Discurso no Senado Federal

PONDERAÇÃO SOBRE O DISCURSO DE HOJE DO SENADOR PEDRO SIMON. SITUAÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PAIS. MUNICIPALIZAÇÃO DO ENSINO FUNDAMENTAL COMO RECUPERAÇÃO DO ENSINO NO PAIS.

Autor
Mauro Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Mauro Miranda Soares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REGIMENTO INTERNO. EDUCAÇÃO.:
  • PONDERAÇÃO SOBRE O DISCURSO DE HOJE DO SENADOR PEDRO SIMON. SITUAÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PAIS. MUNICIPALIZAÇÃO DO ENSINO FUNDAMENTAL COMO RECUPERAÇÃO DO ENSINO NO PAIS.
Publicação
Publicação no DSF de 05/06/1996 - Página 9421
Assunto
Outros > REGIMENTO INTERNO. EDUCAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, POSIÇÃO, PEDRO SIMON, SENADOR, REFERENCIA, ALTERAÇÃO, ORDEM DO DIA, SENADO.
  • RECONHECIMENTO, PROBLEMA, EDUCAÇÃO, ORIGEM, CARENCIA, CRISE, BRASIL, NECESSIDADE, REFORMULAÇÃO, SETOR, PREPARAÇÃO, PAIS, INSERÇÃO, PROCESSO, GLOBALIZAÇÃO, ECONOMIA.
  • APOIO, EMENDA CONSTITUCIONAL, ORIGEM, EXECUTIVO, CRIAÇÃO, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO, ENSINO FUNDAMENTAL, VALORIZAÇÃO, MAGISTERIO, DEFESA, DESCENTRALIZAÇÃO, SETOR, EDUCAÇÃO, AUTONOMIA, MUNICIPIOS.

O SR. MAURO MIRANDA (PMDB-GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ouvi atentamente o pronunciamento do Senador Pedro Simon, que reconheço como uma das lideranças mais fortes desta Casa e por que não dizer do País. Vejo nele o anarquista utópico: anarquista no sentido da movimentação das idéias e utópico no sentido de buscar sempre a perfeição das coisas. Entretanto, creio que S. Exª foi extremamente severo com o Senado quando analisou as votações de hoje.

Nesse ponto, eu gostaria, como Senador praticamente iniciante, de fazer algumas ponderações sobre o que eu percebo nesta Casa. Há pouco o que se discutir nesta Casa, como, num determinado trecho de seu discurso, enfatizou o Senador Pedro Simon. No entanto, bastou o pronunciamento do Senador Bernardo Cabral, alertando sobre denúncia do economista Rudiger Dornbusch sobre o Plano Real, para que esta Casa tivesse o posicionamento que teve hoje.

Ontem, por exemplo, estávamos seis Senadores em Goiânia lutando por um plano concreto de melhoria do nosso corredor de exportação Centro-Leste, ligando Goiás e todo o Centro-Oeste ao Porto de Tubarão. Era uma tentativa de viabilizar uma via importantíssima, vital para o nosso desenvolvimento, para o crescimento da produção de milho e de soja.

Eu, como grande admirador e irmão do Senador Pedro Simon, como membro do Partido do qual S. Exª foi Líder por muito tempo, vejo no nobre Senador o grande anarquista, no sentido maior dessa palavra, e o grande utópico desta Casa.

É bom que S. Exª se pronuncie sempre que achar que devemos melhorar, mas creio que foi extremamente severo nas críticas, quando analisou especificamente as votações de hoje.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, o vasto universo das carências brasileiras tem o tamanho das nossas angústias. Já não sabemos o que é prioritário diante de tantas crises e de tantos desafios. A sorte é que o Brasil é grande demais para ter medo do futuro e, embora aos trancos e barrancos, encontraremos as soluções reclamadas para as futuras gerações. Saúde - haja vista o discurso da Senadora Benedita da Silva denunciando a tragédia ocorrida na Casa de Saúde Santa Genoveva - segurança, moradia, saneamento, reforma agrária, emprego, previdência e renda mínima familiar são questões que afligem mais de perto o dia-a-dia dos brasileiros, mas é irrefutável o fato de que a Educação é a grande questão de fundo que está na origem de todas as nossas mazelas.

No curto, no médio e no longo prazo, a Educação é a grande matriz de todas as nossas prioridades. E é preciso reconhecer que, apesar da justa indignação dos professores com seus míseros salários, esse é um dos poucos setores sociais em que o Governo tem procurado dar algumas respostas objetivas.

A Educação tem que passar por uma ampla, completa, abrangente e corajosa reforma, com o alcance e a importância que o Governo tentou imprimir quando encaminhou ao Congresso as reformas do Estado e da Previdência. Discutem-se muito a globalização, a estabilização da moeda, os avanços tecnológicos com seus rastros de desemprego, a necessidade de eficiência e as transformações estruturais que vão avançar sobre a instabilidade da mão-de-obra não qualificada. Todo esse debate é oportuno e positivo, porque a organização dos sistemas produtivos mundiais passa por transformações de velocidade espantosa, e o Brasil não pode ficar à deriva, sob pena de perder o comboio da História. Ou nos preparamos para competir, ou sucumbimos. Essa é a lei mais eloqüente e mais realista deste final de século.

Com essa preocupação, venho hoje à tribuna para registrar meu apoio à Proposta de Emenda Constitucional nº 233, de 1995 (originária do Executivo), que impõe algumas modificações importantes para o ensino médio e fundamental. Já em fase de substitutivo, a matéria tramita atualmente na Câmara, mas em breve deverá chegar a esta Casa, onde seu aperfeiçoamento passará pelo crivo de grandes nomes ligados à Educação, como os ex-Ministros Darcy Ribeiro e Hugo Napoleão, além de educadores como os Senadores Ney Suassuna e Lauro Campos.

Pessoalmente, tenho sido intransigente na tese de que o ensino médio e fundamental tem que ser municipalizado, para tornar-se eficiente pela supressão dos escaninhos burocráticos intermediários que facilitam a corrupção. Acho que essa será a grande conquista do projeto de emenda constitucional que teremos de aprovar em breve. A proposta cria um Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério, e é por essa via que vamos sair do campo imaginário da metafísica para entrarmos no terreno palpável das ações concretas.

O Fundo vai buscar dois objetivos essenciais na conquista de qualidade do ensino básico. O primeiro é maior eqüidade na distribuição de recursos para a Educação entre municípios pobres e ricos e entre municípios localizados em Estados pobres e em Estados ricos. O segundo é a recuperação e a complementação dos salários dos professores de primeiro e de segundo grau da rede pública de ensino. Aí está, Srs. Senadores, o efeito mágico que é absolutamente previsível na recuperação da qualidade do ensino no País. A remuneração humilhante que vem sendo imposta aos professores é razão direta da queda vertical dos padrões educacionais do País. Os meios de comunicação têm mostrado o quadro de penúria dos mestres do interior, com salários que, em centenas de municípios, chegam ao nível irrisório de R$10,00 por mês.

Graças ao Fundo, a União vai retomar, por um período experimental de 10 anos, o seu papel de mero agente distribuidor dos recursos, com responsabilidades diretas delegadas aos Estados. A distribuição entre as redes estaduais e municipais do ensino público fundamental obedecerá a critérios ligados ao número de alunos matriculados, estabelecendo-se um valor mínimo nacional de gasto por aluno. Nos casos em que haja desencontro entre os valores nacionais e as realidades de cada Estado, a União será obrigada a completar as parcelas, utilizando o dinheiro da vinculação constitucional, de 18%, ou as fontes do FNDE. Outro ponto igualmente importante é a destinação obrigatória de 60% para o pagamento de professores.

Além da atribuição prioritária do ensino fundamental e médio aos Estados e ao Distrito Federal, há outros pontos importantes que pretendo analisar em ocasiões futuras. No momento, considero oportuno destacar a vocação realista e modernizadora da proposta, no caminho de uma Educação mais democrática, menos restritiva e de fato realista. Busco, com as minhas palavras, contribuir para a criação de um ambiente favorável nesta Casa a essas mudanças no ensino fundamental e médio de nosso país. Adaptar a educação básica para dar-lhe eficiência e qualidade é abrir os caminhos do cidadão para as aspirações mais legítimas de afirmação pessoal e de acesso facilitado ao ensino superior.

O quadro de hoje é triste e preocupante, porque o ensino básico chegou a níveis críticos de qualidade. Discutindo e melhorando a proposta do Governo, estaremos revertendo um quadro sombrio e impedindo a multiplicação de nossas tragédias sociais no futuro próximo. Se nada mudar, em breve teremos taxas ainda mais altas de desemprego, geradas pelo uso de tecnologias avançadas de produção que marginalizam a mão-de-obra desqualificada. A competição estabelecida por uma economia mundial cada vez mais globalizada obriga o Brasil a adaptar-se rapidamente pela única via segura, sustentável e permanente, que é a educação. Com seus elevados padrões de riqueza e seus preocupantes índices de desemprego, a Espanha é um exemplo em que o Brasil deve mirar-se. Naquele país, onde existe hoje uma estatística de 20% da população economicamente ativa desempregada, o fenômeno ocorre porque a força de trabalho não é suficientemente qualificada.

Temos indicadores dramáticos que mostram a necessidade de mudanças imediatas na educação. No confronto com outros países da América Latina e do Caribe, o Brasil tem a sexta taxa mais elevada de analfabetismo na população acima de 14 anos. Neste mesmo universo de comparação, somos vice-campeões de repetência no ensino fundamental, sendo superados apenas pelo Suriname. Nas taxas de matrícula no ensino médio, ostentamos a sofrível posição de quinto lugar negativo. É imperativo sacudir este País e receber com entusiasmo qualquer posposta que seja capaz de mudar esta realidade constrangedora. O ensino médio e fundamental é o nosso calcanhar-de-Aquiles na esperança legítima de decolagem para posições privilegiadas neste Planeta, que passa por evoluções irreversíveis.

É com esta convicção que me dirijo aos nobres colegas, esperando que em cada um se instale o espírito de que a educação é a nossa causa número um e a mais nobre de nossas prioridades, e que as próximas decisões da Casa procurem refletir essa verdade.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/06/1996 - Página 9421