Discurso durante a 163ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações a respeito da Medida Provisória 2.166.

Autor
Jonas Pinheiro (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Jonas Pinheiro da Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • Considerações a respeito da Medida Provisória 2.166.
Aparteantes
Luiz Otavio, Mozarildo Cavalcanti.
Publicação
Publicação no DSF de 15/11/2003 - Página 37247
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • COMENTARIO, POLEMICA, MEDIDA PROVISORIA (MPV), ESTABELECIMENTO, COTA COMPULSORIA, PROPRIEDADE RURAL, REGIÃO AMAZONICA, DESTINAÇÃO, PRESERVAÇÃO, MEIO AMBIENTE.
  • QUESTIONAMENTO, CRITERIOS, UTILIZAÇÃO, ESTABELECIMENTO, COTA COMPULSORIA, PROPRIEDADE RURAL, REGIÃO AMAZONICA, POSSIBILIDADE, EXISTENCIA, INFLUENCIA, PAIS ESTRANGEIRO, OBRIGATORIEDADE, COTA, PROPRIEDADE PARTICULAR, TENTATIVA, IMPEDIMENTO, AUMENTO, PRODUÇÃO AGRICOLA, BRASIL.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, RETOMADA, DISCUSSÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), ESTABELECIMENTO, COTA COMPULSORIA, PROPRIEDADE RURAL, REGIÃO AMAZONICA, IMPEDIMENTO, PREJUIZO, PRODUTOR RURAL, MEIO AMBIENTE.

O SR. JONAS PINHEIRO (PFL - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a Medida Provisória nº 2.166 - 67, de 24 de agosto de 2001, que altera dispositivos do Código Florestal, é um dos temas controversos em tramitação no Congresso Nacional e vem sendo objeto de discussões desde 1966, com números de medidas provisórias anteriores. Esse assunto envolve interesses contrários, portanto, posições antagônicas de defensores extremados tanto do meio ambiente quanto dos setor agropecuário.

A Legislação em vigor estabelece que pode ser desmatada - e isso é da medida provisória - em cada propriedade situada na Amazônia Legal somente até 20% de sua superfície total, devendo permanecer intacta no mínimo 80% dela, como reserva legal. Assim, uma propriedade de mil hectares pode usar para exploração agrícola ou pecuária apenas 200 hectares, deduzidas, ainda, as áreas de preservação permanente (que também não podem ser exploradas), fazendo com que esse percentual fique ainda menor. Isso contraria os interesses dos produtores rurais, que têm suas propriedades desvalorizadas pela limitação da capacidade de seu aproveitamento.

A imposição legal de que seja mantida 80% da propriedade para reserva legal é também interpretada como uma exigência sem base técnica, por tratar-se de um percentual definido sem critério técnico ou científico. Poderia ser 85%, ou 75%, ou 60%, ou 40%. Qual foi o critério utilizado para fixar o limite em 80%?

Sr. Presidente, existe uma suspeita de que, por trás dessas polêmicas, existam, ocultos em defesas ambientais, interesses de outros países concorrentes do Brasil, que fomentam esse tipo de embaraço à expansão da área cultivada com produtos agrícolas, devido à enorme potencialidade que tem o Brasil de expandir suas áreas de cultivo, o que faria aumentar cada vez mais sua produção agrícola, e transformaria sua produção em uma concorrente mais forte ainda para a produção agrícola de outros países. Esses interesses são mais evidentes quando se trata de área de cerrado, pois a medida provisória também engessa área de cerrado para produção agrícola.

O fato é que essa matéria tramita há mais de 7 anos no Congresso Nacional sem que seja possível viabilizar um entendimento.

Sr. Presidente, essa matéria não pode ser tema de medida provisória pois não atende aos requisitos de urgência e relevância. Essa matéria pode ser relevante mas não é urgente, porque já está há 7 anos em tramitação nesta Casa.

O assunto passou a ser tratado de forma passional, de maneira mais emocional do que racional. Os próprios Ministérios e órgãos do Governo Federal, tanto o passado quanto o atual, têm posições divergentes entre si. O Congresso Nacional vem procurando, durante todo esse tempo da tramitação da matéria, dar um encaminhamento a esse assunto, para aprová-lo, a fim de possibilitar que o Brasil tenha uma legislação definitiva e coerente. Porém, não tem obtido êxito sozinho.

Em meados de 2002, foram feitos vários esforços com o fito de canalizar a discussão pelo campo técnico, de modo que a fixação dos percentuais, tanto de desmatamento quanto de reserva fossem definidos com base em estudos detalhados e não de forma generalizada para toda a Amazônia, como é feito atualmente.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PPS - RR) - Nobre Senador Jonas Pinheiro, quando V. Exª achar oportuno, gostaria de lhe apartear.

O SR. JONAS PINHEIRO (PFL - MT) - A seguir, darei o aparte a V. Exª.

Assim, determinada região ou área, teria um percentual definido em função de sua diversidade climática, de suas condições de solo, localização, de fragilidade ou não do seu ecossistema. Mas isso só será possível se for realizado o chamado Zoneamento Ecológico-Econômico, conhecido como ZEE.

Concedo o aparte ao nobre Senador Mozarildo Cavalcanti, que tanto tem lutado por este tema no Congresso Nacional, particularmente no Senado.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PPS - RR) - Senador Jonas Pinheiro, quero parabenizá-lo pelo oportuno e aprofundado pronunciamento, V. Exª que é um expert no assunto e, acima de tudo, pelo alerta que V. Exª faz sobre a questão dos interesses que poderiam estar por trás desta medida provisória e de outras ações que visam engessar o Centro-Oeste e a Amazônia. É interessante nos utilizarmos da matemática para sermos melhor compreendidos, porque se dissermos para quem está em Ipanema, por exemplo, que só pode desmatar 20% da Amazônia, pode parecer muito, mas são 20% de uma propriedade particular na Amazônia, porque cerca de 50% da Amazônia já pertence a reservas indígenas. Portanto, não pode ser tocada. Outros 20% são de reservas ecológicas ou de reservas de unidades de conservação - diversos rótulos foram criados ao longo do tempo - e só podem ser admiradas, e não aproveitadas racionalmente. Portanto, quem tem uma propriedade na Amazônia só pode aproveitar 20% dela para a sua sobrevivência, o seu sustento e para, de alguma forma, progredir. No cerrado, a situação é semelhante. Parece-me que são 50% no cerrado.

O SR. JONAS PINHEIRO (PFL - MT) - No cerrado, podem-se usar 65%.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PPS - RR) - Ora, o cerrado não tem mais o que desmatar, o nome já está dizendo. O que se pode fazer é aproveitar um ecossistema favorável ao plantio, como se tem demonstrado. Existe uma campanha muito bem orquestrada que não leva em conta as questões científica e tecnológica, os interesses reais do Brasil, mas apenas aquilo que tem a ver, de um lado, com a ideologia inocente do ambientalismo radical, o ambientalismo que chamo de xiita, que dá mais valor, por exemplo, a um animal, a uma árvore do que ao ser humano, e, de outro lado, que é o mais perigoso, o interesse dos grandes concorrentes internacionais, que não querem que o Brasil produza mais do que eles, que não querem que o País tenha a competitividade que estamos passando a ter. É preciso, como disse V. Exª, levar mais a sério o assunto, promover uma ampla discussão com todos os setores, tanto com os que são a favor quanto com os que são contra, mas levando em conta a questão científica, a questão tecnológica e a questão nacionalista. Eu também me revolto contra isso e contra outras coisas que são feitas em prejuízo da Amazônia e do Centro-Oeste. Esta é uma mentira que vem sendo repetida todos os dias: a de que precisamos preservar, preservar, preservar. Preservar o que e para quem? Para que, futuramente, aqueles que hoje mandam no mundo tenham a água, a madeira, os minérios e, portanto, possam tirar o proveito que quiserem do nosso solo. Nobre Senador, estou do lado de V. Exª no sentido de agilizar esta MP e de discuti-la de maneira séria.

O SR. JONAS PINHEIRO (PFL - MT) - Muito obrigado, eminente Senador Mozarildo Cavalcanti.

O Estado de V. Exª, Roraima, é prova disso. Mais da metade está preservada com as chamadas reservas indígenas. Há coisas extraordinárias que podem ser aproveitadas, em termos de área, de terra, mas nada se pode fazer em função da limitação dessa medida provisória. Imaginem, não é uma lei; é uma instabilidade jurídica o que vivemos até hoje! V. Exª tem razão.

Antes de conceder o aparte ao Senador Luiz Otávio, quero fazer um comentário sobre Rondônia, o Estado do eminente Senador Valdir Raupp, que está aqui, é ex-Governador e vive esse drama.

No Estado de Rondônia, com muito afinco, trabalho e a utilização de muitos recursos, fez-se o Zoneamento Ecológico-Econômico, que foi aprovado na Assembléia Legislativa - e isso faz tempo! Em Mato Grosso, a elaboração desse zoneamento foi iniciada na mesma época do de Rondônia, mas ainda não está definitivamente concluído. Nos demais Estados, ainda não existe zoneamento, mas todos querem fazê-lo. O problema é o seguinte: o zoneamento, que é uma lei estadual, quando há uma medida provisória, que é federal - vale como lei federal -, não tem validade. Rondônia fez o zoneamento, está feito, mas não pode aplicá-lo exatamente porque existe essa medida provisória, que proíbe.

Ouço o Senador Luiz Otávio.

O Sr. Luiz Otávio (PMDB - PA) - Senador Jonas Pinheiro, é importante termos a oportunidade, como estamos tendo agora, de ouvir sobre um assunto tão importante para a Amazônia e principalmente para o Brasil. V. Exª, que foi reconhecido pela população do seu Estado, Mato Grosso, e reeleito Senador da República, sabe que esta medida provisória precisa ser votada. Eu me associo a V. Exª e vou trabalhar com V. Exª, com o Senador Mozarildo Cavalcanti e com todos desta Casa no sentido de solicitar ao Presidente Sarney que coloque em pauta esta medida provisória, para que, na discussão da matéria, possamos chegar a um acordo e ela seja aprovada e entre em vigor. Assim o Estado do Pará e os Estados da Amazônia poderão trazer uma solução imediata para esse segmento tão importante da sociedade.

O SR. JONAS PINHEIRO (PFL - MT) - Muito obrigado, eminente Senador Luiz Otávio.

V. Exª é a prova de que milhares de produtores no Estado do Pará vivem na ilegalidade. Esta medida provisória leva-os para a ilegalidade. Antes da medida provisória, eles já haviam aproveitado a sua área - e tinham o direito de aproveitá-la em até 50%. Agora, a medida provisória reduz essa área e quer que o produtor, que o proprietário a refaça.

Se não mudarmos esta medida provisória com a aprovação da lei, ela continuará retroagindo perigosamente a situação do Estado e prejudicará os proprietários rurais deste País.

Em julho de 2002, após um longo período de entendimento com os Parlamentares, o Governo Federal editou o Decreto nº 4.297, de 10 de julho de 2002, estabelecendo os critérios para a elaboração do Zoneamento Ecológico-Econômico. Foi mais um passo positivo, pois ele contribuiu para deslocar o eixo da discussão sobre o Código Florestal do campo emocional e passional para o campo técnico.

Dessa maneira, os percentuais de reserva legal deverão ser definidos com base no Zoneamento Ecológico-Econômico, a partir de levantamentos e estudos técnicos, podendo variar dentro de um mesmo Estado ou até mesmo dentro de uma mesma sub-região, ou mesmo dentro de um mesmo Município.

Entretanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, esses dispositivos do Código Florestal vêm sendo regidos por medida provisória, sem que sejam devidamente aprovados pelo Congresso Nacional e, muitas vezes, regulamentados por atos normativos editados pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente - Conama -, de validade jurídica sujeita a questionamentos.

Sr. Presidente, por ocasião da edição da medida provisória, o Congresso Nacional criou a Comissão Mista para analisá-la, que foi devidamente composta, desenvolveu as suas atividades, realizou reuniões e audiências inclusive em vários Estados, ouviu depoimentos e opiniões, consultou especialistas, debateu com autoridades dos governos da época e, pela lavra do Deputado Moacir Micheletto, produziu o seu relatório, que, é importante ressaltar, foi votado e aprovado pelos seus membros.

Aquela Comissão cumpriu então o seu papel e apresentou o seu relatório e parecer devidamente aprovado, com o projeto de lei de conversão, que está em condições de ser retomado para novas análises, discussões e negociações do seu conteúdo, e para que possa então ser apreciado, de maneira terminativa, pelo Plenário do Congresso Nacional.

Srªs e Srs. Senadores, consultei agora o eminente assessor desta Casa, Raimundo Carreio, e ele me confirmou, exatamente como estou fazendo neste pronunciamento. As medidas provisórias antigas são regidas ainda pela Constituição antiga, em se tratando de análise de medida provisória. Portanto, essa medida provisória votada na Comissão está preparada para ser votada na Casa. Depende apenas de vir para o Plenário do Congresso Nacional. Então, é decisão nossa, do Congresso Nacional, decisão do Presidente do Congresso Nacional ou da Mesa do Congresso Nacional.

Acontece, entretanto, Sr. Presidente, que essa medida provisória foi editada em data anterior à Emenda Constitucional nº 32, de 11 de setembro de 2001, e, por não ter sido apreciada pelo Congresso Nacional, tem a sua validade em curso até que o Congresso Nacional sobre ela se manifeste, ou o Presidente da República a altere.

Essa condição da medida provisória gerou uma certa comodidade no Congresso Nacional, já que, estando seu conteúdo em vigência e não havendo exigência de prazo, não se apressa para dar continuidade à sua aprovação. Esse fato gera um certo incômodo e uma certa apreensão, pois, em realidade, a matéria fica regida por uma medida provisória não aprovada pelo Congresso Nacional, o que é, no mínimo, um procedimento inadequado.

Por outro lado, quando da edição da medida provisória, foi constituída a Comissão Mista, que, como disse, desempenhou seu papel em sua totalidade. Tive a honra de ser presidente daquela Comissão e acompanhei de perto todo o seu trabalho. Agora, permanece a dúvida, que precisa ser esclarecida: a Comissão está ainda constituída? Seus membros permanecem, ou tem que mudar aqueles que saíram, que não estão mais no Congresso? O relatório apresentado pelo Deputado Moacir Micheletto e aprovado pela Comissão é válido e pode ser submetido ao Congresso Nacional. Esses pontos precisam ser aclarados, conforme me esclareceu o Secretário-Geral da Mesa, Raimundo Carreiro. Estamos conscientes de que está dependendo desta Casa.

O Congresso não pode e não deve continuar comodamente se omitindo, como se o problema não existisse. Não é próprio desta Casa.

Assim, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, torna-se necessário retomar, com urgência, as discussões sobre a medida provisória que reformula o Código Florestal, para que sejam definidos os pontos pendentes e para evitar que cresça o clima de contenda no meio rural, o que só traz intranqüilidade aos produtores, aos proprietários rurais, e prejuízos ao meio ambiente. Não é aceitável que a discussão de matéria dessa importância e amplitude seja postergada indefinidamente, de maneira inconseqüente e imatura.

Não podemos nos acovardar ou tampar o sol com a peneira, como se o fato não existisse. É necessário enfrentar esse tema com coragem e tranqüilidade. É o apelo que faço aos meus pares e aos líderes desta Casa.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/11/2003 - Página 37247