Pronunciamento de Íris de Araújo em 29/07/2003
Discurso durante a 20ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Necessidade de um grande investimento do governo na área de moradia popular.
- Autor
- Íris de Araújo (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
- Nome completo: Íris de Araújo Rezende Machado
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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PREVIDENCIA SOCIAL.
POLITICA HABITACIONAL.:
- Necessidade de um grande investimento do governo na área de moradia popular.
- Publicação
- Publicação no DSF de 30/07/2003 - Página 20566
- Assunto
- Outros > PREVIDENCIA SOCIAL. POLITICA HABITACIONAL.
- Indexação
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- COMENTARIO, AUMENTO, DEFICIT, PREVIDENCIA SOCIAL.
- GRAVIDADE, PROBLEMA, DEFICIT, HABITAÇÃO, BRASIL, AUMENTO, CONFLITO, INVASÃO, EDIFICIO, TERRENO, ZONA URBANA, INSUFICIENCIA, PROGRAMA, LANÇAMENTO, GOVERNO FEDERAL.
- PROPOSTA, UNIÃO, GOVERNO FEDERAL, GOVERNO ESTADUAL, GOVERNO MUNICIPAL, MUTIRÃO, POPULAÇÃO CARENTE, PLANEJAMENTO, CONSTRUÇÃO CIVIL, HABITAÇÃO, PREVISÃO, NUMERO, TOTAL, ANO, DESCENTRALIZAÇÃO, OBRA PUBLICA, PREVENÇÃO, MIGRAÇÃO, UTILIZAÇÃO, MÃO DE OBRA, DESEMPREGADO, DADOS, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), CUMPRIMENTO, DIREITOS SOCIAIS, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em pleno debate da reforma previdenciária, quando o aspecto mais polêmico da discussão é o chamado rombo da Previdência, eis que assistimos a um brutal aumento desse rombo, que chegou a R$9,5 bilhões no primeiro semestre de 2003.
Nesse período, as contribuições para o INSS somaram R$36,1 bilhões, mas o pagamento de benefícios subiu para R$45,6 bilhões. Tudo isso em conseqüência da crise, que corrói como ferrugem a renda dos trabalhadores.
Quanto mais experiência acumulo nesta vida, seja em que campo for, mais entendo o valor da persistência. Muitas vezes é só na quarta, na quinta ou na décima repetição do mesmo esforço que alcançaremos o nosso objetivo. O francês Jacques Lacan, psicanalista e teórico da psicanálise, costumava afirmar que “só faz a sério quem faz em série”. Ou seja, até a seriedade de um trabalho depende da repetição.
Por isso - diante da gravidade da questão social neste momento - não me constranjo de voltar a me referir, mais uma vez, à necessidade urgente de se construirem, em todo o Brasil, mais e mais moradias populares, para abrigar as centenas de milhares de famílias brasileiras que, nos últimos anos, transformaram ruas, praças, pontes, bueiros e até cavernas cavadas na rocha em lugar de moradia.
Mais recentemente, as invasões de edifícios e terrenos, públicos ou privados, têm sido a solução encontrada para hordas de desempregados ou subempregados, que não têm condições de pagar aluguel e, muito menos, de construir, por si próprios, uma habitação. Desesperados, pais de família deixam-se seduzir pela voz dos radicais, que os incitam a mais e mais invasões, que resultam em mais e mais possibilidades de violência, de enfrentamento.
Ainda outro dia, dei meu apoio ao programa de moradias lançado pelo Governo Federal, reconhecendo-lhe a qualidade, mas lamentando a pouca quantidade, pois o que se pretendia realizar não ia além de 5% do total do nosso déficit habitacional.
O Brasil inteiro quer muito mais e precisa de muito mais. Nos últimos dois dias, numa operação apaga-incêndio, o Governo deu sinal de que pretende ampliar seu programa de moradias. Ontem, reunido em clima de grande preocupação, o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social recomendou algumas medidas urgentes, entre elas o incentivo à construção civil.
Mesmo com a tendência a ser menos tímido, esse Governo, formado por lideranças forjadas na luta contra as desigualdades sociais, ainda não entendeu que, para provocar mudanças, é preciso um choque de quantidade, porque, para um déficit de moradias superior a sete milhões de unidades, pouca diferença fará construir pouco mais de 300 mil habitações em um ano. Esse número fará, tenho certeza, a felicidade de 300 mil famílias, mas o tamanho da exclusão continua em mais de seis milhões!
Numa linha de atuação propositiva, apresentei neste plenário o documentário que registrou os resultados de um programa de moradias populares, baseado na tradição dos mutirões, que realizamos na Capital e em todo o Estado de Goiás há mais de duas décadas. A iniciativa despertou em vários Senadores a memória de projetos semelhantes realizados em outros Estados, com resultados mais do que satisfatórios.
Hoje, proponho a união dos Governos Federal, Estaduais e Municipais, mais os trabalhadores sem teto, para construírem, de imediato, dentro de um cálculo cuidadosamente elaborado por quem tem ampla experiência no setor, 1,740 milhão de novas moradias por ano. É preciso ter uma meta, um prazo, e é preciso ser ousado! Os chineses não construíram a Muralha da China? Os brasileiros, Senador Hélio Costa, já foram capazes de construir no cerrado uma nova e avançada Capital.
De acordo com essa proposta, absolutamente possível de ser implementada, os 500 maiores Municípios do Brasil construiriam cada um 100 casas por mês, apenas 100 casas por mês! Ao ano, no País, seriam 600 mil residências.
Vamos dar seqüência ao raciocínio, Sr. Presidente. Os 500 Municípios de porte médio teriam a tarefa de edificar 50 casas por mês, tão somente 50 moradias! Ao ano, seriam 300 mil tetos para nossas famílias.
Por fim, 3,5 mil Municípios ficariam com a incumbência de erguer vinte casas por mês, somente vinte casas! Mas, ao ano, seriam 840 mil novas residências por este Brasil afora.
Somando essas três frentes, ao ano, no País haveria exatamente 1,740 milhão de novas moradias. Em quatro anos, seriam 6,960 milhões de novas casas, o que praticamente zera o déficit brasileiro, calculado em sete mil residências.
Veja bem, Sr. Presidente, que estamos fazendo um cálculo para baixo, envolvendo apenas 4,5 mil dos 5,561 mil Municípios brasileiros, mas é lógico que todas as cidades acabarão sendo envolvidas por essa maravilhosa movimentação que visa a garantir a cidadania e a dignidade de nosso povo. Isso significa que o nosso déficit realmente seria zerado.
E é preciso construir em todas as localidades do País, para que os Municípios onde a oferta aumenta não se tornem pólos de atração de sem teto. É evidente que é necessário atender aos que estão acampados em invasões, mas também é preciso acudir os que vivem sob risco, em condições inumanas. É preciso que haja um processo visível em todas as regiões e áreas do País, para despertar a confiança das pessoas, desestimulando as invasões.
Ao Governo Federal, caberiam os recursos para o material de construção; aos Governos Estaduais, a responsabilidade de oferecer a infra-estrutura, água, energia, urbanização; e, às Prefeituras, a oferta dos terrenos e a coordenação do programa em cada Município, com oferta de assistência técnica e plantas. Aos sem-teto, caberá a tarefa de construir em regime de mutirão. Tendo um terreninho e condições de construir, o povo constrói - disso ninguém duvida. Constrói de imediato para se abrigar e vai construindo a vida toda, melhorando e embelezando a casa própria, porque é sua propriedade.
Além de diminuir o custo, o mutirão possibilita ao cidadão em situação de carência a participação direta na construção de sua casa, tornando-o mais forte, estimulando sua auto-estima, libertando-o da posição de mero recebedor.
Vamos envolver na construção da casa própria milhares de pessoas desempregadas, que hoje vivem sob tendas de plástico, no improviso e na promiscuidade, colocando em risco a vida e a saúde física e psíquica das crianças.
Além de mais barata, a construção de moradias em mutirão vai tirar das gavetas de nossas universidades uma quantidade incrível de alternativas de materiais e técnicas de construção já descobertos e testados. Assim, vamos fazer a real e verdadeira extensão universitária, dando significado social ao trabalho dos nossos pesquisadores.
Só um programa desse tipo, que envolva, que apaixone, que mobilize muita gente pode fazer o milagre da mudança tão esperada. Essa é a obra de um estadista. Essa é, neste momento, a mais bela obra sob a liderança do Presidente que escolhemos.
Hoje, o IBGE tem condições de rastrear cada rua de cada Município, cada pequena corrutela da zona rural, as favelas, as regiões ribeirinhas, as moradias de risco nas encostas. O IBGE sabe onde e o quanto falta. E nem precisamos mais de números. Basta olhar, do alto, o acampamento dos sem-teto no terreno da Volkswagen ou as crianças nordestinas correndo risco sob frágeis pontes de material improvisado, construídas sobre os alagados. O que falta é fazer e fazer em grande escala.
É preciso que leis sejam cumpridas. A Constituição brasileira considera a moradia um direito do cidadão. Esse direito tem de sair da letra para a realidade. Diante do pavoroso cenário de exclusão social que estamos vivendo, é preciso, com urgência urgentíssima, provar a todos que a democracia é o melhor caminho para a solução dos nossos problemas sociais.
E o melhor argumento possível é aquele que se fundamenta na mudança concreta, na transformação, na inclusão dos excluídos.
Não estou dizendo nenhuma novidade: a construção civil é o ramo de atividade que mais emprega justamente naquele setor em que há mais mão-de-obra disponível. Nas últimas décadas, tanto as atividades mais pesadas, como a de pedreiro, quanto as mais delicadas, como a de colocador de azulejos e outros acabamentos, empregam, inclusive, muita mão-de-obra feminina. E, no Brasil inteiro, na cidade e na roça, estamos assistindo ao fenômeno da transformação dos núcleos familiares, com mais e mais mulheres responsáveis pelo sustento da família.
A construção civil, por si só, movimenta toda uma cadeia produtiva, que começa na corretagem e termina no mobiliário. É uma infinidade de empregos que podem ser gerados. E, mais do que empregos, que já representam uma transformação importantíssima, a possibilidade de tirar do desamparo milhões de brasileiros sem teto.
Por isso, mais uma vez, volto a sugerir: experimentem, Srs. Ministros, financiar a construção de moradias em sistema de mutirões.
Srªs e Srs. Senadores, ou o Brasil se une para criar soluções ou nos separamos cada vez mais, aumentando os graves problemas que já enfrentamos. Não tenho vocação para profeta do apocalipse, mas meu coração e minha razão me dizem: não há mais tempo de espera. Já vivemos com muito sofrimento e à beira do abismo. O próximo passo tem de ser a construção de uma ponte sobre esse abismo. E essa ponte é, sem dúvida nenhuma, toda feita de moradias para os brasileiros sem teto.
O povo quer. O Brasil pode. Moradia já!
Muito obrigada.