Discurso durante a 140ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Audiência na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania com o Ministro da Fazenda, Antônio Palocci. Congratulações à advogada iraniana Shirin Ebadi, laureada com o Prêmio Nobel da Paz de 2003. Implantação do programa de renda mínima em todo o País.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA TRIBUTARIA. POLITICA SOCIAL.:
  • Audiência na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania com o Ministro da Fazenda, Antônio Palocci. Congratulações à advogada iraniana Shirin Ebadi, laureada com o Prêmio Nobel da Paz de 2003. Implantação do programa de renda mínima em todo o País.
Aparteantes
Eduardo Azeredo, Mozarildo Cavalcanti, Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 11/10/2003 - Página 31181
Assunto
Outros > REFORMA TRIBUTARIA. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • REGISTRO, PRESENÇA, ANTONIO PALOCCI, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA, SENADO, ESCLARECIMENTOS, REFORMA TRIBUTARIA, SIMPLIFICAÇÃO, RACIONALIZAÇÃO, SISTEMA TRIBUTARIO, OBJETIVO, AUMENTO, CAPACIDADE, ECONOMIA, BRASIL, CONCORRENCIA, PAIS ESTRANGEIRO, REDUÇÃO, ONUS, EMPRESA, CONTRATAÇÃO, TRABALHADOR.
  • APOIO, INICIATIVA, GOVERNO FEDERAL, INCLUSÃO, PROGRAMA, RENDA MINIMA, TEXTO, PROJETO, REFORMA TRIBUTARIA, OBJETIVO, FAVORECIMENTO, FAMILIA, BAIXA RENDA, PESSOA CARENTE.
  • COMENTARIO, APROVAÇÃO, COMISSÃO DE FINANÇAS, TRIBUTAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, PROJETO DE LEI, CRIAÇÃO, PROGRAMA, RENDA MINIMA, CIDADANIA, CARACTERISTICA, COMPATIBILIDADE, PROPOSTA, GOVERNO FEDERAL, RACIONALIZAÇÃO, UNIFICAÇÃO, DIVERSIDADE, PROGRAMA ASSISTENCIAL, EXECUTIVO.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Paulo Paim, em primeiro lugar, quero fazer um registro em relação à exposição do Ministro Antonio Palocci, ontem, perante a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.

S. Exª, de uma maneira muito consciente e brilhante, manifestou-se a respeito da reforma tributária. Diante de Senadores das mais diversas facções partidárias, tanto de apoio ao Governo como de oposição, S. Exª se saiu muito bem. Explicou de forma extraordinária como é que a reforma tributária está procurando alcançar diretrizes que venham a racionalizar o sistema tributário brasileiro, promover maior justiça e trazer simplicidade para que a economia brasileira possa competir em melhores condições com outros países. A reforma busca também uma maior racionalização para a possibilidade de trabalhadores serem contratados sem que haja grande peso sobre a folha de pagamento e haja meios de se realizar justiça em nosso País.

Quero registrar, Sr. Presidente, que de há muito tenho dialogado com o Ministro Antonio Palocci, inclusive sobre um dos aspectos que foi objeto de minha argüição ontem. O Presidente Lula e o Ministro Palocci, ao elaborarem essa proposta de reforma tributária, colocaram, no art. 203, parágrafo único, que a União instituirá um programa de renda mínima. Vou falar agora na forma que foi acordada no diálogo que mantive com o Ministro neste ano, confirmada ontem por ocasião da sua exposição. “A União instituirá programa de renda mínima destinado a assegurar a subsistência das pessoas e das famílias, priorizando-se inicialmente as de baixa renda, podendo ser financiado e realizado por meio de convênio com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, na forma da lei”.

Na forma original, estava apenas “das famílias”, e sugeri que fosse acrescentado o termo “das pessoas”. Sugeri também - e isto foi aceito - que fosse acrescentado “priorizando-se inicialmente as de baixa renda”. Na forma original, estava expresso “na forma da lei complementar”, e sugeri que fosse retirada a palavra “complementar”, uma vez que o Senado Federal já aprovou, por unanimidade, em dezembro de 1991, primeiro um projeto que institui um programa de garantia de renda mínima; e, em dezembro de 1992, também por unanimidade, um projeto de lei que institui uma renda básica de cidadania - que é uma forma de garantia de renda mínima que, no meu entender e de muitos economistas, é a mais racional de todas. Portanto, como o Senado Federal já aprovou a matéria em lei ordinária de iniciativa do Senado e ambos os projetos tramitam na Câmara dos Deputados, já em fase de votação conclusiva, seria perfeitamente razoável que esse assunto fosse tratado na forma simplesmente de lei ordinária, não se exigindo lei complementar.

Quero dar uma boa nova, Sr. Presidente. Na última quarta-feira, a Comissão de Finanças e Tributação, da Câmara dos Deputados, votou favoravelmente ao projeto de lei que institui uma renda de cidadania, conforme parecer do Deputado Paulo Bernardo, do PT do Paraná, inteiramente favorável ao que foi aprovado pelo Senado em dezembro de 2002, ou seja, o projeto do Senador Francelino Pereira que institui o Programa de Renda Básica de Cidadania. Esse projeto de lei diz que, a partir de 2005, será instituída uma renda de cidadania para todos os brasileiros e mesmo para os estrangeiros residentes no Brasil há cinco anos ou mais, iniciando-se pelas camadas da população mais necessitadas, a critério do Poder Executivo, que definirá um nível de renda de cidadania que, conforme o progresso do País e a disponibilidade de recursos, será adotado gradualmente.

Desde o início do Partido dos Trabalhadores, em 1980, e desde quando foi Prefeito de Ribeirão Preto, em 1995, Antonio Palocci foi dos primeiros chefes de Poder Executivo a instituir um programa de garantia de renda mínima. Isso veio facilitar a compreensão desses fatos. S. Exª, hoje, persuadido de que se trata de uma medida de grande relevância do ponto de vista econômico e social com vistas à realização de justiça no País, está, portanto, de acordo com essa proposição.

Sr. Presidente, o projeto de lei aprovado agora na Comissão de Finanças e Tributação, da Câmara dos Deputados, vai para a Comissão de Constituição e Justiça e de Redação. Ele foi aprovado em caráter conclusivo naquela primeira Comissão, e agora a Comissão de Constituição e Justiça e de Redação vai averiguar sua pertinência do ponto de vista de compatibilidade com a Constituição - o que certamente ocorrerá, pois tanto o Senado quanto a Comissão de Finanças da Câmara dos Deputados já o aprovaram unanimemente. Então, não tenho dúvidas de que, ainda neste ano, a renda básica de cidadania virá a se tornar lei.

Quero ressaltar que a forma como está redigida a renda básica de cidadania, segundo o meu projeto de lei, modificado pelas sugestões do Senador Francelino Pereira, é inteiramente compatível com o que o Presidente da República anunciará no próximo dia 20, quando unificará, racionalizando e coordenando melhor, os diversos programas de transferência de renda hoje existentes. Trata-se de uma medida que constitui um passo na direção correta de instituirmos essa renda básica de cidadania.

Sr. Presidente, hoje também quero ressaltar a premiação do Nobel da Paz concedida à advogada iraniana Shirin Ebadi, que se destacou, em uma nação islâmica, na defesa dos direitos das mulheres e das crianças e dos direitos humanos - direitos esses que precisam ser assegurados a toda a humanidade. Esse prêmio certamente está sendo motivo de grande alegria para o povo iraniano. Apresento nossos cumprimentos à Srª Shirin Ebadi pela premiação como Nobel da Paz.

A propósito da reação havida ontem diante das declarações da Srª Asma Jahangir, que, representando as Nações Unidas, sugeriu-nos que seria importante que não apenas o Executivo, mas também o Poder Judiciário respeitasse os direitos humanos em nosso País, a minha compreensão, Sr. Presidente, diante das observações de inúmeros Parlamentares, que avaliaram que a Srª Asma não poderia fazer declarações dessa natureza sobre o Poder Judiciário, é que as observações dela, inclusive sobre o Poder Judiciário, deveriam ser tomadas como cooperação para nós mesmos. O Poder Judiciário não deveria temer nenhum tipo de cooperação por parte da ONU quando esta nos chama a atenção a respeito do que está ocorrendo em nosso País.

A Srª Asma Jahangir, do Paquistão, em verdade, chamou a atenção para falhas gravíssimas que estão ocorrendo no País, ao visitar, por exemplo, a unidade de assistência inicial da Febem, no Braz, em São Paulo. Sr. Presidente, primeiramente, foi-lhe negado o direito de visitar aquela instituição; posteriormente, o Governador Geraldo Alckmin reviu a sua decisão e, inclusive, solicitou ao Vice-Governador Cláudio Lembo para acompanhá-la àquela unidade da Febem. Ali, S. Sª testemunhou a existência de 62 camas e 150 colchões, portanto, haveria lugar, no máximo, para 150 jovens, de 14 a 20 anos. No entanto, lá estavam internos nada menos do que 630 jovens aproximadamente. Então, ela saiu de lá dizendo: “horrível, horrível, horrível”.

O fato de ela ter testemunhado esse fato, Senador Ramez Tebet, certamente levará o Governador Geraldo Alckmin a acelerar a correção de um problema para o qual a própria Justiça e o Ministério Público, há muito tempo, vêm alertando S. Exª. Aliás, eu mesmo estive naquela unidade da Febem e pude verificar essa superlotação. Obviamente, a visita da representante da ONU, inclusive na presença da imprensa, constatando aquela situação, foi muito importante. O fato de duas testemunhas terem lhe relatado a respeito dos assassinatos ocorridos nesses últimos dias pela atuação de esquadrões da morte, o que é totalmente ilegal, constitui fato da maior gravidade, fato esse que se refere a ações tanto de Poderes Executivos federais das Unidades da Federação como dos órgãos da Justiça.

Concedo, com muita honra, o aparte ao Senador Ramez Tebet, que, sei, ontem fez aqui um protesto nesse sentido. No entanto, quero assinalar, prezado Senador, que hoje vi na imprensa que o jurista Dalmo Dallari fez uma observação, no jornal O Globo, à qual gostaria de ler antes de conceder o aparte a V. Exª.

Não entendi como uma intervenção, mas como uma observação de que o Judiciário deveria estar mais próximo da sociedade, no sentido de dar apoio aos problemas.

Segundo Dallari, como até o Judiciário reconhece que precisa ser reavaliado, a crítica acaba sendo útil:

A manifestação estimula o Judiciário, e também o Legislativo e o Executivo, para que procurem melhorar o Poder Judiciário.

Portanto, parece-me que as declarações da Srª Asma podem ser vistas nesse sentido.

Concedo, com muita honra, o aparte ao Senador Ramez Tebet.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Efetivamente, Senador Eduardo Suplicy, V. Exª é daqueles nossos colegas que estão presentes em todos os assuntos que dizem respeito ao nosso País. Este é um deles. E, a meu ver, é muito sério. Não é bem assim como está sendo colocado. Ela não fez observações sobre problemas do Brasil; ela não repudiou somente o que todos repudiamos: as crianças abandonadas, o crime organizado e outros. Isso também repudiamos. Nós queremos uma Pátria melhor. Sonhamos com um Brasil melhor. V. Exª, há pouco, referiu-se à distribuição de renda do País. Não queremos penitenciárias superlotadas, o que é desumano. Não queremos homens de bem sendo assassinados. Não queremos as nossas casas violadas. No entanto, ela propôs e constatou, em seu relatório, uma inspeção no Poder Judiciário. Isto é grave, a meu ver! O Brasil é um País aberto, democrático. Todos podem constatar os nossos problemas. Mas daí a ilustre representante das Organizações das Nações Unidas sugerir em seu relatório uma inspeção num dos Poderes da República, parece-me inadmissível. Isso o Judiciário não pode aceitar! Não o Judiciário. Nós não podemos aceitar inspeção no Judiciário feita por outros. Não! Se aqui no Brasil nós discutimos o controle externo do Judiciário, uns a favor, outros contra, tudo bem, somos nós que estamos discutindo se o controle externo será bom ou não para o aperfeiçoamento das nossas instituições, no caso, o Poder Judiciário. Mas daí admitir que alguém da ONU sugira isso, Senador Eduardo Suplicy, eu fico com a soberania da minha Pátria e continuo repudiando a sugestão. A simples sugestão já merece o nosso repúdio. Reconheço que o jurista Dalmo Dallari esteja afirmando essas dificuldades que o País atravessa, com tanta desumanidade e desigualdade; ele está condenando, como todos condenamos, o crime organizado, o narcotráfico, a violação dos direitos humanos. Tudo isso condenamos. Mas temos maturidade. O Brasil é um País independente para resolver os seus próprios problemas sem a necessidade de inspeção da ONU, dessa ONU que está aí. Nós, no Brasil, estamos procurando fortalecer a ONU, mas muitos a desrespeitam.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Senador Ramez Tebet, como o tempo está correndo, e ainda quero ouvir os Senadores Eduardo Azeredo e Mozarildo Cavalcanti ainda dentro do tempo regimental, comentarei os apartes ao final.

            Senador Eduardo Azeredo, tem V. Exª o aparte.

O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Senador Eduardo Suplicy, V. Exª aborda um tema que preocupa a todos, ou seja, a questão dos direitos humanos, especialmente com a participação da representante da ONU. A minha opinião coincide com a do Senador Ramez Tebet. É fato que as nossas prisões e penitenciárias estão em uma situação lamentável. No caso das de São Paulo, tenho a certeza de que o Governador Geraldo Alckmin tem feito um esforço tremendo para melhorar a situação, mesmo antes da visita da representante da ONU a São Paulo. Entretanto, preocupa-me, Senador Eduardo Suplicy, porque quando fui Governador por Minas, apareceu por lá um senhor chamado James Cavalaro, que representava a Human Rights Committee. Lá, ele visitou cadeias, interferiu, criticou, tomou decisões, e a imprensa deu-lhe grande cobertura. Inclusive tivemos uma CPI sobre as penitenciárias; assinamos algumas medidas novas, e depois ele nunca mais apareceu, sumiu. Depois, no governo seguinte, perguntavam onde estava o James Cavalaro. Novas rebeliões surgiram e a situação se agravou nas penitenciárias de Minas - eu consegui passar quatro anos sem nenhuma rebelião. As rebeliões eram semanais, e o Sr. James Cavalaro sumiu. Manifesto estranheza com essa presença de um representante da ONU em determinado momento e lugar, como ocorreu no Estado de São Paulo, que emite opiniões que, salvo melhor juízo, as considero indevidas, principalmente ao pedir interferência no Poder Judiciário brasileiro. Disse bem o Senador Ramez Tebet: as questões do Judiciário precisam ser discutidas, sim, mas trata-se de um Poder da República. Na minha opinião, também não concordo com as opiniões emitidas pela representante da ONU, pois considero realmente uma interferência em um dos Poderes da República, que é o Judiciário.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Muito obrigado, Senador Eduardo Azeredo.

Concedo um aparte ao Senador Mozarildo Cavalcanti.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PPS - RR) - Senador Suplicy, sigo a mesma linha dos Senadores Ramez Tebet e Eduardo Azeredo. A ONU, nos recentes episódios da invasão ao Iraque, inclusive na complicada eleição do Presidente Bush, não tem se comportado, com relação aos países ricos, com recomendações desse tipo. Portanto, temos que repudiar qualquer manifestação de um organismo que não está tendo moral, hoje - e que precisa ser recuperado, porque é útil para o mundo -, vir aqui propor uma inspeção no Poder Judiciário. Penso que se admitirmos isso estaremos nos colocando como um País de terceira categoria. O Poder Legislativo tem a obrigação de, em comum acordo com o Judiciário, fazer a reforma que passou dez anos na Câmara e já está em seu terceiro ano no Senado. Nós é que temos que fazer as reformas e as inspeções necessárias; nunca qualquer organismo, mesmo que seja internacional!

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Senadores Ramez Tebet, Eduardo Azeredo e Mozarildo Cavalcanti, espero que a manifestação da representante da ONU tenha o mesmo sentido mencionado pelo Professor Dalmo Dallari, a de chamar a atenção para que o Poder Legislativo, Executivo e Judiciário venham a corrigir essa grave questão, para que esses abusos não continuem em nosso País. Muito obrigado.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/10/2003 - Página 31181