Discurso durante a 114ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

NECESSIDADE DE APURAÇÃO AUSTERA, PELA PRODURADORIA-GERAL DA REPUBLICA, E PELO CONGRESSO NACIONAL, DOS 'GRAMPOS' TELEFONICOS E DA POSSIBILIDADE DE EXISTENCIA DE CONTAS DE AUTORIDADES NAS ILHAS CAYMAN. ANALISE DO DEFICIT DA PREVIDENCIA SOCIAL. CONSEQUENCIAS DAS RECENTES MEDIDAS ECONOMICAS ADOTADAS PELO GOVERNO FEDERAL.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA FISCAL. :
  • NECESSIDADE DE APURAÇÃO AUSTERA, PELA PRODURADORIA-GERAL DA REPUBLICA, E PELO CONGRESSO NACIONAL, DOS 'GRAMPOS' TELEFONICOS E DA POSSIBILIDADE DE EXISTENCIA DE CONTAS DE AUTORIDADES NAS ILHAS CAYMAN. ANALISE DO DEFICIT DA PREVIDENCIA SOCIAL. CONSEQUENCIAS DAS RECENTES MEDIDAS ECONOMICAS ADOTADAS PELO GOVERNO FEDERAL.
Aparteantes
Casildo Maldaner, Josaphat Marinho.
Publicação
Publicação no DSF de 13/11/1998 - Página 15578
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA FISCAL.
Indexação
  • DEFESA, APURAÇÃO, MINISTERIO PUBLICO, PROCURADORIA GERAL DA REPUBLICA, CONGRESSO NACIONAL, VERACIDADE, AUTENTICIDADE, DOCUMENTO, AUTORIDADE, BRASIL, CONTA BANCARIA, PAIS ESTRANGEIRO, ILHA CAYMAN, IRREGULARIDADE, ESCUTA TELEFONICA, AUTORIDADE FEDERAL.
  • QUESTIONAMENTO, NUMERO, DADOS, ESTATISTICA, DIVULGAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, REFERENCIA, DEFICIT, PREVIDENCIA SOCIAL, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS), ARRECADAÇÃO, PROPORCIONALIDADE, RECEITA, DESPESA, SETOR.
  • CRITICA, GOVERNO, AUMENTO, CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIARIA, FUNCIONARIO PUBLICO, APOSENTADO, FORMA, CRESCIMENTO, ARRECADAÇÃO, SANÇÃO, DEFICIT, PREVIDENCIA SOCIAL, BRASIL.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, nobre Senador Geraldo Melo, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, em primeiro lugar quero afirmar que, como Líder do Bloco de Oposição, como Líder do Partido dos Trabalhadores, consideramos extremamente importante que seja feita uma apuração a mais séria e responsável possível, pelo Ministério Público, pela Procuradoria Geral da República e pelo Congresso Nacional, dos assuntos que começam a ganhar grande importância, ainda mais diante da divulgação, hoje, pela Folha de S. Paulo , de um novo indício de documento de autoridade que pertenceu ao Governo Fernando Henrique Cardoso.  

Avaliamos como extremamente graves tais indícios. Nós - e eu, em especial -, esperamos, acreditamos e torcemos para que, de maneira alguma, autoridades, como o Presidente da República e Ministros de Estado, estejam envolvidas em situações que não gostaríamos de ver acontecer.  

Avalio, Sr. Presidente, que isso seria uma tragédia para o Brasil após o episódio envolvendo Fernando Collor de Mello: depois de ter ganho extraordinária confiança da população, depois de ter sido eleito pelo povo, após mais de 25 anos sem eleições diretas, ele decepcionou a população com suas práticas, que feriram a ética.  

E espero que isso não ocorra com o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Mas, diante dos indícios, é muito importante a averiguação, e tenho a convicção de que o próprio Presidente Fernando Henrique Cardoso e todas as pessoas de seu Governo são as primeiras a querer que tudo seja seriamente averiguado.  

No âmbito do Congresso Nacional e do Senado Federal, a iniciativa que tomamos foi a de requerer ao Presidente da Comissão de Fiscalização e Controle, Senador João Rocha, que convoque o General Alberto Cardoso, Chefe da Casa Militar, para esclarecer sobre o exame que fez dos documentos que chegaram à sua mão, a apuração realizada.  

Ontem, o General Alberto Cardoso informou que encaminhou os documentos ao Ministério Público e à Polícia Federal. Consideramos correto e adequado esse passo e avaliamos que o Congresso Nacional tem que estar a par, tem que conhecer bem aquilo que será realizado pela Procuradoria-Geral da República. Mas continua válida a iniciativa de convocar o General Alberto Cardoso para que ouçamos as conclusões a que chegou até o presente momento.  

O Presidente da Comissão de Fiscalização e Controle, Senador João Rocha, informou-me que está dialogando com o Presidente Antonio Carlos Magalhães, uma vez que haverá na próxima quarta-feira, dia normal de reunião da Comissão, sessão do Congresso Nacional. S. Exª está analisando qual seria o horário apropriado para realizarmos a reunião da Comissão e examinarmos esse documento. Vamos aguardar o resultado.  

Fica registrada a importância de nós, Senadores, tomarmos iniciativas que mostrem que estamos preocupados com uma serena e responsável apuração dos fatos.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, gostaria de tratar agora da questão da política econômica e do conjunto de medidas que o Governo propôs para corrigir os desequilíbrios internos e externos da economia. Como são muitos os aspectos, quero hoje apresentar alguns dados sobre a Previdência, que reputo de grande valia no sentido de tornar o debate sobre o novo pacote fiscal do Governo um pouco mais transparente.  

Os números até agora apresentados, relativos ao chamado déficit previdenciário, escondem informações importantes sobre as causas da dita falência do nosso sistema previdenciário, especialmente no que tange à previdência do setor público.  

Inicialmente, gostaria de abordar o problema do déficit do INSS. Se por um lado o Governo aponta o déficit da previdência privada como sendo da ordem R$7,8 bilhões, ou seja, receitas de R$45,90 bilhões e despesas de R$53,70 bilhões, por outro ele esconde o fato de estar computando como receita apenas aquela fonte referente à contribuição dos empregadores e dos trabalhadores (fonte 144). De acordo com a Constituição, os recursos das demais contribuições sociais como, por exemplo, a Cofins (fonte 153) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (fonte 151), que arrecadaram em 1997 R$18,19 e R$7,18 bilhões, respectivamente, e até setembro deste ano já alcançaram R$13,20 e R$4,96 bilhões, são receitas da Seguridade Social, podendo, portanto, serem utilizados para cobertura de um eventual déficit da Previdência.  

Além disso, mesmo se considerarmos apenas a fonte 144 - Contribuição dos Empregadores e dos Trabalhadores -, sua arrecadação poderia ser bem maior, superando o valor dos benefícios ou, na pior das hipóteses, igualando-se a esse valor, se houvesse um efetivo combate à sonegação ou se não tivesse sido implantada no País uma política recessiva, que provoca o desemprego e empurra o trabalhador para a informalidade, diminuindo a receita de contribuições dos empregadores e dos trabalhadores. Portanto, o déficit no sistema do INSS é, em grande parte, provocado pelo próprio Governo.  

Passemos a analisar o dito déficit da Previdência Pública. Vamos começar pelos números relativos à União. Aqui o Governo apresenta, do lado da receita, somente a contribuição dos próprios funcionários (contribuição dos segurados e servidores) - R$2,6 bilhões. Entretanto, conforme dispõe a Constituição, aqui deveria ser incluída a contribuição do patrão, ou seja, mais R$5,2 bilhões. Todavia, se fizermos uma simulação mais favorável ao Governo, considerando a contribuição de um para um, como ele próprio prega para o caso das fundações de previdência privada estatais, sua contribuição deveria ser de R$2,6 bilhões. Sendo assim a receita correta, no caso do funcionalismo público civil federal, deveria ser de R$ 5,2 bilhões.  

Por outro lado, no que concerne à despesa, o Governo somou ao pagamento dos inativos civis o pagamento dos proventos de reforma e pensão dos militares e parlamentares que, este ano, devem ultrapassar R$6,3 bilhões. Ao adicionar à despesa dos inativos civis a despesa com os militares inativos e com as aposentadorias dos parlamentares, no mínimo, o Governo está agindo de má-fé, pois, como é de seu conhecimento, tanto militares quanto parlamentares dispõem de um outro regime previdenciário. Aliás, é bom que se diga que até hoje o Executivo não encaminhou ao Congresso o projeto de lei que deverá regulamentar a previdência militar.  

Isso posto, as despesas com o pagamento de aposentadorias e pensões dos servidores civis e inativos alcança R$14,3 bilhões e não os R$20,9 bilhões divulgados pelo Ministério da Fazenda. Ou seja, se considerarmos a contribuição do patrão Governo e excluímos os parlamentares e militares da despesa dos inativos civis federais o déficit da Previdência Pública da União cai para R$9,1 bilhões, ao invés dos R$18,3 bilhões propalados. Uma redução de mais de 50%, graças a utilização dos números corretos.  

No tocante aos dados relativos aos déficit da Previdência Pública dos Estados e Municípios, é preciso lembrar que a confiabilidade desses números não é lá muito alta. Mas, mesmo se os consideramos como corretos, deve ser destacado que, quase que com certeza, estão sendo cometidos os mesmos equívocos relativos aos números da União. Assim, na receita não deve estar sendo computada a contribuição dos próprios Estados e Municípios. No que diz respeito à despesa, é provável que estejam sendo adicionados os valores relativos às aposentadorias dos policiais militares, que, todos sabem, são significativamente maiores que as dos militares federais, e a dos parlamentares.  

Ou seja, grosso modo, pode-se dizer que a receita total de contribuições deve ser elevada para R$4,0 bilhões (ao invés dos R$2,01 bilhões apontados pelo Governo) e a despesa com os servidores inativos civis deve ser estimada em torno de R$12,0 bilhões (cerca de 60%¨do total apontado de R$20,1 bilhões, admitindo-se uma participação dos militares estaduais em torno de 40% da folha total de inativos). Portanto, mesmo que os valores das despesas e receitas apontadas pelo Governo estejam corretos (o que, como se viu nos itens anteriores, é muito pouco provável), o déficit previdenciário de Estados e Municípios se reduz para R$8,0 bilhões, ao invés dos R$16,1 bilhões apontados pelo Governo.  

Em suma, sem fazer maiores considerações sobre a razão dos déficits e sobre a forma de equacioná-los, que com certeza não deve ser mediante a absurda elevação das contribuições dos funcionários ativos e inativos da União, o montante dos referidos déficits, computadas as três categorias de regimes previdenciários apontadas pelo Governo, atingiria a, no máximo, R$17,1 bilhões, ao invés os R$42,2 bilhões constantes dos documentos divulgados.  

Não resta dúvida que ainda é um número expressivo. Porém, para que a discussão sobre a forma de equacionar a cobertura desse déficit possa ser tratada em alto nível, o Governo deve apresentar, em primeiro lugar, os números reais e colocar em discussão o déficit relativo à Previdência dos militares e parlamentares. Não se pode eleger os funcionários civis como os "bodes expiatórios", os únicos responsáveis pelo rombo dos cofres da Previdência.  

O Sr. Josaphat Marinho (PFL-BA) - V. Exª me permite um aparte?  

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - Com muita honra, Senador Josaphat Marinho.  

O Sr. Josaphat Marinho (PFL-BA) - V. Exª traz um dado valioso para que o Senado não aceite discutir essa matéria em regime de urgência. Impõe-se um exame criterioso em cada uma das medidas do chamado ajuste fiscal, para que não cometamos injustiça ou temeridade com relação ao interesse social.  

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - Agradeço o aparte, Senador Josaphat Marinho, que mostra exatamente o cuidado que devemos ter com respeito ao exame das reformas relativas à estabilidade fiscal.  

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB-SC) - V. Exª me permite um aparte, Senador Eduardo Suplicy?  

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - Com muita honra, Senador Casildo Maldaner.  

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB-SC) - Senador Eduardo Suplicy, em relação ao que V. Exª está colocando, e conforme afirmou também o Senador Josaphat Marinho, a Bancada do PMDB, liderada pelo nosso Líder, Senador Jader Barbalho, vai-se reunir daqui a pouco, inclusive com economistas de renome nacional e tendências diversas, para estudar essas propostas, a fim de que possamos apresentar alternativas ao País. Diz o nosso Líder que não podemos ficar de braços cruzados diante dessa situação, mas também não podemos emprestar apoio incondicional à proposta apresentada. Devemos, sim, buscar entender o que já existe e ver em que sentido podemos colaborar com a Nação, indo ao encontro do ajuste fiscal, tão necessário e fundamental. Nesse sentido, a nossa Bancada vai-se reunir com esses economistas, de tendências diversas, para buscar a melhor saída para esse debate. Cumprimento V. Exª, Senador Eduardo Suplicy.

 

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - Agradeço o aparte de V. Exª, Senador Casildo Maldaner. Tenho a convicção de que é muito importante que todos os partidos apresentem alternativas para o impasse que a economia brasileira vem vivendo. Contraria o bom senso o fato de que, para resolver um problema de termos que arcar com maiores dívidas, tanto do ponto de vista do endividamento interno quanto do endividamento externo, esteja o Governo a promover um conjunto de medidas que levará a economia a uma maior recessão e a um aumento da taxa de desemprego, que já é extremamente alta.  

Quero assinalar que li com atenção o artigo do Senador Fernando Bezerra , publicado ontem, na Folha de S.Paulo , em que S. Exª, não só como Presidente da Confederação Nacional da Indústria, mas também como Senador eleito no último pleito, no Rio Grande do Norte - continuando aqui por via de eleição direta e não apenas em substituição ao titular que se havia afastado -, alertava a opinião pública e o Governo para algo extremamente grave. Informava S. Exª que a indústria brasileira não quer que a solução seja no sentido de levar a economia para uma maior recessão. Estou de acordo com a estranheza manifestada pelos industriais brasileiros com respeito às medidas de reforma fiscal apresentadas pelo Governo, já que, de um lado, o Governo menciona que é necessário maior racionalidade na estrutura tributária e fiscal brasileira, e, de outro, ao invés de apresentar a sua proposta de reforma tributária, apresenta modificações no que se refere à presente estrutura, que o próprio Governo considera falha, e apresenta aumentos na CPMF e na Cofins, que incidem justamente sobre o grau de competitividade das empresas brasileiras.  

No momento em que se faz necessário corrigir o desequilíbrio externo, soa de maneira estranha a adoção de medidas que possam, inclusive, agravar a situação de competitividade internacional das empresas brasileiras. Seria, portanto, importante que buscássemos uma maior criatividade no que se refere aos instrumentos de política econômica. Quando são diversos os objetivos a serem alcançados - estabilidade de preço, crescimento da economia de acordo com a nossa potencialidade, melhoria da distribuição da renda, aumento da atividade econômica aliado ao aumento das oportunidades de emprego, erradicação da pobreza -, precisamos usar não apenas um, mas diversos instrumentos de política econômica.  

O economista Paulo Nogueira Batista Júnior faz uma análise, em artigo publicado na Folha de S. Paulo hoje, a respeito de condições para desvalorizar a moeda brasileira, expondo que se aproximam as condições razoáveis para se acelerar a desvalorização do real em relação à moeda americana. Quero assinalar que os argumentos aqui expostos pelo Sr. Ministro da Fazenda, Pedro Malan, no sentido de que uma desvalorização causaria, como em outros países em desenvolvimento, problemas sérios para a economia brasileira, se analisados com profundidade, mostram que não está com inteira razão o Ministro Pedro Malan. Para tanto, recomendo aos Srs. Senadores que leiam esse artigo de Paulo Nogueira Batista Júnior, publicado hoje na Folha de S. Paulo . 

Sr. Presidente, na próxima semana farei uma análise mais aprofundada a respeito de como melhor resolver o desequilíbrio externo da economia brasileira e de como criar instrumentos que possam, efetivamente, contribuir para resolvermos os problemas que preocupam a todos nós, brasileiros.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/11/1998 - Página 15578