Discurso no Senado Federal

COMENTARIOS AO ARTIGO DO JORNALISTA JANIO DE FREITAS, PUBLICADO NA FOLHA DE S.PAULO, DE 15 DO CORRENTE, INTITULADO 'QUEM FAZ AS CONTAS', QUE TRATA DA APLICAÇÃO DAS RESERVAS CAMBIAIS BRASILEIRAS. LEGITIMIDADE DO CONGRESSO NACIONAL NA AVERIGUAÇÃO DE DENUNCIAS SOBRE CONTAS NO EXTERIOR, INCLUSIVE COM A INSTALAÇÃO DE COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO.

Autor
Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • COMENTARIOS AO ARTIGO DO JORNALISTA JANIO DE FREITAS, PUBLICADO NA FOLHA DE S.PAULO, DE 15 DO CORRENTE, INTITULADO 'QUEM FAZ AS CONTAS', QUE TRATA DA APLICAÇÃO DAS RESERVAS CAMBIAIS BRASILEIRAS. LEGITIMIDADE DO CONGRESSO NACIONAL NA AVERIGUAÇÃO DE DENUNCIAS SOBRE CONTAS NO EXTERIOR, INCLUSIVE COM A INSTALAÇÃO DE COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO.
Publicação
Publicação no DSF de 17/11/1998 - Página 15760
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • ANALISE, COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, JANIO DE FREITAS, JORNALISTA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), REFERENCIA, APLICAÇÃO, RESERVAS CAMBIAIS, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), OPERAÇÃO FINANCEIRA, EXTERIOR.
  • APOIO, SUGESTÃO, JANIO DE FREITAS, JORNALISTA, OFERECIMENTO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PROCURAÇÃO, ADVOGADO, OBJETIVO, FACILITAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, AUTENTICIDADE, DOCUMENTO, COMPROVAÇÃO, IRREGULARIDADE, EXISTENCIA, CONTA BANCARIA, EXTERIOR.

O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB-PR. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, hoje, no jornal Folha de S. Paulo , o jornalista Janio de Freitas escreve um artigo extremamente interessante e levanta preocupações na linha das demonstradas pelo orador que me antecedeu, Senador Josaphat Marinho. Já apresentei questões semelhantes na Comissão de Assuntos Econômicos, sem que no entanto a Comissão se sensibilizasse. Trata-se, Sr. Presidente, da aplicação das reservas cambiais brasileiras.  

Já tivemos R$75 bilhões em reservas cambiais. Até um determinado tempo, essas reservas eram aplicadas no BIS, uma espécie de banco central dos bancos centrais do mundo. Mais recentemente, o Banco Central passou a se arrogar a prerrogativa de aplicá-las em outros bancos.  

Então, podemos ter um fenômeno com a seguinte configuração: tomamos, Senador Bernardo Cabral, recursos para as reservas cambiais, pagando o teto atual de 42,5%; mas o Banco Central aplica essas reservas, no BIS ou fora dele, por valores em torno de 5% a 6%. É evidente que esses recursos aplicados com essas taxas podem estar retornando ao Brasil para suplementar a necessidade de reservas cambiais com aplicações de 42,5%, com o lucro líquido de 36,5% ao ano, se considerarmos que o Brasil aplicou os recursos a 6%.  

Nesse sentido é o artigo do jornalista Janio de Freitas, publicado na Folha de S. Paulo do dia 15, caderno um, página 14c/5, segundo a Mídia Impressa da Radiobrás. O título do artigo é Quem Faz as Contas . Diz o jornalista:  

"E por falar em dinheirama no exterior (ou você, por acaso, não estava pensando nisso?), a aplicação no mercado financeiro, também externo, das dezenas de bilhões de dólares da reserva brasileira constitui o mais rendoso e mais desconhecido negócio do Brasil. E, com certeza, um dos mais rendosos e mais desconhecidos do mundo.  

As comissões pela aplicação dos dólares possuídos pelo Brasil (hoje US$42 bilhões, que eram US$75 bilhões até setembro) representam uma enormidade de dinheiro, sobre a qual não se dispõe das informações que é justo esperar de qualquer governo."  

Fazendo um parêntese no artigo de Janio de Freitas, Sr. Presidente, o fundamental é que o Senado não dispõe dessas informações, que já foram por mim solicitadas aos membros do Banco Central, mas a resposta é sempre tortuosa e, quando explicitamente requerida, é frustrada por essa conversa mole de sigilo bancário.  

"Tamanha massa de dinheiro excita a cobiça dos grandes bancos aplicadores e corretoras do mundo todo, para participar dos lucros com as operações no mercado financeiro. Não há, porém, nem a mais tênue clareza sobre a escolha dos bancos e corretoras internacionais agraciados com o privilégio de operar, mundo afora, as dezenas de bilhões.  

Não consta que haja concorrência para a escolha desses operadores privilegiados.  

Como é feita, então, a escolha?  

Mais importante ainda, quem participa dessa escolha tão valiosa? Ou, mais claramente, quem a negocia? Não faltariam por parte dos corretores internacionais, para conseguir os milhões de lucro com operação dos bilhões, propostas com vantagens especiais que são feitas até a investidores privados, desde que mais abonados do que a média. Que propostas são feitas, digamos, ao Brasil?  

O destino das reservas é definido, claro, nas culminâncias do Governo. Consta que esse destino, em termos geográficos, é a Europa, para evitar riscos provenientes de dívidas nos Estados Unidos. Mas a aplicação na Europa não exclui, necessariamente, bancos e corretoras americanas, também lá instaladas. Por fim, consta que o grosso dos dólares está em apenas cinco operadores – o que sugere, entre outras coisas, uma concentração arriscada.  

Mesmo essas aparentes respostas são, na verdade, apenas perguntas. Nada é claro nas aplicações externas dos bilhões cujo sobe e desce está condenando o Brasil a mais anos perdidos ou vidas perdidas.  

E por falar em dinheirama no exterior, há um modo simples de eliminar, com razoável rapidez, o clima de escândalo e suspeições que Fernando Henrique Cardoso diz, com o conhecido otimismo, haver chegado já aos limites. Basta-lhe fazer, agora, a proposta que Mário Covas fez logo em sua primeira reação, embora, por motivos compreensíveis no seu caso, ninguém se interessasse em aceitá-la."  

Continuarei a leitura, mas, neste momento, em outro parêntese, associo-me à opinião do jornalista Janio de Freitas: ninguém, no Brasil, consideraria a simples hipótese de um homem correto como Mário Covas ter uma conta no exterior.  

"É só oferecer uma procuração plena para verificação, em Cayman e seus condutos, do que sugerem o papelório e o palavrório dominantes. Um advogado de reconhecida idoneidade, escolhido em comum por Fernando Henrique e, por exemplo, pela OAB, por certo prestaria tal serviço ao País. Nem tem que mexer com propriedade da fazenda ou com o real valor das quotas da agropecuária Córrego da Ponte Ltda. Nada disso. Só Cayman e adjacências.  

O Brasil conta com esse gesto."  

Ao invés de declarações pré-programadas e de uma irritação artificial, caberia ao Presidente da República aceitar a sugestão do jornalista Janio de Freitas da Folha de S.Paulo e imediatamente procurar o Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, pedindo a nomeação de um advogado que, junto com outro, de sua indicação pessoal, receberia a procuração e restabeleceria a tranqüilidade por intermédio da obtenção rápida da verdade a respeito das contas supostamente existentes nas ilhas Cayman.  

Encerro com um questionamento que não é do jornalista Janio de Freitas. Vivemos sem o financiamento público das eleições. Considero apenas duas hipóteses após uma campanha eleitoral: ou faltou dinheiro ou sobraram recursos. A maioria dos doadores não exige ou condiciona sua doação à inexistência de um recibo. Se houve sobra de recursos, em qualquer campanha, incluindo a campanha passada do Presidente, seguramente os recursos que sobraram, que sobejaram não foram costurados num travesseiro ou num colchão. Eles, de alguma forma, se sobraram, foram aplicados provavelmente com a decisão ética – e não legal – de serem utilizados numa próxima campanha eleitoral. Se não faltou, sobrou; e se sobrou, onde está?  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/11/1998 - Página 15760