Discurso durante a 120ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Justificativa à apresentação do Projeto de Lei do Senado 215, de 2000-Complementar, lido na presente sessão.

Autor
Nabor Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Nabor Teles da Rocha Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO FISCAL.:
  • Justificativa à apresentação do Projeto de Lei do Senado 215, de 2000-Complementar, lido na presente sessão.
Publicação
Publicação no DSF de 16/09/2000 - Página 18741
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO FISCAL.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, APRESENTAÇÃO, PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR (PLP), PREENCHIMENTO, OMISSÃO, LEGISLAÇÃO, RESPONSABILIDADE, NATUREZA FISCAL, IMPEDIMENTO, EXECUTIVO, MANIPULAÇÃO, ESTIMATIVA, RECEITA LIQUIDA, REDUÇÃO, COTA, LEGISLATIVO, JUDICIARIO, MINISTERIO PUBLICO, ESTADOS.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB - AC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estou apresentando nesta data, confiante no apoio dos demais Senadores e dos Srs. Deputados, projeto de lei complementar que se destina a cobrir uma grande lacuna existente na atual Lei de Responsabilidade Fiscal, aprovada pelo Congresso Nacional - a Lei Complementar nº 101, de 2000.

            Em seu art. 19, define-se o conceito de “receita corrente líquida”; no seguinte, é estabelecida a participação de cada um dos Poderes em seu montante, nos níveis Federal, Estadual e Municipal. Trata-se, portanto, do estatuto básico da administração pública em todo o País, o qual contempla, inclusive, os percentuais de cada pilar constitucional.

            Assim sendo, o inciso I do art. 20 prevê que, no plano federal, o Legislativo receberá 2,5% da receita corrente líquida, cabendo 6% ao Judiciário, 40,9% ao Executivo e 0,6% ao Ministério Público. Nos Estados, o Legislativo recebe 3% e assume as despesas do respetivo Tribunal de Contas; o Judiciário fica com 6% e o Executivo com 54%, fechando-se as vinculações com a atribuição de 2% para o Ministério Público.

            Existem outras especificações que V. Exªs, decerto, já conhecem ampla e profundamente. Portanto, deixo de mencioná-las de maneira expressa, inclusive porque a questão é de macropolítica, pois atinge os próprios pressupostos do regime republicano, federativo e, sobretudo, democrático, que juramos defender.

            O cerne da questão está no poder que tem o Executivo de coordenar e dar números à proposta orçamentária anual, enviando ao Legislativo montantes globais que não podem ser alterados e cujas rubricas são sujeitas a severas restrições acautelatórias.

            Com isso, ao estabelecer sua previsão de receita, fixa, automaticamente, o limite das despesas que serão permitidas aos demais beneficiários da Lei de Meios. Teoricamente, havendo erros na estimativa, deles surgirão inevitáveis reflexos concretos na fixação de cotas para todos os organismos a elas sujeitos.

            A anualização orçamentária tem os montantes definidos, portanto, em período anterior ao seu início, com dois valores de naturezas distintas: a arrecadação é prevista, ou seja, na prática seus números não são absolutos; já a receita é fixada, o que impede qualquer alteração, a menos que haja lei específica nesse sentido.

            Se a estimativa de receita for manipulada, minimizando-se os seus valores, achatam-se os repasses constitucionais, que ganham números fixos e definitivos, pois, mesmo que se arrecade muito mais do que o previsto, o que tiver sido destinado a cada um dos Poderes continuará imutável.

            A Constituição Federal, em seu artigo 2º, afirma: “são poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Os Estados, em suas respectivas Cartas, seguem essa norma salutar, que, para tornar-se ainda mais taxativa, desce a minúcias como determinar que “ao Poder Judiciário é assegurada autonomia administrativa e financeira”.

            Quando determina isso, a Constituição vai muito além de manifestar simpatia pelos magistrados. O escopo é garantir que, tendo autonomia administrativa e financeira, terão também autonomia jurisdicional, cumprindo seu dever sem se exporem a pressões ou ameaças de qualquer natureza. Afinal, quem depende financeiramente de outrem dificilmente terá isenção para tomar decisões que afetem o tutor.

            Consciente da gravidade do problema propiciado pela atual redação da Lei de Responsabilidade Fiscal, diante, inclusive, de um caso concreto de conduta deletéria por parte de um Executivo estadual, estou apresentando, nesta data, o seguinte Projeto de Lei, para cujo teor peço especial atenção da Casa:

            Projeto de Lei do Senado nº , de 2000

            Acrescenta dispositivo ao art. 20 da Lei Complementar n° 101, de 4 de maio de 2000.

            Acrescente-se ao art. 20 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, o seguinte dispositivo:

            § 7° - Sempre que a receita corrente líquida superar em mais de 10% (dez por cento) o valor total da previsão estabelecida na Lei Orçamentária, o excedente será repassado para os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, e para o Ministério Público, obedecidos os limites estipulados nos incisos de I a III do caput deste artigo.

            Justificativa

            Os Orçamentos da União, dos Estados e dos Municípios são as peças básicas da administração pública, em cada um dos três níveis, principalmente no que diz respeito aos pagamentos devidos a seus servidores e dignitários.

            Incumbindo ao Executivo a coordenação das propostas oriundas dos demais Poderes e sua consolidação no Projeto de Lei Orçamentária para o exercício fiscal seguinte, dele passam os outros a depender, sujeitando-se, inclusive, ao corte de recursos essenciais para seus investimentos e programas de manutenção.

            Havendo manipulação das estimativas de receita por parte do Executivo, para menos do que seria realmente previsível, as cotas do Legislativo, do Judiciário e demais participantes da despesa estão sujeitas a um achatamento iníquo e absurdo. Ocorrendo isso, torna-se inevitável a quebra da autonomia administrativa e ética dos prejudicados, forçados a negociar, em pleno exercício, créditos suplementares para honrar compromissos claramente assumidos e cuja viabilidade se viu fulminada.

            O Projeto tem a prudência de desconsiderar pequenas oscilações de arrecadação e determina que o repasse de adicionais aos Poderes só ocorrerá quando eles superarem em mais de 10% a receita corrente líquida do exercício. Ao mesmo passo, preserva também as normas cautelares dos percentuais estatuídos na Lei de Responsabilidade Fiscal.

            Não se trata de especulação. Existe, ao menos, um caso concreto de tão deletéria conduta: no Acre, o Presidente da Comissão de Orçamento da Assembléia Legislativa, Deputado Luiz Calixto, acusou o Governador de reduzir à condição de “reféns” os demais Poderes, dizendo: “Podemos afirmar que a receita é muito maior do que nos é informado nos projetos”. E, numa indagação, prevê sérias ameaças ao equilíbrio das entidades do Estado: “A quem interessa essa imobilidade dos Poderes?”

            Os Poderes devem ser harmônicos, sim. Mas a própria Constituição faz questão de determinar a independência de cada um, estabelecendo, inclusive, normas estritas para sua autonomia financeira. Isso, todavia, pode ser quebrado por ações como a denunciada no Estado do Acre, cuja correção - e prevenção, para não se repetir em outras Unidades - é o escopo do presente Projeto, que, decerto, receberá amplo e pronto apoio dos demais Representantes com assento no Congresso Nacional.

            Salas das Sessões, em

            Senador Nabor Júnior

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, citei o Estado do Acre não por ser adversário leal e franco do atual Governo, mas porque é o único em que já surgiram denúncias concretas de manipulação da estimativa de receita corrente líquida - denúncias que crescem, em força e gravidade, quando são feitas por um aliado do Governador.

            Em entrevista concedida à imprensa, na semana retrasada, o Deputado Luiz Calixto já advertia para a situação vexatória a que estão expostos o Legislativo, o Judiciário e o Ministério Público estaduais, induzidos a, de pires na mão, “mendigar” dotações extras e, assim, conseguir fechar o ano fiscal.

            Nas palavras do nobre representante do PMN encontramos uma advertência candente e extremamente grave: “É uma cena deprimente, que tem que acabar: o Governo tem que repassar recursos para salários, investimentos e despesas diversas - e essa verba tem que dar para todo o ano, inclusive para o 13º salário, outro tormento nesses Poderes”.

            Na última segunda-feira, o Presidente da Comissão de Orçamento da Assembléia Legislativa se reuniu com representantes de todos os Poderes do Estado e fez ver que a situação atual que tem de ser corrigida, porque é inaceitável submeter o Parlamento, os Magistrados e os Promotores ao talante do Governador. Lembrou que, no ano passado, o Projeto de Orçamento foi subestimado e, portanto, a Assembléia Legislativa (ALEAC) recebeu apenas R$20 milhões dos R$27 bilhões de que precisaria para cumprir seus compromissos fixos.

            A cobertura que o jornal A Gazeta fez da reunião não deixa margem a dúvidas: os Presidentes dos demais Poderes estão rejeitando essa situação, porque “eles foram unânimes em afirmar que não querem mais ser reféns do poder financeiro do Executivo”. A repórter, Kátia Chaves, ouviu do Deputado Luiz Calixto uma pergunta que deve trazer a nós todos a mais profunda inquietação: “a quem interessa essa imobilidade dos Poderes?”

            E acentua:

“Queremos aprovar uma lei que dê autonomia financeira aos Poderes. A LDO é uma peça figurativa, porque, depois de aprovada, passado um mês, fica totalmente desvirtuada. Orçamento Participativo, por exemplo, é balela. Queremos que essa lei se aproxime da realidade e para isso queremos que também seja cumprida”.

            E conclui a matéria de Kátia Chaves:

“O Governo do Estado apresenta a lei com valores subestimados de receita. Em 99, por exemplo, estava prevista no Orçamento uma arrecadação de R$423 milhões, mas o Estado fechou o ano com R$723 milhões no caixa. Para 2000, essa estimativa foi até menor, de R$390 milhões - o Governo, no entanto, comprovou até 28 de agosto uma receita de R$434 milhões”.

            Ou seja, no primeiros oito dos 12 meses do ano, o Governo do Estado arrecadou quase R$45 milhões acima do que havia previsto para todo o exercício. O que entrar a partir de agora, em setembro, é dinheiro sem aplicação expressamente determinada.

            Enquanto isso, Legislativo, Judiciário e Ministério Público comprimem seus gastos e se vêem obrigados a bater às portas do Palácio, de pires na mão - como afirma o Deputado Luiz Calixto - em busca de dotações extraordinárias que lhes permitam pagar as contas.

            Essa tarefa está ainda mais árdua a partir de agora, porque a Lei de Responsabilidade Fiscal recém-sancionada pelo Presidente da República reduziu de 5,3% para 3% a participação do Legislativo nas receitas do Estado. E, mais grave ainda, incorporou ao seu orçamento o Tribunal de Contas, que, até agora, tinha autonomia financeira.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não é meu intuito trazer para este plenário qualquer questiúncula paroquial. Muito ao contrário, apresento hoje à consideração do Congresso Nacional um projeto que tem largas implicações em todos os Estados, prevenindo a ocorrência de um problema concreto, capaz de afetar o equilíbrio, a harmonia e a independência de seus Poderes.

            Se mencionei diretamente o Estado do Acre, é porque lá ocorreu a primeira denúncia concreta da ocorrência do grave problema, que, portanto, em algum tempo do futuro, poderá vir a se repetir em qualquer outra Unidade da Federação.

            E essa ameaça é uma das graves que poderiam ser feitas à democracia.

            Muito obrigado.

 


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/09/2000 - Página 18741