Discurso no Senado Federal

POSIÇÃO CONTRARIA AO DISCURSO PRONUNCIADO NA CAMARA PELO DEPUTADO FRANCO MONTORO, SOBRE A 'INDISPENSAVEL REFORMA POLITICA'. DEFESA DA MANUTENÇÃO DO SISTEMA DE VOTO PROPORCIONAL, DO VOTO OBRIGATORIO, E O PRINCIPIO DE FIDELIDADE PARTIDARIA, POR ACREDITAR QUE O VOTO DISTRITAL FUNCIONA APENAS EM AREAS DENSAMENTE POVOADAS.

Autor
Nabor Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Nabor Teles da Rocha Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA.:
  • POSIÇÃO CONTRARIA AO DISCURSO PRONUNCIADO NA CAMARA PELO DEPUTADO FRANCO MONTORO, SOBRE A 'INDISPENSAVEL REFORMA POLITICA'. DEFESA DA MANUTENÇÃO DO SISTEMA DE VOTO PROPORCIONAL, DO VOTO OBRIGATORIO, E O PRINCIPIO DE FIDELIDADE PARTIDARIA, POR ACREDITAR QUE O VOTO DISTRITAL FUNCIONA APENAS EM AREAS DENSAMENTE POVOADAS.
Publicação
Publicação no DSF de 24/03/1998 - Página 4806
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA.
Indexação
  • ANALISE, DOCUMENTO, AUTORIA, FRANCO MONTORO, EX GOVERNADOR, EX SENADOR, REFORMA POLITICA, BRASIL, ALTERAÇÃO, FORMA, GOVERNO, PRESIDENCIALISMO, PARLAMENTARISMO, COMBATE, CENTRALIZAÇÃO, EXECUTIVO, PODER PUBLICO, DEFESA, IMPLANTAÇÃO, VOTO DISTRITAL.
  • DISCORDANCIA, FRANCO MONTORO, EX GOVERNADOR, EX SENADOR, DEFESA, IMPLANTAÇÃO, BRASIL, VOTO DISTRITAL, PARLAMENTARISMO, DIVISÃO, ELEITORADO, MUNICIPIOS.
  • DEFESA, MANUTENÇÃO, OBRIGATORIEDADE, VOTO PROPORCIONAL, COMPOSIÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, CAMARA MUNICIPAL, ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, FIDELIDADE PARTIDARIA, ORGANIZAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PRESERVAÇÃO, ESTADO DEMOCRATICO, BRASIL.
  • ANALISE, INEXISTENCIA, VIABILIDADE, IMPLANTAÇÃO, BRASIL, SISTEMA, NATUREZA POLITICA, DIVISÃO, ELEITORADO, VOTO DISTRITAL, PARLAMENTARISMO, ALTERAÇÃO, ORGANIZAÇÃO, PARTIDO POLITICO, MOTIVO, CARACTERIZAÇÃO, MUNICIPIOS, MAIORIA, REGIÃO, PAIS.

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB-AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, todos os dias chegam a nossos gabinetes dezenas ou até mesmo centenas de correspondências das mais diversas origens e com contraditórios objetivos. Todas nos merecem atenciosa e respeitosa consideração, mas, inevitavelmente, algumas se revestem de particular importância devido ao próprio relevo do missivista.

Recebi - e acredito que meus nobres colegas também tiveram esse privilégio - na última sexta-feira, cópia de um discurso pronunciado em 12 de fevereiro, na Câmara dos Deputados, pelo ex-Senador e ex-Governador Franco Montoro, uma das mais caras e dignas legendas da vida pública nacional. Já em seu título, encontrei a certeza da seriedade do assunto e do enfoque a ele dispensado pelo autor à Indispensável Reforma Política, tema que vem merecendo abordagem permanente por parte dos representantes da sociedade no Congresso Nacional e em outros foros legítimos.

O Deputado Franco Montoro começa advertindo para a ordem de prioridades que não pode ser esquecida nessa fase crucial para o futuro do Brasil. Diz ele: “No momento em que o Congresso Nacional se concentra na discussão e votação das reformas administrativa, previdenciária e outras, é oportuno lembrar a importância fundamental da reforma política, que constitui hoje o maior desafio aos responsáveis pelo aperfeiçoamento da democracia brasileira. A reforma política, por sua importância básica, deveria ser a primeira das reformas, porque é na área do Governo que se decidem os destinos do País e as condições de vida da população”.

Citando o dramaturgo e filósofo alemão Bertold Brecht, Montoro ensina que “o pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não sabe o custo de vida, preço do feijão, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio, depende de decisões políticas”.

Todo o discurso do consagrado parlamentar paulista é uma importante peça de grande substância política, ética e social; gostaria de lê-lo na íntegra, mas isso privaria os meus nobres Pares da satisfação da própria leitura, em seus gabinetes, na calma que sempre propicia melhor aproveitamento das idéias expostas no textos.

Com reverência aos títulos acadêmicos e ao vitorioso currículo político-administrativo de Franco Montoro, todavia, vejo-me na obrigação de discordar de alguns dos pontos expendidos naquele discurso, a partir dos postulados que lhe embasam as conhecidas convicções parlamentaristas, que também esposo em essência, embora divergindo quanto a alguns detalhes. Aplaudo com entusiasmo sua citação de Rui Barbosa, condenando “o poder centralizador e unipessoal do Chefe do Executivo”, porque “o Presidente da República encarna o poder dos poderes, o grande eleitor, o grande nomeador, o grande contratador, o poder do bolso, o poder dos negócios, o poder da força”. E o mais notório exemplo dessa centralização de poder hoje em dia é o modo como as medidas provisórias são usadas; a proliferação abusiva desses mecanismos que deveriam ser, pela própria definição, excepcionais e emergenciais. O investimento do poder de legislar pelo Poder Executivo é uma distorção que vem trazendo e ainda trará seriíssimas conseqüências para a democracia brasileira!

De toda forma, esse aspecto negativo do presidencialismo - o caráter imperial de que o cargo se reveste - não pode ser pretexto para a geração de outros males, talvez ainda mais danosos à consolidação do regime, principalmente se vierem para agravar o quadro de ameaças ao equilíbrio institucional do País.

Um dos pilares do parlamentarismo é rigorosamente incompatível com o presidencialismo - o voto distrital, a paroquialização das câmaras legislativas -, mesmo admitindo que o sistema poderia até funcionar nos grandes Estados, naquelas poucas unidades que comportariam, sem maiores problemas, a divisão de Municípios em áreas eleitorais autônomas. Todavia, aí falamos apenas das zonas densamente povoadas do País. Temos de chamar a atenção para as outras regiões, que representam dois terços ou mais do território nacional.

Tratemos objetivamente a questão: em São Paulo, terra do grande tribuno e professor, poder-se-iam efetivamente dividir diversos Municípios, criando em cada um distritos eleitorais; dezenas de cidades interioranas, igualmente, poderiam ser declaradas núcleos estanques, com listas próprias de candidatos. Mesmo enfrentando dificuldades variáveis, em Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná, Rio Grande do Sul, Bahia e Pernambuco, o retalhamento para efeitos eleitorais também seria viável. Mas, e nos demais Estados?

Também tenho procurado focar o debate político na necessidade de reformas políticas profundas, coerentes com as peculiaridades regionais; é indispensável que não se perca de vista o fato de que o Brasil tem inúmeras realidades divergentes e, não raro, conflitantes. Federação é justamente isso: buscar pontos de identidade sem perverter os saudáveis atributos socioculturais dos Estados que se unem sob uma bandeira comum.

Em 14 de junho de 1996, analisando a marcha do processo de modernização do Estado brasileiro, proferi advertência muito semelhante à que agora emite o nobre Deputado Franco Montoro. Afirmei, na oportunidade: “estão em tramitação as chamadas reformas sociais, entre elas as da previdência, da administração, a tributária - mas, até agora, não se tem ainda o arcabouço da reforma política, imprescindível à modernização do sistema democrático no Brasil”.

Busquei definir, na ocasião, os três pontos que devem centralizar qualquer processo de aprimoramento político-eleitoral no Brasil: a permanência do voto obrigatório, a manutenção da proporcionalidade na composição das Câmaras e Assembléias e a instituição de rigorosos princípios de fidelidade partidária.

Vou-me ater hoje à questão do voto distrital, procurando demonstrar que seus aspectos nocivos serão maiores que os hipotéticos benefícios que pudesse trazer.

O assunto é polêmico e envolve duas correntes: há quem pregue o voto distrital puro, com a eleição de todos os Deputados por distritos, em oposição aos que defendem um sistema misto, um “jeitinho” brasileiro, que misture voto proporcional e voto distrital, numa salada indigesta e de previsíveis conseqüências nocivas.

O problema - impõe-se ressaltar - está na exuberância de características que fazem a riqueza e as esperanças desse multifacetado mosaico social, econômico e político chamado Brasil.

Atenhamo-nos à proposta que parece merecer a preferência dos distritalistas - o sistema misto. Se pensarmos apenas em São Paulo, como a maioria deles, não haverá problema, porque a grande metrópole comporta tranqüilamente a divisão em cinco ou seis zonas; cidades como Campinas poderiam ser recortadas em duas zonas ou constituir uma única, igual a outras poderosas comunidades do interior do Estado, até o limite de 35 distritos, embora seja muito difícil explicar a um eleitor do bairro paulistano da Lapa que não poderá votar em um candidato da Casa Verde.

Por outro lado, saindo do Sudeste e de pouquíssimas cidades das demais Regiões, encontraremos, no plano federal, as provas da inviabilidade do sistema. Não vou falar das peculiaridades de cada Estado, porque os nobres representantes aqui presentes as conhecem de sobra, pois têm experiência própria no trato dos seus problemas específicos.

No entanto, creio que, em grande parte do Brasil, talvez na maioria das Unidades da Federação, o quadro seja semelhante ao do meu Estado, o Acre, onde qualquer tentativa de retalhar o eleitorado teria resultados funestos e prejudiciais à consolidação democrática que todos buscamos. Já me pronunciei várias vezes sobre o assunto, detalhando as alternativas possíveis e suas desvantagens e provando que qualquer mudança no sistema proporcional trará prejuízos muito maiores do que eventuais benefícios.

Tenho colhido importantes e substanciais apoios a essa tese, vindos de Senadores das mais diversas regiões e legendas; no discurso que citei há pouco, foram apresentados apartes favoráveis à permanência do voto proporcional, endossando as preocupações e as advertências sobre as notórias distorções que o distritalismo pode trazer para o nosso regime republicano e federativo.

Nada disso, todavia, afeta o profundo respeito com que recebi as palavras do Professor Franco Montoro, cujo discurso é digno de ser inscrito nos Anais da Casa, juntando-se às outras peças por ele lavradas em seus mandatos de Senador, sempre um paladino da causa da liberdade, da democracia e da justiça social. Divirjo - modesta, porém firmemente - de suas propostas quanto ao voto distrital, mas defendo seu direito de apresentá-las e renovo o pedido à Presidência de que sejam publicadas como adendo a este meu discurso.

Agradeço a V. Exª, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, pela audiência.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/03/1998 - Página 4806