmio Congresso em Foco, do site eletrônico UOL. Aliás, honraria é estar diante de dois grandes ganhadores desse prêmio aqui, Senador Cristovam Buarque e Senador Paulo Paim.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Estávamos lá ao seu lado, só isso.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Exatamente, estávamos ao lado.
Fiquei particularmente sensibilizado ainda por ter ficado também entre os dez maiores votados em categorias a que efetivamente me dediquei com especial atenção: defesa da agropecuária, defesa social e da cidadania e profissionalização da gestão pública.
Na questão do agronegócio, não poderia ser diferente: represento, nesta Casa, o celeiro do Brasil, a grande fronteira agrícola que mais se expandiu nas últimas décadas e que ajudou a transformar, em grande parte, o nosso País na atual potência mundial em produção de alimentos. Sinto-me parte integrante nesse sentido dessa grande revolução capitaneada por Mato Grosso, da qual não me afasto.
Defendendo a dignidade e o respeito ao homem do campo, e não somente ao empresário, relatei projetos importantes, como o que anistia agricultores de baixa renda. Nesse mesmo sentido, apresentei projeto que promove a desoneração da venda de pluma de algodão por pessoas físicas mediante isenção do PIS e Cofins e a concessão de empréstimo presumido para empresas adquirentes. Também de minha autoria há o projeto que altera a repartição do Imposto de Renda, para compensar com 10,5% do total arrecadado pela União os Estados e os Municípios exportadores de produtos primários, como alternativa mais sólida ao Fundo de Exportação (FEX).
Tenho lutado, Senador Paim, por uma coisa que lhe é muito cara: a defesa também dos pequenos agricultores, a defesa dos pequenos.
Recentemente, Senador Cristovam, havia, no meu Estado e em todo o Brasil, a possibilidade de que todos os pequenos sitiantes começassem a perder sua terra, todos aqueles pequenos sitiantes que eram signatários do Banco da Terra. Senador Paim, esses pequenos sitiantes compraram suas terras em associações, e o CNPJ em que ficou a dívida era da associação. O Banco da Terra, ao ser extinto, passou a carteira ao Banco do Brasil. O que ocorria? O Banco do Brasil só recebia a dívida se fosse completa. Então, se V. Exª, por exemplo, tinha um pedaço de terra e queria pagar sua conta junto ao Banco do Brasil, não poderia fazê-lo, porque a dívida não estava individualizada. Com isso, todas as associações começaram a ficar inadimplentes, e já se estava correndo para execução das terras.
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Aqui faço um destaque à sensibilidade do Ministro Patrus Ananias. Levei essa questão a ele. Foi uma luta que começou na Comissão de Agricultura, também levantada pelo Senador Wellington Fagundes. Mas tivemos depois diversas reuniões com o Ministro Patrus Ananias, e ele se sensibilizou e voltou à renegociação das dívidas. Então, associações do País inteiro, do Brasil inteiro, poderão renegociar suas dívidas. Esse é um primeiro passo para, aí, sim, vir a individualização das dívidas, para os pequenos produtores não virem a perder suas terras. Então, faço essa ressalva em justiça à sensibilidade do Ministro Patrus Ananias.
Senador Paim, foi com esse ideal que lutei também pela valorização dos servidores públicos e pela contratação de servidores, por exemplo, para a Polícia Rodoviária Federal e para diversos outros órgãos públicos, enaltecendo a importância do concurso público e do fortalecimento das carreiras de Estado.
Essa luta pela valorização dos servidores públicos - digo isto sem jogar confete, porque é a realidade - também tem sido a luta de V. Exª. Tenho acompanhado seu trabalho no Senado desde que aqui cheguei.
Nessa mesma linha, posicionei-me contrariamente ao veto referente ao aumento do salário dos servidores do Judiciário, porque achei ser uma medida de justiça. Infelizmente, temos de chegar à conclusão de que aquele veto foi dado mais por uma contaminação, devido ao ambiente político, do que propriamente por uma necessidade de se vetar realmente. Havia quase dez anos que eles não tinham recomposição de perdas. Agora, com esta inflação, muito mais vão ter uma perda e vão ter seu salário carcomido. Mas, infelizmente, o caldo político de 2015 contaminou o debate, e aqueles servidores foram demonizados. Chegou-se a falar nesta tribuna que, se fosse dado aumento para aqueles servidores, o País quebraria. Bem, toda a culpa praticamente da problemática econômica parecia estar nas costas deles. Não foi dado o aumento, não foi derrubado o veto. A situação econômica do Brasil melhorou? Não. Então, na verdade, foi uma queda de braço. Houve polarização. Parecia que, se fosse dado o aumento para os servidores, isso demonstraria que o Governo não teria maioria na Câmara e que, consequentemente, passaria o impeachment. Infelizmente, o debate foi contaminado com esse caldo, e eles acabaram sendo demonizados. Infelizmente, foi para a imprensa que eram servidores que estavam ganhando R$70 mil, R$80 mil. Não eram. Foi dito aqui um monte de falácia, o que, infelizmente, não condizia com a verdade. Mas V. Exª, aliás, V. Exªs, tanto o Senador Cristovam quanto V. Exª, foram arautos da verdade e também defenderam esses servidores.
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Sr. Presidente, como Parlamentar, também tive a grata oportunidade de exercer representação do nosso País em algumas importantes missões internacionais ao longo de 2015. Destaco, primeiramente, a visita que fiz à base brasileira da Marinha na Antártica, representando a Comissão de Ciência e Tecnologia, cujo Presidente está aqui presente, o Senador Cristovam. Esse é um projeto da mais alta relevância para a pesquisa científica e para a ocupação estratégica do nosso País. Temos falado sempre naquela Comissão sobre inovação, sobre pesquisa. Volto a dizer: não é confete, mas o Senador Cristovam tem batido nesta tecla como um pingo d'água, dizendo que precisamos de inovação, que precisamos de pesquisa.
Ali, nos confins da Antártica, pude ver brasileiros abnegados buscando fazer isso, buscando inovação, buscando pesquisar, buscando plantar um pedacinho do Brasil naquele continente. Trata-se de uma iniciativa das mais importantes, não somente sob o aspecto da defesa nacional, mas, sobretudo, pelas oportunidades tecnológicas que oferece. Ali, vi China, Rússia, Inglaterra, Estados Unidos, todos com afinco, Senador Cristovam. É incrível como as bases ali plantadas estão realizando pesquisa, estão buscando recursos naturais, estão buscando fincar o seu espaço, colocar os seus marcos no continente.
Achei importante o Brasil estar com essa preocupação, mas também vi precariedade. Vi os brasileiros que ali estavam amontoados em contêineres. É bem verdade que, há alguns anos, houve aquele acidente que destruiu totalmente a Base Comandante Ferraz na Antártica, mas esperamos que o Governo Federal possa alocar recursos, para que possamos ter, em breve, uma base científica, uma base de pesquisa que possa dar estrutura para que as universidades brasileiras e as Forças Armadas brasileiras possam ali fazer suas pesquisas.
Como membro integrante da Frente Parlamentar Pela Liberdade Religiosa, também estive na cidade de Nova York, no painel internacional que reuniu 112 Parlamentares de 52 países, junto com representantes de diversas religiões. Nesse painel, foram discutidas questões fundamentais para os dias de hoje como a intolerância e a liberdade religiosa. Pude compartilhar a experiência brasileira nesse assunto.
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Finalmente, pude ir à afamada Universidade de Harvard, também nos Estados Unidos, para participar de uma reunião sobre educação e sobre primeira infância, tema ao qual venho destinando especial atenção e dedicação no exercício do mandato. Vale registrar a aprovação do requerimento de urgência de minha autoria sobre o PLC nº 14, que versa justamente sobre políticas públicas para a primeira infância.
Registro aqui, Senador Cristovam - agradeço o apoio de V. Exª e do Senador Paim -, que, já no início do ano, na semana passada, tivemos a oportunidade e a grata satisfação de ter como primeiro projeto aprovado em 2016 o PLC nº 14, que é o Marco Legal da Primeira Infância. O Marco Legal da Primeira Infância começou a ser gestado justamente na Universidade de Harvard, em parceria com a USP e com o Insper, três centros de ensino de referência no mundo que se dedicaram ao tema. Estudiosos do mundo inteiro se debruçaram sobre o assunto primeira infância, sobre educação, sobre o futuro das nossas crianças.
Como representante de um Estado fronteiriço, também me dediquei ao desenvolvimento de políticas públicas relacionadas ao espaço de fronteira. Nesse sentido, refiro-me não somente ao aspecto da segurança transnacional e do combate ao tráfico humano e de drogas e ao contrabando de mercadorias, mas também às facilidades de mobilidade e de trânsito para os habitantes daquele espaço e às oportunidades econômicas que podem ser geradas pelas potencialidades locais.
V. Exª falava há pouco justamente do tanto que gastamos, Senador Paim, com segurança pública. Gastamos e, por vezes, gastamos de forma errada. Tomamos a decisão, não sei em que momento, de combater o narcotráfico no varejo, combatendo o narcotráfico nas favelas do Rio de Janeiro, nas favelas de São Paulo, nas favelas dos grandes centros. Nós nos esquecemos de combatê-lo no atacado, onde é mais fácil, onde é mais barato.
Mato Grosso, por exemplo, tem 700km de fronteira seca - muito mais, aliás -, mas totalmente desprotegida. Neste momento - vou falar isto aqui, porque já não é mais uma questão de segurança nacional, porque os traficantes já sabem -, não há 15 agentes das três esferas do Estado brasileiro lá. Não há 15 agentes, neste momento, protegendo os mais de 700km de fronteira seca entre Brasil e Bolívia, no Estado de Mato Grosso. Com certeza, a realidade não muda no País afora. Então, entra tudo. Há tráfico humano, tráfico de armas, tráfico de entorpecentes. E vai tudo para os grandes centros. E aí realmente fica caro combater isso no varejo.
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Mas, já me encaminhando para o final, Senador Paim, ainda na defesa dos interesses do meu Estado, Mato Grosso, atuei firmemente na defesa da liberação dos recursos do FEX, porque Mato Grosso não tem como arrecadar sobre o produto que exporta, por força da Lei Kandir, e o Governo Federal não vem pagando em dia o Fundo de Exportação, que compensa essas perdas. O de 2014 foi pago no final de 2015 e o de 2015 ainda não foi pago. Tal situação, nobres colegas, tem gerado grande ineficiência e prejuízo para os produtores mato-grossenses, que não podem contar com os investimentos públicos necessários para recompor e modernizar a infraestrutura da qual falei há pouco nesta tribuna. Também toda a mobilidade urbana das cidades, sem falar na educação e na saúde, fica prejudicada.
Nesse mesmo sentido, também lutei incansavelmente pela reestruturação e ampliação dos aeroportos regionais de Rondonópolis, Cáceres, Alta Floresta, Sinop, Sorriso.
(Soa a campainha.)
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - O incentivo à aviação regional tem sido cantado em prosa e verso pelo Governo, mas, infelizmente, Senador Paim, a realidade ainda tem sido adversa, especialmente para centros urbanos e produtivos mais distantes. Com notórias dificuldades de locomoção terrestre, tal iniciativa alcança contornos ainda mais relevantes, ampliando as possibilidades de progresso, desenvolvimento, acesso a bens e serviços para a população local.
No que tange à reforma política, tema incandescente da atualidade, posicionei-me firmemente contra o financiamento empresarial de campanha, raiz de boa parte das falcatruas e trapaças que atualmente vemos reveladas em nossos noticiários. Não dá para acreditar que grandes empresários financiam campanhas sem ter interesses inconfessáveis por trás da suposta generosidade.
Enfim, Sr. Presidente, minhas caras e meus caros colegas Senadores, não há como negar que 2015 foi um ano bastante turbulento em nosso País. A crise político-econômica ecoa por todos os lados, notadamente pelas paredes deste Parlamento. Temos em tramitação um processo de impeachment, o qual, quero crer, logo mais, logo menos chegará a esta Casa. Precisaremos estar imbuídos do mais elevado espírito cívico para, nos marcos da constitucionalidade, empurrarmos o Brasil de volta para o caminho da unidade nacional e do desenvolvimento econômico.
Em meu primeiro ano de mandato como Senador da República, aprendi muito com V. Exªs. E ressalto: principalmente com esses dois Senadores que estão aqui, o Senador Cristovam e o Senador Paulo Paim.
Também pude desempenhar inúmeras ações no sentido de dotar o meu Estado e o nosso País das condições necessárias para o seu pleno e sustentável desenvolvimento.
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É com uma mensagem de fé e esperança, na certeza de que, com muito trabalho e dedicação, conseguiremos não somente retirar o nosso País do atoleiro em que se encontra, mas colocá-lo nos trilhos do progresso e da estabilidade política e econômica. Que possamos ter um 2016 imbuídos desse espírito, imbuídos da procura pela saída; não imbuídos da procura pelas filigranas e do defeito do outro, mas todos imbuídos daquela saída que V. Exªs têm tanto apregoado aqui. Precisamos e temos como dever perante o nosso povo apontar a saída.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Senador José Medeiros, que fez um pequeno resumo do brilhante trabalho realizado a partir do momento em que chegou a esta Casa, jovem Senador.
Já aproveito para convidar todos: teremos, por iniciativa de V. Exª, no dia 22/02, Requerimento nº 84 do Senador José Medeiros, a discussão do aprimoramento do marco normativo sobre a produção de equipamentos utilizados pelas instituições policiais no Brasil, mostrando, além de tudo o que o senhor falou, a sua preocupação com segurança.
Meus cumprimentos ao belo mandato que orgulha não só o seu Estado, mas o povo brasileiro.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Passamos a palavra ao Senador Cristovam Buarque.
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Presidente Paim, Srªs e Srs. Senadores, em primeiro lugar, Senador Paim, espero que cheguemos aqui preparados para enfrentar as dificuldades que teremos neste ano de 2016 na condução do futuro do nosso País. Creio que raras vezes uma Legislatura começou com desafios tão grandes quanto aqueles que temos nesses próximos meses.
Quero começar falando, Senador, da minha mania, da minha nota única, como se fala por aí, nota só, sobre um relatório lançado ontem, embora formalmente só vá ser lançado em breve na Coreia do Sul, pela Organização de Cooperação do Desenvolvimento Econômico (OCDE), sobre o estado da educação no mundo.
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Mais um vez, o Brasil faz parte daqueles que ficam na lanterna da educação e, portanto, na lanterna do futuro. Mais uma vez, Senador Paim. Alguns dizem: "Mas temos o que comemorar: aumentou o número de matrículas." E é verdade, mas a matrícula não merece ser comemorada, apenas citada, dita, porque matrícula não significa frequência. Muitas crianças se matriculam, mas não frequentam, Senador. Frequência, inclusive, não significa assistência. No Brasil, muitas crianças vão à escola até a hora da merenda para comer, e não para estudar. E assistência não significa permanência. Mesmo as crianças matriculadas, frequentando, assistindo, que não são tantas, não ficam na escola, Senador Medeiros, até o final do ensino fundamental. Imagine do ensino médio! A gente só pode comemorar o aumento da permanência até o final do ensino médio, e não o da matrícula. É uma comemoração muito medíocre! Sabe o que me parece? É como se, na próxima Copa do Mundo, nós perdêssemos de 6 a 1 para a Alemanha e comemorássemos. Já não foi de 7 a 1. Alguém vai comemorar se, na próxima Copa, a gente perder de 6 a 1? Não acredito. Então, não dá para comemorar que aumentamos a matrícula, embora tenhamos que citar, dizer e mostrar que é possível.
Além disso, esse relatório da OCDE, que mostra que o Brasil está em 60º entre 76 países, lanterna, não inclui, por exemplo, os analfabetos. Eles não fazem parte da avaliação, não entram. Se colocasse o analfabetismo, o Brasil estaria muito pior, porque, por exemplo, o Brasil está próximo da Argentina na má qualidade da educação de base, mas, se colocar o analfabetismo, o Brasil piora muito. Não dá para comemorar o pouco que avançou.
Reduziu-se, por exemplo, o número de crianças que tiram apenas um. Não dá para comemorar que tenha reduzido, porque 38% delas ainda continuam com nota quase zero. Não dá para comemorar! Dá para alertar! E é isso que quero fazer. Dá para alertar!
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Vejam o que vai acontecer no Brasil nos próximos anos se esses indicadores continuarem assim. Por exemplo, Senador Paim, o senhor, que tanto se preocupa com o emprego, não há como aumentar o emprego de qualidade sem educação. Não há como! Até é possível haver emprego para pessoas que não tenham educação, mas são empregos pessimamente remunerados; são empregos, em geral, degradantes, próximos da linha da escravidão, como nós discutimos na semana passada aqui.
O desemprego continuará, se nós não formos capazes de investir na educação, se não garantirmos a conclusão de um ensino médio de qualidade para todas as crianças deste Brasil, e, aí, a gente pode começar a comemorar.
Não haverá produtividade sem educação. Produtividade é quanto cada pessoa produz; e, se cada pessoa produz pouco, a renda das pessoas é baixa. O Brasil pode até crescer o PIB, porque tem uma população de 220 milhões. Então, o PIB pode ser alto, mas o PIB per capita continuará baixo enquanto o Brasil não tiver um bom sistema educacional para todas as crianças.
Mas não é só o emprego. A violência cresce, obviamente, com o nível baixo de educação. Não é porque os doutores são pacíficos, mas é porque eles não precisam recorrer à violência física. Nós precisamos educar a nossa população.
A dengue. As pessoas falam que é questão de um mosquito, mas esse mosquito existe por falta de saneamento e de educação, educação cívica, educação que ensine que participemos de tal forma da vida que ninguém deixe um lugar onde os mosquitos serão criados. É a educação que está por trás, saúde.
Todos os estudos mostram que uma pessoa com educação tem mais condições de zelar pela sua alimentação, que tem tudo a ver com saúde; tem condições de zelar até pelo seu peso, de ter informações que digam o que é preciso fazer para ter uma boa saúde. Isso tem tudo a ver com educação. Para buscar o médico, quem tem educação sabe fazer melhor. Tem tudo a ver.
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A indústria brasileira, a indústria sem educação do povo é uma indústria falida, porque, mesmo produzindo, produz coisas antigas, superadas, que é o que acontece no Brasil. Nós somos uma economia, ainda, 500 anos depois da descoberta, agrícola e mineral, em vez de ser uma indústria produzindo bens de alta tecnologia, que é o que assegura a dinâmica, que é o que assegura a riqueza.
Vejam quem são os homens mais ricos do mundo: até pouco tempo, eram os donos da fábricas de automóvel; Ford, por exemplo. Hoje, são os donos das indústrias de software, das indústrias de computador em projetos de hardware, das que produzem novos equipamentos médicos, das que usam o capital conhecimento. Não é mais o capital terra. O preço do petróleo é quase nada, mas o preço de um chipe continua alto; e o chipe não é produzido na terra como o petróleo. É produzido no cérebro das pessoas e é produzido porque sai da educação.
Não há futuro se a gente não fizer o dever de casa que nos negamos a fazer há tanto tempo.
Até coisa que ninguém imagina, uma tragédia brasileira, que é a gravidez precoce de nossas meninas, tem tudo a ver com educação. As estatísticas mostram que as meninas educadas sabem se precaver melhor da gravidez do que as meninas não educadas.
A transmissão da pobreza vem da educação. Barrar a transmissão! Antigamente, dizia-se: "A gente acaba com a pobreza criando emprego." Mas não se cria emprego que tire da pobreza se não houver educação do empregado.
Então, para se cortar a transmissão da pobreza de um pai para um filho é com a educação do filho. Não há outro jeito. Antigamente, havia, porque, mesmo uma pessoa sem educação, conseguindo um emprego, crescia. Hoje, isso acontece? Pode acontecer, mas é raro. É raro! Se esse pai não tiver um filho educado, vai continuar a transmissão da pobreza.
Trabalho infantil: criança na escola não está trabalhando. Tem que botar a criança na escola até como forma de impedir o trabalho infantil. E o trabalho escravo, Senador Paim, o senhor faz parte desses que aqui lutam contra isso em pleno século XXI ...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Diga-se que a sua participação, conseguindo a assinatura de todos os Líderes, foi fundamental para que se retirasse a urgência daquela regulamentação.
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Obrigado, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Isso nós temos falado. Foi mérito de V. Exª. E temos orgulho de que estávamos juntos no mesmo grupo
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Estávamos juntos, fizemos juntos.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Mas V. Exª foi quem conseguiu as assinaturas.
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Pois bem, o senhor que conhece isso mais do que ninguém - trabalho escravo no século XXI -, o senhor conhece algum trabalhador em condições de escravidão com o curso secundário completo? Não acredito, pois quase todos estão entre os analfabetos ou aqueles que terminaram até o terceiro ano do ensino primário.
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São analfabetos funcionais. A mortalidade infantil parece que nada tem a ver, ma tem tudo a ver com o grau de educação da população. A vulnerabilidade às drogas tem a ver.
A influência da leitura na formação da consciência é fundamental! Sem essa consciência, continuamos elegendo corruptos para os altos cargos da República! Ou seja, a corrução tem tudo a ver com a educação.
Aqui quero insistir: isso não quer dizer que a educação faz a pessoa menos corrupta, até porque quase todos os corruptos deste País são doutores. Não é a educação deles, mas é que eles não teriam sido eleitos, se a gente tivesse uma população com consciência. Essa consciência vem da leitura, e a leitura vem da educação.
Por isso, nada tem a ver educação com fazer ou não um corrupto. Nada! Dá quase para a gente dizer que a corrupção está no sangue dele. Não estou dizendo que seria uma forma até de salvá-los. Não, corrupto é uma coisa pessoal, de caráter pessoal. E a educação não consegue resolver isso fácil, a não ser a doméstica, em casa. Mas o corrupto chega a altos cargos por causa da falta de educação cívica da nossa população. Isso vem - vou repetir - da falta de leituras, que dão consciência. E essa leitura vem da escolaridade - não só da escolaridade, porque há outras influências, mas sobretudo da escolaridade.
Tivemos péssimas notas na parte de matemática. O Brasil é um País desmatematizado. O cérebro dos brasileiros não tem matemática lá dentro. Parece que isso não é importante e tem tudo a ver com o futuro do mundo. O mundo cuja população não tem bases matemáticas é um mundo incapaz de entender plenamente a realidade, é incapaz de criar novos produtos que vêm da matemática, de entender as relações das coisas.
A gente não está dando isso às nossas crianças, e elas vão crescer sem entender o que acontece ao redor plenamente, por falta de um mínimo de matemática. A inflação que está aí pressiona mais quem não sabe matemática do que quem sabe matemática, porque quem sabe matemática é capaz de analisar a variação dos preços, de saber o que isso tem a ver com juros,
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de escolher se põe dinheiro na caderneta de poupança ou se aumenta o estoque de mercadoria em casa. Isso é matemática. Sem matemática não se consegue viver bem num mundo inflacionado, num País com inflação. E a gente não está dando a a matemática. Esse relatório da OCDE mostra como estamos no caminho errado no Brasil.
Eu vi a Presidente falando, desejando fazer consertos em coisas erradas do Brasil, Senadora Ana. O que a gente precisa não é um conserto com "s", é um concerto com "c", o concerto do maestro, de fazer com que juntos encontremos o caminho.
A Presidente não sabe como mudar o pneu, mas a gente precisa de um GPS para dizer para onde ir. E isso não é que ela não saiba. A sensação é a de que ela nem preocupada está com isso, porque acha que o caminho está bom, que basta aumentar a velocidade do carro e que para isso precisa consertar o pneu. Nada! Precisa mudar estrada; precisa dobrar a esquina, e não mudar o pneu, como ela fala, e querer um conserto com "s", o conserto do mecânico. É o concerto do maestro que a gente precisa, para saber para onde levar este País. E para onde o quisermos levar, em um futuro compatível com o que acontece no mundo, isso passa pela educação. Esse relatório mostra que nós não estamos no bom caminho.
Eu espero que, neste ano, Senador Paim - para concluir -, em que vamos ser tentados, Senador Reguffe, a enfrentar os problemas do imediato, que são os mais angustiantes - a corrupção, a inflação, a recessão, o vírus da zika -, esse dia a dia não nos faça esquecer o longo prazo para as nossas crianças.
Nós estamos angustiados, todos, com o risco de aumentar o nascimento de crianças que sofram de microcefalia, por causa da imprevidência, da irresponsabilidade de todos nós - de uns mais e de outros menos - de não cuidarmos do saneamento, de não cuidarmos da saúde. Mas, se não dermos educação, mesmo as crianças que vão nascer sem a maldição do vírus da zika, mesmo as crianças que vão nascer sem microcefalia não vão desenvolver plenamente seu cérebro.
O cérebro dos animais cresce em uma proporção, até que eles nasçam. Depois que nascem, parece que o cérebro ainda cresce um pouquinho de nada biologicamente.
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O cérebro humano cresce um pouquinho depois que a criança nasce, mas continua crescendo até a morte. Não biologicamente, não a massa cinzenta aqui dentro, mas aquilo que está dentro dela, aquilo que é chamado de conhecimento.
Há duas microcefalias: a microcefalia biológica, pelo tamanho do cérebro; e a microcefalia intelectual, a quantidade de coisas dentro do cérebro. A quantidade de conhecimento dentro do cérebro depende da educação. Ou seja, a microcefalia biológica é um produto da falta de educação para cuidar do saneamento, para cuidar da higiene. A microcefalia é um produto do Aedes brasiliensis, o Aedes do Brasil, e não o Aedes do Egito. Mas a outra microcefalia intelectual, da quantidade de conhecimento, é ainda mais consequência do Aedes brasiliensis. E quando eu digo "brasiliensis" não é de Brasília, é do Brasil.
Nós temos que entender isso. Temos que despertar para isso. Ontem o pré-relatório da OCDE nos ajuda nisso. E eu vim aqui - e vou passar a palavra ao Senador Reguffe que pediu um aparte - para abrir a minha participação nesse ano falando disso.
Alguns vão dizer: "lá vem ele com a mesma história, lá vem ele com a mesma velha preocupação." Mas é a velha preocupação com o futuro, é a velha preocupação com o que vai acontecer com o nosso País, se não despertarmos para essa realidade, a realidade de que a estrada do futuro vai sobre as estradas onde estão as escolas. As escolas são as estradas do futuro. Eu até diria que as escolas são o aeroporto do futuro. A OCDE, ao mostrar a situação da nossa escola, mostrou que a nossa escola está carcomida e que nós não estamos em condições de caminhar para o futuro.
Só para não dizerem que eu apenas analisei o aspecto crítico, quero dizer que cada vez que eu venho aqui eu falo da solução. A solução é uma boa escola. Essa boa escola depende do bom professor, com bons equipamentos. E isso precisa da União. Isso tem que ser feito, a meu ver, pela federalização da escola - não da escola que está aí, passar de municipal a federal, mas pela criação de um novo sistema,
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pegando o sistema atual, que está carcomido, como a OCDE mostra e substituindo-o por outro, de tal maneira que, daqui a alguns anos, a gente possa estar bem na foto no presente para a construção do futuro.
Antes de passar a palavra, Senador Paim, quero dizer que a China aparece bem. Mas sabem por que a China aparece bem? Porque aparecem bem as cidades que a China escolheu para servir de exemplo.
É o que eu proponho. Proponho que o Governo Federal adote a educação de algumas cidades, e o número dessas cidades vai sendo aumentado ao longo do tempo. É o que a China está fazendo, é o que o Chile vai fazer agora com o programa que a Presidente Bachelet chama de desmunicipalização, que talvez seja um nome até melhor do que federalização. Eu não teria nenhum problema em mudar o nome de federalização para desmunicipalização.
É o que a China está fazendo, e já aparece bem por causa daquelas cidades. Se a gente viesse fazendo isso desde 2003, quando eu tentei fazer - comecei com 29 cidades quando era ministro -, hoje a gente poderia estar com mil, 1,5 mil, 2,5 mil cidades com notas ótimas na OCDE. Mesmo que as outras não estivessem ainda, seria uma questão de esperar um pouco mais. Mas, como está, esperar não vai colocar a gente em uma situação melhor; esperar vai continuar mantendo a gente em uma situação muito ruim no cenário mundial no presente, por causa da escola, e, portanto, ainda pior no cenário mundial no futuro.
Eu gostaria, antes de sair da tribuna, de passar a palavra, com muita satisfação, ao Senador pelo Distrito Federal Reguffe.
O Sr. Reguffe (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Senador Cistovam, quero, primeiro, parabenizar V. Exª pelo pronunciamento, que é muito pertinente nos dias atuais em que a gente vive, e quero discutir o que é o futuro de um País. Antes, quero fazer um comentário sobre a questão do zika vírus, que V. Exª colocou, quanto a essa polêmica toda envolvendo o Aedes aegypti. Eu sinto isso na pele. Minha esposa está grávida, e eu vivo dias de preocupação permanente com a essa questão. E vejo - apesar de ser Parlamentar, sou também cidadão - com muita preocupação a inação do Governo com relação a esse tema. O Governo parte mais para ações midiáticas, para tentar mostrar que está fazendo alguma coisa, do que efetivamente combater isso com recursos e ações.
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Isso vale tanto para o Governo Federal quanto para o Governo local. O Governo daqui do Distrito Federal - eu soube - tem apenas 11 carros dos chamados fumacês, o que é uma brincadeira, pelo tamanho do Distrito Federal - uma população de mais de dois milhões de habitantes. O Brasil - como, aliás, já foi falado - está perdendo, pela incompetência do Governo, a guerra contra esse mosquito. Eu me preocupo, não só por minha esposa estar grávida, por essa questão pessoal, mas também pelo País, que só depois que surge uma coisa dessas é que pensa o que vai fazer. Não há nenhuma ação preventiva. Mas, com relação ao pronunciamento de V. Exª, que é muito pertinente, volta à questão da educação... Às vezes, as pessoas dizem que V. Exª é um Senador de uma nota só, só fala de educação; mas ainda bem que tem gente que se preocupa com a educação, porque para algumas pessoas, hoje, neste País, isso passa ao largo. Eu queria dividir o meu aparte em duas partes. Primeiro, a questão da educação. Infelizmente, este País não soube escolher suas prioridades nos últimos tempos. O ato de governar, a forma de governar é muito mais a consecução de obras físicas do que investir na qualidade dos serviços públicos que são devolvidos à sociedade. O que fica para o futuro é: "Aquela obra está lá. Quem construiu aquela obra?" "Foi fulano de tal". Mas se a pessoa colocar recursos para a educação ou para a saúde, aquilo não fica. Digo pelas minhas emendas ao orçamento: desde que eu era Deputado Distrital, coloco, por exemplo, a compra de remédios para os hospitais públicos. Só que o remédio é consumido, ele não fica; ele tira a dor de uma pessoa naquele momento, mas não é uma obra física, então a pessoa não vê aquilo. Do mesmo jeito, a educação, pela qual V. Exª tanto luta, para que a gente tenha um País diferente. V. Exª teve, aqui no Distrito Federal, um Governo exemplar nessa área, com vários projetos interessantes, como a Bolsa Escola - V. Exª que trouxe esse debate, foi a primeira experiência no Brasil com relação a esse tema -, como a Poupança Escola, a Bolsa-Alfa, de alfabetização, e tantos outros. Mas eu vejo o País escolher as prioridades erradas: prefere investir em obras físicas do que investir no futuro, do que investir em educação. Nós mudamos de século, as cidades estão cheias de viadutos, cheias de estradas, mas não temos uma educação em tempo integral.
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Nós já mudamos de século. Está aí o que o Coreia fez no século passado, o que os Tigres Asiáticos fizeram. No Orçamento, não vemos educação como prioridade, e, na ação, o Governo ainda se utiliza de uma maquiagem orçamentária: quando é obrigado a gastar tanto ali, ele simplesmente tira o recurso que já estava ali, coloca o novo recurso, vai, vai. O tempo todo tem a DRU; ano após ano, se aprova a DRU; então, não se vê aquilo como prioridade, não se pensa o futuro. De outro lado, vê-se a classe política muito mais preocupada com cargos no governo, em apoiar governos - se há cargos, apoia; se não há cargos, não apoia -, do que em discutir um futuro para este País. Preocupa-se muito mais com projetos de poder do que com um projeto de País. Nós temos que discutir de verdade um projeto de País, colocar na mesa e discutir o que se pode fazer para o Brasil daqui a 20 anos. Ninguém consegue pensar lá na frente, daqui a 20 anos. Eu não sei se o meu filho que vai nascer vai conviver com um País melhor do que o que vivemos, porque, infelizmente, a nossa sociedade está cada vez mais individualista, e o ato de governar, o ato de fazer política é cada vez mais a ocupação de espaços no governo do que simplesmente debater ideias. Os partidos políticos no Brasil estão falidos, eles hoje são muito mais cartórios para brigar por espaços no governo, por nacos de poder, por empresas estatais do que para discutir um projeto de País, a formulação de políticas públicas, ideias que deveriam ser a verdadeira política, que é a beleza que a política tem. Então, eu me congratulo com V. Exª, que algumas pessoas dizem que é um romântico, porque eu acho que o Brasil precisa de mais políticos que queiram pensar o futuro, que queiram pensar o que deve ser o futuro e como chegar a esse futuro, passo a passo, ponto por ponto. Não se vai fazer isso sem investimentos pesados na educação e sem o País se preocupar com a educação de fato e de verdade.
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Obrigado, Senador.
O Senador José Antônio Reguffe me trouxe uma lembrança, ao falar, que é o seguinte: o relatório da OCDE mostra que um dos aspectos positivos no Brasil é a taxa de matrículas, que aumentou de 65 para 78, o que eu reconheci aqui, mas matrícula não quer dizer muito, e que isso se deve ao Bolsa Família.
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Eu poderia, em vez de fazer um alerta do que vai acontecer no Brasil, estar aqui comemorando e dizer: graças a um programa que iniciei, chamado Bolsa-Escola, do qual mudaram o nome para Bolsa Família, a OCDE diz que aumentou o número de escolarização. Eu poderia estar comemorando, mas eu não comemorarei. Na próxima Copa, se o Brasil perder de 6 a 1 para a Alemanha e não de 7 a 1, não vou comemorar; vou reconhecer. Reconhecer não é sinônimo de comemorar. Reconheço que houve esse avanço, mas é uma avanço tão tímido no desafio que o Brasil tem que enfrentar que a gente tem que ficar lembrando, mas preocupado.
O Bolsa-Escola deu a sua contribuição, mas é pequena, se a gente não fizer a escola ficar boa. A gente tem como fazer isso e não custa quanto se pensa. Não se faz por milagre, de um dia para outro, mas se faz num cronograma de algumas décadas. Só que não estamos fazendo, Senador Paim. Aumentamos o número de alunos, mas não estamos fazendo esse exercício de a escola do Brasil ser uma das melhores do mundo. Sabe-se como fazer. Temos experiências disso, só é preciso espalhar essas experiências pelo País. Só que vai ser impossível espalhá-las em todo o País apenas sobre os ombros dos prefeitos, além de que também as cidades são muito desiguais do ponto de vista da renda. Portanto, não vamos conseguir na maior parte das cidades que não têm recursos.
Eu espero que esse debate não desapareça em 2016, diante das dificuldades imediatas que vamos enfrentar. Enfrentemos nossas dificuldades sem ignorar as dificuldades que os nossos filhos e os nossos netos vão enfrentar não apenas do ponto de vista pessoal, de cada um deles, de suas famílias, mas também do ponto de vista nacional, do ponto de vista da Nação brasileira, do ponto de vista do conjunto de nossa população. Ainda há tempo, ainda há tempo de fazer aquilo que é preciso. Eu espero que não nos esqueçamos disso neste ano que estamos iniciando agora.
É isso, Sr. Presidente.
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Cristovam, só me permita minha discordância daqueles que dizem que V. Exª é um Senador de uma nota só: isso não é verdade. V. Exª, eu diria, é o número um aqui quando o tema é educação, mas também nos outros temas da conjuntura nacional. Em todos, V. Exª tem posição muito clara, que tem ajudado outros tantos Parlamentares e aqueles que assistem às suas verdadeiras palestras na tribuna do Senado. Meus cumprimentos.
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Obrigado, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Agora, na sequência, seria a Senadora Ana Amélia, como Líder. Em seguida, Alvaro Dias, como Senador inscrito.
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS. Como Líder. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Senador Paulo Paim, que preside esta sessão.
Caros colegas Senadores, nossos telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, venho à tribuna hoje, Senador Paim, brevemente, para manifestar preocupação. Voltei, na madrugada de hoje, de uma missão, nas Nações Unidas, da União Interparlamentar, que debateu as questões relacionadas ao controle de drogas no mundo. Lá se viu que esse problema é transnacional e que as políticas adotadas até agora fracassaram. O problema da droga é tão grave que fragilizou instituições e há suspeita, inclusive, de dinheiro proveniente do tráfico de drogas em campanha eleitoral. Então, esse é um problema extremamente relevante.
Como Presidente da Fundação Milton Campos, tenho apoiado a realização de seminários para envolver as escolas e as famílias no debate da questão da prevenção. Há um projeto desenvolvido no âmbito do Senad (Secretária Nacional Antidrogas do Ministério da Justiça), cujo título é "Drogas por quê?"
Viu-se exatamente que a tendência hoje é criminalizar o usuário e o produtor - em geral um pequeno produtor, seja de coca ou maconha -, deixando de perseguir quem se deveria, o traficante, que leva a parte principal da lucratividade do dinheiro. Aí é onde está posto esse debate.
Foram mostrados o exemplo do Uruguai e da Suíça em relação a esses aspectos e outras experiências que Portugal também vem fazendo em relação à descriminalização, com resultados, na visão dessas autoridades, importantes. A Colômbia e o Peru igualmente mostraram seus projetos nesse setor.
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Nos Estados Unidos, Senador, na segunda-feira e na terça-feira, a imprensa especulou muito: há uma preocupação, Senador Alvaro Dias, de que o Obama poderá não autorizar a vinda da representação norte-americana para as Olimpíadas em função dos problemas causados pelo zika vírus. Da mesma forma, o Quênia; os jornais americanos dando conta de que o Quênia, dos corredores famosos, também poderia proibir a vinda dos seus atletas para as Olimpíadas do Rio de Janeiro. Se isso vier a se confirmar, será, eu diria, um problema grave do ponto de vista da participação de um evento desta envergadura.
Nós estamos devendo explicações, primeiro, para a população brasileira. Aqui foi falado pelo Senador Cristovam Buarque - como sempre exemplar na manifestação - que há cinco meses alguns Estados estão sem receber do Governo Federal o kit que faz os testes para identificação da doença. Isso tem sido provocado, segundo o Ministério da Saúde, pela dificuldade na compra e na distribuição desses kits. Ora, é uma coisa elementar - é uma coisa elementar - fazer uma compra e distribuir. Vejam os Estados que não estão recebendo: São Paulo, um Estado extremamente vulnerável, com muitos casos, sem receber estes kits, e outros Estados da mesma forma. O Governo Federal diz que até o final deste mês poderá resolver esse problema.
O caso do zika vírus dá bem a medida, eu diria assim, da falta de protagonismo, de iniciativa, de profissionalismo e de atenção em estabelecer prioridades - prioridades com um tema crucial, a saúde pública de nosso País.
Eu já disse aqui nesta tribuna, sobre o zika vírus, que combater o mosquito não é um problema apenas do Governo. Eu reconheço que esse é um problema de cada um de nós - cada um de nós.
Aliás, a Comissão de Agricultura do Senado Federal, que eu tenho a honra de presidir, vai promover no dia 18, na próxima quinta-feira, um debate sobre o zika vírus para tratar de como combater o mosquito Aedes aegypti, trazendo especialistas de instituições importantes ligadas à pesquisa nesse setor. E por quê? Porque o setor rural recebe menos informações a respeito dos riscos de contaminação e dos criatórios do mosquito, como os pneus das máquinas agrícolas, como as próprias lonas que se colocam para proteger os equipamentos, as sementes ou a própria ração para o gado. Não há informação sobre os riscos de, nessa lona, com as chuvas, o local acabar se tornando um foco da criação do mosquito ou vários focos, porque são piscininhas, vamos dizer assim, onde se desenvolve, agora, com o clima do verão, facilmente o mosquito da dengue. Então, é esse o motivo que nos leva, na Comissão de Agricultura, a debater essa matéria, por proposta dos Senadores que fazem parte dessa Comissão, um debate extremamente oportuno e necessário. Ali também vamos saber quais as providências que deveremos tomar, quais as medidas mais urgentes e necessárias em relação a essas questões.
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Milhões de pessoas estão infectadas e o Ministério da Saúde já confirmou a terceira morte no Brasil relacionada a esse vírus transmitido pelo mosquito Aedes aegypti, o mesmo transmissor da dengue e da febre chikungunya. A paciente era uma jovem de 20 anos, do Município de Serrinha, no Rio Grande do Norte. Ela ficou internada em Natal durante 11 dias com problemas respiratórios. A morte foi em abril do ano passado, mas o resultado dos exames só saiu agora. Não à toa, o Brasil virou caso de emergência mundial, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Esse é o tema mais presente na imprensa dos Estados Unidos, na imprensa do mundo, dada a mobilidade, porque agora, no verão, muitos turistas vêm para o Brasil aproveitar o clima quente e também porque o Brasil se tornou mais barato para o turista, em função do câmbio favorável, que recebe mais reais quando faz o câmbio de dólares ou de euros para o nosso real.
A prevenção depende de todos, como eu disse. Evitar lixo acumulado e não deixar água parada como criadouro de mosquitos, por exemplo, são medidas básicas para evitar o alastramento do vírus responsável pelo surto de microcefalia na Região Nordeste, desde o ano passado. Estamos tratando de uma situação inédita na pesquisa científica mundial. As investigações sobre o tema devem continuar para esclarecer questões como a transmissão desse agente, sua atuação no organismo humano, a infecção do feto e período de maior vulnerabilidade para a gestante. Inicialmente, o risco está associado aos primeiros três meses de gravidez e ainda há muitas dúvidas sobre como combater esse vírus.
São casos preocupantes de saúde pública que precisam, sem dúvida, da mobilização social e política de toda a sociedade brasileira.
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Por causa de problemas de higiene, falta de rede de esgoto e de reduzido acesso a água potável, uma criança morre no Brasil a cada três minutos - a cada três minutos! -, mais de 100 milhões de brasileiros não têm coleta de esgoto, e apenas 39% dos rejeitos são tratados - 39%! O resto é despejado na natureza, incentivando a proliferação de mosquitos e doenças de todos os tipos e problemas também graves para Estados e Municípios, endividados no limite da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Em boa hora, a nossa CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) acabou de escolher seu tema da Campanha da Fraternidade 2016, "Casa comum, nossa responsabilidade", com foco na melhoria das políticas de saneamento básico. Essa é outra preocupação que atinge a todos - União, Estados e Municípios -, mas atinge sobretudo as pessoas, porque quem joga o lixo na frente da sua casa ou num terreno baldio de seu bairro está comprometendo a sustentabilidade e o meio ambiente; está comprometendo a sua própria saúde, dos seus filhos, dos seus parentes, dos seus amigos; está comprometendo a saúde de todos os moradores daquele bairro ou daquela cidade. É exatamente essa responsabilidade social que a CNBB, em boa hora, está buscando. A CNBB chama a atenção de todos para que tenhamos esse compromisso não apenas com cada um de nós, mas com o coletivo onde nós vivemos.
É por esse aspecto que aqui ocupo brevemente a tribuna, Senador Paim, caros colegas Senadores, para dizer exatamente da gravidade da situação e das consequências. Vamos esperar que nenhum país proíba os seus atletas de vir à Olimpíada no Rio de Janeiro. Isso seria um desastre não só em relação ao descrédito do Brasil numa questão crucial, que é a saúde pública, mas também em relação ao sucesso desse evento que foi cantado em prosa e verso, mas que teve seu gasto discutido. Assim como na Copa do Mundo, discutiu-se muito o gasto que foi feito para realizar a Olimpíada. Querem saber se a sociedade carioca, fluminense vai se beneficiar, de fato, com as obras que foram ali iniciadas e concluídas.
Ora, da Copa do Mundo, temos estádios ociosos que valeram, como o aqui de Brasília, quase R$2 bilhões - um estádio que está ali praticamente ocioso. E foi dinheiro público, dinheiro que falta para a saúde.
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As pessoas não têm hospital, não têm atendimento, mas houve dinheiro para botar no estádio de Brasília e no de outros Estados em que o futebol não é um esporte de grande relevo - como ocorre no eixo Rio-São Paulo, ou no Nordeste, em Pernambuco, ou no nosso Rio Grande do Sul, ou no Paraná do Senador Alvaro -, em que o futebol não tem essa relevância e essa importância, com torcidas organizadas, com um movimento enorme nos estádios. Por exemplo, o estádio que foi feito em Cuiabá, o estádio que foi feito em Manaus revelam um equívoco de prioridades, Senador.
E hoje, junto com todo esse cenário de más notícias, vem a notícia da Transparência Internacional, informando que, na sua análise de 400 casos no mundo sobre corrupção, a Petrobras ficou em segundo lugar; em segundo lugar, na avaliação da Transparência Internacional! É muito triste para nós, brasileiros, ver essa empresa, um orgulho, "o petróleo é nosso", tudo isso praticamente implodido por um processo que nós temos que combater sempre.
A nomeação de presidentes, de dirigentes dessas empresas estatais deveria ser em nome do interesse nacional, em nome do interesse público, e não em nome do interesse de partidos políticos; deveria seguir a mesma profissionalização, o mesmo rigor, o mesmo perfeccionismo, o mesmo profissionalismo que marcou a vitória da Mangueira, da Verde-e-Rosa, nessa grande festa de Carnaval, na homenagem a Maria Bethânia. Esse mesmo rigor e esse mesmo perfeccionismo - e eu acrescentaria a ética e a responsabilidade - deveriam vigorar em nosso País como hoje estão vigorando em algumas instituições como o Poder Judiciário, a Polícia Federal e o Ministério Público. É isso que nos dá ainda a esperança de que uma Operação Lava Jato possa nos simbolizar, a esperança de que possamos enxergar uma luz no fim do túnel desse processo.
É muito triste saber que a Petrobras é o segundo maior caso de corrupção no mundo, segundo a Transparência Internacional.
Muito obrigada, Senador Paim. Muito obrigada, Senadores.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Essa foi a Senadora Ana Amélia, que falou pela Liderança do PP.
Agora, como orador inscrito, é o Senador Alvaro Dias.
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O SR. ALVARO DIAS (PV - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Paulo Paim; Srs. Senadores, Srªs Senadoras, pretendo hoje fazer modesta reflexão sobre a importância do Parlamento e as suas responsabilidades neste momento dramático vivido pelo nosso País.
Mas antes, Senador Paim, uma homenagem, um voto de aplauso a...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Permita-me, Senador Alvaro Dias.
O SR. ALVARO DIAS (PV - PR) - Pois não; pois não, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - O Deputado Frederico Antunes, Senadora Ana Amélia, permita-me rapidamente, é um grande companheiro nosso, um grande companheiro seu também; viajei com ele para cá, vim ao lado dele, e eu disse: "Sou bom como companheiro de viagem". E ele: "Por que, Senador?" "Porque durmo o tempo todo." (Risos.)
Então, permita-me fazer esse registro, V. Exª que acompanha a Senadora Ana Amélia, foi e é um grande Parlamentar do povo gaúcho.
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Obrigada, Senador Paim; obrigada, Senador Alvaro, pela interrupção. Fico feliz por V. Exª ter feito esse registro, e não eu, pois poderia parecer compadrio, porque o Deputado é meu correligionário do Partido Progressista. Temos uma agenda para tratar de free shops com a Receita Federal agora, tema que interessa também ao Paraná.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Interessa a todos nós.
A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Obrigada, Senador Paim. Obrigada, Senador Alvaro.
O SR. ALVARO DIAS (PV - PR) - Sucesso a V. Exª.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Seja bem-vindo, Deputado.
Desculpe, Senador Alvaro.
O SR. ALVARO DIAS (PV - PR) - Senador Paulo Paim, um voto de aplauso à grande escritora brasileira Lygia Fagundes Telles, que é a primeira mulher brasileira a ser indicada ao Prêmio Nobel de Literatura.
A indicação da escritora para o prêmio de literatura é um marco para a cultura nacional. A União Brasileira de Escritores elegeu-a por unanimidade e já encaminhou seu nome à Academia sueca. A escolha e o anúncio serão em outubro próximo, na capital sueca.
Lygia Fagundes Telles é verdadeiro patrimônio da literatura brasileira, já que disseminou sua produção literária pelo mundo afora. Suas obras são traduzidas para o alemão, inglês, espanhol, francês, italiano, polonês, tcheco e português de Portugal.
Muitos de seus livros foram igualmente adaptados para o teatro, cinema e televisão. É motivo de celebração e de muito orgulho para todos os brasileiros partilhar deste momento emblemático de sua indicação ao Nobel.
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Lygia Fagundes Telles é, inquestionavelmente, a maior escritora brasileira viva, reproduzindo as palavras do presidente da União Brasileira de Escritores, Durval de Noronha.
Numa densa entrevista concedida ao jornal O Estado de São Paulo, ela afirmava: "Eu sou uma jogadora. Meu pai era um jogador. Ele jogava com as fichas, eu jogo com as palavras. Eu acho que nós temos de arriscar o tempo todo, até a morte. Então arrisco e acho válido. É uma forma de transpor o círculo de giz, a fronteira. Isso, para o escritor, é sempre uma esperança."
Nas palavras do acadêmico Eduardo Portella, que a saudou na posse da Academia Brasileira de Letras, em maio de 1987, "esse traço modernizante, esse salto rigorosamente qualitativo que vai da ilusão da plenitude à aventura do possível, esse risco calculado, atento às regras do jogo, instala a esperança no interior da linguagem. E a linguagem não é senão a língua mais a premonição."
De maneira lapidar, a magistral Lygia Fagundes Telles sentencia que "a obra de arte é uma criação de liberdade, de liberdade e de amor." Suas expressões revelam invariavelmente uma vastidão avessa às fronteiras. Na exata exposição de Portella:
Quem se aproxima da rigorosa humanidade de Lygia pode compreender, sem se entregar ao biografismo fácil, o quanto a pessoa influiu no personagem. Influiu sem dirigir, sem subjugar os movimentos livres da cena. Influiu no alto teor ficcional. Influiu na temperatura afetiva das reconstituições. Influiu no exercício sem alarde, no exercício silencioso e pontual da solidariedade, que é, nos mínimos gestos reclusos, a façanha de um encontro ao mesmo tempo intelectual e humano.
A obra dessa escritora, que já recebeu os prêmios Camões (2005) e Jabuti (1966 e 1974), entre tantos outros, agora concorre ao prêmio que personifica a maior honraria concedida a um escritor. Nesse contexto, estou convicto de que Lygia Fagundes Telles, essa escritora "radical", "enraizada", faz-se merecedora, por parte do Senado da República, desse apoio e desse voto de aplauso que tenho a honra de propor e a certeza de que será aprovado, como reconhecimento de sua colossal produção literária.
Por fim, requeiro que o presente voto de aplauso seja encaminhado à homenageada.
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Essa é a homenagem que fazemos a essa grande escritora, certamente fazendo jus à sua trajetória literária, atendendo, obviamente, à expectativa de milhares de brasileiros que a admiram.
Mas, Sr. Presidente, pretendo, como disse no início desta fala, abordar a responsabilidade do Parlamento na democracia.
Hans Kelsen, célebre jurista e filósofo austríaco, na obra Essência e Valor da Democracia, adverte que a existência da democracia moderna depende da questão de ser ou não o Parlamento um instrumento útil para resolver as necessidades sociais de nossa era.
A função de ditar normas de conduta que regulam a vida social com alcance geral não esgota o trabalho do Parlamento. Tão importante quanto a tarefa de legislar é a de fiscalizar o cumprimento das leis. Tarefa que, considerando a complexidade crescente da administração pública, exige tempo e conhecimento. Nesse ponto, vale ressaltar que a fiscalização não constitui uma função exclusiva do Poder Legislativo. O Poder Judiciário, o Ministério Público e a Polícia Federal atuam com essa função.
Ao Parlamento, diversas técnicas de controle são disponibilizadas. Podemos formular denúncias da tribuna, encaminhar pedidos de informação a ministros e órgãos de fiscalização, apresentar votos de repúdio ao Governo, criar comissões de investigação, como CPIs, que têm o poder de quebrar sigilos, por exemplo.
No Parlamento, a função de fiscalizar é característica da oposição. Inclusive, é no Parlamento que a oposição, elemento característico da democracia pluralista, tem seu espaço para atuar com maior vitalidade. Quanto mais livre e atuante é a oposição, mais democrático é o regime político. É por isso que se afirma: "Infeliz é a nação que não possui uma oposição competente, responsável e corajosa".
Na Inglaterra, por exemplo, a oposição se organiza de tal forma que é denominada Gabinete Sombra (Shadow Cabinet), também conhecido como Oposição de Sua Majestade (Her Majesty's Loyal Opposition).. Cada membro do Sombra faz um minucioso acompanhamento das ações de um ministro titular. Tudo isso para acompanhar os atos do Governo de forma permanente e eficiente, criticando e fiscalizando as políticas e ações do Governo e propondo mudanças na legislação.
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No Brasil, a oposição, embora numericamente raquítica, faz do Parlamento o espaço legítimo para manifestação. Durante anos, alguns da oposição denunciamos os desmandos na área econômica. Chamei atenção para a bomba de efeito retardado que estava sendo gestada pelos arquitetos da política econômica que serviam e ainda servem à Senhora Presidente da República. Até ao Supremo Tribunal Federal nos dirigimos para conseguir abrir a caixa-preta que durante anos caracterizou os negócios do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), especialmente aqueles relacionados aos empréstimos a países estrangeiros, subsidiados com o dinheiro do contribuinte brasileiro que foram permitidos graças ao maroto Decreto Presidencial nº 6.322, de 21 de dezembro de 2007, que alterou o Estatuto Social do BNDES, permitindo esse tipo de operação.
Abro parênteses, nesse aspecto, para dizer àqueles que imaginam ser responsabilidade do Senado Federal aprovar ou não empréstimos concedidos através do BNDES a outras Nações que, na verdade, essa prerrogativa não nos pertence. Esse decreto que alterou esse estatuto do BNDES permite esse tipo de operação sem que o Congresso Nacional, especialmente o Senado Federal, tenha que avalizar.
De fato, criticamos, fiscalizamos e denunciamos nos últimos anos. Quando criticávamos a política econômica, especialmente o crescimento da dívida pública, o Governo tentava nos desqualificar dizendo sermos pessimistas. Deu no que deu. Não estava, portanto, a oposição sendo pessimista. Estávamos alertando. O Governo insistiu no erro e agora chama a população para pagar a conta, aumentando impostos em diversos segmentos. Ele lançou a proposta da CPMF. E, enquanto a população assustada tenta se mobilizar para frear a criação da CPMF, o Governo, de forma sorrateira, vai aumentando impostos em diversas áreas e, assim, ampliando a fatia que abocanha dos salários dos brasileiros - aliás, na contramão da realidade. Eu tenho repetido, Senador Paim, que se trata de uma trombada na realidade nacional, porque estamos vivendo um período de recessão, de inflação que se eleva e de desemprego, e aumentar impostos é aumentar dificuldades. Aumentando dificuldades, o desemprego, sobretudo, cresce e passa a ser, hoje, a grande preocupação dos brasileiros. O drama que vivem trabalhadores ainda empregados diante da perspectiva de uma demissão a curto prazo passa a ser o sofrimento maior neste País na atualidade.
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Criticamos também, de forma indignada, o estelionato eleitoral que caracterizou a vitória da candidata eleita para a Presidência da República, que se elege prometendo açúcar ao povo e está entregando robustas doses de fel a cada dia.
Atualmente, grande parte do que denunciamos está sendo investigada pela Polícia Federal, Ministério Público, Justiça Federal e Tribunal de Contas da União. Quando afirmo "investigamos", faço referência às várias CPIs realizadas no Senado Federal - algumas delas com insucesso visível, mas que, de qualquer maneira, produziram relatórios paralelos que, certamente, se tornaram importantes para as investigações atuais. Aliás, foram representações inúmeras. Só em relação à Petrobras, nós protocolamos 18 representações junto ao Procurador-Geral da República. As denúncias desde 2009 foram selecionadas; as mais importantes, as mais graves se transformaram em representações encaminhadas ao Procurador-Geral da República. E, dessas representações, surgiram os inquéritos instaurados pelo Ministério Público Federal. Certamente, elas se constituem em uma contribuição do Legislativo para que essa investigação judiciária em curso tenha sucesso e alcance os resultados, surpreendentes para muitos, que vêm alcançando. Criticamos, portanto, o Governo e tomamos essas providências que cabia ao Legislativo adotar.
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Atualmente, repito, grande parte do que denunciamos está sendo investigado pela Polícia Federal, Ministério Público, Justiça Federal e Tribunal de Contas da União. Nesses casos, o Parlamento não deve concorrer com as instituições que estão atuando. Constantemente, nós somos cobrados como se devêssemos instalar novas CPIs para investigar aquilo que já está sendo investigado com maior autoridade e competência, pois trata-se de uma investigação judiciária de profissionais qualificados, uma investigação que se realiza tendo à frente profissionais extremamente qualificados e experientes, com instrumentos muito mais poderosos do que aqueles de que nós poderíamos lançar mão para a investigação política.
É por isso que na Constituição da França se inscreve que a Comissão Parlamentar de Inquérito se instala como forma de convocar o Ministério Público a investigar. A partir do momento em que o Ministério Público instaura os procedimentos para a investigação, a CPI encerra suas atividades, mesmo sem conclusão. Aqui, no Brasil, nós avançamos com investigações paralelas, que, até determinado momento, são necessárias, úteis, contribuem, mas, hoje, quando nós vemos o avanço das investigações em relação à Petrobras, abordar a necessidade de instalar-se uma nova CPI aqui seria, a meu ver, uma incongruência e, de certa forma, um oportunismo de quem estaria tentando aproveitar-se do fato consumado para obter dividendos de natureza eleitoreira. Não cabe à oposição esse comportamento.
O Parlamento deve, sim, estar atento e atuar para garantir a continuidade e a regularidade do trabalho que está sendo realizado pelas instituições. Neste caso, a oposição no Parlamento deve atuar como guardiã e atuar como instrumento garantidor, valorizando o trabalho dessas instituições que se credenciam diante da opinião pública, apontando para uma mudança essencial para que se acredite no futuro deste País. Eu me refiro às instituições como a Justiça Federal, o Ministério Público Federal e a Polícia Federal. Creio que esta é a nossa missão nesta hora: corroborar, valorizar, apoiar para que essas investigações alcancem o resultado desejado pelo povo brasileiro.
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Já com relação à função legislativa, o Parlamento precisa efetivamente aproveitar o que está sendo identificado como fragilidade do sistema legislativo e aperfeiçoá-lo, para que a corrupção não encontre terreno fértil como encontrou nos últimos anos. Fazendo isso, efetivamente, o Parlamento estará sendo um instrumento útil para resolver as necessidades sociais de nossa era.
No turbilhão da crise econômica, da crise de liderança, da crise ética e da crise de legitimidade, o Parlamento deve buscar um novo patamar nos debates travados entre os seus pares. É inaceitável transformar as discussões em plenário numa disputa político-partidária. O debate deve ser orientado pela busca de alternativas para o País.
Como já dissemos, procuramos cumprir nosso papel fiscalizador nos últimos anos. Considero injusta a crítica generalizada de que atuamos com timidez. É possível que alguns oposicionistas tenham atuado com timidez, mas não todos. Seja nas CPIs, nas representações apresentadas, nos pedidos de informações, em auditorias, etapa preliminar que antecede a investigação judiciária, oferecemos às instâncias adequadas - como a Polícia Federal, o Ministério Público, a Justiça Federal e o TCU - os elementos para as investigações que foram confirmadas pela Operação Lava Jato, deflagrada nos idos de 2014. Precisamos, sim, enaltecer - repito - o papel dessas instituições, capazes de mudar o conceito de justiça. Até então, vigorava a máxima de que a justiça no Brasil só valia para os pobres. Hoje há grandes empresários, banqueiros, ex-ministros de Estado, Parlamentares e até um ex-Presidente da República sendo investigados. Isso merece ser celebrado como um avanço da nossa democracia. Há, hoje, na prisão - especialmente em Curitiba, capital do meu Estado -,empresários, ex-ministros, Parlamentares, lideranças políticas. E isso, até há bem pouco tempo, era inacreditável.
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Estamos vivendo um momento de mudança do paradigma de justiça, que merece ser celebrado. O que se assiste, neste momento nacional, é a justiça derrotando a impunidade. Momento que tem na Operação Mãos Limpas, iniciada em 1992, na Itália, uma similaridade como marco na história contemporânea do Judiciário. A Operação Mãos Limpas, da Itália, resultou em 2.993 mandados de prisão, 6.059 pessoas investigadas, das quais 872 eram empresários, 1.978 eram administradores locais e 438 Parlamentares - quatro deles haviam sido primeiros-ministros.
Segundo o Juiz Sérgio Moro, no seu trabalho publicado na Revista CEJ, em 2004, intitulado "Considerações sobre a Operação Mani Pulite", "a ação judiciária revelou que a vida político-administrativa de Milão e da própria Itália estava mergulhada na corrupção, com o pagamento de propina para a concessão de todo contrato público". Precisamos ter consciência de que "a corrupção disseminada não coloca em xeque apenas a legitimidade do regime democrático, mas também a do sistema judicial", como escreve o Juiz Moro no citado trabalho. Nas palavras de Donatella Della Porta, professora de ciências políticas do Instituto Universitário Europeu, e de Alberto Vannucci, professor da Universidade de Pisa e autor de várias obras sobre corrupção, citados textualmente por Moro:
de fato escândalos políticos não colocam em questão apenas a legitimidade da classe política; eles também tem impacto na legitimidade daqueles encarregados de investigá-los: a magistratura. Em alguns casos, de fato, a descoberta de ilegalidade disseminada provoca críticas ao sistema no sentido de que este estaria sendo inadequado para combater a corrupção.
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O Parlamento não pode contrapor-se à Operação Lava Jato. Um novo conceito de justiça emergiu do mar de ilícitos. Nesse contexto, é preciso oferecer marcos legais para o efetivo combate à corrupção, com a aprovação de inúmeros projetos em tramitação, tais como o que muda as regras da prescrição penal para reduzir a impunidade; a proposta de emenda à Constituição do combativo hoje Deputado Jarbas Vasconcelos que já foi aprovada pelo Senado e que impõe a perda imediata do mandato de Parlamentar condenado em sentença definitiva; a proposta do hoje Governador Pedro Taques - dele fui parceiro como relator, ampliando sua proposta - que já foi aprovada no Senado, que está na Câmara dos Deputados e que transforma a corrupção em crime hediondo, bem como o projeto sugerido pela Associação dos Juízes Federais que inibe manobras processuais utilizadas pelo réu para responder em liberdade, a exemplo de tantos outros.
Mas não só o Parlamento é protagonista de mudanças na legislação. O Ministério Público está à frente da campanha "10 medidas contra a corrupção", colhendo assinaturas para apresentar projetos de lei, entre eles o que criminaliza o enriquecimento ilícito de agentes públicos e a responsabilização dos partidos políticos pelo caixa dois.
Como bem afirma o Juiz Moro, "a gravidade da constatação é que a corrupção tende a espalhar-se enquanto não encontrar barreiras eficazes".
Decididamente, o Parlamento precisa interpretar as inquietações e necessidades populares. Caso não atue com esse espírito, produzirá um distanciamento entre os eleitores e os Parlamentares, o que não é desejado, visto que o desprestígio dos políticos pode corroer o prestígio da instituição parlamentar e a própria democracia.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
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O SR. PRESIDENTE (Raimundo Lira. Bloco Maioria/PMDB - PB) - Passo a palavra ao Senador Paulo Paim. (Pausa.)
O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS. Fora do microfone.) - Vou para o outro microfone. Aquele lá está funcionando. Vou para aquele, se for o caso.
O SR. PRESIDENTE (Raimundo Lira. Bloco Maioria/PMDB - PB) - Senador, o painel eletrônico está em manutenção. V. Exª, por favor, ocupe esta tribuna aqui...
O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS. Fora do microfone.) - Pois não.
O SR. PRESIDENTE (Raimundo Lira. Bloco Maioria/PMDB - PB) - ...apesar de, tradicionalmente, V. Exª ocupar aquela tribuna.
O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Raimundo Lira, no exercício da Presidência da sessão, eu já li e coloquei em votação - faço questão de que isto fique registrado também como meu pronunciamento na tribuna - uma nota oficial da Comissão de Direitos Humanos sobre o assassinato do psicólogo e militante social Marcus Vinicius Matraga.
A Comissão de Direitos Humanos vem, por meu intermédio, manifestar sua irrestrita solidariedade à família de Marcus Vinicius Matraga, assassinado no dia 5 de fevereiro, no Estado da Bahia. O ex-sindicalista e psicólogo, militante dos direitos humanos, foi levado de sua casa por dois homens armados até uma estrada, onde foi morto com um tiro na cabeça. Essa Comissão fará todos os esforços junto às autoridades da Bahia e à Polícia Federal para o esclarecimento imediato de quem foi o autor ou o mandante do crime.
Propomos, assim - já encaminhei, Sr. Presidente -, em nome da Comissão de Direitos Humanos, voto de pesar, a ser encaminhado à família de Marcus Vinicius Matraga, ao Sindicato dos Psicólogos da Bahia e à Federação Nacional dos Psicólogos.
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Quero também, Sr. Presidente, fazer outro registro que considero importantíssimo.
No dia 5 de fevereiro de 2016, a TV Senado completou 20 anos. As comemorações serão restringidas à programação da própria TV, com produções especiais e com novos produtos, além de uma sessão especial que se realizará no mês que vem.
Falo aqui, Sr. Presidente, em nome de todos os profissionais, do mais simples ao mais graduado, como a gente fala, dessa importante TV brasileira, que é um instrumento fundamental do próprio processo democrático. Nada há mais democrático do que a TV Senado. Tudo que eu falar aqui vai ao vivo para milhões e milhões de brasileiros.
Parabéns a todos e a todas que, no dia de hoje, fazem da TV Senado um dos mais importantes veículos de comunicação pública do nosso País!
Aqui, na TV Senado, Sr. Presidente, não há censura. Seja negro, seja branco, seja índio, seja cigano, seja de oposição, seja de situação, tudo que se fala vai ao ar.
(Interrupção do som.)
O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Registro ainda, Sr. Presidente, que, quando me apresenta este pequeno resumo, o Diretor da TV Senado o faz com muita humildade, porque o trabalho da TV Senado, que é um trabalho de cidadania, ultrapassa em muito estas folhas pelas quais, neste momento, corro os olhos para homenagear essa querida emissora.
É um instrumento que dá transparência e visibilidade ao trabalho de todos os Senadores e Senadoras e de todos os convidados que vêm a esta Casa, seja nas comissões, seja no plenário, aproximando, com isso, naturalmente, a Casa ao povo brasileiro.
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Assim, Sr. Presidente, é que surgiu a TV Senado há 20 anos, a primeira emissora legislativa de alcance nacional.
Em 5 de fevereiro de 1996, o então Presidente do Senado, José Sarney, resumia a quem se destinava a TV Senado: "Este serviço hoje inaugurado não é serviço para o Senado, mas para o povo brasileiro".
O desafio de aproximar o trabalho dos Parlamentares da sociedade fez surgir um modelo único de TV legislativa, que superou as naturais dificuldades de uma missão pioneira, como lembra a jornalista Marilena Chiarelli, primeira diretora da TV Senado.
- Naquele momento, a gente tinha uma estrutura pequena, não tinha um modelo a seguir. Tivemos que inventar a TV que a gente queria - recorda Marilena.
No começo, eram só 15 horas diárias de programação, transmitidas apenas para Brasília. Em menos de um ano, passou a ficar 24 horas no ar. Hoje, o canal aberto da TV Senado está disponível em 20 capitais, e seu sinal também chega a 40 milhões de residências por antena parabólica e TV por assinatura.
São milhões e milhões de brasileiros que ouvem tudo que nós falamos e fazemos aqui no Senado. Calculem os senhores, nesta introdução, como um Senador como eu, por exemplo, entraria na mídia nacional ou mesmo na mídia do Estado se não fosse a TV Senado? Talvez, ficasse aqui um desconhecido falando para as cadeiras ou para nós mesmos aqui dentro. Mas, graças à TV Senado, o nosso trabalho - não o meu, mas o nosso, o de todos nós - é conhecido em todo o Brasil. Tenho feito uma experiência recentemente com o debate da terceirização, coberto pela TV Senado. Se a TV Senado não pode mandar a equipe, ela recebe da assembleia o debate que lá realizamos e o transmite depois. Vemos, assim, o alcance da TV Senado.
Sr. Presidente, falar da importância da TV Senado faz também com que nos lembremos dos conteúdos produzidos nas atividades legislativas, do jornalismo, dos programas acessados por meio do site oficial e do canal do Youtube.
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A receita criada foi mérito dos profissionais da TV Senado, destaca Murilo Ramos, consultor em Comunicação, para quem o modelo de uma TV legislativa com características de TV de serviço público, mas com programação generalista, é "sensacional e único no mundo".
Para Fernando Oliveira Paulino, diretor da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (UnB), a TV Senado já se consolidou como uma ferramenta essencial para promoção da transparência e da democracia no País.
- É claro que a cidadania brasileira espera que esse canal permaneça desenvolvendo o trabalho que faz e o expanda, promovendo ainda mais debates, discussões públicas e também oferecendo condições para que seus profissionais desenvolvam suas atividades sem interferência [nenhuma] de grupos políticos que assumam a condução da Casa [...]. [É a palavra do professor.]
Para o cientista político André César, que tem na TV Senado uma ferramenta de trabalho, o marco foi a CPI Mista dos Correios, em 2005, quando a audiência bateu recorde.
- De repente, virou uma coisa que o Brasil inteiro parou. O dia em que Marcos Valério foi depor parecia final de Copa do Mundo. Todo mundo parou para ligar a TV, as TVs convencionais colocando no ar ao vivo, muitas usando imagens geradas [por quem?] pela TV Senado. Então, isso mostra que alguma coisa está sendo feita. E isso é muito importante.
Reafirmo aqui a defesa da transparência, da própria democracia e até do combate à impunidade e à corrupção.
As transmissões ao vivo do que acontecia no Senado tiveram impacto quase imediato na estratégia de cobertura dos outros veículos de comunicação e, mais ainda, sobre o comportamento dos próprios personagens centrais, os Senadores. A própria produção legislativa cresceu com a garantia de que tudo estaria sendo registrado e levado ao cidadão.
Aquele que não fazia nada - sabemos que isso existe em todas as categorias - teve de começar a mostrar serviço. Os que faziam continuaram fazendo, sem problema algum. Hoje, vota-se mais, debate-se mais as propostas de leis, os grandes assuntos nacionais.
Funcionam no Senado quase 40 colegiados, entre comissões permanentes e temporárias, subcomissões e comissões mistas ou de inquérito. Há dez anos, eram menos da metade. [A TV Senado cobre tudo.]
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Em 2015, a TV Senado transmitiu ao vivo 256 sessões do plenário, totalizando 920 horas. Foram 808 reuniões de comissões gravadas e transmitidas, com mais de 1.415 horas de captação. Mesmo com toda essa enorme demanda de cobertura da atividade legislativa, graças ao esforço da equipe, com cerca de 270 profissionais, foram produzidos 1.550 programas e 1.280 chamadas de programação, desafio que só pode ser enfrentado com renovados investimentos em tecnologia e capacitação de seus profissionais.
Nos anos recentes, foram adquiridos, e agora começam a ser instalados, equipamentos e sistemas que deverão compensar o déficit tecnológico que a TV Senado enfrenta em relação à maioria das outras emissoras, inclusive as públicas, mas com um esforço enorme de superação com os próprios profissionais. E 2016 é o ano que marcará o início do nosso salto analógico para o digital com ganhos de qualidade para o cidadão e para a sociedade. É uma mudança de paradigma, um momento importante para toda a equipe e para o Senado, informa o diretor de TV, jornalista Sylvio Guedes.
[A qualidade do que é produzido gera reconhecimento.] Já são 21 prêmios, entre os mais importantes do País, por reportagens e documentários. Quatro vieram da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), pelo tratamento dado pela TV Senado aos temas como hanseníase e população de rua. 'A TV Senado ganha prêmios porque mostra preocupação com os temas sensíveis à sociedade', define Dom Leonardo Steiner, Bispo auxiliar de Brasília e Secretário-Geral da CNBB.
Para marcar os 20 anos da criação da TV Senado, a Secretaria de Comunicação Social, em vez de organizar eventos ou cerimônias, optou por presentear os expectadores com o que a emissora sabe melhor fazer: o conteúdo de qualidade. Por isso, ao longo do ano, uma série de programas e documentários novos serão lançados.
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[Assim é que se mostra trabalho, assim é que a gente pode dizer: fizemos muito, mas há muito ainda por fazer.]
Filmetes de depoimentos com repórteres da TV, que narram momentos marcantes da TV Senado, sob a ótica de quem cumpriu os fatos, já começam a ser veiculados nesta sexta-feira, ou seja, amanhã. Uma série de pequenos programas registrará trechos memoráveis dos debates e votações em plenário e comissões. Outra linha de produção vai resgatar as leis mais importantes votadas pelos Senadores nos últimos 20 anos.
Da série Histórias Contadas, que enfoca a trajetória política e pessoal de grandes nomes que passaram pelo Parlamento, três novos episódios já estão sendo finalizados, sobre os ex-Senadores Eduardo Suplicy, Francisco Dornelles e Luiz Henrique. Já o projeto/documentário Cidadão 2.0 quer mostrar sob a ótica do próprio cidadão a sua interação com o Senado, por meio dos inúmeros canais oferecidos para a participação do cidadão [e-Cidadania, Ouvidoria, Alô Senado, veículos da Secom, mídias sociais, etc].
Sr. Presidente, fazendo esses dois registros, eu ainda aproveito esta tarde para fazer mais dois registros.
O SR. PRESIDENTE (Raimundo Lira. Bloco Maioria/PMDB - PB) - Senador Paulo Paim, V. Exª me permite interrompê-lo?
O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Sr. Presidente, Senador Raimundo Lira, é sempre uma satisfação receber um aparte de V. Exª.
O SR. PRESIDENTE (Raimundo Lira. Bloco Maioria/PMDB - PB) - Muito obrigado, Senador.
V. Exª falou homenageando a TV Senado pelos 20 anos. Fiz uma matéria que mandei para a imprensa da Paraíba. Todos nós, do Senado Federal, temos a convicção plena de que a democracia só funciona na sua plenitude dando liberdade total, logicamente com direitos e obrigações dos cidadãos, se existir de fato liberdade de imprensa. E a TV Senado merece todas as homenagens, pelo seu trabalho, pela seriedade, pela sua modernidade e pelas matérias que transmite à população brasileira. Quero aqui fazer mais uma referência: nenhum sistema de comunicação simboliza melhor, na sua inteireza, a liberdade de imprensa do que a TV Senado, porque, aqui, como V. Exª falou, a palavra é livre, as pessoas e os Senadores têm liberdade de expressar os seus pensamentos, expressar aquilo que recebe da população brasileira dos seus respectivos Estados e transmitir para a população brasileira.
Portanto, quero também me aliar a V. Exª, homenageando a TV Senado, principalmente através dos seus funcionários, dedicados, por transformar a TV Senado, nesses 20 anos, num sistema de comunicação que merece o respeito de todos nós, brasileiros.
Muito obrigado.
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O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Presidente, meus cumprimentos pela sua fala, que ajusta o meu pronunciamento. E uma das frases que V. Exª usou, digo: nada melhor para fortalecer a democracia que a transparência absoluta, radical. É isso que a TV Senado faz. Se eu falar aqui um palavrão, vai ao ar; e eu que responda pelo que falei. A TV Senado não tem censura. Isso é democracia na sua radicalidade, e a TV Senado tem essa simbologia.
Meus cumprimentos, Presidente.
Presidente, eu quero falar ainda hoje do meu Estado, que está passando por uma situação muito difícil. Todos sabem da situação dos servidores públicos, que os salários atrasaram, tiveram que tomar empréstimo para o décimo terceiro. Todos sabem que o desemprego tem pegado muito o Rio Grande, a própria questão do Polo Naval - outro dia eu vim à tribuna e comentava a respeito. Agora eu trago outro problema que pega principalmente a agricultura no Rio Grande do Sul: o setor da uva, Sr. Presidente, de que vou falar um pouco aqui.
Os produtores de uva do Rio Grande do Sul amargam prejuízos de mais de R$380 milhões. O Estado obteve a pior safra dos últimos 70 anos. Conforme a Emater (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural), a queda foi de 65%. Entre os motivos estão: floração antecipada, geada tardia, granizo e muita chuva, como muitos brasileiros acompanharam pela mídia em todo País. O fato é que toda a cadeia produtiva foi atingida. Além dos prejuízos aos viticultores, a queda já aumentou os preços da matéria-prima e terá impacto sobre os custos e a oferta de derivados, como vinhos e sucos.
Sr. Presidente, tomei conhecimento, porque me ligaram os produtores - e me refiro aqui também ao empresário do setor metalúrgico, que não é produtor de uva, mas é solidário a eles, o Sr. Adão -, de que, no próximo dia 3 de março, em Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha, a Câmara da Cadeia Produtiva da Viticultura, Vinhos e Derivados estará reunida.
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Esta vai ser uma oportunidade para o debate do assunto e para a busca de soluções que viabilizem a recuperação da cadeia produtiva desse importantíssimo setor do meu Estado, o vinho gaúcho - vinho e derivados; temos, também, é claro, o suco de uva.
O setor encaminhou uma carta à ex-Senadora e Ministra Kátia Abreu. E pediram também que eu interagisse, já que a Kátia foi uma Senadora que sempre teve uma relação muito amistosa, de muita solidariedade a todos aqui no Parlamento em relação à essa área que ela conhece muito bem.
Esta carta, que eles encaminharam e que vou reforçar à Ministra Kátia Abreu, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, tem o seguinte teor, Sr. Presidente - e eu sei que a Ministra Kátia, talvez, esteja até neste momento ligada na TV Senado. É esta carta que ela vai receber e que eu quero reforçar.
A carta diz:
"Está ocorrendo uma das safras mais complicadas dos últimos anos para o setor de viticultura do Rio Grande do Sul. Muitas soluções podem ser buscadas para atenuar esses problemas, como um seguro agrícola de melhor qualidade que dê a tranquilidade ao produtor, bem como uma adequada remuneração da matéria-prima. Ao mesmo tempo, toda a cadeia produtiva deve buscar mecanismos para o uso mais intenso de novas tecnologias, como, por exemplo, a adequação de variedades para cada local, o uso da viticultura de precisão e o manejo integrado das pragas.
Como já dever ser do conhecimento de V. Exª, Ministra, estamos enfrentando uma safra negativa sem precedentes na história do nosso País em relação a volume e quantidade. Esta realidade está nos afetando. Primeiro, preços praticados na compra da uva estão no patamar de R$1,50 o quilo, livre de grau para uma uva da variedade bordô, como exemplo. A uva tem uma tabela de preço mínima, que é estabelecida pela Conab, na qual se paga a mesma pela graduação, concentração de açúcar, tendo a possibilidade de ter acesso à linha de crédito subsidiada pelo Governo chamado FGPP (Financiamento para Garantia de Preços ao Produtor). Como referência, a tabela da Conab está em R$0,93 o quilo por esta mesma variedade. "
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A falta de qualidade da uva está aumentando o nosso custo para produzir um quilo de suco concentrado, já que a uva é de baixa graduação [aí se refere ao baixo teor da açúcar], devido à quantidade de chuva que temos no Sul do País.
As situações acima e que aqui listei vão prejudicar as seguintes áreas: não teremos volume de suco concentrado de uva para abastecer nossos clientes no mercado nacional; não teremos faturamento para manter nossas indústrias; não teremos giro financeiro para pagar nossos custos fixos e as nossas dívidas de FGPP (Financiamento para Garantia de Preços ao Produtor).
Hoje, suco de uva é o principal sabor de suco consumido pelos brasileiros. Com a realidade que estamos enfrentando, o valor do suco de uva vai ficar muito alto, e não teremos como abastecer a necessidade do mercado.
Acreditamos que empresas como Coca-Cola - maior comprador de suco concentrado no Brasil, que compra volumes acima de 20.000 toneladas de concentrado por ano - vão fazer de tudo para poder importar suco concentrado de uva para poder atender sua demanda. Se os nossos clientes, como a Coca-Cola, conseguirem esta importação direta, o nosso ramo vitivinícola ficará extremamente fragilizado, provocando a quebra - falência - da nossa indústria, dos produtores de uva e, consequentemente, dos seus trabalhadores.
Falamos isso, Srª Ministra, pelas seguintes razões: nossas indústrias já vão ter uma alta diminuição do faturamento este ano devido à baixa produção. Devido à baixa produção e alta procura da matéria-prima uva, o nosso custo será bem elevado, enquanto que o suco importado será mais atrativo que o nacional e atenderá nossos clientes no Brasil, em qualidade, quantidade e preço.
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Mas, por outro lado, estaremos, assim, enfraquecendo as indústrias brasileiras. Ainda mais: as mesmas terão condições de se manter no mercado com isso? Nossos pequenos agricultores, que somam 20.000 famílias, não terão onde entregar suas produções anuais."
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Sr. Presidente, para não ficar só no campo da análise, pedimos à Ministra que nos ajude a liberar a importação de suco concentrado de uva e vinho a granel para as empresas que trabalham na produção destes produtos no Brasil em um volume controlado e estudado para repor os estoques normais de cada empresa nacional para garantir que as mesmas consigam dar o giro este ano e manter o fornecimento necessário para o consumo brasileiro; exigir dos bancos a extensão dos prazos de FGPP contratados que vencem agora, em 2016 para 2017; ajudar os agricultores de uva com o seguro agrícola, que está sendo negado aos mesmos.
Os produtores precisam da ajuda do Governo para poder sobreviver e encarar de frente a crise.
Sem a ajuda, naturalmente, do Governo, várias empresas vão parar suas atividades este ano, e muitos agricultores vão desistir do plantio de uva.
A queda do setor afetará diretamente o montante de mais de 250 mil pessoas envolvidas na indústria, contando nesse volume com agricultores, vitivinícolas e seus funcionários diretos e indiretos e outros fornecedores.
O setor, enfim, pede socorro. Reitera a necessidade de uma ação do Ministério da Agricultura e de outros Ministérios, Casa Civil, para liberação de uma autorização emergencial para importação de derivados de uva a granel para que eles possam, assim, continuar produzindo o vinho e, principalmente, o suco.
Por fim, Sr. Presidente, faço um último registro.
Tenho feito isso com a maior tranquilidade, Sr. Presidente. Espero que as pessoas não vejam, neste último registro que faço, algo que vá contra aquilo tudo que eu sempre tenho pregado da tribuna e, ao mesmo tempo, o meu Partido, mas vou - como fiz com um artigo de Frei Betto - registrar da tribuna um artigo de Leonardo Boff que julgo apropriado para uma reflexão que nós todos temos que fazer.
Diz Leonardo Boff, neste artigo que achei interessante para uma reflexão, para uma autocrítica dos erros que nós cometemos, sabendo que errar é possível; o grave é não reconhecer o erro e não tentar acertar:
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Durante quatro a cinco décadas houve vigorosa movimentação das bases populares da sociedade discutindo que “Brasil queremos”, diferente daquele que herdamos. [Enfim, que Brasil queremos]. Ele deveria nascer de baixo para cima e de dentro para fora, democrático, participativo e libertário. Mas consideremos um pouco os antecedentes histórico-sociais para entendermos por que esse projeto tão sério, tão bonito não conseguiu prosperar como nós gostaríamos.
É do conhecimento dos historiadores, mas muito pouco da população, como foi cruenta a nossa história, tanto na Colônia, na Independência, como no reinado de Dom Pedro I, sob a regência e nos inícios do reinado de Dom Pedro II. As revoltas populares, de mamelucos, negros, colonos e de outros foram exterminadas a ferro e fogo, a maioria fuzilada ou enforcada. Sempre vigorou o espantoso divórcio entre o Poder e a Sociedade. Os dois principais partidos, o Conservador e o Liberal, se digladiavam por pífias reformas eleitorais e jurídicas, porém jamais abordaram as questões sociais e econômicas.
O que predominou foi a Política de Conciliação entre os partidos e as oligarquias, mas sempre sem o povo. Para o povo e com o povo não havia conciliação, mas submissão. Essa estrutura histórico-social excludente predominou por muito e muito tempo até aos nossos dias.
No entanto, pela primeira vez, uma coligação de forças progressistas e populares, hegemonizadas pelo PT, vindo de baixo, chegou ao poder central. [O Leonardo Boff é que escreveu esse documento].
Ninguém pode negar o fato de que se conseguiu a inclusão de milhões e milhões que sempre foram postos à margem. Far-se-iam enfim as reformas de base?
Um governo ou governa sustentado por uma sólida base parlamentar ou assentado no poder social dos movimentos populares organizados. Aqui se impunha uma decisão. [Você vai se articular via Parlamento numa política de negociação, ou de fora para dentro, baseado nos movimentos populares.]
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Na Bolívia, Evo Morales buscou apoio na vasta rede de movimentos sociais, de onde ele veio como forte líder. Conseguiu, lutando [às vezes e até mesmo] contra os partidos. Depois de anos, construiu uma base de sustentação popular, de indígenas, de mulheres e de jovens [de idosos],, a ponto de dar um rumo social ao Estado e lograr que mais da metade do Senado seja hoje composta [inclusive] por mulheres. Agora os principais partidos o apoiam e a Bolívia goza do maior crescimento econômico do Continente.
Porque tem apoio popular. Baseado no apoio popular, conseguiu maioria também no parlamento porque os parlamentares não quiseram ficar contra a população.
É interessante a análise que faz, aqui, o nosso querido Frei Leonardo Boff. Ele diz que aqui no Brasil se adotou outra alternativa. "Se optou pelo Parlamento no ilusório pressuposto de que seria o atalho mais curto para as reformas" que se pretendiam fazer.
Assumiu aqui o "Presidencialismo de Coalizão. Líderes dos movimentos sociais foram chamados a ocupar cargos no governo, enfraquecendo, em parte, a força popular".
Isso eu já escrevia também, permitam-me que diga, no meu livro O Rufar dos Tambores. Escrevi que estava preocupado com o fato de que o movimento social e popular estava sendo enfraquecido porque muitos dos líderes estavam ocupando cargos no Governo. Mas, enfim:
Mesmo mantendo ligação com os movimentos de onde veio, [o nosso movimento] não via neles o sustentáculo de seu poder, mas a coalizão pluriforme de partidos. Se tivessem observado um pouco a história, teriam sabido do risco desta política de Coalização que atualiza a política [na verdade] de conciliação [com a política atrasada] do passado.
A coalizão se faz à base de interesses, [e aqui está fazendo uma crítica] com negociações, troca de favores [é dando que se recebe] e concessão de cargos e de verbas. A maioria dos parlamentares [infelizmente] não representa o povo.
Mas muitos Deputados e Senadores - diz Frei Boff, é a visão dela sobre a política nacional - ficam mais ligados a como se eleger e a quem vai financiar as campanhas. Diz ele:
Todos, com raras exceções, falam do bem comum, mas [infelizmente] é pura hipocrisia.
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Na prática, infelizmente, os interesses de bens particulares e corporativos acabam prevalecendo. Foi esse atalho que não deu certo. Por isso, neste período, não se conseguiu fazer nenhuma reforma política, econômica, tributária e muito menos agrária. Não havia base organizada.
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Diz ele:
A Carta aos Brasileiros, que na verdade era uma carta aos banqueiros, obrigou Lula a ficar dentro do ditames da macroeconomia mundial. Ela deixava pouco espaço para as políticas sociais, que foram aproveitadas, tirando da miséria 36 milhões de pessoas. Nessa economia, o mercado dita as normas e tudo tem seu preço.
Assim [nessa política de coalizão], perdeu-se o contato orgânico com as bases, sempre terapêutico contra a corrupção. Infelizmente, boa parte do PT não se manteve fiel às bandeiras principais.
Assim, Sr. Presidente, eu estou tentando resumir aqui: ele diz que as comunidades de base, as pastorais sociais e os grupos emergentes se mantiveram no seu espaço, nas suas células, entendendo que assim eles estariam dando sustentação às grandes mudanças.
Ele diz:
Eles [as comunidades de base, as pastorais sociais e os grupos emergentes] aprenderam a articular fé e política. A mensagem originária de Jesus de um Reino de Justiça, a partir dos últimos e da fraternidade viável, apontava de que lado deveríamos estar: dos oprimidos. A política seria uma mediação para alcançar tais bens para todos. Por isso, as centenas de CEBs não entraram no PT; fundaram [como eu dizia antes] células dele e grupos, como instrumento para fortalecer o sonho de melhorar a vida de todos.
Diz ele mais:
O Partido cometeu um equívoco fatal ao optar, sem opção, pelo problemático presidencialismo de coalizão. Deixamos de articular com as bases, de formar politicamente seus membros e de suscitar, buscar, alavancar novas lideranças.
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E aí ele fala aqui e não tem como não dizer: "Daí vem todo o problema [que eu estou sintetizando] do mensalão, sobre o qual se aplicou uma justiça duvidosa que a história um dia tirará ainda a limpo."
Depois, diz ele: "Veio o problema do petrolão, que envolveu também membros do partido e, naturalmente, de outros partidos."
Aí ele diz, e aqui termina, Sr. Presidente:
O PT [e eu me somo a esta posição, porque nem tudo que está aqui eu sou obrigado a concordar, está em uma carta] deve ao povo brasileiro uma autocrítica nunca feita integralmente. [E eu me somo a essa frase, tenho me manifestado assim, ao longo dos últimos, no mínimo, dois anos] Para se transformar em uma fênix que ressurge das cinzas, deverá voltar às bases e junto com o povo reaprender a lição de uma nova democracia participativa, popular e justa que poderá resgatar a dívida histórica que os milhões de oprimidos ainda esperam desde a colônia e da escravidão.
Apesar de tudo, e quer queiramos ou não, o PT representa, como disse o ex-presidente uruguaio Mujica, quando esteve entre nós, a alma das grandes maiorias empobrecidas e marginalizadas do Brasil. Essa alma luta por sua libertação e o PT redimido continua sendo seu mais imediato instrumento.
E termina dizendo:
Quem cai sempre pode se levantar. Quem erra sempre pode aprender com os próprios erros. Caso queira permanecer e cumprir sua missão histórica, o PT faria bem em seguir este percurso redentor [com uma autocrítica e começar tudo - tudo - outra vez].
Artigo com alguns comentários meus, claro, mas que fica na íntegra, nos Anais da Casa, escrito pelo inesquecível e querido de todos nós, que está sempre vigilante no combate...
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - ... à impunidade, à corrupção, e na construção de uma sociedade melhor para todos, que é o nosso querido Frei Leonardo Boff.
Era isso. Obrigado, Sr. Presidente.
Parece que eu estava segurando o tempo para o Senador Valdir Raupp chegar.
DOCUMENTO ENCAMINHADO PELO SR. SENADOR PAULO PAIM EM SEU PRONUNCIAMENTO.
(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e §2º, do Regimento Interno.)
Matéria referida:
- “Os equívocos do PT e o sonho de Lula”, Leonardo Boff.
O SR. VALDIR RAUPP (Bloco Maioria/PMDB - RO) - Muito obrigado, Senador Paim.
O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - V. Exª é que manda agora.
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Passo a palavra, neste momento, ao Senador Raimundo Lira, que gentilmente estava presidindo a sessão para que eu fizesse uma fala acima de 20 minutos, talvez 40 ou 50 minutos.
Senador Raimundo Lira, pelo tempo necessário para o seu pronunciamento.
O SR. RAIMUNDO LIRA (Bloco Maioria/PMDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Paulo Paim, é sempre uma satisfação ouvir os pronunciamentos de V. Exª, que, além de representar muito bem, com muita dignidade, com muita competência, o querido Estado do Rio Grande do Sul, enriquece esta Casa, trazendo sempre assuntos da maior importância para serem debatidos e registrados nos Anais do Senado Federal.
V. Exª falou em um de seus pronunciamentos do brutal assassinato, no Estado da Bahia, do sociólogo Marcus Vinícius Matraga. De forma violenta, nós temos visto o assassinato de muitos brasileiros que dedicaram sua vida ao estudo, à pesquisa, ao trabalho, sobretudo com amor e dedicação ao nosso País. São famílias que estão sendo destroçadas de uma forma que está emocionando, constrangendo e levando indignidade a todos os brasileiros. Por onde passamos, nós sentimos isso, essa indignação da população brasileira em relação à segurança pública.
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Há poucos dias, nós verificamos o assassinato de um médico na Lagoa Rodrigo de Freitas. O delinquente queria a sua bicicleta. Ele entregou a bicicleta, mas o delinquente enfiou uma faca no peito do médico, que tinha uma vida inteira para salvar vidas no nosso País.
Foi quando apresentei aqui um projeto transformando a posse, a condução da arma branca em arma letal, excluindo-a, naturalmente, na condição de ferramenta. Então, quando o açougueiro usa a faca, quando se usa a tesoura para cortar o tecido, quando se usa a foice ou a roçadeira para fazer os trabalhos agrícolas, elas não são armas. Elas são ferramentas de trabalho. Mas, quando um assaltante ameaça com uma faca os passageiros em um ônibus, não se justifica esse instrumento não ser uma arma letal.
Também verificamos, outro dia, a morte de outro médico no Rio de Janeiro, que saía do seu plantão e, na Avenida Brasil, foi abordado por meliantes que queriam o seu veículo. Ele entregou o veículo, mas os meliantes, no seu alto grau de perversidade, de crueldade, o assassinaram. E repito: ele tinha muito tempo ainda e grandes oportunidades de salvar vidas no nosso País.
Hoje, eu vi no noticiário da televisão um garçom ser assassinado brutalmente por dois facínoras.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Covardemente.
O SR. RAIMUNDO LIRA (Bloco Maioria/PMDB - PB) - Covardemente. Esse jovem trabalhador, pai de família, entregou o celular, que era o que os meliantes queriam. Mesmo assim, para satisfazer uma vontade agressiva de matar as pessoas, eles assassinaram o garçom. E quanta falta esse rapaz vai fazer à sua família e à sua filhinha!
Mas quero aqui fazer uma homenagem especial a um jovem paraibano que escolheu como carreira profissional servir à Polícia Militar e defender a vida e o patrimônio dos paraibanos.
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É o jovem Tenente Ulisses Costa, com apenas 32 anos, um oficial disciplinado, querido pela tropa, bem visto pela comunidade, pela sua cortesia e pela sua educação, que estava transitando num veículo da Polícia Militar, cumprindo a sua obrigação, quando sem nenhum confronto três meliantes atiraram no veículo e mataram esse jovem Tenente Ulisses Costa. E em nome dele eu quero homenagear a Polícia Militar do meu Estado, que tem pessoas cumpridoras de suas obrigações, que arriscam, no dia a dia, a sua vida, repito, para defender vidas dos paraibanos.
Então eu quero neste momento rememorar a necessidade, Presidente, que o País tem de modernizar o seu Código Penal, porque não se justifica um policial, civil ou militar... E esses policiais são seres humanos. Eles são filhos, eles são pais, eles são irmãos e arriscam a vida para prender um bandido que está cometendo crime. Logo à frente, poucos dias depois, semanas ou meses, ele arrisca novamente a vida para prender o mesmo bandido que está cometendo o mesmo crime e, com mais algum tempo, semanas ou meses, ele arrisca pela quinta vez a sua vida para prender o mesmo bandido que está cometendo o mesmo crime, porque o Código de Processo Penal imobiliza a ação dos juízes, do Judiciário brasileiro.
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Muitas vezes, de forma constrangida, um jovem juiz dedicado à sua carreira é obrigado a liberar, a dar habeas corpus a um bandido. Muitas vezes, na sua convicção, no seu íntimo, ele sabe que aquela pessoa, aquele elemento representa um perigo para a sociedade. Mas ele não faz as leis; ele interpreta as leis e precisa atender ao que preconiza o Código de Processo Penal.
Da mesma forma que um Código Penal arcaico, atrasado, imobiliza a ação da polícia - e nós temos que levar em consideração que existem muitos policiais, com certeza a maioria, que são pessoas honestas e trabalhadoras -, da mesma forma, repito, que o Código Penal imobiliza a ação policial, eu quero aqui rememorar que já existem estudos que demonstram claramente que quanto mais rigorosas sejam as leis penais, menos arbitrárias são as polícias daqueles países.
Temos o exemplo da Inglaterra, onde as leis penais são rigorosíssimas e a maioria dos policiais trabalham desarmados, porque as leis penais, um código penal rigoroso funciona como uma barreira. Ele desestimula a ação dos assaltantes, dos bandidos, dos assassinos e dos facínoras, porque eles sabem que, cometendo delitos médios ou graves, terão uma pena muito rigorosa. Isso faz com que a ação da polícia seja menos violenta e, muitas vezes, menos arbitrária, porque a lei já vai cumprir o seu papel de punir com rigor aquelas ações criminosas efetuadas, como citei aqui, de forma covarde e desnecessária contra os cidadãos.
Falei aqui também, na semana anterior, Senador Valdir Raupp, a respeito do surgimento, do crescimento e da consolidação do novo cangaço.
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São quadrilhas que chegam às pequenas cidades, dominam o pequeno contingente policial, ameaçam a população inteira e fazem o que querem, roubam o dinheiro das agências bancárias e as explodem. Por conta disso, como consequência, essas pessoas, essas famílias que moram nas pequenas cidades estão vivendo momentos de insegurança, de incerteza e até de descrédito em relação às instituições democráticas brasileiras.
E mais ainda, os bancos estão fechando essas agências. Em alguns casos, a agência que foi explodida uma vez é recuperada; explodida pela segunda vez é recuperada; explodida pela terceira vez, os bancos não têm mais como mantê-la, trazendo desconforto e reduzindo a qualidade de vida da população dessas pequenas cidades.
Isso é muito forte no Nordeste brasileiro, mas eu tenho informações de que o comportamento dessas quadrilhas, que denominamos de novo cangaço, também está acontecendo em outros Estados, inclusive no Estado de V. Exª, o Rio Grande do Sul.
O Sr. Valdir Raupp (Bloco Maioria/PMDB - RO) - V. Exª me concede um aparte?
O SR. RAIMUNDO LIRA (Bloco Maioria/PMDB - PB) - Com todo o prazer, Senador Valdir Raupp.
O Sr. Valdir Raupp (Bloco Maioria/PMDB - RO) - Quero parabenizá-lo, nobre Senador Raimundo Lira, por esse pronunciamento oportuno, citando os projetos PLS nº 320, de vossa autoria, e o PLS nº 311, de autoria do Senador Romero Jucá. Sou relator dos dois, que estão apensados. Já emiti meu parecer e o encaminhei à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania para que que seja apreciado e votado. Acredito que a tipificação do crime de arma branca, no caso da faca ou similar, possa inibir um pouco mais esse tipo de crime que V. Exª acabou de citar. São crimes bárbaros. Eu não sei qual é a diferença entre um crime com arma de fogo, um revólver ou uma pistola de calibre baixo, e com uma arma branca, uma faca, uma peixeira, um punhal, um facão. Acho que o crime é praticamente o mesmo. A violência, a barbárie que muitas vezes ocorre num crime de arma branca é tão forte, tão pesada quanto em um crime de arma de fogo. Acho que é até mais brutal, às vezes, um crime com arma branca.
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Então, eu parabenizo V. Exª, assim como o Senador Romero Jucá, por ter tido a iniciativa de encaminhar esses projetos para a apreciação do Senado Federal e, posteriormente, da Câmara dos Deputados. É de se lamentar que a violência, no Brasil, continue aumentando. Nas estradas, os acidentes de trânsito, tanto nas áreas urbanas quanto nas cidades, têm diminuído. Por que têm diminuído? Pela severidade da Lei Seca, proibindo a bebida de álcool, e também pela rigidez da Polícia Rodoviária Federal - ou mesmo das polícias estaduais, nas rodovias estaduais - na fiscalização do trânsito. Então, eu acho que as leis ajudam, sim. É claro que o Brasil vive, de repente, um momento difícil de desigualdades sociais, como muitos países vivem, mas eu acho que a rigidez e a fiscalização, para a aplicação das leis, são muito importantes. Eu visitei recentemente a Colômbia, que era um país violento, um país de guerrilha, que já está praticamente eliminada, estão, inclusive, fazendo as pazes lá, a guerrilha com o Governo colombiano, e eles estão conseguindo reduzir, nas grandes cidades colombianas, como Bogotá, Medellín, Cali, Cartagena e outras, a criminalidade. Quer dizer, um país que não é mais rico do que o Brasil, pelo contrário, é muito mais pobre do que o Brasil, e está conseguindo reduzir a criminalidade. Eu recebi hoje funcionários, conselheiros e ministros da Embaixada do Marrocos. Eu os recebi no meu gabinete, hoje pela manhã, e eles estavam lá me relatando da segurança do país deles, do Marrocos. É um país pequeno, com uma população de 35 ou 45 milhões, se não me falha a memória, mas estão conseguindo praticamente, não vou dizer zerar, mas quase zerar a criminalidade, a exemplo da Indonésia, na área de tráfico de drogas e entorpecentes, que é tolerância zero. Foi assim que os Estados Unidos, principalmente Nova Iorque, que tinha um índice de violência elevado, conseguiram combater os índices de criminalidade, com a tolerância zero. Eu acho que está na hora de o Brasil, com todo o aparato policial que tem e com as leis também... Tudo bem que temos que aperfeiçoar um pouco mais, mas o Brasil tem muitas leis que, se bem aplicadas, já poderiam estar coibindo esse tipo de crime. Mas, acima de tudo, é necessário tolerância zero. A Justiça tem que ser rápida no julgamento, e a polícia - como esse rapaz, esse cidadão, esse policial que V. Exª está narrando aí - tem que ter determinação, coragem e tolerância zero para esse tipo de crime. Parabéns a V. Exª.
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O SR. RAIMUNDO LIRA (Bloco Maioria/PMDB - PB) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, apenas para mostrar que a História da humanidade deixou claro que arma branca é tão letal quanto a arma de fogo; apenas para rememorar um fato histórico, na primeira fase do Império Romano, na guerra entre Roma e Cartago, que durou duas gerações. Aníbal, o líder de Cartago; depois, o filho Amílcar, lutaram contra Roma por um período de aproximadamente 30 anos. E, nesse período, não existia arma de fogo, a arma letal era a espada, que não é mais nem menos que uma faca de grande tamanho, uma faca longa.
E, nessa luta entre o Império Romano, na sua primeira fase, e a cidade império de Cartago, foram mortos em combate mais de 150 mil soldados. Isso mostra como a arma branca é letal. E, hoje, estamos vivendo, na atualidade... No Código Penal brasileiro, ainda não está expresso com clareza que a arma branca seja uma arma letal.
Fico muito honrado de V. Exª ser o Relator do meu projeto. Que possamos corrigir essa falha! Mas não só isso, vamos lutar, Sr. Presidente, por um código penal moderno, atualizado; um código de processo penal também moderno, atualizado, que dê instrumentos ao Judiciário para que possa cumprir com eficiência a defesa da sociedade brasileira, pondo fim a essa violência que hoje está assolando o País.
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E, mais ainda, é fundamental que, além desse assunto do Código Penal e do Código de Processo Penal, lutemos por outra causa, Sr. Presidente, que é a modernização do sistema prisional do País. Não podemos continuar da forma como está, muitas prisões são verdadeiras escolas do crime. O bandido, o criminoso, por mais perverso que seja, tem que ser punido de acordo com o texto da lei, e não pode ser punido duas vezes, ou seja, ele perde a sua liberdade e vai para uma prisão desumana; então, ele está sendo punido pela segunda vez.
Temos que também trabalhar nessa outra causa, até porque alguns setores da sociedade que defendem a manutenção do Código Penal como está, que não é mais nem menos do que um estatuto de incentivo à criminalidade, eles o defendem, por causa dessa segunda causa, que é a existência no País de presídios desumanos. Nós temos que corrigir isso para que o meliante, o criminoso, o assassino, o facínora seja punido de forma rigorosa, mas que seja recolhido com todas as garantias do Estado brasileiro.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Meus cumprimentos, Senador Raimundo Lira, que tem o meu apoio à sua iniciativa; e, na mesma linha do Senador Valdir Raupp. Às vezes, o pessoal fala: "Não, mas há muitas leis!" E eu sempre digo: "Ruim com as leis, muito pior sem elas!"
A lei, em tese, vem para favorecer os mais vulneráveis, os mais fracos. E, aí, esse é o objetivo das propostas de V. Exªs. Meus cumprimentos.
Senador Valdir Raupp, com a palavra.
O SR. VALDIR RAUPP (Bloco Maioria/PMDB - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Paulo Paim, grande líder, Senador do Rio Grande do Sul, que preside a sessão neste momento; Srªs e Srs. Senadores; senhoras e senhores ouvintes da Rádio Senado, telespectadores da TV Senado, minhas senhoras e meus senhores, antes de iniciar o meu pronunciamento, Sr. Presidente, queria, mais uma vez, porque já falei na semana passada, falar sobre o grito da pecuária do Estado de Rondônia, que é uma cruzada para melhorar o preço da arroba do boi. Rondônia é um Estado agropecuário, que vive da agricultura e da pecuária. Temos mais de 13 milhões de cabeça de gado; é um Estado novo, mas já o quinto maior produtor de carne e de leite do Estado do Brasil; e a disparidade, a diferença entre uma arroba de boi em Rondônia e no Estado de São Paulo é gritante.
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No passado, girava em torno de R$10 a R$12, o que corresponde, mais ou menos, ao preço do frete da carne para São Paulo, para os grandes centros. Hoje, está chegando a R$40 a diferença - R$40! -, e, às vezes, a até mais de R$40 corresponde o preço da arroba do boi em Rondônia, em relação ao Estado de São Paulo e, às vezes, até ao Mato Grosso do Sul e a Campo Grande; a cotação do boi fica em torno de São Paulo, Campo Grande e Mato Grosso do Sul. Então, isso é inaceitável!
E o Presidente da Assembleia, o Deputado Maurão de Carvalho, com outros Deputados, fez uma cruzada no Estado, em várias cidades polos do Estado de Rondônia. E agora, no dia 15, segunda-feira, será o desfecho destas reuniões em Porto Velho. Já foram convidadas várias autoridades de Brasília, do Ministério da Agricultura, da área de defesa animal, da Confederação da Agricultura (CNA); os proprietários e diretores de frigoríficos dos grandes grupos que dominam hoje o Brasil, e não seria diferente em Rondônia.
São poucos os proprietários de frigoríficos que são de Rondônia, a maioria é formada por grupos de fora. E há uma suspeita de cartelização, da existência de um cartel, para baixar o preço do boi, para ter mais lucro. E nós estamos apurando isso, todos nós.
Então, na segunda-feira próxima, dia 15, será esta reunião em Porto Velho, no auditório da sede, do Palácio do Governo, o Palácio Rio Madeira, com o Governador Confúcio Moura; com o Secretário de Estado de Agricultura, Padovani; com os presidentes de entidades voltadas ao agronegócio; e com os diretores, políticos, Parlamentares, Deputados Federais, Senadores, Deputados Estaduais, Prefeitos. Enfim, toda a classe política e econômica vai estar reunida no dia 15, em Porto Velho.
Então, louvo a atitude do Presidente da Assembleia, que iniciou essa cruzada. E, agora, todos nós vamos fazer esse fechamento, apertando essas empresas, para ver se elas chegam, pelo menos, ao que existia antes, a essa diferença de R$10, R$12, por arroba, no que se refere à Rondônia com relação a São Paulo.
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Entro agora, Sr. Presidente, na fala que devo fazer sobre a economia brasileira. Tenho a honra de congratular-me com a Presidente da República, Dilma Rousseff, pela convocação do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, o chamado Conselhão, que acreditamos deverá contribuir para viabilizar um consenso político, visando à mobilização das forças políticas e sociais do País, com o escopo de permitir a adoção das amplas reformas por nós ansiadas. Esse Conselho, Sr. Presidente, ficou um pouco paralisado. No Governo Lula, ele se reunia muito; no primeiro Governo da Dilma, acho que até o meio, um pouco mais, também; depois, parou. Eu acho que foi ruim a paralisação das reuniões do Conselhão, porque são muitas ideias, e essas ideias se fundem e acabam surtindo resultado.
Após sua primeira reunião, na nova formatação, o Governo pôde anunciar algumas medidas de impacto para reativar a economia e tirar o País da crise. Nesse sentido, vale recolocar em foco o programa lançado pelo PMDB em 29 de outubro, Uma Ponte para o Futuro, que mereceu amplos aplausos da sociedade brasileira. Trata-se de proposta que visa à união dos brasileiros de boa vontade, clamando pela pacificação, pois, como sabido, a disseminação do ódio e dos ressentimentos está inviabilizando os consensos políticos, sem os quais nossas crises se tornarão cada vez maiores.
Aproveito a oportunidade para parabenizar a direção do PMDB, da qual faço parte, pelas importantes propostas desse programa, que, juntamente com a Agenda Brasil, lançada pelo ilustre Senador Renan Calheiros, Presidente do Congresso Nacional, em agosto último, ajudarão no âmbito do Poder Legislativo a destravar a economia. Do abrangente programa lançado pelo PMDB e que merece ser considerado pelo Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social abordo algumas de suas mais importantes propostas no contexto da profunda recessão do Brasil e de possível longo período de estagnação.
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O Estado brasileiro vive severa crise fiscal, com déficits nominais de 6% do PIB, em 2014, e de inéditos 9%, em 2015. Houve rombo de R$111,2 bilhões nas contas públicas, havendo a dívida pública atingido R$2,8 trilhões, em trajetória que deverá continuar a elevar-se, a menos que reformas estruturais e imprescindíveis sejam empreendidas.
Em sua conclusão, o programa considera que a brusca interrupção do crescimento econômico, com o crescente desemprego e a pausa na expansão das transferências e dos serviços do Estado estão gerando um enfraquecimento da autoridade política e aprofundando a insatisfação social.
Conforme o PMDB defende no programa, requer-se recuperar a capacidade de o Brasil crescer a uma taxa próxima do nível histórico do século XX, de 2,5% ao ano per capita. É um imperativo que deve obrigar governos e cidadãos a considerarem uma trajetória realista que leve em conta a necessidade preliminar de reconstituirmos o Estado brasileiro, para que ele volte a ser como foi no passado, não um obstáculo, mas um agente do desenvolvimento.
Como aponta o Uma Ponte para o Futuro, as modernas economias de mercado precisam de um Estado ativo e também moderno. Quem nos diz isso não é apenas a teoria econômica, mas a experiência histórica dos países bem-sucedidos. Só o Estado pode criar e manter em funcionamento as instituições do Estado de Direito e da economia de mercado e só ele também pode suprir os bens e serviços.
No Relatório Global de Competitividade 2015-2016 do Fórum Econômico Mundial, o Brasil ficou em 75° lugar, apontando-se o nível dos impostos e a complexidade tributária como os dois principais problemas. As leis trabalhistas e a corrupção vêm em seguida.
As despesas públicas primárias, ou não financeiras, têm crescido sistematicamente. É, portanto, uma tarefa que compete aos partidos políticos, ao Congresso Nacional e à cidadania. Não serão somente obras de burocratas e de financistas, mas também de políticos capazes de darem preferência às questões permanentes e de longo prazo.
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No Relatório Global de Competitividade 2015-2016, serviços, cujos benefícios sociais superam os benefícios privados, o nosso desajuste fiscal chegou a um ponto crítico e merecerá mais debate no Congresso, pois sua solução poderá ser muito dura para o conjunto da população e terá de abranger, além de medidas de emergência, medidas acima do crescimento do PIB, a partir da Constituição de 1988.
Em parte, esses aumentos se devem a novos encargos atribuídos ao Estado pela Constituição, muitos deles positivos e virtuosos, nas áreas da saúde, educação e assistência social. Nesses casos, o aumento das despesas públicas, conforme opina o Uma Ponte para o Futuro, foi uma escolha política correta que melhorou nossa sociedade. Mas esta mesma Constituição e legislações posteriores criaram benefícios e dispositivos que tornaram muito difícil a administração do Orçamento, dos quais se sobressai o crescente déficit da Previdência Social, projetando-se que alcance R$125 bilhões neste ano.
Temos que considerar aqui, nesta Casa, colocar em discussão a reforma da sistemática orçamentária, pois há excessiva rigidez das despesas, o que torna o desequilíbrio fiscal permanente e cada vez mais grave. No Brasil, a maior parte do Orçamento chega ao Congresso para ser discutida e votada com a maior parte dos recursos já previamente comprometidos, seja por meio de vinculações constitucionais, seja por indexação obrigatória dos valores. Assim, os esforços de ajustes acabam se concentrando em uma parcela mínima do Orçamento, o que torna o ajuste mais difícil e menos efetivo.
Uma Ponte para o Futuro propõe, entre outras coisas, acabar com as vinculações constitucionais e considerar a implantação do Orçamento inteiramente impositivo, de forma a que o Brasil disponha de Orçamento real e não de quase ficção, tendo como meta o equilíbrio fiscal de longo prazo. Propõe ainda a criação de uma instituição que articule e integre o Poder Executivo e o Poder Legislativo, em uma espécie de autoridade orçamentária, com competência para considerar aspectos de harmonização de entendimentos com vistas a se atingirem os fins almejados.
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Outro aspecto importante abordado pela proposta do PMDB aponta para a necessidade de conter o crescente déficit da Previdência. Em 2015, a diferença ou déficit entre as receitas e as despesas do regime geral do INSS está em R$82 bilhões e, no Orçamento de 2016, as previsões do déficit alcançam R$125 bilhões.
A dívida pública, Sr. Presidente, situa-se já em mais de 67% do PIB, com tendência de continuar crescendo. O Uma Ponte para o Futuro ressalta que a nossa dívida pública deve ter custado mais de 8% do PIB em 2015. A economia brasileira convive, há longo tempo, com a anomalia de juros elevadíssimos - os mais altos do mundo - para controlar a inflação e financiar o endividamento público. Mas o Brasil talvez não tenha exibido uma garantia sólida de equilíbrio fiscal de longo prazo, e os juros altos talvez sejam o preço que pagamos por isso.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, acredito que se possa desenvolver consenso nesta Casa de que torna fundamental reverter essa anomalia, sem voluntarismo e com prudência, pois juros tão altos diminuem nossa capacidade de crescer, afetam os investimentos produtivos e realizam uma perversa distribuição de renda.
Ao mesmo tempo, a elevada incerteza sobre a sustentabilidade da nossa economia tem resultado no aumento exponencial da dívida de curto prazo, como, por exemplo, pelas Letras Financeiras do Tesouro, sendo quase 40% de nossa imensa dívida, na prática, financiada diariamente no mercado financeiro, uma situação que nenhum país relevante compartilha conosco.
O programa em tela aponta ainda para as dispendiosas operações de swap cambial do Banco Central, a um custo de 2% do PIB, agravando o déficit final e o endividamento a um custo, no ano passado, de cerca de R$112 bilhões. Indago aos caros colegas se seria justo que uma instituição não eletiva tenha esse tipo de poder, sem nenhum controle institucional.
O Uma Ponte para o Futuro considera ou propõe que a taxa de juros de longo prazo que remunera a dívida pública e a taxa de juros que controla a liquidez da economia sejam definidas, respectivamente, pelo Tesouro Nacional e pelo Banco Central do Brasil. Mesmo sem questionar as razões que estão por trás do Banco Central, não podemos deixar de afirmar que a magnitude e o vulto dessas políticas para a sociedade devem nos levar, conforme aponta o Uma Ponte para o Futuro, a impor a essas decisões um rito mais republicano e representativo.
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O programa propõe, entre outras considerações, a execução de uma política de desenvolvimento centrada na iniciativa privada, por meio de transferências de ativos que se fizerem necessárias, concessões amplas em todas as áreas de logística e infraestrutura, parcerias para complementar a oferta de serviços públicos e retorno a regime de concessões. Ainda cumpre destacar, da extensa agenda, a prioridade à pesquisa e ao desenvolvimento tecnológico, que são a base da inovação. E, finalmente, cooperar com o setor privado na abertura dos mercados externos, buscando o maior número possível de alianças ou parcerias regionais.
Acredito, Sr. Presidente, que o Uma Ponte para o Futuro merece ser debatido com mais profundidade nesta Casa, bem como discutido pelos integrantes do Conselhão como base na qual o Executivo e o Legislativo possam considerar suas deliberações na construção de um novo Brasil.
Por fim, solicito a inclusão, nos Anais do Senado Federal, do artigo "Infraestrutura, inflação e desemprego", de minha autoria, que foi publicado no jornal Correio Braziliense, no dia 8 de fevereiro, na coluna Opinião.
Sr. Presidente, muito obrigado pela atenção de V. Exª, das Srªs e dos Srs. Senadores, das senhoras e dos senhores ouvintes da Rádio Senado e telespectadores da TV Senado.
Aqui está o artigo "Infraestrutura, inflação e desemprego", de nossa autoria, publicado, no dia 8, pelo Correio Braziliense.
Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.
Muito obrigado.
DOCUMENTO ENCAMINHADO PELO SR. SENADOR VALDIR RAUPP EM SEU PRONUNCIAMENTO.
(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e §2º, do Regimento Interno.)
Matéria referida:
- "Infraestrutura, inflação e desemprego", de Valdir Raupp, Correio Braziliense, em 08/02/2016.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Senador Valdir Raupp, um dos Líderes da Casa, que traz um tema para o debate.
O importante é isto, Senador: trazer temas para o debate. Cada um expressa o seu ponto de vista, e assim vamos construindo juntos, como V. Exª disse outro dia. Eu estava na tribuna, falando de um tema semelhante, e V. Exª me lembrou: "Paim, isso tudo é para um grande debate, para construirmos a sociedade ideal para todos." E eu me somo a essa linha de construirmos um bom debate dos temas que interessam a todo o nosso povo.
Parabéns a V. Exª.
Não havendo mais nenhum orador inscrito, nós damos por encerrada a sessão de hoje. Voltaremos amanhã. Às 9h, estaremos aqui.
Sessão encerrada. Que Deus ilumine a todos!
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Está encerrada a sessão.
(Levanta-se a sessão às 17 horas e 27 minutos.)