Discurso no Senado Federal

TRANSCRIÇÃO DO ARTIGO INTITULADO 'DEPOIMENTO DE UM SOBREVIVENTE DO CIGARRO', DE AUTORIA DO JORNALISTA JORGE CALMON, PUBLICADO NO JORNAL A TARDE, DE 30 DE JANEIRO DE 1995.

Autor
Lourival Baptista (PFL - Partido da Frente Liberal/SE)
Nome completo: Lourival Baptista
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TABAGISMO.:
  • TRANSCRIÇÃO DO ARTIGO INTITULADO 'DEPOIMENTO DE UM SOBREVIVENTE DO CIGARRO', DE AUTORIA DO JORNALISTA JORGE CALMON, PUBLICADO NO JORNAL A TARDE, DE 30 DE JANEIRO DE 1995.
Aparteantes
Jacques Silva.
Publicação
Publicação no DCN2 de 01/02/1995 - Página 1809
Assunto
Outros > TABAGISMO.
Indexação
  • TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, A TARDE, ESTADO DA BAHIA (BA), DIVULGAÇÃO, DEPOIMENTO, JORGE CALMON, JORNALISTA, ABANDONO, UTILIZAÇÃO, FUMO, PRESERVAÇÃO, SAUDE.
  • CONGRATULAÇÕES, PAULO MALUF, PREFEITO DE CAPITAL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ASSINATURA, PORTARIA, PROIBIÇÃO, FUMO, BAR, RESTAURANTE, DEFESA, SAUDE, POPULAÇÃO.

O SR LOURIVAL BAPTISTA (PFL-SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o jornal A Tarde, do Estado da Bahia, um dos noticiosos de maior circulação no Nordeste, fundado em 1912, tem participado, com a sua função jornalística, dos últimos 83 anos da história da Bahia e de nosso País, sempre divulgando, comentando, publicando suas reportagens e artigos de vida nacional, cultural, e política do nosso dia a dia local, regional e nacional.

Leitor assíduo desse importante órgão da imprensa baiana, detive-me ontem sobre a leitura de um artigo que julguei do maior interesse público, tendo também para mim o sentido especial, pois é mais um argumento, uma comprovação que contribui para consolidar a luta que estamos desenvolvendo contra o tabagismo.

Jorge Calmon, Diretor Redator-Chefe desse jornal, e que foi meu colega de escola no Colégio Antonio Vieira, em Salvador, fumante há 50 anos, segundo ele desde os tempos em que "estar com o cigarro entre os dedos era sinal de maior idade, se não de machismo, para impressionar as menininhas", após fazer avaliação dos resultados do vício e do alto preço que ele cobrava de sua saúde, do seu organismo, deixou de fumar, abandonando "sobre um móvel o maço de cigarros ainda pela metade."

Antes houvera consultado um clínico, segundo confessa em seu depoimento, que o advertiu, após analisar a radiografia dos seus pulmões, alertando-o que já era tempo de deixar o vício, pois o enfisema, a terrível ameaça que paira sobre os fumantes, estava próximo.

Então, estimulado pelo instinto de conservação, segundo diz, e pela "lembrança do tempo anterior ao começo do vício, ou seja, da infância ou da adolescência, quando se vivia perfeitamente bem com o gosto de fumaça de cigarro", abandonou definitivamente o vício, sem nenhuma tentação de a ele voltar, pois embora o cigarro tivesse sido o seu companheiro por 50 anos, iludindo sua capacidade de sentir e de pensar, inclusive supostamente estimulando sua concentração para escrever, hoje verifica que o cigarro nenhuma falta lhe faz.

E, expressando uma opinião, que vem em apoio a uma tese que sustentei no pronunciamento que ontem fiz nesta Casa sobre o problema das drogas e o projeto de lei que apresentei no Senado , em 1993, acrescenta: "Na marcha em que as coisas vão, não tardará o dia em que fumo - cigarro, cachimbo, charuto, o que seja -, receberá o mesmo tratamento dado às drogas, tais como cocaína, heroína, maconha etc. Esse dia chegará quando o poder público e a sociedade se derem conta - e então começando a capacitar-se disso, não sem grande atraso - do custo do vício em termos de vidas sacrificadas e da saúde de tantas pessoas comprometidas pelo hábito pernicioso."

Esta é a conclusão consciente, Srs. Senadores, de alguém que conviveu com o cigarro durante meio século e, agora, decepcionado com o vício, dá esse depoimento para ajudar a sociedade a combatê-lo.

A minha experiência tem demonstrado que, entre as pessoas, aquelas mais difíceis de se convencerem sobre os males do fumo são os fumantes inveterados, que sempre encontram um subterfúgio de raciocínio para não encararem de frente o problema que o cigarro lhes causa, adiando, sempre, a decisão de bom senso, de força de vontade para deixarem de fumar.

Jorge Calmon, um homem letrado e de sólida cultura, familiarizado com os fatos sociais e a vida do povo, em função de sua atividade diária, há várias décadas na militância jornalística, comenta a oportunidade da portaria assinada pelo ex-Ministro Henrique Santillo que está sendo estudada pelo atual ocupante da Pasta da Saúde, o Ministro Adib Jatene, que mandou verificar os eventuais impedimentos de filigranas jurídicas, visando sua implantação definitiva, ressalvando-se que S. Exª é um profundo conhecedor dos estragos que o fumo causa às suas vítimas: "coração arrebentado, pulmões corroídos pelo câncer, sistema circulatório deteriorado", isto é o que comprova em sua experiência de cirurgião.

O ilustre jornalista baiano comenta que os cuidados do atual Ministro da Saúde visam preservar o Governo de algum recurso na Justiça, sob o aspecto constitucional, conforme alegam os interessados na indústria fumageira que poderiam contestar a medida nos tribunais.

E finalizando o seu artigo, argumenta o eminente e consagrado jornalista baiano, Jorge Calmon, uma opinião que deverá merecer a reflexão desta Casa sobre esse grave problema que atormenta a vida e a saúde dos brasileiros, dizendo:

      Tenho para mim que a Justiça jamais chegaria a tal extremo. Ainda que o ato do ex-Ministro tivesse escapado, parcialmente, de sua competência, por serem alguns dos dispositivos da alçada do Legislativo, haveriam aos Tribunais de se lembrarem que existe uma lei situada acima de todas as outras. Dessa lei máxima falava o mestre Ponciano de Oliveira, professor de Direito Romano, na Faculdade: "Salus populi suprema lex est" a salvação - ou a saúde - do povo é a lei suprema.

      Haverá melhor fundamento que este para uma sentença justa?

Aí está, Sr. Presidente, Srs Senadores, o argumento que faltava para um posicionamento firme do Governo contra o fumo. Uma lei que deveria preceder todas as leis como fundamento basilar de interesse público. E esse princípio é justamente o que foi lembrado por Jorge Calmon:

      A saúde do povo é a lei suprema.

O Sr. Jacques Silva - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Lourival Baptista?

O SR. LOURIVAL BAPTISTA - Com prazer, ouço o aparte do eminente Senador Jacques Silva.

O Sr. Jacques Silva - Senador Lourival Baptista, pelo menos nesta legislatura, tenho a impressão de que é o seu último discurso. Digo nesta legislatura porque vejo V. Exª ainda com muita disposição para a batalha política. Com certeza, se quiser, retornará ao Senado na próxima legislatura - e é o que espero. Nesta oportunidade, Senador, não poderia deixar de registrar - já que esta é minha última participação também, estou, como V. Exª, encerrando o mandato - um elogio ao trabalho e à batalha persistente de V. Exª contra o fumo. Tenha certeza que prestou um grande serviço à Nação. Quantas pessoas, certamente, deixaram de fumar graças às advertências de V. Exª. E, digo mais, quantas pessoas estão vivas graças a V. Exª, que os advertiu do mal que estavam cometendo. Portanto, Senador Lourival Baptista, tenha a certeza do dever cumprido. V. Exª elegeu essa causa, a causa da saúde, uma das mais importantes deste País. No combate intransigente ao tabagismo, V. Exª não mediu esforços, esteve aqui constantemente, falando, pregando, e isso foi muito importante. E V. Exª encerra hoje exatamente falando contra o fumo. Espero que algum senador que esteja chegando a esta Casa, a partir de amanhã, possa abraçar essa bandeira de V. Exª contra o fumo, que realmente é um grande mal. Tenha a certeza de que fez um grande bem a esta Nação combatendo o fumo. Seja feliz, nobre Senador Lourival Baptista, e continue a sua luta contra o fumo que V. Exª estará no caminho certo.

O SR. LOURIVAL BAPTISTA - Prezado Senador Jacques Silva, o aparte de V. Exª enriquece muito o nosso pronunciamento. Na verdade, há dez anos estou aqui, onde me sentei pela primeira vez, em 1971, e daqui não saí. Nunca liguei para quem fumasse ou deixasse de fumar. Já contei, certa feita, aqui a razão pela qual abracei esta campanha contra o tabagismo.

Fui médico, e, na minha época, o médico era clínico, cirurgião, obstetra, ginecologista, fazia de tudo. Há dez anos, tomei um avião em Aracaju com destino a Brasília. Ao fazer uma escala em Salvador, encontrei-me, no aeroporto, com um colega que não via há 29 anos. Abraçamo-nos, ele me contou que um outro colega nosso estava morrendo no Rio de Janeiro - eu havia seguido Medicina e os outros dois, Direito. Tomei nota do endereço e, na semana seguinte, fui ao Rio de Janeiro. Ele morava na Avenida Atlântica, e lembro-me de que o apartamento era o 304. Eu não lhe disse que era Senador, apresentei-me como antigo colega do Colégio Antônio Vieira, na Bahia. Entrei no apartamento e conheci sua senhora e os filhos dele. Disseram-me que o pai estava passando muito mal, e a causa era o tabagismo, pois ele era um fumante inveterado. Finalmente, entramos no quarto. Eu não o via há 29 anos. Ao entrar, deparei-me com ele sentado, encostado a uma parede, cheio de travesseiros. O filho perguntou ao pai: "Meu pai, sabe quem é esse?" O pai não falava. Então, ele disse o meu nome, ao que ele começou a chorar. Abraçamo-nos, e ele pediu papel e lápis. Trouxeram um bloco e ele escreveu: "Lourival, quero veneno ou um revólver." Queria suicidar-se devido a sua doença.

Há cinco anos, eu estava em Nova Iorque num daqueles restaurantes de paredes de vidro, quando passou uma grande personalidade brasileira e me viu. Entrou, sentou-se e perguntou: "Senador, V. Exª está perdido?" Respondi que ia ao Banco do Brasil trocar cheque. Esse homem acendia um cigarro no outro. Pedi ao Ministro que não fumasse, e ele perguntou-me por que entrei nessa campanha. Contei que era devido a esse amigo meu de infância. Disse também que ele não sabia quantas pessoas se suicidam por causa do tabagismo. Ele respondeu que era o caso de seu pai. Ele fumava três, quatro maços de cigarros por dia. Um dia, chamou os três filhos e disse: "Meus filhos, eu já estou respirando com dificuldade e vou me matar." Três dias depois ele deu um tiro no coração. Eu lhe disse então: "E o senhor, que é um homem culto, moço, rico e inteligente, continua fumando?" "Já parei três vezes. Seja lá o que Deus quiser", respondeu-me.

Caro Senador Jacques Silva, estamos nesta campanha há anos e já temos cinco livros publicados com discursos e conferências. Sou Presidente do Grupo Assessor do Ministério da Saúde no Combate ao Tabagismo e continuo nesta luta. Nesta hora, venho aqui felicitar o jornalista baiano que fez este artigo, artigo que muito me sensibilizou - o Sr. Jorge Calmon. O artigo é o depoimento de um sobrevivente do Senado. Eu, então, achei por bem incorporar este artigo ao meu pronunciamento.

Quero dizer, também, a V. Exª que acabei de ler no jornal Folha de S. Paulo que o Prefeito Paulo Maluf assinou uma portaria proibindo fumar em bares e restaurantes, o que achei uma medida acertada. Aliás, quando S. Exª anunciou que iria assinar, fiz um pronunciamento aqui. Hoje, felicito o Prefeito Paulo Maluf por ter assinado essa portaria, pois, com ela, S. Exª está defendendo a saúde da população.

Finalizando, Sr. Presidente, peço a transcrição, com o meu pronunciamento, do artigo a que me referi, de autoria do jornalista Jorge Calmon, intitulado "Depoimento de um sobrevivente do cigarro", e publicado em A Tarde, edição de 30.1.95.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 01/02/1995 - Página 1809