Discurso durante a 109ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Edição da Resolução 3.018, do Banco Central do Brasil, que regulamenta a renegociação de dívidas de pequenos produtores.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA. POLITICA SOCIAL.:
  • Edição da Resolução 3.018, do Banco Central do Brasil, que regulamenta a renegociação de dívidas de pequenos produtores.
Publicação
Publicação no DSF de 11/09/2002 - Página 17470
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, OBTENÇÃO, SENADO, APROVAÇÃO, EMENDA, ALTERAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), PRORROGAÇÃO, DIVIDA, PRODUTOR RURAL, RESULTADO, EDIÇÃO, RESOLUÇÃO, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), REGULAMENTAÇÃO, PROGRAMA ESPECIAL, CREDITOS, REFORMA AGRARIA.
  • CRITICA, EXCLUSÃO, PRODUTOR RURAL, EMPRESTIMO, RECURSOS, FUNDO DE AMPARO AO TRABALHADOR (FAT), RENEGOCIAÇÃO, DIVIDA AGRARIA, MOTIVO, FALTA, RESPONSABILIDADE, AGENTE FINANCEIRO, ORIENTAÇÃO, PEQUENO PRODUTOR RURAL.
  • EXPECTATIVA, RESULTADO, ELEIÇÕES, VIABILIDADE, REFORMULAÇÃO, MODELO ECONOMICO, ATENDIMENTO, INTERESSE SOCIAL, REDUÇÃO, DESEMPREGO, COMBATE, MISERIA, POBREZA, MAIORIA, POPULAÇÃO, PAIS.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (PSB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Senado Federal há muito tempo tem dedicado grande parte dos seus debates ao problema da repactuação e do alongamento da dívida dos produtores rurais.

Sem dúvida, tratou-se de uma luta muito grande, da qual participaram vários Senadores, empenhados todos que estávamos, e ainda estamos, em resolver, em definitivo, a questão do endividamento rural que, ao longo destes anos, tem-se agravado, notadamente porque o Governo, insensível ao sofrimento do homem do campo, aos problemas ocasionados pela rigidez das normas bancárias e a baixa remuneração dos nossos produtos, conseguiu elevar o montante da dívida, em muitos casos, a um valor impagável.

Vários Senadores pronunciaram-se sobre isso - não só Valadares, como a Senadora Heloísa Helena - procurando sensibilizar o Governo para que entendesse que esse montante chegou à estratosfera não por culpa do produtor rural, mas da política econômica estabelecida pelos Ministérios da Fazenda e do Planejamento, uma vez que correções monetárias indevidas foram impostas aos produtores rurais. Como exemplo, posso citar a incidência da TJLP sobre o financiamento ou sobre os contratos rurais perante as agências financeiras.

Era incabível a perpetuação dessa imposição, uma vez que a agricultura brasileira, como sabemos, por não ser subsidiada, jamais poderia se responsabilizar pelo pagamento de uma dívida em que a correção monetária cobrada sobre o endividamento tornava impraticável qualquer negociação. Mesmo assim, o Governo insistiu e só em 1998, diante da gritaria geral dos Senadores e Deputados, entendeu que esses índices absurdos não poderiam continuar fazendo parte dos financiamentos rurais.

Entretanto, quem tomou financiamento antes dessa data - a partir de 1994, por exemplo - sofreu os efeitos da cobrança monetária indevida. Milhões de produtores rurais ficaram impossibilitados, diante da inadimplência, de tomar novos financiamentos. Alguns deles abandonaram em definitivo a atividade no meio rural, o que significou, sem dúvida alguma, desemprego e fome, principalmente nas regiões mais pobres, como o Nordeste, o Norte e o Centro-Oeste, que deveriam merecer um tratamento diferenciado das autoridades econômicas, tendo em vista sofrerem, mais que as regiões desenvolvidas, o impacto determinado pela política econômica do Governo.

Entretanto, Sr. Presidente, apesar das resistências oferecidas pelo Governo, o Senado Federal e a Câmara dos Deputados conseguiram algumas vitórias, o que considero importante, porque foi a primeira vez, no âmbito do Senado Federal, que uma medida provisória conseguiu ser alterada pelo Poder Legislativo. Antes, as medidas provisórias eram intocáveis. Na prática, não podiam ser alteradas. A toque de caixa e a repique de sino, elas tinham de ser aprovadas pelo Congresso Nacional, sem a mudança de uma vírgula sequer. Foi por ocasião da discussão da Medida Provisória nº 9 que o Senado Federal tomou a primeira posição de independência em relação ao Governo Federal, em vez da submissão que antes ocorria.

Dessa posição, nasceu um benefício importante: uma emenda de nossa autoria conseguiu o rebate de 40% a 14% da dívida dos produtores rurais. O Governo, não se conformando com sua derrota aqui no Senado, ameaçou vetar a matéria e não dar nenhum benefício aos produtores rurais. Entretanto, o Senado Federal e a Câmara dos Deputados bateram pé. O fato é que o Governo fez uma negociação com o Poder Legislativo, e, mesmo não se alcançando os 40% do rebate, baixou o desconto para 35%. Considero que essa posição do Governo em não aceitar in totum aquilo que aprovamos ou integralmente aquilo que era desejo do Senado Federal tenha sido uma represália, como se ele dissesse: “O Senado aprovou, mas quem manda sou eu”.

Diante da realidade e como foi pequena a diminuição estabelecida pelo Governo para o percentual de desconto das dívidas, terminamos aceitando. O Governo e a Oposição uniram-se aqui no Senado, e foi aprovada outra medida provisória que embutia esse desconto da ordem de 35% para os financiamentos de 1994 e de até 14% para os financiamentos de 1998.

Então, aceitamos a negociação, que redundou na Resolução nº 3.018, aprovada pelo Banco Central no dia 4 deste mês. Essa resolução regulamenta o que foi aprovado pelo Senado Federal com relação ao Procera - Programa Especial de Crédito para a Reforma Agrária -, com taxa de juros de 1,15% ao ano. Todos esses créditos referentes ao Procera poderão ser regularizados até o dia 31 de outubro deste ano.

O vencimento das dívidas do Procera foi alongado para o prazo de até 15 anos, e será concedido um bônus de 70% sobre cada parcela a vencer. Quer dizer, a regularização ocorrerá até o dia 31 de outubro, mas a repactuação, ou negociação propriamente dita, irá até o dia 30 de novembro. O produtor rural incluído no Procera e interessado em renegociar sua dívida deverá manifestar-se perante o agente financeiro até o dia 31 de outubro, para regularizar sua situação. E há outro benefício: as parcelas vencidas do Procera farão parte da renegociação.

Além disso, os agricultores familiares, os míni e pequenos produtores rurais e suas cooperativas e associações, ao amparo de recursos dos Fundos Constitucionais de Financiamento do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, cujos valores originalmente contratados sejam inferiores a R$15 mil e cujas operações tenham sido formalizadas até o dia 31 de dezembro de 1997, terão rebate de 8,8% em seu saldo devedor e substituição dos encargos financeiros originalmente pactuados pela taxa de juros de 3% ao ano, devendo tais beneficiados efetuar, até 31 de outubro deste ano, o pagamento mínimo de 10% das parcelas vencidas até 31 de março de 2002. No caso de liquidação antecipada da dívida - vejam se isso é possível nesta situação de crise que estamos vivendo -, o Governo daria um bônus de 10% aos agricultores familiares vinculados ao Pronaf.

Os financiamentos representados pelos investimentos agropecuários dos míni e pequenos produtores, cujos valores contratados foram acima de R$15 mil, também terão um rebate de 10% nas parcelas vencíveis.

A resolução do Banco Central define pequeno e miniprodutores rurais como sendo os que têm 80% de sua renda, no mínimo, baseada na atividade agropecuária e não agropecuária do estabelecimento, ou aqueles cuja renda familiar bruta anual seja de aproximadamente R$30 mil.

Para os financiamentos com base nos Fundos Constitucionais, de até R$200 mil, o prazo de renegociação será até 31 de outubro deste ano, e o desconto que poderá ser concedido aos produtores enquadrados nessas operações varia de 34% - para quem obteve o financiamento no ano de 1994 - a até 14%, para financiamentos de 1998.

Portanto, Sr. Presidente, apesar de alguns benefícios, de algumas conquistas consolidadas na Resolução nº 3.018 do Banco Central, ainda há produtores rurais não contemplados, como os que renegociaram suas dívidas com base na Lei nº 9.138, ou seja, que pediram dinheiro emprestado acreditando tratar-se de Fundo Constitucional. No entanto, eram recursos do FAT.

Nesse caso, houve irresponsabilidade dos agentes financeiros, que não orientaram devidamente os tomadores do empréstimo ou do financiamento, não lhes disseram que o empréstimo era oriundo do FAT - que é um financiamento diferenciado -, nem que essa situação poderia causar-lhes embaraços futuros. Nada disso foi explicado, e o produtor rural assinou contratos sem saber o que estava fazendo. Quem tomou financiamento baseado em recursos oriundos do FAT ficou fora da renegociação.

Considero essa atitude, Sr. Presidente, uma maldade cometida pelos agentes financeiros, que deveriam ser responsabilizados. O Governo deveria abrir espaço a esses que tomaram tal tipo de empréstimo. São milhares e milhares de produtores rurais no Nordeste, em Minas Gerais, no Centro-Oeste e no Norte do País impossibilitados de qualquer renegociação, simplesmente porque foram ludibriados em sua fé e assinaram contratos prejudiciais a futuras negociações. Suas dívidas, agora, estão fora de qualquer processo de reescalonamento.

Por isso, novas etapas virão em nossa luta no Senado Federal para a inclusão, entre os beneficiários de qualquer renegociação das dívidas rurais, dos tomadores de empréstimo com base nos recursos provenientes do FAT, Fundo de Amparo ao Trabalhador, bem como daqueles que, em virtude da política econômica perversa instalada por esse Governo, ficaram inadimplentes, sem condição alguma de propor renegociação ao banco.

Sr. Presidente, enalteço a luta do Senado Federal, que, pela primeira vez, conseguiu modificar uma medida provisória do Governo apesar das pressões que recebeu, dando prova de muita independência, discernimento e solidariedade ao homem do campo. Atualmente, o agronegócio está contribuindo de forma mais efetiva para a nossa balança de pagamentos do que outras atividades econômicas que, antes, pesavam muito em nossas divisas. Em termos de geração de emprego, o agronegócio está colaborando, em nosso mercado de trabalho, mais do que a própria construção civil, que sempre foi fator preponderante de abertura de frentes de trabalho principalmente para a população de baixa renda ou para pessoas sem nenhuma qualificação profissional - no caso de serventes, pedreiros etc.

A construção civil sempre foi o carro-chefe do emprego no Brasil. Mas, como este País reduziu substancialmente os seus investimentos no setor habitacional, notadamente a Caixa Econômica Federal, que, há 10 ou 12 anos, era responsável pela construção de milhares de casas pelo Brasil afora, o Governo abandonou essa prioridade e passou a dedicar-se quase exclusivamente ao pagamento da dívida externa.

Assombrosamente, Sr. Presidente, no próximo ano, o orçamento será de aproximadamente R$1 trilhão. Entretanto, quase R$600 bilhões são reservados para o pagamento dos encargos da nossa dívida, sem considerar os R$93 bilhões que serão utilizados para o pagamento de juros. Desse modo, 59% do que arrecadamos deverão ser reservados para o pagamento da dívida contraída pela União. Não estou incluindo nesse montante a dívida dos Estados e dos Municípios nem a dívida contraída pelas empresas. Estou falando da dívida pública do Governo e da União.

Sr. Presidente, esperamos que, com essa eleição que será realizada em 6 de outubro, se consiga instalar no Brasil um novo modelo econômico que seja voltado para os interesses sociais, para as prioridades que devem consubstanciar um governo que tenha a solidariedade humana, que tenha solidariedade com as regiões mais pobres do nosso País, como o Nordeste, o Norte e o Centro Oeste.

O próximo Governo terá a imensa responsabilidade de resgatar esse grande débito que o Brasil tem para com os mais pobres. São mais de 50 milhões de brasileiros que ganham menos de R$80 por mês e que estão abaixo da linha de pobreza.

É inconcebível, Sr. Presidente, que o desemprego esteja atingindo índices tão alarmantes. Só em Sergipe, meu Estado, nestes últimos três anos, nada menos que 4.300 pequenas e médias empresas desapareceram da atividade econômica, gerando desemprego e desespero na nossa sociedade. O que estamos vendo em Sergipe é o retrato vivo do que ocorre em todo o Brasil, num atestado eloqüente de que a nossa programação econômica, o nosso plano de governo precisa ser mais consentâneo com as necessidades básicas da população: emprego e renda.

Precisamos abrandar a preocupação, como disse o Senador Ney Suassuna no início desta sessão, com relação à violência que atormenta o povo brasileiro, um povo de índole marcante e boa. A crise que enfrentamos atualmente nos apresenta ao mundo como pessoas insensíveis. Mas, na realidade, a insensibilidade não está no povo, mas nas políticas públicas implementadas sem auscultar os interesses maiores da sociedade.

Portanto, Srªs e Srs. Senadores, minhas palavras são de perspectivas melhores para o Brasil com um governo totalmente diferente do atual, um governo que encare o cidadão como ser humano, não apenas como mero joguete eleitoral daqueles que desejam continuar no poder.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

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SEGUE DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR ANTONIO CARLOS VALADARES EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/09/2002 - Página 17470