Discurso durante a 104ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Posicionamento contrário à proposta de reforma trabalhista aprovada pelo Senado Federal.

Autor
Eduardo Amorim (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SE)
Nome completo: Eduardo Alves do Amorim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRABALHO:
  • Posicionamento contrário à proposta de reforma trabalhista aprovada pelo Senado Federal.
Publicação
Publicação no DSF de 13/07/2017 - Página 20
Assunto
Outros > TRABALHO
Indexação
  • CRITICA, PROPOSTA, GOVERNO FEDERAL, REFORMULAÇÃO, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, PREJUIZO, TRABALHADOR, DISCORDANCIA, APROVAÇÃO, SENADO, AUMENTO, INSALUBRIDADE, GESTANTE, REDUÇÃO, DIREITO, ECONOMIA, MERCADO, EMPREGO.

    O SR. EDUARDO AMORIM (Bloco Social Democrata/PSDB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, colegas Senadores, ouvintes da Rádio Senado, expectadores da TV Senado, todos que nos acompanham pelas redes sociais, 50 mil operários paralisaram praticamente todas as fábricas de São Paulo, seja de tecidos, chapéus, sapatos, móveis, de fósforos, parafusos, cerveja, farinha, exigindo mudanças nas relações de trabalho.

    São Paulo parada, ruas desertas, comércio de portas fechadas, indústrias com maquinário desligado, escolas sem aula. E, de vez em quando, a cidade-fantasma dava lugar à violência e ao sangue, quando os grevistas atacavam fábricas, armazéns e bondes, e a Polícia os reprimia à bala. A greve geral durou uma semana, deixando 200 mortos nos dois lados.

    Tudo isso, Sr. Presidente, colegas Senadores, Senadora Vanessa Grazziotin, foi há exatos 100 anos – 100 anos, exatamente em julho de 1917.

    Eram outros tempos, é verdade – tempos em que o trabalhador não tinha praticamente direito algum. As jornadas de trabalho eram de no mínimo 12 horas, os salários dos homens eram ridiculamente baixos, e as mulheres e as crianças trabalhavam o mesmo que os homens, mas ganhavam ainda menos. Não havia férias. Não havia décimo terceiro, muito menos adicional noturno. Não havia aposentadoria nem descanso no final de semana.

    Certamente, eram outros tempos. E, de lá para cá, com muita luta e mesmo à custa de muitas vidas, o trabalhador conquistou vários direitos e garantias. No entanto, Sr. Presidente, em muitos sentidos aquela época não difere tanto do que vivemos ontem.

    Sr. Presidente, o que não mudou nada de 1917 para cá é o fato de que o trabalhador ainda é o responsável pelo desempenho das instituições onde trabalha, seja ela uma indústria, comércio, lavoura ou qualquer outra, e é, sim, e é, em última instância, o responsável pelo desenvolvimento econômico do nosso País.

    O fato é que, essencialmente, a relação trabalhista mudou pouco. De 1917 para cá, pode ter havido redução na jornada de trabalho, pode ter havido a conquista de direitos trabalhistas, como férias, décimo terceiro, descanso remunerado, aposentadoria e outros, mas o trabalhador continua na posição mais frágil da relação empregatícia.

    Quando falamos, por exemplo, em permitir que o negociado prevaleça sobre o legislado, estamos incorrendo num seriíssimo risco, eu diria que é um risco, quase de 100%, de retrocedermos imensamente nas relações de trabalho em nosso País.

    Se aceitarmos que acordos coletivos ou mesmo acordos individuais possam passar por cima de direitos mínimos estabelecidos em lei, estamos simplesmente entregando os trabalhadores à exploração patronal. É um retrocesso sem tamanho.

    Pode até ser que isso não ocorra no início, ou seja, nos primeiros meses ou anos após a entrada em vigor da reforma. Contudo, é praticamente certo que, à medida em que a economia for oscilando e as relações de trabalho forem se reajustando, o trabalhador saia prejudicado, porque sempre será – sempre será – a parte mais fraca nas mesas de negociação.

    Quando se propõe a universalização da jornada de 12 por 36 horas e uma flexibilização enorme da jornada de trabalho, com formação de bancos de horas; na prática, o empregador poderá fazer o empregado trabalhar o quanto quiser sem lhe pagar horas extras.

    O trabalho intermitente, por exemplo, com toda a flexibilidade que se pretende dar à legislação, pode ser entendido, pura e simplesmente, como a oficialização "do bico" – abre aspas – "do bico", uma relação extremamente precária de trabalho.

    Dessa forma, se entendi bem, estamos tentando fomentar a economia com o aumento da precarização do trabalho. Não é isto o que queremos, não é isto o que merecemos.

    Vejam, colegas Senadores, o que se propõe: o empregador poderá, ou não, convocar o trabalhador pelo período que quiser. Além disso, poderá lhe atribuir uma jornada amplamente variável, ao seu bem querer.

    Que conveniente para o empregador. Ele possuirá um negócio em que seus empregados estarão sempre a sua disposição, mas sem serem remunerados por isso. Quando houver demanda, ele os convocará; quando não houver, ele os deixará sem trabalho.

    Ora, no mundo laboral, entende-se que o empregado entrega sua força de trabalho ao empregador, que assume o risco do negócio. Da forma como está essa reforma trabalhista, o trabalhador passará a arcar com os riscos, além de vender a sua força de trabalho.

    É completamente desproporcional e injusto.

    É assim que vamos criar postos de trabalho? É assim que vamos aquecer a economia?

    Por outro lado, outro absurdo dessa reforma é a possibilidade de uma mulher grávida vir a trabalhar em ambiente extremamente insalubre, caso haja autorização do médico.

    É incrível que sequer estejamos discutindo isso. Mas, já que chegamos a esse nível, vejamos: será que não é admissível que algum empregador inescrupuloso pressione uma empregada grávida a obter a tal autorização médica sob ameaça de demiti­ la?

    Ora, se as mulheres são discriminadas em ambiente de trabalho insalubre porque hoje elas têm de ser alocadas em um local seguro quando engravidam, há formas adequadas de combater essa discriminação, com a Justiça do Trabalho ou mesmo com a criação de mecanismos legais mais específicos. No entanto, essa reforma tenta resolver o problema com uma estratégia totalmente invertida e, ao meu ver, equivocada.

    Aprovamos aqui uma lei que admitirá risco para a maternidade, a vida e a saúde dos recém-nascidos! Que tipo de retrocesso é esse?

    Sr. Presidente, colegas Senadores, recentemente, eu li um artigo no site da BBC no qual um ex-presidente de um grande banco privado brasileiro defende a reforma trabalhista. Segundo ele, não se trata de tirar direitos dos trabalhadores, mas sim de flexibilizá-los. Notem bem a sutileza do termo: flexibilização de direitos. Ele acredita que a legislação trabalhista atual não favorece a criação do emprego e não induz em nada a produtividade.

    Ora, eu fico pensando aqui comigo: o que esse senhor do alto da sua carreira executiva num banco privado sabe da vida e das condições reais de trabalho da maioria dos trabalhadores brasileiros? Será que sabe mesmo?

    Eis uma pequena citação da fala desse senhor: "Se não criarmos uma legislação trabalhista equilibrada, que dê condições para as empresas aumentarem a produção e gerarem riqueza, enfrentaremos um problema sério. Nunca teremos como resolver nossos problemas sociais."

    E eu continuo me perguntando, Sr. Presidente: o que um alto executivo de uma grande empresa, que ficou 23 anos à frente de um dos maiores bancos privados brasileiros, tem a dizer sobre nossos problemas sociais ou sobre produtividade, quando as instituições bancárias agem sempre e absolutamente sempre em favor dos seus próprios interesses?

    Vivemos num País onde os juros são extorsivos, um crime permitido, sem pensar nos trabalhadores e nas pequenas empresas, praticando tarifas absurdas e taxas de juros criminosas, astronômicas, com as quais consegue gerar lucros bilionários, todos os anos, lucros esses que são obtidos às custas do suor, do sangue do povo brasileiro.

    Felizmente, muita gente não acredita nessa flexibilização de direitos. Aliás, para mim, parece óbvio que há sérias perdas para o trabalhador, perdas de direitos que começaram a ser duramente obtidos com muita luta, muito sangue derramado, com muita greve, sobretudo lá em São Paulo, em julho de 1917.

    Por tudo isso é que, com consciência e com coerência, eu disse "não" à reforma trabalhista que se tenta impor ao trabalhador brasileiro! Uma reforma trabalhista que consiste num retrocesso histórico enorme e que ...

(Interrupção do som.)

    O SR. EDUARDO AMORIM (Bloco Social Democrata/PSDB - SE) – Uma reforma trabalhista que consiste num retrocesso histórico enorme e que, por isso mesmo, não mereceu o nosso apoio, Sr. Presidente.

    E, para finalizar, eu gostaria de estar votando aqui, Sr. Presidente, era a reforma tributária, porque, num país onde existem mais de 94 tipos de tributo, sinaliza-se que se cobra mal, se cobra de quem não deve, se cobra de quem não pode pagar e se estimula, muitas vezes, a sonegação, porque não há como fiscalizar adequadamente 94 tipos de tributo. Que o diga o rombo da previdência, Sr. Presidente.

    Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/07/2017 - Página 20