Discurso no Senado Federal

APOIO A CAMPANHA 'BANCOS PRIVADOS: SOCIOS DA CRISE', LANÇADA PELOS SINDICATOS DE BANCARIOS DO ESTADO DE SANTA CATARINA.

Autor
Nelson Wedekin (PDT - Partido Democrático Trabalhista/SC)
Nome completo: Nelson Wedekin
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS.:
  • APOIO A CAMPANHA 'BANCOS PRIVADOS: SOCIOS DA CRISE', LANÇADA PELOS SINDICATOS DE BANCARIOS DO ESTADO DE SANTA CATARINA.
Publicação
Publicação no DCN2 de 24/03/1994 - Página 1369
Assunto
Outros > BANCOS.
Indexação
  • APOIO, CAMPANHA, SINDICATO, BANCARIO, ESTADO DE SANTA CATARINA (SC), SOLICITAÇÃO, PRESIDENTE, CONSELHO DIRETOR, BANCO PARTICULAR, ADOÇÃO, POSIÇÃO, ATUAÇÃO, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO NACIONAL, RETOMADA, CRESCIMENTO ECONOMICO, REDUÇÃO, POBREZA, MISERIA, MAIORIA, POPULAÇÃO, PAIS.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, JORNAL DO BRASIL, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), AUTORIA, RUBENS PENHA CYSNE, PROFESSOR, FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS (FGV), ANALISE, PERCENTAGEM, TRANSFERENCIA FINANCEIRA, BANCOS, EXCESSO, AUMENTO, LUCRO.
  • COMENTARIO, SITUAÇÃO, MAIORIA, POPULAÇÃO, IMPOSSIBILIDADE, ACESSO, MANUTENÇÃO, CONTA BANCARIA, UTILIZAÇÃO, SERVIÇO BANCARIO, RESULTADO, EXIGENCIA, BANCOS.

     O SR. NELSON WEDEDIN (PDT-SC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, está em curso, desde o final de novembro do ano passado, a campanha "Bancos Privados: Sócios da Crise".

     Em redes de televisão e em edições dominicais dos jornais de grande circulação, figuram anúncios que, além de informarem a população sobre a situação financeira dos bancos privados, têm como escopo fazer um apelo, um chamamento, uma exortação, na verdade, a tais bancos. O apelo está endereçado aos presidentes e conselhos diretores dos bancos privados, no sentido de passarem a assumir uma ação positiva em prol do desenvolvimento nacional e se integrarem efetivamente na retomada do crescimento econômico do País, bem como na luta pela diminuição da pobreza e miséria crônicas de grande parte da população brasileira.

     A campanha está sendo empreendida pelo Departamento Estadual dos Bancários e pelos Sindicatos de Bancários filiados à Central Única dos Trabalhadores, do Estado de Santa Catarina.

     Segundo informações do coordenador da campanha, Sr. José Ricardo Toscan de Freitas, os anúncios estão fundamentados nos seguintes eixos:

     1) Os bancos privados não estão reinvestindo seus lucros na produção e no fomento ao desenvolvimento da economia do Brasil;

     2) Os bancos privados detêm o controle do sistema financeiro nacional, interferindo na formulação das políticas específicas, estabelecendo tarifas e preços para o setor, tudo isso livres de qualquer forma de controle social;

     3) Os bancos privados estão investindo fortemente na elitização da clientela, discriminando a grande maioria da população em favor de uma minoria que desfruta de privilégios como abertura e manutenção de contas-fantasma, aplicações no exterior e atendimento VIP;

     4) Os bancos privados investem milhões de dólares em automação e informática, mas mantêm relações de trabalho arcaicas, autoritárias e injustas.

     É de se destacar, Sr. Presidente e Srs. Senadores, que vem sendo o setor bancário aquele que mais tem auferido benefícios com a inflação constantemente em alta, com os desacertos da administração da nossa economia e com a implantação de uma política de juros altíssimos.

     Não é por outras razões que os bancos colheram, em 1993, o maior lucro dos últimos cinco anos e um dos maiores de sua história. Os meios de informação deram notícia de que, a partir da análise dos balanços de mais de 220 empresas bancárias, referentes ao primeiro semestre do ano passado, empresas de consultoria apresentavam estimativa de o setor fechar o exercício com um lucro total próximo a dois bilhões e setecentos milhões de dólares. Esse número acusa um aumento de 28,8% em relação aos valores registrados no ano anterior. A rentabilidade líquida sobre o patrimônio também deverá mudar de patamar: de 9,6% em 1992, para 11,5% no exercício de 1993.

     Em artigo publicado no Jornal do Brasil, de 19 de agosto de 1993, o professor Rubens Penha Cysne, da Escola de Pós-Graduação em Economia da Fundação Getúlio Vargas, estabeleceu uma relação que é oportuno mencionar neste pronunciamento. Revela ele que, entre 1947 e 1992, as transferências inflacionárias - nome que se dá aos ganhos brutos dos bancos comerciais no processo de transferência de renda do setor não bancário para o setor bancário - representaram uma média de 4,15% do PIB. Isso significa que indivíduos e empresas têm transferido para o setor bancário da economia, em decorrência da inflação, algo em torno de dezoito bilhões de dólares.

     Mas a relação a que me referi anteriormente, na verdade, encerra algumas comparações que são assustadoras. Transferir esses dezoito bilhões de dólares é o mesmo que a população brasileira trabalhar, a cada 24 anos, um ano inteiro de graça para o Banco Central e para os acionistas dos bancos comerciais.

     Comenta ironicamente o mesmo professor que o slogan "tudo pelo social", vigente nos cinco anos do governo Sarney, poderia ter sido perfeitamente substituído por "tudo pelo setor bancário", em virtude de terem girado em torno de 5,5% do PIB as transferências inflacionárias totais, numa época em que a inflação média girou ao redor de 470% ao ano.

     A tão propalada proteção aos descamisados do governo Collor, então, o que fez foi transferir mais ganho ao setor bancário. Se já estavam sem camisa, nossos pobres acabaram mesmo é perdendo as próprias calças!

     E no ritmo inflacionário em que vem seguindo o Governo Itamar, as projeções indicavam que, até o final de 1993, aproximadamente 23,8 bilhões de dólares teriam sido transferidos para o setor bancário. É como se a população presenteasse compulsoriamente o Banco Central e os bancos comerciais com dois milhões e seiscentos mil fuscas.

     Ora, não é nenhum descabimento, portanto, serem os bancos chamados para se integrarem num grande propósito nacional, qual seja, o de promover, fomentar e alavancar o desenvolvimento do País. Se representam o setor que, nesses longos e duros anos de crise econômica, logrou passar ao largo da penúria geral e obteve lucros inéditos, é justo que agora cooperem na superação da crise econômica.

     Além do mais, não é excessivo lembrar que os bancos, gerados a partir de cartas patentes emitidas pelo Governo, têm uma função social a desempenhar, qual seja: irrigar financeiramente o sistema produtivo e proteger as poupanças individuais.

     Nesse pormenor, o que vemos é muitos bancos andarem na contramão de sua finalidade social, porque, ao invés de auxiliarem os mais pobres e desprotegidos, transformam-se em seus verdadeiros censores e algozes, ao adotarem medidas discriminatórias contra a população de baixa renda, os aposentados e os pensionistas. É justamente em situações de acelerada inflação, quando os salários perdem a cada minuto seu poder aquisitivo, que mais os assalariados necessitam dos serviços bancários para proteger suas pequenas economias da corrosão inflacionária. Sabemos que até mesmo os bancos públicos têm estabelecido limites mínimos de renda para o trabalhador poder abrir contas-correntes e cadernetas de poupança, com valores pré-fixados para depósito inicial, exigência de saldo médio e de teto mínimo de vencimentos.

     Ora, é tarefa dos bancos auxiliar os mais pobres a deixarem de ser tão pobres, para isso habilitando-os ao acesso aos serviços bancários.

     A esse respeito, retomo uma pequena história, relatada por Clóvis Rossi, em sua coluna de 26 de dezembro de 1993, na Folha de S. Paulo. Trata-se da ação do economista Mohammed Yunus, de Bangladesh, que, incomodado com a miséria que via no caminho para a universidade, tentou convencer os banqueiros locais a emprestarem dinheiro para os pobres, na certeza de que pequeníssimas quantidades bastariam para eles promoveram grandes mudanças em suas vidas. Como não obteve sucesso na empreitada, passou três anos buscando suporte governamental para montar seu próprio banco, o Grameen. Dez anos depois, o banco revelou-se uma história de sucesso, tanto para ele quanto para os pobres de Bangladesh. Resultado: 48% dos que fizeram empréstimos constantes, nos dez anos de vida do banco, ultrapassaram a linha de pobreza. Outros 27% chegaram perto dessa meta. Equivale dizer que três de cada quatro clientes desse insólito banco melhoraram de vida e num período relativamente curto de tempo.

     E não se pode dizer que o empreendimento financeiro de Mohammed Yunus não obteve sucesso. Hoje conta com mais de mil sucursais, um milhão e seiscentos mil clientes, girando empréstimos de 30 milhões de dólares ao mês. O empréstimo inicial fica na casa de míseros 10 ou 20 dólares. Na média, os empréstimos não passam de 100 dólares, equivalente aproximado ao salário mínimo brasileiro.

     Diz Clóvis Rossi que a revolução promovida por Yunus é de conceito: em vez de se preocuparem com a capacidade de pagamento do tomador de empréstimo, os funcionários do Grameen preocupam-se em convencê-lo de que pode usar o dinheiro para melhorar de vida. É por isso que Clóvis Rossi indica a iniciativa a de Yunus como projeto para "abençoados quixotes", segundo seus próprios termos, como Betinho, Oded Grajew e outros.

     Aqui, no Brasil, o que estamos vendo é a cada dia um número maior de pessoas ficar impossibilitado não só de ter acesso a uma conta bancária, mas mesmo de manter suas contas abertas e se valer dos serviços bancários, a despeito de os bancos estarem se tornando mais e mais eficientes no atendimento a grande número de clientes, via investimento maciço em informatização das operações, criação de bancos 24 horas, serviços via telefone, etc.

     Por todos os fatores aduzidos neste breve pronunciamento, reputo como de máxima oportunidade a campanha Bancos Privados: Sócios da Crise. Aproveito o ensejo, ao me manifestar acerca dessa louvável iniciativa dos sindicatos de bancários de meu estado, Santa Catarina, para deixar consignado meu apoio à campanha ora empreendida, bem como aproveito a ocasião para transmitir meus sinceros cumprimentos não só aos idealizadores e executores dessa iniciativa, mas a todos os bancários catarinenses, pela consciência social, pela capacidade organizativa e pela solidariedade à causa da erradicação da miséria no Brasil. Porque é certo: para que se reverta a queda contínua dos indicadores econômicos do PIB nacional, para que se reverta a situação de miséria absoluta em que se encontra um quinto da população brasileira, para que cresça a oferta de empregos, é imprescindível que os agentes financeiros se coloquem como partícipes do desenvolvimento nacional e da construção de um País onde impere a prosperidade, a justiça social e o bem-estar de seu povo.

     É o que tinha a dizer.

     Muito obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 24/03/1994 - Página 1369