Discurso no Senado Federal

DIVULGAÇÃO DO MANIFESTO 2000 POR UMA CULTURA DE PAZ E NÃO-VIOLENCIA, ELABORADO PELA UNESCO, NO TRANSCURSO DO ANO INTERNACIONAL DA CULTURA DA PAZ.

Autor
José Jorge (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: José Jorge de Vasconcelos Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • DIVULGAÇÃO DO MANIFESTO 2000 POR UMA CULTURA DE PAZ E NÃO-VIOLENCIA, ELABORADO PELA UNESCO, NO TRANSCURSO DO ANO INTERNACIONAL DA CULTURA DA PAZ.
Publicação
Publicação no DSF de 01/07/1999 - Página 17926
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, ATUAÇÃO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO A CIENCIA E A CULTURA (UNESCO), BRASIL.
  • COMENTARIO, PROPOSIÇÃO, ORADOR, CRIAÇÃO, GRUPO PARLAMENTAR, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO A CIENCIA E A CULTURA (UNESCO), CONGRESSO NACIONAL, DEBATE, PROPOSTA, CONTRIBUIÇÃO, REDUÇÃO, POBREZA, VALORIZAÇÃO, VIDA HUMANA.
  • DIVULGAÇÃO, IMPORTANCIA, MANIFESTO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO A CIENCIA E A CULTURA (UNESCO), OPORTUNIDADE, COMEMORAÇÃO, ANO INTERNACIONAL, CULTURA, PAZ, OBJETIVO, PROMOÇÃO, CONSCIENTIZAÇÃO, POPULAÇÃO, REJEIÇÃO, VIOLENCIA.

O SR. JOSÉ JORGE (PFL-PE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a UNESCO foi criada em 16 de novembro de 1945 para promover a paz e os direitos humanos com base na "solidariedade intelectual e moral da humanidade". É uma das agências das Nações Unidas para incentivar a cooperação técnica entre os Estados membros.

Ao tempo de sua criação, o mundo acabara de experimentar a maior catástrofe de sua história - a Segunda Grande Guerra Mundial. Os representantes dos países aliados, percebendo a importância e o alcance da cooperação intelectual entre os povos, decidiram criar uma organização para ser um sistema de vigilância e alerta em defesa da paz, da solidariedade e da justiça. Como declara o seu Ato de Constituição, "se as guerras nascem na mente humana, é na mente dos homens e das mulheres que devem ser erguidas as defesas da paz". Essa frase, que se tornaria antológica, passou a presidir a trajetória de lutas da UNESCO, que já passa de meio século.

A cooperação intelectual constitui, desde os primórdios da Organização, um dos eixos centrais de sua atuação. Não uma cooperação desvinculada dos problemas sociais que o mundo enfrenta, mas uma cooperação capaz de oferecer uma contribuição efetiva aos países membros em suas políticas de promoção do desenvolvimento da educação, da ciência e da cultura, como forma e estratégia de progresso da cidadania e do bem estar social.

A Representação da UNESCO no Brasil, sediada em Brasília, iniciou suas atividades em 1972. A partir de 1992, suas ações adquiriram um novo impulso, motivadas inicialmente pela "Declaração Mundial sobre Educação para Todos". A Representação, percebendo a importância desse compromisso na política educacional do país, iniciou entendimentos com o Ministério da Educação com vistas a um diálogo permanente de como poderia contribuir a UNESCO na concretização dos ideais de Jomtiem. Em 1993, foi assinado o primeiro plano de trabalho com o MEC, como mecanismo auxiliar à decisão do Governo de elaborar o Plano Decenal de Educação para Todos. Aos poucos, as atividades da Representação foram se ampliando para outras áreas, multiplicando-se as articulações e os acordos de cooperação técnica, tanto com o governo quanto com entidades da sociedade civil.

Hoje, as atividades da UNESCO no Brasil situam-se predominantemente nos setores da Educação, Cultura, Ciência, Tecnologia, Comunicação, Informática, Meio Ambiente, Direitos Humanos e Gestão Social. Em todos esses setores, a UNESCO tem procurado moldar uma atuação que tenha por referência as convenções e compromissos internacionais firmados pelos Estados Membros em diversos eventos e conferências de Cúpula. A articulação permanente com os poderes constituídos destaca-se como condição fundamental para a viabilização da cooperação técnica que favoreça a consecução dos objetivos de desenvolvimento humano inerentes a esses compromissos. Esta cooperação, no caso brasileiro, tem o objetivo de auxiliar a formulação e operacionalização de políticas públicas que estejam em sintonia com as grandes metas acordadas internacionalmente.

A atuação da UNESCO no Brasil, porém, não se limita apenas ao seu relacionamento com os órgãos do Poder Executivo, nas esferas federal, estadual e municipal. Diante da crescente importância do chamado "Terceiro Setor", a UNESCO tem buscado parcerias, mobilizando novos interlocutores para ações em prol da paz, do desenvolvimento e da democracia. Dentre estes destacam-se os grupos parlamentares, corporações militares, jornalistas, jovens e mulheres, além das Fundações Privadas, mantidas por organizações empresariais voltadas para as ações sociais.

Em todo o mundo, a UNESCO procura contar com o apoio dos Parlamentos na consecução dos grandes objetivos acordados entre os Estados Membros. A importância dessa parceria tem sido objeto de crescente reconhecimento nos principais fóruns internacionais que discutem o problema do desenvolvimento humano. No caso do Brasil, o Congresso Nacional, como instância do poder legitimada pelos diversos segmentos sociais através de eleições livres e democráticas, constitui fórum privilegiado para o debate e aprovação de leis que convertam em realidade compromissos e projetos de indubitável alcance coletivo. Nesta linha, propus, apoiado em sugestão apresentada pelo Representante da UNESCO no Brasil, o Sr. Jorge Werthein, a criação do Grupo dos Parlamentares Amigos da UNESCO, no âmbito do Congresso Nacional, com o objetivo de promover a discussão pública de propostas que contribuam para a redução da pobreza e valorização da dimensão humana do desenvolvimento. Com essa iniciativa, passamos a ser o primeiro país da América Latina a contar com um Grupo Parlamentar pela UNESCO, a exemplo do que já acontecia em países europeus, no Japão e em Israel.

O Grupo foi constituído formalmente no dia 3 de julho de 1997, em solenidade realizada no Espaço Cultural da Câmara dos Deputados, com a presença do Diretor-Geral da UNESCO, Sr. Federico Mayor. Participam do Grupo Deputados e Senadores de diferentes partidos políticos e de diferentes regiões brasileiras, unidos pelo mesmo ideal de paz, justiça social e solidariedade. Este Grupo desempenha, hoje, um importante papel, não só em termos de difusão dos ideais da UNESCO, como também na formulação de políticas nacionais de educação, cultura, ciência e tecnologia.

Sr. Presidente, é justamente com o intuito de difundir os ideais que orientam a atuação da UNESCO no Brasil e no mundo que venho hoje a essa tribuna falar-lhes sobre a Cultura de Paz.

Gostaria de introduzir o assunto citando o Sr. Federico Mayor, Diretor-Geral da UNESCO: "Não pode haver paz sustentável sem desenvolvimento sustentável. Não pode haver desenvolvimento sem educação ao longo da vida. Não pode haver desenvolvimento sem democracia, sem uma distribuição mais eqüitativa dos recursos, sem a eliminação das disparidades que separam os países mais avançados daqueles menos desenvolvidos".

A cultura de paz é a paz em ação; é o respeito aos direitos humanos no dia-a-dia, é um poder gerado por um triângulo interativo de paz, desenvolvimento e democracia. Enquanto cultura de vida, trata-se de tornar diferentes indivíduos capazes de viverem juntos, de criarem um novo sentido de compartilhar, ouvir e zelar uns pelos outros e de assumir responsabilidade por sua participação numa sociedade democrática que luta contra a pobreza e a exclusão; ao mesmo tempo em que garante igualdade política, eqüidade social e diversidade cultural.

Por iniciativa do Diretor-Geral da UNESCO, a Cultura de Paz tornou-se a principal vertente da Organização, aumentando a promoção da não-violência, da tolerância e da solidariedade e influenciando pessoas de todas as partes do mundo no sentido de engajarem-se em ações inspiradas por esses valores. Na alvorada do novo milênio a cultura de paz está mais ativa do que nunca em seu esforço de fazer do "espírito de paz" uma realidade na vida das pessoas. Mas, para concretizarmos este ideal, impõe-se duas questões básicas: Como fortalecer a consciência sobre a importância e urgência da tarefa vital que se faz presente ao final desse século, de se promover a transição de uma cultura de guerra para uma cultura da paz? Como encontrar os caminhos para alterar os valores, atitudes, crenças e comportamentos do tempo presente?

Muitas guerras têm sido causadas por questões de identidade cultural visando à destruição do oponente; muitos esforços violentos de modernização têm afetado a noção de identidade dos povos; muitas conseqüências cruéis são decorrentes da globalização do intercâmbio cultural e o intercâmbio econômico que levam à desintegração dos valores das populações.

Em sua busca pela paz, a UNESCO parte do princípio de que a violência ainda persiste, no entanto, com uma nova face. Apesar de as formas tradicionais de conflito e guerra terem diminuído, ainda deparamos, dia a dia, com cenas de violência, de injustiça e com a miséria que tira do homem o seu bem mais precioso, a dignidade. Convivemos hoje com novas ameaças não-militares para a paz e para a segurança como a exclusão, a pobreza extrema e a degradação ambiental.

Mas como fazer da cultura de paz uma realidade concreta e duradoura? No mundo interativo, tudo é uma questão de conscientização, mobilização, educação, prevenção e informação de todos os níveis sociais em todos os países. A elaboração e o estabelecimento de uma cultura de paz requer profunda participação de todos. Cabe aos cidadãos organizarem-se e assumir sua parcela de responsabilidade. Os países devem cooperar, as organizações internacionais devem coordenar suas diferentes ações e as populações devem participar inteiramente no desenvolvimento de suas sociedades. E nesse ponto, nós, parlamentares, temos muito a acrescentar e colaborar.

A cultura de paz é uma iniciativa de longo prazo que deve levar em conta os contextos histórico, político, econômico, social e cultural de cada ser humano. É necessário aprendê-la, desenvolvê-la e colocá-la em prática no dia-a-dia familiar, regional e nacional.

A paz não é um processo passivo: a humanidade deve esforçar-se por ela, promovê-la e administrá-la. A promoção da educação para a paz, a defesa do pluralismo e da diversidade cultural e a conscientização dos meios de comunicação para uma programação menos violenta e mais solidária são alguns dos esforços possíveis em direção a uma cultura de paz.

Em 1997, a Assembléia Geral das Nações Unidas proclamou o ano 2000 como o "Ano Internacional da Cultura de Paz", e em 1998 declarou o período 2001-2010 como a "Década Internacional da Cultura de Paz e Não-Violência para as Crianças do Mundo". Com essas ações, a Assembléia Geral das Nações Unidas demonstrou sua total conformidade com essa prioridade da UNESCO, que foi escolhida a agência coordenadora das celebrações. Em sua preparação, foi lançado em 04 de março de 1999, em Paris, o Manifesto 2000 por uma Cultura de Paz e Não-Violência, elaborado por personalidades laureadas com o Prêmio Nobel da Paz conjuntamente com as Nações Unidas e a UNESCO.

O ano 2000, com todo o simbolismo relacionado ao novo milênio, oferece uma excelente oportunidade para lançar um Movimento Mundial por uma Cultura de Paz, com base no compromisso individual no dia-a-dia, com o envolvimento de instituições e organizações em todos os níveis. Incluindo-se a participação efetiva de grupos parlamentares, já que a existência de uma vontade política é necessária para a criação e o estabelecimento de condições para a paz em longo prazo.

O Manifesto 2000 por uma Cultura de Paz e Não-Violência tem por finalidade a promoção da conscientização e do compromisso individual: não é nem um apelo nem uma petição dirigidos aos governos ou autoridades superiores. O Manifesto afirma que é da responsabilidade de cada ser humano traduzir os valores, atitudes e padrões de comportamento que inspiram a cultura de paz em realidades da vida diária. Todos podem agir no espírito desta cultura dentro do contexto da própria família, do local de trabalho, do bairro, da cidade ou da região, tornando-se um mensageiro da tolerância da solidariedade e do diálogo.

O objetivo é de coletar 100 milhões de assinaturas antes da Assembléia Geral das Nações Unidas em setembro de 2000. Norman Borlayg, Adolfo Perez Esquivel, Michail Gorbatchev, Mairead Maguire, Rigoverta Menchu Tum, Shimon Peres, José Ramos Horata, Joseph Rotblat, David Trimble, Desmond Tutu, Elie Wiesel, Carlos F. Ximenes Belo, Nelson Mandela e o Dalai Lama foram os primeiros signatários do Manifesto 2000.

O ato de assinatura do Manifesto 2000 é apenas o começo do compromisso individual das pessoas, e não o seu fim. O objetivo é mobilizar o maior número possível de indivíduos para contribuir para a cultura de paz, encorajando-os a juntarem-se às organizações e às instituições já envolvidas em suas diferentes áreas. Assinando o Manifesto, todos comprometem-se a respeitar todas as vidas, rejeitar a violência, compartilhar com os outros, ouvir para entender, preservar o planeta, redescobrir a solidariedade.

A UNESCO, como corpo das Nações Unidas coordenador da preparação do Ano Internacional da Cultura de Paz, é responsável pela distribuição do Manifesto 2000 pelo mundo afora, e está lançando um apelo a todas as organizações, associações e governos no sentido de cooperarem. É justamente esse o convite que venho hoje apresentar-lhes: levar às nossas bases os ideais expressos no Manifesto 2000, conscientizando as pessoas em todo o Brasil da importância de assumir os compromissos por uma cultura de paz e não-violência. Para tanto, a própria UNESCO, encaminhará aos Gabinetes Parlamentares de V.Exas. o referido Manifesto.

A divulgação do Manifesto 2000 requer também um esforço no sentido de coletar o maior número possível de assinaturas. Um site na Internet dedicado ao Manifesto 2000, incluindo o registro de todas as suas assinaturas, foi implementado, com acesso por meio da Home Page da UNESCO Brasil na internet no endereço www.unesco.org.br. Considerando que a internet ainda é uma realidade distante para grande parte da população brasileira, as assinaturas podem ser coletadas também sob a forma escrita, com a reprodução do Manifesto 2000 e a coleta de assinaturas onde constem dados pessoais, tais como: cidade, país e idade.

O objetivo dessa operação de larga escala é atrair o maior número possível de assinantes por meio do aumento de conscientização e da mobilização da opinião pública em todo o mundo no sentido de lançar e apoiar novas iniciativas e buscar soluções alternativas. O Ano Internacional da Cultura de Paz é uma oportunidade de aumentar a conscientização, bem como encorajar o surgimento de um movimento universal para a promoção da paz, e estabelecer um sistema de rede de informações para conectar os indivíduos com as organizações relevantes.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, conto com o apoio de Vossas Excelências para divulgar essa nobre causa que não é só da UNESCO ou do Grupo dos Parlamentares Amigos da UNESCO, mas de toda a humanidade.

Manifesto 2000 Por uma Cultura de Paz e Não-Violência

O ano 2000 deve ser um novo começo para todos nós. Juntos, podemos transformar a cultura de guerra e violência em uma cultura de paz e não-violência.

Essa evolução exige a participação de cada um de nós para dar aos jovens e às gerações futuras valores que os ajudem a forjar um mundo mais digno e harmonioso, um mundo de justiça, solidariedade, liberdade e prosperidade.

A cultura de paz torna possível o desenvolvimento duradouro, a proteção do ambiente natural e a satisfação pessoal de cada ser humano.

Reconhecendo a parte de responsabilidade ante o futuro da humanidade, especialmente com as crianças de hoje e de amanhã, me comprometo, em minha vida diária, minha família, meu trabalho, minha comunidade, minha região e eu país a:

1.     respeitar a vida e a dignidade de cada pessoa, sem discriminar nem prejudicar;

2.     praticar a não-violência, repelindo a violência em todas as suas formas: física, sexual, psicológica, econômica e social, em particular ante os mais fracos e vulneráveis, como as crianças e os adolescentes;

3.     compartilhar o meu tempo e meus recursos materiais, cultivando a generosidade, a fim de terminar com a exclusão, a injustiça e a opressão política e econômica;

4.     defender a liberdade de expressão e a diversidade cultural, privilegiando sempre a escuta e o diálogo, sem ceder ao fanatismo, nem à maledicência e o rechaço ao próximo;

5.     promover um consumo responsável e um modelo de desenvolvimento que tenha em conta a importância de todas as formas de vida e o equilíbrio dos recursos naturais do planeta;

6.     contribuir para o desenvolvimento de minha comunidade, propiciando a plena participação das mulheres e o respeito dos princípios democráticos, com o fim de criar novas formas de solidariedade.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/07/1999 - Página 17926