Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Análise do primeiro ano do Governo Lula.

Autor
Eduardo Azeredo (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MG)
Nome completo: Eduardo Brandão de Azeredo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Análise do primeiro ano do Governo Lula.
Publicação
Publicação no DSF de 19/12/2003 - Página 42209
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, POLITICA SOCIAL, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, POLITICA MONETARIA, PERMANENCIA, MODELO ECONOMICO, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, REDUÇÃO, INVESTIMENTO, SAUDE, INFRAESTRUTURA, SANEAMENTO BASICO, AUMENTO, DESEMPREGO, AUSENCIA, CRESCIMENTO ECONOMICO.

O SR. EDUARDO AZEREDO (PSDB - MG. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srªs e Srs. Senadores, a linha de oposição propositiva adotada pelo PSDB ao longo deste primeiro ano do Governo Lula não significa passividade em relação às ações do Governo; ao contrário, temos lutado para defender as conquistas que obtivemos ao longo da administração Fernando Henrique e para impedir retrocessos prejudiciais ao País. Alcançamos recentemente uma grande vitória, nesse sentido, na batalha em defesa do cumprimento da Emenda Constitucional nº 29, que elevara os recursos para o setor de saúde. A grande mobilização comandada pela Frente Parlamentar e dirigida pelo Deputado Rafael Guerra, de Minas Gerais, impediu que a tentativa de desvio de R$ 3,5 bilhões da área da saúde por parte do Governo Federal fosse bem-sucedida, numa violação ao preceito constitucional que teria efeitos nefastos sobre o sistema público de saúde.

Já na época da campanha pública eleitoral, tínhamos ciência da necessidade de avançar além das conquistas obtidas pelo Governo Fernando Henrique, buscando nova agenda para alcançar o crescimento econômico sustentado, o aumento do emprego e a melhoria da segurança pública.

O que temos visto nos últimos meses difere radicalmente das nossas idéias e do que o País exige para se desenvolver. Na área econômica em uma demonstração de insegurança, o Governo atual optou por uma dosagem excessiva na aplicação de instrumentos restritivos da política monetária. Além disso, ignorou durante muito tempo o clamor geral em favor da redução das taxas de juros. O resultado disso foram meses de sacrifícios desnecessários e desmesurados, em que o número de desempregado ampliou-se - como bem lembrou o Líder do PFL, José Agripino - em 648 mil desde janeiro último.

Para cumprir a sua mais cara proposta de campanha, o Governo atual terá de criar quase 11 milhões de emprego nos postos de trabalho, o que exigirá um crescimento econômico em um ritmo muito superior aos 3,5% previstos para 2004.

Ao reduzir a renda dos trabalhadores, o modelo econômico seguido pelo Governo atual concentra a riqueza de forma perversa. Basta comparar o que está sendo gasto este ano com o pagamento de juros em relação aos dispêndios de aposentadoria. As despesas do setor público com juros devem chegar a R$154 bilhões neste ano. Será o maior nível da história e poderá representar 10% do PIB. Pela projeções do próprio Banco Central, o valor será 35% maior do que o registrado no ano passado.

Será também, Sr. Presidente, a primeira vez em que as despesas com pagamento de juros irão superar os gastos com pagamento de aposentadorias. Para pagar as aposentadorias de cerca de vinte milhões de brasileiros, o INSS deverá gastar este ano R$105 bilhões, contra R$154 bilhões de pagamento de juros. O PT foi um partido extremamente crítico exatamente com a questão da dívida brasileira.

Indo além do que o próprio FMI exigira, o Governo atual elevou a meta do superávit primário para 4,25% do PIB, um nível absolutamente incompatível com as carências vividas pelo País. Na esteira desse arrocho, temos hoje na área social um dos piores desempenhos da nossa história recente. Basta dizer que investimentos sociais realizados até setembro representam apenas 10% do que foi aplicado no ano passado. A falta de sensibilidade manifestada pela atual administração em relação às necessidades urgentes do país reflete-se no orçamento proposto para 2004 para a área social: 8% menor do que o executado em 2002.

O símbolo do Governo na área social, o programa Fome Zero, apresentado à população como a grande solução para acabar com o problema da falta de comida nas mesas de milhões de brasileiros, ainda engatinha. Apesar de toda a propaganda e o marketing que envolvem o programa, o Fome Zero ainda não decolou. Até o final de setembro, só haviam sido aplicados R$173,2 milhões dos R$1,271 bilhão destinados ao programa. O quadro da fome e da miséria, infelizmente, em nada mudou nesses primeiros 11 meses do novo Governo - há que se considerar.

Na saúde, o descaso não aparece apenas na tentativa do Executivo de subtrair recursos programados para o ano que vem.

Depois de quase seis anos de pagamentos rigorosamente em dia, a rede hospitalar e ambulatorial ligada ao SUS voltou a conviver com atrasos e hoje a qualidade do atendimento começa a se deteriorar, com sinais evidentes de crise em diversos hospitais. Não houve qualquer avanço nos programas existentes. A maior promessa eleitoral no setor de saúde, a criação de farmácias populares, sequer saiu do papel. Ainda agora no Orçamento, o Governo concentra recursos nas suas mãos, diminuindo recursos do SUS que são descentralizados para os Estados.

Um dos maiores equívocos cometidos pelo atual Governo foi a interrupção dos investimentos em saneamento básico. Até o final de setembro, haviam sido investidos em projetos públicos de água e esgoto apenas R$12 milhões dos R$230 milhões previstos no Orçamento da União para este ano, ou seja, somente foram aplicados 4,5% dos recursos disponíveis.

A paralisação dos investimentos em água e esgoto foi acompanhada de uma decisão drástica: o fim do Projeto Alvorada, responsável pelo maior investimento a fundo perdido feito nos anos recentes em saneamento básico no País. Entre 2001 e 2002, o Projeto Alvorada aplicou quase R$2,4 bilhões, beneficiando 2,2 milhões de famílias. Acabaram com o projeto e não colocaram nada no lugar.

Uma marca comum a quase todas as áreas do Governo é a forma pouco democrática de gerir o Estado. O aparelhamento verificado na máquina pública conspira contra a eficiência e o respeito aos mais caros valores republicanos. Em nome da diretriz de que o servidor público tem de ter lado, ressuscitaram-se formas arcaicas de clientelismo e fisiologismo em órgãos respeitados como o Incra, a Funasa e o BNDES, apenas para citar três dos redutos mais emblemáticos desse retrocesso.

O País assiste, com surpresa, a esse espetáculo de ineficiência e falta de rumo. Trata-se de sentimento que acomete desde o cidadão comum até os agentes econômicos, à espera de que o Governo comece a governar. Em razão disso, os investimentos produtivos cessaram num momento em que o País mais precisa desse impulso. O setor elétrico fornece o exemplo mais eloqüente dessa situação: das 49 usinas hidrelétricas que contam atualmente com concessão expedida pela Aneel, apenas 17 têm obras em andamento.

Voltamos a viver riscos que julgávamos superados, com a ameaça de nova crise no fornecimento de energia elétrica.

Sr. Presidente, já estou me aproximando do fim do discurso. O Senador Maguito Vilela terá oportunidade de falar.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma) - V. Exª tem o seu tempo. Eu pedi a V. Exª um pouco do seu tempo para conceder ao Senador Maguito, mas é seu o tempo.

O SR. EDUARDO AZEREDO (PSDB - MG) - Um dos retrocessos de maior gravidade para o futuro do País é o que se delineia com relação ao setor elétrico brasileiro e às agências reguladoras, um dos principais passos da estratégia trilhada para modernizar o Estado brasileiro. Depois de inúmeras demonstrações públicas de contrariedade ao ambiente de competição sadia, o Executivo enviou ao Congresso, por medida provisória, alterações que, se aprovadas, irão pôr em risco os investimentos futuros em energia e, conseqüentemente, as próprias chances de um crescimento sustentado da economia brasileira.

A mesma falta de projetos consistentes transparece em setores tão díspares quanto o meio ambiente e a ciência e tecnologia. O que vemos nessas duas áreas é uma ameaça ao conhecimento produzido por nossos pesquisadores, como expresso na proposta de reformulação da política referente à biosegurança. O custo desses equívocos poderá ser um grande atraso nos avanços tecnológicos que precisamos alcançar para aumentar a competitividade do País.

Ao fim dos primeiros onze meses do atual Governo, a conclusão é a de que estamos encerrando um ano fraco em termos de crescimento econômico e progresso social.

No pouco que agiu, o Governo demonstrou inexperiência e insensibilidade no trato das questões que afetam a vida cotidiana dos brasileiros, especialmente os mais necessitados. O caso mais dramático foi a exigência para que aposentados com mais de 90 anos comparecessem pessoalmente às agências do INSS para se recadastrarem. A indignação nacional fez o Governo desistir desse desatino. As cenas dramáticas que revoltaram o País, entretanto, voltaram a se repetir dias depois, desta vez às portas da Justiça, para pedir a correção de aposentadorias e pensões. Faltou ao Governo, mais uma vez, sensibilidade para encontrar uma solução que poupasse nossos aposentados de tanta humilhação e tanto sacrifício.

A insensibilidade em relação à questão social se repetiu no episódio do veto presidencial ao projeto do Deputado Eduardo Barbosa, do PSDB de Minas Gerais, que permitia o uso de recursos do Fundef para estudantes portadores de deficiência. Novamente o repúdio nacional obrigou o Governo a voltar atrás e a improvisar uma solução para remediar mais um ato grotesco da Administração.

Ainda tenho que falar das estradas. Por várias vezes, ocupei esta tribuna lembrando a péssima situação das estradas brasileiras, quer seja na manutenção, quer seja na construção de novas, para enfrentar o tráfego cada vez mais crescente.

Tudo isso mostra que quem tem motivos para se envergonhar de propostas feitas no passado e não cumpridas no presente não é o meu Partido, o PSDB, que incorporou milhões de brasileiros ao mercado com o Plano Real, mas, sim, o Partido do Governo, que abandonou seu programa.

Na qualidade de Primeiro Vice-Presidente do Partido, trago, ao fim deste ano, estas considerações, que mostram como o PSDB contribuiu, e muito, com uma oposição construtiva, mas também que estaremos prontos para cobrar os resultados já no próximo início de ano que se avizinha.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/12/2003 - Página 42209