Discurso durante a 21ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Estranheza com a suspensão, pelo Ministério da Educação da pesquisa sobre a participação de negros e pardos nas universidades federais brasileiras.

Autor
José Jorge (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: José Jorge de Vasconcelos Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ENSINO SUPERIOR. DISCRIMINAÇÃO RACIAL. EDUCAÇÃO.:
  • Estranheza com a suspensão, pelo Ministério da Educação da pesquisa sobre a participação de negros e pardos nas universidades federais brasileiras.
Aparteantes
Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 17/03/2005 - Página 5163
Assunto
Outros > ENSINO SUPERIOR. DISCRIMINAÇÃO RACIAL. EDUCAÇÃO.
Indexação
  • PROTESTO, DECISÃO, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), SUSPENSÃO, SOLENIDADE, DIVULGAÇÃO, PESQUISA, RESULTADO, COTA, NEGRO, UNIVERSIDADE FEDERAL, MOTIVO, DISCORDANCIA, CONCLUSÃO, INEFICACIA.
  • CRITICA, AUTORITARISMO, GOVERNO FEDERAL, CENSURA, PESQUISA, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), TENTATIVA, MANIPULAÇÃO, OPINIÃO PUBLICA.
  • ANUNCIO, CONVOCAÇÃO, COMISSÃO DE EDUCAÇÃO, SENADO, COORDENADOR, PESQUISA, OBJETIVO, EXPOSIÇÃO, RESULTADO, COTA, RAÇA, UNIVERSIDADE FEDERAL, IMPORTANCIA, DEBATE, APERFEIÇOAMENTO, POLITICA.
  • DEFESA, AUTONOMIA, UNIVERSIDADE, SISTEMA, INCLUSÃO, RAÇA.
  • CRITICA, DEMORA, EXECUTIVO, REMESSA, CONGRESSO NACIONAL, PROJETO, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO, ENSINO FUNDAMENTAL.

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na última segunda-feira, o Ministério da Educação e Cultura, alegando não ter sido avisado com antecedência, suspendeu uma solenidade de divulgação de pesquisa que reforça uma tese contrária às cotas nas universidades. Na realidade, essa solenidade foi marcada há bastante tempo, e muitas pessoas foram convidadas. Eu mesmo recebi o convite uma semana antes.

Na hora do evento, apesar de todos estarem lá, o Ministério, por intermédio do Sr. Ministro e do Secretário Executivo, suspendeu a solenidade por uma razão aparentemente simples, mas preocupante: não ter concordado com os resultados daquela pesquisa financiada pelo Ministério e realizada pelo Fórum Nacional de Pró-Reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis, de 47 Universidades Federais de todo o Brasil. A pesquisa em questão denomina-se “Segundo Perfil Socioeconômico e Cultural dos Estudantes de Graduação das Instituições Federais de Ensino Superior”. Tais dados, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, colocam em dúvida, pelos resultados que já têm das universidades, esse sistema de cotas. É evidente que não é só porque uma pesquisa coloca uma dúvida que se vai suspender uma política governamental em relação a determinado sentido em que se está indo, mas não se deve impedir que a pesquisa seja divulgada, mesmo porque ela precisa ser discutida, exatamente para permitir a verificação de seus resultados.

Há pouco tempo, já lembramos dois fatos relacionados com esse. Primeiro, foi quando o Governo, por meio do Ministério do Planejamento, baixou uma portaria para que o IBGE, antes de divulgar suas pesquisas, mandasse os resultados 48 horas antes para que o Governo pudesse examiná-los. Ora, há uma tendência internacional de que os órgãos de pesquisa sejam autônomos em relação ao Governo, para que seus resultados tenham a credibilidade de toda a sociedade e não apenas a do Governo. Se o Governo coloca sob suspeição a pesquisa, querendo examiná-la com 48 horas de antecedência, pode sugerir que esteja querendo mudar o resultado da pesquisa. Penso que não seja isso. O Governo não vai querer mudar o resultado da pesquisa; é mais grave ainda: ele quer preparar notícias para colocar na mídia e mostrar que aquela pesquisa não é bem como se previa. É uma maneira diferente de apresentar os resultados, de forma a deixar o Governo em uma situação melhor.

Exemplo típico disso foi quando fizemos uma pesquisa sobre a alimentação no Brasil. Quando o Governo assumiu, todos se lembram de que o programa mais importante do Presidente Lula era o Fome Zero, marketing bolado e montado pelo publicitário Duda Mendonça. Acontece que esse programa foi feito sem nenhum instrumental técnico no sentido de se verificar se realmente deveria ser o principal programa brasileiro naquele momento. O que se verificou na pesquisa? Verificou-se que há muito mais obesos na população brasileira do que pessoas passando fome; o índice dos que estavam passando fome era próximo de 4%, e, entre os obesos, havia algumas categorias que chegavam próximo de 30%. E o Governo tentou controlar a mídia pelo Conselho Nacional de Jornalismo, tentou controlar os artistas que fazem filmes, documentários, etc., por meio da Ancinave. E agora tenta controlar também as pesquisas. Isso é bastante preocupante.

Ontem, na Comissão de Educação do Senado, denunciamos esse fato e fizemos um requerimento, que foi aprovado pela Comissão, convocando a Professora Thérèse Hoffman, coordenadora da pesquisa e que é Decana de Assuntos Comunitários da Universidade de Brasília, para que use a Comissão de Educação do Senado para expor sua pesquisa. Depois discutiremos os resultados, errados ou não, mas não podemos impedir a apresentação da pesquisa para a sociedade.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Permita-me um aparte, Senador José Jorge?

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE) - Concedo o aparte a V. Ex.ª, Senador Paulo Paim e ainda lhe dou os parabéns pelo seu aniversário, ocorrido ontem.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador José Jorge, cumprimento V. Exª por dois motivos. Primeiro, por ter levantado essa discussão sobre as pesquisas e chamar as partes para fazermos um bom debate na Comissão de Educação, onde o requerimento foi aprovado por unanimidade. Faço este aparte como homenagem a V. Ex.ª e à Senadora Roseana Sarney. V. Exª, embora questionando as quotas no que tange às pesquisas, teve a grandeza e a generosidade política de relatar o projeto do Estatuto da Igualdade Racial, que garante as quotas nas universidades, aprovado por unanimidade graças à defesa que V. Exª fez. Agradeço a V. Exª. Tenho certeza de que a Senadora Roseana Sarney, que não estava presente, escolheu um Relator, V. Exª, que fez belíssima defesa do trabalho que ela havia esculpido durante meses. Sobre a pesquisa, faremos o debate no momento adequado. Esse é um quadro em que não se tem como errar. Se chegarmos aos presídios, veremos que a cor predominante é esta aqui: preta. Se chegarmos às favelas, a cor predominante é esta: preta. Mas se chegarmos às universidade, em qualquer sala de aula - faço muitas palestras em universidades - com cinqüenta alunos, com certeza, veremos que no máximo dois ou três são negros. Essa é uma realidade, mas em nenhum momento desautoriza o requerimento de V. Exª; pelo contrário, o requerimento vem para esclarecer os fatos e dizer se efetivamente a pesquisa está certa ou não. Quero cumprimentar V. Exª e dizer-lhe muito obrigado pelo seu relatório, que permitiu a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial.

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE) - Agradeço a V. Exª o aparte. Na realidade, o mérito maior desse projeto, o Estatuto da Igualdade Racial, é de V. Exª, como autor e como grande defensor dessas teses que existem no Senado e vêm desde o tempo em que fomos colegas, como Parlamentares, na Câmara dos Deputados.

Na realidade, o que a pesquisa mostra, Sr. Presidente, é exatamente o que o Senador Paim disse: que, segundo o estudo, a maioria dos universitários se declarou branca, 59,4%; outros, 28,3%, disseram ser pardos, e 5,9%, quase 6%, se disseram negros. Os dados da pesquisa mostram que esses percentuais são parecidos com os percentuais da população brasileira.

Ainda mostrou uma pesquisa segundo a qual 65% dos estudantes são de famílias com renda média mensal entre R$207,00 e R$1.600,00, sendo que 42,8% têm renda familiar até R$927,00; 46,2% dos estudantes entrevistados chegaram à universidade depois de fazer o ensino médio na rede pública.

Então, Sr. Presidente, existe aí uma série de informações. Eu, por exemplo, particularmente, não sou contra o sistema de cotas nas universidades públicas. Só acho que caberia ao Governo Federal dar orientação às universidades. Inclusive apresentei um projeto ao Senado dizendo simplesmente que as universidades deverão colocar em seus exames de seleção critérios de natureza de inclusão social, etc., que permitam que cada universidade, dependendo do contexto em que estiver, dependendo da forma de liderança que ela tenha naquele momento, diga qual o sistema que vai utilizar. O que não acho correto é inventar um sistema de cota que seja uma espécie de pijama e querer vestir o mesmo pijama em todas as universidades, seja ela magra, seja gorda.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE) - Todas duas vão ter o mesmo pijama, o que acho errado. A pesquisa feita pelas universidades serve para esclarecer a sociedade brasileira; não serve para acabar com o sistema de cotas, porque isso depende de decisão do Governo, decisão do Congresso. Porém, não se pode impedir que o sistema de cotas seja discutido e que as universidades que fizeram a pesquisa tenham oportunidade de apresentá-la. Hoje mesmo, o Governo apresenta nos jornais outra pesquisa que mostra resultado contrário. Tudo bem, vamos examinar as duas pesquisas, vamos discuti-las e garantir a autonomia das universidades, porque no momento em que se tira das universidades, públicas ou privadas, a autonomia por conta de cotas, a autonomia delas acaba. Depois de tirar a autonomia por conta das cotas, vai-se tirá-la por outras razões.

O SR. PRESIDENTE (Tião Viana. Bloco/PT - AC) - V. Exª dispõe de mais dois minutos, Senador José Jorge.

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Na realidade, temos de manter a autonomia da universidade e estabelecer que cada universidade deve definir sua forma de fazer essa inclusão social e não querer fazer um sistema só para todas as universidades, pois, aí sim, elas deixam de ser autônomas, exigindo que obedeçam essa norma, ou seja, vistam o mesmo pijama. Achei isso muito grave. Já tinha falado na Comissão de Educação sobre esse problema, mas achei que deveria fazer o mesmo aqui no plenário. Por outro lado, já por essa crítica do Senador Cristovam Buarque, o Ministério anunciou uma série de programas que vai lançar para o ensino básico. São programas sem o devido estudo e suporte técnico, o que faz com que fiquemos muito preocupados com a forma como esse Ministério vem sendo conduzido.

Esperamos que, por exemplo, o Fundeb, programa apresentado aqui há muitos anos pelos próprios Parlamentares do PT...

Já estamos no terceiro mês do terceiro ano do mandato do Governo, e o projeto do Fundeb ainda chegou ao Congresso. O Ministro anunciou ontem que está mandando o projeto para a Casa Civil. Ora, quem quer saber disso? Que me interessa se um programa está na Casa Civil ou no Ministério da Educação? Quero que esteja no Congresso para que possamos aprová-lo, porque senão vamos aprová-lo no último ano do Governo Lula. Então, na verdade, esse não é um projeto para o Governo Lula, mas para o próximo Governo. É preciso tratar o ensino fundamental com a seriedade devida e com a prioridade que se quer dar...

(Interrupção do som.)

O SR. PRESIDENTE (Tião Viana. Bloco/PT - AC) - A Mesa agradece a V. Exª e pede à Taquigrafia que registre as últimas palavras de V. Exª.

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE) - ... ao ensino superior, a meu ver, de forma equivocada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/03/2005 - Página 5163