Discurso durante a 81ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa do salário mínimo de R$ 275,00.

Autor
José Jorge (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: José Jorge de Vasconcelos Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SALARIAL.:
  • Defesa do salário mínimo de R$ 275,00.
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 15/06/2004 - Página 18102
Assunto
Outros > POLITICA SALARIAL.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, PROPOSTA, ACRESCIMO, VALOR, REAJUSTE, SALARIO MINIMO, AUTORIA, BLOCO PARLAMENTAR, PARTIDO POLITICO, OPOSIÇÃO, GOVERNO, DETALHAMENTO, CUSTEIO.
  • DENUNCIA, FRUSTRAÇÃO, CIDADÃO, DESCUMPRIMENTO, PROMESSA, CAMPANHA ELEITORAL, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MELHORIA, SALARIO MINIMO, INSUCESSO, PROGRAMA, POLITICA SOCIAL, SUPERIORIDADE, GASTOS PUBLICOS, MORDOMIA.
  • REGISTRO, TRADIÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA FRENTE LIBERAL (PFL), LUTA, MELHORIA, SALARIO MINIMO, DEBATE, PROBLEMA, NATUREZA FISCAL, AUSENCIA, ATENDIMENTO, NECESSIDADE, TRABALHADOR, EXPECTATIVA, INDEPENDENCIA, VOTAÇÃO, SENADO.

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Sr. Presidente. Agradeço ao Senador Marco Maciel.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os debates em torno da fixação do valor do salário mínimo já formam uma tradição à parte na história do Parlamento brasileiro. O fato é que o tema salário mínimo mexe com corações e mentes, enseja argumentos de exortações, dá margem a apelos à razão e a apelos à emoção.

Agora, quando discutimos no Senado Federal a medida provisória que fixa o novo valor do salário mínimo, já aprovada pela Câmara na forma que o Governo desejava, a história não será diferente. Mas não é à emoção que quero apelar hoje ao defender o aumento do salário mínimo para R$275. É importante que se mostre claramente a razoabilidade dessa proposta.

Há, na verdade, muito mais paixão envolvida na discussão deste ano. Explicações para isso há várias, naturalmente. Entre elas as expectativas geradas, por um lado, pelas promessas do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, feitas ainda na campanha eleitoral, de dobrar o valor real do salário mínimo nos seus quatro anos de Governo. Por outro lado, pelo próprio fato de que temos agora o Governo do Partido dos Trabalhadores, chefiado por um ex-sindicalista, com uma história e uma trajetória que autorizaria pensar que este Governo poderia ser muito mais ousado do que outros já foram no que diz respeito à política do salário mínimo.

Essas expectativas, no entanto, frustraram-se todas. O aumento irrisório que o Governo propõe agora para o salário mínimo joga uma pá de cal sobre a promessa feita. Infelizmente precisamos mais do que uma biografia para apoiar e fundamentar as nossas decisões.

É assim, Srªs e Srs. Senadores, com um olho voltado para o que deveria ser ou pelo menos para o que todos gostariam que fosse, e outro fixado naquilo que é nossa realidade e naquilo que podemos fazer, surgiu a proposta capitaneada pelos partidos de oposição de aumentar o salário mínimo para 265 reais em lugar dos 260 sugeridos pelo Governo. Portanto, um aumento de apenas 15 reais é o valor desse pequeno benefício aos trabalhadores, aos quatorze milhões de brasileiros que ganham o salário mínimo. É essa proposta que quero defender, relembrando os argumentos que a apóiam.*

Sr. Presidente, Senador Paulo Paim, V. Exª lembra que, no tempo do Governo Fernando Henrique, quando éramos do Governo e V. Exª era da oposição, naquela época do PT, estivemos juntos em muitos movimentos para apoiar o salário mínimo. Eu era o coordenador do movimento pelo salário mínimo de 100 dólares junto com a bancada do PFL. E votamos a favor do salário mínimo. Fomos derrotados pela máquina do Governo, mas votamos contra o aumento do salário mínimo proposto pelo Governo na época e a favor do salário mínimo de 100 dólares sob a liderança do Senador Paulo Paim.

O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PT - DF) - V. Exª me concede um aparte?

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE) - Concedo o aparte ao Senador Cristovam Buarque, que já está esperando desde o pronunciamento do Senador José Agripino.

O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PT - DF) - Senador José Jorge, como se trata do mesmo assunto, dá até para falar de uma só vez com os dois Senadores. Não vou discordar dos números do Senador José Agripino, nem se é ou não possível dar o aumento de 275, nem se há recursos para tanto no Orçamento. Quero fazer uma pergunta a V. Exª, que é do PFL, já que não posso fazer ao líder. Em vez de dar 15 reais a mais, por mês, não seria melhor para o trabalhador, mantermos os 260 que o Presidente propõe e, com esses 1,6 bilhão, exatamente, contratarmos 500 mil trabalhadores desempregados para um programa de água e esgoto na casa dos trabalhadores que recebem salário mínimo? Concordo com V. Exª: é um absurdo termos um salário de 260 reais, mas mantenho-me coerente com o meu discurso de anos atrás, na época do Presidente Fernando Henrique Cardoso, quando eu dizia: se não é possível dar aumentos maiores, e não tenho como justificar um aumento maior, por que não oferecer serviços públicos ao trabalhador? Quinze reais é muito pouco e, ao mesmo tempo, pesa na Previdência, como alega o Governo. E gostaria de dizer ao Senador José Agripino que pode ter um efeito quando ele dizia que, a cada quatro meses, aumentava o salário em 40%, aumentava a arrecadação, mas disparava o gatilho da inflação e tinha um efeito alimentador do processo inflacionário que o Presidente Fernando Henrique conseguiu acabar com o Plano Real, essa realimentação para mim foi o grande êxito do Plano Real. O aumento do salário, segundo o Governo, pressionará os preços porque, além de serem recursos do Governo, vai pressionar a Previdência. Quero reafirmar que não voto R$260,00 puro, mas votarei sem problema se vier com um projeto acompanhando, dando ao trabalhador aquilo que ele tem direito: melhorando a escola e o piso salarial do professor, garantindo vagas para as crianças na escola. O simples fato de uma criança estar na escola, só de alimentação, corresponde a R$20,00. Gostaria de chamar o PFL para um debate sobre como melhorar a qualidade de vida do trabalhador sem necessariamente passar pelo aumento do salário mínimo, mas cobrando do Governo os serviços públicos que o meu Partido, o PT, prometeu na campanha e que não está cumprindo ainda.

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE) - Muito obrigado, Senador Cristovam Buarque.

V. Exª é uma pessoa com muitas idéias boas, é crédula e, infelizmente, não sou tão crédulo como V. Exª o é. Gostaria de ser por entender que isso é uma virtude, mas o que verificamos nesse Governo é que não concede o aumento do salário mínimo que prometeu, e os programas sociais que ele mesmo cria opera muito mal. Um exemplo é o programa social do Primeiro Emprego em que a meta era de 250 mil empregos no primeiro ano; não se criaram nem mil. O Programa Fome Zero e todos esses programas sociais têm muito de marketing e pouco de ação efetiva. Então, na realidade, se aceitássemos uma sugestão como essa de V. Exª, só iríamos, de certa maneira, mudar a tônica do discurso, porque, no final, não confiaríamos que o Governo pudesse efetivamente cumprir essas promessas.

Já temos um exemplo típico disso na reforma da Previdência. A emenda paralela era para ter sido aprovada em janeiro, mas já estamos em junho - o Presidente até já comemorou o São João - e ainda não a aprovamos.

Vemos que todos os dias há dinheiro para comprar muitas coisas que não eram prioritárias. O Presidente gastou R$176 milhões com avião de luxo, mais de R$40 milhões para comprar motos; quer dizer, para tudo há dinheiro, só para o salário mínimo é que não há.

A proposta de V. Exª é inteligente. Concordo com V. Exª, em tese, que alguns programas sociais poderiam até, de uma certa maneira, viabilizar um salário mínimo menor, mas não confiamos que o Governo seja capaz de operá-los.

Creio ser interessante fazermos um breve esforço de memória para resgatarmos um pouco da intenção original por trás desta instituição que é o salário mínimo.

A idéia de fixar um salário mínimo desatrelado da produtividade do trabalho e do jogo das forças do mercado tinha na sua origem um alcance claramente social. O objetivo era garantir um limite inferior de renda à revelia dos mecanismos de mercado, garantindo, assim, a satisfação de requisitos mínimos de sustento dos indivíduos.

O salário mínimo foi instituído na perspectiva da inclusão social e sob a ótica distributiva. Hoje, no entanto, como aliás demonstram os debates em torno de seu reajuste, a questão do salário mínimo foi engolida pelos problemas contábeis do equilíbrio fiscal e da capacidade de pagamento dos cofres públicos.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não podemos deixar de levar em conta nenhuma destas duas perspectivas: a original, com sua ênfase na função social do salário mínimo; e a outra, que se organiza em torno do problema do equilíbrio fiscal. Esta última é especialmente relevante em nosso caso, dado que, no Brasil, o salário mínimo está diretamente atrelado à política de Previdência e Assistência Social.

Volto, então, à proposta que defendo. Tal proposta pretende, ao mesmo tempo, fazer alguma justiça à função original da instituição do salário mínimo e respeitar as limitações impostas pelo imperativo do equilíbrio das contas públicas. Dentro desses limites, parece mais justa, sem deixar de ser realista, a proposta de reajustar o valor do salário mínimo para R$275,00, em vez dos R$260,00 fixados pelo Governo.

Alguém poderia perguntar: que diferença fazem R$15,00 por mês? O que significa cerca de R$0,50 por dia a mais no bolso do trabalhador? Certamente faz muita diferença, Sr. Presidente. Mais ainda se compararmos esse valor com algumas despesas criadas recentemente pelo Governo do PT. O Presidente Lula tem demonstrado uma predileção toda especial pelas chamadas “mordomias do poder”. Gastou R$176 milhões com um avião de luxo, pago à vista. Normalmente, todo avião é financiado em dez anos. As próprias fábricas contam com uma estrutura a fim de financiar a compra de aviões, Senador Pedro Simon. Esse avião foi comprado à vista e pago antecipadamente. Já foram pagos quase R$40 milhões, e o avião somente será entregue no final do ano. É um caso inédito. Estou até fazendo um requerimento de informação para saber por que o avião foi comprado à vista e se o Governo tinha dinheiro sobrando para pagá-lo de uma vez só.

Gastou com um avião de luxo, com novas motocicletas importadas para a sua escolta e ainda com novíssimos capacetes importados de alta tecnologia, equiparados aos dos pilotos de caça. Cada um deles custará ao contribuinte R$44 mil, mais caro que um carro bom hoje, cujo valor está em torno de R$30 mil. Esses são os gastos prioritários do Palácio, enquanto o salário mínimo, apesar de ser promessa de campanha, fica relegado a segundo plano.

Mas, mesmo assim, a nossa proposta de aumento para R$ 275,00, Sr. Presidente, é ainda modesta. Todos concordamos com isso e todos gostaríamos de poder fazer mais. No entanto, não podemos ignorar os limites impostos pela necessidade do equilíbrio, que não foram de forma alguma esquecidos pelo nobre Deputado Rodrigo Maia, que defendeu, em seu parecer sobre a medida provisória na Comissão Mista, o valor de R$ 275,00 para o salário mínimo.

Resumo aqui, Sr. Presidente, as razões que apresentou. Aumentar o valor do salário mínimo de R$240,00 para R$275,00 implica um aumento líquido de R$3,4 bilhões nas despesas previdenciárias e assistenciais. Acrescentando-se a isso o passivo previdenciário, considerado em seu fluxo, para os meses restantes de 2004, que é de R$1,3 bilhão, temos R$4,7 bilhões a cobrir para justificar o valor de R$275,00.

Ora, a Lei Orçamentária anual de 2004 já reservou R$1,8 bilhão para o reajuste do salário mínimo. Além desses recursos, podemos contabilizar mais R$1,7 bilhão de excesso de arrecadação em relação à Lei Orçamentária. Cerca de R$500 milhões de remanejamento de dotações orçamentárias e R$700 milhões correspondentes à redução da necessidade de superávit fiscal pela queda do PIB em 2003. Somando tudo, temos R$4,7 bilhões, o suficiente para cobrir aquele aumento sem nenhuma pressão inadequada para a capacidade de pagamento dos cofres públicos que pusesse em risco o equilíbrio das contas.

Portanto, é viável e realista, respeitando os limites orçamentários e o imperativo do equilíbrio fiscal, a proposta de aumentar o valor do salário mínimo para R$275,00. Essa é uma proposta razoável e responsável, que não desconhece demagogicamente as dificuldades, ao mesmo tempo em que tenta, na medida do possível, aproximar-se do que seria mais justo.

Sr, Presidente, Srªs e Srs. Senadores, se há algo que não devemos perder de vista neste momento é que, ao decidirmos o novo valor do salário mínimo, estaremos intervindo diretamente na vida de mais de 30 milhões de trabalhadores e de mais de 14 milhões de beneficiários da Previdência e da Assistência Social. São 44 milhões de brasileiros que estaremos afetando diretamente com a nossa decisão. Muitos mais são afetados indiretamente, e muitos deles contam apenas com a renda do salário mínimo para sustentar não apenas a si mesmos, mas a suas famílias.

Na próxima quarta-feira, depois de amanhã, teremos essa importante votação no Senado. Nós da Oposição, juntamente com diversos Senadores da Base do Governo, estamos fazendo um trabalho para garantir, nesta Casa, a vitória do valor de R$275,00 para o salário mínimo, um trabalho democrático, procurando um a um, convencendo-os da necessidade desse aumento de R$ 260,00 para R$ 275,00.

Todo dia lemos nos jornais que o Governo criará uma delegação para viajar ao exterior, que oferecerá liberação de emendas parlamentares - tem R$1 bilhão de excesso de arrecadação - para aprovar o salário mínimo de R$ 260,00.

Creio que Senadores não serão influenciados em relação a seu voto por uma viagem, nem que seja para Paris ou Nova York. Também penso que é obrigação do Governo fazer liberação de emendas, e nenhum Senador mudará seu voto por causa da liberação da emenda “a”, “b” ou “c” - eu pelo menos não mudarei o meu.

Vamos contar com a vitória do valor de R$275,00, pois necessitamos mostrar ao Governo que ele deve utilizar os recursos públicos da maneira mais econômica possível, só gastando o absolutamente necessário.

Para pagar juro e mordomia não falta dinheiro, mas, quando chega a hora de aprovar um salário mínimo que ainda assim é mínimo, o dinheiro desaparece.

É nosso dever fazer o melhor que podemos, dados os limites que conhecemos.

Creio que, na atual circunstância, aumentar o salário mínimo para R$275,00 é o melhor que podemos oferecer. Portanto, é nosso dever aprovar pelo menos esse aumento, contra o proposto pelo Governo. É o apelo que faço ao Senado.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/06/2004 - Página 18102