Discurso durante a 147ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Irregularidades na atuação da empresa Cobra, beneficiada pelo governo federal.

Autor
José Jorge (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: José Jorge de Vasconcelos Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • Irregularidades na atuação da empresa Cobra, beneficiada pelo governo federal.
Publicação
Publicação no DSF de 26/10/2004 - Página 33153
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • REITERAÇÃO, QUESTIONAMENTO, ATUAÇÃO, EMPRESA, INFORMATICA, EMPRESA SUBSIDIARIA, BANCO DO BRASIL, REGISTRO, DENUNCIA, PUBLICAÇÃO, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AUSENCIA, LICITAÇÃO, CONTRATO, PREFEITURA, BANCO OFICIAL, EMPRESA DE PROCESSAMENTO DE DADOS DA PREVIDENCIA SOCIAL (DATAPREV), TERCEIRIZAÇÃO, PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, FAVORECIMENTO, EMPRESARIO, CONTRIBUINTE, CAMPANHA ELEITORAL, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT).
  • LEITURA, TRECHO, REPRESENTAÇÃO, AUTORIA, ORADOR, SOLICITAÇÃO, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), INVESTIGAÇÃO, IRREGULARIDADE, EMPRESA, INFORMATICA, PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, EMPRESA DE PROCESSAMENTO DE DADOS DA PREVIDENCIA SOCIAL (DATAPREV), BANCO DO NORDESTE DO BRASIL S/A (BNB).
  • LEITURA, REQUERIMENTO, CONVOCAÇÃO, COMISSÃO DE EDUCAÇÃO, SENADO, PRESIDENTE, EMPRESA, INFORMATICA.
  • CONCLAMAÇÃO, EMPRESARIO, DENUNCIA, IRREGULARIDADE, MERCADO, INFORMATICA.

O SR JOSÉ JORGE (PFL - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, desde o início do mês de agosto tenho vindo a esta tribuna para falar sobre a empresa Cobra. Como sabemos, trata-se de uma subsidiária do Banco do Brasil, criada, na realidade, há bastante tempo, na época em que havia reserva de mercado, como uma empresa de hardware, para fabricar computadores. 

Com o tempo e o final da reserva de mercado, essa empresa passou a ter faturamento bastante pequeno. Agora, no Governo Lula, ela está renascendo para realizar trabalhos não somente na área de hardware, mas também na de software.

Fiquei muito feliz, Sr. Presidente, ao ver que a Veja, uma das principais revistas semanais do País, publicou uma matéria, na edição que começou a circular ontem em todo o território nacional, sobre a Cobra, citando exatamente a preocupação que temos mostrado aqui desde o mês de agosto: a forma como essa empresa está atuando no mercado de informática, em todo o Brasil.

A Cobra, Sr. Presidente, é uma empresa pública na hora de fazer contratos com o setor público. Ela tem contratos com 22 Prefeituras, sem licitação - dois dos quais com a Prefeitura de São Paulo -, e com os mais importantes bancos estatais brasileiros, como o Banco do Brasil, que é o sócio majoritário, em segundo lugar, com o Banco do Nordeste, depois, com a Caixa Econômica Federal, com o Banco da Amazônia e outros, além de algumas empresas de informática do setor público, como a Dataprev. E todos esses contratos são assinados sem licitação. A Cobra recebe o contrato, e o que faz? Ela atua como uma empresa de terceirização. Neste ponto é que está o erro. Quando vai realizar o serviço, ela contrata empresas do mercado de informática, sem licitação também. No momento em que faz isso, ela é uma empresa privada.

Em resumo: na hora de fazer contrato com o setor público, ela é uma empresa pública, recebe o serviço sem licitação; na hora de terceirizar, ela é uma empresa privada e, portanto, não precisa fazer licitação.

Ora, então o que ela faz? Ela dá os principais contratos aos seus protegidos, aos empresários petistas ou aos que contribuem para as campanhas do PT.

Um exemplo mais claro, que inclusive consta da matéria da Veja, diz o seguinte:

A Cobra alega selecionar seus fornecedores com rigor, mas uma das empresas contratadas, a Novadata, pertence a Mauro Dutra, aquele amigo pessoal de pescaria de Lula que já arrecadou doações em campanhas presidenciais do partido.

 

Não sou eu quem está dizendo isso, é a Veja. Eu já disse aqui antes a mesma coisa, por isso não vou repetir. Vou apenas ler o que a Veja publicou: “Na contabilidade da ONG de Dutra, a Ágora, auditores do governo acharam uma pilha de notas fiscais frias”.

Na realidade, então, a Cobra contrata quem quer. Ela pega aqueles amigos, os apaniguados, e são feitas as contratações.

E o que disse o Presidente da Cobra? Vamos ouvir a declaração dele, Senador Edison Lobão, que achei brilhante, diga-se de passagem. O Presidente da Cobra é o Engenheiro Graciano Santos Neto, que já foi gerente de uma antiga subsidiária da GTech, aquela empresa que faz todo o trabalho da Caixa Econômica Federal e que está envolvida com o Waldomiro, com o Ministro José Dirceu, com todas as pessoas daquela denúncia feita anteriormente aqui e que todos nós conhecemos. Então, ele era da GTech. E a revista faz a pergunta: “Por que a Cobra não participa de licitações?” A resposta é a seguinte: “A empresa se considera uma estatal [ela se considera uma estatal] e, como tal, beneficiária de um dispositivo que dispensa licitação quando um órgão público contrata outro órgão público”.

E há uma outra pergunta: “Se a empresa é uma estatal, não deveria fazer licitações ao menos quando compra produtos de empresas para repassá-los adiante?” É lógico que, se eu sou estatal, quando vou comprar tenho que fazer licitação. E o que ele diz? “A Cobra tem ‘atividade lucrativa como objetivo’ e, portanto, não pode ser compelida a cumprir regras rígidas que a colocariam em desvantagem com relação às empresas privadas”. Então, como ela quer ter lucro, não precisa fazer licitação.

Assim, há esse grande problema, Senador Edison Lobão, que, na realidade, não se resolve. Ninguém no Governo toma providência. Espero que ocorra aí o que houve no caso do cartão de crédito, em que o próprio Presidente Lula... Vejam que isso é um absurdo.

Este ano, de acordo com a estimativa, ela deve faturar mais de R$1 bilhão, quase R$1,5 bilhão, mais de 200% do que faturou no ano passado ou em 2002. Portanto, é uma situação que tem de ser resolvida.

E eu, no dia 24 de agosto, há três meses, fiz duas representações ao Tribunal de Contas, sobre a questão da Cobra. A primeira representação é em relação a uma situação que ocorreu na Dataprev. Como todos sabemos, a Dataprev é uma empresa estatal federal, que presta serviço de informática ao Ministério da Previdência.

Estão aqui as representações, das quais vou ler apenas um trecho, em que solicito ao TCU que verifique os seguintes aspectos: dispensa de licitação por parte da Dataprev; cancelamento de subcontratação por órgão da administração pública de mesma empresa para prestar mesmo serviço; a não realização de licitação por parte da Cobra, na contratação da Unisys; a compatibilidade do fim social e a capacidade da Cobra de prestar os serviços requeridos pela Dataprev.

O que houve, de fato, na questão da Dataprev? Até imagino que seja um pouco mais grave, porque, no caso da Dataprev, quem prestava serviço há mais de 20 anos era a Unisys, uma empresa de informática. O serviço foi dado para a Cobra, que, ao examiná-lo, verificou não possuir capacidade técnica, ou não se interessou pelo serviço, e terceirizou-o para a Unisys. Então, na realidade, o serviço continua sendo feito pela Unisys, mas quem recebe o dinheiro é a Cobra, que é também quem paga a Unisys.

Criou-se um intermediário, que terá lucro - e o próprio Presidente da Cobra afirmou que ela é uma empresa com fins lucrativos -, e uma situação esdrúxula: o serviço que era feito por uma empresa foi dado a outra, que subcontratou a primeira para que ela o fizesse.

Assim, desde o dia 24 de agosto, fiz essa representação ao Tribunal de Contas da União, para que essa situação fosse examinada.

Fiz também, Sr. Presidente, uma representação sobre o Banco do Nordeste, que existe há 50 anos, e sempre teve seus serviços de informática licitados, para que as empresas pudessem realizar o trabalho. Agora, o serviço foi dado à Cobra, pela primeira vez, que o terceirizará para quem quiser. Então, fiz uma representação ao Tribunal de Contas, que já me respondeu. Recebi há 15 dias, datada de 23 de setembro, a seguinte informação do Tribunal de Contas da União:

Sr. Senador,

Consoante despacho exarado pelo Exmº Sr. Ministro Relator Marcos Vinícios Vilaça, em 14/09/2004, Relator do processo de Representação formulada por Vossa Excelência, cumpre-me informar o andamento do referido processo:

a) tramita nesta Casa o TC 010.997/2004-4, que trata de representação sobre indícios de contratação irregular da Empresa Cobra Tecnologia para fornecimento de solução global para modernização tecnológica ao Banco do Nordeste, e que tão logo seja julgado ser-lhe dado conhecimento [assunto do qual tratei];

b) no TC nº 013.065/2004-5 houve determinação, em caráter cautelar, ao Banco do Nordeste para que se abstenha de dar início à execução do projeto a que se referem os itens 1.2 a 1.9 da cláusula quarta do Contrato 2004/229, até que este Tribunal delibere no mérito sobre a legalidade da contratação efetuada, nos termos do art. 45 da Lei nº 8.443/1992 c/c art. 276 do Regimento Interno;

c) determinou, também, a juntada do presente processo ao TC 010.997/2004-4 a fim de subsidiar a análise.

Informo, ainda, que o BNB opôs Embargos de Declaração à Medida Cautelar, tendo o Plenário do TCU, através do Acórdão nº 1.377/2004, conhecido do mesmo, mas negado provimento, mantendo os exatos termos da Medida Cautelar deferida. (Sic.)

Com essa carta, Sr. Presidente, já percebemos uma evolução. O Ministro Relator, Marcos Vinícios Vilaça, concedeu uma medida cautelar, suspendendo a execução do contrato, no caso específico do Banco do Nordeste, que é um dos graves. É um contrato de R$240 milhões. O Banco do Nordeste recorreu ao Pleno do Tribunal, que manteve a medida cautelar. Portanto, o contrato está suspenso até que sejam verificadas suas condições.

É necessário que nós, no Senado, façamos algo, para evitar esse atropelamento que a empresa está causando no mercado de informática. Alguém poderia perguntar qual a importância disso. Essa questão é fundamental, porque é muito difícil para o Governo controlar o mercado de informática.

Outro dia, estive no Tribunal de Contas da União, conversando com alguns Ministros, que me disseram que, como as obras de construção civil - estradas, pontes, escolas, hospitais - são realizadas há muito tempo, existem parâmetros, hoje em dia, que nos permitem avaliar o preço justo, o custo que o setor público paga por elas. Evidentemente, ainda há muita irregularidade, mas essa possibilidade existe pelos índices praticamente já definidos.

No entanto, por ser novo o mercado de informática, a maioria das pessoas não entende muito bem como são realizados esses trabalhos. É necessário que haja parâmetros, para se fazer o julgamento dos preços e dos custos pagos pelo setor público para efetuar esses serviços.

Para haver julgamento e parâmetros, é preciso que haja licitação. Sendo assim, no momento em que a empresa Cobra começa a realizar todos esses serviços sem licitação e a repassá-los a terceiros novamente sem licitação, fica-se sem parâmetros no mercado. E o que ocorre?

Nós nos lembramos bem de que o Tesoureiro do PT, Sr. Delúbio Soares, na entrevista que concedeu à IstoÉ Dinheiro, disse que, durante a campanha, ligou para 14 mil empresas, para pedir ajuda para o PT. Imaginem se não telefonará para essas empresas que estão recebendo serviço sem licitação da Cobra! Se eu estivesse no lugar dele - se fosse tesoureiro do PT - e a Cobra repassasse serviços sem licitação, eu colocaria, em primeiro lugar, na lista, essas empresas que estão sendo diretamente beneficiadas por esse Governo.

É necessário que se tome uma providência. Além dos requerimentos ao Tribunal de Contas, fiz um requerimento de convocação do Presidente da Cobra à Comissão de Educação, que também trata de ciência e tecnologia.

Eu gostaria de fazer um apelo às pessoas da área de informática, principalmente às associações de empresas ou de profissionais, para que examinassem a questão. Na realidade, as empresas têm medo de envolver-se, porque, muitas vezes, prestam serviços a essas mesmas empresas públicas. No momento em que entra esse intermediário do Governo, que tem prestígio, que deve circular no Palácio do Planalto e que está realizando a coisa a seu bel-prazer, fornecendo serviços à empresa que quer, toda empresa fica amedrontada - eu também ficaria - de entrar em um processo como esse.

O jornal O Estado de S. Paulo fez uma matéria há algum tempo, assim como a Gazeta Mercantil e a Veja. Acredito que outros órgãos da imprensa farão o mesmo. É hora de as associações profissionais da área de informática entrarem na questão, para garantir que o mercado de informática não seja corrompido - penso que o termo certo é esse. O sistema que está sendo usado pela Cobra corromperá o mercado de informática; para que isso não aconteça, tanto as associações profissionais da área, como nós, Senadores - que não temos nada a perder, porque não assinamos contratos com empresa de informática -, devemos denunciar, a fim de que o problema seja resolvido.

Apelo ao Presidente Lula, para que repita o que fez com o cartão do Bolsa Família. Se não nos deixam tomar decisões, que Sua Excelência decida, acabando com essa corrupção generalizada que está começando a aparecer no mercado de informática.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/10/2004 - Página 33153