Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES ACERCA DA DEFINIÇÃO DAS PRIORIDADES DA SOCIEDADE BRASILEIRA NO ORÇAMENTO DA UNIÃO PARA 1997 E SOBRE A EXECUÇÃO DO ORÇAMENTO DESTE ANO.

Autor
Coutinho Jorge (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PA)
Nome completo: Fernando Coutinho Jorge
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ORÇAMENTO.:
  • CONSIDERAÇÕES ACERCA DA DEFINIÇÃO DAS PRIORIDADES DA SOCIEDADE BRASILEIRA NO ORÇAMENTO DA UNIÃO PARA 1997 E SOBRE A EXECUÇÃO DO ORÇAMENTO DESTE ANO.
Publicação
Publicação no DSF de 13/11/1996 - Página 18354
Assunto
Outros > ORÇAMENTO.
Indexação
  • ANALISE, APERFEIÇOAMENTO, CONGRESSO NACIONAL, PROCESSO, APROVAÇÃO, ORÇAMENTO, REDUÇÃO, CORRUPÇÃO, PARTICIPAÇÃO, SOCIEDADE, MELHORIA, METODOLOGIA, ESPECIFICAÇÃO, EMENDA COLETIVA.
  • CRITICA, GOVERNO, EXECUÇÃO, ORÇAMENTO, CANCELAMENTO, DOTAÇÃO, APROVAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, RETENÇÃO, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, ESPECIFICAÇÃO, ORIGEM, EMENDA COLETIVA.
  • CRITICA, FALTA, PLANEJAMENTO, EXECUTIVO, PROJETO DE LEI ORÇAMENTARIA, CONFLITO, ATUAÇÃO, LEGISLATIVO, PREJUIZO, ESTADOS, MUNICIPIOS.
  • ANALISE, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, ESTADO DO PARA (PA), CRITICA, FALTA, INVESTIMENTO, SITUAÇÃO, CARENCIA, INFRAESTRUTURA.
  • EXPECTATIVA, BANCADA, ESTADO DO PARA (PA), ORÇAMENTO, EXERCICIO FINANCEIRO SEGUINTE, RELAÇÃO, EMENDA COLETIVA, ANALISE, PRIORIDADE, PROJETO, TRANSPORTE, ENERGIA ELETRICA, EDUCAÇÃO.
  • EXPECTATIVA, INTEGRAÇÃO, EXECUTIVO, LEGISLATIVO, REFERENCIA, ORÇAMENTO.

O SR. COUTINHO JORGE (PSDB-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, gostaria, neste oportunidade, de tecer algumas considerações sobre um assunto que julgo importantíssimo, no que diz respeito à discussão das prioridades da sociedade brasileira, e que todos conhecem como Orçamento.

O Orçamento está na Casa e o Congresso Nacional, que no momento o analisa, deverá aprová-lo até o final de dezembro. Portanto, quero também tecer algumas ilações a respeito do Orçamento vigente em 1996, sobretudo no que diz respeito à sua execução.

Todos sabem que o Orçamento é um instrumento operacional por excelência, que sintetiza as decisões que se tomam sobre uma sociedade. A Constituição brasileira deu ao Orçamento uma dimensão ampla em três níveis: o Plano Plurianual, que é o orçamento de médio prazo, que abarca quatro anos da ação do Governo Federal no País; a Lei de Diretrizes Orçamentárias, que define as linhas mestras, aquilo que se vai fazer durante o ano, em termos de grandes metas e prioridades anuais; e o Orçamento Anual, que nada mais é do que o aspecto operacional dessas decisões no ano, dentro da chamada funcional programática ou dentro das categorias ditas econômicas.

A Constituição de 88 criou regras claras para a aprovação e discussão desta peça importante, que é o Orçamento, tanto que criou uma Comissão Especial Mista, que comanda o processo de discussão no Congresso Nacional. Talvez pela falta de vivência do processo, até 1988, o Orçamento era praticamente encaminhado em mensagem pelo Poder Executivo ao Congresso, que apenas o ratificava, carimbava essa decisão.

Na verdade, após a Constituição de 1988, tivemos alguns problemas graves, alguns equívocos no uso desse Orçamento pelas próprias Casas do Congresso Nacional, tanto que colimou com a grande CPI, que mostrou ao povo brasileiro os problemas que essa peça tinha em sua discussão, em sua manipulação pelo Poder Legislativo. É inegável que a partir daí, o Orçamento passou a mudar; os procedimentos de análise e aprovação do Congresso Nacional melhoraram, aprimoraram-se, tanto que podemos dizer que hoje há uma transparência no processo, há uma participação democrática maior da sociedade brasileira e há, também, uma metodologia mais lógica, mais coerente em sua discussão.

Na verdade, hoje, temos o que se chama de audiências púbicas em nível setorial, em nível regional. E mesmo agora para o Orçamento do próximo ano tivemos reuniões regionais em todo o País. E, o mais importante, surgiu a figura da emenda coletiva, substituindo as emendas individuais ou paroquiais, que eram uma grande crítica do processo orçamentário. As emendas coletivas, em níveis estaduais, regionais e setoriais, passaram a ter prioridade e as próprias bancadas passaram a discutir, em maioria, que programas e projetos deveriam ser priorizados para o País.

Não tenho dúvida nenhuma de que houve uma melhoria, um salto qualitativo no que diz respeito à avaliação e aprovação do orçamento pelo Congresso brasileiro.

E será que houve o mesmo progresso em relação ao Poder Executivo? Eu diria que não. É bom lembrar que, no processo orçamentário, existem duas direções, dois níveis que tomam decisões e que devem estar interdependentes e se complementarem: o Poder Executivo, que envia mensagem e amarra as linhas mestras das prioridades nacionais e o Poder Legislativo, que analisa, discute, aprova e devolve ao Poder Executivo a peça orçamentária que vai ser executada e implementada em favor dos interesses do povo brasileiro.

Na verdade, posso dizer que o Legislativo evoluiu nesse campo. Mas, lamentavelmente, o Executivo não evoluiu quanto à vontade do Parlamento, quanto aquilo que é aprovado no Congresso Nacional e que, durante a sua execução, é distorcido. E o exemplo claro de uma atitude autoritária do Governo é o cancelamento de dotações aprovadas pelo Congresso Nacional, o contingenciamento de recursos importantes aprovados pelo Congresso Nacional - sobretudo de emendas coletivas - que ficam obstruídos praticamente até o fim do ano.

Isso realmente mostra a distorção que existe na relação entre o Executivo e Legislativo no trato dessa peça importante que é o Orçamento Anual do Brasil.

Na verdade, essa forma de cancelar, contingenciar, tem trazido dissabores ao Congresso Nacional, frustrações pelo esforço realizado, sobretudo considerando que o processo orçamentário está avançado, aprimorado e tem realmente transparência e coerência metodológica na sua discussão.

No nosso entender, falta ao Poder Executivo o mínimo de planejamento, coerência na discussão dos temas importantes, como é o caso do Orçamento. Acho que a mensagem encaminhada pelo Poder Executivo ao Congresso Nacional vem eivada de equívocos. Já fui Ministro e sei das dificuldades sérias de se elaborar essa peça, que chega ao extremo de permitir que Ministros venham ao Congresso Nacional reivindicar recursos que, no bojo da Mensagem, deixaram de ser priorizados como deviam.

Ora, alega-se, há muito tempo, que o Orçamento da União tem sido uma ficção, culpando-se, quase sempre, o Poder Legislativo. No período em que as emendas individuais eram importantes e fundamentais, poderia haver distorções, poderia ser o orçamento uma peça fictícia, irreal, forçado, mas isso mudou com as emendas coletivas. Hoje a posição do Congresso Nacional é muito mais séria, mais profunda.

Se hoje existe Orçamento fictício a maior culpa é do Poder Executivo, que cancela, contingencia, de forma global e depois manda medidas provisórias propondo créditos extraordinários, especiais e suplementares. Isso acontece sempre no final do ano, como está ocorrendo agora em que 56 mensagens estão chegando para reformular o uso de dotações orçamentárias que não foram usadas durante o ano corrente. É um grave equívoco: crédito suplementar, crédito especial são circunstâncias excepcionais, que não podem ser permanentes, ordinários, como ocorre atualmente.

Dá a impressão de que a estratégia do Governo seria contingenciar e, no final do ano, através dos créditos adicionais seria feito o remanejamento para liberar o que for conveniente. Para que serve então o Congresso Nacional? Para que servem as discussões que esta Casa tem empreendido durante a nova fase da discussão orçamentária dentro do Congresso Nacional?

O que há realmente é um conflito, uma falta de sintonia entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo em relação a esse instrumento de tomada de decisão, que é o Orçamento anual.

Frente a esse fato, que temos que alterar, no que diz respeito ao relacionamento entre Legislativo e Executivo, em relação ao Orçamento da União, há impactos altamente negativos para os estados e municípios, sobretudo das regiões mais carentes. Quero mostrar com isso que todo esse conflito gera seqüelas altamente negativas, prejudicando os estados e os municípios.

Com relação ao orçamento de 1996, por exemplo, o Governador do meu Estado, Almir Gabriel, reuniu-se com a Bancada paraense de todos os Partidos, para discutirmos as prioridades do Estado. Fizemos uma opção clara em favor de projetos de infra-estrutura, pois o nosso Estado, apesar de grande, tem carência de rodovia, de porto, de energia. Nossa prioridade foram projetos de viabilização de uma grande rodovia transestadual, a Transamazônica; de outra rodovia importante para a integração norte-sul, entre dois Estados - Pará e Mato Grosso - que é a Santarém-Cuiabá, a BR-222, que integra regiões importantes do nosso Estado; a duplicação da BR-316, tão importante como saída da grande Belém para o Nordeste, para o Centro-Sul e para todas as regiões brasileiras; implantação da energia elétrica em toda a Transamazônica, na direção de Tucuruí a Itaituba e de Tucuruí a Santarém, energizando esta grande área com a energia abundante que o Pará tem através da sua hidroelétrica; também a energização da região do Baixo Tocantins, tão carente e tão prioritária; os portos de Belém, de Vila do Conde e Santarém.

Assim, o Governador e os parlamentares paraenses selecionaram as 10 prioridades do Estado, que foram amplamente discutidas, no ano passado, na Comissão de Orçamento do Congresso Nacional no ano passado. E o que aconteceu? É lamentável, mas se analisarmos a execução dessas prioridades, decididas, de forma unânime, pela Bancada Paraense, ficamos altamente frustrados. Se analisarmos essa execução, ficamos constrangidos ao ver que praticamente todos esses projetos, com exceção do Linhão de Tucuruí, até o momento, tiveram liberação zero por parte do Governo Federal. É inadmissível que esse fato ocorra nas emendas coletivas, decididas globalmente e aprovadas pelo Congresso Nacional no ano passado e vigendo este ano.

Além disso, a Transamazônica e a Santarém-Cuiabá tiveram créditos suplementares, enviados pelo Governo, em dezembro do ano passado, e, no entanto, até hoje, esses créditos não foram realmente liberados, sequer um real.

Ficamos num grande conflito, numa grande inquietude. O processo orçamentário tem que ser reavaliado. A relação entre o Legislativo e o Executivo tem que ser reconsiderada. Alguns dados em relação ao Pará são contundentes.

Os relatórios demonstram que, dos R$558 milhões aplicados em investimentos em todos os Estados brasileiros, apenas 0,9% foi destinado ao meu Estado, num totalizando R$5.016 milhões; portanto, menos de 1%; para ser preciso, 0,9%. A cada paraense coube a importância de R$0,3. É o quarto menor Estado em termos de liberação total.

É importante ressaltar que, do total liberado para o Pará - R$295 milhões -, 46% foram destinados à despesa de pessoal, 52% às despesas correntes e apenas 1,7% aos investimentos. Vale dizer que o Governo Federal nada fez ao meu Estado a não ser a manutenção dos órgãos federais e o desenvolvimento das atividades que lhe são próprias. Trata-se de um Estado com graves problemas, como é o caso de Serra Pelada, o das invasões de terra, onde tivemos o fatídico Eldorado. Isso mostrou que aquele Estado precisa de investimentos intensos, massivos, fundamentais, sobretudo em infra-estrutura.

Ora, com todo esse quadro altamente negativo na execução do Orçamento de 96, a Bancada reuniu-se novamente, com esperanças renovadas, para discutir as propostas do Orçamento de 97, que está na Casa. Novamente a Bancada se reuniu e, de forma unânime, decidiu por dez projetos principais que comporão as prioridades da bancada estadual. Priorizou também projetos no que diz respeito aos aspectos regionais, incluindo a Santarém-Cuiabá como prioridade regional aprovada por todos os Estados da Amazônia; inseriu como prioridade setorial na área de transporte a hidrovia Araguaia-Tocantins com as sua respectivas eclusas aprovadas pela Comissão de Transportes da Câmara Federal.

Além disso, decidiu repetir grande parte dos projetos que foram aprovados no ano passado e que deveriam ser executados este ano, mostrando que a Bancada tem coerência, tem bom senso, e quer realmente a implementação efetiva desses projetos em favor do desenvolvimento do Estado.

Eu gostaria de lembrar apenas os projetos considerados prioritários, como a duplicação da BR-316, a da BR-222, a Transamazônica, sobretudo a Obra d'Arte Especial, a BR-158, que é a antiga PA-150 que vai de Marabá até a fronteira de Mato Grosso. No que diz respeito à transmissão de energia para o Baixo Tocantins continua altamente relevante, como também a energia para o sul do Pará, para o nordeste paraense bem como a priorização dessas áreas importantíssimas do nosso Estado.

Na área de transporte, ainda temos a considerar os portos de Santarém, Vitória do Xingu e Vila do Conde; na área de saneamento a prioridade da Bancada foi o programa de macrodrenagem de Belém, que visa exatamente a atender cerca de 500 mil pessoas que vivem em condições subumanas. É preciso implantar um grande projeto de soerguimento da cidadania dessas pessoas.

Hidrovias importantes como do Tocantins e Marajó foram consideradas prioridades pela Bancada.

Na área de educação, o término, a conclusão do Hospital Universitário Betina Ferro e Souza foi considerado prioritária.

Sr. Presidente, Srª e Srs. Senadores, isso mostra que a Bancada, mais uma vez, usou bom senso; usou, realmente, a sua prerrogativa de discutir e escolher quais os projetos mais importantes para o desenvolvimento do Estado. Não são projetos inventados pela Bancada; são projetos priorizados pelo próprio Governo Federal.

Na área do transporte rodoviário, dos portos, da universidade, damos importância a projetos do Governo Federal. Alocamos maior quantidade de recursos e corrigimos omissões do próprio Governo Federal em sua mensagem enviada ao Congresso Nacional.

Ora, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nós temos um dilema muito sério, dilema que eu insisto que existe.

Aprimoramos, no Poder Legislativo, o processo de análise e discussão da Mensagem Orçamentária, mas o Poder Executivo não se modernizou, não encaminhou e não tem encaminhado a mensagem. Isso não é defeito apenas do Governo Fernando Henrique Cardoso. Todos os governos, de 1988 para cá, pecaram dentro do mesmo aspecto. Encaminham mensagens com problema; o Congresso as corrigi e as aprimora, e o que ocorre? Cancelamentos, contingenciamentos e, no final do ano, tentam corrigir isso de forma açodada, através de mensagens que tentam propor créditos adicionais suplementares ou especiais ou extraordinários, seja de qualquer teor, remanejando recursos como se o Orçamento até outubro, novembro, não existisse, em termos de investimento e passa sê-lo só para novembro e dezembro. Isto é uma brutal distorção que temos que corrigir de forma definitiva. Esperamos que o Presidente Fernando Henrique Cardoso, que foi um brilhante parlamentar e reconhece, realmente, o trabalho desta Casa, passe a superar este equívoco que se repete de governo a governo.

Não podemos aceitar que o processo seja desrespeitado, desconsiderado. Os Poderes Legislativo e Executivo têm que trabalhar integrados, de forma complementar, neste importante instrumento da sociedade, que é o Orçamento Anual. Esperamos que ainda, em novembro ou dezembro, depois das eleições municipais, o Governo consiga liberar - não peço aquilo que já foi aprovado, não sei - mas, pelo menos, 50% dessas dotações, e que ainda se possam realizar obras importantes no meu Estado, na minha região, neste imenso Brasil, para que o Governo possa, pelo menos, honrar de forma mínima, aquilo que ele enviou como mensagem, que o Congresso aprimorou e que ele, lamentavelmente, está desconsiderando, desrespeitando.

Temos que mudar; confiamos que as coisas hão de mudar, não há dúvida nenhuma, mas insistimos. Vamos continuar lutando na Comissão de Orçamento. O Congresso Nacional tem essa responsabilidade junto ao Governo Federal, conseguir uma solução efetiva e clara neste impasse, neste conflito entre o que o Governo encaminha e o Congresso aprova, e que o Governo, na sua execução, distorce, altera, mutila, desconsiderando, portanto, a existência do Parlamento brasileiro nesse processo tão importante que é o Orçamento da União, que atende prioridades e interesses nacionais.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/11/1996 - Página 18354