Discurso durante a 41ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa da convocação de novas eleições como forma de solucionar a crise política por que passa o País.

Autor
Randolfe Rodrigues (REDE - Rede Sustentabilidade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES E PARTIDOS POLITICOS:
  • Defesa da convocação de novas eleições como forma de solucionar a crise política por que passa o País.
Publicação
Publicação no DSF de 01/04/2016 - Página 65
Assunto
Outros > ELEIÇÕES E PARTIDOS POLITICOS
Indexação
  • DEFESA, CONVOCAÇÃO, REALIZAÇÃO, ELEIÇÕES, OBJETIVO, ESCOLHA, SUBSTITUTO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, COMENTARIO, BENEFICIO, MELHORIA, CRISE, POLITICA NACIONAL.

    O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Eu lhe agradeço, meu caríssimo Presidente, Senador Elmano Ferrer.

    Sr. Presidente, eu faço questão de iniciar este pronunciamento lendo o excelente artigo de hoje do jornalista Clovis Rossi, da Folha de S.Paulo, sob o título: "A morta-viva e os vampiros.", que retrata o drama da conjuntura que estamos vivendo. Diz Clovis Rossi:

É fácil apontar a causa pela qual o PMDB decidiu romper com o governo Dilma Rousseff: vampiros abandonam corpos quando estão exangues. Dilma [...] é, hoje por hoje, uma morta-viva, que deixou de governar faz algum tempo e que, quando governou, semeou a ruína que agora colhe e pavimenta seu caminho para o cadafalso.

Hélio Schwartsman, excelente colunista, já deixou claro, na sua coluna desta quarta-feira, 30, que a presidente cairá, se cair, não por algum crime hediondo mas porque está desesperadoramente sozinha.

O problema é que, se cair pela via do impeachment, o que virá não traz [nenhuma] esperança, a não ser para os que, ingênua ou interessadamente, acreditam que Dilma é a causa de todos os problemas.

Qualquer um que conheça a trajetória dos que aparecem nas fotos comemorativas do desembarque do PMDB só pode suar frio: o que vem por aí é parte do "sistema ilegal e ilegítimo de financiamento do sistema partidário-eleitoral do país", denunciado por uma grande financiadora, no caso a Odebrecht.

O fato, inegável, é que o sistema está podre e o rompimento do PMDB apenas acrescenta anomalia à podridão: a coalizão que foi legitimamente eleita em 2014 rompeu-se na [última] terça-feira. No entanto, o governo continua em funções, ainda que não exerça mais função alguma já faz um bocado de tempo.

Agora, o PT diz que vai procurar pedaços de partidos para montar um novo monstro de Frankenstein e reanimar o corpo [...] [até agora inerte].

Pode até conseguir, mas não há partido que não esteja na planilha da Odebrecht e, se ela própria diz que é "ilegal e ilegítimo" o sistema de financiamento, não há por que não suspeitar de todos os que constam da lista, mesmo os beneficiados por doações declaradas.

Temos, pois, [continua Clovis Rossi] um morto-vivo, o governo [...], buscando carne possivelmente putrefata para sobreviver. No campo oposto, um bando de oportunistas que deixa a teta gorda em que mamou durante todo o governo, na expectativa de que mude o dono da teta, mas preserve a mamada ampla, geral e irrestrita que a Lava Jato aponta dia sim, o outro [dia] também.

O governo do PMDB, pelo que já está vazando, será outra criatura de Frankenstein, com outra cara, mas com o mesmo coração.

Tudo somado, só resta repetir o que já escrevi neste espaço na semana passada:

    Aí conclui o excelente articulista:

a única eventual possibilidade de saída para o impasse em que o país mergulhou de cabeça é a convocação o mais depressa possível de novas eleições, de preferência eleições gerais, para a Presidência e para o Congresso.

Se a iniciativa partisse da Presidência da República, como, segundo o noticiário, chegaram a cogitar assessores de Dilma, seria o ideal.

A presidente sairia mas ninguém poderia gritar "golpe", o que, em tese, acalmaria as ruas excitadas como raramente se viu antes neste país.

Só um governo banhado pela legitimidade que dá o voto popular teria, se Deus ajudasse, condições para construir uma verdadeira ponte para o futuro. Eu não transitaria por uma erguida por quem foi governo, com um bando ou com o outro, e que lega essa terra arrasada.

    Sr. Presidente, eu fiz questão de citar ipsis litteris todo o artigo do jornalista Clovis Rossi, na Folha de S. Paulo de hoje, porque, na sua conclusão em especial, ele sintetiza o que me parece que, cada vez mais, cada dia da conjuntura, fica claro que é a única alternativa possível para os dramáticos momentos que o País está vivendo, que é a convocação de novas eleições.

    Eu sei, o jornalista inclusive aponta o cenário que eu também considero que seria o ideal. Termos, ainda este ano - e a Presidente da República, se quisesse, assim poderia fazer -, a convocação de eleições gerais para renovação de dois terços dos mandatos do Senado - inclusive o meu mandato -, para renovação da Câmara dos Deputados e para eleição de uma nova chapa presidencial, junto com as eleições para prefeito, vice-prefeito e vereador. Seria o ideal. O ideal seria a convocação de novas eleições gerais ainda este ano.

    E eu já disse nos debates desta tarde, aqui no plenário do Senado, aparteando o Senador Lindbergh, que essa seria uma saída pela porta da frente pela qual a Presidente da República poderia optar. Era a saída mais adequada. E não é saída pela porta da frente para a Presidente ou para os lados que estão em disputa.

    Neste momento, mais de 50 mil pessoas estão aqui na frente do Congresso Nacional. Daqui a pouco, haverá uma manifestação do outro lado com outros milhares de pessoas.

    Eu lhe confesso, Presidente, que temo como será a Praça dos Três Poderes e a frente deste Congresso Nacional no dia da votação do impeachment se os dois lados resolverem convocar manifestações simultâneas. Eu temo o desenrolar disso. Nós não podemos chegar ao momento ápice e dramático de ter o sacrifício da vida de um brasileiro porque não é possível a construção de um consenso nacional que aponte para uma alternativa que é a mais democrática no momento.

    Em momentos dramáticos, em momentos de exceção, já disse aqui, já disse isso hoje e eu repito, frase inclusive que não é minha, frase que é de uma liderança estudantil que inspirou a minha geração, que é Vladimir Palmeira, em momentos de excepcionalidade são necessárias soluções excepcionais.

    Não é possível todas as constatações que estamos tendo, ter uma manifestação de 50 mil pessoas aqui na frente do Congresso por mais democracia, ter manifestação do outro lado apontando que a única solução é o impeachment, mas 76% desses perguntados nessa outra manifestação apoiavam a realização de eleições gerais.

    Não é possível vermos o sistema político brasileiro ser desvendado, e eu quero destacar aqui, ser desvendado. O sistema político brasileiro não ficou assim do dia para a noite ou não ficou assim a partir do Governo do PT. O sistema político brasileiro sempre foi um sistema de cumpliciamento inescrupuloso de interesses que deveriam ser públicos transformados em interesses privados. Sempre foi assim desde a redemocratização. E as raízes disso estavam no período autoritário, durante a ditadura, período em que as empreiteiras mais ganharam dinheiro no País. Aliás, há dois períodos em que empreiteiras ganharam muito dinheiro nesse País: durante a ditadura e nos últimos anos, durante o Governo petista.

    É por isso que, complementarmente, eu fiz questão de apresentar, e o requerimento está à disposição para a coleta de assinaturas, de requisitar a instalação, aqui no Senado Federal, de uma Comissão Parlamentar de Inquérito que investigue as relações das empreiteiras com os agentes públicos.

    Eu acho que o Congresso Nacional tem que ter coragem de tomar algumas medidas. Essa é uma medida necessária e fundamental para ser tomada pelo Congresso Nacional, para, inclusive, o próprio Congresso dizer: "Não devo, não temo, quero que ocorra a investigação". Mas, como disse o próprio jornalista Clóvis Rossi, o que está sendo revelado cada vez mais é como funcionou, desde a redemocratização, o sistema político eleitoral brasileiro.

    Nós vivemos um momento de esgotamento desse sistema e isso está expresso nas ruas. Seja um lado ou outro que esteja ocupando as ruas do Brasil nesse momento, seja um lado ou outro, eles estão reclamando da mesma conclusão: o sistema político brasileiro se esgotou. O sistema de cumpliciamento com interesses privados se esgotou e é necessário ocorrer um freio de arrumação.

    O freio de arrumação nesse momento é que nós realizemos eleições ainda este ano. O ideal, mas, lamentavelmente, não é, Presidente? Dizem que o bom é inimigo do ótimo. Às vezes, o ideal não é o que é possível, mas, no mínimo, a medida que deveríamos ter agora seria a convocação, pelo menos, de eleições presidenciais.

    Eu digo isso e quero recomendar a experiência que já tivemos na história.

    Eu reitero a posição de convocação de novas eleições. E não é uma saída para a Presidente ou para o governo atualmente de plantão. É uma saída para o Brasil.

    O antecedente na história que temos de uma situação muito parecida é em 1973, no Chile. Um governo progressista de esquerda, um dos governos mais democráticos da história da América Latina, o governo de Salvador Allende estava sitiado, ilhado e isolado por todas as forças políticas. O partido mais ao centro, a Democracia Cristã, tinha rompido com o governo e negado uma alternativa de recomposição com a Unidade Popular.

    Qual foi a alternativa que encontrou o Presidente Allende naquele momento? Convocar um plebiscito para que o povo dissesse se o seu governo devia continuar ou não. E o plebiscito não ocorreu. Alguns dizem que foi em decorrência disso que ocorreu o golpe armado. Não! O golpe armado ocorreu para evitar que o povo votasse no Chile.

    Não há remédio melhor na política do que a soberania do voto popular, do que o povo ser chamado para votar, para escolher os novos destinos.

    O processo que se avizinha tende a ser traumático, Sr. Presidente. Um segundo impeachment na história republicana em um intervalo de menos de 25 anos não é bom para a nossa democracia, mesmo porque as razões não estão claramente dadas neste caso.

    Eu sou de oposição ao Governo da Presidente Dilma. Tenho inúmeras razões e enormes críticas ao Governo. Mas materialmente nesse processo as razões não estão dadas. Um ambiente que desague no impeachment pode, concretamente, resultar no acirramento ainda maior da conjuntura, além da ilegitimidade de quem a sucede. Não tem legitimidade nenhuma uma chapa dirigida pelo Sr. Michel Temer, que terá Eduardo Cunha, um notório ladrão, um dos maiores, senão o maior bandido da história republicana como Vice-Presidente da República. Qual o bem que esta cena, esta imagem - Temer e Eduardo Cunha - trará para melhorar o Brasil?

    Por outro lado, a solução também está nas mãos da Presidente, que poderia tomar a iniciativa, resolver esse impasse, tranquilizar as ruas e apaziguar a sociedade brasileira convocando um plebiscito sobre a continuação do seu governo ou não, ou ainda encaminhando para cá, em caráter de urgência, uma proposta de emenda constitucional que apontasse que poderíamos ter eleições ainda neste ano, como temos reclamado insistentemente, que é a única alternativa agora.

    Os dois cenários, Sr. Presidente, para o Brasil, daqui a duas ou três semanas, quando o processo de impeachment será votado na Câmara dos Deputados, são dramáticos. Cenário número um: a possibilidade de a Presidente da República ganhar, mas não ter a maioria dos votos, ou seja, sagrar-se vitoriosa ou pela ausência de alguns Deputados ou por uma margem pequena. Nós vamos ter um governo fraco, moribundo, um governo que não terá condições de governar e não aprovará praticamente nada aqui no Congresso.

    O segundo cenário: o cenário de um impeachment se concretizar e o Governo da República recair nas mãos da foto que nós tivemos na última terça-feira, ou seja, ter alguém que já é réu no Supremo Tribunal Federal, o Sr. Eduardo Cunha, ascendendo na linha sucessória. E, vamos combinar, chega a ser bizarro ter uma sessão de impeachment presidida por um ladrão conhecido, pelo maior criminoso na política hoje, na história brasileira, que é o Sr. Eduardo Cunha. Não tem sentido nem cabimento.

    Por isso, os dois cenários sendo dramáticos, é chegado o momento de construir, de encontrar uma mediação, mediação que já houve em outros momentos da história nacional e que evitou uma conjuntura pior para o País.

    Em 1961, era Presidente da República Jânio Quadros. No dia 25 de agosto, ele renunciou à Presidência da República. Os ministros militares vetaram a posse do Presidente João Goulart. Naquele momento, naquele ambiente, embora não seja a medida que historicamente eu defendo, algumas pessoas de espírito republicano, embora eu também não concorde com elas, encontraram uma mediação, que foi a emenda do parlamentarismo que aquiesceu à posse do Presidente João Goulart.

    Menos de um ano depois, o Presidente João Goulart convocou o povo brasileiro a um plebiscito para decidir se mantinha o sistema parlamentar de governo ou se restaurava o presidencialismo. Noventa por cento votaram a favor da restauração dos poderes presidenciais. Num momento de impasse da vida nacional alguns buscaram a mediação e evitaram que o País caminhasse para um gravíssimo conflito, que era o que tendia a acontecer entre 61 e 62.

    É chegado de novo o momento em que o impasse está colocado, em que a situação é excepcional, em que o governo padece de uma crise de legitimidade, em que o Vice que está colocado para assumir não tem legitimidade política, porque quer implementar um programa que não foi o que defendeu durante a campanha, é o antônimo, é antagônico ao programa que defendeu durante a campanha.

    Não só não tem legitimidade política como, mais grave do que isso, não tem legitimidade moral para assumir, porque o seu Partido é o principal implicado nas investigações que são conduzidas lá em Curitiba e que estão em curso aqui.

    É por conta disso, Sr. Presidente, que a saída sensata, a saída para a resolução do impasse político, a saída para levar legitimidade popular para a crise que o País atravessa, a legitimidade para resolver - estou mais do que convencido -, é a convocação de novas eleições.

    Sr. Presidente, as outras saídas pensadas são rupturas com a ordem democrática, retrocessos, são alternativas forjadas em gabinetes. Alguns já falaram até em parlamentarismo. Seja o parlamentarismo, seja o impeachment como está sendo moldado, eles estão sendo forjados no gabinete e excluindo o povo da participação.

    A responsabilidade do sistema como está não é somente da Presidente Dilma. Tirar Dilma e não modificar as estruturas corrompidas da política brasileira é manter a situação como está. A ruptura de que o País precisa - e precisa de uma ruptura neste momento, Sr. Presidente - é uma ruptura democrática, é a convocação imediata de eleições gerais por qualquer um dos caminhos que forem apontados, por qualquer um dos remédios, seja pela adoção da emenda constitucional do recall, da revogação popular de mandato, pois há mecanismo nesse sentido, seja, alternativamente, a própria Presidente tomar consciência disso e mandar uma proposta de emenda constitucional para cá, extraordinariamente, propondo a convocação de eleições ainda este ano, seja a convocação de eleições gerais ou somente a convocação, no programa mínimo, mas bom e adequado, para Presidente e Vice.

    Estou convencido, Presidente, de que as ruas, os dois lados estão clamando por reformas profundas nas estruturas do poder brasileiro.

    Essas reformas só podem vir - esta é a única alternativa, estou mais do que convencido disto - para diminuir a crise dramática que vive o nosso País neste momento, chamando a sociedade brasileira e submetendo o sistema e os partidos políticos a um novo sufrágio popular. Não há quem questione, não acredito que haja alguém que questione o remédio do sufrágio popular, da soberania popular na decisão política. Não há como alegar que essa seja golpe; não há como alegar que essa seja uma alternativa extraordinária. Tanto é assim, que os dois lados nos criticam por apontarmos essa solução.

    Repito, vivemos um momento extraordinário e, em decorrência do momento extraordinário, temos de apontar uma solução extraordinária. E a solução extraordinária é fazermos, ainda neste ano, novas eleições.

    Agradeço V. Exª.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/04/2016 - Página 65