Discurso no Senado Federal

DIFICULDADES FINANCEIRAS DOS ESTADOS PERIFERICOS, FOCALIZADAS NA SESSÃO DE ONTEM PELO SENADOR BERNARDO CABRAL. PREOCUPAÇÃO COM A NOVA POLITICA DE INCENTIVOS FISCAIS, PRETENDENDO INSTITUIR O ICMS DIFERENCIADO. SITUAÇÃO CAOTICA DAS UNIVERSIDADES FEDERAIS, EM PARTICULAR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO.

Autor
Júlio Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Júlio José de Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRIBUTOS. EDUCAÇÃO.:
  • DIFICULDADES FINANCEIRAS DOS ESTADOS PERIFERICOS, FOCALIZADAS NA SESSÃO DE ONTEM PELO SENADOR BERNARDO CABRAL. PREOCUPAÇÃO COM A NOVA POLITICA DE INCENTIVOS FISCAIS, PRETENDENDO INSTITUIR O ICMS DIFERENCIADO. SITUAÇÃO CAOTICA DAS UNIVERSIDADES FEDERAIS, EM PARTICULAR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO.
Aparteantes
Bernardo Cabral, Mauro Miranda.
Publicação
Publicação no DSF de 11/10/1995 - Página 788
Assunto
Outros > TRIBUTOS. EDUCAÇÃO.
Indexação
  • SOLIDARIEDADE, PRONUNCIAMENTO, BERNARDO CABRAL, SENADOR, DEFESA, INTERESSE, REGIÃO AMAZONICA, DIFICULDADE, FINANÇAS, ESTADOS, BRASIL.
  • APREENSÃO, DECISÃO, GOVERNO, ALTERAÇÃO, POLITICA, INCENTIVO FISCAL, REFORMULAÇÃO, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS).
  • ANALISE, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, UNIVERSIDADE FEDERAL, SOLICITAÇÃO, PAULO RENATO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), ATENÇÃO, PROBLEMA, LIBERAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO (UFMT).

O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ocupo a tribuna do Senado na tarde de hoje, para trazer à baila dois importantes assuntos.

Um deles refere-se ao pronunciamento feito na tarde de ontem pelo eminente Senador Bernardo Cabral, que abordou assuntos de interesse da Região Amazônica. Como presidia a sessão, não pude dar a S. Exª o meu aparte e manifestar-lhe a minha solidariedade, como gostaria, quando S. Exª abordou as dificuldades por que passam os Estados periféricos de nosso País. O nosso Estado - Mato Grosso - é também periférico como o são o Amazonas e os Estados nordestinos, assim como o Estado que V. Exª, Sr. Presidente, representa - o Amapá. Por quê? Distante dos centros de decisão política e econômica, esses Estados só têm os incentivos fiscais como únicos atrativos para a fixação, na nossa região, de indústrias, de agroindústrias, de empresas que possam viabilizar a criação de empregos, o desenvolvimento, enfim, o progresso para a nossa população.

E é muito grave, quando se discute a Reforma Tributária, o Governo Federal falar em criar dois ICMs: um de nível federal e outro de nível estadual, ambos submetidos a uma única legislação, centralista, que só pode ser a da União.

Os Estados não poderão mais realizar política econômica ou social por meio do ICM, perdendo sua autodeterminação; só a União poderá fazê-lo. O seu passado não recomenda, e o presente condena. Pretende a simetria nacional de âmbito de ICM, do Rio Grande do Sul ao Amapá. Se o Piauí, o Amazonas ou o Mato Grosso não puderem oferecer isenções de ICM para atrair investimentos, ganharão os Estados centrais, que têm população, transporte, infra-estrutura, tudo bem montado, como é o caso do Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Paraná. Não incluo aí o Rio Grande do Sul, que está um pouco longe do centro de decisão, e cuja grande opção, penso eu, é o sucesso do MERCOSUL.

Um exemplo disso é a instalação de uma fábrica de cinescópio que uma multinacional pretendia implantar na Zona Franca de Manaus. O cinescópio é um dos componentes mais importantes de um televisor, representando cerca de 35% do total de seus componentes e 75% do peso de um aparelho de TV. Essa indústria estava decidida a fixar-se em Manaus, na Zona Franca, que é um centro industrial do País e orgulho de todos nós. Como homem da Amazônia, indiscutivelmente, eu não poderia deixar de reconhecer o grande avanço que a Zona Franca de Manaus levou para toda a nossa região. Para surpresa de todos nós, segundo o pronunciamento de ontem do eminente Senador Bernardo Cabral, a grande imprensa do eixo Rio-São Paulo - em especial os jornais Folha de S.Paulo, Jornal do Brasil e O Globo - noticia, para tristeza nossa, que o consórcio de empresas Philco-CCE-SEMP-TOSHIBA está se preparando para construir uma nova fábrica de cinescópio, mas não no lugar anteriormente anunciado, que seria a cidade de Manaus. Talvez a escolha recaia entre o Rio de Janeiro e o interior de São Paulo, este já tão rico e forte. Atualmente, as prioridades dos industriais são Minas Gerais, São Paulo, Espírito Santo e Rio de Janeiro.

Desta mesma tribuna, apoiamos o gesto simpático e certo da Volkswagen, ao implantar uma fábrica de caminhões no interior do Rio de Janeiro. Mas discordamos, neste momento, Srª Presidente Emilia Fernandes, Srs. Senadores, nesse caso, porque a nossa região, já tão carente, sofre agora essa restrição por parte do Governo Federal, deixando-nos sem a mínima possibilidade de competir. Porque o que faz o empresariado deixar de investir em São Paulo, Rio de Janeiro, onde está próximo aos portos de exportação, às estradas asfaltadas, com energia elétrica suficiente, são os incentivos.

O Sr. Bernardo Cabral - V. Exª me permite um aparte?

O SR. JÚLIO CAMPOS -  Tem V. Exª o aparte.

O Sr. Bernardo Cabral - Nobre Senador Júlio Campos, não tomo a iniciativa de aparteá-lo para agradecer a solidariedade de V. Exª. Isso é absolutamente desnecessário, pois V. Exª, como homem público, como ex-Governador do seu Estado, por certo não teria outra atitude senão esta. V. Exª, portanto, sabe dos problemas que afligem essas regiões periféricas. E V. Exª diz muito bem. A criação de dois ICMs irá destruir a Federação. A destruição ocorrerá exatamente pela base com que V. Exª sustenta o seu discurso. Não há como pensar que o grande industrial, sem os incentivos que lhe poderiam proporcionar um deslocamento do eixo da sua indústria, do seu comércio, vá para o Estado do Mato Grosso, que V. Exª tão bem representa, ou para o meu, que tenho a honra de estar aqui falando em nome daqueles que me conduziram ao Senado. Ora, a interpretação de V. Exª é o segundo alerta. Talvez até com mais propriedade do que aquele que fiz ontem, mas é um alerta oportuno, pois V. Exª fere, no meu ver, no meu sentir, o ponto fundamental, que é a destruição da Federação. Meus aplausos.

O SR. JÚLIO CAMPOS - Muito obrigado. Incorporo, com muita honra, o aparte de V. Exª ao meu pronunciamento.

Essa situação de abandono preocupa-me muito. É muito difícil e muito complicado conseguirmos algum recurso para a nossa região, pois dificilmente temos Ministros. Os últimos Ministros mato-grossenses de que me lembro foram Roberto Campos, na gestão do Presidente Castello Branco, e depois o Ministro Dante de Oliveira, Ministro da Reforma Agrária. Também é muito difícil termos presidentes nas grandes empresas. Dificilmente, portanto, as Regiões Amazônica e Centro-Oeste têm possibilidade de participar do Governo Federal.

Se não temos como decidir aqui em Brasília, e a nossa força política já é pequena em termos de representação na Câmara dos Deputados, que hoje comanda a política do País muito mais fortemente do que o Senado, a única oportunidade que essas Regiões têm de se desenvolver é através da política de incentivos fiscais. Se o Governo acabar com a possibilidade de termos um pouco de apoio, para que os empresários acreditem em nossa região, o que vai nos restar? Talvez seja preferível o Brasil rediscutir a nossa Federação.

O Sr. Mauro Miranda - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Júlio Campos?

O SR. JÚLIO CAMPOS - Pois não, nobre Senador Mauro Miranda.

O Sr. Mauro Miranda - Ouço com atenção o pronunciamento de V. Exª, que nos atinge diretamente, nós das Regiões periféricas, o Norte, o Nordeste e o Centro-Oeste. Estamos sempre sendo colocados de lado. Nossa força está na nossa união. Quando da elaboração da Constituição de 1988, fizemos aqui um movimento brilhante e maravilhoso que quebrou a hegemonia do Sul e do Sudeste contra o desenvolvimento de nossas Regiões. Acho que está na hora também, nessa Reforma Tributária - e de nossa parte já fizemos reuniões com todo o empresariado, o novo empresariado de Goiás e da Região Centro-Oeste -, de preparar nossas emendas. Tenho certeza de que os interesses da Amazônia e do Nordeste são os mesmos, porque nossos problemas são os mesmos. Isso se dá não só com os interesses econômicos, mas também com os interesses culturais. Vejo um preconceito enorme contra nossas universidades. Basta ouvir os discursos do Ministro da Educação contra nossas universidades do nosso interior, que se mantêm a duras penas. Mas por que esse preconceito contra regiões que querem se desenvolver num momento tão difícil? Hoje dei entrada, nesta Casa, a um requerimento solicitando ao Ministro da Educação a discriminação, Estado por Estado, dos recursos destinados às nossas universidades. Pode ter certeza, Senador Júlio Campos, que a Universidade do Mato Grosso também está sendo discriminada. É hora de esta Casa, que representa os Estados brasileiros, tomar uma posição firme. Precisamos nos unir. Outro dia, nesta Casa, o Senador Edison Lobão, do Maranhão, fazia esse alerta, endossado pelo Senador Antonio Carlos Magalhães. É hora de nós, do Nordeste, Centro-Oeste e Norte, repetirmos a união que tivemos na Reforma Constitucional. Ao Centro-Sul e aos tecnocratas não interessa o crescimento harmônico do País, mas apenas o massacre dos Estados periféricos! Muito obrigado.

O SR. JÚLIO CAMPOS - Preocupa-me muito, Senador Mauro Miranda, a desigualdade social hoje existente neste País. O homem de São Paulo, do Rio, do Espírito Santo, de Minas ou do Paraná são muito diferentes de nós, da Região Amazônica e da Região Centro-Oeste, em termos de qualidade de vida, de saneamento, de saúde, de educação.

Já começa a florescer em nossa região o sentimento de divisão. Por que não rediscutir a Federação?

Recentemente, estive visitando a região da Galícia, na Espanha, representando o Senado Federal. Lá, tomei conhecimento do modelo político-administrativo - que, talvez, continuando a discriminação, a desigualdade, teremos que implantar aqui no Brasil. Em Madri, capital da espanha, estão Sua Majestade, o Rei Juan Carlos, e o Primeiro-Ministro com o Ministério Federal. Há várias regiões administrativas autônomas. A própria Galícia é uma região autônoma, com orçamento próprio, e tem um Presidente, o Sr. Manoel Fraga Iribarne, homem altamente preparado. O Presidente tem o poder de construir e administrar a sua região.

A Galícia abrange uma área de aproximadamente 40.000km². Por volta de vinte províncias compõem a sua região; são mais de 300 cidades que têm os seus Prefeitos eleitos, os seus Governadores. Há os Parlamentos estaduais. A Galícia tem a sua autonomia administrativa.

Aqui, no Brasil, se continuar esse tipo de administração centralizada - tudo está voltado para o Centro-Sul e nada para o Centro-Norte, para o Centro-Oeste e, talvez, para o extremo-Sul brasileiro -, teremos que repensar essa situação, que não pode perpetuar.

Ainda hoje, almocei com um empresário do Rio Grande do Norte, proprietário de uma usina de álcool. Talvez seja obrigado a mudar a sua usina para outra região. Ele me dizia sobre o sentimento que tem hoje o Nordeste, devido à discriminação que o homem e o empresário nordestinos sofrem constantemente junto aos órgãos de decisão daqui de Brasília e de decisão empresarial do Centro-Sul do País.

Realmente, temos que repensar o Brasil. Por que o Senado Federal não realiza um seminário sobre o tema "Repensar o Brasil"? Está no momento de repensar este País. Temos que nos unir, Senador Mauro Miranda. E já começamos um movimento nesse sentido, tanto é que já fizemos um seminário sobre o Centro-Oeste, com a participação de Governadores do Norte, visando à participação do Governo Fernando Henrique em termos de desenvolvimento. Necessitamos de estradas, de energia, de ferrovia, de navegação fluvial, de saneamento básico, do apoio do Governo Federal às nossas universidades.

Toda vez em que se fala em política universitária, as universidades são discriminadas. Ainda hoje, o próprio Jornal de Mato Grosso anuncia que a nossa universidade poderá fechar porque está com déficit. Ela necessita de R$7 milhões para a sua despesa mínima de funcionamento até o final do ano e só tem R$1,5 milhão. Não tem autonomia sequer para fazer convênios para captar recursos próprios. É tanta a centralização que tudo depende de Brasília.

Nessa oportunidade, quero alertar que o pronunciamento que o Senador Bernardo Cabral fez com relação à Zona Franca de Manaus, temos que fazer com relação às Regiões Amazônica e Centro-Oeste, que vivem discriminadas. Os recursos destinados a Mato Grosso no Orçamento de 1996 são ridículos. De um orçamento de US$300 bilhões de dólares - não sei quanto é o nosso Orçamento, alguns bilhões não sei do quê -, R$34 milhões é o que estão destinados para todas as obras de que Mato Grosso precisa. É um Estado que produz 7.500.000 toneladas de grãos, ou seja, é o terceiro maior produtor de alimentos deste País. Possui de 10 a 12 milhões de cabeças de gado e fornece carne. Vivemos do produto primário.

Mato Grosso é o Estado que tem a maior produção de ouro do País. No entanto, pagamos o nosso imposto, trabalhamos, somos brasileiros, enfrentamos nossos vizinhos bolivianos e paraguaios, permanentemente, defendendo as cores verde e amarela do Brasil, e do outro lado da fronteira a qualidade de vida, o progresso e o desenvolvimento são mais harmônicos.

Queremos chamar a atenção do Governo Federal, da sua equipe, do Ministro José Serra, do Planejamento, que está planejando o Brasil do próximo século, para o fato de que a nossa região não pode continuar do jeito que está: abandonada, sofrida, sem recurso nenhum, com pouca simpatia por parte da equipe governamental.

A continuar dessa forma, será melhor repensar o Brasil, o federalismo brasileiro, criando regiões administrativas com mais autonomia, como por exemplo Regiões Administrativas do Centro Oeste, da Amazônia, do Nordeste, do Sul, do Centro-Leste, e assim por diante. Talvez com um Governo Central aqui em Brasília, mas sem muita influência administrativa, para que possamos tentar prosperar. Já que, juntos, não temos tido apoio para o nosso desenvolvimento, poderemos até pensar na hipótese de um novo federalismo em nosso País.

Quero também abordar, neste instante, para finalizar o meu pronunciamento, a situação difícil em que vivem as universidades brasileiras. De norte a sul, de leste a oeste, em especial na nossa região, elas estão à beira da falência.

O Governo Federal anuncia que tem superávit todo mês, que está arrecadando bem, que a prioridade é a educação. No entanto, as transferências para as universidades do País estão em estado de miserabilidade. A própria Universidade de Brasília, a UnB, que era tida como modelo e símbolo do ensino superior no País, vive momentos difíceis, está quase fechando as suas portas por não ter condições de pagar os seus fornecedores, por não ter como pagar aqueles que cuidam da sua manutenção.

Nesta oportunidade, em nome da Bancada de Mato Grosso, quero fazer um apelo ao Ministro da Educação, Prof. Paulo Renato, no sentido de que se sensibilize com o problema das universidades, liberando os recursos necessários para a nossa UFMT, por exemplo, não fechar as suas portas agora, antes do final do ano. Ela está devendo água, telefone, luz, xerox, à EMBRATEL, fax, além das empresas de segurança e de limpeza, como também ticket alimentação. Temos recursos de R$1,5 milhão para vivermos até dezembro, quando precisamos de pelo menos R$7 milhões para chegarmos com vida até o final do ano.

Neste instante, apelo para que o Ministro Paulo Renato, que já foi Reitor de uma Universidade, embora rica - a UNICAMP - Universidade de Campinas - volte os seus olhos para as nossas universidades federais, principalmente as dos Estados periféricos, que hoje estão vivendo momentos de tristeza pela falta de recursos para o seu funcionamento.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/10/1995 - Página 788