Discurso no Senado Federal

ENCONTRO MUNDIAL DA FAO, REALIZADO EM ROMA. CUMPRIMENTANDO OS QUESTIONAMENTOS E AS DENUNCIAS FORMULADAS PELO PRESIDENTE DE CUBA, SR. FIDEL CASTRO, DURANTE O REFERIDO ENCONTRO, NO QUE TANGE A REDUÇÃO DE RECURSOS A SEREM APLICADOS NOS PROGRAMAS DE COMBATE A FOME EM TODO O MUNDO. PREOCUPAÇÕES DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO COM A REELEIÇÃO E A PRIVATIZAÇÃO DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE. PROBLEMAS SOCIAIS NOS GRANDES CENTROS URBANOS. CRITICAS E OPOSIÇÃO DE S.EXA. AS PROPOSTAS DE REFORMA CONSTITUCIONAL.

Autor
Junia Marise (PDT - Partido Democrático Trabalhista/MG)
Nome completo: Júnia Marise Azeredo Coutinho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • ENCONTRO MUNDIAL DA FAO, REALIZADO EM ROMA. CUMPRIMENTANDO OS QUESTIONAMENTOS E AS DENUNCIAS FORMULADAS PELO PRESIDENTE DE CUBA, SR. FIDEL CASTRO, DURANTE O REFERIDO ENCONTRO, NO QUE TANGE A REDUÇÃO DE RECURSOS A SEREM APLICADOS NOS PROGRAMAS DE COMBATE A FOME EM TODO O MUNDO. PREOCUPAÇÕES DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO COM A REELEIÇÃO E A PRIVATIZAÇÃO DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE. PROBLEMAS SOCIAIS NOS GRANDES CENTROS URBANOS. CRITICAS E OPOSIÇÃO DE S.EXA. AS PROPOSTAS DE REFORMA CONSTITUCIONAL.
Publicação
Publicação no DSF de 20/11/1996 - Página 18638
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • ELOGIO, PRONUNCIAMENTO, FIDEL CASTRO, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, CUBA, CONFERENCIA INTERNACIONAL, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A ALIMENTAÇÃO E AGRICULTURA (FAO), REFERENCIA, REDUÇÃO, RECURSOS, PAIS, PRIMEIRO MUNDO, DESTINAÇÃO, COMBATE, FOME, MUNDO, SIMULTANEIDADE, AUMENTO, VERBA, FINANCIAMENTO, AÇÃO MILITAR.
  • CRITICA, GOVERNO, AUSENCIA, PROGRAMA, COMBATE, FOME, MISERIA, POBREZA, FALTA, POLITICA SOCIAL.
  • CRITICA, ATENÇÃO, GOVERNO, REELEIÇÃO, PRIVATIZAÇÃO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), SIMULTANEIDADE, NEGLIGENCIA, POLITICA SOCIAL, EFICIENCIA, COMBATE, FOME, MISERIA, POBREZA, POPULAÇÃO.

A SRª. JÚNIA MARISE (PDT-MG. Como Líder. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, as imprensas nacional e mundial divulgaram com muito destaque o encontro mundial da FAO, em Roma, onde compareceram representantes de diversos países, lamentavelmente à exceção de alguns do Primeiro Mundo.

Discutiram-se temas da maior relevância, que certamente repercutem em nosso País e em todos os países subdesenvolvidos onde a grande maioria da população é constituída de excluídos. O Brasil convive hoje com cerca de 70 milhões de pessoas que praticamente passam fome e que vivem na mais absoluta miséria.

Esse encontro internacional da FAO foi marcado, sem dúvida alguma, pela presença do Presidente cubano Fidel Castro, que, em pronunciamento de aproximadamente oito minutos, sintetizou o problema da fome em todo o mundo, referindo-se às suas conseqüências danosas para a população pobre e marginalizada.

O Presidente cubano apresenta dez perguntas. Questiona, por exemplo, por que são dedicados U$700 bilhões por ano com despesas militares e por que não se investe parte dessa quantia para combater a fome, para impedir a deterioração do solo, a desertificação, o desmatamento e o aquecimento da atmosfera. Esta questão, sem dúvida alguma, gerou perplexidade e foi acompanhada por toda a imprensa internacional, pela posição, pela coerência e pela sinceridade com que o Presidente cubano defendeu suas idéias, mostrando, de forma realista, a situação dos excluídos de todo o mundo.

Pregou-se no encontro, para se discutir a fome em todo o mundo, mais uma vez, o combate ao neoliberalismo, implantado há mais de 10 anos na Europa e reconhecido por todos os europeus como um programa nefasto e de conseqüências danosas para a sociedade, para os trabalhadores e principalmente para as populações mais pobres e mais carentes.

Por isso, as expressões citadas e o questionamento sincero do Presidente cubano com relação à redução de praticamente metade dos recursos a serem aplicados nos programas de combate à fome em todo o mundo, enquanto se elevam os recursos destinados às forças militares, principalmente nos países do Primeiro Mundo, o que lamentavelmente ficou caracterizado nesse grande encontro internacional.

Sr. Presidente, manifesto não apenas os cumprimentos aos questionamentos e às denúncias formulados pelo Presidente cubano, como também nossa preocupação diante das dificuldades por que hoje passam os 70 milhões de excluídos do nosso País.

O Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso preocupa-se apenas com a reeleição e com a privatização da Vale do Rio Doce, e, após dois anos, não cumpriu nenhuma de suas metas e nem colocou o "dedo na ferida" dessa grande chaga social do nosso País.

A cada dia, as capitais e os grandes centros urbanos transformam-se em metrópoles miseráveis. A pobreza, o desemprego e a situação de miséria social tomam conta das grandes cidades, principalmente das nossas capitais. Assistimos ao crescimento do analfabetismo e da violência. Espalham-se pelas ruas, avenidas e praças das nossas cidades meninos e meninas abandonados, às vezes de mãos estendidas pedindo esmolas, às vezes já percorrendo o caminho da marginalidade e do vício. 

Milhares e milhares de pessoas estão hoje nas regiões mais pobres deste País, como lá no vale da pobreza, que é o Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, ou no Nordeste brasileiro. Estão elas também na periferia dos centros urbanos, onde as favelas se multiplicam. 

São o retrato da pobreza e da fome esses meninos, essas crianças, esses jovens e adolescentes e agora também esses adultos, trabalhadores que perderam seu emprego e que estão hoje trilhando o caminho da violência e da marginalidade para obterem dinheiro para matar a fome de sua família.

Por que o Governo não tem um programa de combate à fome, de combate à miséria no nosso País? Por que até hoje não tivemos a oportunidade de ver o Governo, com a presença de toda a mídia nacional, em uma grande solenidade, com o Presidente da República à frente, anunciar que está destinando milhões de reais para combater a fome dos excluídos desta Pátria?

Não estamos tendo a oportunidade de perceber uma demonstração de vontade política deste Governo de, mais do que ser ético, realizar a administração que ele um dia foi às ruas prometer, resgatando a grande dívida social do nosso País.

Tenho tido a oportunidade de ocupar a tribuna desta Casa, às vezes fazendo minhas críticas, às vezes fazendo oposição às propostas de reforma constitucional. Essas foram aprovadas de maneira açodada no Congresso Nacional. Ouvia-se freqüentemente o discurso de que este Senado Federal em nada poderia mexer, nada poderia acrescentar e em nada poderia aperfeiçoá-las, uma vez que o Governo tinha pressa em que as emendas constitucionais de quebra dos nossos monopólios fossem aprovadas, possibilitando-lhe, então, a implantação do Programa de Desenvolvimento Nacional.

Ora, Sr. Presidente, até hoje elas não foram regulamentadas. Desejávamos que a aprovação das reformas fosse feita por via complementar, para estabelecer o quorum qualificado na discussão de matérias que são tão importantes porque dizem respeito ao patrimônio de 150 milhões de brasileiros. Isso também não foi possível ao Senado Federal e ao Congresso Nacional.

Até hoje, nenhuma dessas matérias começaram a ser debatidas e discutidas. No ano passado, o Governo pregava a votação célere das reformas. A aprovação ocorreu quase que a toque de caixa neste Senado, sob a justificativa de que as reformas eram necessárias para promover-se o desenvolvimento econômico do nosso País. Nada aconteceu.

Acabo de fazer, Sr. Presidente, uma reflexão dos fatos que ocorreram aqui na votação das propostas de reforma constitucional.

Para concluir o meu pronunciamento, quero fazer uma reflexão sobre a nossa situação social, a propósito da realização do encontro da FAO, que contou com a presença - parece-me - de 155 representantes e presidentes de vários países.

Foi ressaltada pela mídia a posição do Presidente Fidel Castro, que fez uma cobrança em nome dos milhões e milhões de pessoas de todo o mundo que estão passando fome. O próprio dirigente dessa organização, reconhecendo a redução dos recursos pela metade, admitiu que, nos próximos dez anos, ainda haverá, em todo o mundo, mais de 400 milhões de pessoas passando fome, sem condições de sobreviver.

Essas são as grandes preocupações que nos tocam neste momento e que devem sensibilizar o Presidente Fernando Henrique Cardoso. Durante quatro anos,para dirigir a Sua Excelência esta reflexão. Será que o Presidente da República pode dormir tranqüilo, todos os dias, sabendo que neste País há 70 milhões de brasileiros passando fome e 30 milhões de crianças nas ruas expostas à mendicância e à delinqüência? Enquanto isso, dez milhões de trabalhadores, com mão-de-obra especializada, estão fora do mercado de trabalho. É possível que, talvez, num determinado momento, o Presidente da República acorde e tenha um gesto de sensibilidade diante dessa situação.

Sr. Presidente, essa situação é real, porque mostra a realidade desta Nação que cada dia mais caminha para uma grande convulsão social.

Não é momento de se falar em reeleição; a ocasião é de se discutir os rumos que este País deve tomar e as medidas que deve adotar para destinar recursos a programas de construção de moradias populares, para atender às necessidades básicas da saúde do nosso povo. Não essa saúde que está sendo televisionada como matéria paga do Governo Federal, por uma mídia que, certamente, pode ser considerada enganosa quando diz que está sendo resolvido o problema da saúde no País. A saúde está num verdadeiro caos!

Recursos para banqueiros tapar o rombo do sistema financeiro do País, este Governo tem. Para a saúde, este Governo fecha suas portas, como fechou ao ex-Ministro Adib Jatene, que deixou a Pasta por não querer carregar sobre seus ombros a responsabilidade de continuar vendo milhares e milhares de pessoas morrendo nas portas dos hospitais públicos.

Com estas reflexões, Sr. Presidente, espero que, nesse encontro da FAO, a posição adotada pelo Presidente cubano possa servir também de reflexão para o Presidente brasileiro, para que Sua Excelência possa um dia acordar do seu silêncio e enfrentar os problemas sociais deste nosso País.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/11/1996 - Página 18638