Discurso durante a 30ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A OBSOLESCENCIA DO METRO DE BRASILIA E A GESTÃO DO GOVERNADOR JOAQUIM RORIZ.

Autor
Lauro Campos (PT - Partido dos Trabalhadores/DF)
Nome completo: Lauro Álvares da Silva Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF).:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A OBSOLESCENCIA DO METRO DE BRASILIA E A GESTÃO DO GOVERNADOR JOAQUIM RORIZ.
Publicação
Publicação no DSF de 07/04/2001 - Página 5647
Assunto
Outros > GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF).
Indexação
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, AUMENTO, GASTOS PUBLICOS, PUBLICIDADE, PERIODO, CRISE, ECONOMIA.
  • CRITICA, JOAQUIM RORIZ, GOVERNADOR, DISTRITO FEDERAL (DF), INFERIORIDADE, ALCANCE, METRO, CAPITAL FEDERAL, AUSENCIA, INTEGRAÇÃO, CIDADE SATELITE, SUPERIORIDADE, CUSTO, INVESTIGAÇÃO, IRREGULARIDADE, CORRUPÇÃO, OBRA PUBLICA.

O SR. LAURO CAMPOS (Bloco/PT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho hoje à tribuna fazer eco ao foguetório soltado pelo Governo Federal ao retomar - parece - uma posse inicial, com promessas que se vão somando àquelas que não foram cumpridas desde o palanque inicial, o primeiro com o qual sua majestade, o Presidente da República Fernando Henrique Cardoso, conquistou o seu primeiro reinado. Agora, no segundo reinado, já houve, pelo menos, duas posses menores, subposses, nas quais o Governo mostra-se reabastecido em sua imaginação, reabastecido em sua capacidade verbal, reabastecido pelos meios de propaganda de modo geral, de televisão em especial - não há dúvida de que o Presidente da República é um ser televisivo; dá-se muito bem na televisão.

A crise econômica fez com que os gastos em publicidade ultrapassassem os gastos em guerra e espaço, setores que, desde sempre, têm sido as prioridades envergonhadas e reais, isto é, os setores em que o capitalismo mais gasta dinheiro. Agora, com a crise, passou a ser prioridade, momentaneamente, a publicidade. As empresas, quebrando, obviamente, tentam segurar a clientela, manter o seu nível de atividade e de lucro, aumentando a publicidade, aumentando a propaganda. E o Governo em crise faz o mesmo; parece-me que R$480 milhões foram gastos pelo Governo Federal em propaganda no ano passado.

Aqui, o nosso Governador Joaquim Domingos Roriz aproveita-se da conclusão do metrô - parece que é a conclusão, mas não é. Ele está inaugurando a pré-conclusão do metrô. Há cerca de dez anos, o Sr. Joaquim Domingos Roriz foi ao cartório e registrou que o metrô seria inaugurado em seis anos, num dia qualquer dos primeiros meses após seis anos do início das obras. Desse modo, o Sr. Joaquim Domingos Roriz é dos poucos brasileiros que tem uma mentira registrada em cartório!

Vamos ver o que está acontecendo em Brasília com o tal do metrô. Há um equívoco atrás do outro. O Sr. Joaquim Domingos Roriz afirma que o metrô é um meio muito moderno de transporte. Moderno como? O primeiro metrô do mundo, o de Londres, teve sua construção iniciada em 1865! Assim, o metrô não pode ser considerado um meio de transporte tão moderno. Além disso, o metrô de Londres é, realmente, um metrô. Vamos ver que isso que foi inaugurado tem apelido de metrô, tem custo de metrô, mas não é metrô. Faz-se uso indevido da palavra por analogia - uma analogia muito precária - com os metrôs que foram construídos a partir de 1865.

O metrô de Londres, por exemplo, tem 1.350 quilômetros de rede metroviária. O de Brasília tem cerca de 40 quilômetros. O de Londres tem 1.350 quilômetros, e esse metrozinho de Brasília, 40 quilômetros! Além disso - existem muitos “além disso” -, o Sr. Joaquim Domingos Roriz parece não perceber bem a diferença entre as coisas e, julgando assim superficialmente, transformou um transporte leve, de superfície, em metrô. São coisas totalmente diferentes.

            O metrô verdadeiro é outra coisa. Em Paris, por exemplo, lá em Montmartre, o metrô tem cerca de 70 metros de profundidade. O metrô é um sistema de transporte horizontal e vertical, tem que ter elevador, tem que ter escadas rolantes, tem que ter diversos níveis, de modo a permitir que as linhas de metrô se cruzem, uma em cima da outra.

Vou tentar dar uma explicação: se você chega em Paris e compra uma passagem em uma estação qualquer do metrô, você desce uma escada e pega o metrô que passa naquele nível. Ou, então, conforme o caso, para onde você queira ir, você desce um ou dois níveis e pega o metrô que passa no segundo ou no terceiro nível. Compra-se, por exemplo, um tíquete, uma passagem, e pode-se entrar na linha azul. Na linha azul, você pega o metrô, anda por cinco quilômetros, desce da linha azul e sobe ou desce alguns andares, de elevador, como acontece em Montmartre, ou de escada rolante, e entra em um metrô da linha vermelha. Pega a linha vermelha, anda por dois ou três quilômetros, desce da linha vermelha, sobe ou desce um, dois ou três andares para pegar o metrô, por exemplo, da linha laranja, que vai levá-lo ao ponto final ou para onde você queira ir.

Aqui não existe isso. O metrô do Sr. Roriz, cuja construção foi orçada em R$600 milhões - isso para todo o projeto -, na realidade, já consumiu R$1,3 bilhão, quantia que daria para construir mais um metrô, mas não para construir um metrô de verdade, porque, quando se constrói uma linha sobre a outra, quando se faz uma construção a 50 metros de profundidade para passar uma linha, como acontece em Montmartre, por exemplo, é óbvio que o custo é muitas vezes maior do que o de se colocar um metrô, um trem leve de superfície, na superfície.

Aqui em Brasília, o metrô afunda em um sistema de trincheira - não um sistema utilizado desde 1865, em Londres -, pois, em vez de se fazer um túnel para o metrô passar, um outro túnel por baixo desse para passar uma linha de metrô de outra cor e um outro túnel mais abaixo ainda, o que aqui se fez foi o seguinte: o metrô do Sr. Roriz, o transporte leve de superfície, mergulha apenas quando chega no início da Asa Sul; ali foi feita uma trincheira, um buraco - que depois foi coberto -, por onde passa o trenzinho do Sr. Roriz.

Já falei há muito tempo, desde a minha campanha, que o metrô seria privatizado, e é o que se confirma agora: vai ser privatizado. Naquela época, eu chamava esse metrô de “trenzinho do Canhedo”. Quem é que vai comprar ou receber esse presente? Será, obviamente, uma grande empresa de transportes. A maior naquela ocasião - e penso que é ainda hoje - era a do Sr. Canhedo, da Vasp.

Inaugurado agora o “metrô”, o que se verifica é que ainda serão necessários R$285 milhões para concluir o projeto. E o Sr. Roriz já ameaça levar o metrô para diversas cidades-satélites. Ora, um metrô que só liga Samambaia ao Plano Piloto, que só tem praticamente uma linha, não pode ser um sistema como esse que estou descrevendo, onde diversas linhas se entrecruzam e permitem, portanto, por exemplo, em Brasília, que o passageiro que pegue o metrô na rodoviária possa descer no final da Asa Sul e pegar um outro metrô para o Lago Sul, para o Gama, para o Núcleo Bandeirante ou para qualquer outra cidade satélite. Mas, nessas localidades, não há metrô. Ou seja, nunca haverá um metrô digno desse nome, um sistema integrado horizontal e vertical de transporte.

Certo dia, em uma estação de metrô em Paris, tive curiosidade em saber o que estava por baixo, como era o sistema que permitia uma grande estabilidade ao metrô nas curvas. Abaixei-me, então, sustentando-me nas mãos e nos pés, para ver o que estava debaixo do metrô. Devo ter sido a única pessoa do mundo a fazer essa ginástica para olhar debaixo do metrô. E por quê? Porque sabia ou desconfiava que deveria haver uma outra roda sustentando aquelas rodas - uma roda sobre os trilhos e uma outra dentro daquela, para impedir que o metrô não se desestabilizasse -, e realmente isso acontece. Então, até mesmo nos trens, existe uma grande diferença.

O sistema daqui não permite que o trenzinho ande na velocidade que alcança em Londres, em Paris ou em qualquer outra cidade onde haja realmente um metrô.

Além disso, ainda faltam R$285 milhões para completar esse trecho do metrô. Imaginem se agora fossem querer estendê-lo a outras cidades-satélites! Só daqui ao Gama são mais 40 quilômetros, o que consumiria mais R$1,4 bilhão. Jamais chegaremos lá! Para chegarmos a Planaltina e Sobradinho, gastaríamos, portanto, cinco ou seis vezes mais do que já gastamos.

Mas ainda existe um outro defeito gravíssimo: em todos os metrôs do mundo, há uma preocupação com as pessoas, os passageiros. Aqui em Brasília não se pensou nisso. O que acontece? Em Roma, o passageiro sai do metrô e entra em uma sotto passagio pedonale, quer dizer, o metrô está ligado a um túnel, a uma passagem subterrênea, que leva o passageiro para o outro lado da rua. Aqui em Brasília não há isso. O metrô vai despejar o passageiro em cima dos Eixos ou de outros locais, podendo haver, portanto, um outro desastre metroviário. Ou seja, poderá haver um aumento no número de atropelamento, pois as pessoas, saindo do metrô, serão despejadas nos eixos, nas ruas, onde sabemos que a velocidade dos carros é bastante elevada.

Assim, sem um underground, sem uma sotto passagio pedonale, sem um sistema como esse, um verdadeiro crime é cometido contra a população.

De modo que não houve também uma CPI. Não se pode mais falar em CPI neste País. Quando o Governo afirma que não admite mais CPI, o que ele está fazendo? Passando aquele antigo ditado “ou todos nos locupletamos, ou todos roubamos, ou restaure-se a dignidade” para o imperativo “todos nos locupletamos”, porque o Governo não deixa restaurar a moralidade por meio da CPI. E assim, no Brasil, foi dada a autorização para todos roubarmos, todos nos locupletarmos, porque a moralidade jamais será restaurada. É uma traição restaurar a moralidade, de acordo com a fala de Sua Excelência, o Presidente da República.

E o que vemos também é que não houve apuração destes desvios: o projeto foi orçado em R$600 milhões, foram gastos R$1,3 bilhão, e faltam ainda R$280 milhões. E está totalmente incompleto!

E o que disse o Sr. Roriz nesse caminho da total irresponsabilidade, da proibição de se apurar os desvios, os roubos, as falcatruas e as maracutaias? Disse, no entusiasmo da inauguração do seu trenzinho, com quase 10 anos de atraso: “Que custe R$1 bilhão ou R$2 bilhões, isso não é o mais importante; o importante é o serviço para a população”. Quando um Governador diz que não importam os custos, está repetindo aquele velho ditado: “Rouba-se, mas faz-se”.

Diante de tantas deficiências e insuficiências, houve vários desastres metroviários antes da inauguração do metrô. Imaginem no dia em que for inaugurado!

E, no mesmo dia da inauguração, como era de se prever, S.Exª disse que a operação será terceirizada. Realmente, este R$1,6 bilhão que deverá custar finalmente isto que eles chamam de metrô será privatizado, terceirizado. E como as empreiteiras que fazem essas grandes obras são pouco numerosas - em Brasília, são umas três ou quatro -, é óbvio que o Governo não tem interesse em apurar as falcatruas, a roubalheira. Por quê? Porque nas próximas eleições são essas três ou quatro empreiteiras que irão, novamente, sustentar a campanha, dar dinheiro para os políticos vencerem as eleições. De modo que eles não têm interesse algum em apurar os fatos. Por isso, apesar de o metrô ter levado tanto tempo e ter provocado tantos desastres metroviários, não foi aberto inquérito algum sobre esses desmandos.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/04/2001 - Página 5647