Discurso no Senado Federal

COMENTARIOS ACERCA DE INICIATIVAS DO GOVERNO FEDERAL, PRINCIPALMENTE DO INCENTIVO A AGRICULTURA, DO ESTIMULO AS EXPORTAÇÕES E DA PROTEÇÃO TARIFARIA CONCEDIDA A ALGUNS SETORES INDUSTRIAIS EM DIFICULDADES.

Autor
Edison Lobão (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Edison Lobão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • COMENTARIOS ACERCA DE INICIATIVAS DO GOVERNO FEDERAL, PRINCIPALMENTE DO INCENTIVO A AGRICULTURA, DO ESTIMULO AS EXPORTAÇÕES E DA PROTEÇÃO TARIFARIA CONCEDIDA A ALGUNS SETORES INDUSTRIAIS EM DIFICULDADES.
Publicação
Publicação no DSF de 14/08/1996 - Página 13933
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • ANALISE, CONJUNTURA ECONOMICA, REFERENCIA, NECESSIDADE, RETOMADA, CRESCIMENTO ECONOMICO, BRASIL.
  • ELOGIO, INICIATIVA, GOVERNO, INCENTIVO, AGRICULTURA, APOIO, EXPORTAÇÃO, PROTEÇÃO, TARIFA ADUANEIRA, INDUSTRIA NACIONAL, ATENÇÃO, IMPASSE, RESTRIÇÃO, VALORIZAÇÃO, CAMBIO, SUPERIORIDADE, TAXAS, JUROS, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO.
  • DEFESA, REDUÇÃO, GASTOS PUBLICOS, UNIÃO FEDERAL, ESTADOS, MUNICIPIOS, OBJETIVO, AUMENTO, POUPANÇA, GOVERNO, NECESSIDADE, APOIO, LEGISLATIVO, REFORMA CONSTITUCIONAL.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL-MA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, razoavelmente concluído o processo de estabilização da moeda nacional, as atenções da sociedade têm-se voltado, agora, para a recuperação do crescimento da economia brasileira. Nada mais natural essa aspiração por crescimento e prosperidade, pois a vitória sobre a inflação não é um fim em si mesmo, mas apenas um pressuposto, um importantíssimo pressuposto para que o desenvolvimento nacional possa evoluir de forma contínua, sustentada e sem sobressaltos. Quando a "década perdida" de 1980 nos lembra um período em que nossa renda per capita manteve-se constante e estagnada, mais aguda se torna nossa ansiedade por ver o Brasil retomar o caminho do crescimento econômico.

Por isso, preocupa-me sobremaneira a conjuntura macroeconômica pela qual estamos passando, que, longe de proporcionar o impulso necessário à expansão de nossa produção, antes convida a uma certa reflexão sobre as causas que nos levam a combinar política monetária restritiva com política fiscal expansionista e taxa de câmbio com alguma sobrevalorização.

Quero tecer breve comentário a respeito do cenário macroeconômico ao final desta exposição. Por ora, gostaria de me debruçar sobre algumas iniciativas tomadas pelo Governo que muito podem contribuir para a retomada da capacidade de crescimento do País. São elas: o incentivo à agricultura; o estímulo às exportações; e a proteção tarifária concedida a certos ramos da indústria em dificuldades.

Sr. Presidente, talvez a agricultura tenha sido o setor produtivo mais prejudicado na oportunidade do lançamento do Plano Real. Naquela ocasião, reduziram-se os recursos do crédito rural, intensificou-se a queda das alíquotas de importação de produtos primários, ao mesmo tempo em que se manteve a mesma estrutura de tributação da agricultura. É claro que a concorrência acirrada dos alimentos importados, muito baratos, produziu o efeito de deprimir o preço desses bens no mercado interno, -- o que, a despeito de conseqüências negativas no médio prazo, como diminuição da área plantada, proporcionou à população brasileira aumento do poder aquisitivo. Tal foi a importância dos alimentos baratos e da sustentação do preço da cesta básica para o lançamento do plano de estabilização, que se falou, na época, que o verdadeiro lastro da nova moeda não era a "âncora cambial", mas sim a "âncora verde".

O Governo vem agora resgatar parte dessa dívida com os agricultores e reconhecer-lhes os sacrifícios por meio de uma maior atenção voltada ao campo produtor de alimentos. Não menos relevante é o desejo de que a área cultivada no Brasil volte a crescer.

Com o propósito de recuperar a agricultura, anunciou-se recentemente o Plano Safra, no qual estão insertas três medidas que melhoram as condições do crédito rural. Em primeiro lugar, aumentou-se o volume de recursos para o crédito rural, atingindo-se a quantia nada desprezível de 5,1 bilhões de reais para custeio. Em segundo lugar, reduziram-se os juros a serem pagos pelos agricultores, de 16% para 12% ao ano. Em terceiro lugar, reajustaram-se os preços mínimos para cima, num montante de 9 a 10%.

Outro fator que pode, à primeira vista, parecer de menor importância, mas que, ao inverso, principalmente no Brasil, é da maior relevância e merece ser destacado, refere-se ao fato de que as condições de financiamento da próxima safra foram anunciadas com bastante antecedência. Ora, isso no Brasil é bem raro e demonstra a organização administrativa do atual Governo, num país em que já aconteceu de planos de safra serem definidos quando a plantação já havia sido colhida. Espero que, para os anos vindouros, esse fato se repita, pois o agricultor merece todo nosso respeito e, é óbvio, somente pode decidir, com mais proveito, o que plantar e quanto plantar e o que não plantar, quando está de posse de todas as informações relevantes sobre o crédito rural antes da época de deitar as sementes ao solo.

Quanto às exportações e aos estímulos para sua expansão, não resta dúvida de que esse tema é fundamental na presente conjuntura, em que se temem abalos ao plano de estabilização, por conta de um quadro externo que se pode mostrar insustentável no médio prazo.

Três aspectos são fundamentais para a impulsão das exportações brasileiras: a melhoria da infra-estrutura, a redução dos impostos e a oferta de financiamentos em montantes e condições adequadas. Um quarto fator, e de máxima relevância, seria alguma desvalorização adicional do real frente ao dólar, mas, como esse caminho está por hora descartado, em função da manutenção da estabilidade monetária, deixarei de considerá-lo como opção de curto-prazo.

Consciente do esgotamento da capacidade da União em fazer frente, sozinha, aos pesados investimentos necessários em infra-estrutura, o Governo tem buscado atacar essa questão por meio da reorientação de seu papel como provedor de infra-estrutura. De acordo com um ideário mais moderno de organização econômico-institucional, o Estado tem deixado maior espaço de atuação ao setor privado, enquanto se coloca numa posição mais de regulador e controlador em relação ao mercado. Assim, têm-se incentivado as concessões de serviço público a empresas privadas e muito se tem avançado no processo de privatização. Espera-se, com tais medidas, que melhore, em curto prazo, a qualidade das vias de transporte, do fornecimento de energia elétrica e do serviço portuário, entre outras áreas que contribuem para a perda de competitividade da produção brasileira.

Em relação aos impostos, impõe-se o tema da desoneração das exportações. Não é preciso repetir a sentença tantas vezes ouvida de que, num mercado internacional altamente competitivo, em que todo os países isentam de tributos suas exportações e, em alguns casos, chegam até mesmo a conceder subsídios, não passa de redobrada burrice o Brasil pretender "exportar impostos". Enquanto nossos concorrentes estão "dando uma mãozinha" a suas exportações, para barateá-las, nós, em movimento contrário, estamos encarecendo as nossas por meio da cobrança de impostos. Assim, ou o Brasil está certo e o resto do mundo está errado, ou acontece justamente o oposto, o que é mais provável.

O projeto do Governo de reforma tributária, relatado pelo Deputado Mussa Demes, prevê o fim da cobrança de impostos indiretos sobre as exportações. De forma a agilizar a desoneração das exportações, também está tramitando no Congresso um projeto de lei do Deputado e hoje Ministro Antônio Kandir que suspende a cobrança do ICMS sobre as exportações de produtos semi-elaborados, igualando o tratamento de isenção que já existe para as exportações de produtos industrializados. Seria ótima idéia a aprovação do projeto do Ministro Antônio Kandir, enquanto se aguarda os desdobramentos, necessariamente mais morosos, de tramitação da Emenda Constitucional que trata da reforma tributária.

O financiamento consiste, atualmente, no calcanhar-de -aquiles do setor exportador brasileiro. Muitas vezes, com qualidade superior e preços mais baixos, os produtos nacionais perdem a concorrência com similares estrangeiros nos mercados além-fronteira, porque não conseguem oferecer ao comprador condições de financiamento tão vantajosas quanto as de seus concorrentes. Nesse ponto, não há saída: o Estado brasileiro, a exemplo da atuação das nações desenvolvidas, tem de prover seus exportadores com uma agência bancária capitalizada que possa cumprir a função de financiar os importadores de produtos brasileiros.

O Ministro Antônio Kandir tem estado atento para essa necessidade e parece querer fazer do BNDES essa agência que tanta falta faz para nosso comércio exterior. Coerente com essa linha de atuação, o Ministério do Planejamento anunciou um aumento de 255% nos recursos orçamentários destinados ao Programa de Financiamento às Exportações (PROEX), gerido pelo BNDES, que passarão dos atuais 52 milhões para 185 milhões de reais. Além disso, ampliou-se a linha de produtos a serem contemplados com financiamento do PROEX, com a inclusão de bens de consumo à antiga lista onde somente figuravam bens de capital.

Por fim, abordarei, com brevidade, os aumentos de alíquotas do imposto de importação decididos pelo Governo, com o objetivo de proteger, temporariamente, o setor de brinquedos frente à concorrência desleal e predatória imposta por outros países. Comenta-se que os próximos candidatos à proteção tarifária são os setores produtores de papel e celulose, de têxteis, de vinhos, de arroz, de pêssego, de gipsita e gesso, de óxido de titânio, de corantes e de acessórios de bicicleta, também prejudicados pela competição desigual.

Deve ser observado que a proteção tarifária, -- a exemplo das medidas já comentadas de incentivo à agricultura e de estímulo às exportações, -- significa um impulso adicional ao crescimento do PIB, no sentido de que cria condições melhores para a expansão de setores produtivos nacionais.

Destaque-se que não se trata de um retorno à pura opção pela política protecionista, mas tão somente de posição defensiva de curto-prazo, que permita a reestruturação tecnológica desses setores para fazer frente à competição internacional.

Certamente não se pode assistir de braços cruzados ao desmoronamento de setores inteiros da economia nacional que não têm tido êxito, por si sós, em fazer frente à concorrência dos produtos estrangeiros, no novo cenário marcado pela abertura comercial. Nunca é demais repetir que a hostilidade do ambiente para muitas empresas brasileiras não decorre apenas dessa abertura, mas também de um cenário em que temos os custos financeiros mais altos do mundo, uma taxa de câmbio sobrevalorizada, uma infra-estrutura depreciada e relações institucionais, tributárias e trabalhistas arcaicas, que revertem em custos altos de produção e prejudicam nossa competitividade.

Mas não podemos esquecer, por outro lado, que alguns dos países que hoje concorrem com o Brasil vendendo seus produtos a preços extremamente baixos, na verdade só conseguem tal proeza à custa de grandes sacrifícios às suas populações, com baixos salários e pouca ou nenhuma proteção trabalhista, levando ao que se convencionou chamar de "dumping social" nas operações com exterior.

Nesse contexto, embora não seja o ideal, justifica-se algum recuo temporário no nível de abertura externa para algumas indústrias, desde que vigente por pouco tempo e amarrado a um programa de reestruturação. Outra maneira de ajudar indústrias em dificuldades, talvez mais adequada do que a proteção tarifária, é o financiamento estatal de médio e de longo prazos para programas de reestruturação, a exemplo do que o BNDES vem fazendo. Porém, francamente, penso que a elevação das alíquotas de importação de brinquedos de 20 para 70% foi excessiva. Que houvesse um aumento progressivo das alíquotas por períodos curtos, digamos, de um ano, enquanto a indústria promove uma reestruturação, talvez fosse mais condizente com ritmo da modernização da economia brasileira.

Porém, não esqueçamos de dois pontos. Primeiro, a estabilização da moeda tem como um dos seus pilares a abertura comercial, a maneira eficiente de se contrapor ao poder dos monopólios e dos oligopólios brasileiros, responsáveis, em grande parte, pelo malogro de vários planos de estabilização anteriores. Segundo, o aumento do poder aquisitivo da população não se realiza somente por meio do aumento de salários, mas também pela queda de preço dos produtos que consome. Sem sombra de dúvida, a abertura comercial brasileira tem ajudado sobremaneira a contenção do custo de vida e, portanto, o aumento do padrão de vida da população. Logo, -- esta é a conclusão a se tirar, -- a abertura comercial é uma política progressista e deve ser defendida.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, passamos por uma conjuntura muito difícil para o crescimento econômico. Iniciativas como as recentemente tomadas pelo Governo podem vir a auxiliar bastante na retomada do crescimento; porém um crescimento maior e sustentado ainda esbarra em restrições macroeconômicas.

Na verdade, estamos encerrados numa espécie de armadilha que temos de desmontar para voltarmos a crescer. Pode-se partir do câmbio sobrevalorizado para proceder à desmontagem dessa armadilha.

Pois bem, o câmbio firme e quase inalterado tem representado a "âncora" do plano de estabilização. Proceder a uma desvalorização acentuada do real, no contexto da atual indisciplina fiscal do Setor Público, seria temerário, pois abriria espaço para o aumento dos preços dos bens nacionais que hoje concorrem com os produtos importados, fomentando o aumento da inflação. Para manter o fluxo de capitais estrangeiros para o Brasil os juros nominais teriam que subir, de forma a dar a mesma remuneração real aos investidores externos. Não podemos esquecer que o elevado déficit no Balanço em Conta Corrente em nossas operações com o exterior depende do ingresso desses capitais para o seu financiamento.

Ora, a atual situação de nossas contas externas e de finanças públicas impõe uma restrição muito clara ao crescimento porque, se a economia cresce, mantido o câmbio sobrevalorizado, aumentam também as importações, o que piora o saldo comercial e, conseqüência, o Balanço em Conta Corrente. Para evitar isso, é necessário manter elevadas as taxas de juros, que, não é preciso lembrar, desestimulam os investimentos e inibem o crescimento da economia.

A maneira de começar a desmontar a armadilha, que acaba por desfavorecer o crescimento, é proceder ao aumento da poupança do Governo. Como os próprios técnicos do Governo já admitem, o aumento da arrecadação de impostos chegou ao seu limite. Portanto, o caminho é o corte e racionalização de gastos em seus três níveis de governo -- a União, Estados e Municípios. Caso a política fiscal deixe de ser expansionista, como atualmente, isto levaria a um crescimento da poupança interna e diminuição da dependência por poupança externa, refletindo em menores taxas de juros e em estímulo ao crescimento. Adicionalmente, o controle das contas públicas teria efeito benéfico sobre as expectativas inflacionárias dos agentes econômicos, abrindo espaço para uma desvalorização mais rápida do câmbio, sem maiores conseqüências em termos de repercussão sobre o nível de preços.

O fato -- Srªs e Srs. Senadores --, é que a par de muitas despesas do Governo que são incomprimíveis, temos um serviço da dívida interna extremamente pesado, causado, tanto pela velocidade do giro dos títulos públicos, como pelo seu montante, fato que acaba se agravando pelas recentes medidas na área financeira, representadas pelos empréstimos do PROER, algo em torno de quatorze bilhões de reais, e o socorro de oito bilhões de reais ao Banco do Brasil.

Tais medidas, porém, são inevitáveis, pois, nas suas ausências, a quebradeira de instituições financeiras que se seguiria certamente levaria, como aconteceu em outros países, a uma acentuada queda no PIB, resultando em um custo social muito maior. Por essa razão, embora os gastos com juros tenham tendência decrescente, de vez que as taxas de juros vêm sendo paulatinamente diminuídas pelo Governo, é preciso uma maior parcimônia na política de gastos, para compensar o custo daqueles programas.

Nesse sentido são fundamentais o apoio parlamentar à aprovação das reformas previdenciária e administrativa, pois somente através delas é que o Estado poderá equilibrar suas finanças de forma definitiva e sustentada.

Por fim, gostaria de reafirmar minha crença na coragem do Governo em enfrentar questões tão graves, que há muito estão na agenda nacional, bem como confio na responsabilidade do Congresso Nacional em encaminhá-las a um bom destino.

Era o que tinha a dizer.

Muito Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/08/1996 - Página 13933