2ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA
55ª LEGISLATURA
Em 6 de dezembro de 2016
(terça-feira)
Às 11 horas
189ª SESSÃO
(Sessão Especial)

Oradores
Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos.
Declaro aberta a Sessão Especial do Senado Federal destinada a comemorar o Dia Internacional dos Direitos Humanos e a entrega da Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara, em sua 7ª edição.
A Comenda Dom Hélder Câmara, instituída pela Resolução nº 14, de 2010, é destinada a agraciar personalidades que tenham oferecido contribuição relevante à defesa dos direitos humanos no Brasil.
Nesta solenidade serão agraciados com a Comenda Dom Hélder Câmara Srª Cristina Lopes Afonso; (Palmas.)
Sr. Omar Ferri; (Palmas.)
Sr. Airton Freire de Lima; (Palmas.)
Informamos ainda que o Conselho decidiu, por unanimidade, prestar homenagem in memoriam à Srª Luciana Lealdina de Araújo, conhecida carinhosamente como Mãe Preta. (Palmas.)
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Vamos à composição da Mesa. Convido para compor a Mesa o nobre Senador que estava presente até o momento, Senador Lasier Martins. Ele faz parte da Comissão e foi um dos que trabalhou muito pela indicação de um dos nomes que ele aqui vai ter oportunidade de falar da tribuna.
Convidamos agora para compor a Mesa os homenageados, lembrando que todos eles terão direito à palavra.
Cristina Lopes Afonso. (Palmas.)
Omar Ferri. (Palmas.)
Pe. Airton Freire de Lima, representado pelo Superintendente da Fundação Terra, Sr. Wellington Santana Lima. (Palmas.)
Luciana Lealdina de Araújo, representada pela Srª Tirzah Araújo de Salazar, do Instituto São Benedito. Ela representa Luciana Lealdina, a Mãe Preta (in memoriam). (Palmas.)
Registramos a presença do Primeiro Conselheiro da Embaixada da República da Eslovênia, Sr. Igor Šef.
Representando também o Movimento de Justiça e Direitos Humanos, o Vice-Presidente, Sr. Luiz Francisco Corrêa Barbosa.
Convido a todos para, em posição de respeito, ouvirmos o Hino Nacional.
(Procede-se à execução do Hino Nacional.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Queria registrar a presença conosco do Deputado Federal Stédile, a quem eu rendo aqui, também, uma salva de palmas. (Palmas.)
Aqui nessa sessão, Deputado, você representa a Câmara dos Deputados. Inclusive, se V. Exª quiser usar a palavra, pode saber que aqui você terá esse direito, porque eu entendo que o Parlamento tem que, cada vez mais, fortalecer a democracia em tempos tão difíceis. Por isso, às vezes o protocolo tem que ser quebrado - porque muitas vezes a gente chega à Câmara como Senador, em alguns tempos e só pode usar a palavra dentro do protocolo; aqui, a gente abre esse espaço para V. Exª, porque sei que essa também tem sido a posição de V. Exª toda vez que eu estive lá na Câmara dos Deputados. Obrigado pela presença.
Essa premiação recebe o nome de Dom Hélder Câmara. O bispo católico foi um dos fundadores da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e ficou conhecido pela defesa dos direitos humanos durante o regime militar aqui no Brasil. Em tempos tão difíceis, eu digo: ditadura nunca mais!
Foi o único brasileiro indicado quatro vezes para o Prêmio Nobel da Paz. Nascido no Ceará, teve a sua atuação de maior destaque em Pernambuco, onde foi arcebispo de Olinda e Recife entre 1964 e 1985, período que coincide com o regime militar. Destacou-se por pregar uma Igreja simples, voltada para os pobres e pela defesa de atitudes não violentas em todas as interações humanas. Faleceu em agosto de 1999, aos 90 anos.
Seguindo também a orientação regimental, eu neste momento faço o pronunciamento de abertura em nome do Presidente do Congresso e do Senado. Não me perguntem quem efetivamente é o Presidente. Em tempos tão tumultuados, eu diria que o faço aqui, porque foi uma liminar, em nome do Presidente do Senado. Ponto. Pode ser assim? Em nome do Presidente do Senado e da Mesa do Senado, eu faço este pronunciamento.
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A sessão especial de hoje destina-se a dois eventos de excepcional grandeza: a lembrança, a comemoração do Dia Internacional dos Direitos Humanos e a entrega da Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara.
O Dia Internacional dos Direitos Humanos é celebrado todo dia 10 de dezembro. Neste dia, no ano de 1948, a Assembleia-Geral das Nações Unidas adotou a Declaração Universal dos Direitos Humanos, documento revolucionário, fundamental para que elevássemos a inspiração pela dignidade humana ao nível da política.
Em tempos tão difíceis, eu poderia lembrar aqui da Boate Kiss, verdadeiro forno em que 252 jovens perderam a vida, lá no Rio Grande do Sul.
Poderia lembrar aqui, queiramos ou não, o que aconteceu com o time de Chapecó, em que as informações que chegam foi falta de combustível. Vejam o absurdo daqueles que só pensam no lucro e se esquecem das políticas humanitárias.
Podia lembrar aqui do que aconteceu no domingo também numa boate nos Estados Unidos, onde 50 pessoas foram queimadas.
Podia lembrar aqui - são muitos acidentes em pouco tempo - do helicóptero que caiu agora em São Paulo, que levava a noiva e o irmão para uma atividade.
Podia lembrar aqui da situação dos imigrantes no Brasil e no mundo, situação que lembra a época do nazismo por tudo aquilo que estamos vendo pela imprensa nesse momento tão difícil.
Por isso tudo é que foi a partir desse marco que a humanidade erigiu seu edifício dos direitos com o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, com o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, sempre em defesa da vida e com protocolos e convenções especializados, que estabeleceram a proibição da tortura, do racismo, da discriminação de gênero, dos desaparecimentos forçados e que consubstanciaram os direitos das crianças, das pessoas com deficiência e de tantos outros. Enfim, da defesa da vida.
Senhoras e senhores, esse trabalho na linha dos direitos humanos é um trabalho que nunca acaba. Os valores que irradiam da noção básica da dignidade humana são infinitos e o edifício dos direitos humanos, apesar de indestrutível, apesar de ter suas funções firmemente plantadas na consciência de todos, muitas vezes se deixa corroer, se deixa degradar, se deixa iludir pelos ventos e trovoadas da história. É preciso, então, que nos mantenhamos atentos. É preciso que nos mantenhamos vigilantes.
Eis a importância de dedicar este dia a parabenizar e a agradecer a todos aqueles que atuam na defesa dos direitos humanos mundo afora. Direitos humanos não têm fronteira.
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Senhoras e senhores, no Senado Federal, nós lembramos o Dia Internacional dos Direitos Humanos, com a entrega de um prêmio àqueles que se destacaram nessa seara. Trata-se da Comenda Dom Hélder Câmara.
O nome da homenagem faz referência a um dos mais ferrenhos defensores dos direitos humanos no Brasil e no mundo. D. Hélder era um homem de Deus, era um homem dos homens, era um pensador, era um mobilizador, era um intelectual, era um homem de ação. Eu diria: era um pescador daqueles que estão sempre à procura de buscar águas não turbulentas para salvar vidas.
Suas reflexões sobre miséria, sobre desenvolvimento econômico, sobre as condições humanas; sua atuação como articulador da Igreja católica e das relações com o Estado; e sua militância, muito mais social do que política, ao contrário do que dizem os críticos, constituem um legado absolutamente imprescindível para os dias atuais, muito atuais.
Oxalá tivéssemos hoje outros como D. Hélder! Em diversos aspectos, a sua biografia demonstra o quanto acertamos com essa homenagem.
Em primeiro lugar, D. Hélder cresceu e formou seu pensamento em meio a um contexto político conturbadíssimo e, mesmo espremido entre tantas ideologias negadoras da política humanitária, da humanidade, pelo fascismo, pelo nazismo, pelo comunismo soviético e suas variantes, conseguiu desenvolver um sentimento de humanismo profundamente redentor.
Tal sentimento pautou-lhe a atuação religiosa, social e política durante toda a sua vida e fez dele um exemplo muito inspirador para todos aqueles que observam a conjuntura atual de intensa polarização. Ele não se dizia comunista, mas também não se dizia capitalista.
D. Hélder buscou a verdade, sempre a verdade, mesmo que tivesse de denunciar e desafiar os poderosos do seu tempo. Esse é um legado e tanto para uma época como a atual. Hoje em dia, o apelo emocional de uma mensagem, às vezes, vale mais do que a sua veracidade e do que o seu conteúdo.
Quem dera tivéssemos um D. Hélder nesses tempos de pós-verdade, de desinformação em massa! Quem dera tivéssemos um D. Hélder!
E, finalmente, D. Hélder seguiu uma vida franciscana, abraçando a pobreza em Cristo. Ao fazê-lo, D. Hélder arvorou-se em porta-voz dos desfavorecidos, dos socialmente excluídos. Um exemplo muito inspirador para a humanidade atual, dilacerada pela vaidade, pela desigualdade, pela opulência e pelo individualismo exacerbado que sufoca os projetos sociais, as iniciativas coletivas.
Enfim, são esses os valores que nós queremos aqui hoje reafirmar com a Comenda Dom Hélder, premiando, anualmente, figuras de destaque na defesa dos direitos humanos no nosso País.
Senhoras e senhores, a Comenda Dom Hélder Câmara encontra-se em sua sétima edição.
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Os ganhadores deste ano são a Srª Cristina Lopes Afonso; a Drª Eunice Paiva; o Dr. Omar Ferri; o Padre Airton Freire de Lima; e a Srª Luciana Lealdina de Araújo, Mãe Preta (in memoriam).
A Srª Cristina Lopes Afonso, quando ainda muito jovem, sofreu uma agressão covarde, sexista, destrutiva, mas viveu, viveu para contar e fez, do seu trauma, uma narrativa de superação, com seu projeto social e político em favor das vítimas de queimaduras no Brasil todo. Hoje em dia, a Drª Cristina é sócia-fundadora da Sociedade Brasileira de Queimaduras e Vereadora do Município de Goiânia.
Seja bem-vinda, Drª Cristina. (Palmas.)
A Drª Eunice Paiva foi incansável na busca pela verdade a respeito do desaparecimento do seu marido, o sempre lembrado por todos nós, Deputado Rubens Paiva, perseguido pela ditadura militar.
Apesar da tragédia, essa líder reuniu forças para, desde então, mobilizar-se, formar-se advogada e arvorar-se em ativista da democracia. Precisamos, podem crer, nesses tempos tão turbulentos, de ativistas em defesa da democracia e dos direitos civis de desaparecidos e de suas famílias.
Ainda abraçou a causa dos povos indígenas, quilombolas, combatendo ações e políticas indigenistas expropriadoras.
Palmas, palmas a ela, porque ela merece. (Palmas.)
O Dr. Omar Ferri, advogado militante, tem uma longa trajetória na defesa dos direitos civis, da liberdade de imprensa e do devido processo, nos tempos da ditadura.
Em sua atuação profissional, reconheceu, no sequestro dos uruguaios Lilian Celiberti e Universindo Díaz, os indícios da Operação Condor, de cooperação entre as polícias políticas do Cone Sul. Reiteradas vezes, enfrentou, de peito aberto, o aparato repressão.
Lembro aqui, meu querido Omar Ferri, que eu acompanhei com um grupo - e você liderou - para irmos ao Uruguai para ver se encontrávamos Universindo Díaz e Lilian Celiberti. Não os encontramos, mas foi importante aquele movimento.
Minhas palmas aqui a esse grande líder dos militantes dos direitos humanos, Dr. Omar Ferri. (Palmas.)
O Padre Airton Freire de Lima, a exemplo de D. Hélder Câmara, dedicou a vida à causa dos pobres. Sua Fundação Terra instalou-se na chamada Rua do Lixo, em Arcoverde, Pernambuco, então endereço de um depósito a céu aberto de resíduos sólidos.
Por meio da fundação, o Padre Airton desenvolve um projeto importantíssimo junto à comunidade, com programas nas áreas de assistência social, inserção produtiva, educação, cultura, saúde, entre outras. Um projeto que mudou e ainda muda, todos os dias, a vida de muita gente.
Um abraço ao Padre Airton.
Aceite aqui o nosso caloroso carinho por tudo o que tem feito. (Palmas.)
Por fim, temos a Srª Luciana Lealdina de Araújo, conhecida como Mãe Preta, que nasceu em Porto Alegre, mas viveu em Pelotas, lá no Rio Grande do Sul.
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Ela superou a própria pobreza, a exclusão, para fundar o Instituto São Benedito, especializado no atendimento de crianças e adolescentes da periferia.
Neste 2016, o Instituto São Benedito completou 115 anos de piedade, de caridade e de compaixão, que transformam as vidas de tantos jovens em situação de risco.
Palmas! Palmas! Palmas! (Palmas.)
A Srª Luciana Lealdina faleceu em 1930, mas nós hoje dedicamos esta simples homenagem a essa grande militante pela vida. Homenageamos, de forma humilde, consideradas as suas realizações, o seu legado e a sua bonita memória.
Senhoras e Senhores, concluindo, das biografias de D. Hélder Câmara, da Drª Cristina Afonso, da Drª Eunice Paiva, do Dr. Omar Ferri, do Padre Airton Freire e da Srª Luciana Lealdina, nós extraímos o mais elevado exemplo da essência humana comum, o altruísmo, a generosidade, a dedicação aos nossos semelhantes, quaisquer que sejam as diferenças.
Enfim, eu confesso que não me canso de refletir sobre essas histórias inspiradoras, renovadoras, construtoras de fé e de vida, mas percebo também que, neste momento, nós poderíamos, primeiro, dar uma salva de palmas a todos os militantes dos direitos humanos no mundo pelo papel fundamental que eles cumprem em defesa da vida, em defesa, eu diria, da democracia, em defesa da dignidade humana em tempos tão difíceis. Homens e mulheres que fazem o bem sem olhar a quem.
Uma salva de palmas aos militantes dos direitos humanos do Brasil e do mundo. (Palmas.)
Termino, pessoal, porque não dá para, num momento como este, deixar de lembrar, como eu falei na abertura, esses jovens, outros com um pouco mais de idade, que morreram, porque simplesmente não havia gasolina suficiente no avião.
Chega-se a um ponto na vida, quando eu me lembro da boate Kiss e deste acidente - dois exemplos -, em que eu não consigo dizer que foi simplesmente uma tragédia. Foi um massacre, foi um massacre e eles terão que responder por esse massacre. Eles terão que responder. Por isso, nós temos que apostar que a Justiça e que a luta de todos nós hão de apontar um caminho, em que o lucro, a ganância não esteja acima da vida humana.
Por isso, eu quero terminar pedindo que, de pé, batamos palmas por um minuto para as almas desses do time de Chapecó, que perdemos com a queda do avião. (Palmas.)
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Obrigado, que Deus ilumine a todos.
Declaro, portanto, a partir deste momento, a abertura oficial deste evento e passo a palavra aos oradores inscritos.
Primeiro orador inscrito, Senador Lasier Martins.
Se o Deputado José Stédile quiser usar a palavra, fique tranquilo também.
Eu havia me comprometido com a Senadora Lúcia Vânia no sentido que eu levaria a sessão até ela chegar na hora de os oradores falarem, e deu certinho.
Senadora Lúcia Vânia. (Palmas.)
Senador Lasier e, em seguida, ela usará a palavra.
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente do Conselho da Comenda Dom Hélder Câmara; Senadores presentes no plenário; Senador Humberto Costa; Senadora Lúcia Vânia; Deputado Stédile; o Primeiro Conselheiro da Embaixada da República da Eslovênia, Sr. Igor Sef; o Sr. Vice-presidente do Movimento de Justiça em Direitos Humanos, de atuação brilhante no Rio Grande do Sul por esta causa, Dr. Luiz Francisco Corrêa Barbosa; senhores homenageados.
Nós vivemos dias tempestuosos aqui no Congresso Nacional e, particularmente no dia de hoje, aqui no Senado, mas nada disso impede uma sessão solene da importância desta pela justiça que queremos realizar com esta homenagem da nossa Comissão que atribui a Comenda Hélder Câmara, um símbolo de humanismo na história brasileira. Tenho certeza de que os homenageados se sentirão gratificados pela obra que desempenharam em defesa dos direitos humanos ao receberem esta comenda.
Os nossos defensores dos direitos humanos, como estão aqui hoje representados, são pessoas heroicas, por que não? São pessoas de espírito solidário e espírito humanitário. Então, sentimo-nos muito felizes também por estarmos aqui testemunhando e participando dessas homenagens.
Coube a mim indicar o nome do meu Estado, o Rio Grande do Sul, e, sem vacilar, logo me ocorreu o nome de Omar Ferri. Omar Ferri tem uma história longa em defesa dos direitos humanos. Advogado que instalou um escritório de advocacia em Porto Alegre, logo que começou o período da ditadura, e se tornou, por longo tempo, um defensor de presos políticos.
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Mais tarde, atuou também como Vereador, sempre muito corajoso nos seus pronunciamentos.
Eu, particularmente, tenho uma história ligada ao Dr. Omar Ferri. Exerci o jornalismo, durante muitos anos, no Rio Grande do Sul. Em certa época, em plena ditadura, quando se esboçava um princípio de abertura democrática, tinha eu um programa na Rádio Guaíba, de Porto Alegre - um programa que criei -, chamado Guaíba Revista, em que investia com comentários e com reportagens contra a ditadura. Em determinado momento, o Dr. Omar Ferri me comunicou que ele tinha uma gravação de alguns momentos de tortura de presos políticos nos porões do Dops. Eu pedi ao Dr. Omar Ferri que me cedesse aquela gravação e a coloquei no ar. Foi uma exibição de causar terror pelos gritos dos torturados, mas era a prova provada...
(Soa a campainha.)
O SR. LASIER MARTINS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - RS) - ... de como acontecia o terror nos porões da ditadura.
Com aquela exibição, Dr. Omar Ferri - o senhor me acompanhou -, eu recebi o Prêmio Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, uma placa muito bonita, que tenho na minha galeria de troféus em Porto Alegre.
Então, se já o admirava, passei a admirar ainda mais o Dr. Omar Ferri pelo trabalho que desenvolveu ao longo de sua vida.
Neste momento, eu saúdo o Dr. Omar Ferri; sua esposa, Maria Helena, que aqui está; sua filha Márcia; os demais familiares; e as pessoas que vêm aqui tributar essa homenagem aos senhores e às senhoras. Realmente nós temos aqui um verdadeiro merecedor dessa comenda e estamos aqui exatamente para homenagear essas pessoas.
E eu destaco que, depois que o indiquei, muito honrado, o seu nome foi aprovado unanimemente pela Comissão. Nessa plêiade de lutadores, de heróis, de defensores dos direitos humanos, está um gaúcho que nos honra muito no Rio Grande do Sul.
Era essa a minha palavra modesta, mas muito sincera, de homenagem a S. Exª, este herói dos direitos humanos, Dr. Omar Ferri.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Senador Lasier Martins.
Eu convido o Senador Humberto Costa a usar a palavra neste momento. A exemplo do Senador Lasier Martins, que indicou o nosso querido amigo Dr. Omar Ferri, o Senador Humberto Costa, Líder do meu Partido, que está aqui prestigiando a nossa sessão, indicou o Padre Airton Freire de Lima.
O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente e requerente desta sessão especial, Senador Paulo Paim; Senador Lasier Martins; homenageados - Cristina Lopes Afonso, Omar Ferri, Padre Airton Freire de Lima, representado aqui pelo Superintendente da Fundação Terra e seu irmão Wellington Santana Lima, Luciana Lealdina de Araújo, a Mãe Preta, representada pela Srª Tirzh Araujo de Salazar, do Instituto São Benedito.
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Quero, também, aqui registrar e saudar o Deputado Federal José Stédile; o Primeiro Conselheiro da Embaixada da República da Eslovênia, Igor Sef; e o Vice-Presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos, Sr. Luiz Francisco Corrêa Barbosa.
Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado, ouvintes que nos acompanham pela Rádio Senado, o Senado da República vive hoje um dia muito especial. Esta Casa, que é do povo e que o acolhe, representa, homenageia uma figura ilustre cuja vida e trabalho têm sido a favor do povo. Uma personalidade do nosso tempo cuja missão transcende o próprio tempo, firmando-se, pela sua importância e pela sua relevância social, como uma das mais exitosas de que se tem notícia em nosso País. Um trabalho que vem mudando uma realidade doída de uma região sofrida e carente do Nordeste.
Estamos falando de Airton Freire de Lima, o Padre Airton, pilar-mor da Fundação Terra, instituição pernambucana, como o seu criador, e que hoje se firma como uma das mais importantes do nosso Estado no tripé caridade, educação, responsabilidade social.
Ao padre Airton o Senado concede a Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara, um dos galardões mais significativos que a Câmara Alta oferta. A ele e ao seu trabalho, que tanto significa para tanta gente e que tem feito a diferença em uma região carente e, muitas vezes, fora do alcance pleno do Poder Público. Tive a graça e a honra de ser o autor desta concessão, o que muito me orgulha e alegra. Na verdade, o que considero para mim, acima de tudo, um privilégio.
Reconhecer um trabalho como o da Fundação Terra e de seu idealizador é quase que uma obrigação para o poder e para os agentes públicos. Trata-se de um trabalho profícuo, que sobrevive de doações de pessoas físicas e jurídicas e de recursos públicos governamentais provenientes de programas e projetos cujos resultados se apalpam e se conferem com satisfação e com absoluta transparência. Igualmente, um trabalho perene, que há mais de três décadas vem plantando amor e solidariedade em terras nordestinas, cujo resultado tem sido uma colheita rica em formação, amparo e assistência social.
Os números falam por si. Na região de Arcoverde, sertão pernambucano, a Fundação Terra mantém duas escolas, três creches, uma biblioteca e uma casa para crianças e adolescentes. Dispõe de dois abrigos para idosos, sendo um em Sertânia, a 60 quilômetros de Arcoverde, onde fica a sua sede. Completam o arco de serviços um centro de reabilitação intelectual, motora, visual e...
(Soa a campainha.)
O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - ... auditiva em Arcoverde, o Mens Sana, que atua através de convênio com o SUS e que atende pessoas de 20 cidades sertanejas, e um centro de reabilitação para usuários de álcool e drogas, o Terra Terapêutica, situado em Mimoso, Distrito de Pesqueira, a 20 quilômetros de Arcoverde.
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Essa estrutura atende mais de mil crianças nas escolas e creches; 70 crianças em situação de vulnerabilidade; 30 idosos; 292 crianças e jovens nos pontos de educação complementar (músicas, artes marciais, dança, percussão e artes cênicas); 339 jovens e adultos em cursos profissionalizantes; mais de 1.500 famílias atendidas, anualmente, por programas e ações de longo alcance social.
Criada em 1984, a Fundação Terra completou os seus 32 anos de existência no dia 8 de setembro. A instituição nasceu na Rua do Lixo, subúrbio de Arcoverde, Município sertanejo a 250 quilômetros do Recife. E começou em um local que era um ponto de despejo de resíduos sólidos. Ali, centenas de famílias tiravam o seu sustento da forma mais insalubre possível, recolhendo as sobras das sobras do que era consumido na cidade, catando e comendo restos de alimento.
Recém-ordenado pela Igreja Católica, Airton Freire iniciou seu trabalho pastoral de forma diferente. Deixou a Casa Paroquial e estabeleceu-se naquele local, onde até então ninguém queria ir, com o qual poucos se importavam. A igreja do jovem padre era diferente e fez o que devia ter feito e o que mandam os mais básicos ensinamentos cristãos: foi para o meio do seu povo. Assim como sempre fez a igreja de D. Hélder, patrono dessa medalha, que hoje cai como uma luva em seu agraciado.
Ali mesmo na Rua do Lixo, uma semente foi plantada e um trabalho começou a nascer. Trabalho árduo que obteve o apoio de toda a cidade e o grato e fraterno entusiasmo da comunidade, que viu a transformação e os frutos serem postos à mesa em uma divisão equânime e solidária.
Com o tempo, o trabalho expandiu-se para além da comunidade da Rua do Lixo. Chegou a outras cidades da região e transformou-se em uma referência de fraternidade, acolhimento, serviço social, educação e caridade.
Sem dúvida, o trabalho da Fundação Terra constitui um exemplo de dedicação à população carente no Nordeste. Um exemplo que deve ser seguido por outros Estados e por outras Regiões. Um exemplo que precisa ser seguido por todo o País.
E quem é este homem que dedicou sua vida à causa de servir ao povo pobre, a espalhar obras importantes de assistência social e a deixar sua marca em rincões nordestinos onde tudo, em termos de miséria e de dor, é superlativo?
O Pe. Airton Freire é um sertanejo do Pajeú, nascido em São José do Egito, em 1966, e que aos seis anos de idade foi morar com a família em Sertânia, onde ficou até concluir seus estudos do primeiro grau, em 1971. Migrou então para o Recife, onde passou a morar em uma pensão e a frequentar a lendária Casa do Estudante de Pernambuco, onde fazia as refeições. Iniciou o segundo grau no Colégio Martins Júnior e concluiu o ciclo em uma escola técnica, onde cursou desenho e arquitetura.
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A vida religiosa chamou-o, e, em 1975, foi estudar no Instituto de Teologia do Recife (Iter), que, é bom que se relembre, foi o berço sacerdotal por onde passou a maioria dos padres alinhados com Dom Hélder e com a teologia da libertação, a corrente progressista criada na Igreja da América Latina após o Concílio Vaticano II e a Conferência de Medellín, de 1968, e que consolidou a opção preferencial pelos pobres, que mudou os rumos da Igreja Católica.
Em paralelo com o Iter, Pe. Airton cursou psicologia na Facho (Faculdade de Ciências Humanas de Olinda).
Foi ordenado diácono em 1981 e padre em fevereiro do ano seguinte, na Catedral de Santa Águeda, em Pesqueira. Celebrou sua primeira missa na sua terra natal, São José do Egito, e de imediato foi transferido para a Paróquia do Livramento, em Arcoverde. Dois anos depois, a convite de um grupo de jovens, foi conhecer a Rua do Lixo. Impressionado com a miséria do lugar, resolveu rezar uma missa. A cena de uma criança faminta pedindo para comer a hóstia mudou a vida do jovem pároco, que resolveu morar na Rua do Lixo. A partir daí, tudo é história. Nascia ali a Fundação Terra dos Servos de Deus.
Pe. Airton chegou a ir a Salvador também, em 1986, onde ingressou na Companhia de Jesus. Quando voltou para Pernambuco, para Arcoverde, para a Rua do Lixo, morou na comunidade até o ano 2000 e decidiu se mudar para o povoado de Malhada, perto de Arcoverde, onde está até hoje.
A mudança para Malhada ocorreu por conta da criação de outra obra do Pe. Airton, a Comunidade de Vida dos Servos de Deus e o Instituto dos Servos de Deus. A partir da primeira, nasceu uma série de grupos de oração denominada Grupos da Terra, apoiados pelo Instituto Padre Airton, o IPA.
Trata-se, portanto, de uma figura rara e prolífica em seu trabalho pastoral na área de assistência social, auxílio a quem mais precisa, solidariedade e caridade.
(Soa a campainha.)
O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) - Vou concluir, Presidente.
O incansável Pe. Airton, um homem que fala fluentemente mais três idiomas, que foi professor de colégios importantes do Recife, que fez formação analítica freudiana e pós-graduação em Paulo Freire, o escritor que já produziu oitenta livros e o compositor e cantor que gravou 180 CDs de músicas autorais e pregações em retiros.
Trata-se de um homem cujo trabalho beneficia, de forma direta, mais de 2 mil pessoas, o Pe. Airton, que hoje homenageamos com uma medalha que traz o nome da maior expressão da igreja dos pobres do Brasil em todos os tempos, que é Dom Hélder Câmara.
O Senado Federal se congratula com o Pe. Airton e com a Fundação Terra, representada nesta solenidade pelo seu superintendente, o Sr. Wellington Santana.
Particularmente, eu me associo às homenagens aqui prestadas, sabedor da justeza deste tributo e com a certeza de que o trabalho da Fundação Terra vai continuar rendendo frutos. Mais ainda, que continuará multiplicando o número de beneficiários entre uma faixa da população que tem, quase sempre, o desamparo e o esquecimento oficial como características perversas e dolorosas.
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Em nome do Senado, digo da honra de conceder a Comenda Dom Hélder Câmara ao Pe. Airton. Em nome do povo do meu Estado, expresso o mais sincero sentimento de gratidão e o nosso muito obrigado.
Obrigado, Sr. Presidente, pela tolerância. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Não, V. Exª ficou dentro do tempo. Meus cumprimentos ao Senador Humberto Costa pela indicação do Pe. Airton Freire de Lima.
Agora, passo a palavra à Senadora Lúcia Vânia, que indicou - e todos foram aprovados por unanimidade - a Srª Cristina Lopes Afonso.
Em seguida, fará uso da palavra o Senador Cristovam Buarque.
Senador Lúcia Vânia, só para tranquilizá-la, dou cinco minutos a V. Exª, mais cinco e quantos minutos forem necessários para a conclusão.
A SRª LÚCIA VÂNIA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sim, está bom.
Sr. Presidente, senhoras e senhores convidados, que nos honram com as suas presenças, familiares da Vereadora Cristina, que nos honram também com suas presenças neste momento importante da vida da nossa querida Vereadora Cristina. Quero aqui, Sr. Presidente, cumprimentá-lo, principalmente porque tenho sido, ao longo do tempo, testemunha da luta de V. Exª em favor dos menos favorecidos e, acima de tudo, da sua compreensão e determinação, ao trazer à pauta desta Casa a luta pelos direitos humanos. Parabéns pela sua atuação. V. Exª é um dos brasileiros que orgulha esta Casa. É a referência maior que temos para apresentar à sociedade brasileira.
Cumprimento o Senador Lasier Martins, cumprimento o Senador Humberto Costa, cumprimento os senhores homenageados Cristina Lopes Afonso, Vereadora; Omar Ferri; Pe. Airton Freire de Lima, representado neste evento pelo Superintendente da Fundação Terra, o Sr. Wellington Santana Lima; a Srª Luciana Lealdina de Araújo, a Mãe Preta, representada pela Srª Tirzah Araújo de Salazar, do Instituto São Benedito; os demais convidados Sr. Deputado Federal Jose Stédile; o Primeiro Conselheiro da Embaixada da República da Eslovênia, Sr. Igor Sef; e o Vice-Presidente do Movimento Justiça e Direitos Humanos, Sr. Francisco Corrêa Barbosa.
Sr. Presidente, cumprimento neste momento o Senador Cristovam Buarque, outro baluarte aqui Casa, na defesa dos direitos humanos e, sem dúvida alguma, um grande Senador que também honra esta Casa.
Sr. Presidente, vejo-me na contingência de tecer considerações sobre o inspirador desta homenagem: Dom Hélder Câmara. Sem dúvida, foi, pela sua atuação religiosa e política, um dos personagens marcante do final do século XX no Brasil. Dom Hélder foi uma figura ímpar, que dedicou a sua vida a servir aos outros. Na sua figura física franzina, escondia-se um ser forte e destemido, que, em muitas ocasiões, desafiou a ditadura militar no Brasil.
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Por outro lado, a figura humana da Vereadora Cristina Lopes Afonso é permeada por uma história de vida extraordinária. Portanto, Sr. Presidente, é com imenso prazer que venho aqui prestar esta homenagem à Cristina Lopes Afonso, que hoje recebe deste Senado Federal a Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara. Cristina é desses exemplos que nos iluminam pela força, pela garra, pela perseverança; Cristina é desses exemplos de que precisamos tanto; Cristina é desses exemplos que nos mostram que vale a pena insistir e lutar.
Em 1986, quando ainda morava no Paraná, muito jovem, Cristina foi vítima de um crime bárbaro: motivado por ciúmes, seu ex-marido atirou álcool e ateou fogo a seu corpo. Com 85% do corpo atingido, e com pouco menos de 20 anos, Cristina poderia ter morrido, mas não morreu; poderia ter apenas sobrevivido, mas foi muito além; poderia ter sido apenas mais uma vítima da violência doméstica, mas resolveu fazer a diferença.
Cristina formou-se em Fisioterapia, especializou-se em queimaduras, adotou Goiânia e dedicou-se a ajudar àqueles que, como ela, sobreviveram ao fogo. E foi ali, na luta cotidiana a favor dos queimados, que construiu uma história pessoal extraordinária, uma história de superação.
Foi e é mais do que apenas uma fisioterapeuta. Atuou como chefe do Serviço de Fisioterapia do Instituto Nelson Piccolo, referência nacional no tratamento de queimaduras, desde 1991 até 2014. Tornou-se professora de Fisioterapia em várias instituições de ensino superior, entre as quais a Universidade do Estado de Goiás, na qual foi a responsável pela implantação da disciplina de queimados. E fundou a Sociedade Brasileira de Queimaduras.
Pelo seu trabalho em favor do próximo, Cristina foi eleita a Vereadora mais votada de Goiânia nas eleições de 2012 e acaba de ser reeleita para a Câmara de Vereadores, novamente com uma votação expressiva, em primeiro lugar. Ali, preside a Comissão de Direitos Humanos, é Vice-Presidente da Comissão de Constituição e Justiça e tem uma atuação voltada para a formulação e proposição de leis para ampliar as condições de atendimento à saúde no Município de Goiânia. Além disso, trabalha na melhoria das condições de acessibilidade em Goiânia e na criação das condições de qualificação dos profissionais de saúde.
A luta de Cristina em prol de melhores condições de vida da população em geral tem-na feito alvo de inúmeras homenagens. Recebeu a Comenda da Ordem do Mérito Anhanguera, a mais alta outorga estadual, também foi agraciada com o título de Cidadã Goiana e possui a Medalha do Mérito Legislativo Pedro Ludovico Teixeira e a Comenda Berenice Teixeira Artiaga. Todas as distinções concedidas pela Assembleia Legislativa do Estado de Goiás. E hoje recebe a homenagem deste Senado Federal. Foi escolhida também como uma das 75 mulheres referência do Estado de Goiás, numa iniciativa do jornal O Popular, de Goiânia, na comemoração dos 75 anos daquele veículo de comunicação.
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Parabéns, Cristina! Parabéns pela sua carreira em todos os aspectos brilhante! Parabéns pela sua luta, mais do que necessária! Parabéns pela sua superação! Parabéns pelo seu exemplo de mulher coragem, determinada e, acima de tudo, uma mulher de fé, de crença e de personalidade! Parabéns! Você é, sem dúvida, uma referência não só para as mulheres de Goiás e do Paraná, mas você é referência da mulher brasileira - corajosa, determinada, perseverante. Tenho certeza de que Dom Hélder Câmara, onde quer que esteja, estará lisonjeado com esta homenagem.
Mais uma vez, a todos os senhores homenageados os meus cumprimentos e o meu carinho enorme e a minha admiração pela querida amiga e hoje política exemplo do Estado do Goiás Cristina Lopes.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Senadora Lúcia Vânia. Meus cumprimentos à Senadora Lúcia Vânia e à nossa homenageada Cristina Lopes Afonso.
Passamos a palavra, neste momento, ao nobre Senador Cristovam Buarque, que fez questão de estar conosco.
Logo após o Senador Cristovam Buarque, eu vou chamar o nosso querido amigo Deputado Jose Stédile.
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Bom dia a cada uma e cada um!
Cumprimento o Senador Paim, o Senador Lasier, os homenageados, com muito carinho e respeito à Cristina Lopes, a Omar Ferri, ao Pe. Airton Freire de Lima, à Luciana Lealdina de Araújo, que não está conosco fisicamente, mas é uma homenageada in memoriam. Cumprimento os demais que assistem a esta sessão tanto aqui, quanto fora, pela televisão. E quero dizer que, pelo tempo que eu convivi com Dom Hélder Câmara, eu tenho certeza de que ele estaria, Senador Paim, Senador Lasier, feliz com aqueles que recebem uma comenda com o seu nome. Já se fez referência a cada um.
E eu queria, neste momento, homenagear o próprio Dom Hélder, porque cada um de vocês que recebe um prêmio faz uma homenagem a ele, pelo seu trabalho, pela sua luta, que eu acompanhei, como recifense, desde o dia em que ele ali chegou. Mas eu creio que a melhor homenagem que podemos fazer hoje, neste momento que o Brasil atravessa, a Dom Hélder é refletirmos, imaginarmos o que diria Dom Hélder se estivesse aqui conosco. Que lições nos daria? Que linha nos proporia? O que faria para que nós encontrássemos um rumo no Brasil?
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Eu creio, sem dúvida alguma, que o primeiro ponto seria o compromisso dele mantido com duas coisas fundamentais: os pobres e a democracia. Tirando o lado da religião, claro, que foi a sua vida, Dom Hélder significava o compromisso com os pobres e com a democracia. E ele lutou contra o regime militar, ele lutou pelo estabelecimento das regras democráticas que nós temos.
Que faria ele hoje? Que diria ele hoje para nós? Eu creio que se assustaria, apesar de todas as conquistas sociais que tivemos, sim, nas últimas décadas, especialmente nos últimos anos, com a crise econômica que está provocando tantos retrocessos nas nossas conquistas sociais, mas eu creio que ele se assustaria mais como democrata do que como humanista nas suas preocupações sociais.
Eu creio que ele se assustaria com os riscos institucionais que hoje nós atravessamos. Ele se assustaria com a Constituição, que ele ajudou a criar, que permitiu a corrupção, a descrença nos políticos, a falta de sonhos utópicos, os partidos sem propostas, sem identidades, nem do ponto de vista moral, nem do ponto de vista ideológico.
Eu creio que ele se assustaria, como um pacifista que foi, um defensor de Gandhi, um defensor da luta pela paz, sem praticar violência, com a violência que hoje toma conta do Brasil. E se assustaria com o descrédito que hoje nós políticos recebemos do povo e que está perto de se transformar em desrespeito. E, quando se sai do descrédito para o desrespeito, a crise vira desagregação.
Eu creio que ele nos alertaria para o risco de uma desagregação do tecido social, político, econômico brasileiro. Aquele momento em que não apenas se critica, deixa-se de respeitar; não apenas se reclama dos impostos, para de se pagar imposto por descrédito com os políticos que vão dizer o destino do dinheiro.
Eu creio que ele proporia, porque ele não era homem de críticas sem propostas, para mim, ele proporia diálogo. Essa foi a vida dele: diálogo. Dom Hélder nunca parou de dialogar nem mesmo com aqueles que naquela época estavam no centro do poder ditatorial.
Eu creio que ele nos diria que é hora de derrubar paredes e construir pontes; o contrário do que estamos fazendo. Nós estamos construindo paredes e derrubando pontes.
Eu creio que ele nos sugeriria sair dos sectarismos, de um lado e do outro, das certezas plenas, que, na verdade, são certezas, porque não estão vindo com análise concreta dos problemas.
Eu creio que ele pediria que nós tivéssemos duas palavras: lucidez e responsabilidade: lucidez para entender os problemas sem os preconceitos que nós carregamos; e responsabilidade para pôr o interesse do País à frente do interesse de cada um de nós, o interesse da próxima geração à frente da preocupação com a próxima eleição a que cada um de nós vai se submeter.
Dom Hélder hoje nos diria: sejam brasileiros antes de serem políticos! Tenham compromisso com a verdade antes de terem compromisso com as suas interpretações! E ele nos diria, sobretudo, que é pela paz que a gente constrói o futuro - a paz, com lucidez e com responsabilidade.
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É muita pretensão imaginar o que Dom Hélder diria, mas eu acho que uma boa maneira de tentar pensar é tentando imaginar como ele pensaria. Além de agradecer a vocês pelo trabalho de cada um merecendo o prêmio que tem o nome dele, ele pediria que vocês militem com responsabilidade e com lucidez, duas coisas que estão faltando muito em nós - e eu me incluo - políticos desta geração. Mas é preciso, no meio de todo o pessimismo, manter acesa a esperança, palavra que Dom Hélder tanto gostava. Ele foi um Bispo que eu chamei uma vez de santo rebelde. Ele era um rebelde na sua santidade no dia a dia da sua vida. Ele era um lúcido, era um responsável e era incansável, mas uma das palavras de que ele mais gostava, ao lado da paz, era esperança. Vamos ter esperança, porque o Brasil encontrará o seu rumo. Nós deveríamos tentar fazer isso, mas, se a nossa geração não fizer, a próxima fará. O Brasil é muito maior do que cada um de nós.
Viva Dom Hélder Câmara! Viva cada um de vocês que receberam esta comenda!
Parabéns! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Senador Cristovam Buarque, que faz uma fala dirigindo homenagens a Dom Hélder.
Com satisfação, convido para usar a palavra o Deputado Federal Jose Stédile. (Palmas.)
O SR. JOSE STÉDILE (PSB - RS) - Bom dia a todos e a todas.
Em primeiro lugar, eu gostaria de agradecer o nobre Senador gaúcho Paulo Paim, meu amigo, pela quebra de protocolo. Estou aqui representando a Câmara dos Deputados. Eu também quero parabenizá-lo pela Mãe Preta, que foi indicada pelo senhor, Senador Paulo Paim, e que está aqui representada pela Tirzah Araújo de Salazar, minha amiga de Pelotas que realiza um grande trabalho.
Eu queria saudar a Senadora Lúcia Vânia, que é do meu Partido, que indicou a Cristina, cujo excelente trabalho já foi mostrado.
Quero saudar também o nosso querido Senador Lasier, que indicou Omar, ex-Vereador e grande lutador dos direitos humanos no Rio Grande do Sul, o meu Estado, que representava os nossos sonhos na época da ditadura. Você merece o nosso reconhecimento.
E, por fim, o Pe. Airton - aqui presente, Senador Cristovam. Parabéns, padre.
Em nome de todos os agraciados, também quero saudar os que trabalham pelos direitos humanos de forma anônima. Eu tenho uma vizinha que mora a duas casas da minha e, por coincidência, anteontem, fiquei sabendo que ela, há mais de 20 anos, faz todos os anos em torno de 70 - ela estava me falando - casacos de lã bordados, com aquele trabalho manual, para ajudar as pessoas. Eu disse que nunca ninguém falou, mas ela disse: "Mas eu não quero que ninguém saiba que eu faço isso". Ela entrega para a prefeitura para diminuir o sacrifício e a dificuldade das pessoas no inverno gaúcho. Quantas pessoas anônimas lutam pelos direitos humanos, lutam para que as pessoas tenham igualdade! Todas elas merecem o nosso respeito.
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Nós vivemos dias difíceis. E não podemos pegar somente o Brasil. Vejam o que está acontecendo na Europa com os exilados. Faz parte do programa político dos candidatos ser contra os exilados; e, por pior que pareça, usam isso para ganhar. Então, a população, muitas vezes... Será que eles esqueceram o que os países europeus fizeram na África? Será que eles esqueceram a exploração pelo próprio país? E muito da riqueza que eles têm hoje vem da exploração, da invasão dos países africanos. Então, não é só aqui no Brasil. Nós no Brasil avançamos, e muito, em vários setores, mas ainda nós não temos o que comemorar do ponto de vista dos direitos humanos, do sacrifício, da exclusão de crianças e idosos, dos pobres, dos negros, enfim, de todos que são excluídos da nossa sociedade.
Por isso, parabéns, Paulo Paim. Parabéns ao Senado por esta homenagem a todas as pessoas maravilhosas que estão hoje aqui. O Brasil tem que comemorar, sim, o que está sendo conquistado por estas pessoas, valorizar e fortalecer a luta pelos direitos humanos e em todos os setores.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Muito bem, Deputado Federal Jose Stédile, que aproveitou para fazer uma homenagem especial à Mãe Preta, na pessoa da Tirzah Araújo de Salazar.
Eu registro a presença também conosco - estava aqui - do Senador Paulo Rocha.
A partir deste momento, nós passamos a fazer a entrega da Comenda Dom Hélder Câmara.
Seguindo aqui a lista, eu convido de imediato a Senadora Lúcia Vânia para entregar a Comenda à nossa homenageada Cristina Lopes Afonso. (Palmas.)
(Procede-se à entrega da Comenda Dom Hélder Câmara à Srª Cristina Lopes Afonso.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Convidamos, neste momento, o Senador Lasier Martins para entregar a Comenda ao Sr. Omar Ferri. (Palmas.)
(Procede-se à entrega da Comenda Dom Hélder Câmara ao Sr. Omar Ferri.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Neste momento, convido o Senador Humberto Costa para entregar a Comenda ao Pe. Airton Freire de Lima. (Palmas.)
(Procede-se à entrega da Comenda Dom Hélder Câmara ao Sr. Wellington Santana Lima, representante do Pe. Airton Freire de Lima.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Informamos que o Pe. Airton Freire de Lima foi representado pelo Sr. Wellington Santana Lima.
Neste momento, convido a Srª Tirzah Araújo de Salazar, que representa aqui a homenageada in memoriam, a Srª Luciana Lealdina de Araújo, conhecida como Mãe Preta. Como fui eu que indiquei esse prêmio, então, neste momento, eu vou, aqui na frente, fazer a entrega. Eu convido o Deputado para ficar junto comigo, já que foi ele que fez o discurso de homenagem a ela, uma vez que eu já tinha feito só o protocolar. (Palmas.)
(Procede-se à entrega da Comenda Dom Hélder Câmara à Srª Tirzah Araújo de Salazar, representante da Srª Luciana Lealdina de Araújo.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Meus amigos e minha amigas, foi um belíssimo evento em tempos tão difíceis - tão difíceis.
Eu queria agradecer a todos, aos homenageados, aos representantes dos mesmos, a este Plenário, a esta Mesa, aos Senadores presentes, ao Senador Eunício.
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O Senador Eunício tem sido parceiro nosso aqui em todos os momentos. Permita que eu diga que, em projetos difíceis como o da terceirização, ele é que tem me dito: "Fique calmo, Paim, nós vamos achar um caminho. Conte com a gente. A gente sabe do seu apreço a essa matéria". Eu queria, de público, agradecer ao Senador Eunício, que tem me ajudado muito nesse debate da terceirização. (Palmas.)
Senador Eunício Oliveira, se quiser usar a palavra. (Pausa.)
O Senador Eunício, informo à Casa - permita-me, porque não é segredo -, provavelmente, será o futuro Presidente desta Casa. É de minha responsabilidade o que eu estou aqui falando. Claro, na eleição que teremos em fevereiro. Pelo Regimento, o partido com o maior número de Senadores indica o Presidente, e, pela informação que temos, V. Exª será o futuro Presidente da Casa no momento adequado, em janeiro. Nada a ver com o momento que nós estamos vivendo. Perguntavam aqui: "Quem é o Presidente hoje?" E, como se criou uma situação dúbia, eu disse que eu estava falando em nome do Presidente da Casa e assim eu fiz.
Eu queria só, agora, neste encerramento, dizer a todos os senhores que são momentos muito difíceis, mas que eu aprendi na vida, até porque vim de uma família muito pobre, a ser otimista. Apesar de tudo, eu sempre digo que o pessimista é um derrotado por antecipação. E eu prefiro ser um otimista e acreditar sempre que a democracia há de vencer, que aqueles que se colocam sempre no lugar do outro, para os efeitos da vida, que direitos humanos hão de ser sempre uma política humanitária sem fronteira...
Por isso, eu encerro dizendo: vida longa aos militantes dos direitos humanos no Brasil e no mundo!
Está encerrada a sessão. (Palmas.)
(Levanta-se a sessão às 12 horas e 34 minutos.)