Discurso no Senado Federal

NECESSIDADE DE AMPLO DEBATE SOBRE A REFORMA POLITICA.

Autor
Jefferson Peres (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA CONSTITUCIONAL.:
  • NECESSIDADE DE AMPLO DEBATE SOBRE A REFORMA POLITICA.
Aparteantes
Bello Parga, Edison Lobão, José Eduardo Dutra, Lúcio Alcântara.
Publicação
Publicação no DSF de 22/10/1998 - Página 14421
Assunto
Outros > REFORMA CONSTITUCIONAL.
Indexação
  • QUESTIONAMENTO, VALIDADE, REFORMA POLITICA, IMPLANTAÇÃO, VOTO DISTRITAL, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DO AMAZONAS (AM), RESULTADO, DIVERSIDADE, CARACTERIZAÇÃO, GEOGRAFIA, PAIS.
  • DEFESA, IMPLANTAÇÃO, BRASIL, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL, FUNDOS PUBLICOS, IMPEDIMENTO, ABUSO, UTILIZAÇÃO, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, EXCESSO, INFLUENCIA, PODER ECONOMICO, ELEIÇÕES, PREJUIZO, DEMOCRACIA, PAIS.
  • OPOSIÇÃO, PRETENSÃO, IMPLANTAÇÃO, BRASIL, SISTEMA ELEITORAL, PROPORCIONALIDADE, REPRESENTAÇÃO, NUMERO, POPULAÇÃO, ESTADOS, REPRESENTAÇÃO POLITICA, REPRESENTAÇÃO PARTIDARIA, CONGRESSO NACIONAL, PREJUIZO, REGIÃO CENTRO OESTE, REGIÃO NORDESTE, REGIÃO NORTE, PAIS.

      O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, o debate a respeito da reforma política já foi antecipado neste plenário. Essa discussão foi inaugurada há poucos dias pelo ilustre Senador Lúcio Alcântara, quando abordava alguns aspectos dessa reforma que já chega atrasada, mas que certamente será a primeira prioridade no Congresso Nacional, na Sessão Legislativa do próximo ano.

      Srs. Senadores, entre os vários pontos considerados como principais da reforma, eu nem salientaria o voto distrital misto, a respeito do qual eu mesmo tenho sérias dúvidas, tendo em vista a realidade geográfica e social do nosso País. Há poucos dias eu conversava com o Senador que ora preside esta sessão, Senador Geraldo Melo, que comunga comigo da sua preocupação relativa à introdução desse sistema eleitoral.

      Veja, Senador Edison Lobão, o caso específico do Amazonas: como seria dividido um Estado com um milhão e quinhentos mil quilômetros quadrados, com mais da metade da população concentrada na capital, Manaus, com oito cadeiras de deputados federais? Metade da bancada talvez viria da lista, e os outros quatro mandatos seriam preenchidos pelo distrito. Teríamos seguramente dois “distritões” em Manaus, uma cidade com mais de um milhão de habitantes, e dois “distritões” no Interior, numa extensão de um milhão e quinhentos mil quilômetros quadrados. Que sentido terá no Amazonas, Senador Bernardo Cabral, no nosso Estado, o voto distrital?

      Por que se vai criar o voto distrital? Ele é excelente, em tese, e em outra realidade - claro! Sou francamente favorável a que metade das vagas de deputados seja preenchidas pelo sistema distrital, Senador Lúcio Alcântara, devido à grande vantagem de vincular o eleitor ao seu representante. No entanto, Senador Bernardo Cabral, não haveria essa vinculação se um distrito tivesse 750 mil quilômetros quadrados espalhados em sub-regiões completamente diferentes umas das outras. Não sou contra o voto distrital, mas é muito complicado, tendo em vista, repito, a realidade geográfica do nosso País. É preciso examiná-lo com muita cautela.

      Na minha opinião, reforçada na última eleição, o ponto principal -e não um dos principais- da reforma política que virá será a introdução do financiamento público das campanhas eleitorais. Hoje a desigualdade é simplesmente brutal. As campanhas estão ficando cada vez mais caras, e levam enorme vantagem aqueles que têm a máquina administrativa a seu serviço, aqueles que dispõem de acesso fácil ao financiamento empresarial -o que já não é bom para a democracia- e, finalmente, aqueles que dispõem de recursos próprios. Como ficam, então, aqueles que são pobres, estão na Oposição e ainda vêem bloqueado, às vezes pelo próprio oficialismo, o acesso às empresas?

      Eu me elegi, Senador Ronaldo Cunha Lima, despendendo recursos mínimos. Fiz uma campanha de vereador numa conjuntura excepcional, quem sabe, já que grande parte da população se empolgou e votou espontaneamente em mim. Mas será que isso se repetirá? Não podemos argumentar com exceções, Senador Ronaldo Cunha Lima.

      V. Exª sentiu agora no seu Estado -já fez o relato disto- o peso esmagador do poder e do dinheiro numa eleição. Com tamanha desigualdade de forças, como pode um candidato sem recursos enfrentar, principalmente em eleições majoritárias, candidatos que têm a seu serviço a máquina administrativa ou o dinheiro? É quase impossível vencer uma eleição como essa, com completo desvirtuamento do processo democrático.

      O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB-CE) - Permite-me V. Exª um aparte?

      O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM) - Concedo o aparte ao nobre Senador Lúcio Alcântara.

      O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB-CE) - Senador Jefferson Péres, vou me reportar à parte inicial do discurso de V. Exª que aborda o voto distrital, assunto que deve ser tratado com muita cautela, já que a Alemanha, país que tem um sistema distrital misto, tem características inteiramente diversas das nossas, seja em termos culturais, educacionais ou territoriais. Na França, por exemplo, o voto distrital foi introduzido na época em que De Gaulle tinha superpoderes, que o desenhou, com a precisão de um estrategista - socorre-me aqui o nosso colega Bernardo Cabral -, de modo a liquidar o Partido Comunista. Os distritos eram caprichosamente feitos para atender ao poder, ao General De Gaulle, que estava presidindo a França, na V República. Como é que vai ficar isso aqui no Brasil? Por exemplo, o Amazonas seria formado de quatro distritos. Mas quem vai formar esses distritos? Como vão ser feitos? Todo esse temor, esse receio, essa cautela não significa medo do futuro e da mudança. Se for necessário, vamos encarar essa questão, mas é preciso que seja bem analisada. O Brasil tem dessas coisas. Está-se dizendo agora que o Brasil se salvará com essa reforma política e que, se colocarem o voto distrital misto, está tudo resolvido. Ora, o que precisamos saber realmente é até que ponto isso vai preservar as funções do Congresso Nacional, já que as pessoas vão ser representantes de pequenas áreas e vão se desvincular dos grandes interesses do País. Certas elites criticam as emendas de parlamentar. Se o voto distrital misto for implantado, isso vai significar o reinado das microrregiões dentro dos Estados; os parlamentares serão representantes dessas microrregiões e vão precisar prestar contas disso. Por último, ainda aproveitando o tema levantado por V. Exª sobre os distritos e mostrando a desproporção entre área territorial e representação, gostaria de lembrar que a Amazônia tem uma população rarefeita, razão pela qual devemos lutar para impedir esse movimento que quer diminuir a representação dos Estados, principalmente a dos Estados do Norte. O Senador Darcy Ribeiro dizia - e V. Exª agora confirmou com o seu argumento - que não podemos levar em conta, na representação desses Estados, apenas a população, mas temos que considerar, pelo menos em parte, também a grande área territorial. Não podemos aceitar essa conversa de “um homem-um voto”, porque no Senado são todos iguais, bem como na Câmara. Estou muito à vontade para dizer isso, porque, por esses estudos, no Ceará nem se aumenta nem se diminui: mantém-se a representação que temos hoje. Mas os Estados do Norte e Centro-Oeste precisam sim e penso que não devemos mexer nisso. Devemos deixar essa representação com esse piso, por essas razões e porque também é um fator de equilíbrio da população. V. Exª, de algum modo, sem tocar no assunto, acabou nos levando a esta conclusão, ou seja, de que a área territorial também é importante, porque senão teríamos distritos enormes, o que dificultaria muito o contato de um deputado com os seus representados.

      O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM) - Muito obrigado, Senador Lúcio Alcântara. V. Exª tocou em um ponto muito mencionado e que deve ser incluído no bojo da reforma política: aumentar a representação dos Estados mais populosos e reduzir a dos Estados de populações menores. Isso é inaceitável para nós do Norte e do Nordeste. São Paulo, hoje, tem nove vezes mais Deputados que o Amazonas, e isso me parece razoável. Se formos estabelecer uma proporcionalidade real, São Paulo terá 20 ou 25 vezes mais do que o Amazonas. O Nordeste e a Amazônia ficarão inferiorizados na Câmara dos Deputados. Não me parece que o equilíbrio federativo seja buscado apenas no Senado. Creio que é importante tê-lo também na Câmara dos Deputados. De início, acredito que a esmagadora maioria das Bancadas dos Estados nordestinos, da Amazônia e talvez do Centro-Oeste se manifestará contra essa modificação.

      Quanto ao voto distrital - permita-me só concluir, Senador Edison Lobão -, além desse problema de ordem geográfica dos “distritões”, que descaracterizam o distrito inteiramente, ainda há outro, Senador Lúcio Alcântara. Dizem que o voto distrital será criado para reduzir o peso do poder econômico. Tenho minhas dúvidas quanto a isso. Argumentam que hoje o deputado tem que buscar voto em todo o Estado, sendo mais fácil para os que têm mais dinheiro. Quando tiver que disputar em uma área restrita, onde o seu adversário rico concentrará todo o peso dos seus recursos, será muito mais fácil. Ocorre ainda, Senador Edison Lobão, que muitos deputados pobres ou desprovidos de recursos têm uma votação difusa em todo o Estado, ou seja, conseguem um pouco de voto em toda parte e se elegem assim. Mas, em muitos casos, poderão ficar muito inferiorizados se disputarem apenas no distrito. Essa é mais uma razão para se olhar com muito receio a criação de muitos distritos.

      O Sr. Edison Lobão (PFL-MA) - Permite-me V. Exª um aparte?

      O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM) - Ouço V. Exª.

      O Sr. Edison Lobão (PFL-MA) - Entendo que V. Exª inicia ou dá seguimento a uma discussão que a mim me parece de fundamental importância: a reforma política. Senador Jefferson Péres, estes três temas que V. Exª abordou -o voto distrital, o financiamento das campanhas e a alteração das bancadas-, desde logo, parecem já obter o consenso dos Senadores que se encontram neste plenário. Mas, na Câmara, talvez seja um pouco diferente. Entretanto, são de capital importância para uma boa reforma política que se pretende fazer. Senão vejamos. No que se refere ao voto distrital, estive fazendo um levantamento superficial no meu Estado -e sei que é assim também em muitos outros Estados- e cheguei à conclusão de que, com o voto distrital, muitos dos mais votados deputados estaduais do meu Estado não se elegeriam. Ora, isso é algo incoerente na vida pública. E quem se elegeria? Seguramente prefeitos ou lideranças municipais com maior suporte no município ou na região. Assim, acabaríamos tendo uma Câmara de Deputados municipais ou distritais e não deputados que realmente representem o pensamento do Estado. Quanto ao financiamento de campanha, não é mais suportável o que se está fazendo neste País. Temos um projeto aqui assinado pelo Senador Pedro Simon e por mim -e sei que há outras iniciativas também- no sentido de se criar meios e modos para o financiamento público das campanhas. Há, todavia, muitos opositores a isso, cujos argumentos não compreendo. Se já se introduziu o princípio da reeleição do Presidente da República, de governadores e prefeitos, como não se põe também em prática uma iniciativa dessa natureza? Vamos acabar, dentro de dez ou quinze anos, no máximo, elegendo apenas os bilionários para a Câmara dos Deputados, para o Senado da República e até para os governos estaduais. Aqueles com boas condições de representar bem o pensamento do seu Estado terão dificuldades extremas com essa eleição, porque cada vez fica mais difícil o financiamento das campanhas. Senador Jefferson Péres, no que diz respeito às bancadas estaduais, hoje temos o Estado de São Paulo, que, somado aos Estados de Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Santa Catarina, já tem maioria na Câmara dos Deputados. Como ainda se quer alterar essa ordem de peso das bancadas estaduais? Isso é simplesmente insuportável, inaceitável para a boa prática da política neste País. Entendo que devemos todos nos preparar para uma discussão mais profunda em torno dessa matéria, contribuindo para evitar essas catástrofes de natureza política.

      O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM) - Muito obrigado, Senador Edison Lobão. V. Exª repetiu o que tinha dito há pouco o Senador Lúcio Alcântara quanto ao risco de, com o voto distrital, estarmos levando para a Câmara uma enorme bancada de vereadores federais. Se hoje há muitos Deputados que se ocupam exclusivamente dos problemas de seus Estados, o que não é condenável, porque foram eleitos também para isso, e evidentemente os grandes temas nacionais têm de ser discutidos no Parlamento, imaginem se tivermos Deputados se ocupando quase exclusivamente dos seus distritos. Como cairá a qualidade da Câmara e como ela será também desvirtuada em seu papel de segunda Casa do Legislativo brasileiro.

      Alega-se que, com a existência das listas, os expoentes, os grandes nomes terão lugares garantidos, porque integrarão a lista. Mas com a realidade dos partidos brasileiros nos níveis regionais, muitos deles, a maioria, dominados por caciques, pelo caciquismo, eu lhe pergunto: será que os expoentes independentes mais qualificados ficarão nos primeiros lugares das listas? Ou serão jogados pelos caciques para os últimos lugares e não chegarão ao Parlamento? Que Câmara dos Deputados teremos no futuro? Vereadores federais e outros integrantes das listas elaboradas por aqueles que dominam as seções regionais dos partidos. De forma que, repito, em tese, o sistema distrital misto é muito bom, mas cautela com ele!

      Quanto à modificação da representação dos Estados, já disse que isso é absolutamente inaceitável para nós do Norte e do Nordeste.

      O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT-SE) - V. Exª me concede um aparte?

      O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM) - Concedo o aparte, Senador José Eduardo Dutra, com muito prazer.

      O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT-SE) - Senador Jefferson Péres, V. Exª aborda esse assunto com a ponderação e a cautela que lhe são peculiares. Já fiz também um pronunciamento sobre esse assunto na semana passada e penso que o importante é que essa discussão sobre reforma política não tenha o mesmo destino que teve de outras vezes. Toda vez que termina uma eleição, vem à moda, vem à baila a necessidade de se fazer a reforma política para se aperfeiçoar a democracia brasileira; depois, a coisa vai esfriando, a eleição vai passando, vai-se aproximando a próxima eleição, e aí fica muito mais difícil estabelecer mudanças, afinal, boas ou ruins, as regras atuais são conhecidas, e todo mundo tem medo, pelo menos os candidatos parlamentares, de aprovar regras que não conhecem. No meu pronunciamento, eu disse também que, para mim, o ponto mais importante da reforma política seria o financiamento público das campanhas. Quero, inclusive, lembrar que, quando da discussão da Lei Eleitoral para estas eleições, grande parte dos Parlamentares se dizia a favor do financiamento público, mas não para esta eleição, e sim para a próxima. Estou ansioso para ver se, realmente, na próxima eleição já teremos financiamento público das campanhas, como foi prometido por boa parte dos Senadores que votaram contra o financiamento nesta eleição, mas já antecipando o voto favorável quando se tratasse das próximas eleições. Penso, realmente, que esse é o ponto principal, não só para se dar um mínimo de igualdade de competição, como também seria o meio mais eficaz até para fiscalização do cumprimento da lei. Sabemos que a prestação de contas dos TREs é absoluta ficção. Na prestação de contas de alguns candidatos, chega a ser risível o valor que declaram ter gasto nas eleições, quando o que se viu durante a campanha foram gastos muito superiores. A partir do momento em que se defina o financiamento público como financiamento exclusivo para as eleições, proibindo contribuição de pessoas jurídicas, todos os candidatos, todos os partidos e a sociedade vão saber quanto é que cada candidato, cada partido recebeu para fazer a sua campanha. E, então, basta se comparar o volume da campanha e as demonstrações explícitas de riqueza com o montante recebido para a campanha e constatar se houve desrespeito ou não à lei. Com relação ao voto distrital misto, esse é um tema que, normalmente, mereceu muito preconceito por parte da Esquerda, sempre sob a alegação de que isso iria prejudicá-la e transformar o Congresso Nacional em uma grande Câmara de Vereadores. Atualmente estou muito mais simpático a essa idéia do que há algum tempo. Em primeiro lugar, porque estou percebendo que o voto está se “distritalizando” na prática, muitas vezes até em detrimento do eleitorado mais urbano, isto é, o número de ex-prefeitos que se candidatam a deputados e se elegem tem sido cada vez maior. Esses pontos levantados por V. Exª merecem realmente ser analisados quando formos estabelecer a legislação. Primeiro, deve-se verificar quem vai traçar o contorno geográfico desses distritos; segundo, a própria disparidade de área entre os diversos Estados. Da forma como está hoje, um voto proporcional com lista aberta, está havendo não a disputa entre candidatos de diferentes partidos, mas a disputa entre candidatos do próprio partido ou das próprias coligações. Eles disputam muito mais o voto com um “companheiro de chapa” do que com candidatos de outros partidos, de outras coligações. É até uma questão natural. Como a classificação é feita dentro de cada chapa, em função do número de votos, e como, em tese, é muito mais fácil receber o voto de alguém que está disposto a votar num candidato do seu partido do que de outro, acaba havendo essa distorção. A meu ver, a disputa eleitoral deveria ser entre projetos, entre propostas, entre diferentes visões políticas. Não sei bem como vamos corrigir isso. Talvez com a parte proporcional, que vai continuar existindo, do voto distrital misto, com listas, se pudesse diminuir isso. Também não concordo com o argumento de que o voto distrital vai diminuir os custos. É só fazer uma comparação: onde se gasta mais dinheiro: numa eleição para prefeito ou numa eleição para deputado? Onde o peso do poder econômico se faz sentir com mais rigor? Numa eleição para prefeito, que é majoritária, dentro de um determinado distrito, ou numa eleição para deputado? Avalio que é numa eleição para prefeito, que inclusive possibilita maior influência do poder econômico. Feitas essas ponderações, eu gostaria de parabenizar V. Exª pela cautela com que vem abordando esse tema. Entendo, contudo, que, mesmo com toda cautela, é preciso que o Congresso Nacional não só avance na discussão da reforma política, mas também faça algumas reformas urgentíssimas, como é o caso do financiamento público das campanhas. Muito obrigado.

      O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM) - Muito obrigado, Senador José Eduardo Dutra.

      Em que pese alguma divergência entre nós a respeito do voto distrital, a nossa concordância é total quanto ao financiamento público de campanhas com exclusividade. Compartilho do seu ponto de vista e creio que a exclusividade, além de reduzir ainda mais a desigualdade, dá mais transparência.

      Parece-me espúria qualquer contribuição de particulares, esse conúbio de empresas, políticos e partidos mediante financiamento. Isso deveria ser proibido mesmo! Dá mais transparência, porque se sabe, exatamente e com certeza, quanto os partidos estarão autorizados a gastar. Se forem visíveis os gastos superiores ao orçado, ficará muito mais fácil para a Justiça Eleitoral detectar o fato e punir os infratores.

      Por falar nisso, creio que a Justiça hoje funciona com menos eficiência do que deveria, Senador José Eduardo Dutra. Temos cometido o erro de configurar como crimes eleitorais essas irregularidades praticadas. Ora, os crimes têm uma tramitação demorada, vão até o trânsito em julgado da sentença, e muitas vezes, quando o caso é julgado, o infrator ou delinqüente já concluiu o mandato. O melhor seria classificar como infração eleitoral apenas, e não como crime, porém passível de cassação de registro, porque o processo seria muito mais rápido.

      Aparentemente, ao abrandarmos a classificação de crime para infração, na prática, estaríamos tornando muito mais eficaz e rápida a punição. A exclusividade, portanto, dará maior transparência aos gastos de campanha, propiciará à Justiça Eleitoral uma punição mais rápida e mais rigorosa. Tal como acontece na legislação do Imposto de Renda, Senador Lúcio Alcântara, os sinais exteriores de gastos deveriam ser evidentemente levados em conta pela Justiça para aplicação das sanções respectivas.

      O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB-CE) - Senador Jefferson Péres, V. Exª me concede mais um aparte?

      O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM) - Concedo um aparte ao nobre Senador Lúcio Alcântara.

      O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB-CE) - Nobre Senador, eu me esqueci, quando desenvolvi a argumentação sobre o voto distrital -e o aparte do Senador José Eduardo Dutra fez-me lembrar deste argumento- de que o voto distrital elimina a representação da minoria. Trata-se de uma eleição majoritária; disputa-se em uma determinada área geográfica, que se chama distrito, e só irá para a Câmara ou Assembléia aquele deputado que for majoritário. Portanto, se ele tiver 51% -uma hipótese- e o outro, 49%, este estará eliminado. Quer dizer, essa fração do eleitorado, que é expressiva e mereceria uma representação, estará eliminada.

      O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM) - Sim, o voto distrital é majoritário.

      O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB-CE) - É isso o que quero dizer. Se houvesse aqui o sistema distrital puro, será que a representação, por exemplo, do PT teria crescido como vem crescendo ao longo desses anos? Não quero fazer futurologia, mas certamente esse é um argumento ponderável. A minoria não teria representação, mesmo que tivesse uma votação expressiva. E sobre essa questão de correlação entre prestação de contas e, digamos, aparência da campanha, creio que isso poderia ser resolvido de uma maneira muito simples: os tribunais eleitorais deveriam lançar mão de empresas, recrutadas mediante licitação, que iriam estimar em relação ao volume de campanha de cada um -evidentemente considerando uma margem de erro, de tolerância- o que representaria aquilo em termos de gastos. Há pessoas que apresentam uma quantia ridícula e absolutamente desproporcional ao material exposto.

      O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM) - Gastam um milhão e dizem que gastaram R$100 mil oficialmente! Isso é realmente uma farsa.

      O Sr. Bello Parga (PFL-MA) - Permite-me V. Exª um aparte?

      O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM) - Concedo um aparte ao Senador Bello Parga.

      O Sr. Bello Parga (PFL-MA) - Na fase atual, egressos de uma eleição que efetivamente ainda não terminou em alguns Estados da Federação, nada mais natural do que trazermos a debate o assunto eleitoral e o assunto partidário. V. Exª iniciou referindo-se apenas ao voto distrital, mas, com os apartes que recebeu, outros aspectos vieram à baila. No entanto, quero me fixar apenas no voto distrital, do qual, confesso, sou velho batalhador em discussões, debates e em artigos de jornal. Estou cada vez mais convencido quanto a essa questão, muito embora efetivamente eu não o encare, como o nobre Senador Lúcio Alcântara, como uma panacéia universal para resolver os nossos problemas. O problema principal da vida política brasileira é a inautenticidade dos partidos. Daí decorre essa migração que chamam de infidelidade - muitas vezes nem o é. Quero crer que, com o voto distrital puro ou misto, haverá uma maior autenticidade. Os partidos mobilizar-se-ão mais em torno de idéias, como aqui já foi dito. Nas próprias regiões, nos próprios distritos, nos próprios círculos, haverá uma congregação em torno de pensamentos, em torno de doutrinas, e não em torno de pessoas. Portanto, até mesmo na escolha dos candidatos, a democracia penetrará mais quando houver as convenções regionais, as convenções distritais ou como forem denominadas. Entendo que o voto distrital é um voto à frente. O nobre Senador Edison Lobão trouxe a lumine uma circunstância: no nosso Estado, muitos dos que foram eleitos por votação expressiva possivelmente não seriam eleitos. Coloco essa declaração do Senador Edison Lobão sob reserva, porque acredito que as lideranças de nossa terra - entre as quais tenho a satisfação de arrolar S. Exª, que tem manifestado isso ao longo de sua vida política -, firmar-se-ão, ao contrário do que afirma S. Exª, pois terão uma base geográfica, efetivamente com apoio popular. Vou dar um exemplo: houve um candidato, no Maranhão, que dizia que sua meta era obter cem votos por Município. Quer dizer, um candidato com somente cem votos em cada um dos duzentos e dezessete Municípios do Estado não tem obrigação com eleitorado algum! Em eleições outras, um candidato ia, com seu poder financeiro, a determinada região do Estado e lá se elegia, fazendo trocas e conchavos. Como notabilizava-se por não cumprir os compromissos financeiros da campanha, na eleição seguinte ia para outra região, que ainda não tinha explorado, elegendo-se novamente para a Câmara Federal. Dessa forma, acredito que o voto distrital majoritário assegura a governabilidade, porque a corrente de pensamento que for vencedora nos Distritos terá o apoio do Legislativo para sua mensagem, sua doutrina e seu ideário. Acredito que será um passo à frente. Evidentemente, deverá haver um estudo sobre o assunto e para isso não faltarão as luzes dos nobres Senadores que o apartearam, bem como as de V. Exª, Senador Jefferson Péres.

      O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM) - Não há dúvida, o voto distrital tem vantagens e desvantagens, como tudo na vida, afinal de contas, e será debatido exaustivamente no devido tempo.

      A minha presença nesta tribuna é para colocar este meu ponto de vista: tudo será inútil - e não exagero - se não se instituir financiamento público de campanha. Se isso não for feito, repito, mais adiante somente se elegerão ou os candidatos apoiados pelo poder, ou os muito ricos, ou aqueles que se vinculam e se põem a serviço de interesse de empresa. Os pobres, os de Oposição, e os que não querem ou não conseguem vínculos com empresa, esses só se elegerão excepcionalmente. Isso pode ser tudo, Senador Ronaldo Cunha Lima, menos democracia autêntica.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/10/1998 - Página 14421