Discurso durante a 23ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

HOMENAGEM DE PESAR PELO FALECIMENTO DO EX-SENADOR NELSON CARNEIRO.

Autor
Bernardo Cabral (S/PARTIDO - Sem Partido/AM)
Nome completo: José Bernardo Cabral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM DE PESAR PELO FALECIMENTO DO EX-SENADOR NELSON CARNEIRO.
Publicação
Publicação no DSF de 08/02/1996 - Página 1404
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, NELSON CARNEIRO, EX SENADOR, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ).

O SR. BERNARDO CABRAL ( -AM. Para encaminhar a votação. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, numa seqüência de oradores que falam sobre determinado assunto, geralmente o que fala depois sempre corre grandes riscos: de ser repetitivo, de não trazer coisas novas e, quem sabe, de acabar cansando quem o ouve depois de ter ouvido o discurso anterior.

No entanto, se não fosse o meu discurso, como amanhã se poderia aferir a beleza das palavras que acaba de proferir o Senador Hugo Napoleão? Se não houvesse um discurso mais fraco, menos denso, como avaliar um que contivesse o seu brilho? Talvez ficasse sozinho no seu registro, sem que alguém pudesse dizer: "Depois que falou o Senador Hugo Napoleão, não precisava mais que outro falasse".

Sr. Presidente, Srs. Senadores, digo isso com muita sinceridade.

Claro que o perfil que V. Exª traçou - assim, a vol d´oiseau, faça-se o registro - conseguiu, na sua concisão, retratar de corpo inteiro quem foi Nelson Carneiro, inclusive lembrando a sua passagem pela Faculdade de Direito de seu Estado, onde concluiu seu curso com brilhantismo, chegando até aqui, à Constituinte. Portanto, não será aí que a comparação vai ser feita. Fujo de lhe traçar o perfil biográfico para não cometer equívocos que V. Exª não fez, mas sinto-me no dever, Sr. Presidente, de dar meu depoimento.

Quando cheguei à Câmara dos Deputados, garoto, na casa dos trinta anos, em 1967, encontrei Nelson Carneiro. Eu o admirava pela sua luta, quando Deputado Federal pela Bahia, a favor da implantação do divórcio, que ele não conseguiu ver vitoriosa àquela altura, porque havia sido derrotado pelo Monsenhor Arruda. Isso lhe custou a reeleição em Salvador. Nelson Carneiro migrou, então, para o Rio, onde conquistou seu mandato.

Em 1967, eu, que já vinha como um admirador de Nelson, comecei a concretizar essa amizade, que foi muito forte e conseguiu vencer o tempo, a distância e o silêncio.

O silêncio se fez quando, em 1968, fui cassado, perdi meu mandato e dez anos de direitos políticos. Migrei, então, para o Rio de Janeiro, não mais convivendo com Nelson, senão depois, quando nos encontramos na Ordem dos Advogados do Brasil, no Instituto dos Advogados Brasileiros, onde ele era altamente respeitado. A diáspora, interrompida, cedeu lugar ao reencontro. A partir daí, no meu escritório de advocacia - e por isso faço o registro -, tive a honra de que ele me desse, num pedido muito fraternal, a sua filha Laura Carneiro para, ainda como estudante, lá estagiar. Depois de ter concluído o curso, ficou advogando como colega de escritório, de onde partiu para uma eleição de vereadora. Hoje, a Laura, a Laurinha, como ele a chamava, é nossa Deputada Federal.

Entre a Ordem dos Advogados e o Instituto, reencontramo-nos novamente na Assembléia Nacional Constituinte.

Este é o depoimento que quero dar.

Muitos dizem que Nelson foi grande na emenda do divórcio, que afinal conseguiu ver aprovada. Eu diria que ele foi maior no Estatuto da Mulher Casada, no Decreto nº 4121, quando conseguiu fazer a reserva da meação da esposa com aqueles bens que o marido dilapidava. Nesse caso, via-se a esposa, de uma hora para outra, nas agruras de quem não tinha como fazer o seu sustento.

Se foi grande na emenda, se foi maior por ocasião do 4121, foi incomparável na Assembléia Nacional Constituinte.

Às vezes, estávamos Ulysses Guimarães e eu, às três horas da manhã, no Prodasen, e lá adentrava Nelson Carneiro para fazer a defesa do que queria, com uma sinceridade ímpar. Talvez alguém pudesse fazer igual a ele, mas não com maior sentimento. S. Exª sempre se sobrepujava.

Como é que eu me poderia silenciar nesta tarde em relação ao requerimento, cuja autoria é do nosso Presidente, o eminente Senador José Sarney? Fiz questão de aderir, deixando meu pronunciamento para depois, Senador Hugo Napoleão, correndo o risco desta comparação: que vissem o brilho de uma lamparina no meu discurso e o sol no discurso de V. Exª. Corro esse risco porque não quero deixar de dizer que Nelson Carneiro, que nasceu na Bahia e depois adquiriu a cidadania do Rio de Janeiro, não pode ser chamado de baiano nem de carioca. Eu diria que ele é um cidadão do mundo e soube, ao final da sua vida, quando não mais lhe era possível ter, ver e sentir o seu mandato renovado, declarar à imprensa nacional: "Eis-me aqui pobre; meu patrimônio é um apartamento de valor reduzido e um carro de segunda mão, cuja venda não dá para pagar o meu caixão".

Esse homem merece o respeito não só desta Casa, merece a alegria daqueles que o viram, que o conheceram e o respeito das Câmaras por onde passou.

Sr. Presidente José Sarney, V. Exª, que conviveu com Nelson Carneiro, preside agora esta sessão em sua homenagem. Quero juntar às palavras do nobre Senador Hugo Napoleão a minha modesta contribuição e levar à família enlutada o sentimento de solidariedade. Praza aos céus que, no meu desempenho nesta Casa ao longo de mais sete anos, eu jamais tenha que ocupar a tribuna outra vez para fazer o registro que ora faço sobre um amigo que me foi muito caro.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/02/1996 - Página 1404