Discurso no Senado Federal

REFLEXÃO SOBRE A DECISÃO DO GOVERNADOR VITOR BUAIZ, DO ESPIRITO SANTO, DE SE DESLIGAR DO PARTIDO DOS TRABALHADORES. SOLICITANDO A TRANSCRIÇÃO NOS ANAIS DO SENADO DA CARTA DO GOVERNADOR VITOR BUAIZ A DIREÇÃO NACIONAL DO PARTIDO DOS TRABALHADORES.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA PARTIDARIA.:
  • REFLEXÃO SOBRE A DECISÃO DO GOVERNADOR VITOR BUAIZ, DO ESPIRITO SANTO, DE SE DESLIGAR DO PARTIDO DOS TRABALHADORES. SOLICITANDO A TRANSCRIÇÃO NOS ANAIS DO SENADO DA CARTA DO GOVERNADOR VITOR BUAIZ A DIREÇÃO NACIONAL DO PARTIDO DOS TRABALHADORES.
Publicação
Publicação no DSF de 14/08/1997 - Página 16256
Assunto
Outros > POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • ANALISE, DECISÃO, VICTOR BUAIZ, GOVERNADOR, ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES), DESLIGAMENTO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT).
  • TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, CARTA, AUTORIA, VICTOR BUAIZ, GOVERNADOR, ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES), ENCAMINHAMENTO, COMISSÃO EXECUTIVA NACIONAL, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT).

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero dedicar-me a uma reflexão sobre a decisão, extremamente difícil, dolorosa, tomada pelo Governador do Estado do Espírito Santo, Vitor Buaiz, na última segunda-feira, quando se desligou do PT.

Ainda ontem, o Presidente Nacional do Partido dos Trabalhadores, José Dirceu, por ocasião do lançamento de sua candidatura à Presidência do Partido dos Trabalhadores, realizada no Sindicato dos Bancários, em Brasília, expressou a dificuldade por que passou o partido diante da saída de Vitor Buaiz, ressaltando que S. Exª é uma pessoa extremamente ética, que teve divergências com deputados estaduais, com segmentos do PT no Estado do Espírito Santo, que o levaram a sair.

Eu disse ao Presidente José Dirceu e a tantos que ali estavam, e o mesmo faço da tribuna do Senado Federal, que nós do PT precisamos criar as condições para que Vitor Buaiz retorne ao seio do Partido que ajudou a formar nos últimos 17 anos. Vitor Buaiz começou a se destacar entre nós, companheiros de PT, quando era Presidente do Sindicato dos Médicos. Uma figura extremamente respeitável até por sua forma de viver e de se relacionar com as pessoas, por suas excepcionais qualidades, foi eleito Deputado Federal, o primeiro de nosso Partido, pelo Estado do Espírito Santo. Na Constituinte, destacou-se sobremaneira.

Tinha iniciativas pioneiras, até mesmo sobre formas de viver. Dentre outros aspectos interessantes, vou citar um de que me lembro. Como médico, preocupado com a saúde das pessoas e com a sua própria saúde, Vitor Buaiz preferia a alimentação vegetariana, que recomendava às pessoas. Entretanto, aqui no Congresso Nacional, não havia um restaurante vegetariano. Foi ele quem procurou organizar os seus pares para que a Mesa da Câmara dos Deputados se convencesse dessa necessidade e, portanto, graças a ele, todos aqueles que preferem esse tipo de alimentação podem hoje fazer uso do restaurante vegetariano que existe na Câmara dos Deputados, que inclusive serve aos funcionários do Senado e a nós Senadores. Esse é um pequeno exemplo.

Vitor Buaiz foi eleito, junto com Luiza Erundina e Olivio Dutra, em 1988, para Prefeito de Vitória. Eram os três prefeitos de capitais do PT: Vitória, São Paulo e Porto Alegre. Em Vitória, como os demais prefeitos de capitais eleitos pelo nosso Partido fizeram, ele introduziu o orçamento participativo. Teve inúmeras iniciativas interessantes no sentido de tornar a administração pública mais transparente e mais participativa. Teve algumas desavenças com pessoas dentro do PT, mas de tal maneira conduziu-se bem que tornou-se o nome mais forte para a sucessão ainda mais difícil - a de ser Governador do Estado do Espírito Santo. Em que pese a pequenas rusgas aqui e acolá, ele conseguiu eleger-se Governador daquele Estado, mas num momento extremamente difícil, em que os governos estaduais se viram diante de barreiras extraordinárias.

Vitor Buaiz, por exemplo, avaliou que havia ocorrido um certo arrocho de salário na gestão anterior e que poderia conceder um aumento de 25% na remuneração dos servidores. Isso aconteceu no mesmo ano que se implantou o Plano Real, que acabou diminuindo significativamente os preços. Aquele aumento dos funcionários guardava relação com uma situação inflacionária, e as conseqüências do aumento acabaram dificultando, porque aumentou sobremaneira o peso dos salários no Orçamento, uma vez que a arrecadação não cresceu na mesma proporção. Assim, as dificuldades começaram a ser cada vez maiores. O Governador se viu obrigado a pensar numa maneira de enxugar as despesas, e, a partir daí, cresceram os conflitos naturais entre as organizações representativas dos médicos, dos professores, dos servidores em geral e a administração.

No curso dessas dificuldades, o Governador precisou recorrer, por exemplo, à Caixa Econômica Federal e a outras instituições financeiras da União, e os responsáveis pelo Governo da União acabaram exigindo ora a privatização da Escelsa, ora medidas de enxugamento, tais como programas de demissão voluntária e assim por diante, o que veio a acirrar os ânimos dentro do PT.

Não conheço tanto os detalhes e, por isso mesmo, tive hoje uma conversa com o Deputado Federal João Carlos Coser, que muitas vezes foi um aliado e muitas vezes um discordante de Vitor Buaiz. Pedi a ele que me explicasse um pouco o problema e falei ao Deputado que hoje faria uma reflexão da tribuna do Senado em sinal de respeito a esse companheiro.

Quero transmitir aos companheiros do PT, mesmo àqueles que discordam de Vitor Buaiz num ou noutro aspecto, que o considero um valor muito tão significativo na história do PT, uma pessoa que sempre se apresentou com valores éticos muito próximos daqueles que julgo importantes na defesa do interesse público. Seus adversários não mencionaram qualquer quebra da ética pessoal e consideram que seus procedimentos foram realizados com a devida probidade. Não há registro de acusação de denúncias sobre suas atitudes no que diz respeito à seriedade no trato da coisa pública.

Apesar das divergências, quero registrar o respeito que tenho por Vitor Buaiz e dizer que me coloco à disposição para com ele dialogar e também com o Partido, porque gostaria, num espaço de tempo não muito longo, ao examinar as diversas opções de partido, ao examinar a sua própria história e inclusive as palavras de Vitor Buaiz na sua carta à Direção Nacional do Partido dos Trabalhadores, instrumento com o qual se desligou, eu gostaria, repito, de lhe dizer: suas palavras são próprias de quem ainda poderá vir a dar extraordinária contribuição ao Partido dos Trabalhadores. Seus dezessete anos entregues à causa do PT, que você ajudou a construir por acreditar na utopia de uma relação política para uma nova sociedade, exercendo os cargos que exerceu, mostram que você tem muito ainda a contribuir para que venhamos a construir uma Nação justa.

Num trecho de sua carta, diz que "não faz sentido ignorar que o fenômeno multifacetado da globalização nos coloca diante de um desafio gigantesco: como conciliar as necessidades de reduzir custos e se tornar competitivo com as carências de grandes contingentes da população que, já destituídos dos ingredientes mínimos da cidadania, estão sendo lançados no submundo do desemprego ou lutam pela sobrevivência na selva da economia informal?"

Será que há solução para isso? Há sim, Vitor. Podemos assegurar a todos os brasileiros o direito à riqueza da Nação e à sobrevivência; podemos assegurar a todas as crianças do Brasil pertencentes a famílias de pouca posse ou muito carentes o suficiente para não precisarem estar trabalhando tão precocemente. E mediante que instrumento? Por exemplo, a renda de cidadania, uma renda garantida, que deve ser prioritária. Se governos, como o de Fernando Henrique Cardoso, colocam como prioridade ora criar o Proer para ajudar instituições financeiras, ora criar condições para a privatização de empresas como a Excelsa e outras, ora criar instrumentos para dinamizar a economia aqui e acolá, nós, do PT, podemos mostrar, com clareza, que há caminhos.

Sr. Presidente, requeiro que seja anexada ao meu pronunciamento a carta de Vitor Buaiz ao PT, para que possamos todos refletir sobre esse documento. Na forma do Regimento, arco com eventuais despesas de publicação.

Será importante criarmos as condições para que ele e o Partido reflitam, a fim de que possa retornar um dia a nossa Casa.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/08/1997 - Página 16256