Discurso no Senado Federal

HOMENAGEM AOS CENTO E CINQUENTA ANOS DE NASCIMENTO DE JOAQUIM NABUCO E O CINQUENTENARIO DA FUNDAÇÃO JOAQUIM NABUCO.

Autor
Romero Jucá (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/RR)
Nome completo: Romero Jucá Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM AOS CENTO E CINQUENTA ANOS DE NASCIMENTO DE JOAQUIM NABUCO E O CINQUENTENARIO DA FUNDAÇÃO JOAQUIM NABUCO.
Publicação
Publicação no DSF de 22/10/1999 - Página 28116
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE NASCIMENTO, JOAQUIM NABUCO (PE), ESCRITOR, JORNALISTA, ADVOGADO, POLITICO, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, FUNDAÇÃO JOAQUIM NABUCO (FUNDAJ).

O SR. ROMERO JUCÁ (PSDB - RR) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, passar por este mundo, todos passam. Deixar uma marca, no entanto, nem todos deixam. Mas, mesmo que muitos deixem uma marca, deixar uma contribuição indelével, no entanto, é tarefa para poucos. Felizmente, há os que passam, deixam a marca, a marca viceja, produz frutos para a posteridade e continua marcando o mundo. É a uma dessas pessoas, uma das que deixam uma marca frutífera, que quero homenagear hoje: Joaquim Nabuco.  

Nascido pernambucano, esse brasileiro saiu espalhando sua sabedoria, sua vivência, sua simplicidade não só em sua terra natal, mas em todo o Brasil. Falecido, inspirou a criação de uma fundação que leva seu nome e que continua a executar seus propósitos de melhor conhecer o Brasil para transformá-lo.  

Como não é hábito entre nós cultuar a memória de figuras como ele, permitir-me-ei fazer um breve passeio pela biografia de Joaquim Nabuco, a fim de que todos possam apreciar sua vida e obra.  

Comemoramos este ano, em 19 de agosto, os 150 anos de seu nascimento. Tendo nascido na metade do século passado e vivido até os dez primeiros anos deste século, ele pôde participar de alguns dos mais importantes eventos de nossa história. Como seu nome está ligado à Fundação Joaquim Nabuco, sua memória perpetuará, também, nesse século que nasce.  

Não faltava a Nabuco uma ascendência ilustre: do lado do pai, ele próprio Senador (José Tomás Nabuco), alguns de seus ancestrais foram Senadores do Império, desde o Primeiro Reinado; do lado da mãe, os Paes Barreto, descendia de uma linhagem de nobres e de administradores públicos. Criado num engenho (Massangana), levaria para sempre na memória a questão dos escravos. Talvez por isso, sua opção, não obstante toda a sua origem aristocrática, tenha sido de lutar contra as desigualdades.  

Saindo de Pernambuco, teve a oportunidade de estudar no Rio de Janeiro (Nova Friburgo) até o Secundário; estudou Direito em São Paulo, sendo contemporâneo de figuras ilustres, como Rui Barbosa, Castro Alves, Rodrigues Alves e Afonso Pena. Posteriormente, no Recife, concluiria seus estudos.  

Em Recife, escreveu A escravidão , uma manifestação de seu compromisso. Naquela cidade chocou a elite ao defender, em um júri, um escravo negro que assassinara o seu senhor. Uma escolha que marca bem sua trajetória de "rebeldia", mesmo que, aos olhos de alguns, tenha sido considerado um conservador.  

Em 1870, transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde começou a atuar no escritório de advocacia do pai e iniciou-se no jornalismo, no A Reforma . Dois anos depois, passa um ano na Europa, em contato com intelectuais e políticos. O contato com culturas de outros países, aliás, marcaria sua vida pública e intelectual. Assim, seu primeiro cargo público é de adido da legação brasileira nos Estados Unidos; coincidentemente, seu último cargo será também nos EUA, como embaixador.  

Entre 1879 e 1889, com algumas interrupções, exerceu o cargo de deputado, com participação destacada, tendo em vista sua oratória e, principalmente, independência frente ao governo. Algumas de suas atuações mais destacadas, foram:  

Campanha contra a escravidão, em favor da abolição da escravatura;

Combate a um projeto de exploração do Xingu e defesa dos direitos dos indígenas;

Crítica a uma proposta de estímulo à migração de chineses que deveriam substituir os escravos nas atividades agrícolas;

Fundação da Sociedade Brasileira Contra a Escravidão;

Defesa do projeto de libertação dos sexagenários, apesar de considerá-lo muito moderado;

Defesa de projeto de lei em favor da federação das províncias.

Em sua luta pelo abolicionismo, chega a ter, em 1888, uma audiência particular com o Papa Leão XIII, em que relatou a luta pelo abolicionismo no Brasil. Possivelmente, sua atuação influenciou o grande Pontífice na elaboração de uma encíclica contra a escravidão. Nesse mesmo ano, dá grande contribuição à elaboração da Lei Áurea.  

Em 1889, foi eleito deputado por Pernambuco, para a última legislatura do Império, mesmo sem ir ao Recife e sem solicitar o apoio do eleitorado. Com a Proclamação da República, posiciona-se como monarquista e recusa cadeira na Assembléia Constituinte de 1891.  

Entre 1893 e 1899, Nabuco dedica-se intensamente à atividade intelectual, sendo que, em 1896, participa da fundação da Academia Brasileira de Letras, que teve Machado de Assis como seu primeiro presidente e Nabuco como secretário perpétuo.  

Volta a assumir um cargo público em 1899 para defender o Brasil na questão de limites com a então Guiana Inglesa, causa da qual era árbitro o rei Victor Emanuel da Itália. Nessa ocasião, iniciou um processo de afastamento do grupo monarquista e a sua conciliação com a República.  

Em 1905, Nabuco foi nomeado embaixador do Brasil em Washington. Nessa condição ligou-se muito ao governo norte-americano e defendeu uma política pan-americana, baseada na doutrina de Monroe. Naquele país, viajou bastante e proferiu dezenas de conferências em universidades. Essa militância o levaria a organizar a III Conferência Pan-americana, realizada no Rio de Janeiro, com a presença do secretário de Estado dos Estados Unidos.  

Na condição de embaixador, veio a falecer em Washington, após um longo período de doença.  

Mas seu espírito inovador serviu de inspiração a muitos políticos e intelectuais. Tanto é assim que, na legislatura de 1946-1950, Gilberto Freyre apresenta o projeto de criação do Instituto Joaquim Nabuco. A idéia era homenagear Nabuco como reformador social. A criação desse instituto reconduz o Recife ao antigo "esplendor de Centro de Renovação Social e Intelectual do Brasil".  

Foram muitas as dificuldades enfrentadas pelo primeiro diretor, José Antônio Gonsalves, com os entraves burocráticos e a falta de recursos. Num levantamento feito por Clóvis Cavalcanti, nos primeiros dez anos, devido às dificuldades, foram poucas as produções científicas. Mas nos trinta anos seguintes, seria fecunda a produção da hoje Fundação Joaquim Nabuco.  

Mas o que mais se precisa destacar é o propósito dessa instituição: a produção e veiculação de conhecimentos voltados para romper desigualdades, no mesmo espírito de Joaquim Nabuco. Se em seu tempo, a principal desigualdade a ser combatida era a da escravidão, hoje, com todo o avanço político, econômico e tecnológico, multiplicaram-se por muitas as desigualdades. São desigualdades regionais, econômicas e culturais. Partindo das desigualdades regionais, vemos que o Nordeste continua figurando como região menos privilegiada da produção econômica nacional. Passando para as desigualdades de natureza tecnológica, temos que o agricultor nordestino continua a utilizar meios ultrapassados de produção. Chegando à desigualdade cultural, vemos que a cultura nordestina luta para se manter viva, diante da invasão propiciada pelos meios de comunicação.  

A todos esses setores – e a mais alguns – dedica-se a Fundação Joaquim Nabuco. Muitas são as questões que ocupam o trabalho da FUNDAJ, como revelam os nomes de seus órgãos e projetos:  

Cultura, Identidade e Pensamento Social no Brasil;

Estado, Cidadania e Atores Sociais;

Gênero, Família e Idade;

Desenvolvimento Regional, Urbano;

Políticas Públicas, População e Exclusão Social;

Agricultura e Meio Ambiente;

Pesquisa, Conservação e Restauração de Documentos e Obras de Arte;

Museu do Homem do Nordeste;

Escola de Governo e Políticas Públicas;

Desenvolvimento Profissional;

Produções Multimídia;

Editora;

Estudos sobre a Amazônia.

Tanto o trabalho de Joaquim Nabuco quanto o da Fundação Joaquim Nabuco revelam um só compromisso: o conhecimento a serviço da transformação social. Ao primeiro, rendemos as nossas justas homenagens, nestes 150 anos de seu nascimento; à segunda, nos seus 50 anos de fundação, expressamos o nosso desejo de sucesso nos projetos que vem desenvolvendo.  

Que práticas como essa se multipliquem, pois somente com o desenvolvimento de conhecimento intensivo seremos capazes de desenvolver o Brasil; não apenas desenvolvê-lo economicamente; não apenas ampliar a riqueza material; mas enriquecer as pessoas; universalizar a educação; socializar os conhecimentos e, por fim, acabar com as desigualdades que ainda imperam entre nós. Como faria o próprio Joaquim Nabuco, se vivo fosse. Essa, sim, é a maior homenagem que podemos prestar a ele.  

Era o que tinha a dizer.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/10/1999 - Página 28116